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Repercussões sociossanitárias da pandemia por Covid-19 para imigrantes e refugiados no Brasil: uma revisão narrativa da literatura

Socio-sanitary repercussions of the Covid-19 pandemic for immigrants and refugees in Brazil: a narrative review of the literature

Resumo:

Trata-se de revisão narrativa de literatura que objetiva apresentar o estado da arte da produção científica sobre as repercussões sociossanitárias da pandemia por Covid-19 para populações de migrantes internacionais no Brasil. A busca foi realizada nas bases de dados Web of Science™, PubMed e Scielo no período de 21 de abril de 2022 a 12 de janeiro de 2023 e foram selecionados 12 artigos. A análise abarcou as temáticas de vulnerabilidade e desigualdade estrutural; discriminação e preconceito; acesso aos serviços sociais e de saúde e respostas governamentais; e sofrimento psíquico. Há necessidade de enfrentamento das desigualdades estruturais, negligência e exclusão sofridas por grupos de migrantes internacionais e intensificadas durante a pandemia. Ademais, é urgente a defesa de estratégias interculturais no Sistema Único de Saúde (SUS) e do estabelecimento de agenda política que englobe marcadores interseccionais e esteja comprometida com a garantia de direitos e cidadania destes grupos.

Palavras-chave:
Covid-19; migração internacional; Brasil; direitos humanos

Abstract:

This narrative literature review aims to present the state of the art of scientific production on the socio-sanitary repercussions of the Covid-19 pandemic for international migrant populations in Brazil. The search was conducted in the Web of Science™, PubMed, and Scielo databases from April 21, 2022, to January 12, 2023, and 12 articles were selected. The analysis covered the themes of vulnerability and structural inequality; discrimination and prejudice; access to social and health services and governmental responses; and psychological suffering. There is a need to confront the structural inequalities, neglect, and exclusion suffered by groups of international migrants and intensified during the pandemic. Furthermore, it is urgent to defend intercultural strategies in the Public Health System and to establish a political agenda that encompasses intersectional markers and is committed to guaranteeing the rights and citizenship of these groups.

Keywords:
Covid-19; international migration; Brazil; human rights

Introdução1 1 Este artigo é resultado parcial do projeto intitulado “Acesso à saúde e vulnerabilidades de imigrantes internacionais no contexto de disseminação da Covid-19: uma pesquisa interinstitucional em rede colaborativa”, com apoio FAPESP processo 2021/06792-2 (Edital UN Roadmap) e CNPQ processo 403913/2021-7 (Edital Universal).

A pandemia por Covid-19 consiste na maior crise sanitária global dos últimos cem anos (Santos, 2020SANTOS, Boaventura Sousa. A cruel pedagogia do vírus. São Paulo: Boitempo Editorial, 2020.). O contexto sanitário atual expôs e acirrou os cenários de exclusão e desigualdade estrutural presentes nas sociedades capitalistas e vivenciados, de maneira desproporcional, por diversos grupos sociais (Martin et al., 2022MARTIN, Denise; VIODRES, Silvia; SILVEIRA, Cássio. Atenção em saúde para migrantes internacionais em São Paulo, Brasil: acesso e universalidade no contexto da pandemia de covid-19. Revista del Cesla: International Latin American Studies Review, v. 29, p. 49-68, 2022.; Santos, 2020SANTOS, Boaventura Sousa. A cruel pedagogia do vírus. São Paulo: Boitempo Editorial, 2020.). Dentre estes grupos, parte significativa são migrantes internacionais, que já experienciam a realidade de vulnerabilidade prévia à pandemia e tiveram esta condição drasticamente exacerbada com a eclosão da mesma (Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.).

Os deslocamentos humanos atravessam a história e ocorrem a partir de motivações diversas, bem como por diferentes grupos sociais e modalidades migratórias (Baeninger et al., 2021BAENINGER, Rosana; DEMÉTRIO, Natália Belmonte Demétrio; MAGALHÃES, Duval Fernandes; DOMENICONI, Jóice. Cenário das migrações internacionais no Brasil: antes e depois do início da pandemia de Covid 19. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano, v. 4, p. 1-35, 2021.). A pandemia eclodiu em um cenário concomitante à influência da atual divisão internacional do trabalho, que emergiu como um importante determinante nas recentes rotas das migrações transnacionais. Também ocorreu em um cenário de aumento das migrações forçadas que, segundo Baeninger (2014 BAENINGER, Rosana. Migrações Internacionais no século 21: desafios para uma agenda de pesquisa. In: VI Congreso de la asociación latinoamericana de poblacíon. Lima (Peru), 2014.), é decorrente de conflitos internos, desastres ambientais, guerras, instabilidade econômica e política, perseguições, dentre outros fatores internos e externos gerados pelas sociedades capitalistas e neoliberais. Neste cenário de mobilidade, o Brasil tem se configurado como um local de destino da migração internacional, em especial nas migrações Sul-Sul em decorrência, principalmente, das barreiras de entrada de imigrantes do Sul no Norte Global (Magalhães et al., 2018MAGALHÃES, Luís Felipe; BOGUS, Lucia Machado; BAENINGER, Rosana. Migrantes e refugiados Sul-Sul na cidade de São Paulo: trabalho e espacialidades. In: BAENINGER, Rosana; BÓGUS, Lúcia Machado; MOREIRA, Júlia Bertino; VEDOVATO, Luís Renato; FERNANDES, Duval Magalhães; SOUZA; Marta Rovery; BALTAR, Cláudia; PERES, Roberta; WALDMAN, Tatiana; MAGALHÃES, Luís (orgs.). Migrações Sul-Sul. Campinas: Nepo/Unicamp, 2018, p. 402-419.).

A aprovação da Lei de Migração de 2017 no país, ainda que com os vetos presidenciais, se configurou como um importante avanço na defesa dos direitos humanos e da dignidade dos migrantes ao alocá-los enquanto sujeitos de direitos, garantindo o acesso ao sistema de proteção social brasileiro, conjunto de transferências sociais contributivas e não contributivas independentemente da situação documental (Espinoza et al., 2021 ESPINOZA, Marcia Vera; ROSAS, Victoria Prieto; ZAPATA, Gisela P.; GANDINI, Luciana; REGUERA, Alethia Fernández; HERRERA, Gioconda; VILLAMIL, Stephanie López; GOMEZ, Cristina María Zamora; BLOUIN, Cécile; MONTIEL, Camila; GÁLVEZ, Gabriela Cabezas, PALLA, Irene. Towards a typology of social protection for migrants and refugees in Latin America during the COVID-19 pandemic. Comparative Migration Studies, v. 9, n. 1, p. 1-28, 2021., p. 7). Em que pese a importância do arcabouço jurídico, há desafios para garantia de acesso a direitos e serviços, bem como para o estabelecimento de uma real inclusão dos imigrantes (Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.; Espinoza et al., 2021 ESPINOZA, Marcia Vera; ROSAS, Victoria Prieto; ZAPATA, Gisela P.; GANDINI, Luciana; REGUERA, Alethia Fernández; HERRERA, Gioconda; VILLAMIL, Stephanie López; GOMEZ, Cristina María Zamora; BLOUIN, Cécile; MONTIEL, Camila; GÁLVEZ, Gabriela Cabezas, PALLA, Irene. Towards a typology of social protection for migrants and refugees in Latin America during the COVID-19 pandemic. Comparative Migration Studies, v. 9, n. 1, p. 1-28, 2021.). Concomitante a isto, com a irrupção da pandemia, emergiram o recrudescimento de políticas antimigratórias, aumento de discursos públicos xenofóbicos e preconceituosos e lacunas na inclusão de grupos de imigrantes e refugiados nas respostas governamentais para proteção populacional (Gruer et al., 2021GRUER, Laurence; Agyemang, Charles; Bhopal, Raj; Chiarenza, Antonio; Krasnik, Allan; Kumar, Bernadette. Migration, ethnicity, racism and the COVID-19 pandemic: a conference marking the launch of a new Global Society. Public Health in Practice, v. 2, s/n, 100088, 2021.).

Neste sentido, a literatura nacional e internacional no campo da migração tem se voltado para abarcar as repercussões da pandemia na vida de imigrantes e nos processos de mobilidade entre fronteiras. Dentre os principais achados, tem-se evidenciado os seguintes tópicos: vulnerabilidade socioeconômica; perda ou exploração dos postos de trabalho (Granada et al., 2021GRANADA, Daniel; GRISOTTI, Marcia; DETONI, Priscila; CAZAROTTO, Rosmari; OLIVEIRA, Maria Conceição. Saúde e migrações: a pandemia de Covid-19 e os trabalhadores imigrantes nos frigoríficos do Sul do Brasil. Horizontes Antropológicos, v. 27, n. 59, p. 207-226, 2021.; Gonçalves Junior et al., 2020GONÇALVES JUNIOR, Jucier; SALES, Jair Paulino; MOREIRA, Marcial Moreno; PINHEIRO, Woneska Rodrigues; LIMA, Carlos Kennedy Tavares; ROLIM NETO, Modesto Leite. A crisis within the crisis: The mental health situation of refugees in the world during the 2019 coronavirus (2019-nCoV) outbreak. Psychiatry research, v. 288, 113000, 2020.); aumento de atos de xenofobia e violência (Gruer et al., 2021GRUER, Laurence; Agyemang, Charles; Bhopal, Raj; Chiarenza, Antonio; Krasnik, Allan; Kumar, Bernadette. Migration, ethnicity, racism and the COVID-19 pandemic: a conference marking the launch of a new Global Society. Public Health in Practice, v. 2, s/n, 100088, 2021.); impactos relacionados ao fechamento das fronteiras e dos serviços de imigração (Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.); dificuldade no acesso aos serviços e direitos sociais; violações nos direitos humanos e sofrimento psíquico (Gonçalves Junior et al., 2020GONÇALVES JUNIOR, Jucier; SALES, Jair Paulino; MOREIRA, Marcial Moreno; PINHEIRO, Woneska Rodrigues; LIMA, Carlos Kennedy Tavares; ROLIM NETO, Modesto Leite. A crisis within the crisis: The mental health situation of refugees in the world during the 2019 coronavirus (2019-nCoV) outbreak. Psychiatry research, v. 288, 113000, 2020.; Matsue, 2022MATSUE, Regina Yoshie. O “Modelo Japonês” (San Mitsu) no Combate à Covid 19. E os Imigrantes? REMHU, Revista Interdisciplinar de Mobilidade Humana, v. 30, n. 65, p. 169-184, 2022.).

