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Gestão do trabalho na perfuração de poços de petróleo: usos de si e 'a vida por toda a vida'

Management of labor in the drilling of oil wells: uses of itself 'give life for all life'

Resumos

Destacam-se no artigo os riscos potenciais à segurança e à saúde (especialmente a dimensão mental), associados às características do processo de trabalho e ao modelo de gestão do trabalho adotado pela empresa multinacional Schlumberger. Esses dois elementos aliados aos traços predominantes da indústria petrolífera tendem a expor seus trabalhadores a um aumento do custo psíquico (cognitivo, afetivo) em sua integridade biopsíquica (corpo-si). Indicam-se pistas para reflexão relativas à constatação das inadequações da organização do trabalho e do despreparo de muitos trabalhadores para lidarem com a intensidade das 'dramáticas do uso de si'. Questionam-se o alcance do 'sofrimento patogênico' presente na organização do trabalho, o comprometimento da possibilidade de sublimação e a possível conversão do sofrimento em criatividade (condição de 'possibilidade de circulações'). O referencial teórico-metodológico privilegia a ergonomia da atividade e a psicodinâmica do trabalho numa perspectiva ergológica. Os métodos operacionalizam um dispositivo dinâmico a três polos (DD3P) em 'encontros sobre o trabalho' e entrevistas semiestruturadas que valorizam a dialogia.

gestão do trabalho; dramáticas dos usos de si; intensificação do trabalho; ampliação da jornada de trabalho; indústria do petróleo


The article emphasizes the potentials dangers to the security and to the health (especially the mind ones), associated to the quality of work's process and to the standard of management work used by the Schlumberger multinational company. Both of these components associated to the main aspects of the petroleum industry tend to endanger its workers to increase their psychological costs (cognitive, affective) in their biopsychical (body itself) integrality. Trails denote the inappropriate workers structure and their despair to deal with the intensity of the 'use of itself drama'. The reach of 'pathogenic suffering' on workers structure, the compromising with the possibility of sublimation and the possibility to transform suffering on creativity (condition of 'possibility circulations') is argued. The theoretic and methodological reference emphasizes the activity's ergonomic and the psychodynamics of work in a ergological perspective. The methods operationalize a dynamic device of three poles (DD3P) on 'meetings about work' and on interviews semi-structured which valorizes the recurrence.

management work; dramatic uses of itself; intensification of work; extension of working hours; petroleum industry


ARTIGO ARTICLE

Gestão do trabalho na perfuração de poços de petróleo: usos de si e 'a vida por toda a vida'

Management of labor in the drilling of oil wells: uses of itself 'give life for all life'

Marcelo Figueiredo1 1 Professor associado I do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, Rio de Janeiro, Brasil; pesquisador do Núcleo de Estudos em Inovação, Conhecimento e Trabalho (NEICT). Doutor em Engenharia de Produção pela Coppe da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com pós-doutorado em Psicologia do Trabalho pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (PPGPS/Uerj). < marceloparada@uol.com.br> , * * Correspondência: Departamento de Engenharia de Produção da Universidade Federal Fluminense (UFF). Rua Passo da Pátria, 156, Bloco D, sala 306, CEP 24210-240, São Domingos, Niterói, Rio de Janeiro, Brasil. ; Denise Alvarez2 2 Professora associada I do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, Rio de Janeiro, Brasil; pesquisadora do Núcleo de Estudos em Inovação, Conhecimento e Trabalho (NEICT) e do grupo Pesquisa e Intervenção em Atividade de Trabalho, Saúde e Relações de Gênero (Pistas), do Centro de Estudos em Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana, da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, da Fundação Oswaldo Cruz (Cesteh/Ensp/Fiocruz). Doutora em Engenharia de Produção pela Coppe da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com pós-doutorados pelo Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Ensp/Fiocruz, e pelo Departamento de Ergologia da Universidade de Provence, França. < alvarez.dena@gmail.com>

RESUMO

Destacam-se no artigo os riscos potenciais à segurança e à saúde (especialmente a dimensão mental), associados às características do processo de trabalho e ao modelo de gestão do trabalho adotado pela empresa multinacional Schlumberger. Esses dois elementos aliados aos traços predominantes da indústria petrolífera tendem a expor seus trabalhadores a um aumento do custo psíquico (cognitivo, afetivo) em sua integridade biopsíquica (corpo-si). Indicam-se pistas para reflexão relativas à constatação das inadequações da organização do trabalho e do despreparo de muitos trabalhadores para lidarem com a intensidade das 'dramáticas do uso de si'. Questionam-se o alcance do 'sofrimento patogênico' presente na organização do trabalho, o comprometimento da possibilidade de sublimação e a possível conversão do sofrimento em criatividade (condição de 'possibilidade de circulações'). O referencial teórico-metodológico privilegia a ergonomia da atividade e a psicodinâmica do trabalho numa perspectiva ergológica. Os métodos operacionalizam um dispositivo dinâmico a três polos (DD3P) em 'encontros sobre o trabalho' e entrevistas semiestruturadas que valorizam a dialogia.

Palavras-chave: gestão do trabalho; dramáticas dos usos de si; intensificação do trabalho; ampliação da jornada de trabalho; indústria do petróleo.

ABSTRACT

The article emphasizes the potentials dangers to the security and to the health (especially the mind ones), associated to the quality of work's process and to the standard of management work used by the Schlumberger multinational company. Both of these components associated to the main aspects of the petroleum industry tend to endanger its workers to increase their psychological costs (cognitive, affective) in their biopsychical (body itself) integrality. Trails denote the inappropriate workers structure and their despair to deal with the intensity of the 'use of itself drama'. The reach of 'pathogenic suffering' on workers structure, the compromising with the possibility of sublimation and the possibility to transform suffering on creativity (condition of 'possibility circulations') is argued. The theoretic and methodological reference emphasizes the activity's ergonomic and the psychodynamics of work in a ergological perspective. The methods operationalize a dynamic device of three poles (DD3P) on 'meetings about work' and on interviews semi-structured which valorizes the recurrence.

Keywords: management work; dramatic uses of itself; intensification of work; extension of working hours; petroleum industry.

O objetivo principal deste artigo é chamar a atenção para os riscos potenciais à segurança e à saúde (especialmente a dimensão mental), associados às características do processo de trabalho e ao modelo de gestão do trabalho adotado pela empresa multinacional de origem francesa Schlumberger.

Destacamos que as características do processo de trabalho nesse setor referem-se, dentre outros fatores: 1) ao processo contínuo de produção ininterrupto nas 24 horas; 2) ao alto custo de equipamentos e de prestação dos serviços; 3) à pressão temporal decorrente dos dois primeiros fatores; 4) à necessidade de alta qualificação dos trabalhadores; 5) ao confinamento e/ou isolamento das equipes nas operações em campo; 6) aos regimes de embarques (em situação offshore).

