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Representação lexical de classes verbais do PB

Lexical representation of verb classes in Brazilian Portuguese

Resumos

Neste artigo, apresentamos uma proposta de representação lexical de algumas classes de verbos do português brasileiro, que consiste em dois níveis relacionados: o nível semântico-lexical, que é a própria estrutura argumental do verbo, e o nível sintático-lexical, que é uma estrutura de ligação entre a semântica lexical e a sintaxe sentencial. No nível semântico-lexical, está representado o sentido do verbo em uma estrutura composta por predicados primitivos, argumentos e uma raiz, similar à proposta de Levin e Hovav (1998, 2005). A estrutura de predicados é a parte compartilhada por verbos de uma mesma classe e a raiz é a parte idiossincrática do sentido de cada verbo individual. O nível sintático-lexical - representado pelas estruturas de Hale e Keyser (1993, 2002) funciona como um princípio de mapeamento entre o nível semântico e a sintaxe sentencial, sendo capaz de prever a organização e opções de realizações argumentais das classes de verbos na sintaxe. Os dois níveis estão relacionados pela raiz, que pertence a um determinado tipo ontológico na estrutura semântica e é mapeado na sintaxe lexical em uma determinada categoria gramatical. A relação entre os dois níveis não é do tipo um-para-um, pois existem mais categorias ontológicas que categorias gramaticais.

Estrutura argumental; Decomposição de predicados; Estruturas sintático-lexicais; Mapeamento semântico-sintaxe


In this paper, we propose a lexical representation of some verb classes in Brazilian Portuguese, consisting of two related levels: the lexical-semantic level, which is the argument structure of the verbs, and the lexical-syntactic level, which links lexical semantics and sentential syntax. On the lexical-semantic level, verb meanings are represented by a structure composed of primitive predicates, arguments, and a root, following Levin and Hovav's proposal (1998, 2005). Predicate structure is what is shared by verbs within a class and the root is the idiosyncratic part of each individual verb meaning. The lexical-syntactic level, represented by Hale and Keyser's structures (1993, 2002), operates as a mapping principle between the semantic level and sentential syntax, predicting the argument realization options of verbs; e.g. it predicts whether a verb participates in the causative-inchoative alternation. The two levels are related by the root, which pertains to a certain ontological type in the semantic structure and is mapped into a grammatical category in the lexical syntax. The relation between the two levels is a "many-to-one" relation, since there are more ontological types than grammatical categories.

Argument structure; Predicate decomposition; Lexical-syntactic structure; Syntax-Semantics linking


ARTIGOS ORIGINAIS

Márcia CançadoI; Luisa GodoyII

IUFMG - Universidade Federal de Minas Gerais. Faculdade de Letras - Belo Horizonte - MG - Brasil. 31270- 901 - mcancado@ufmg.br

IIUFMG - Universidade Federal de Minas Gerais. Faculdade de Letras - Belo Horizonte - MG - Brasil. 31270-901 - luisagodoy@gmail.com

RESUMO

Neste artigo, apresentamos uma proposta de representação lexical de algumas classes de verbos do português brasileiro, que consiste em dois níveis relacionados: o nível semântico-lexical, que é a própria estrutura argumental do verbo, e o nível sintático-lexical, que é uma estrutura de ligação entre a semântica lexical e a sintaxe sentencial. No nível semântico-lexical, está representado o sentido do verbo em uma estrutura composta por predicados primitivos, argumentos e uma raiz, similar à proposta de Levin e Hovav (1998, 2005). A estrutura de predicados é a parte compartilhada por verbos de uma mesma classe e a raiz é a parte idiossincrática do sentido de cada verbo individual. O nível sintático-lexical - representado pelas estruturas de Hale e Keyser (1993, 2002) funciona como um princípio de mapeamento entre o nível semântico e a sintaxe sentencial, sendo capaz de prever a organização e opções de realizações argumentais das classes de verbos na sintaxe. Os dois níveis estão relacionados pela raiz, que pertence a um determinado tipo ontológico na estrutura semântica e é mapeado na sintaxe lexical em uma determinada categoria gramatical. A relação entre os dois níveis não é do tipo um-para-um, pois existem mais categorias ontológicas que categorias gramaticais.

Palavras-chave: Estrutura argumental. Decomposição de predicados. Estruturas sintático-lexicais. Mapeamento semântico-sintaxe.

ABSTRACT

In this paper, we propose a lexical representation of some verb classes in Brazilian Portuguese, consisting of two related levels: the lexical-semantic level, which is the argument structure of the verbs, and the lexical-syntactic level, which links lexical semantics and sentential syntax. On the lexical-semantic level, verb meanings are represented by a structure composed of primitive predicates, arguments, and a root, following Levin and Hovav's proposal (1998, 2005). Predicate structure is what is shared by verbs within a class and the root is the idiosyncratic part of each individual verb meaning. The lexical-syntactic level, represented by Hale and Keyser's structures (1993, 2002), operates as a mapping principle between the semantic level and sentential syntax, predicting the argument realization options of verbs; e.g. it predicts whether a verb participates in the causative-inchoative alternation. The two levels are related by the root, which pertains to a certain ontological type in the semantic structure and is mapped into a grammatical category in the lexical syntax. The relation between the two levels is a "many-to-one" relation, since there are more ontological types than grammatical categories.

Keywords: Argument structure. Predicate decomposition. Lexical-syntactic structure. Syntax-Semantics linking.

Introdução

O objetivo deste trabalho1 1 Este artigo é uma ampliação e revisão das ideias apresentadas em Cançado e Godoy (2010) e Cançado e Godoy (2011). é o de oferecer uma proposta de representação lexical dos itens verbais. Em um nível semântico-lexical, essa representação apresenta uma estrutura de decomposição em predicados semânticos primitivos (nos termos de Levin e Hovav (1995, 1998, 1999, 2005), Hovav e Levin (1988, 2010) dentre outros), sendo esta a estrutura argumental do item verbal; e, em um nível sintático-lexical, estabelece-se uma estrutura de ligação entre a estrutura semântico-lexical e a sintaxe sentencial, usando-se, para tal, as estruturas sintático-lexicais propostas por Hale e Keyser (1993, 2002). Enquanto o nível semântico-lexical organiza e caracteriza semanticamente as classes verbais, o nível sintático-lexical prevê as possíveis configurações sintáticas e as alternâncias argumentais dessas classes. O que relaciona esses dois níveis, tornando possível usar o nível sintático-lexical como um componente de ligação entre a semântica e a sintaxe, é a raiz. Na decomposição de predicados (nível semântico-lexical), a raiz é um elemento que representa o sentido idiossincrático do verbo e que pode ser classificada quanto a uma ontologia das raízes (LEVIN; HOVAV, 1998, 2005).Nas estruturas sintático-lexicais de Hale e Keyser (2002) (nível sintático-lexical), a raiz é um elemento pertencente a alguma categoria gramatical.

Vale dizer que a ideia de dois níveis de representação lexical (um semântico e outro sintático) já foi sugerida nos trabalhos de Hovav e Levin (1988) e Grimshaw (1990). Mais recentemente, Cançado (2010) propõe associar as estruturas de Hale e Keyser (2002) com uma estrutura de decomposição de predicados. Seguindo a proposta inicial de Cançado (2010), vamos expandir e aprofundar essa ideia da vinculação entre os dois tipos de estrutura.