O presente estudo apresenta um panorama da produção científica sobre as repercussões sociossanitárias da pandemia por Covid-19 para populações de migrantes internacionais no Brasil. A compreensão crítica sobre a realidade de grupos de imigrantes e refugiados nesse contexto permite, sobretudo, colaborar para o subsídio de ações e políticas públicas voltadas a estas populações no Brasil, consonantes à realidade e às complexidades emergentes. Neste aspecto, a pergunta balizadora da pesquisa pode ser assim sumarizada: quais repercussões sociossanitárias da pandemia por Covid-19 para populações de migrantes internacionais residentes no Brasil foram referidas nas produções científicas?

Metodologia

A busca de artigos foi realizada nas bases de dados: Web of Science™, PubMed e Scielo no período de 21 de abril de 2022 a 12 de janeiro de 2023. Para a construção da estratégia de busca, consultou-se o MeSH/DeCS e foram selecionados os termos: Covid-19, Refugees, Brazil e Covid-19, Immigrants e Brazil. Os descritores foram utilizados em português e inglês com os operadores booleanos AND .

A seleção dos estudos foi conduzida pela consulta de títulos/resumos e, posteriormente, pela leitura dos textos completos. As decisões sobre elegibilidade dos estudos foram realizadas utilizando o Software Copyright© Rayyan. Os critérios de inclusão foram: artigos originais que abordassem a temática das repercussões da pandemia por Covid-19 em imigrantes e refugiados adultos residentes no Brasil, publicados entre março de 2020 e outubro de 2022. Foram excluídos estudos não originais como cartas ao editor, prefácios, comunicações breves, correções/erratas, comentários, editoriais, revisões, ensaios, que não abordavam de maneira relevante a situação dos imigrantes e refugiados residentes no Brasil durante a pandemia de Covid-19; e artigos com texto completo indisponíveis gratuitamente.

As estratégias de busca utilizadas resultaram em 59 artigos dispostos da seguinte maneira: 34 na Web of Science™; 19 no PubMed; e 6 na Scielo. Do total de artigos, foram excluídos 16 por duplicação e 21 após análise de título e resumo por não se enquadrarem nos critérios de elegibilidade. Em seguida, foram excluídos 4 artigos por não terem a publicação disponível e 6 artigos após leitura na íntegra. Após lidos, 12 artigos foram considerados elegíveis, conforme apresentado na Figura 1. Os artigos selecionados tiveram as informações inseridas em uma planilha que incluiu autores, ano de publicação, periódico de publicação, metodologia, principais achados e considerações finais.

A leitura e sistematização do material ocorreu a partir de aproximações e verificação das diferenças das temáticas apresentadas. O material foi agrupado em uma lista de categorias e organizado de acordo com sua relevância para os objetivos do estudo. Posteriormente, as categorias foram trabalhadas em sua relação com as subcategorias, buscando responder, de maneira adensada, a questão norteadora da pesquisa. As cinco categorias delimitadas ao final do processo estão dispostas na seção Resultados, apresentada a seguir.

Figura 1 -
Fluxograma de seleção de artigos

Resultados

No que se refere ao ano de publicação, 17% foram publicados em 2022, 50% foram publicados em 2021 e 33% em 2020. Com relação ao idioma, 33% das pesquisas foram publicadas em português, 50% em inglês e 17% em inglês/português. Dos estudos, 66,7% utilizaram metodologias qualitativas, 16,7% quantitativas e 16,7% fizeram uso de métodos mistos.

Quanto aos locais das pesquisas selecionadas, cabe pontuar que algumas ocorreram em mais de uma localidade. Há uma variedade de estados brasileiros, com destaque ao Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina, seguidos de Rio Grande do Sul, Amazonas, Pará e Roraima. Tratam-se de estados com tradição histórica em receber migrantes internacionais. Ademais, três pesquisas realizaram estudo de caso no Brasil. As disposições dos locais estão apresentadas no Gráfico 1. Por fim, quanto às populações estudadas, alguns estudos abordaram migrantes internacionais de um único país ou região como: Haiti, Venezuela ou indígenas venezuelanos Warao. A maioria das pesquisas trabalhou com migrantes de múltiplos países e regiões ou não especificados.

Gráfico 1 -
Locais dos estudos

A análise das temáticas dos artigos resultou em cinco categorias: a) Vulnerabilidade e desigualdade estrutural; b) Discriminação e preconceito; c) Acesso aos serviços sociais e de saúde e respostas governamentais; d) Fechamento das fronteiras; e) Sofrimento psíquico. Cabe pontuar que diversos estudos versaram sobre mais de uma temática, sendo incluídos em mais de uma categoria. As categorias emergentes serão apresentadas a seguir:

a) Vulnerabilidade e desigualdade estrutural

Os estudos desta categoria versam acerca de questões que acirraram ou trouxeram novos componentes relacionados à desigualdade estrutural vivenciada por imigrantes, refugiados e solicitantes de refúgio no contexto da pandemia por Covid-19 (Antonucci, 2021ANTONUCCI, Nathalia. Mover-se ou não mover-se? As múltiplas pandemias a partir de trânsitos e narrativas de uma solicitante de refúgio lésbica ao Sul Global. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 145-160, 2021.; Granada et al., 2021GRANADA, Daniel; GRISOTTI, Marcia; DETONI, Priscila; CAZAROTTO, Rosmari; OLIVEIRA, Maria Conceição. Saúde e migrações: a pandemia de Covid-19 e os trabalhadores imigrantes nos frigoríficos do Sul do Brasil. Horizontes Antropológicos, v. 27, n. 59, p. 207-226, 2021.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.; Martuscelli, 2022______. Solidarity in the Time of COVID-19: Refugee Experiences in Brazil. Refugee: Canada's Journal on Refugees/Refuge: revue canadienne sur les réfugiés, v. 38, n. 1, p. 27-42, 2022.; Tonhati, Macêdo, 2021TONHATI, Tania Mara Passarelli; MACÊDO, Marília. Os impactos da pandemia de Covid-19 para as mulheres imigrantes no Brasil: mobilidade e mercado de trabalho. Sociedade e Estado, v. 36, n. 3, p. 891-914, 2021.; Santos, Costa, 2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.; Silva et al., 2021SILVA, Hilton Pereira da; ABREU, Isabella Nogueira; LIMA, Carlos Neandro Cordeiro; DE LIMA, Aline Cecy Rocha; DO NASCIMENTO BARBOSA, Alexandre; DE OLIVEIRA, Lehi Rodrigues; FUJISHIMA, Mayumi Aragão; LIMA, Sandra Souza; DE LIMA, Vitor Nina; CASTELO-BRANCO, Socorro; VALLINOTO, Antonio Carlos Rosário. Migration in times of pandemic: SARS-CoV-2 infection among the Warao indigenous refugees in Belém, Pará, Amazonia, Brazil. BMC Public Health, v. 21, n. 1, p. 1-9, 2021.; Souza et al., 2020SOUZA, Jeane Barros; HEIDEMANN, Ivonete Terezinha Schulter Buss; GEREMIA, Daniela Savi; MADUREIRA, Valéria Silvana Fagnello; BITENCOURT, Júlia Valéria Oliveira; TOMBINI, Larissa Hermes Thomas. Pandemia e imigração: famílias haitianas no enfrentamento da COVID-19 no Brasil. Escola Anna Nery, v. 24, 20200242, p. 1-9, 2020.; Zapata, Rosas, 2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.). Dentre os principais elementos evidenciados estão dificuldades relacionadas à moradia (Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.; Zapata, Rosas, 2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.; Santos, Costa, 2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.), ao trabalho (Antonucci, 2021ANTONUCCI, Nathalia. Mover-se ou não mover-se? As múltiplas pandemias a partir de trânsitos e narrativas de uma solicitante de refúgio lésbica ao Sul Global. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 145-160, 2021.; Granada et al., 2021GRANADA, Daniel; GRISOTTI, Marcia; DETONI, Priscila; CAZAROTTO, Rosmari; OLIVEIRA, Maria Conceição. Saúde e migrações: a pandemia de Covid-19 e os trabalhadores imigrantes nos frigoríficos do Sul do Brasil. Horizontes Antropológicos, v. 27, n. 59, p. 207-226, 2021.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.; Martuscelli, 2022______. Solidarity in the Time of COVID-19: Refugee Experiences in Brazil. Refugee: Canada's Journal on Refugees/Refuge: revue canadienne sur les réfugiés, v. 38, n. 1, p. 27-42, 2022.; Santos, Costa, 2022SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.; Souza et al., 2020SOUZA, Jeane Barros; HEIDEMANN, Ivonete Terezinha Schulter Buss; GEREMIA, Daniela Savi; MADUREIRA, Valéria Silvana Fagnello; BITENCOURT, Júlia Valéria Oliveira; TOMBINI, Larissa Hermes Thomas. Pandemia e imigração: famílias haitianas no enfrentamento da COVID-19 no Brasil. Escola Anna Nery, v. 24, 20200242, p. 1-9, 2020.; Tonhati, Macêdo, 2021TONHATI, Tania Mara Passarelli; MACÊDO, Marília. Os impactos da pandemia de Covid-19 para as mulheres imigrantes no Brasil: mobilidade e mercado de trabalho. Sociedade e Estado, v. 36, n. 3, p. 891-914, 2021.; Zapata, Rosas, 2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.), garantia de alimentação e subsistência (Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.; Martuscelli, 2022______. Solidarity in the Time of COVID-19: Refugee Experiences in Brazil. Refugee: Canada's Journal on Refugees/Refuge: revue canadienne sur les réfugiés, v. 38, n. 1, p. 27-42, 2022.; Santos, Costa, 2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.; Souza et al., 2020SOUZA, Jeane Barros; HEIDEMANN, Ivonete Terezinha Schulter Buss; GEREMIA, Daniela Savi; MADUREIRA, Valéria Silvana Fagnello; BITENCOURT, Júlia Valéria Oliveira; TOMBINI, Larissa Hermes Thomas. Pandemia e imigração: famílias haitianas no enfrentamento da COVID-19 no Brasil. Escola Anna Nery, v. 24, 20200242, p. 1-9, 2020.; Zapata, Rosas, 2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.), o aumento da violência e o aumento da sobrecarga de mulheres migrantes no trabalho doméstico, influenciado pelo fechamento de escolas.

