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Propriedades tecnológicas e de cocção em grãos de arroz condicionados em diferentes temperaturas antes da parboilização

Technological properties and cooking of rice grains conditioned at different temperatures before parboiling

Resumos

O arroz é um dos principais cereais produzidos e consumidos no mundo. Objetivou-se, com este estudo, avaliar os efeitos de diferentes temperaturas da massa de grãos no condicionamento e no início da parboilização sobre parâmetros tecnológicos e de cocção. Os grãos foram armazenados com teor de água de 13%, em temperaturas de 5, 15, 25 e 35ºC, durante 7 dias, sendo submetidos com estas temperaturas ao processo de encharcamento a 60ºC, durante 300 minutos, antes da parboilização, autoclavados a 116±1ºC com pressão de 0,6±0,05 kgf cm-2 durante dez minutos e secos em secador estacionário com temperatura de 35ºC até 13%. Após parboilizados, os grãos foram submetidos às análises de renda e rendimento, incidência de defeitos, perfil colorimétrico e branquimétrico, tempo de cocção, rendimento gravimétrico e volumétrico de cocção, parâmetros texturométricos e à avaliação sensorial. Conclui-se que a temperatura de condicionamento antes da parboilização tem efeito negativo na incidência de defeitos em temperaturas mais altas (25 e 35ºC) e positivo no parâmetro "firmeza" da avaliação sensorial, em temperatura de refrigeração (5ºC). Porém, não altera o comportamento de cocção, rendimento gravimétrico, volumétrico e parâmetros texturométricos. O resfriamento artificial no condicionamento de grãos antes de parboilização possibilita uma melhor qualidade industrial e tecnológica no produto final.

Arroz parboilizado; Resfriamento; Defeitos; Análise sensorial


Rice is one of the major crops produced and consumed throughout the world. The objective of the study was to evaluate the effects of using different temperatures to condition the grains and at the start of parboiling on the technological and cooking parameters. The grains were stored with a moisture content of 13% at temperatures of 5, 15, 25 and 35ºC for 7 days, and then subjected at these temperatures to the process of soaking at 60ºC for 300 minutes before parboiling, followed by autoclaving at 116 ± 1ºC with a pressure of 0.6 ± 0.05 kgf cm-2 for 10 minutes and drying to 13% moisture in a static dryer at 35ºC. After parboiling the grains were subjected to an analysis of the yield, incidence of defects, colorimetric and whiteness profiles, cooking time, gravimetric and volumetric cooking yields, textural parameters and a sensory evaluation. It was concluded that higher conditioning temperatures (25 and 35ºC) before parboiling had a negative effect on the incidence of defects, and refrigerator temperatures (5ºC) had a positive effect on the sensory parameter of "firmness", but did not change the behavior during cooking, the gravimetric and volumetric yields or the textural parameters. Artificial cooling of the conditioned grains before parboiling allowed for better industrial and technological quality of the final product.

Parboiled rice; Cooling; Defects; Sensory analysis


Propriedades tecnológicas e de cocção em grãos de arroz condicionados em diferentes temperaturas antes da parboilização

Technological properties and cooking of rice grains conditioned at different temperatures before parboiling

Ricardo Tadeu ParaginskiI; Valmor ZieglerI; André TalhamentoI; Moacir Cardoso EliasI; Mauricio de OliveiraII,* * Autor Correspondente | Corresponding Author

IUniversidade Federal de Pelotas (UFPEL), Faculdade de Agronomia Eliseu Maciel, Departamento de Ciência e Tecnologia Agroindustrial, Laboratório de Pós-Colheita, Industrialização e Qualidade de Grãos, Pelotas/RS - Brasil, e-mail: paraginskiricardo@yahoo.com.br, vamgler@hotmail.com, andre.tlh@hotmail.com, eliasmc@uol.com.br

IIUniversidade Federal de Pelotas (UFPEL), Faculdade de Agronomia Eliseu Maciel, Departamento de Ciência e Tecnologia Agroindustrial, Laboratório de Pós-Colheita, Industrialização e Qualidade de Grãos, Campus Capão de Leão, CEP: 96010-900, Pelotas/RS - Brasil, e-mail: mauricio@labgraos.com.br