É preciso motivar a postulação desses dois níveis. Consideremos primeiro por que não ficamos apenas com o nível semântico-lexical. A razão é que o mapeamento de uma decomposição de predicados na sintaxe não é algo trivial. Como explicam Levin e Hovav (2005), é preciso tornar explícita a correspondência dos argumentos semânticos da decomposição de predicados nas posições sintáticas. Essa correspondência pode ter a forma de regras de ligação (linking) ou hierarquias de argumentos. A sintaxe lexical de Hale e Keyser (2002) pode funcionar como uma hierarquização dos argumentos semânticos, de forma a fazer a interface da semântica lexical com a sintaxe propriamente dita, a sintaxe sentencial. Ou seja, assumindo as estruturas de Hale e Keyser (2002) em composição com as estruturas de decomposição de predicados, estamos tecendo uma proposta de mapeamento sintático. Além disso, a maneira como se dão as alternâncias argumentais na sintaxe é bem explicada por meio das estruturas de Hale e Keyser (2002), enquanto que, se ficássemos apenas com as decomposições de predicados, teríamos de nos valer de mais regras para explicar essas alternâncias.

Por outro lado, por que não ficamos apenas com o nível sintático-lexical, como é o caso da própria teoria de Hale e Keyser (1993, 2002), isenta de informações semânticas? O principal motivo é o fato de que as estruturas sintático-lexicais não dão conta de representar todos os traços lexicais que são relevantes linguisticamente em relação aos verbos. Por exemplo, a propriedade sintática da passivização depende de certas restrições semânticas que derivam da relação do argumento externo com o predicado, e isso não pode ser previsto em uma estrutura sintático-lexical, que diz respeito somente à relação do predicado com os seus argumentos internos (como mostraremos à frente). Os próprios proponentes da "l-syntax", Hale e Keyser (2002), diante de restrições de teor semântico para a alternância causativa, alocam-nas na parte enciclopédica do sentido dos verbos. Em uma decomposição de predicados, essas restrições poderiam não apenas ser representadas como explicadas, pois é possível que sejam sistemáticas em certas classes de verbos e não idiossincráticas/enciclopédicas. Se assim for, temos um ganho em termos de generalização e explicação sobre o que influi na realização argumental dos verbos de uma língua.

É importante ainda realçar que o mapeamento entre a semântica e a sintaxe se dá de uma forma "muitos-para-um". Se o ponto de convergência das duas estruturas é a raiz, expressa na semântica por categorias ontológicas e na sintaxe por categorias gramaticais, é evidente que teremos várias classes semânticas associadas a uma única estrutura sintático-lexical, pois há mais categorias ontológicas do que categorias gramaticais. Ainda, estamos assumindo que um comportamento sintático semelhante (mesmas possíveis realizações argumentais) é indício de uma mesma classificação semântico-lexical. Porém, assumimos a possibilidade de que as classes verbais não sejam sempre as mesmas em todas as línguas. Ou seja, ainda que um verbo de uma língua denote um mesmo evento no mundo que um verbo de outra língua, é possível que a conceptualização do evento realizada por cada verbo não seja a mesma. Por exemplo, o verbo blush (corar) em inglês é inergativo, enquanto em italiano, arrossire, é inacusativo. Levin (1993) sugere que a diferença está na diferente conceptualização do evento lexicalizada por cada língua: no inglês, é uma atividade, e no italiano, um achievement.

As estruturas sintático-lexicais de Hale e Keyser (2002)

Desde Hale e Keyser (1993), os autores propõem a existência de uma sintaxe no léxico, cujas estruturas (diagramas arbóreos) são as próprias estruturas argumentais dos itens lexicais. Em um trabalho mais recente, Hale e Keyser (2002) reelaboram a sua proposta, sugerindo quatro estruturas sintático-lexicais para representar a estrutura argumental dos verbos, como mostra a adaptação que fizemos da proposta dos autores abaixo:

Em (1), temos a estrutura dos verbos deadjetivais, como clear 'clarear', que projetam uma posição de especificador (Spec) e cuja raiz é de natureza A (adjetivo). A posição de Spec é a do argumento interno; o argumento externo não é representado nesta estrutura, pois não pertence à estrutura argumental dos verbos. O argumento externo faz parte da estrutura sintático-sentencial, a sintaxe propriamente dita.

Em (2), temos a estrutura sintático-lexical de verbos inergativos, os denominais, como laugh 'rir'. A raiz desses verbos (em posição de complemento de V) é de natureza gramatical N (nome) e não projeta um Spec para o verbo; esses verbos não têm argumento interno. A presença de um argumento interno em posição de Spec de V é o que determina a possibilidade de o verbo alternar entre uma forma intransitivo-incoativa e uma transitivo-causativa. Na sintaxe sentencial de verbos cuja estrutura sintático-lexical é (1), o argumento interno pode ou ser alçado para a posição de sujeito, formando uma sentença intransitiva, ou ocupar a posição de objeto, na presença de um argumento externo. Por outro lado, na estrutura sintático-lexical de verbos que não projetam um Spec, como em (2), não há um argumento que possa ser alternado.

Em (3), temos a estrutura proposta para verbos conhecidos como location e locatum (bottle 'engarrafar' e butter 'amanteigar'), verbos psicológicos (anger 'enraivecer') e de resultados (cut 'cortar'). Partindo de Clark e Clark (1979), Hale e Keyser (2002) entendem esses verbos como denominais (como os inergativos), mas seu complemento é a projeção de uma preposição abstrata.2 2 A preposição é, para os autores, uma projeção diádica, sendo a única categoria gramatical essencialmente birrelacional. A raiz é N, que se une (merge) com P e sucessivamente com V, seguindo os princípios da operação conflation. Ainda, como esses verbos não projetam um Spec de V, eles também não participam da alternância causativa.3 3 Vale realçar que a estrutura em (2) é semelhante à estrutura em (3), exceto pela natureza do complemento de V; em (2), existe a formação de um verbo denominal, através do processo de conflation de N com um V vazio; e, em (3), existe a formação de um verbo denominal, através do processo de conflation de P com um V vazio (ou com algum prefixo do tipo -en-).

E em (4), temos uma estrutura de verbos que projetam somente um argumento, o complemento, não incluindo um Spec (como make a fuss 'fazer barulho'). Esses verbos também não participam da alternância causativa.

Este trabalho, então, será uma proposta de classificação semântica de algumas classes de verbos do PB (português brasileiro), de como essas classes se projetam nas estruturas (1) e (3) acima, e, consequentemente, de como elas se projetam dessa estrutura para a sintaxe sentencial. É importante realçar que, na proposta de Hale e Keyser (2002), as estruturas sintático-lexicais são encaradas como as estruturas argumentais dos verbos. Diferentemente, em nossa proposta, essas estruturas sintático-lexicais são uma estrutura de ligação (linking) entre a representação semântico-lexical e a sintaxe sentencial, sendo que a estrutura semântica composta por predicados primitivos é a estrutura argumental dos verbos.

A decomposição de predicados

Muitos semanticistas lexicais, como Jackendoff (1990), Levin e Hovav (1995, 1998, 1999, 2005), Hovav e Levin (1988, 2010), Van Valin e LaPolla (1997), Van Valin (2005) e Wunderlich (2000, 2009) exploram a ideia de que os determinantes semânticos da realização argumental derivam da decomposição do significado dos verbos em elementos básicos de sentido - os predicados ou "metapredicados". Segundo Levin e Hovav (2005, p.69): "A decomposição de predicados é a representação do significado formulada em termos de predicados primitivos escolhidos para representar os componentes do significado que são recorrentes entre os grupos de verbos." Como os verbos individualizam e nomeiam os eventos, as teorias de decomposição de predicados são também teorias de tipos de eventos. Usaremos a abordagem de decomposição de predicados para tratar das classes de verbos estudadas, ou dos tipos de eventos que essas classes nomeiam4 4 Ver Levin e Hovav (2005) para uma argumentação sobre a vantagem da decomposição de predicados em relação à abordagem de uma listagem de papéis temáticos atribuídos por um verbo. .