Por sua vez, o modelo de gestão do trabalho adotado pela empresa tem como principais elementos: 1) as condições sanitárias e de alimentação precárias nos locais onde são realizadas as operações de campo; 2) a extrapolação da ampliação da jornada de trabalho que afeta, dentre outras esferas, o sistema cronobiológico (gestão do sono); 3) a intensificação do trabalho com o estabelecimento de metas de produção mal dimensionadas; 4) a culpabilização do trabalhador no caso de acidente ou incidentes; 5) o envio de apenas uma equipe para a realização de operações em campo; 6) a remuneração diferenciada paga por trabalho executado (empreitada) sem computar devidamente o pagamento de horas extras.

Lembramos que os traços predominantes na indústria petrolífera tendem a expor seus trabalhadores a um aumento do custo psíquico (cognitivo, afetivo). Um custo elevado e gerado a partir do que é mobilizado no decorrer de certas atividades desta empresa, e que pode adquirir contornos insólitos em situações como as abordadas no presente texto.

Cabe ressaltar que a investigação em torno do caso Schlumberger se insere no escopo de uma pesquisa mais abrangente - "Trabalho, saúde e segurança na indústria petrolífera offshore na Bacia de Campos (RJ)" -, projeto desenvolvido pelo Núcleo de Estudos em Inovação, Conhecimento e Trabalho (NEICT), desde 2003, em parceria com o Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense (Sindipetro NF).

O referencial teórico-metodológico que norteia o projeto privilegia a ergonomia da atividade (Daniellou, 2004; Wisner, 1994) e a psicodinâmica do trabalho (Dejours, 1993, 2008), um encaminhamento sinérgico entre saberes das ciências e da experiência prática pertinentes à análise de situações de trabalho, na linha do que propõe a ergologia.

Percurso metodológico

Neste texto não detalharemos as opções metodológicas que norteiam o projeto mencionado, pois tais conteúdos já foram apresentados em outras contribuições (Alvarez, Figueiredo e Rotenberg, 2010; Figueiredo e Alvarez, 2007). Vale, entretanto, assinalar alguns breves comentários sobre as inspirações e abordagens que nos acompanham e, mais especificamente, os recursos que possibilitaram a elaboração deste artigo.

Os aportes metodológicos utilizados contribuem para uma maior aproximação do trabalho real, assim como do real do trabalho e, por conseguinte, da defasagem entre as dimensões da prescrição e do efetivamente realizado. Isto se dá por intermédio de métodos indiretos, via participação dos trabalhadores nas discussões, ao se valorizar sua experiência acumulada ao longo dos anos, seu saber-fazer, seus atributos associados àquela parcela de conhecimento que emerge no curso da atividade. A atividade é então conceito central que possibilita o olhar sobre as dimensões subjetivas da ação e permite compreender o trabalho como um lugar permanente de microescolhas, de debate de normas e valores. Isso porque no trabalho o sujeito é colocado diante de diferentes racionalidades e valores. Procura-se, assim, operacionalizar dispositivos que dinamizem a relação entre o conhecimento científico e a experiência, tendo como princípio as 'mútuas convocações', combinando desconforto intelectual e humildade epistemológica (Schwartz, 1995).

Inspiramo-nos, então, nas 'comunidades científicas ampliadas' (Oddone, 1984) para mobilizar uma 'comunidade ampliada de pesquisa' (CAP)3 3 Essa comunidade envolveu os pesquisadores diretos (coordenadores do projeto), o grupo sindical (demandante) e um grupo de trabalhadores interessados (contatados via sindicato), além de dois pesquisadores indiretos (para acompanhamento da pesquisa sem participação sistemática no campo) - Milton Athayde, do PPGPS/Uerj, e Jussara Brito, do Cesteh/Ensp/Fiocruz, - em função das supervisões dos pós-doutoramentos dos coordenadores do projeto. (Athayde, Brito e Neves, 2003). Entre o final de 2002 e 2004 acionamos um dispositivo dinâmico a três polos (DD3P), os 'encontros sobre o trabalho' (Schwartz e Durrive, 2010), período em que fizemos vinte encontros (registrados em fitas cassete) que seguiam de maneira flexível um roteiro semiestruturado de conversação, valorizando a dialogia. O conteúdo desse material permitiu-nos acessar aspectos importantes do funcionamento (e disfuncionamento) do sistema técnico e, em âmbito mais global, do processo produtivo, além dos constrangimentos ali presentes. Possibilitou-nos também apreender um pouco da vivência subjetiva que vem à tona ao mobilizar-se a capacidade dos trabalhadores de analisarem sua situação, em especial no que tange à percepção do risco (Dejours, 2008), às reservas de alternativas e aos ingredientes de competência presentes para gerir o trabalho (Schwartz e Durrive, 2010; Schwartz, 1998). As principais questões suscitadas pelos temas debatidos retornavam ao confronto com a literatura acadêmica.

Neste artigo voltamo-nos para a análise de parte do material empírico mais diretamente vinculado ao caso Schlumberger, inserido no escopo da pesquisa mais ampla. No desenrolar do texto tornar-se-á evidente nossa opção por realçar a dimensão dialógica desse material. As referências principais do conteúdo empírico analisado foram as trajetórias de um engenheiro e de uma profissional de nível técnico vinculados à empresa, respectivamente, ao longo de três e cinco anos.4 4 Doravante passaremos a fazer menção a ambos como o 'engenheiro' e a 'técnica'. O engenheiro atuou principalmente no exterior (em países da América Latina), e a técnica no Brasil (fazendo cursos de formação no exterior). O primeiro contato com o engenheiro causou-nos tal perplexidade diante do conteúdo relatado que, imediatamente, propusemos a ele um segundo encontro, no qual fizemos o registro. No caso da técnica, houve um primeiro contato rápido próximo à região de Macaé e num encontro posterior fizemos o registro em gravador.

Como referências complementares mencionamos ainda o contato com um engenheiro, ex-funcionário, que permaneceu cerca de três anos na empresa5 5 Entretanto, neste artigo não foi possível incorporar esse conteúdo à nossa análise. e nossa participação como ouvintes da palestra proferida, na Universidade Federal Fluminense (UFF), em março de 2010, por um outro engenheiro que atuava na área de recrutamento da Schlumberger. Foi-nos igualmente útil registrar a trajetória de uma ex-profissional da Halliburton,6 6 A Halliburton é a principal concorrente da Schlumberger e a segunda no ranking mundial de empresas que atuam em perfuração e perfilagem de poços de petróleo. com experiência de cinco anos de embarque na bacia de Campos.7 7 Doravante passaremos a fazer menção a ela como a 'engenheira'.