No que tange às questões relacionadas à moradia, a vivência em albergues ou casas compartilhadas com múltiplas famílias dificultou a realização das medidas sanitárias e de isolamento necessárias para mitigação do vírus (Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.; Santos, Costa, 2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.; Zapata, Rosas, 2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.). A dificuldade em pagar o aluguel (Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.) e os despejos sem aviso prévio (Santos, Costa, 2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.) corroboraram para que parte destes migrantes internacionais passassem a viver em situação de abrigamento ou de rua.

Do ponto de vista laboral, a pandemia provocou perdas significativas dos postos de trabalho (Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.; Martuscelli, 2022______. Solidarity in the Time of COVID-19: Refugee Experiences in Brazil. Refugee: Canada's Journal on Refugees/Refuge: revue canadienne sur les réfugiés, v. 38, n. 1, p. 27-42, 2022.; Souza et al., 2020SOUZA, Jeane Barros; HEIDEMANN, Ivonete Terezinha Schulter Buss; GEREMIA, Daniela Savi; MADUREIRA, Valéria Silvana Fagnello; BITENCOURT, Júlia Valéria Oliveira; TOMBINI, Larissa Hermes Thomas. Pandemia e imigração: famílias haitianas no enfrentamento da COVID-19 no Brasil. Escola Anna Nery, v. 24, 20200242, p. 1-9, 2020.; Tonhati, Macêdo, 2021TONHATI, Tania Mara Passarelli; MACÊDO, Marília. Os impactos da pandemia de Covid-19 para as mulheres imigrantes no Brasil: mobilidade e mercado de trabalho. Sociedade e Estado, v. 36, n. 3, p. 891-914, 2021.; Zapata, Rosas, 2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.; Santos, Costa, 2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.). Da mesma forma, com a redução da circulação de pessoas, as possibilidades de venda de produtos por ambulantes ou mesmo de coletas de moedas, prática comum aos indígenas Warao oriundos da Venezuela, diminuíram (Santos, Costa, 2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.). Granada et al. (2021GRANADA, Daniel; GRISOTTI, Marcia; DETONI, Priscila; CAZAROTTO, Rosmari; OLIVEIRA, Maria Conceição. Saúde e migrações: a pandemia de Covid-19 e os trabalhadores imigrantes nos frigoríficos do Sul do Brasil. Horizontes Antropológicos, v. 27, n. 59, p. 207-226, 2021.) e Tonhati e Macêdo (2021)TONHATI, Tania Mara Passarelli; MACÊDO, Marília. Os impactos da pandemia de Covid-19 para as mulheres imigrantes no Brasil: mobilidade e mercado de trabalho. Sociedade e Estado, v. 36, n. 3, p. 891-914, 2021. demonstram que, durante a pandemia, os frigoríficos e matadouros consistiram em importantes locais para a absorção da mão de obra de imigrantes. Entretanto, as condições de trabalho destes locais apresentaram insalubridade e precariedade sanitária, expressiva exploração laboral e ausência de protocolos de biossegurança. Trata-se de locais deletérios que favoreceram a infecção e disseminação do vírus, intensificando as condições de vulnerabilidade socioeconômica dos trabalhadores migrantes.

Com relação às condições de vida, autores como Martuscelli (2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.), Santos e Costa (2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.), Souza et al. (2020SOUZA, Jeane Barros; HEIDEMANN, Ivonete Terezinha Schulter Buss; GEREMIA, Daniela Savi; MADUREIRA, Valéria Silvana Fagnello; BITENCOURT, Júlia Valéria Oliveira; TOMBINI, Larissa Hermes Thomas. Pandemia e imigração: famílias haitianas no enfrentamento da COVID-19 no Brasil. Escola Anna Nery, v. 24, 20200242, p. 1-9, 2020.) e Zapata e Rosas (2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.) versam acerca da dificuldade de parte dos imigrantes em garantir a própria subsistência e a de familiares, bem como a compra de produtos de higiene necessários na prevenção da Covid-19. Santos e Costa (2020)SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020. demonstram que, durante a quarentena, a instituição que ofertava refeições pelo valor de um real em Manaus fechou, afetando a segurança alimentar de imigrantes que faziam uso do local (Santos, Costa, 2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.). Ademais, o fechamento das escolas influenciou a sobrecarga de trabalho doméstico para as mulheres, além de aumentar a demanda alimentar da família em um contexto, muitas vezes, já escasso (Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.).

Ante o exposto, considera-se que a condição de vida de grande parte dos grupos de migrantes internacionais no contexto da pandemia exacerbou as vulnerabilidades estruturais e aumentou o risco de contágio pelo vírus. Segundo Silva et al. (2021)SILVA, Hilton Pereira da; ABREU, Isabella Nogueira; LIMA, Carlos Neandro Cordeiro; DE LIMA, Aline Cecy Rocha; DO NASCIMENTO BARBOSA, Alexandre; DE OLIVEIRA, Lehi Rodrigues; FUJISHIMA, Mayumi Aragão; LIMA, Sandra Souza; DE LIMA, Vitor Nina; CASTELO-BRANCO, Socorro; VALLINOTO, Antonio Carlos Rosário. Migration in times of pandemic: SARS-CoV-2 infection among the Warao indigenous refugees in Belém, Pará, Amazonia, Brazil. BMC Public Health, v. 21, n. 1, p. 1-9, 2021., a prevalência sorológica de anticorpos IgG anti -SARS-CoV-2 na população de refugiados indígenas Warao do território venezuelano, e residentes em abrigos privados e públicos na cidade de Belém, foi de 83,2%. Embora a literatura seja escassa quanto aos dados epidemiológicos com populações migrantes, o estudo indica uma alta exposição ao vírus.

b) Discriminação e preconceito

Estudos que expressaram esta categoria de análise explicitaram que discriminação, preconceito e xenofobia são parte da condição de vida de múltiplos grupos de migrantes internacionais (Antonucci, 2021ANTONUCCI, Nathalia. Mover-se ou não mover-se? As múltiplas pandemias a partir de trânsitos e narrativas de uma solicitante de refúgio lésbica ao Sul Global. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 145-160, 2021.; Camargo et al., 2022CAMARGO, Julia; COGO, Denise; ALENCAR, Amanda. Venezuelan Refugees in Brazil: Communication Rights and Digital Inequalities During the Covid-19 Pandemic. Media and Communication, v. 10, n. 2, p. 230-340, 2022.; Granada et al., 2021GRANADA, Daniel; GRISOTTI, Marcia; DETONI, Priscila; CAZAROTTO, Rosmari; OLIVEIRA, Maria Conceição. Saúde e migrações: a pandemia de Covid-19 e os trabalhadores imigrantes nos frigoríficos do Sul do Brasil. Horizontes Antropológicos, v. 27, n. 59, p. 207-226, 2021.; Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.; Santos, Costa, 2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.; Zapata, Rosas, 2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.). Ao longo da pandemia, os discursos anti-imigrante foi exacerbado e, por vezes, estes grupos assumiram o lugar de “bode expiatório” de vetores de transmissão do vírus (Camargo et al., 2022CAMARGO, Julia; COGO, Denise; ALENCAR, Amanda. Venezuelan Refugees in Brazil: Communication Rights and Digital Inequalities During the Covid-19 Pandemic. Media and Communication, v. 10, n. 2, p. 230-340, 2022.; Santos, Costa, 2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.; Zapata, Rosas, 2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.).

A associação histórica que relaciona “estrangeiro” à “doença” intensificou os desafios vivenciados na pandemia, em especial ao se associar imigrantes e refugiados a vetores de transmissão do vírus (Camargo et al., 2022CAMARGO, Julia; COGO, Denise; ALENCAR, Amanda. Venezuelan Refugees in Brazil: Communication Rights and Digital Inequalities During the Covid-19 Pandemic. Media and Communication, v. 10, n. 2, p. 230-340, 2022.; Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.). Além disso, Camargo et al. (2022)CAMARGO, Julia; COGO, Denise; ALENCAR, Amanda. Venezuelan Refugees in Brazil: Communication Rights and Digital Inequalities During the Covid-19 Pandemic. Media and Communication, v. 10, n. 2, p. 230-340, 2022. identificaram que grupos de refugiados foram alvo de discursos de ódio em meios digitais, com posicionamentos que se opunham ao direito destes grupos de receber auxílio emergencial e os acusavam de congestionar o sistema de saúde. Consequentemente, essa realidade de discriminação e preconceito interferiu na busca pelos serviços de saúde.

Martuscelli (2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.) e Martuscelli (2021)______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021. referiram que parte dos refugiados sentiu receio de acessar os serviços de saúde, isto por terem vivido ou terem medo de viver experiências discriminatórias e xenofóbicas. Neste aspecto, consideram que o cuidado em saúde é prestado de maneira diferente entre brasileiros e não brasileiros. Esta percepção exacerbou o medo de adoecimento na pandemia, visto que há insegurança frente ao cuidado ofertado.