Seguiremos mais de perto a proposta de Levin e Hovav (2005) e Hovav e Levin (2010) para propormos a nossa classificação dos verbos do PB. Vejamos um exemplo. As autoras propõem que verbos que denotam mudança de estado, como break 'quebrar', têm a seguinte estrutura semântica:

(5) "v: [[ X ACT ] CAUSE [ Y BECOME <STATE> ]]". (LEVIN; HOVAV, 2005, p.72).

A estrutura inteira representa a contraparte causativa dos verbos de mudança de estado e a estrutura encaixada "[Y BECOME <STATE>]" representa a contraparte incoativa desses verbos. Na estrutura em (5), "ACT", "CAUSE" e "BECOME" são predicados primitivos, "X" e "Y" são os argumentos de cada um desses predicados (o "agente" e o "paciente", respectivamente) e o que está entre colchetes angulados é a chamada "constante" (LEVIN; HOVAV, 1998) ou "raiz" (LEVIN; HOVAV, 2005) que representa o sentido idiossincrático de cada verbo. Apesar de veicularem um sentido idiossincrático, as raízes podem ser classificadas quanto a determinados tipos ontológicos. A coincidência terminológica da palavra "raiz" nas propostas de Levin e Hovav (2005) e Hale e Keyser (2002) não é gratuita. As autoras entendem as estruturas de Hale e Keyser (2002) como uma "versão sintática" da decomposição de predicados.

Hovav e Levin (2010) assumem que existem verbos que têm como parte de seu significado a especificação do processo de um estado resultante, os chamados "verbos de resultado"; e existem verbos que têm como parte de seu significado a especificação da maneira como uma ação ocorre, os chamados "verbos de maneira". Essa distinção é gramaticalmente relevante, já que os verbos de resultado e os verbos de maneira diferem na realização de suas estruturas argumentais.

Neste artigo, não trataremos dos verbos de maneira. Vamos focalizar nossa análise nos verbos de resultado, mais especificamente, nos verbos que estabelecem uma relação causal entre dois subeventos, além de acarretar um resultado. Em uma análise mais ampla dos dados do PB, percebemos que a proposta de Hovav e Levin (2010) para os verbos de resultado não é específica o suficiente de forma a capturar de uma maneira mais fina diferenças semânticas linguisticamente relevantes. Por isso, ampliaremos essa divisão, primeiramente, renomeando os verbos de resultado como "verbos de mudança", e, em seguida, dividindo-os em verbos de mudança de estado, verbos de mudança de lugar e verbos de mudança de posse. Os verbos de mudança de estado serão ainda subdivididos em três grupos e os de mudança de posse em dois subtipos.

Classe 1: Verbos de mudança de estado

Segundo Parsons (1990), verbos que denotam uma mudança de estado acarretam necessariamente o sentido become ADJ 'tornar-se ADJ', em que o adjetivo é relacionado ao verbo.5 5 Para adjetivos que denotam propriedades graduais, como por exemplo, o adjetivo contido em clarear¸ o acarretamento não será do tipo: João clareou a sala. > A sala ficou clara. Mas sim, A sala ficou mais clara. Ver sobre o assunto Hovav e Levin (2010). Para o PB, podemos ilustrar essa afirmação com os seguintes exemplos, em que (a) acarreta (b):

(6) a. O João quebrou o vaso.

b. O vaso ficou quebrado.6 6 Note-se que, quando não existe morfologicamente a forma adjetival, o particípio assume a função adjetiva. Para maiores explicações sobre a diferença entre a forma adjetival e a forma participial, ver Parsons (1990).

(7) a. A filha preocupou a mãe.

b. A mãe ficou preocupada.

(8) a. O calor amadureceu a banana.

b. A banana ficou madura.

Faz sentido classificar os verbos acima, mais amplamente, como sendo pertencentes a uma mesma classe. Para Levin e Hovav (2005), verbos desse tipo possuem a estrutura em (5). São verbos que estabelecem uma relação causal entre dois subeventos, denotando uma mudança de estado, e aceitam a alternância causativo/incoativa, na forma transitiva e intransitiva:

(9) a. O João quebrou o vaso.

b. O vaso (se) quebrou.

(10) a. A filha preocupou a mãe.

b. A mãe (se) preocupou.

(11) a. O calor amadureceu a banana.

b. A banana amadureceu.

Entretanto, em uma análise mais detalhada, vemos que existem certas diferenças relevantes que motivam uma subclassificação semântica ainda mais fina para os dados do PB.

Verbos de mudança de estado causativo/agentivos

Cançado (2010) propõe que verbos de mudança de estado causativo/agentivos, como quebrar no exemplo em (9), devem ser decompostos como em (12) abaixo, em que X é uma força externa, como um agente, um instrumento ou mesmo uma eventualidade, Y é a entidade afetada e STATE é o elemento idiossincrático do significado, a raiz:

(12) "v : [ [ X (ACT) ] CAUSE [ Y BECOME <STATE> ] ]" (CANÇADO, 2010, p.91).

A representação semântica em (12) difere da de Levin e Hovav (2005), em (5), porque especifica um pouco mais o evento. Cançado (2010) propõe que esses verbos apresentam o predicado ACT apenas opcionalmente, porque quando X é o agente volicional da ação, isso não está marcado lexicalmente no verbo, mas no nível sentencial, com a presença de um modificador do sujeito:7 7 Jackendoff (1990) também faz uma proposta semelhante em que se têm predicados opcionais marcados no léxico.

(13) a. João quebrou o vaso.

b. João quebrou o vaso deliberadamente.

A interpretação agentiva irá depender da composição, na sintaxe sentencial, do sujeito com um modificador que expresse volição. Essa característica semântica acarretará relevantes diferenças para as projeções da estrutura sintático-lexical, pois verbos que acarretam um agente lexicalmente não aceitam a alternância causativa.

Exemplos de verbos que podem ser representados pela estrutura em (12) são:

(14) a. quebrar: [ [ X (ACT) ] CAUSE [ Y BECOME <QUEBRADO> ] ]

b. abrir: [ [ X (ACT) ] CAUSE [ Y BECOME <ABERTO> ] ]8 8 É fundamental realçarmos que o mesmo verbo pode ser classificado diferentemente se houver outras ocorrências polissêmicas, como em abrir o livro, abrir a porta ou abrir a nova loja. c. acender: [ [ X (ACT) ] CAUSE [ Y BECOME <ACESO> ] ]

Parafraseando as estruturas acima, temos:

(15) O X (voluntaria ou involuntariamente) causa o Y ficar quebrado/aberto/aceso.

Outros exemplos de verbos dessa classe são:

(16) abalar, afinar, amassar, apagar, aquecer, arrebentar, arredondar, bloquear, cachear, colar, contundir, cortar (machucar), curar, danificar, desarrumar, descosturar, descolorir, desfiar, emaranhar, esfolar, esfriar, esterilizar, estragar, esvaziar, fechar, ferir, gelar, iluminar, machucar, molhar, queimar, rachar, rasgar, revitalizar, secar, sujar, trincar...