A Schlumberger: grande multinacional em serviços de perfuração de poços e seu processo

A Schlumberger é uma das principais referências mundiais na área de serviços petrolíferos, com destaque para a perfuração de poços. Com atuação em nível mundial em contínua expansão possui atualmente algo em torno de 80.000 funcionários espalhados pelo globo, de mais de 140 nacionalidades distintas (Cardoso, 2010, p. 6).

Após as aquisições da francesa Geoservices e, sobretudo, da norte-americana Smith International, no início de 2010, a Schlumberger isolou-se no ranking como a maior fornecedora de serviços para a indústria petrolífera na área de exploração e produção (Cardoso, 2010, p. 6), sendo importante frisar que ela não atua como operadora tal como as grandes petrolíferas Exxon-Mobil, Shell, BP, Chevron, ConocoPhilips etc. Atualmente integra o grupo das quatro maiores empresas de equipamentos e serviços, ao lado das americanas Halliburton, Baker & Hughes e Weatherford - as duas primeiras são suas principais concorrentes, especialmente a Halliburton. Juntas, as quatro concentram 23% do mercado mundial (Fusco e Stefano, 2009).

No que tange à sua estrutura, a Schlumberger se subdivide em segmentos (sísmica, perfuração, perfilagem, testes etc.) e tem se mantido na ponta da disputa tecnológica em seu ramo de atuação por várias décadas. Para se ter uma noção, a empresa investiu US$ 728 milhões em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) somente no ano de 2007 (www.slb.com/content/about/who.asp). Com a exploração do pré-sal decidiu instalar seu primeiro centro de pesquisa no Rio de Janeiro, após um período de seis décadas de operações no Brasil, valendo-se apenas de soluções geradas no exterior (Fusco e Stefano, 2009).

O processo de perfuração consiste basicamente no conjunto de operações e atividades efetuadas para romper as formações geológicas superficiais, ao longo do qual são utilizados diversos equipamentos, estruturas e ferramentas próprias, tais como tubos, brocas e sondas de perfuração. Tais operações são comumente classificadas em rotineiras e específicas. As de rotina são aquelas tidas como normais na atividade de perfuração, e as específicas abrangem todas as operações diferenciadas, indispensáveis em casos particulares, tais como: perfilagem, revestimento do poço, cimentação do revestimento, testemunhagem e completação (Thomas, 2001; Cardoso, 2005).

Os serviços executados pela empresa são cruciais para o andamento dos trabalhos no poço, pois as demais equipes envolvidas, com todos os seus equipamentos mobilizados, dependem da conclusão das operações da Schlumberger para que possam dar continuidade ao processo. Dito de outra forma, os atrasos que, porventura, venham a ocorrer significam que todo o aporte de pessoas e maquinário utilizado pelas outras empresas, em torno do poço, ficará paralisado.

Em geral, em operações como as que participavam o engenheiro e a técnica, os trabalhadores se expõem a uma miríade de fatores de risco, tais como: privação de sono, condições de higiene e alimentação precárias, levantamento e transporte de cargas, material explosivo e radioativo, risco de blow out8 8 Quando um kick (fluxo indesejável de fluidos do interior do poço) não é devidamente controlado, pode se transformar em uma erupção (descontrolada) denominada de blow out. Os mais intensos podem ocasionar acidentes de grande magnitude (Thomas, 2001). etc. Essas intervenções requerem como equipe básica a presença de um engenheiro, de um operador chefe e de, geralmente, mais dois operadores (às vezes três ou mais), de menor qualificação, encarregados do trabalho mais pesado. Os dois primeiros são responsáveis pelas operações no interior de um caminhão, e os outros dois pelas operações no interior de uma caminhonete, ambos os veículos dotados dos respectivos equipamentos necessários para a consecução das tarefas nas intervenções programadas.

Gestão do trabalho, saúde e segurança: usos de si e 'dar a vida por toda a vida'

Se no trabalho offshore as jornadas, turnos e o sistema de embarque constituem fatores extremamente adversos, na Schlumberger os trabalhadores não raramente são submetidos a arranjos completamente insólitos, expostos à condição de terem que se manter em estado de vigília por períodos bem longos, por 24, 48, e até mesmo 72 horas ou mais. Isto porque a empresa não adota o esquema clássico de revezamento em indústrias de processo contínuo, com duas equipes que se alternam ao longo das 24 horas, cada uma cumprindo metade desta jornada (12 horas).9 9 Em plataformas offshore esse revezamento (denominado 14 x 14) se dá ao longo de 14 dias de embarque, período após o qual o trabalhador desembarca e permanece 14 dias em terra. Na Schlumberger, o tempo de embarque pode ultrapassar os 14 dias ou o período desembarcado pode se reduzir (regime de 14 x 7, por exemplo). O trabalhador pode, ainda, desembarcar e ter de retornar ao mar três ou quatro dias depois. Trabalha-se 24 horas por dia, a qualquer hora, sete dias por semana, sob um regime mensal que prevê quatro dias de férias e mais quatro de descanso.10 10 Apenas como base de comparação, num esquema tradicional de trabalho, esses oitos dias corresponderiam aos quatro finais de semana do mês. Em nosso país, entretanto, além dos finais de semana, não são computados como dias de trabalho os feriados e os trinta dias de férias. É comum acumular-se alguns poucos ou, não raramente, vários dias de férias e de descanso, assim como vendê-los, dependendo da chefia local e das regras predominantes no país. Como o engenheiro atuava no exterior, para garantir suas vindas ao Brasil de tempos em tempos, negociou um regime de dois meses e meio ininterruptos de trabalho e três semanas de descanso.11 11 Se a cada mês eles têm direito a quatro dias de férias e a quatro de descanso, em dois meses e meio têm direito de usufruir dez dias de férias e dez de descanso (vinte dias), ou seja, em torno de três semanas de folga, tal como o engenheiro assinala. Contudo, em contextos de grande demanda de serviços pode-se ficar até três ou quatro meses trabalhando direto, sem descansar nenhum dia, como chegou a ocorrer com a técnica e com o engenheiro, respectivamente.12 12 Os possíveis motivos para a adoção dessa jornada extensa são discutidos no item "A aviltante ampliação da jornada de trabalho" deste artigo.