Por fim, questões relacionadas à etnia, ao gênero e à orientação sexual corroboram para promover experiências de dupla estigmatização, especialmente aos sujeitos que são negros (Granada et al., 2020GRANADA, Daniel; GRISOTTI, Marcia; DETONI, Priscila; CAZAROTTO, Rosmari; OLIVEIRA, Maria Conceição. Saúde e migrações: a pandemia de Covid-19 e os trabalhadores imigrantes nos frigoríficos do Sul do Brasil. Horizontes Antropológicos, v. 27, n. 59, p. 207-226, 2021.), asiáticos (Zapata, Rosas, 2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.) e lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, queer, intersexuais, assexuais e demais orientações, reconhecidas pela sigla LGBTQIA+ (Antonucci, 2021ANTONUCCI, Nathalia. Mover-se ou não mover-se? As múltiplas pandemias a partir de trânsitos e narrativas de uma solicitante de refúgio lésbica ao Sul Global. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 145-160, 2021.; Santos, Costa, 2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.). Antonucci (2021)ANTONUCCI, Nathalia. Mover-se ou não mover-se? As múltiplas pandemias a partir de trânsitos e narrativas de uma solicitante de refúgio lésbica ao Sul Global. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 145-160, 2021. e Santos e Costa (2020)SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020. apontam que, além da discriminação relacionada ao status migratório, esses sujeitos têm que lidar com a violência de gênero e LGBTQIA+ fobia. Antonucci demonstra a dificuldade de uma imigrante lésbica em se manter em abrigos ou em casa de familiar durante o período de isolamento social da pandemia, em decorrência de preconceitos sofridos pela sexualidade e expressão de gênero. Santos e Costa (2020)SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020. também constataram dificuldades enfrentadas por mulheres imigrantes transexuais no acesso a albergues e ao auxílio emergencial em razão do não reconhecimento enquanto mulheres chefes de família, o que contribuiu para acirrar a vulnerabilidade desses núcleos familiares. Desta forma, Antonucci (2021)ANTONUCCI, Nathalia. Mover-se ou não mover-se? As múltiplas pandemias a partir de trânsitos e narrativas de uma solicitante de refúgio lésbica ao Sul Global. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 145-160, 2021. alerta para a imprescindibilidade de inserir, no cenário pandêmico, o debate interseccional no campo de mobilidades, gênero e sexualidade.

c) Acesso aos serviços sociais, serviços de saúde e medidas de proteção social

Os estudos dessa categoria se voltam para a compreensão da estrutura e proteção social do Brasil e para as repercussões das ações voltadas aos migrantes internacionais pelo poder público ao longo da pandemia de Covid-19 (Camargo et al., 2022CAMARGO, Julia; COGO, Denise; ALENCAR, Amanda. Venezuelan Refugees in Brazil: Communication Rights and Digital Inequalities During the Covid-19 Pandemic. Media and Communication, v. 10, n. 2, p. 230-340, 2022.; Espinoza et al., 2021 ESPINOZA, Marcia Vera; ROSAS, Victoria Prieto; ZAPATA, Gisela P.; GANDINI, Luciana; REGUERA, Alethia Fernández; HERRERA, Gioconda; VILLAMIL, Stephanie López; GOMEZ, Cristina María Zamora; BLOUIN, Cécile; MONTIEL, Camila; GÁLVEZ, Gabriela Cabezas, PALLA, Irene. Towards a typology of social protection for migrants and refugees in Latin America during the COVID-19 pandemic. Comparative Migration Studies, v. 9, n. 1, p. 1-28, 2021.; Granada et al., 2021GRANADA, Daniel; GRISOTTI, Marcia; DETONI, Priscila; CAZAROTTO, Rosmari; OLIVEIRA, Maria Conceição. Saúde e migrações: a pandemia de Covid-19 e os trabalhadores imigrantes nos frigoríficos do Sul do Brasil. Horizontes Antropológicos, v. 27, n. 59, p. 207-226, 2021.; Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.; Martucelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.; Santos, Costa, 2021SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.; Zapata, Rosas, 2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.).

Segundo Espinoza et al. (2021) ESPINOZA, Marcia Vera; ROSAS, Victoria Prieto; ZAPATA, Gisela P.; GANDINI, Luciana; REGUERA, Alethia Fernández; HERRERA, Gioconda; VILLAMIL, Stephanie López; GOMEZ, Cristina María Zamora; BLOUIN, Cécile; MONTIEL, Camila; GÁLVEZ, Gabriela Cabezas, PALLA, Irene. Towards a typology of social protection for migrants and refugees in Latin America during the COVID-19 pandemic. Comparative Migration Studies, v. 9, n. 1, p. 1-28, 2021. e Zapata e Rosas (2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.), o Brasil é um país com um robusto sistema de proteção social, dotado de marcos legais de proteção aos direitos sociais de imigrantes e refugiados independentemente do status jurídico. O sistema universal de saúde, a tríade de seguridade baseada em saúde, previdência e assistência social, bem como a não obrigatoriedade de uma identificação condicionada ao status legal para acessar programas de proteção social, são fatores que possibilitaram acesso aos sistemas de saúde e social no contexto da pandemia (Espinoza et al., 2021 ESPINOZA, Marcia Vera; ROSAS, Victoria Prieto; ZAPATA, Gisela P.; GANDINI, Luciana; REGUERA, Alethia Fernández; HERRERA, Gioconda; VILLAMIL, Stephanie López; GOMEZ, Cristina María Zamora; BLOUIN, Cécile; MONTIEL, Camila; GÁLVEZ, Gabriela Cabezas, PALLA, Irene. Towards a typology of social protection for migrants and refugees in Latin America during the COVID-19 pandemic. Comparative Migration Studies, v. 9, n. 1, p. 1-28, 2021.; Zapata, Rosas, 2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.). Espinoza et al. (2021) ESPINOZA, Marcia Vera; ROSAS, Victoria Prieto; ZAPATA, Gisela P.; GANDINI, Luciana; REGUERA, Alethia Fernández; HERRERA, Gioconda; VILLAMIL, Stephanie López; GOMEZ, Cristina María Zamora; BLOUIN, Cécile; MONTIEL, Camila; GÁLVEZ, Gabriela Cabezas, PALLA, Irene. Towards a typology of social protection for migrants and refugees in Latin America during the COVID-19 pandemic. Comparative Migration Studies, v. 9, n. 1, p. 1-28, 2021. destacam ainda o papel complementar das Organizações não Governamentais (ONG), sociedade civil e organizações internacionais na atenção às necessidades básicas e emergenciais de imigrantes e refugiados em situação de vulnerabilidade.

Em que pese a importância do sistema universal de saúde e proteção social, sua existência, por si só, não garante que estes grupos tenham acesso efetivo aos direitos sociais e de saúde durante a pandemia (Espinoza et al., 2021 ESPINOZA, Marcia Vera; ROSAS, Victoria Prieto; ZAPATA, Gisela P.; GANDINI, Luciana; REGUERA, Alethia Fernández; HERRERA, Gioconda; VILLAMIL, Stephanie López; GOMEZ, Cristina María Zamora; BLOUIN, Cécile; MONTIEL, Camila; GÁLVEZ, Gabriela Cabezas, PALLA, Irene. Towards a typology of social protection for migrants and refugees in Latin America during the COVID-19 pandemic. Comparative Migration Studies, v. 9, n. 1, p. 1-28, 2021.; Zapata, Rosas, 2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.). Ante o exposto, apesar do arcabouço jurídico e normativo, estudos demonstraram a existência de significativas dificuldades para o acesso real a estes serviços (Camargo et al., 2022CAMARGO, Julia; COGO, Denise; ALENCAR, Amanda. Venezuelan Refugees in Brazil: Communication Rights and Digital Inequalities During the Covid-19 Pandemic. Media and Communication, v. 10, n. 2, p. 230-340, 2022.; Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.; Granada et al., 2020GRANADA, Daniel; GRISOTTI, Marcia; DETONI, Priscila; CAZAROTTO, Rosmari; OLIVEIRA, Maria Conceição. Saúde e migrações: a pandemia de Covid-19 e os trabalhadores imigrantes nos frigoríficos do Sul do Brasil. Horizontes Antropológicos, v. 27, n. 59, p. 207-226, 2021.; Zapata, Rosas, 2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.).

Neste aspecto, Zapata e Rosas (2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.) apontam que, apesar do acesso à saúde ser garantido aos migrantes internacionais, fragilidades associadas ao sistema de saúde fizeram com que, na prática, a cobertura total não fosse uma realidade experienciada. Concomitantemente, o medo de buscar os serviços devido ao status migratório não regularizado e às experiências de xenofobia e preconceito, além do desconhecimento acerca do funcionamento do sistema, constituiu-se como barreiras (Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.). A falta de informações linguisticamente adaptadas também interferiu no acesso aos serviços sociais, de saúde e às informações de proteção sanitária (Camargo et al., 2022CAMARGO, Julia; COGO, Denise; ALENCAR, Amanda. Venezuelan Refugees in Brazil: Communication Rights and Digital Inequalities During the Covid-19 Pandemic. Media and Communication, v. 10, n. 2, p. 230-340, 2022.; Granada et al., 2021GRANADA, Daniel; GRISOTTI, Marcia; DETONI, Priscila; CAZAROTTO, Rosmari; OLIVEIRA, Maria Conceição. Saúde e migrações: a pandemia de Covid-19 e os trabalhadores imigrantes nos frigoríficos do Sul do Brasil. Horizontes Antropológicos, v. 27, n. 59, p. 207-226, 2021.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.).

Martuscelli (2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.) demonstra que a falta de informações claras e corretas favoreceu a crença em fake news e a possibilidade de imigrantes serem envolvidos em fraudes e explorações. O aplicativo WhatsApp se configurou como importante canal de comunicação durante a pandemia, entretanto, também facilitou a disseminação de notícias fraudulentas (Camargo et al., 2022CAMARGO, Julia; COGO, Denise; ALENCAR, Amanda. Venezuelan Refugees in Brazil: Communication Rights and Digital Inequalities During the Covid-19 Pandemic. Media and Communication, v. 10, n. 2, p. 230-340, 2022.). Dentre as fake news emergentes, Camargo et al. (2022)CAMARGO, Julia; COGO, Denise; ALENCAR, Amanda. Venezuelan Refugees in Brazil: Communication Rights and Digital Inequalities During the Covid-19 Pandemic. Media and Communication, v. 10, n. 2, p. 230-340, 2022. destacaram notícias em nome da Organização das Nações Unidas (ONU) e Organização Mundial da Saúde (OMS) ofertando auxílio financeiro em dólar para vale-refeição, remédios e receitas falsas na prevenção da Covid-19. Consequentemente, a disseminação de fake news aumentou o risco de exploração de grupos imigrantes e refugiados (Camargo et al., 2022CAMARGO, Julia; COGO, Denise; ALENCAR, Amanda. Venezuelan Refugees in Brazil: Communication Rights and Digital Inequalities During the Covid-19 Pandemic. Media and Communication, v. 10, n. 2, p. 230-340, 2022.).