Verbos de mudança de estado estritamente causativos

Verbos de mudança de estado estritamente causativos, como preocupar no exemplo em (10), terão uma pequena distinção semântica em relação à classe dos causativo/agentivos. Esses verbos não aceitam, nem composicionalmente, um agente na posição de sujeito. Evidência disso é que sentenças com verbos desse tipo não aceitam um instrumento:

(17) a. * A filha preocupou a mãe com uma faca.

b.* O João aborreceu o pai com um martelo.

c.* A Maria chateou o namorado com um revólver.

Cançado (1995) classifica esses verbos como estritamente causativos. A autora realça que, ainda que esses verbos possam apresentar um NP animado na posição de sujeito, a referência denotada por esse NP não será a de um ente animado, mas sim, a de uma eventualidade não especificada. Isso implica uma estrutura de predicados um pouco diferente da proposta em (12):

(18) preocupar: [ [ X ] CAUSE [ Y BECOME <PREOCUPADO> ] ]

Na estrutura em (18), o X é interpretado como uma causa não-especificada e poderíamos propor a seguinte paráfrase:

(19) Uma eventualidade X (seja um evento ou um estado) causa o Y ficar preocupado.

Uma motivação gramatical para se propor a distinção entre as duas subclasses de verbos de mudança de estado é que verbos que possuem a estrutura em (12), como quebrar, abrir e acender, aceitam a passivização sintática, enquanto os verbos que possuem a estrutura em (18), como preocupar, aborrecer e chatear, não aceitam a passivização:

(20) a. O vaso foi quebrado (pelo João).

b. A porta foi aberta (pelo João).

c. A luz foi acendida (pelo João).

(21) a. *A mãe foi preocupada pela filha.

b. *O pai foi aborrecido pelo João.

c. * O namorado foi chateado pela Maria.

A classe dos verbos estritamente causativos é composta somente por verbos psicológicos que têm um objeto como experienciador, entretanto, vale observar que nem todos os psicológicos com objeto experienciador fazem parte dessa classe. Cançado (1995) aponta que existe um grupo de verbos psicológicos que fazem parte dos verbos causativo-agentivos, como por exemplo:

(22) a. O João assustou a Maria com um revólver.

b. A Maria foi assustada pelo João.

(23) a. O João acalmou a Maria com um chá.

b. A Maria foi acalmada pelo João.

(24) a. Os colonizadores apaziguaram os índios com presentes.

b. Os índios foram apaziguados pelos colonizadores.

Outros exemplos de verbos estritamente causativos são:

(25) abismar, aborrecer, acanhar, admirar, afligir, agitar, agoniar, baratinar, brutalizar, chocar, contentar, deliciar, deprimir, desanimar, emocionar, enamorar, encabular, encantar, entristecer, fascinar, frustrar, grilar, horripilar, impacientar, inquietar, irar, irritar, maravilhar, melindrar, obcecar, orgulhar, pasmar, penalizar, pirar, relaxar, revoltar...

Vimos até aqui dois tipos de verbos de mudança de estado, aqueles que aceitam tanto uma causa quanto um agente como argumento externo, tipo quebrar, e aqueles que aceitam apenas uma causa como argumento externo, tipo preocupar. Mostramos que essa subdivisão é relevante gramaticalmente, pois a passivização é sensível a ela. Mostramos também que verbos psicológicos podem pertencer a ambos os subtipos. Passemos, pois, para um terceiro subtipo de verbos de mudança de estado.

Verbos de mudança de estado incoativos

O terceiro subtipo de verbos de mudança de estado, os verbos incoativos, como amadurecer no exemplo em (11), é assumido por muitos, principalmente, para análises do inglês, como pertencendo à classe de quebrar. Isso porque eles denotam uma mudança de estado e podem aparecer tanto na forma transitivo-causativa quanto na forma intransitivo-incoativa. Entretanto, como já realçamos, as línguas lexicalizam os eventos de maneiras diferentes e parece ser este o caso do PB, com relação a verbos desse tipo. Cançado e Amaral (2010) propõem que existem algumas diferenças semânticas e morfossintáticas entre verbos como amadurecer e os demais verbos de mudança de estado. Primeira evidência da diferença entre as classes de quebrar e amadurecer é a natureza semântica do argumento interno afetado. A mudança de estado do argumento interno de um verbo causativo deve-se a um processo que ocorre externamente ao objeto e não depende dele para se efetivar. Já a mudança de estado do argumento interno de um verbo incoativo deve-se a um processo que ocorre internamente a esse objeto e depende de propriedades inerentes do objeto para se efetivar. Kemmer (1993) classifica esses verbos como verbos que denotam uma mudança de estado fisiológico. Alexiadou, Anagnostopoulou e Schafer (2006) classificam esses verbos como internamente causados, pois a mudança de estado que ocorre no evento é ligada às propriedades inerentes do objeto que muda de estado. Essa propriedade restringe a natureza do papel temático do argumento externo, pois os verbos incoativos não são compatíveis com um agente e, mesmo quando existe um argumento expresso por um NP animado, a denotação desse NP não é a de um agente, pois não se consegue acrescentar um instrumento na sentença:

(26) *A empregada amadureceu a banana com o forno.

(27) *A padaria apodreceu o pão com o fermento.

(28) *A mãe emagreceu o filho com um remédio forte.

Para Levin (2009), essa causa indireta cria o ambiente propício para a ocorrência do processo de mudança de estado, mas o processo só irá se desenrolar se o objeto afetado tiver propriedades inerentes que o efetivem. Portanto, esses verbos também são estritamente causativos,9 9 Sem entrar em detalhes, vale a observação de que a natureza semântica do objeto e do sujeito dos verbos do tipo preocupar também é a mesma dos verbos incoativos. Interessante observar que, apesar da motivação ser sintática, Belletti e Rizzi (1988) propõem que verbos do tipo preoccupare do italiano teriam uma estrutura inacusativa. Muitos autores demonstram que essa hipótese sintática está equivocada, entretanto, do ponto de vista semântico, esses verbos realmente se assemelham. como os verbos do tipo preocupar. Ainda, são verbos que não aceitam um agente na posição de argumento externo. A construção passiva e a indeterminação do sujeito são bloqueadas por serem propriedades sintáticas diretamente relacionadas à agentividade:

(29) a.*A banana foi amadurecida.

b.* Amadureceram a banana.

(30) a.*O pão foi apodrecido.

b.*Apodreceram o pão.

(31) a.*O menino foi emagrecido.

b.*Emagreceram o menino.

Cançado e Amaral (2010) apontam outra evidência da distinção entre os dois subtipos de quebrar e amadurecer: na versão incoativa de verbos como amadurecer, não é possível a inserção do clítico se, como é possível para os demais verbos causativos:

(32) a. O calor amadureceu a banana.

b. A banana *se amadureceu.

(33) a. A umidade apodreceu o pão.

b. O pão *se apodreceu.

(34) a. A dieta emagreceu o menino.

b. O menino *se emagreceu.