No que tange à remuneração, ela é composta pelo salário fixo e por uma parcela variável paga por trabalho executado (por empreitada), que pode variar em função das características do serviço a ser executado, da região na qual este se realiza, da conjuntura do mercado etc. Como a técnica frisou, esses regimes de trabalho e remuneração são "difíceis de explicar para quem não entende como é a produção de petróleo", para quem se encontra distante de onde a atividade acontece, longe do coração do processo produtivo. Em meio a toda sorte de adversidades e imprevistos, a atividade se faz plena de regulações e renormatizações, sem as quais o trabalho na perfuração se mostraria inviável. Todavia, por maior que seja a capacidade dos trabalhadores, ela parece ser insuficiente para dar conta da extrapolação exacerbada dos limites da jornada de trabalho. Para municiar seus funcionários da forma que julga mais apropriada para o enfrentamento de tais condições, a empresa ministra ensinamentos sobre "técnicas de administração do sono". Ou seja, como fazer para romper com os limites que a necessidade de sono nos impõe, não apenas no que concerne à ampliação da jornada de trabalho, mas também à reprodução da força de trabalho.

Desde 1991, a empresa implanta programas que relacionam performance à fadiga, tentando combater o que denomina de "síndrome do comportamento automático". No curso de treinamento, por exemplo, são fornecidas informações sobre o desempenho dos indivíduos após cochilos de variadas durações e sobre a variação do nível de alerta segundo a hora do dia e o número de noites sem dormir, extraídas do relatório "Schlumberger: managing a 24-hour lifestyle - gerenciando um estilo de vida de 24 horas" (PTAC, 2001) - como se observa nos Gráficos 1 e 2. O título do documento já indica que os indivíduos valorizados pela empresa devem "viver 24 horas para o trabalho". E, para isso, "administrar o sono" é uma das estratégias.



Os relatos a seguir deixam transparecer certa incredulidade dos pesquisadores acerca da não existência de uma segunda equipe para revezamento e da não previsão de tempo e local minimamente apropriados para descanso. Vê-se pelo diálogo que, mesmo para aqueles que possuem algum conhecimento sobre o trabalho na produção de petróleo, é difícil entender, ou aceitar, os esquemas de organização do trabalho implementados pela Schlumberger:

- Em algumas bases, quando o trabalho era muito longo, aí sim levava um trailer pro pessoal tentar descansar um pouco e tal (Engenheiro 1).

- Muito longo são (...)? (Pesquisador 1).

- Mais de quatro dias (E 1).

- Quer dizer, esse que era dois, três dias, vocês... (P 2).

- Dois, três dias é uma equipe só (E 1).

- Uma equipe, aí acampa? (P 2).

- Não, não tem. Não acampa, não tem lugar, você está numa área de trabalho (E 1).

- Você não dorme? (P 1).

- Você dorme... quando dorme. O engenheiro que, teoricamente, não dorme, dorme na cadeira da caminhonete ou no chão ou... Teoricamente você não dorme, você não pode dormir, você está trabalhando. Mas o engenheiro, vamos supor, num trabalho de três dias, tira soneca. A ferramenta começa, tem uma velocidade, você bota tudo de uma certa maneira que você vê que não tem perigo, você fala pro cara do guincho não dormir e você dorme um pouco. Dorme 15 minutos, meia hora (E 1).

O engenheiro "teoricamente não dorme", mas seguir esta prescrição à risca inviabilizaria sua permanência no campo, portanto, no curso do trabalho real ele irá de alguma forma tentar cochilar contando com a ajuda do operador do guincho. A cooperação que aí se estabelece permite suprir os "vazios de normas" (Schwartz, 2010a) da situação, já que, como veremos na sequência, não existe algo "predeterminado" que indique o momento a partir do qual e o quanto se pode descansar. Diante de tal paroxismo os pesquisadores, no decorrer da entrevista, continuam a se mostrar intrigados com a falta de previsão formal de descanso:

- Não tem previsão de descanso? Parte-se da premissa que você vai estar em estado de vigília o tempo inteiro... (P 2).

- (...) Teoricamente, nesse trabalho de dois dias, até dois dias, se entra o cliente ou entra alguém ali e te vê dormindo, você vai tomar 'esporro', você não é pra dormir (E 1).

- Em 48 horas? (P 1).

- Bem... Não tem uma coisa predeterminada que a partir de 24 horas ou de... Mas [a empresa] está esperando que, vamos supor, você está indo ali trabalhar. Se, de repente, pega num cochilinho, tudo bem, a partir do segundo dia, né? No primeiro dia, vai tomar 'esporro' (E 1).

Assim, dependendo do tempo de duração da intervenção, em algum momento o engenheiro será vencido pelo cansaço e terá de cochilar. Para tanto, aguarda o momento oportuno em que as condições no interior do poço mostrem-se propícias e conta com a ajuda do operador, pois não há garantias de que não ocorra algum problema repentino. Este irá monitorar os registros na tela do computador enquanto o engenheiro descansa. O problema é que não raramente ao acordar, minutos depois, o engenheiro depara-se com o operador dormindo, deixando-o numa situação bastante vulnerável, pois, em última instância, ele (engenheiro) é o responsável pela operação. Mas, então, como proceder para manter-se em estado de vigília o máximo de tempo possível? Ficar olhando para a tela do computador na alta madrugada pode fazê-lo adormecer, pois quanto maior a privação de sono, menor o período de manutenção do estado de alerta, como se pode visualizar no Gráfico 3.


Uma estratégia recorrente é preparar os relatórios que serão entregues para o cliente ao término do registro. Recurso que permite não só manter-se em estado de vigília, como também antecipar o horário de saída. Realizar etapas pesadas das montagens de equipamentos, mesmo na alta madrugada, colabora igualmente para não sucumbir ao cansaço. O custo será um desgaste elevado para o organismo, pois como atestam os estudos de cronobiologia e o Gráfico 3, num período considerado crítico (alta madrugada), não poderá relaxar nem dormir e ainda será exposto à sobrecarga de trabalho.

De todo modo, um bom entrosamento com os outros membros da equipe é fundamental nessa situação. O engenheiro percebe a importância de respeitar algumas das regras informais engendradas pelo coletivo (Cru, 1988), sob pena de não ter a contrapartida necessária da equipe em momentos críticos, em que um engajamento mais efetivo de seus membros se faça vital para a eficácia da operação. Em poços onde atuou, onde havia caminhões maiores, equipados com cama, esta era tradicionalmente ocupada pelo operador-chefe, tido como 'dono' do caminhão, e não o engenheiro. Além disso, como já dissemos, é comum o engenheiro ajudar o restante da equipe na montagem das ferramentas e equipamentos, embora esta não seja sua tarefa formal. São exemplos de regras com estatuto de informalidade que se integram configurando as sinergias presentes nas "entidades coletivas relativamente pertinentes" (Schwartz, 2010b). Essa dimensão do trabalho, que não consta dos procedimentos formais, pode ser um requisito indispensável para que determinadas manobras sejam realizadas com eficácia e segurança.