RESUMO

O arroz é um dos principais cereais produzidos e consumidos no mundo. Objetivou-se, com este estudo, avaliar os efeitos de diferentes temperaturas da massa de grãos no condicionamento e no início da parboilização sobre parâmetros tecnológicos e de cocção. Os grãos foram armazenados com teor de água de 13%, em temperaturas de 5, 15, 25 e 35ºC, durante 7 dias, sendo submetidos com estas temperaturas ao processo de encharcamento a 60ºC, durante 300 minutos, antes da parboilização, autoclavados a 116±1ºC com pressão de 0,6±0,05 kgf cm–2 durante dez minutos e secos em secador estacionário com temperatura de 35ºC até 13%. Após parboilizados, os grãos foram submetidos às análises de renda e rendimento, incidência de defeitos, perfil colorimétrico e branquimétrico, tempo de cocção, rendimento gravimétrico e volumétrico de cocção, parâmetros texturométricos e à avaliação sensorial. Conclui-se que a temperatura de condicionamento antes da parboilização tem efeito negativo na incidência de defeitos em temperaturas mais altas (25 e 35ºC) e positivo no parâmetro "firmeza" da avaliação sensorial, em temperatura de refrigeração (5ºC). Porém, não altera o comportamento de cocção, rendimento gravimétrico, volumétrico e parâmetros texturométricos. O resfriamento artificial no condicionamento de grãos antes de parboilização possibilita uma melhor qualidade industrial e tecnológica no produto final.

Palavras-chave: Arroz parboilizado; Resfriamento; Defeitos; Análise sensorial.

SUMMARY

Rice is one of the major crops produced and consumed throughout the world. The objective of the study was to evaluate the effects of using different temperatures to condition the grains and at the start of parboiling on the technological and cooking parameters. The grains were stored with a moisture content of 13% at temperatures of 5, 15, 25 and 35ºC for 7 days, and then subjected at these temperatures to the process of soaking at 60ºC for 300 minutes before parboiling, followed by autoclaving at 116 ± 1ºC with a pressure of 0.6 ± 0.05 kgf cm–2 for 10 minutes and drying to 13% moisture in a static dryer at 35ºC. After parboiling the grains were subjected to an analysis of the yield, incidence of defects, colorimetric and whiteness profiles, cooking time, gravimetric and volumetric cooking yields, textural parameters and a sensory evaluation. It was concluded that higher conditioning temperatures (25 and 35ºC) before parboiling had a negative effect on the incidence of defects, and refrigerator temperatures (5ºC) had a positive effect on the sensory parameter of "firmness", but did not change the behavior during cooking, the gravimetric and volumetric yields or the textural parameters. Artificial cooling of the conditioned grains before parboiling allowed for better industrial and technological quality of the final product.

Key words: Parboiled rice; Cooling; Defects; Sensory analysis.

1 Introdução

O arroz (Oryza sativa L.) é vital para a segurança alimentar de grande parte da população do mundo e está entre os três cereais internacionalmente mais produzidos e consumidos, figurando atrás apenas do trigo e do milho. Dentre os cereais, o arroz é o que mais se destaca, por ser alimento básico da maioria dos povos, fazendo parte da dieta de cerca de 2,4 bilhões de pessoas no mundo (USDA, 2009; CARVALHO et al., 2012). Assim como o aumento da população mundial, o aumento da produção de arroz é de grande importância, abrangendo 158 milhões de hectares (ha) em 2009, com rendimento médio de 4,3 t ha–1 (USDA, 2009).

No Brasil, o arroz é o principal cereal consumido, estando rotineiramente presente na mesa dos brasileiros como fonte de carboidratos, minerais, proteínas, lipídios e vitaminas. O grão pode ser consumido na forma integral, branco polido, parboilizado integral ou parboilizado polido. Do total de arroz consumido no Brasil, aproximadamente 25% são de arroz parboilizado polido, devido à melhor qualidade nutricional e ao comportamento de cocção desejado por parte da população.