Vamos retomar a análise das autoras sobre essa questão na literatura. Alguns autores, como Kaine (1975), Grimshaw (1982) e Reinhart e Siloni (2005), sustentam que o clítico se, nas línguas românicas, aparece na forma intransitiva como uma maneira de marcar a ausência de um argumento da diátese transitiva básica do verbo. Com isso, temos que assumir que existe uma forma transitiva básica e uma forma intransitiva derivada. O grande problema de assumir uma explicação dessa natureza é mostrar as evidências do que é uma forma básica de um verbo. Do ponto de vista sintático, os exemplos de (9) e (11) são idênticos: verbos que apresentam uma forma transitiva e uma forma intransitiva. Outros autores, como Kemmer (1993) e Maldonado (1999), refutam essa proposta e sugerem que o se pode aparecer para marcar diversas manifestações. Por exemplo, para o espanhol, Maldonado (1999) propõe que o se aparece em situações com significados como correferencialidade, impessoalização, auto-afetação, incoatividade, processos espontâneos, entre outros. Naquela língua, até mesmo verbos reconhecidamente inacusativos podem receber a marca se, como o verbo cairse. Ainda, mesmo em PB, há vários contraexemplos de verbos depoentes, do tipo arrepender-se e queixar-se, que possuem a marca se, mas notadamente essa marca não é entendida como a remoção de algum argumento. Portanto existem evidências convincentes de que o clítico se não é uma marca de uma propriedade sintática.

Em outra linha de análise, Chierchia (2004) e Koontz-Garboden (2009) propõem que o fenômeno da anticausativização é uma operação geral de reflexivização. Entretanto não parece uma alternativa adequada tratar a inserção do se como um processo de reflexivização único. Kemmer (1993) assume que existem dois domínios distintos em que a marca morfológica se opera: o domínio reflexivo e o domínio médio (as sentenças incoativas e as sentenças mediais, que apresentam a marca se nas línguas românicas, por exemplo). A autora mostra que há línguas, como as românicas, que apresentam a mesma marca morfológica para o processo de reflexivização e de construções médias. Entretanto há línguas que apresentam duas formas distintas para marcar a reflexivização e as construções médias, como o russo e o latim. Ainda, como argumento principal, a marca se nas construções reflexivas marca uma mudança na referenciação dos participantes, tendo uma natureza nominal. Já, a marca se nas construções médias marca uma mudança de perspectiva no evento denotado, tendo uma natureza verbal.10 10 Godoy (2012) utiliza-se da decomposição de predicados para dar explicações mais refinadas sobre a ocorrência do se nas sentenças reflexivas e médias. Portanto fica também descartada essa hipótese da inserção do se como um processo mais geral de reflexivização.

Por outro lado, Chierchia (2004) e Koontz-Garboden (2009), como uma evidência da hipótese de reflexivização, propõem que, no processo de anticausativização, o operador CAUSE é mantido em sua representação léxico-semântica. Cançado e Amaral (2010) seguem essa hipótese específica para analisar os dados do PB. As autoras assumem dois pontos específicos a respeito da presença ou ausência da marca morfológica se no PB: primeiro, a marca morfológica se não indica marcação sintática; segundo, assumindo que a marca se pode indicar uma série de propriedades semântico-pragmáticas distintas, no caso específico dos verbos causativos e incoativos, ela indica a presença do predicado primitivo CAUSE na estrutura lexical-semântica dos verbos. Como a classe dos verbos incoativos não aceita a marca morfológica se, na sentença intransitiva, fato comum aos verbos causativos, esses verbos não trazem em sua estrutura semântica o predicado primitivo CAUSE, enquanto os verbos causativos, por apresentarem esse predicado em sua estrutura semântica, ao serem incoativizados, perdem esse predicado, aparecendo assim a marcação morfológica.

É importante realçar que as autoras não assumem que existem formas sintáticas básicas e derivadas, mas assumem que, a partir da decomposição do significado dos verbos, há verbos basicamente causativos ou basicamente incoativos do ponto de vista semântico. Entretanto o processo sintático de transitivização ou intransitivização é o mesmo para as duas classes. Semanticamente, então, temos verbos causativos que se incoativizam e verbos incoativos que se causativizam.

Portanto mais uma vez mostra-se relevante separar a subclasse de amadurecer das demais subclasses de verbos de mudança de estado. A estrutura de predicados proposta é a seguinte:

(35) amadurecer: ([X] CAUSE) [Y BECOME <MADURO>]

Na estrutura em (35), X é interpretado como uma eventualidade que pode ser acrescentada ao verbo em um processo de causativização. Ou seja, essa causa não é inerente ao verbo, porém, a possibilidade da inserção de uma causa é marcada lexicalmente. Teríamos para (35) a seguinte paráfrase:

(36) Pode existir um eventualidade X que causa (motiva) o Y ficar maduro.

Outros exemplos de verbos incoativos são:

(37) açucarar, adoecer, amarelar, apodrecer, arroxear, azular, bichar, branquear, cariar, cicatrizar, desabrochar, desmaiar, embolorar, empipocar, empalidecer, entonteceu, enrouqueceu, enrugar, enrubescer, ensurdecer, enegrecer, enferrujar, enverdecer, florir, fundir, inchar, mofar, necrosar, pretejar, rançar, sarar, talhar, verdejar...

Verbos de mudança de estado: projeção na estrutura sintático-lexical

Finalmente, analisaremos como as três subclasses de verbos de mudança de estado são projetadas nas estruturas de Hale e Keyser (2002). Apesar de termos proposto a divisão dos verbos de mudança de estado em três subtipos distintos, essa divisão não acarretará três projeções nas estruturas sintático-lexicais distintas. Vimos que essa divisão é pertinente para algumas propriedades morfossintáticas (passivização, indeterminação do sujeito e marcação com o clítico se). Entretanto essas diferenças dizem respeito ao argumento externo das três subclasses; com relação ao argumento interno, a estrutura de predicados é sempre a mesma, e é essa a subestrutura relevante para a análise sintático-lexical de Hale e Keyser (2002):11 11 O fato de propriedades como a passivização serem sensíveis apenas à semântica do argumento externo é inclusive uma das motivações para se propor uma estrutura argumental baseada na representação semântica dos verbos. Diferentemente da estrutura sintático-lexical de Hale e Keyser (2002), a estrutura semântica representa, além do argumento interno, a relação do argumento externo com o verbo. Assim, podemos fazer certas previsões a respeito de propriedades sintáticas, tais como a passiva.

(38) [Y BECOME <STATE>].

A raiz semântica dos verbos de mudança de estado pertence à categoria ontológica dos estados; essa informação é projetada na sintaxe lexical do verbo como um adjetivo.12 12 Estamos assumindo que o particípio que tem valor adjetival será projetado na mesma estrutura dos verbos deadjetivais. A estrutura argumental proposta para esses verbos consiste em dois componentes estruturais: uma raiz (A) e um verbo hospedeiro (V). O componente verbal toma um complemento, realizado aqui como a raiz que, por ser um adjetivo, requer um Spec:

A presença do Spec de V licencia a possibilidade de um argumento alternante. Essa estrutura sintático-lexical, portanto, prevê a ocorrência da alternância causativo/incoativa, como constatado de (9) a (11). Se o processo semântico é uma causativização ou uma incoativização, ou se existe a inserção do clítico se, esses fatores serão irrelevantes para a estrutura sintático-lexical.

Classe 2: Verbos de mudança de lugar (location)

A segunda classe dos verbos de mudança compõe-se de verbos que têm um agente implícito em seu sentido, ou em outros termos, verbos estritamente agentivos. Esses verbos também têm uma estrutura de eventos complexa, composta por dois subeventos relacionados por uma causação. O primeiro subevento é a ação do agente X e o segundo subevento denota uma mudança de lugar de uma entidade Y, diferentemente do que ocorre na primeira classe estudada, que denota uma mudança de estado na entidade. Os verbos de mudança de lugar não apresentam a alternância causativo/incoativa e os que vamos aqui estudar são, essencialmente, verbos derivados de um nome ou verbos "denominais".