O acesso ao auxílio emergencial foi outro desafio vivenciado por migrantes internacionais (Camargo et al., 2022CAMARGO, Julia; COGO, Denise; ALENCAR, Amanda. Venezuelan Refugees in Brazil: Communication Rights and Digital Inequalities During the Covid-19 Pandemic. Media and Communication, v. 10, n. 2, p. 230-340, 2022.; Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.; Santos, Costa, 2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.). Apesar de terem direito legal ao recebimento do benefício, houve dificuldade na compreensão dos critérios de elegibilidade e incertezas quanto à possibilidade de ter direito ao auxílio (Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.). O aplicativo com instruções apenas em português (Camargo et al., 2022CAMARGO, Julia; COGO, Denise; ALENCAR, Amanda. Venezuelan Refugees in Brazil: Communication Rights and Digital Inequalities During the Covid-19 Pandemic. Media and Communication, v. 10, n. 2, p. 230-340, 2022.; Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.) e com exigência de documento de identidade brasileiro foi um dos fatores dificultadores (Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.). Ademais, no início da pandemia, a não aceitação dos documentos de imigrantes e refugiados tanto para o cadastro quanto para a abertura de contas bancárias virtuais no banco estatal demandou intervenções judiciais das Defensorias Públicas, a fim de garantir o direito ao recebimento do auxílio (Santos, Costa, 2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.).

Em termos gerais, Santos e Costa (2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.), Martuscelli (2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.) e Martuscelli (2021)______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021. demonstraram que imigrantes e refugiados foram negligenciados pelas respostas governamentais na pandemia. Além disso, a ausência de dados sobre a realidade de imigrantes e refugiados na pandemia por Covid-19 contribuiu para o aumento da invisibilidade e cerceamento de implementação de políticas públicas consoantes às reais necessidades destes grupos (Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.). Assim, é urgente a inserção temática das migrações na agenda política, para abarcar as multiplicidades de formas de existências e promover o acesso aos direitos garantidos pela legislação brasileira (Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.).

d) Fechamento das fronteiras

Nessa categoria, os estudos apontam que a pandemia por Covid-19 promoveu o fechamento de fronteiras sem precedentes e com importantes impactos para migrantes internacionais (Camargo et al., 2022CAMARGO, Julia; COGO, Denise; ALENCAR, Amanda. Venezuelan Refugees in Brazil: Communication Rights and Digital Inequalities During the Covid-19 Pandemic. Media and Communication, v. 10, n. 2, p. 230-340, 2022.; Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.; Tonhati, Macêdo, 2021TONHATI, Tania Mara Passarelli; MACÊDO, Marília. Os impactos da pandemia de Covid-19 para as mulheres imigrantes no Brasil: mobilidade e mercado de trabalho. Sociedade e Estado, v. 36, n. 3, p. 891-914, 2021.; Zapata, Rosas, 2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.)

Para Antonucci (2021ANTONUCCI, Nathalia. Mover-se ou não mover-se? As múltiplas pandemias a partir de trânsitos e narrativas de uma solicitante de refúgio lésbica ao Sul Global. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 145-160, 2021.), a imposição de restrições na mobilidade humana durante a pandemia condensou e potencializou os corpos imigrantes a marcadores sociais e históricos de desigualdades. As relações de poder envolvidas nas dinâmicas de mobilidade e/ou imobilidade reforçaram o controle epidemiológico/biomédico de fronteiras de países do Norte frente aos países do Sul-global, constituindo-se como dispositivos de controle neocoloniais e necrobiopolíticos.

O fechamento de fronteiras paralisou também serviços essenciais que conectam e preservam as relações de imigrantes com suas famílias e redes de apoio transnacionais. No Brasil, locais que realizavam ligações, acesso à internet e às transações financeiras para o exterior foram fechados por não serem considerados essenciais pelos governos estaduais. Como consequência, a paralisação desses estabelecimentos dificultou o contato e o envio ou recebimento de remessas financeiras necessárias para a subsistência de milhares de migrantes e seus familiares, exacerbando o cenário de insegurança acerca da proteção e sobrevivência (Camargo et al., 2022CAMARGO, Julia; COGO, Denise; ALENCAR, Amanda. Venezuelan Refugees in Brazil: Communication Rights and Digital Inequalities During the Covid-19 Pandemic. Media and Communication, v. 10, n. 2, p. 230-340, 2022.; Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.). Além disso, como estratégia de adaptação, Camargo et al. (2022)CAMARGO, Julia; COGO, Denise; ALENCAR, Amanda. Venezuelan Refugees in Brazil: Communication Rights and Digital Inequalities During the Covid-19 Pandemic. Media and Communication, v. 10, n. 2, p. 230-340, 2022. demonstram que, por vezes, os envios financeiros passaram a ser feitos por intermédio de outras pessoas que prestavam esse tipo de serviço, o que favoreceu procedimentos inseguros. Da mesma forma, foram estabelecidas outras estratégias de deslocamento, por locais também mais perigosos.

Tonhati e Macêdo (2020)TONHATI, Tania Mara Passarelli; MACÊDO, Marília. Os impactos da pandemia de Covid-19 para as mulheres imigrantes no Brasil: mobilidade e mercado de trabalho. Sociedade e Estado, v. 36, n. 3, p. 891-914, 2021. enfatizam os significativos impactos do fechamento das fronteiras ao fluxo imigratório feminino. Como exemplo, a impossibilidade de deslocamentos expôs maiores riscos às mulheres, principalmente as de nacionalidade venezuelana, que, para conseguirem imigrar ou concretizar a reunião familiar, realizaram travessias menos conhecidas e seguras. Além disso, o bloqueio dos deslocamentos trouxe danos psicológicos significativos, sobretudo, entre aquelas que deixaram seus filhos nos países de origem, tornando o reencontro incerto e imprevisível.

Para além das paralisações físicas de mobilidade, o bloqueio de fronteiras também suspendeu os serviços de regularização de documentos e os procedimentos de reagrupamento familiar, gerando inseguranças e a imprevisibilidade no afastamento familiar (Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.). Tais aspectos também estão presentes nos artigos de Antonucci (2021ANTONUCCI, Nathalia. Mover-se ou não mover-se? As múltiplas pandemias a partir de trânsitos e narrativas de uma solicitante de refúgio lésbica ao Sul Global. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 145-160, 2021.); Martuscelli (2020)MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.; Martuscelli (2021)______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.; Santos e Costa (2021)SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.; Souza et al. (2021)SOUZA, Jeane Barros; HEIDEMANN, Ivonete Terezinha Schulter Buss; GEREMIA, Daniela Savi; MADUREIRA, Valéria Silvana Fagnello; BITENCOURT, Júlia Valéria Oliveira; TOMBINI, Larissa Hermes Thomas. Pandemia e imigração: famílias haitianas no enfrentamento da COVID-19 no Brasil. Escola Anna Nery, v. 24, 20200242, p. 1-9, 2020.; e Tonhati e Macêdo (2020)TONHATI, Tania Mara Passarelli; MACÊDO, Marília. Os impactos da pandemia de Covid-19 para as mulheres imigrantes no Brasil: mobilidade e mercado de trabalho. Sociedade e Estado, v. 36, n. 3, p. 891-914, 2021..

Em resumo, neste eixo de análise, as pesquisas apontam o quanto as populações migrantes sofreram e vivenciaram vulnerabilidades de acesso aos direitos sociais e de emergência tanto nos locais de moradia quanto em seus países de origem. A preocupação relacionada à dificuldade na prestação de auxílio aos familiares que permaneceram nos países de origem e redes de apoio transnacionais também emergiu como significativo ponto de atenção, que demandou a criação de estratégias informais, nem sempre seguras.

e) Sofrimento psíquico

Esta categoria trata das repercussões na saúde mental dos grupos de migrantes internacionais durante a pandemia. Dentre os fatores que geraram sofrimento psíquico estão: preocupação com familiares, medo de contaminação e morte, desânimo e solidão, incerteza e desesperança, bem como a sensação de viver a pandemia duplamente, no país natal e na atual residência (Antonucci, 2021ANTONUCCI, Nathalia. Mover-se ou não mover-se? As múltiplas pandemias a partir de trânsitos e narrativas de uma solicitante de refúgio lésbica ao Sul Global. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 145-160, 2021.; Santos, Costa, 2021SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.; Souza et al., 2021SOUZA, Jeane Barros; HEIDEMANN, Ivonete Terezinha Schulter Buss; GEREMIA, Daniela Savi; MADUREIRA, Valéria Silvana Fagnello; BITENCOURT, Júlia Valéria Oliveira; TOMBINI, Larissa Hermes Thomas. Pandemia e imigração: famílias haitianas no enfrentamento da COVID-19 no Brasil. Escola Anna Nery, v. 24, 20200242, p. 1-9, 2020.; Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.; Martuscelli, 2022______. Solidarity in the Time of COVID-19: Refugee Experiences in Brazil. Refugee: Canada's Journal on Refugees/Refuge: revue canadienne sur les réfugiés, v. 38, n. 1, p. 27-42, 2022.).

No que tange à preocupação com familiares, foram evidenciadas questões como o medo de contaminar membros do grupo familiar e também preocupações com os meios de subsistência e das condições de enfrentamento da pandemia pelos familiares que permanecem nos países de origem. Neste aspecto, a dificuldade na comunicação, a falta de estrutura dos países de origem, cenários de conflitos e guerras e a falta de condições financeiras dos familiares exacerbaram tais preocupações (Antonucci, 2021ANTONUCCI, Nathalia. Mover-se ou não mover-se? As múltiplas pandemias a partir de trânsitos e narrativas de uma solicitante de refúgio lésbica ao Sul Global. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 145-160, 2021.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.).