O processo de parboilização, que consiste nas etapas de hidratação, autoclavagem e secagem, causam alterações na estrutura dos grãos e aumentam o período seguro de conservação dos grãos, além de reduzir a suscetibilidade ao ataque de insetos e melhorar o rendimento industrial, tornando o grão menos suscetível à quebra (ELBERT et al., 2001; SAIF et al., 2003; HEINEMANN et al., 2005). De acordo com a Instrução Normativa MAPA Nº 06 de 16 de fevereiro de 2009, o rendimento industrial do arroz é definido pelos parâmetros renda e rendimento (BRASIL, 2009). Renda corresponde ao percentual de arroz beneficiado ou beneficiado e polido, resultante do beneficiamento do arroz em casca, e Rendimento corresponde ao percentual, em peso, de grãos inteiros e de grãos quebrados, resultantes do beneficiamento do arroz.

O armazenamento de grãos de arroz é uma prática necessária para permitir que as indústrias trabalhem o ano todo e atendam à demanda de produto para consumo nas diferentes regiões. Dentre os principais fatores que interferem na qualidade de armazenamento dos grãos, a temperatura é um dos principais, provocando alterações nas propriedades fisico-químicas e nutricionais. A técnica de resfriamento artificial de grãos é uma alternativa para a redução das alterações e a obtenção de um produto com melhores características ao final do armazenamento, pois reduz a velocidade das reações metabólicas e enzimáticas (REHMAN et al., 2002; SIRISOONTARALAK; NOOMHORM, 2007; PARK et al., 2012).

Os benefícios da utilização da refrigeração na conservação dos grãos já são evidenciados, porém pouco se sabe sobre o comportamento e a manutenção das características dos grãos de arroz quando estes são submetidos aos processos de parboilização sem que seja feita a estabilização ou a redução do gradiente térmico entre os grãos e a água de encharcamento, na primeira etapa da parboilização. O processo de parboilização afeta o tempo de cocção e as propriedades de textura do arroz, sendo que o arroz parboilizado requer mais energia para ser cozido do que o arroz branco polido, devido à necessidade de um tempo maior para absorção de água (ROY et al., 2004).

O arroz, por se tratar de um grão amiláceo, possui sensibilidade ao choque térmico, que é provocado pela variação brusca de temperatura. A temperatura da massa dos grãos é um dos parâmetros operacionais que estão diretamente relacionados com os choques térmicos, que podem ocorrer durante o processamento dos grãos. A ocorrência de danos imediatos e latentes devido às alterações de temperatura são é expressa pelo aumento de trincamentos e pela incidência de defeitos nos grãos, respectivamente, reduzindo seu valor comercial e alterando as características tecnológicas e sensoriais dos grãos (MENEGHETTI et al., 2012). Nesse contexto, a textura tem sido definida como uma caracteristica multidimencional, que apenas os seres humanos podem perceber, definir e medir. Dessa forma, os consumidores consideram a textura do arroz cozido como principal atributo de qualidade (ROUSSET et al., 1999).

A qualidade e a funcionalidade dos grãos de arroz são caracterizadas de várias maneiras, dependendo, em grande parte, do segmento da indústria que utiliza o arroz. Estas características incluem a aparência e a moagem, além dos parâmetros de cozedura.

Para os processos de beneficiamento industrial do arroz, a quebra de grãos e a incidência de defeitos são fatores importantes economicamente, especialmente devido à valorização do produto com alto índice de grãos inteiros e baixo índice de defeitos, se comparado ao produto com grãos quebrados e grãos defeituosos (VIEIRA, 2004; CARVALHO et al., 2011).

Assim, considerando-se o aumento da utilização da técnica de resfriamento artificial em grãos de arroz e as controvérsias sobre a qualidade dos grãos, quando submetidos diretamente ao processo de parboilização, este trabalho objetivou avaliar os efeitos de diferentes temperaturas de condicionamento da massa (5, 15, 25 e 35ºC) de grãos durante 7 dias de armazenamento, nas propriedades tecnológicas e de cocção dos grãos submetidos ao processo de parboilização, sem redução do gradiente térmico dos grãos antes da imersão na água de encharcamento.

2 Material e métodos

2.1 Material e preparo das amostras

Foram utilizados grãos de arroz (Oryza sativa L.) da cultivar IRGA-417, de grãos longo-fino (agulhinha) com alto teor de amilose (29%), cultivado em sistema de irrigação, no município de Pelotas, Estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Os grãos, após a colheita e a secagem até teor de água de 13%, foram acondicionados em sacos de polietileno de baixa densidade, com 10 micras (µ) de espessura, e condicionados nas temperaturas de 5, 15, 25 e 35ºC durante 7 dias, para estabilização da temperatura de massa dos grãos e, posteriormente, após realização dos processos de parboilização e beneficiamento.