A classe dos verbos de location compõe-se de itens como hospitalizar, cuja paráfrase é algo como colocar alguém no hospital, ou seja, o nome do qual o verbo deriva é o nome de um lugar. Esses verbos não apresentam a alternância incoativa:

(41) a. O João hospitalizou a Maria.

b. *A Maria (se) hospitalizou. (a menos que a interpretação seja reflexiva, com a obrigatoriedade do se)

(42) a. O João engavetou os papéis.

b.*Os papéis (se) engavetaram.

(43) a. O João engarrafou a cerveja.

b. *A cerveja (se) engarrafou.

A estrutura de predicados primitivos proposta para essa classe é:

(44) v: [ [ X ACT ] CAUSE [ Y BECOME [ IN <PLACE> ] ] ]

Assim, teremos:

(45) hospitalizar: [ [ X ACT ] CAUSE [ Y BECOME [ IN <HOSPITAL> ] ] ]

(46) engavetar: [ [ X ACT] CAUSE [ Y BECOME [ IN <GAVETA> ] ] ]

(47) engarrafar: [ [ X ACT ] CAUSE [ Y BECOME [ IN <GARRAFA> ] ] ]

Os verbos dessa classe compartilham uma mesma decomposição de predicados, diferindo apenas quanto à locação final de Y; esse locativo é a raiz do verbo, o seu sentido idiossincrático. O predicado ACT não é notado entre parênteses, pois esses verbos são estritamente agentivos; o predicado CAUSE relaciona os dois subeventos; e o predicado BECOME acarreta que Y não estava na locação denotada pela raiz, anteriormente ao evento. Assim sendo, a composição de BECOME com o locativo implica, como resultado, um deslocamento do argumento Y no decorrer da eventualidade.

Outros exemplos de verbos dessa classe são:

(48) aprisionar, arquivar, embolsar, empacotar, encanar, encaixotar, encarcerar, encestar, enclausurar, encovar, engaiolar, enjaular, ensacar, enterrar, envelopar, sepultar, tabelar...

Classe 3: verbos de mudança de posse (locatum e benefactivos)

Outra classe de verbos do PB, a dos verbos de mudança de posse, também se compõe de verbos que têm um agente implícito em seu sentido e uma estrutura de eventos complexa, composta por dois subeventos relacionados por uma causação. O primeiro subevento é a ação do agente X e o segundo subevento denota uma mudança de posse de uma entidade Y, diferentemente do que ocorre na primeira classe estudada, que denota uma mudança de estado na entidade, e na segunda classe estudada, que denota uma mudança de lugar da entidade. Essa diferença acarretará distintas representações semânticas. Os verbos de mudança de posse também não aceitam a alternância causativa e podem ter tipos diferentes. O primeiro tipo são os chamados verbos de "locatum", desde Clark e Clark (1979). Os verbos de locatum aqui estudados também serão verbos denominais:

(49) a. O João amanteigou o bolo.

b. *O bolo (se) amanteigou.

(50) a. O João algemou a Maria.

b. *A Maria (se) algemou. (interpretação reflexiva possível, com o se)

(51) a. O cavaleiro selou o cavalo.

b. *O cavalo (se) selou.

Para Clark e Clark (1979), verbos como os acima teriam um sentido semelhante ao dos verbos de location, com a diferença da posição do nome da qual deriva o verbo. Nos verbos de location, como engavetar (colocar Y na gaveta), o nome gaveta está localizado no locativo da sentença usada como paráfrase do verbo. Já nos verbos de locatum, como amanteigar (colocar manteiga em Y), o nome manteiga estaria localizado no complemento do verbo colocar da sentença usada como paráfrase. Entretanto, Hale e Keyser (2002) mostram que a paráfrase com o verbo colocar não se sustenta no processo de derivação de um verbo denominal como amanteigar. Eles propõem que a paráfrase mais adequada para esse verbo seria prover Y com manteiga (e não colocar manteiga em Y). Os autores argumentam que se admitíssemos a existência do processo de conflation de nomes em posição de complemento (localizados em Spec de P) com um V, teríamos construções impossíveis para verbos de location e locatum, como nas sentenças em (a) abaixo:

(52) a. *O João enlivrou na gaveta.

b. O João colocou livros na gaveta > O João engavetou os livros.

(53) a. *O João amanteigou no pão. (O João colocou manteiga no pão)

b. O João proveu o pão com manteiga > O João amanteigou o pão.

Portanto a hipótese dos autores é a de que verbos denominais como os acima (não os inergativos) derivam de estruturas do processo de conflation de uma preposição abstrata com o nome do qual o verbo se origina. A diferença entre os verbos de location e os de locatum está unicamente no sentido da preposição. Nos verbos de location, a preposição tem sentido de lugar: colocar y em; e nos verbos de locatum, a preposição tem sentido de posse: prover y com. Essa diferença irá se refletir nas estruturas semântico-lexicais pelos diferentes sentidos dos predicados primitivos expressos pelas preposições; nos verbos de location, teremos a preposição IN, denotando o lugar, e nos verbos de locatum, teremos a preposição WITH, denotando posse. Os autores propõem que a raiz de verbos de locatum é o nome de um objeto que a entidade denotada pelo argumento interno passa a possuir.

Concordando com a hipótese de Hale e Keyser (2002), partimos da paráfrase prover y com para propor a estrutura semântica de verbos do tipo locatum:

(54) v: [ [ X ACT ] CAUSE [ Y BECOME [ WITH <THING> ] ] ]

Vejam-se os exemplos:

(55) amanteigar: [ [ X ACT ] CAUSE [ Y BECOME [ WITH <MANTEIGA> ] ] ]

(56) algemar: [ [ X ACT ] CAUSE [ Y BECOME [ WITH <ALGEMA> ] ] ]

(57) selar: [ [ X ACT ] CAUSE [ Y BECOME [ WITH <SELA> ] ]

Os verbos dessa classe compartilham uma mesma estrutura de predicados, na qual ACT é obrigatório, há dois subeventos relacionados por uma causa e há um predicado BECOME, que, em composição com o argumento "possessivo" introduzido pelo predicado WITH, implica, como mudança, que Y não possuía o objeto denotado pela raiz anteriormente à eventualidade. O que difere um verbo de outro dentro dessa classe é justamente a raiz, que contém a parte idiossincrática do sentido do verbo.

Outros verbos de locatum em PB são:

(58) acorrentar, aferrolhar, afivelar, adubar, agasalhar, apimentar, cimentar, coroar, dedetizar, emoldurar, emplacar, encapar, encerar, enfeitar, enfronhar, engraxar, engordurar, esmaltar, fardar, gramar, legendar, ornamentar, perfumar, tampar, temperar...

Percebemos haver em PB um segundo tipo de verbo de mudança de posse: os verbos que chamaremos de benefactivos, que, como os de locatum (e os de location), também não aceitam a alternância causativa:

(59) a. O João presenteou a Maria.

b. *Maria (se) presenteou. (interpretação reflexiva possível, com o se)

(60) a. O João patrocinou a banda.

b. *A banda (se) patrocinou. (como acima)

(61) a. A academia premiou o escritor.

b. *O escritor (se) premiou. (como acima)

A paráfrase desses verbos que primeiro vem à mente é algo como dar presente/patrocínio/prêmio para Y, em que haveria um deslocamento de algo, partindo de uma fonte para um alvo, um recebedor, ou ainda um "benefactivo"; daí o nome desse grupo. Porém, o mesmo raciocínio desenvolvido acima cabe para os verbos benefactivos: a melhor paráfrase para esses verbos é a proposta para os verbos de locatum: prover Y com N. Podemos constatar que se houvesse o processo de conflation do complemento (Spec de P) com o verbo, teríamos sentenças agramaticais, como as seguintes:

(62) a. *O João presenteou para a Maria. (O João deu presentes para a Maria)

b. O João proveu a Maria com presentes > O João presenteou a Maria.