Acidentes de trajeto, gestão 'esquizofrênica' dos riscos e dramáticas do uso de si

O maior índice de acidentes na empresa está relacionado à condução de veículos. Como assevera o engenheiro, confirmado pelo outro engenheiro da empresa, palestrante na UFF, que atuava no recrutamento: "o maior índice de acidente, de morte, de qualquer coisa, é direção". A afirmação não nos causa surpresa, se levarmos em conta que, após jornadas excessivamente longas, os operadores dirigem até a base, ou para outro poço, para a realização de algum outro serviço. Numa tentativa de avaliar as condições dos profissionais para assumir a direção dos veículos, a empresa possui um sistema de check list de segurança, contendo em torno de 20 a 25 itens. Primeiramente, verificam-se os itens diretamente relacionados ao veículo: faróis e lanternas, cintos de segurança, vidros, água, óleo, calibração etc. Além destes, examina-se o funcionamento do telefone celular ou do rádio.

Em seguida, um outro check list avalia itens como número de pessoas que ocuparão a caminhonete, tipo de estrada, distância do local de destino. A todos estes itens é atribuída uma pontuação. Por exemplo, se há mais de duas pessoas, se a estrada está em bom estado, se o trajeto é percorrido por dois veículos ou mais, se o local de destino é próximo, a pontuação é baixa. Do contrário, os valores assinalados serão elevados. Um terceiro check avalia quantas horas o funcionário dormiu nas últimas 24 horas. Nesta listagem quanto menor o número de horas de sono, maior a pontuação. Ao final, somam-se os valores atribuídos a cada um dos itens e chega-se a uma pontuação final: até 10 pontos o supervisor assina e libera a viagem, entre 10 e 20 pontos só o gerente pode assinar, acima de 20 só o gerente geral pode autorizar.

- Então, muitas vezes, no meio da madrugada, a gente ligava pro gerente geral e falava: 'Olha a minha lista deu tanto, posso ir?' Aí o cara dava 'esporro'... O gerente geral dava 'esporro' no gerente, porque, tipo, como a gente tinha chegado naquela situação. Então o gerente dava 'esporro' na gente, porque a gente tinha administrado mal o nosso tempo, que era pra ter saído antes, isso, aquilo, aquilo outro... (E 1).

- Mas aí? Não saía? (P 2).

- Normalmente saía (E 1).

- Mesmo com a pontuação estourada? (P 2).

- Dependendo (...). Se existia uma condição de não sair e era muito crítico... Porque, normalmente, o gerente jogava a responsabilidade pra cima da gente, falava: 'Você acha que pode ir? Você acha que tem condições de dirigir?' Se você falasse: 'Não tenho condições de dirigir, a pontuação é muito alta, eu não vou', os caras: 'tudo bem' (E 1).

- Tudo bem? (P 2).

- Tudo bem, mas... 'por que você não gerenciou o seu tempo pra ter ido ontem? Por que você está indo agora?' (E 1).

O cenário descrito explicita uma autêntica "dramática do uso de si" (Schwartz, 2010a), em que o debate de normas se dá sob o 'fio da navalha', pois a decisão de dirigir ou não ocorre num contexto em o que o funcionário encontra-se premido entre as normas de segurança e as normas que balizam o cumprimento das metas e os indicadores de produtividade. Uma alternativa para minimizar o sofrimento que o acomete, diante do antagonismo entre segurança e produção, é evitar que a situação chegue a este limiar. Contudo, há situações em que, por maior que seja a capacidade da equipe de 'gestão do tempo', as exigências de produtividade e qualidade resultarão em pontuação elevada. Portanto, se a situação se degradou no que concerne à pontuação, resta como último subterfúgio preencher o check list com pouco rigor. Evita-se o dissabor de ter de pedir autorização aos superiores hierárquicos, tendo que reconhecer perante a gerência que não foi suficientemente hábil, competente, ou pró-ativo, e exime-se também de parcela da responsabilidade que lhe será imputada caso decida conduzir o veículo e ocorra um acidente. Isto porque, como é de praxe nos mais variados contextos, se interpelado após a ocorrência de um sinistro sobre o porquê da autorização dada, o gerente poderá argumentar a seu favor que o seu subordinado afirmara estar em condições de dirigir.

Parece-nos que adotar o recurso de preenchimento do check list de forma pouco criteriosa também possibilita uma espécie de falseamento da dramática, certo endosso à atuação dos sistemas defensivos (Dejours, 1993), pois, embora a gerência faculte a ele a decisão final, sabe-se que a repetição da recusa pode acarretar futuras represálias. Não recusar irá confrontá-lo com o dilema de parar ou não, caso não suporte a sensação de cansaço ao longo do percurso. Cansaço que, aliado ao cochilo, pode trazer consequências graves como se constata no Gráfico 4, que correlaciona variação do estado de alerta com grandes acidentes.


O relato a seguir apresenta um outro recurso do qual o engenheiro pode lançar mão, o que já constatamos recorrentemente em outras situações na indústria do petróleo - um tipo de regra de ouro (Cru, 1988) que funciona como sistema defensivo, isto é, nunca "bater fofo", nunca assumir "eu vou parar", ou então acreditar que "um pouquinho mais eu aguento". Caso não queira se defrontar com esta verdadeira prova de estoicismo - parar ou não parar o veículo após uma jornada extenuante, sem a compensação mínima de um sono reparador - uma saída é não se expor. Recusar-se a dirigir à noite, livrando-se do risco de acidente, mas arriscando-se a se tornar um alvo da gerência.

- O que muitas vezes fazia era dormir. É... dirigindo. Você sentia que sua cabeça ia balançando, balançando. E, teoricamente, você tinha que parar. Só que muitas vezes, o poço estava esperando, e você falava: 'Um pouquinho mais eu aguento, um pouquinho mais eu aguento'. Aí falava: 'Não aguento mais', botava outro, e várias vezes eu acordei e tinha dado uma piscada. E tem operador que fala que está legal, dirigindo, e quando você acorda o cara está indo no meio da pista. Eu vi a caminhonete, eu indo para o poço, a caminhonete saiu da pista... dormiu... foi embora. Bateu e voltou (E 1).

- Teve já caso de acidente assim? (P 2).

- Teve um cara que saiu do poço que eu estava, foi lá buscar uma ferramenta para levar para o outro poço... Na estrada, tinham duas pistas, ele foi passar um caminhão... Dormiu, entrou por debaixo do caminhão. Eu tomei o maior 'esporro', o outro cara, do outro poço, tomou maior 'esporro', esse cara tomou um pouco de 'esporro', porque era operador novo. Mas se a gente não mandasse aquela peça também ia tomar 'esporro' porque não tinha mandado a peça (E 1).