Antonucci (2021ANTONUCCI, Nathalia. Mover-se ou não mover-se? As múltiplas pandemias a partir de trânsitos e narrativas de uma solicitante de refúgio lésbica ao Sul Global. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 145-160, 2021.), Martuscelli (2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020., 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.) e Souza et al. (2020SOUZA, Jeane Barros; HEIDEMANN, Ivonete Terezinha Schulter Buss; GEREMIA, Daniela Savi; MADUREIRA, Valéria Silvana Fagnello; BITENCOURT, Júlia Valéria Oliveira; TOMBINI, Larissa Hermes Thomas. Pandemia e imigração: famílias haitianas no enfrentamento da COVID-19 no Brasil. Escola Anna Nery, v. 24, 20200242, p. 1-9, 2020.) apontam para o significativo medo de se contaminar e/ou morrer de Covid-19 no Brasil e a insegurança quanto ao atendimento em saúde recebido (Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.). Da mesma forma, a possibilidade de morte em um país distante, sem a possibilidade de ver os familiares, corroborou para o medo existente (Antonucci, 2021ANTONUCCI, Nathalia. Mover-se ou não mover-se? As múltiplas pandemias a partir de trânsitos e narrativas de uma solicitante de refúgio lésbica ao Sul Global. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 145-160, 2021.; Souza et al., 2020SOUZA, Jeane Barros; HEIDEMANN, Ivonete Terezinha Schulter Buss; GEREMIA, Daniela Savi; MADUREIRA, Valéria Silvana Fagnello; BITENCOURT, Júlia Valéria Oliveira; TOMBINI, Larissa Hermes Thomas. Pandemia e imigração: famílias haitianas no enfrentamento da COVID-19 no Brasil. Escola Anna Nery, v. 24, 20200242, p. 1-9, 2020.) e para sentimentos de solidão, desânimo e incertezas (Souza et al., 2020SOUZA, Jeane Barros; HEIDEMANN, Ivonete Terezinha Schulter Buss; GEREMIA, Daniela Savi; MADUREIRA, Valéria Silvana Fagnello; BITENCOURT, Júlia Valéria Oliveira; TOMBINI, Larissa Hermes Thomas. Pandemia e imigração: famílias haitianas no enfrentamento da COVID-19 no Brasil. Escola Anna Nery, v. 24, 20200242, p. 1-9, 2020.).

Antonucci (2021ANTONUCCI, Nathalia. Mover-se ou não mover-se? As múltiplas pandemias a partir de trânsitos e narrativas de uma solicitante de refúgio lésbica ao Sul Global. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 145-160, 2021.) apontou para a especificidade das múltiplas pandemias vivenciadas por pessoas LGBTQIA+, ligadas à discriminação, exclusão e violência. Santos e Costa (2021)SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020. também demonstram que as pessoas trans, concomitantemente às demandas da pandemia, ainda lidam com a xenofobia, violência de gênero e a transfobia. Como exemplo, Santos e Costa (2021)SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020. identificaram que ainda que sejam feitos encaminhamentos para atendimentos em saúde mental, há considerável absenteísmo entre as mulheres imigrantes transsexuais. De acordo com os autores, em face de preocupações urgentes e imediatas relacionadas às necessidades básicas de sobrevivência, o atendimento com psicólogos, por exemplo, muitas vezes não é uma prioridade. Neste aspecto, apontam para certa naturalização das diversas formas de violência e opressão vividas por imigrantes LGBTQIA+ e da desproteção social de migrantes internacionais em geral (Santos, Costa, 2021SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.).

Por fim, Martuscelli (2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.) e Martuscelli (2022)______. Solidarity in the Time of COVID-19: Refugee Experiences in Brazil. Refugee: Canada's Journal on Refugees/Refuge: revue canadienne sur les réfugiés, v. 38, n. 1, p. 27-42, 2022. demonstram que a vivência anterior de crises ou de outras epidemias, a exemplo do Ebola, afetaram a forma como as pessoas vão experienciar o sofrimento no contexto atual. As vivências passadas podem aumentar ou minimizar o sentimento de medo e insegurança relacionado às restrições decorrentes da pandemia por Covid-19 (Martuscelli, 2022)______. Solidarity in the Time of COVID-19: Refugee Experiences in Brazil. Refugee: Canada's Journal on Refugees/Refuge: revue canadienne sur les réfugiés, v. 38, n. 1, p. 27-42, 2022.. Ademais, o sofrimento passado de grupos de refugiados pode ter contribuído para promover sentimentos de empatia perante sofrimento de outros, bem como uma consciência de vítima inclusiva, corroborando para favorecer as ações e experiências solidárias destinadas a brasileiros e outros grupos de refugiados em condição de vulnerabilidade (Martuscelli, 2022______. Solidarity in the Time of COVID-19: Refugee Experiences in Brazil. Refugee: Canada's Journal on Refugees/Refuge: revue canadienne sur les réfugiés, v. 38, n. 1, p. 27-42, 2022.).

Discussão

A partir dos artigos analisados, pode-se compreender que as repercussões da pandemia por Covid-19 nos grupos de migrantes internacionais destacaram, em sua maioria, o baixo alcance das políticas públicas, bem como a vulnerabilidade estrutural a que estes grupos estão submetidos. Neste aspecto, a presente pesquisa permitiu lançar luz para a intersecção entre pandemia por Covid-19, sofrimento e as estruturas de violência e produção de desigualdade presentes na sociedade (Das, 2015DAS, Veena. Affliction: health, disease, poverty. New York: Fordham University Press, 2015.) e que atravessam grupos de migrantes internacionais no Brasil.

Conforme apresentado por Quesada et al. (2011QUESADA, James; HART, Laurie; BOURGOIS, Philippe. Structural vulnerability and health: Latino migrant laborers in the United States. Medical anthropology, v. 30, n. 4, p. 339-362, 2011.), a vulnerabilidade estrutural a que estas populações estão expostas consiste em uma posicionalidade que se constitui como produto de forças que se interrelacionam entre exploração econômica, discriminação cultural, de gênero e racial e os movimentos de violências simbólicas que legitimam práticas e discursos punitivistas de indignidade individual. No contexto brasileiro, durante a pandemia por Covid-19, questões raciais, geracionais, de gênero e outros marcadores de desigualdades perpassaram as trajetórias de imigrantes e refugiados foram explorados em grande parte dos trabalhos aqui analisados (Granada et al., 2021GRANADA, Daniel; GRISOTTI, Marcia; DETONI, Priscila; CAZAROTTO, Rosmari; OLIVEIRA, Maria Conceição. Saúde e migrações: a pandemia de Covid-19 e os trabalhadores imigrantes nos frigoríficos do Sul do Brasil. Horizontes Antropológicos, v. 27, n. 59, p. 207-226, 2021.; Zapata, Rosas, 2020ZAPATA, Gisela; ROSAS, Victoria Prieto. Structural and contingent inequalities: the impact of COVID‐19 on migrant and refugee populations in South America. Bulletin of Latin American Research, v. 39, n. S1, p. 16-22, 2020.; Antonucci, 2021ANTONUCCI, Nathalia. Mover-se ou não mover-se? As múltiplas pandemias a partir de trânsitos e narrativas de uma solicitante de refúgio lésbica ao Sul Global. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 145-160, 2021.; Santos, Costa, 2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.).

Todos os artigos perpassaram por questões de vulnerabilidade vivenciadas por aqueles que migraram forçadamente para o Brasil, favorecendo circunstâncias de sofrimento, adoecimento e morte no contexto pandêmico. Aliado a isto, a ausência de dados sobre morbimortalidade e a inexistência do quesito nacionalidade nos registros do Ministério da Saúde em relação ao adoecimento por Covid-19 comprometeram a compreensão da realidade e a construção de políticas públicas direcionadas às especificidades das condições de vida e saúde de migrantes (Magalhães et al., 2021MAGALHÃES, Luís Felipe; BÓGUS, Lucia Machado; BAENINGER, Rosana. Covid-19 e imigração internacional na Região Metropolitana de São Paulo. REMHU, Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 15-32, 2021.). Ademais, a condução do enfrentamento da pandemia por Covid-19 no país se deu em um contexto de fragilidade na criação de políticas públicas efetivas de mitigação do vírus para toda a população, o que contribuiu para intensificar o caos sanitário no país.

No que se refere às vivências de preconceito e xenofobia, Dantas (2020DANTAS, Sylvia. Pandemia, mentiras e xenofobia: a saúde pública requer interculturalidade. In: BAENINGER, Rosana; VEDOVATO, Luís Renato; NANDY, Sailen (coords.). Migrações Internacionais e a Pandemia da Covid-19. Campinas: Núcleo de Estudos de População “Elza Berquó”, 2020, p. 104-108.) afirma que a associação de migrantes internacionais com a propagação do vírus favoreceu discursos anti-imigrante no país (Dantas, 2020DANTAS, Sylvia. Pandemia, mentiras e xenofobia: a saúde pública requer interculturalidade. In: BAENINGER, Rosana; VEDOVATO, Luís Renato; NANDY, Sailen (coords.). Migrações Internacionais e a Pandemia da Covid-19. Campinas: Núcleo de Estudos de População “Elza Berquó”, 2020, p. 104-108.). O lugar social do imigrante como alguém dotado de risco de promover adoecimento intensificou ações de xenofobia, preconceito e discriminação (Sargent, Larchanché, 2011SARGENT, Carolyn; LARCHANCHÉ, Stéphanie. Transnational migration and global health: the production and management of risk, illness and access to care. Annual Review of Anthropology, v. 40, n. 1, p. 345-361, 2011.). Tais ações colaboram para as políticas de extermínio destes grupos populacionais, seja por incitar pulsões de violência, por afastá-los dos serviços de saúde, ou, ainda, por corroborar para condutas ativas ou omissivas do poder público (Ventura, 2020VENTURA, Deisy Freitas Lima. Pandemia e estigma: nota sobre as expressões “vírus chinês” e “vírus de Wuhan”. In: BAENINGER, Rosana; VEDOVATO, Luís Renato NANDY, Sailen (coords.). Migrações Internacionais e a Pandemia da Covid-19. Campinas: Núcleo de Estudos de População “Elza Berquó”, 2020, p. 95-103.).