Com isso, propomos para os verbos benefactivos a mesma estrutura semântica que a dos verbos de locatum:

(63) v: [ [ X ACT ] CAUSE [ Y BECOME [ WITH <THING> ] ] ]

Para os exemplos de (59) a (61), temos as seguintes estruturas de predicados:

(64) presentear: [ [ X ACT] CAUSE [ Y BECOME [ WITH <PRESENTE> ] ] ]

(65) patrocinar: [ [ X ACT ] CAUSE [ Y BECOME [ WITH <PATROCÍNIO> ] ] ]

(66) premiar: [ [ X ACT ] CAUSE [ Y BECOME [ WITH <PRÊMIO> ] ] ]

O que esses verbos compartilham entre si e com os verbos de locatum é uma estrutura em que ACT é obrigatório, há dois subeventos relacionados por uma causa e há um predicado BECOME que, associado ao argumento possessivo introduzido pelo predicado WITH, acarreta uma mudança nas posses da entidade denotada por Y. O que difere cada verbo é a raiz, que denota o que é dado. Apesar de parecer que deveria haver um deslocamento de algo (a denotação da raiz) de X para Y, trata-se muitas vezes de entidades abstratas, como patrocínio, que não necessariamente existiam nas posses de X antes de existirem nas de Y. Queremos com isso justificar a ausência de predicados como GO ou MOVE ou mesmo de argumentos locativos na estrutura semântica dos verbos benefactivos. Talvez a única diferença entre os verbos benefactivos e os verbos de locatum seja o fato de a denotação da raiz ser algo mais abstrato, como patrocínio, e não concreto, como manteiga. Vejamos uma listagem de mais exemplos:

(67) abençoar, aconselhar, ajudar, alentar, alimentar, amparar, apoiar, assessorar, condecorar, diplomar, empregar, encorajar, financiar, fomentar, indenizar, informar, motivar, multar, penalizar, orientar, recompensar, socorrer, subornar...13 13 Vários desses exemplos de verbos benefactivos foram tirados de Wenceslau (2003).

Vale ressaltar, como uma última observação, que uma abordagem semântica por meio de decomposição de predicados acomoda mais naturalmente o sentido de todos esses verbos, e também as suas diferenças de sentido, do que uma abordagem por grades temáticas, por exemplo. Do ponto de vista dos papéis temáticos, os três grupos de verbos denominais (location, locatum e benefactivos) teriam a mesma grade, contendo um argumento Agente e um Paciente. As estruturas propostas deixam claro que parte do sentido é compartilhada entre vários verbos e que parte é idiossincrática de cada verbo, além de representar bem o fato de que a raiz contribui para o nome do verbo, conforme a hipótese de Levin e Hovav (2005).

Por fim, seria interessante mostrar que as diferenças semânticas percebidas entre a classe de verbos de mudança de lugar (location) e a de verbos de mudança de posse (locatum e benefactivos) não são linguisticamente triviais. Ou seja, restaria encontrar evidências de propriedades linguísticas sensíveis à diferença semântica entre uma mudança de lugar e uma mudança de posse. De fato, conforme Godoy (2012), a reflexivização parece obter dois tipos de resultados quando aplicada a esses dois conjuntos de verbos. Veja-se que (68b) e (69b) são paráfrases aceitáveis da forma transitiva dos verbos algemar (locatum) e presentear (benefactivo) e que (70b) e (71b) são paráfrases igualmente aceitáveis das formas reflexivas desses verbos:

(68) a. João algemou Maria.

b. João colocou a algema em Maria.

(69) a. João presenteou Maria.

b. João deu um presente para Maria.

(70) a. João se algemou.

b. João colocou a algema nele mesmo.

(71) a. João se presenteou.

b. João deu um presente para ele mesmo.

Porém, veja-se que, enquanto (72b) é uma paráfrase aceitável da forma transitiva de um verbo de mudança de lugar como hospitalizar e aprisionar, (73b) não é uma boa paráfrase da forma "reflexiva" desses verbos:

(72) a. João hospitalizou / aprisionou Maria.

b. João colocou Maria no hospital / na prisão.

(73) a. João se hospitalizou / se aprisionou.

b. ?João colocou ele mesmo no hospital / na prisão.

Com verbos de mudança de posse como algemar e presentear, portanto, a reflexivização gera sentenças reflexivas "normais". Já com verbos de mudança de lugar como hospitalizar e aprisionar, a reflexivização parece ocorrer gerando sentenças diferentes, que são muitas vezes chamadas na literatura de "médias", ou pertencentes a uma "voz média" (CAMACHO, 2003; CÂMARA JUNIOR, 1972; KEMMER, 1993; KLAIMAN, 1991; MALDONADO, 1999).

Em suma, percebe-se intuitivamente uma diferença de sentido entre uma sentença reflexivizada com um verbo de mudança de posse (algemar e presentear) e com um verbo de mudança de lugar (hospitalizar e aprisionar). No primeiro caso, parece tratar-se da forma reflexiva strictu sensu e, no segundo caso, da forma verbal chamada de "média" por alguns autores. Essa diferença intuitiva se reflete nas diferentes possibilidades de paráfrase com a expressão anafórica/enfática ele mesmo. Sem adentrar nas explicações para tais diferenças (sobre as quais remetemos o leitor ao trabalho de Godoy, 2012), bastou apenas notar que uma propriedade linguística como a reflexivização parece ser sensível à diferença semântica entre um verbo de mudança de lugar e um verbo de mudança de posse. Ou seja, apesar de essas duas classes terem o mesmo mapeamento em uma estrutura de Hale e Keyser (2002) (como veremos a seguir), elas se diferenciam no nível semântico-lexical e tal diferença parece ser linguisticamente relevante.

Verbos de mudança de lugar e de posse: projeção na estrutura sintático-lexical

Em relação à projeção dos verbos na estrutura sintático-lexical, as distinções semânticas observadas entre as duas classes serão irrelevantes. Retomando a ideia de muitos-para-um no mapeamento da semântica para a sintaxe lexical, vamos mostrar que as diferentes estruturas semânticas se projetam igualmente em uma estrutura sintático-lexical do tipo (3). A raiz desses verbos, de tipo ontológico PLACE ou THING, vai se projetar como um nome, inserida na projeção birrelacional de uma preposição abstrata, em posição de complemento verbal:

Vamos retomar a explicação de Hale e Keyser (2002) para a estrutura de verbos de location e locatum, acrescentando os verbos benefactivos. Por meio da operação de conflation, o nome é incorporado à preposição abstrata e em seguida ao verbo, formando os verbos hospitalizar (location), amanteigar (locatum) e presentear (benefactivo). O argumento interno desses verbos encontra-se em posição de Spec de P. Essa configuração dá conta de explicar por que nenhum desses verbos participa da alternância causativo/incoativa, como mostramos nos exemplos (b) de (49)-(51) e de (59)-(61). Isso se deve justamente ao fato de o argumento interno não estar em posição de Spec de V (mas, em Spec de P). Além disso, a configuração explica também a origem denominal desses verbos.