Em verdade, conquanto a retaliação ocorra em ambos os encaminhamentos, a nosso ver, é nítido o primado da produção em detrimento da segurança, pois a exigência de envio da peça, mesmo em condições completamente desfavoráveis, rechaça qualquer possível ambiguidade a este respeito. A falta de respaldo para medidas de segurança elementares, como a existência de uma segunda equipe, mesmo sabendo-se da necessidade de condução de veículos após a conclusão dos serviços, e a exposição dos trabalhadores às consequências daí advindas podem tornar insustentável o gerenciamento de riscos nas conjunturas mais agudas, indo bem além daquilo que Machado (1996) chamou de "gerenciamento artificial de riscos". Pode-se mesmo chegar a uma gestão 'esquizofrênica' dos riscos, como atesta o caso envolvendo um gerente que, diante da pressão exacerbada da direção para redução do índice de acidentes com veículos, asseverou aos funcionários:

[Ele disse] Se alguém tivesse algum acidente e fosse por culpa própria, ele demitia, porque todo mundo tinha recebido treinamento pra não sofrer acidente. E tinham umas listas enormes [check list] que você tinha que preencher e, se tudo aquilo estivesse perfeito, você não teria porque ter um acidente. Muitas vezes não dava certo a lista e aí os caras: 'Tá, vai assim mesmo'. E o cara falou que se alguém tivesse algum acidente e não fosse sua culpa e sim do outro, talvez você não fosse culpado, mas você estava sendo azarado porque alguém bateu em você e, na situação que a empresa estava, não podia admitir pessoas azaradas. Então ia pra fora da mesma maneira (E 1).

Sob forte pressão, a gerência parece ter retornado a uma concepção retrógrada no campo da saúde e segurança. Se atribuir ao ato inseguro a causa principal pela ocorrência dos acidentes já é uma visão retrógrada, o que dizer de uma concepção que penaliza os trabalhadores pelo suposto azar que os acometeria se ocorressem tais eventos? De certo modo, é como se a responsabilidade migrasse do plano individual para o 'metafísico', numa tentativa desesperada de não reconhecer a responsabilidade daqueles que organizam o processo de trabalho e compactuam com o cumprimento de metas que seriam tidas como inexequíveis caso se respeitassem as exigências de saúde e segurança. Daqueles que, na lógica do capital, estão investidos do poder de tomar as decisões nesta esfera.

A aviltante ampliação da jornada de trabalho: de volta ao século XIX

Alterar a organização do trabalho significa com frequência evocar tensionamentos das relações capital e trabalho e enfrentar as resistências daí decorrentes. Tarefa mais árdua em um contexto em que o capital reproduz instrumentos de exploração que mais parecem os empregados no século XIX, dadas as suas características, como é o caso da ampliação da jornada de trabalho na Schlumberger. Não são novas as investidas do capital para se apropriar do tempo do trabalhador. Ao descrever o cenário de expansão do capitalismo no século XIX, Marx dedica algumas páginas de O capital a essa questão.

Obviamente, não é nossa intenção fazer um paralelo estreito entre o cenário descrito por Marx no século XIX e o que ora apresentamos. Embora na média sejam jovens, os trabalhadores de campo da Schlumberger não são crianças, possuem o amparo de uma legislação trabalhista inexistente naquela época, e se os riscos de acidente são inúmeros, não podem ser comparados à gravidade da insalubridade e da periculosidade de então. Nossa perplexidade é grande pela constatação de que as situações encontradas nos relatos são fruto de uma opção de gestão do trabalho, pois a determinação de uma equipe suplementar poderia aliviar, em parte, o impacto desse custo biopsíquico aos trabalhadores.

Não desconsideramos os problemas logísticos decorrentes dessa escolha, mas acreditamos ser uma alternativa plausível. Há casos em que a ida de duas equipes para revezamento, em tese, não está descartada, contudo se essa for a alternativa adotada, a parte da remuneração referente à empreitada terá de ser dividida entre elas. A divisão da remuneração aliada à regra de ofício de ouro do "não poder bater fofo" ("aguentar apesar de tudo"), atuando como sistema defensivo e expondo certa exaltação da virilidade (Dejours, 1999), dificultam mais ainda a opção pela segunda equipe. A própria tradição da empresa reforça o padrão 24 horas, ou seja, a não adoção de dois turnos, segundo o engenheiro. Para o coletivo, a aquiescência episódica aos dois turnos significaria jogar luz sobre as dificuldades do trabalho no regime de 24 horas, o que talvez o tornasse ainda mais insuportável, na medida em que este é o padrão usual e incentivado pela direção. Como se fosse uma chamada à razão em meio ao desvario da subordinação imposta pela jornada de 24 ou mais horas.

Os exemplos até agora elencados apontam para o fato de que, por maior que seja o potencial de renormatização em tais circunstâncias, em algum momento, o corpo irá esbarrar com os seus limites. Resta saber até onde se pode aguentar, ou quais são os recursos disponíveis (quais são as 'reservas de alternativas') para contornar os obstáculos que inexoravelmente se interpõem no curso da jornada. Na ausência de uma segunda equipe para assumir a continuidade das tarefas, dormir de meia em meia hora pode ser uma saída, talvez a única dependendo das exigências:

- Eu já passei uma semana embarcada, numa situação assim: eu não podia dormir, e tinha que ficar dentro da minha unidade, tinha que fazer um teste de meia em meia hora, então eu cochilava ali, meia hora, fazia o teste, acompanhava, acompanhava, meia hora, dormia (Técnica 1 - T 1).

- Uma semana sem dormir mais de meia hora? (P 3).

- Uma semana. Foi um dos meus piores trabalhos, não foi o pior, mas foi um dos piores... (T 1).

- Não foi o pior? (P2).

- Em termos de tempo acho que foi o pior, mas, assim, de complicação não foi o pior. E é complicado nesse sentido, mas a Schlumberger não manda subir outro técnico... É muito difícil mandar, você está lá, você se vira sozinho, quer dizer, existe uma demanda muito grande pra os poucos técnicos que tem... (T 1).

A técnica observou que a alta demanda de serviços não é adequadamente atendida pelo número de técnicos existentes na empresa, pois com o elevado número de desistências nem sempre a empresa logra êxito na reposição de funcionários com a qualificação requerida. Ela salientou que foi selecionada com mais quatro profissionais dos quais dois deixaram a empresa com menos de dois anos de contrato e, em seguida, os outros dois também partiram. Ela foi a última a sair e a única que completou cinco anos. Foi enfática ao afirmar que "o pessoal não se adapta com o estilo de trabalho".