Neste aspecto, Faustino e Oliveira (2021FAUSTINO, Deivison Mendes; OLIVEIRA, Leila Maria. Xeno-racismo ou xenofobia racializada? Problematizando a hospitalidade seletiva aos estrangeiros no Brasil. REMHU, Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 63, p. 193-210, 2021.) apontaram que o contexto histórico colonial brasileiro e latino-americano traz especificidades na relação entre xenofobia e racismo quanto ao acolhimento dos migrantes internacionais do país. Assim, considera-se a xenofobia racializada como um complexo de exploração, discriminação e opressão sobre determinados corpos que ultrapassam a dimensão econômica ou de nacionalidades. A especificidade da realidade brasileira demonstra que a racialização promove influência determinante nos processos de exclusão e segregação de diferentes grupos de imigrantes que vivem no Brasil. Pelo crivo racial, estes sujeitos passam a ser reduzidos a determinados estereótipos que limitam as possibilidades de integração, de expressão subjetiva e de potência de vida (Faustino, Oliveira, 2021FAUSTINO, Deivison Mendes; OLIVEIRA, Leila Maria. Xeno-racismo ou xenofobia racializada? Problematizando a hospitalidade seletiva aos estrangeiros no Brasil. REMHU, Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 63, p. 193-210, 2021.).

Ademais, o recente cenário pandêmico é o primeiro vivido a partir de um novo ecossistema midiático, orientado pela hegemonia das redes sociais e da conectividade perpétua, que promove acesso à múltiplas formas de informação (Miskolci, 2021MISKOLCI, Richard. Desinformação e Saúde Pública. In: VENTURA, Deisy de Freitas Lima Ventura; AITH, Fernando Mussa Abujamra; REIS, Rossana Rocha. Direitos na Pandemia. Boletim 14, USP, CEPEDISA, 2021, p. 9-11. Disponível em: https://cepedisa.fsp.usp.br/wp-content/uploads/2023/02/V3-Boletim-14.pdf. Acesso em: 10.01.2021.). Nesta realidade, a propagação de fake news, aliada à ausência de informações claras e adaptadas, favoreceu que parte de pessoas em situação de imigração se distanciasse das recomendações sanitárias para mitigação do vírus (Martin et al., 2022MARTIN, Denise; VIODRES, Silvia; SILVEIRA, Cássio. Atenção em saúde para migrantes internacionais em São Paulo, Brasil: acesso e universalidade no contexto da pandemia de covid-19. Revista del Cesla: International Latin American Studies Review, v. 29, p. 49-68, 2022.).

Apesar do uso alargado da terminologia fake news, especialmente nos últimos anos, Giglietto et al. (2019)GIGLIETTO, Fábio; IANNELLI, Laura; VALERIANI, Augusto; ROSSI, Luca. Fake News is the invention of a liar: how false information circulates within the hybrid news system. Current Sociology, v. 67, n. 4, p. 625-642, 2019. chamam atenção para a complexidade do fenômeno e referem que as notícias podem surgir tanto com o intuito de enganar e gerar desinformação como por erros honestos e negligências. Seja qual for a forma, a rápida propagação das fake news tornou-se, segundo Galhardi et al. (2020GALHARDI, Cláudia Pereira; FREIRE, Neyson Pinheiro; MINAYO, Maria Cecília de Souza; FAGUNDES, Maria Clara Marques. Fato ou Fake? Uma análise da desinformação frente à pandemia da Covid-19 no Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, v. 25, n. 2, p. 4201-4210, 2020.), a segunda mazela pandêmica, visto que viralizam notícias disseminando medo, exclusão, charlatanismos e avanços no risco de contaminação e morte por Covid.

O fechamento de fronteiras também foi determinante no agravamento das condições de vida das populações migrantes. No Brasil, a publicação em 17 de março de 2020 da Portaria Interministerial nº 120 negou a entrada de imigrantes de nacionalidade venezuelana no país (Brage, Branco, 2021BRAGE, Eugênia; PEREIRA, Alexandre Branco. O que a pandemia mostrou sobre imigrantes e refugiados(as) no Brasil. Nexo Jornal. 2021. Disponível em: Disponível em: https://pp.nexojornal.com.br/opiniao/2021/O-que-a-pandemia-mostrou-sobre-imigrantes-e-refugiadosas-no-Brasil . Acesso em: 10.11. 2022.
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). Em seguida, a norma foi ampliada em 29 de julho de 2020, restringindo o ingresso de pessoas oriundas de qualquer país, prevendo também a deportação, a inabilitação de pedido de refúgio, a responsabilização civil, administrativa e penal de imigrantes que entraram no país sem autorização, e, por fim, permitindo a expulsão de imigrantes (Angelo, 2020ANGELO, Tiago. Migrantes não podem ser deportados com base em portaria federal, diz juiz do AC. Conjur. 2020. Disponível em: Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-ago-19/portaria-governo-federal-nao-impedir-entrada-migrantes . Acesso em: 10.12. 2022.
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). Ao considerar o fato de que, em 2018 e 2019, o Brasil foi o sexto país do mundo a receber mais solicitantes de refúgio, é possível considerar que as medidas restritivas fomentaram severos impactos nos deslocamentos forçados no país (Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.).

As dificuldades relacionadas ao fechamento das fronteiras coadunam com a realidade no contexto internacional. O relatório “COVID-19 and the State of Global Mobility in 2020”, produzido pela Organização Internacional para as Migrações (OIM) e o Migration Policy Institute (MPI) (Benton et al., 2021BENTON, Meghan; BATALOVA, Jeanne; DAVIDOFF-GORE, Samuel; SCHMID, Timo. COVID-19 and the State of Global Mobility in 2020. Washington, D.C.-Geneva: Migration Policy Institute and International Organization for Migration. 2021.), identificou a criação de ao menos 111 mil medidas de fechamento de fronteiras ou restrições ao ir e vir de imigrantes desde o início da pandemia (MIGRAMUNDO, 2021MIGRAMUNDO. Pandemia gerou 111 mil fechamentos de fronteiras e restrições às migrações em 2020. Migramundo, 2021. Disponível em: Disponível em: https://migramundo.com/pandemia-gerou-111-mil-fechamentos-de-fronteiras-e-restricoes-as-migracoes-em-2020/ . Acesso em: 01.08.2022.
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). A OIM afirma que, para conter o avanço da disseminação do vírus, tais medidas restritivas à mobilidade humana são legítimas como ações temporárias. No entanto, o relatório não deixa de sinalizar três fatos negativos dessas contenções, que já eram presentes antes da pandemia, mas se tornaram mais explícitos durante a crise humanitária: a) aumento do abismo entre aqueles que se deslocam globalmente com fins de turismo e negócios em oposição à migração dos que buscam melhores condições de vida; b) a ampliação das vulnerabilidades socioeconômicas; c) a ampliação das relações de dependência e exploração (Benton et al., 2021BENTON, Meghan; BATALOVA, Jeanne; DAVIDOFF-GORE, Samuel; SCHMID, Timo. COVID-19 and the State of Global Mobility in 2020. Washington, D.C.-Geneva: Migration Policy Institute and International Organization for Migration. 2021.).

Conforme observado ao longo do artigo e em concordância com os resultados apontados pela OIM, aponta-se que os fechamentos fronteiriços levaram a novas formas de imobilidade involuntária/forçada, como movimentos transfronteiriços limitados para aqueles que já estão dentro do território, e restringiram a capacidade de buscar refúgio para aqueles que ainda estão fora (Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.; Antonucci, 2021ANTONUCCI, Nathalia. Mover-se ou não mover-se? As múltiplas pandemias a partir de trânsitos e narrativas de uma solicitante de refúgio lésbica ao Sul Global. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 145-160, 2021.; Santos, Costa, 2020SANTOS, John Elton Costa; COSTA, Thiago Ribeiro. Genderand COVID-19 in the context of the refugee and migrant population in the city of Manaus-Amazonas. Mundo Amazônico, v. 11, n. 2, p. 62-74, 2020.). Ademais, restrições desse caráter podem, em algumas situações, associar doenças aos corpos imigrantes, fomentando a xenofobia a determinadas nacionalidades (Martin et al., 2022MARTIN, Denise; VIODRES, Silvia; SILVEIRA, Cássio. Atenção em saúde para migrantes internacionais em São Paulo, Brasil: acesso e universalidade no contexto da pandemia de covid-19. Revista del Cesla: International Latin American Studies Review, v. 29, p. 49-68, 2022.). Tal argumento fomenta o posicionamento seletivo sobre o controle de fronteiras.

Outros entraves para a população imigrante no decorrer da pandemia foram as barreiras burocráticas brasileiras para solicitar ou regularizar a documentação do Registro Nacional Migratório. Os atendimentos na Polícia Federal passaram a ser realizados através de agendamentos pela internet, o que tornou o processo mais lento e dificultou o alcance de imigrantes sem acesso à internet. A suspensão impossibilitou a regularização de muitos imigrantes, afetando diretamente no acesso aos auxílios emergenciais. Ocorreu também o entrave na emissão do novo modelo de carteira de trabalho digital, pois, com agendamento online, parte dos grupos imigrantes ficou à mercê de poucas datas livres no site eletrônico, impossibilitando o acesso igualitário ao trabalho, ao serviço bancário e à seguridade social (Albuquerque, Salmuni, 2020ALBUQUERQUE, José Lindomar Coelho; SALMUNI, Maria Florencia. Entrada e saída pela direita: o filtro migratório no governo de Jair Bolsonaro. Boletim Lua Nova, p. 1-4, 2020.). Por fim, a ausência de produção de dados de imigrantes que utilizaram o SUS em decorrência do vírus Covid-19 inviabilizou o conhecimento e impacto que os grupos de imigrantes sofreram na pandemia (Magalhães et al., 2021MAGALHÃES, Luís Felipe; BÓGUS, Lucia Machado; BAENINGER, Rosana. Covid-19 e imigração internacional na Região Metropolitana de São Paulo. REMHU, Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, v. 29, n. 61, p. 15-32, 2021.).