Considerações finais

Neste texto, visamos propor umarepresentação lexical de verbos que consiste em dois níveis relacionados: o semântico-lexical, que é a estrutura argumental dos verbos, e o nível sintático-lexical, que é a estrutura de ligação entre a semântica e a sintaxe sentencial. O nível semântico-lexical, a estrutural argumental, representa o sentido dos verbos em uma estrutura composta de predicados primitivos e de uma raiz. A estrutura de predicados é o que os membros de uma mesma classe verbal compartilham entre si e a raiz é a parte idiossincrática do sentido de cada verbo individualmente. O nível sintático-lexical serve como um mapeamento do nível semântico para a sintaxe propriamente dita e é capaz de prever a realização argumental dos verbos na sintaxe. Por exemplo, prevê a possibilidade da participação de certo verbo na alternância causativo/incoativa. Esses dois níveis estão relacionados por meio da raiz, que, na estrutura semântica, tem um certo tipo ontológico, sendo mapeada na estrutura sintático-lexical como pertencendo a determinada categoria gramatical. Essa relação entre os dois níveis é de "muitos-para-um", pois há mais tipos ontológicos que categorias gramaticais.

Para exemplificar e corroborar a proposta, elegemos algumas classes verbais do português brasileiro para serem representadas. O grande grupo dos verbos de mudança foi selecionado e dividido em três classes - a dos verbos de mudança de estado, a dos verbos de mudança de lugar e a dos verbos de mudança de posse, sendo os dois últimos essencialmente denominais. A classe dos verbos de mudança de estado foi subdividida em verbos causativo/agentivos, estritamente causativos e incoativos. Cada uma dessas subdivisões foi motivada semântica e morfossintaticamente, pois há propriedades morfossintáticas sensíveis à subdivisão, como a passivização e a presença do clítico se. No entanto, para a estrutura sintático-lexical, que prevê a alternância causativo/incoativa, a subdivisão é irrelevante. Todos os verbos de mudança de estado vão se projetar em uma estrutura sintático-lexical em que a raiz pertence à categoria dos adjetivos e há um Spec de V, posição de um argumento passível de ser alternado. As duas classes de verbos denominais, a dos verbos de mudança de lugar e a dos de mudança de posse, também se projetam em uma mesma estrutura sintático-lexical, através da relação das categorias ontológicas THING e PLACE com a categoria gramatical N, complemento de uma preposição. As diferenças de sentido que representamos em diferentes estruturas semânticas parecem poder ser corroboradas pela propriedade da reflexivização, que gera resultados diferentes quando aplicada a verbos de mudança de lugar e de mudança de posse - no primeiro caso, gera sentenças "médias" e, no segundo, sentenças reflexivas strictu sensu. Os verbos de mudança de lugar e mudança de posse são entretanto projetados em uma mesma estrutura sintático-lexical, que explica tanto a origem denominal do verbo (projeção de uma preposição abstrata) quanto a não-possibilidade da alternância causativo/incoativa (não há Spec de V).

As estruturas sintático-lexicais propostas aqui para representar os verbos do português brasileiro são totalmente fiéis às estruturas de Hale e Keyser (1993, 2002). Porém, a ideia dos autores não é a de associá-las a representações semânticas, mas tomá-las como sendo a própria estrutura argumental dos verbos. A originalidade deste trabalho consiste justamente na proposta de assumir como estrutura argumental a estrutura semântico-lexical e utilizar as estruturas de Hale e Keyser (2002) como um princípio de ligação entre a semântica lexical e a sintaxe sentencial. Apontamos, também, como méritos do trabalho: a) as propostas originais das estruturas semântico-lexicais, ainda que baseadas em grande parte na literatura sobre decomposição semântica de predicados, b) as subdivisões motivadas para a classe dos verbos de mudança de estado, c) a percepção da origem denominal dos verbos benefactivos e a sua representação lexical e d) a sugestão de se encontrar na reflexivização a propriedade linguisticamente relevante que motiva as diferentes estruturas semânticas dos verbos de mudança de lugar e de mudança de posse. Esperamos, assim, ter contribuído para uma maior compreensão do léxico verbal do PB, bem como para a construção de uma proposta formalizada e adequada para estudá-lo.

Agradecimentos

Márcia Cançado agradece o apoio financeiro da Bolsa de Produtividade do CNPq e da taxa de bancada do Programa de Pesquisador Mineiro da FAPEMIG. Luisa Godoy agradece o apoio financeiro da bolsa de doutorado da CAPES.

Recebido em março de 2011

Aprovado em maio de 2011

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  • Representação lexical de classes verbais do PB

    Lexical representation of verb classes in Brazilian Portuguese
  • 1
    Este artigo é uma ampliação e revisão das ideias apresentadas em Cançado e Godoy (2010) e Cançado e Godoy (2011).
  • 2
    A preposição é, para os autores, uma projeção diádica, sendo a única categoria gramatical essencialmente birrelacional.
  • 3
    Vale realçar que a estrutura em (2) é semelhante à estrutura em (3), exceto pela natureza do complemento de V; em (2), existe a formação de um verbo denominal, através do processo de
    conflation de N com um V vazio; e, em (3), existe a formação de um verbo denominal, através do processo de
    conflation de P com um V vazio (ou com algum prefixo do tipo
    -en-).
  • 4
    Ver Levin e Hovav (2005) para uma argumentação sobre a vantagem da decomposição de predicados em relação à abordagem de uma listagem de papéis temáticos atribuídos por um verbo.
  • 5
    Para adjetivos que denotam propriedades graduais, como por exemplo, o adjetivo contido em
    clarear¸ o acarretamento não será do tipo:
    João clareou a sala. > A sala ficou clara. Mas sim,
    A sala ficou mais clara. Ver sobre o assunto Hovav e Levin (2010).
  • 6
    Note-se que, quando não existe morfologicamente a forma adjetival, o particípio assume a função adjetiva. Para maiores explicações sobre a diferença entre a forma adjetival e a forma participial, ver Parsons (1990).
  • 7
    Jackendoff (1990) também faz uma proposta semelhante em que se têm predicados opcionais marcados no léxico.
  • 8
    É fundamental realçarmos que o mesmo verbo pode ser classificado diferentemente se houver outras ocorrências polissêmicas, como em
    abrir o livro,
    abrir a porta ou
    abrir a nova loja.
  • 9
    Sem entrar em detalhes, vale a observação de que a natureza semântica do objeto e do sujeito dos verbos do tipo
    preocupar também é a mesma dos verbos incoativos. Interessante observar que, apesar da motivação ser sintática, Belletti e Rizzi (1988) propõem que verbos do tipo
    preoccupare do italiano teriam uma estrutura inacusativa. Muitos autores demonstram que essa hipótese sintática está equivocada, entretanto, do ponto de vista semântico, esses verbos realmente se assemelham.
  • 10
    Godoy (2012) utiliza-se da decomposição de predicados para dar explicações mais refinadas sobre a ocorrência do
    se nas sentenças reflexivas e médias.
  • 11
    O fato de propriedades como a passivização serem sensíveis apenas à semântica do argumento externo é inclusive uma das motivações para se propor uma estrutura argumental baseada na representação semântica dos verbos. Diferentemente da estrutura sintático-lexical de Hale e Keyser (2002), a estrutura semântica representa, além do argumento interno, a relação do argumento externo com o verbo. Assim, podemos fazer certas previsões a respeito de propriedades sintáticas, tais como a passiva.
  • 12
    Estamos assumindo que o particípio que tem valor adjetival será projetado na mesma estrutura dos verbos deadjetivais.
  • 13
    Vários desses exemplos de verbos benefactivos foram tirados de Wenceslau (2003).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Ago 2012
    • Data do Fascículo
      2012

    Histórico

    • Recebido
      Mar 2011
    • Aceito
      Maio 2011
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