2.2 Parboilização

O processo de parboilização foi realizado após determinação das curvas de hidratação dos grãos de arroz em casca, para definição da combinação de tempo e temperatura na etapa de hidratação do processo de parboilização. Os resultados indicaram combinações de 60ºC e 300 minutos para todos os tratamentos. Amostras de 250 g (gramas) de grãos de arroz em casca foram hidratadas em água na proporção 1:1,5 v/v (arroz/água) durante o tempo e a temperatura pré-estabelecidos anteriormente para os tratamentos, e autoclavadas em autoclave vertical (Bio Eng, modelo A-30, Bio Eng., Brasil) com temperatura de 116±1ºC e pressão de 0,6±0,05 kgf cm–2 durante dez minutos. A seguir, a secagem dos grãos foi realizada em secador estacionário, com temperatura do ar de 35±2ºC, até a obtenção de 13% no teor de água. As amostras foram condicionadas em sala climatizada a 25±2ºC durante 96 horas, para completa estabilização do amido antes da realização das análises.

2.3 Renda e rendimento dos grãos

O processo de renda e rendimento dos grãos foi realizado de acordo com a Instrução Normativa 06, de 2009 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do Brasil, que determina os padrões oficiais de classificação de grãos de arroz (BRASIL, 2009). O teor de grãos esbramados foi determinado de acordo com a diferença entre os grãos antes e após o descascamento. O rendimento de inteiros foi realizado após o polimento, com remoção de 9% de farelo para o arroz branco e 5% para o arroz parboilizado, e foi realizada a separação de grãos quebrados com auxílio de triuer e posterior repasse manual. Foram considerados grãos inteiros, os grãos com comprimento maior do que três quartos do tamanho da classe; neste caso, grãos com comprimento maior do que 4,49 mm. A incidência de defeitos foi determinada pelo somatório de todos os defeitos presentes nos grãos de arroz após o polimento (mofados, ardidos, enegrecidos, picados, manchados, danificados e rajados).

2.4 Perfis colorimétrico e branquimétrico

Os perfis colorimétrico e branquimétrico foram determinados nos grãos de arroz após o polimento. O perfil de cor dos grãos de arroz foi determinado com um colorímetro (Minolta CR 300, Osaka, Japão), utilizando-se os seguintes parâmetros de cor CIELAB: L* (100 = 0 = branco e preto), a* (vermelho = positivo e negativo = verde) e b* (amarelo = positivo e negativo = azul). O perfil branquimétrico foi realizado com branquímetro Zaccaria (modelo MBZ-1, Indústria de Máquinas Zaccaria S/A, São Paulo, Brasil), operado de acordo com recomendações da indústria fabricante, determinando os parâmetros de brancura, transparência e polimento dos grãos.

2.5 Tempo de cocção

O tempo de cozimento ideal foi determinado de acordo com teste proposto por Juliano e Bechtel (1985). Em um copo de 250 mL, aproximadamente 10 g de grãos de arroz inteiros foram cozidos com água destilada (98±1ºC). A determinação do tempo de cocção foi iniciada imediatamente após a imersão dos grãos na água. Após dez minutos de cozimento, a cada minuto, dez grãos de arroz foram removidos e prensados entre duas placas de vidro limpo, sendo os grãos de arroz parboilizado observados com auxílio de luz polarizada. O tempo de cozedura foi registrado quando, no mínimo, 90% dos grãos já não tinham núcleo opaco ou o centro cozido, sendo adicionado o tempo de dois minutos ao tempo determinado para padronização.

2.6 Rendimentos gravimétrico e volumétrico de cocção

Os rendimentos volumétrico e gravimétrico são realizados "após a cocção". O rendimento volumétrico é obtido pelo quociente entre o volume final do arroz cozido e o volume inicial do arroz cru, enquanto o rendimento gravimétrico é calculado pelo quociente entre o peso final do arroz cozido e o peso inicial do arroz cru. Os grãos foram cozidos em panelas de alumínio adaptadas, nas quais foi pesado e determinado o volume de 35 g de grãos e adicionaram-se 120 mL de água, com temperatura de 98±1ºC, deixando-se o tempo determinado anteriormente para cocção. Após cozidas, as amostras foram deixadas em repouso durante 30 minutos na temperatura de 25±1ºC, para determinação do peso e volume dos grãos após a cocção.