Densidade do trabalho e dimensão subjetiva: mobilização do corpo-si ao extremo

Figueiredo e Athayde (2004) já destacavam a eficácia de algumas regras do trabalho atuando como sistemas defensivos. É importante frisar que no caso do offshore a postura de "nunca bater fofo" assume esse status, porém as "infidelidades do meio" (Canguilhem, 1995) em profusão, ou até mesmo a representação atroz que um acidente venha a adquirir, por vezes, são capazes de desestabilizar este tipo de conduta. Resta saber o que permite sustentar o psiquismo numa situação como a relatada aqui, que testa de forma incisiva a resistência à adversidade, ao cansaço que beira o esgotamento completo. Cabe não esquecer que este tipo de trabalhador não é formado apenas para atuar no offshore, pois ele também atua em terra (onshore), como exemplificamos em algumas passagens. Tal como os 'trecheiros' (que vivem no 'trecho', de um canto a outro) da construção civil, eles devem estar preparados para intervir nos mais variados locais, em condições extremas. São os 'trecheiros do ouro negro', e aqueles que mais se destacam integram a linhagem dos que possuem 'sangue negro'.13 13 Alusão ao filme homônimo estrelado por Daniel Day-Lewis em 2007. Para eles o "debate de normas" (Schwartz, 1992) se dá atravessado por exigências que desafiam sua capacidade de mobilização física, cognitiva e psíquica, e que, portanto, desbordam a capacidade de mobilização do "corpo-si". Com efeito, a forma com que se desenrola este trabalho confirma as afirmações de Wisner (1994). Ele salienta que os efeitos poluidores sobre outras esferas da vida serão tão mais consideráveis quanto maior a densidade de uma dada situação de trabalho. Isto nos ajuda a compreender a dinâmica descrita a seguir, a respeito da possibilidade de se "viciar" no trabalho:

Com certeza [perguntado se sentia falta da adrenalina do trabalho]. Eu, por exemplo, nas primeiras vezes que eu fiquei lá fora, eu voltava e ficava duas, três semanas aqui. Então, numa das primeiras vezes que eu voltei, depois que eu já estava trabalhando como engenheiro, a primeira vez que eu dormi, eu acordei e não sabia nem onde eu estava. Eu acordava falando espanhol, eu acordava... Assim, perdido, completamente perdido, completamente perdido. Porque quando você estava lá no trabalho era uma coisa tão intensa que você, vamos supor... Minha mulher falava: '(...) eu tô sentindo sua falta'. Lá você nem sente falta das pessoas, porque é tão intenso o trabalho, é tão... Que às vezes você não tem tempo nem de pensar nas coisas. E quando eu voltava era comum acontecer isso: 'Pô, onde é que eu estou?' E... perdido (E 1).

Por vezes, o engajamento no trabalho é de tal modo intenso, é "tão"..., que aquilo que se encontra para além da esfera do trabalho fica meio em suspenso. A volta para o espaço doméstico, com uma ruptura abrupta em relação à dinâmica instaurada para suportar tamanha pressão, não poderia se dar sem ônus. Os sinais se manifestam já na primeira noite, no desencontro com toda aquela intensidade do trabalho nos poços de petróleo. Fica-se, assim, "completamente perdido". Se não faltam elementos para constatarmos o potencial de sofrimento psíquico que a situação embute, por outro lado, faz-se necessária certa cautela para que, numa visão apressada, não pensemos que tal situação não ofereceria qualquer espaço para a vivência do prazer. Vejamos na continuação do relato anterior:

- Quando eu saí da empresa, com certeza [sentia falta da adrenalina]. Porque o trabalho era um trabalho muito... Mas você vicia, você pega vício do trabalho. Eu tirava férias, às vezes, de um mês, um mês e meio e no final das férias eu estava de saco cheio, doido pra voltar pra lá pra fazer o trabalho. Não voltar pra lá [para o local simplesmente], mas... Porque tem... Esse trabalho, que eu fazia lá, pelo menos pra mim, gerava muita satisfação. Você sair do trabalho e fazer o trabalho bem... Com certeza eu nunca vou ter tanta satisfação num trabalho como eu tinha lá (E 1).

- Por quê [em tom de perplexidade]? (P 2).

- Porque, quando tudo saía mal e no final você conseguia fazer alguma coisa que saísse bem... Era muito bom... Era muito bom. E se num trabalho num escritório que não tem tanta intensidade, você não sente isso... (E 1).

A técnica também reconhece que, apesar da nocividade das condições em que transcorria sua atividade, o trabalho "não tem só coisas ruins, tem coisas boas também". Sobretudo na ida ao campo, pois, além do acréscimo na remuneração propiciada pelo pagamento dos bônus referentes às empreitadas nos poços, os conhecimentos são enriquecidos na lida com novas situações e novas ferramentas. No campo, o trabalho é exercido com maior autonomia e ao concluí-lo vivencia-se "a satisfação do dever cumprido", que lhe parece inalcançável no contexto de pendências burocráticas intermináveis da base. Em meio a toda sorte de desafios, a atividade no campo abre espaço para o engajamento da potência presente no trabalho vivo, para que no exercício do trabalho, em sua dimensão concreta (Marx, 1988), sinta-se uma verdadeira profissional. Como assinala no relato a seguir, sua satisfação é no campo: "é a minha profissão".

- Me dava muita satisfação sim. Quer dizer, quando eu passava, apesar dos três meses direto, mas quando eu ia mais pro campo que pra base, eu gostava mais do trabalho. Pô, maluquice, você gostar mais do risco, e tal, mas... (T 1).

- E o que te dava mais prazer aí? (P 1).

- Primeiro, porque você sempre aprendia mais. Sempre uma situação nova, sempre uma ferramenta nova, um perfil novo, um poço novo, e quanto mais vezes você ia, mais você se aprofundava no seu conhecimento. Aquilo que me dava dinheiro de fato, ali eu não tinha perturbação, porque ali eu era a líder da minha equipe, e ali eu tinha a satisfação do dever cumprido. Cada vez que eu era chamada pra fazer um canhoneio,14 14 Para estabelecer a comunicação entre a formação produtora e o interior do poço, perfura-se o revestimento deste com o emprego de cargas explosivas especialmente moldadas para tal finalidade (o canhoneio) (Thomas, 2001). quando eu acabava o canhoneio, era mais um dever cumprido. Na base você nunca tinha o dever cumprido, entendeu?... Então a satisfação minha é no campo. É a minha profissão. E eu gostava do meu trabalho de campo. Gostava mesmo, é muito fascinante essa área. Muito fascinante, não tem só coisas ruins, tem coisas boas também (T 1).