Cabe pontuar que as temáticas evidenciadas na pesquisa coadunam com a realidade de grupos de imigrantes e refugiados no cenário internacional, durante o contexto pandêmico. Dados da literatura internacional apontam que estes sujeitos, em diversos locais, enfrentaram aumento das restrições migratórias, barreiras de acesso à saúde, aumento de racismo e xenofobia, bem como intensificação da pobreza, precariedade e sofrimento (Espinoza et al., 2021 ESPINOZA, Marcia Vera; ROSAS, Victoria Prieto; ZAPATA, Gisela P.; GANDINI, Luciana; REGUERA, Alethia Fernández; HERRERA, Gioconda; VILLAMIL, Stephanie López; GOMEZ, Cristina María Zamora; BLOUIN, Cécile; MONTIEL, Camila; GÁLVEZ, Gabriela Cabezas, PALLA, Irene. Towards a typology of social protection for migrants and refugees in Latin America during the COVID-19 pandemic. Comparative Migration Studies, v. 9, n. 1, p. 1-28, 2021.; Gruer et al., 2021GRUER, Laurence; Agyemang, Charles; Bhopal, Raj; Chiarenza, Antonio; Krasnik, Allan; Kumar, Bernadette. Migration, ethnicity, racism and the COVID-19 pandemic: a conference marking the launch of a new Global Society. Public Health in Practice, v. 2, s/n, 100088, 2021.). Estes resultados demonstram que, neste contexto de intensa crise sanitária, os grupos de migrantes internacionais foram comumente relegados ao lugar da negligência que, diversas vezes, resultava em um cenário de sofrimento, adoecimento e aniquilação.

Conforme Mckee et al. (2021MCKEE, Martin; GUGUSHVILI, Alexi; KOLTAI, Jonathan; STUCKLER, David. Are Populist Leaders Creating the Conditions for the Spread of COVID-19? Comment on “A Scoping Review of Populist Radical Right Parties' Influence on Welfare Policy and its Implications for Population Health in Europe”. International Journal of Health Policy Management, v. 10, n. 8, p. 511-515, 2021.), países em que o enfrentamento da pandemia foi conduzido por líderes populistas e de extrema direita tenderam a acirrar as desigualdades vivenciadas por grupos minoritários, a exemplo dos imigrantes e refugiados. Esta realidade se sustentou no desprezo às instituições e em práticas ultranacionalistas que buscavam culpar pela pandemia aqueles que possuíam a marca do estrangeiro. A realidade política ultraconservadora e de retórica nacionalista promoveu um processo de desmantelo de políticas públicas e direitos sociais, bem como a condução da pandemia pautada no negacionismo e necropolítica (Ortega, Orsini, 2020ORTEGA, Francisco; ORSINI, Michael. Governing COVID-19 without government in Brazil: Ignorance, neoliberal authoritarianism, and the collapse of public health leadership. Global public health, v. 15, n. 9, p. 1257-1277, 2020.). A regulação da vida transformada na regulação da morte em condições extremas produzidas pela sociedade. Isto leva à morte pelo empobrecimento das minorias e pelo não direito à vida e à saúde. São corpos que já estavam expostos ao esgotamento físico e a substâncias tóxicas no trabalho e, agora também, estão expostos ao coronavírus (Mbembe, 2020MBEMBE, Achille. O Direito Universal à Respiração. São Paulo: N-1 Edições, n. 20, 2020.). Este cenário promoveu repercussões negativas na vida de migrantes internacionais que vivenciam a pandemia em território nacional.

Por fim, apesar dos efeitos devastadores da pandemia no país, considera-se que populações em situação de migração forçada foram afetadas de maneira diferente em comparação aos brasileiros (Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.), o que, por vezes, os colocou em um cenário de maior vulnerabilidade. Esta realidade se coaduna com os achados internacionais expressos pela Comissão Interamericana dos Direitos Humanos (2023), que apontam que as populações migrantes têm estado em situação de maior vulnerabilidade quando comparadas aos sujeitos locais.

Neste aspecto, de acordo com Martuscelli (2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.), apesar da eclosão da pandemia acirrar os desafios já enfrentados por estes grupos populacionais e trazer novas dificuldades que afetaram a população como um todo, existiram problemáticas que estavam relacionadas à condição de “estrangeiro”. Como exemplo, aponta-se para o fechamento das fronteiras e de instituições de prestação de serviços à população imigrante; a intensificação de discursos de xenofobia (Martuscelli, 2020MARTUSCELLI, Patrícia Nabuco. How are refugees affected by Brazilian responses to COVID-19? Revista de Administração Pública, v. 54, n. 5, p. 1446-1457, 2020.; Martuscelli, 2021______. How are forcibly displaced people affected by the COVID-19 pandemic outbreak? Evidence from Brazil. American Behavioral Scientist, v. 65, n. 10, p. 1342-1364, 2021.; Granada et al., 2021GRANADA, Daniel; GRISOTTI, Marcia; DETONI, Priscila; CAZAROTTO, Rosmari; OLIVEIRA, Maria Conceição. Saúde e migrações: a pandemia de Covid-19 e os trabalhadores imigrantes nos frigoríficos do Sul do Brasil. Horizontes Antropológicos, v. 27, n. 59, p. 207-226, 2021.); bem como a dificuldade em acessar benefícios assistenciais decorrente da exigência de documento de identidade brasileiro e de instruções somente na língua portuguesa. Ademais, estudos demonstram que migrantes internacionais possuem, ainda, dificuldades tanto linguísticas quanto de compreender o funcionamento do sistema de saúde nacional (Martin et al., 2022MARTIN, Denise; VIODRES, Silvia; SILVEIRA, Cássio. Atenção em saúde para migrantes internacionais em São Paulo, Brasil: acesso e universalidade no contexto da pandemia de covid-19. Revista del Cesla: International Latin American Studies Review, v. 29, p. 49-68, 2022.; Silveira et al., 2013SILVEIRA, Cássio; CARNEIRO JUNIOR, Nivaldo; RIBEIRO, Manoel Carlos Sampaio; BARATA, Rita de Cássia Barradas. Living conditions and access to health services by Bolivian immigrants in the city of São Paulo, Brazil. Cadernos de Saúde Pública, v. 29, n. 10, p. 2017-2027, 2013.).

Por fim, Martin et al. (2022MARTIN, Denise; VIODRES, Silvia; SILVEIRA, Cássio. Atenção em saúde para migrantes internacionais em São Paulo, Brasil: acesso e universalidade no contexto da pandemia de covid-19. Revista del Cesla: International Latin American Studies Review, v. 29, p. 49-68, 2022.) indicam a escassez de dados sobre a situação de saúde dos migrantes e apontam para importantes eventos ocorridos no ano de 2021: (1) a Plenária Nacional Saúde e Migração, organizada pela Frente Nacional pela Saúde de Migrantes (FENAMI), que resultou no documento: "Saúde e Migração em Tempos de Covid-19" (FENAMI, 2021FRENTE NACIONAL PELA SAÚDE DE MIGRANTES. 1ª Plenária Nacional sobre Saúde e Migração: Documento Final Saúde e Migração em Tempos de Covid-19. 2021 Disponível em: Disponível em: https://www.fenami.org/_files/ugd/7848d7_fb03e44f58b6475fbb239a148eedc15f.pdf . Acesso em: 23.06.2012.
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); (2) o Mutirão da Zona Leste (MZL), realizado na cidade de São Paulo, que mobilizou associações, organizações de saúde pública, organizações internacionais, serviços públicos de assistência social, entre outros, para conhecer e solucionar problemas de saúde de migrantes; e (3) o Grupo de Trabalho formado a partir do MZL em associação com a Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo (SMSSP).

Considerações finais

O estado da arte da produção científica sobre as repercussões sociossanitárias da pandemia por Covid-19 entre migrantes internacionais residentes no Brasil demonstrou os significativos prejuízos vivenciados por estes grupos. Por exemplo, a dificuldade de adoção de medidas de proteção sanitárias e de cuidado em saúde, as situações de xenofobia e discriminação e as formas de imobilidade forçadas decorrentes da seletividade do controle de fronteiras. Ainda, as pesquisas analisadas evidenciaram a necessidade de englobar a inter-relação entre pandemia e migrações, bem como os marcadores interseccionais que atravessam e afetam de maneira distinta as experiências dos diversos sujeitos.

Neste aspecto, a pesquisa demonstrou a ineficiência das estratégias de combate unicamente vírus-centrada para um enfrentamento da pandemia que englobe as demandas de grupos de imigrantes e refugiados. Assim, faz-se urgente o reconhecimento e desenvolvimento de estratégias voltadas para o enfrentamento das desigualdades estruturais, bem como da negligência, exclusão e discriminação sofrida por grupos de migrantes internacionais no cenário atual.

Ademais, considera-se que a inclusão de dados acerca da nacionalidade e do grupo étnico nos documentos oficiais relacionados ao Covid-19 é imprescindível para que se possa delinear um panorama condizente com a real situação dos grupos migrantes no país. Convoca-se o desenvolvimento de uma agenda política que substitua prerrogativas prioritariamente pautadas no humanismo por uma real política de garantia de direitos e cidadania. Aponta-se, ainda, para a necessidade de desenvolvimento de pesquisas e de fortalecimento das ações de resistência que contam com o protagonismo dos sujeitos migrantes, bem como de pautas e estratégias interculturais no campo da saúde, que permitam a atenção prestada no SUS condizente com a complexidade inerente ao campo das migrações.

Por fim, em que pesem os significativos desafios a serem superados, a existência de um sistema universal de saúde e proteção social no Brasil favorece a proteção e o acesso aos serviços independentemente da situação imigratória. Desta forma, é inegável a defesa intransigente ao fortalecimento do SUS e das políticas de proteção social, bem como de políticas públicas comprometidas com o reconhecimento dos imigrantes e refugiados como sujeitos de direitos e com a real inserção nas trocas sociais.

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    Este artigo é resultado parcial do projeto intitulado “Acesso à saúde e vulnerabilidades de imigrantes internacionais no contexto de disseminação da Covid-19: uma pesquisa interinstitucional em rede colaborativa”, com apoio FAPESP processo 2021/06792-2 (Edital UN Roadmap) e CNPQ processo 403913/2021-7 (Edital Universal).

Editores de seção

Roberto Marinucci, Barbara Marciano Marques

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Set 2023
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2023

Histórico

  • Recebido
    07 Fev 2023
  • Aceito
    27 Jun 2023
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