2.7 Parâmetros texturométricos

O cozimento das amostras foi realizado conforme descrito por Juliano e Bechtel (1985). As amostras de arroz para cozimento foram preparadas em béquer de 250 mL com 200 mL de água destilada à temperatura de 98±1ºC, no qual colocaram-se 10 g de amostras e deixou-se no tempo previamente determinado para cocção com constante agitação, removendo-se no final toda a água da cocção e mantendo-se os grãos no interior do béquer para o teste, enquanto ainda estavam quentes. O perfil texturométrico dos grãos cozidos foi determinado utilizando-se equipamento marca Stable Micro Systems Texture Analysers, modelo TA.XTplus, com uma célula de carga de 5 kg com uma compressão de dois ciclos (PARK et al., 2001). Uma força de compressão de dois ciclos de tempo versus programa foi utilizada para comprimir as amostras até 90% da espessura original de grão cozido, retornar à sua posição original e novamente comprimir (MEULLENET et al., 1997). Os parâmetros determinados, conforme descrito por Bourne (2002), foram: dureza - definida como a força máxima requerida para comprimir a amostra numa dada percentagem pré-estabelecida, em Newton; mastigabilidade - definida como o número de mastigações necessárias para tornar o alimento com consistência adequada para ser engolido, em Ns–1; gomosidade - definida como a energia requerida para desintegrar um alimento semissólido para um estado pronto de ser engolido, sem mastigar, em Newton; elasticidade - definida como o grau com que o alimento retoma a sua forma após uma compressão parcial da língua contra os dentes ou o céu da boca, em milímetros, e adesividade - definida como a força necessária para remover o alimento que adere na língua, nos dentes e nas mucosas, em Ns–1. Quinze determinações foram realizadas por tratamento e o resultado foi expresso pela média das determinações.

2.8 Análise sensorial

A avaliação sensorial dos grãos de arroz após a cocção foi realizada de acordo com metodologia desenvolvida por Gularte (2002), para análise sensorial de alimentos. Foram selecionados 50 provadores ao acaso, entre funcionários, alunos e visitantes da Universidade Federal de Pelotas, com base no interesse e na disponibilidade de participar dos testes sensoriais, sendo estes provadores não treinados, de ambos os sexos, com idade entre 15 e 45 anos. Para a avaliação, empregou-se um painel contendo uma escala não estruturada de nove centímetros, com termos descritivos, caracterizando os atributos de cor, brilho, firmeza, soltabilidade, odor, sabor, aceitação e intenção de compra das amostras de arroz cozido. Para definição dos atributos, os termos da escala foram previamente estabelecidos da seguinte forma: para cor, foram utilizados padrões das cores branco e amarelo; para o atributo brilho, foram utilizados padrões de arroz opaco e muito brilhoso; para odor, arroz branco e parboilizado; para soltabilidade, pastosos e grãos bem separados; para firmeza, em forma de massa mole e centro duro, e para sabor, característico de arroz branco e característico de arroz parboilizado forte. Os avaliadores recebiam as amostras em painéis individuais, com codificação alfanumérica de três números para cada tratamento, como o objetivo de comparação entre os tratamentos avaliados. Após a análise, realizou-se a média das determinações e os grãos cozidos foram enquadrados de acordo com escala não estruturada para os parâmetros propostos.

2.9 Análise estatística

Os resultados foram avaliados através de análise de variância (ANOVA), seguida do teste de Tukey, de comparação de médias, todos com 5% de significância (p >0,05).

3 Resultados e discussão

Os resultados de renda e rendimento de grãos de arroz (Tabela 1) indicam que houve um aumento no rendimento de grãos inteiros após a parboilização, para todos os tratamentos, aumentando os valores de 57,06% de inteiros, no arroz branco polido, para valores entre 71,54% e 72,21% nos grãos parboilizados polidos, acondicionados em sacos de polietileno e armazenados em diferentes temperaturas antes da parboilização. Estes resultados mostram que, mesmo quando os grãos são submetidos à imersão em água para o encharcamento à temperatura mais baixa (5ºC), apresentando um alto gradiente de temperatura (±55ºC) em relação à água de encharcamento (±60ºC), não houve aumento significativo no índice de grãos quebrados, mostrando que os grãos podem ser submetidos ao encharcamento diretamente nas condições de temperatura de condicionamento estudadas.

Houve um aumento da incidência de defeitos com o aumento da temperatura de massa de grãos, principalmente nos grãos com temperatura de 35ºC, resultado de uma maior atividade metabólica e enzimática dos grãos durante o período que antecedeu a parboilização e na fase inicial do processo de encharcamento. O aumento da incidência de defeitos é resultado do maior tempo de exposição a altas temperaturas em níveis de umidade elevados (30-32%) durante a parboilização, que intensificam as reações químicas, fazendo com que apareçam manchas e outras alterações que estavam latentes nos grãos antes da parboilização.

O aumento no rendimento de inteiros está de acordo com Schluterman e Siebenmorgen (2007), que verificaram que o rendimento de grãos inteiros pode variar de 0 a 75% em arroz parboilizado. O aumento do rendimento de grãos inteiros e a redução dos teores de grãos quebrados é resultado do processo de gelatinização do amido, que ocorre durante a parboilização do arroz, promovendo uma reestruturação do endosperma amiláceo do grão. Durante esse processo, as fissuras intragranulares, resultado de adsorção e dessorção de umidade, durante as fases de cultivo, colheita, secagem e armazenamento, que provocariam a quebra dos grãos durante o descascamento e o polimento, são eliminadas, elevando o rendimento de grãos inteiros, conforme observado na Tabela 1.

De acordo com a Instrução Normativa MAPA Nº 06 de 16 de fevereiro de 2009 (BRASIL, 2009), grãos esbramados são considerados o produto do qual somente a casca foi retirada. Já grãos inteiros são considerados os grãos descascados e polidos que apresentarem comprimento igual ou superior às três quartas partes do comprimento mínimo da classe que predomina. Neste caso, como é arroz da classe longo fino (agulhinha), são considerados grãos inteiros os grãos com comprimento maior do que 4,49 mm. Verifica-se, na Tabela 1, que a temperatura de condicionamento dos grãos antes da parboilização, bem como o processo de parboilização, não afeta a operação de descascamento dos grãos, pois a parboilização altera os constituintes do interior dos grãos e não os constituintes da casca.

Os resultados de cor dos grãos (Tabela 2) indicam que a temperatura de massa de grãos no condicionamento antes da parboilização não interfere na qualidade final do produto, pois o processo de parboilização apenas intensifica a coloração amarela dos grãos, quando comparados aos grãos não parboilizados. Foram observadas reduções nos valores de L* e aumento do valor b*, determinados com colorímetro Minolta. Foram observadas reduções nos valores de Brancura, Transparência e Polimento, determinados pelo branquímetro Zaccaria. Entretanto, o condicionamento de grãos em temperaturas elevadas por longos períodos reduz a cor do produto final.

Conforme resultados do branquímetro (Tabela 2), verifica-se redução nos valores de brancura e transparência, bem como redução do grau de polimento após a parboilização. O aumento da coloração amarelada e a redução da Brancura e da Transparência dos grãos após a parboilização são características indesejadas pelos consumidores, sendo atribuídas ao aumento da migração de pigmentos da casca e do farelo, e do escurecimento não enzimático obtido durante a parboilização nas temperaturas elevadas (DUTTA; MAHANTA, 2012). Segundo Sirisoontaralak e Noomhorm (2006), a mudança de cor nos grãos de arroz durante as etapas de tratamentos hidrotérmicos, passando do branco para o amarelo, se deve ao fato de que ocorrem mudanças estruturais dos glicosídeos e acoplamentos de peptídeos, conhecidos como Reação de Maillard, formando pigmentos escuros denominados de melanoidinas. Lamberts et al. (2008) afirmam que a formação de melanoidinas envolve grupos carbonila de açúcares redutores e grupos amino dos aminoácidos (principalmente lisina), e induzem a alterações nutricionais nos grãos.

Os resultados do comportamento de cocção (Tabela 3) indicam aumento no tempo de cocção e nos rendimentos gravimétricos e volumétricos após a parboilização. Entretanto, a temperatura da massa dos grãos antes da parboilização, variando de 5 a 35ºC, não afetou as propriedades de cocção.

O aumento do tempo e dos rendimentos de cocção após a parboilização é resultado da lenta absorção de água dos grãos de arroz parboilizado, devido à parcial gelatinização do amido, que dificulta o processo de hidratação. Entretanto, a capacidade de absorção é maior, provocando o aumento observado nos rendimentos gravimétrico e volumétrico após a cocção. Os parâmetros texturométricos dos grãos de arroz após a cocção (Tabela 4) indicam que a temperatura de massa no armazenamento dos grãos antes da parboilização não interfere na textura física dos grãos após o cozimento, pois o processo de parboilização apenas provoca um aumento de dureza, elasticidade, gomosidade e mastigabilidade, e uma redução da adesividade dos grãos.

Os grãos de arroz são consumidos principalmente após o cozimento e a textura dos grãos inteiros é um parâmetro de importância primária para avaliação da qualidade. O aumento da dureza observado no arroz parboilizado polido, quando comparado ao arroz branco polido, é resultado da gelatinização do amido (PARKER; RING, 2001; LAMBERTS et al., 2008), sendo que, quanto mais intenso o processo de parboilização, maior a dureza e o amarelecimento dos grãos, reduzindo a qualidade do produto final. A redução da adesividade é uma característica desejada pelos consumidores de arroz parboilizado, que preferem um arroz mais "soltinho" para o consumo. O sabor e a maciez dos grãos após a cocção são também parâmetros importantes para a avaliação da qualidade.

Conforme resultados da análise sensorial (Tabela 5), verifica-se que não há diferença entre os tratamentos, exceto para o parâmetro de firmeza, em que os grãos condicionados a 5ºC foram identificados como "macios com centro firmes", enquanto que, nas demais temperaturas, os grãos foram identificados como "firmes". O aumento na firmeza dos grãos em temperaturas de 15, 25 e 35ºC, relatado pelos julgadores, é decorrente de possíveis alterações estruturais nos grãos durante o condicionamento, como reações químicas (Maillard) (PEREDA et al., 2005) e pré-gelatinização do amido, devido à alta temperatura de condicionamento (LAMBERTS et al., 2008)

Observando-se os parâmetros de aceitação e intenção de compra, apresentados na Tabela 5, verifica-se que a temperatura de condicionamento dos grãos de arroz antes da parboilização não influênciou a aceitação do arroz, sendo que ambas as amostras foram julgadas como "indiferente". A intenção de compra também não foi alterada pela temperatura de condicionamento dos grãos, sendo que o arroz branco e o parboilizado foram julgados como "tenho dúvidas se compraria". Os resultados desses parâmetros são decorrentes das mínimas alterações observadas nos demais parâmetros sensoriais avaliados.

4 Conclusão

A utilização de resfriamento artificial no condicionamento dos grãos antes da parboilização é uma boa alternativa, já que possibilita melhores resultados de renda e rendimento do produto final. Os grãos condicionados a 5ºC podem ser comercializados e submetidos ao processo de parboilização sem afetar os parâmetros tecnológicos e a qualidade de cocção, já que não se alteram o rendimento de grãos inteiros, os perfis colorimétrico e branquimétrico, o tempo e os rendimentos de cocção, e os parâmetros texturométricos após a cocção.

O condicionamento em temperaturas de 25 e 35ºC, durante 7 dias antes e até o momento da parboilização, aumenta gradualmente a incidência de defeitos metabólicos, bem como o parâmetro de "firmeza", na avaliação sensorial em temperaturas de 15ºC ou mais.

Agradecimentos

Ao CNPq, à CAPES, à FAPERGS e à Secretaria da Ciência, Inovação e Desenvolvimento Tecnológico (SCIT-RS) (Polos Tecnológicos).

Recebido | Received: 22/11/2013

Aprovado | Approved: 23/07/2014

Publicado | Published: jun./2014

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    Autor Correspondente | Corresponding Author
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Ago 2014
    • Data do Fascículo
      Jun 2014

    Histórico

    • Recebido
      22 Nov 2013
    • Aceito
      23 Jul 2014
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