Na medida em que a relação com o trabalho é vivida também afetivamente, abre-se espaço para vivências muito diversificadas de prazer e de sofrimento (Dejours, Abdoucheli e Jayet, 1994), para muitos devires. No caso estudado, essa relação dá-se muito intensamente e nossa percepção indica que - se na dinâmica do funcionamento psíquico, na economia do prazer/desprazer (sofrimento), é grande o potencial de sofrimento patogênico, com riscos de desestabilização - isso não nos permite afirmar que a possibilidade de vivência do prazer esteja obstruída por inteiro. Entendemos que um dos componentes essenciais dessa dimensão subjetiva está vinculada ao desafio cotidiano colocado a esses trabalhadores, impondo uma conduta que não descarta, tal como assinalado anteriormente, o espaço para conversão do sofrimento em criatividade. Portanto, não se trata aqui de amenizar a experiência da exploração a que são submetidos, mas de questionar até que ponto se poderia aceitar que esta anularia por completo a possibilidade do engajamento da criatividade; até onde a captura da produção subjetiva, que efetivamente ocorre, impediria a emergência da dimensão inventiva da atividade. Ou a enorme satisfação a que se referem os profissionais, anteriormente, só é possível em consequência da alienação a que se encontram submetidos? Fruto de uma produção de subjetividade que estreita a visão que teriam sobre o espectro de alternativas para vivências do prazer em situações potencialmente menos deletérias. Ainda que concordássemos parcialmente com o papel que joga tal 'estreiteza', podem-se atrelar a ela a mobilização do potencial inventivo e a importante função que desempenha para a vivência do prazer.

Segundo Schwartz (2010c, p. 26), caso não se faça um esforço para ver de perto (o olhar com a lupa) como cada um não apenas 'se submete', mas vive e tenta recriar sua situação de trabalho, então "interpreta-se, julga-se e diagnostica-se no lugar das próprias pessoas e isso não pode produzir resultados positivos". Por outro lado, isto não significa negar a exploração desta dimensão criativa pelo capital. Hardt e Negri (2003), ao problematizarem a mais-valia na produção pós-moderna e o papel que nesta joga a atividade criativa, nos alertam que a exploração consistirá fundamentalmente na expropriação por parte do capital do excedente expressivo e da cooperação do trabalho vivo. Todavia, insistimos que o risco de desestabilização mental está colocado e, em casos extremos, as consequências podem ser nefastas, como nos confirmou o engenheiro ao narrar um acidente fatal com o teste de explosivos.

'Dar a vida por toda a vida' e os sistemas defensivos

Apesar de o engenheiro ser um funcionário com reconhecida competência tanto pelos pares quanto pela chefia, após sua saída, ele não se assume como "um funcionário bom para a Schlumberger". Para tanto há que se ter disponibilidade em tempo integral para a empresa, ao longo das 24 horas do dia, disposição para trocar de país de tempos em tempos, para viver no 'trecho global' da indústria do petróleo. Aqui, em última instância, o capital demanda uma subjetividade disposta não a "dar a metade da vida e descansar a outra metade, mas a dar a vida por toda a vida". Nessa entrega maior residiria o espírito do "funcionário Schlumberger":

Eu não sei até que ponto eles mantêm esse nível de exigência tão alto pra poder deixar só subir os que são muito bons e que estão dispostos a levar aquela vida... Porque eu acho que não sou um funcionário bom pra Schlumberger, porque eu não estou disposto a... Eu acho que fui muito bom pra Schlumberger enquanto eu estive lá. Mas pra empresa continuar investindo em mim eu não sei se era bom porque eu não estou disposto a dar a minha vida pra empresa por toda a minha vida. Ficar mudando, a cada três anos, de país e tudo isso. Então eu não sou exatamente um funcionário... Eu acredito que eu não sou um funcionário Schlumberger... E se você pergunta pra uma pessoa que está dentro da empresa, ela quer isso. Tipo... Ela está ali é pra dar a vida, não é pra dar a metade da vida e descansar a outra metade da vida, de forma geral. As pessoas que querem isso, normalmente, não é a pessoa que a empresa quer. A empresa quer uma pessoa que se dedique 100%... Porque se uma pessoa, por exemplo, pensar: 'Não, mas é melhor que a pessoa trabalhe 12 e descanse 12'. Mas você acha que essa pessoa que quer descansar 12 quando trabalha 12, será que essa pessoa vai estar disposta pra daqui a três anos ir pro deserto no Saara? Depois de três anos ir pra... Não sei, Guiné Bissau ou outros, lá pra Ásia ou... Não sei. Então, provavelmente, o que trabalha 24 horas vai querer. Então é mais provável que ele queira mais um ritmo de trabalho desse maluco do que o outro... (E 1, grifos nossos).

Conquanto não julgue encarnar o espírito maior que pautaria a conduta do típico "funcionário Schlumberger", o engenheiro se reconhece como alguém que reúne alguns dos requisitos indispensáveis para trilhar o percurso dentro da empresa, fugindo a um suposto padrão de normalidade, incapaz de sustentar a permanência nas condições aqui descritas:

- Tem que ser uma pessoa meio aventureira, que gosta muito de aventura, que gosta de desafio e tal. E eu, pessoalmente, acho que não pode ser uma pessoa muito normal, pra gostar dessa vida pra vida toda. Então, muito normal a pessoa não pode ser. Tem que ser uma coisinha meio de maluquinho e tal (E 1).

- Ou seja, você enxerga em você um... (P 1).

- É... Eu sempre fui um pouco de aventura, de fazer coisa maluca, assim... Um pouco, sim... (E 1).

Pode-se questionar se essa concepção estereotipada não estaria vinculada à construção dos sistemas defensivos, no rastro da análise empreendida por Dejours (1991) para os pilotos de caça franceses, ou da realizada por Figueiredo e Athayde (2005) para o trabalho de mergulho profundo na bacia de Campos (RJ). Sem querer traçar paralelos de forma ligeira, até pelas características muito peculiares de ambas as situações (aviação de caça e mergulho profundo), levantamos a hipótese de que se encontraria nesse suposto estereótipo (que afirmaria essa 'fuga aos padrões de normalidade') uma parcela da justificativa para a aceitação do permanente desgaste e do desafio ao risco que caracterizam a atividade de perfuração. Cabe então perguntar até onde a defesa que se sustenta em torno desse estereótipo estaria sendo explorada pela organização do trabalho com tal finalidade.

Vale mencionar aqui o episódio do blow-out comentado pelo engenheiro. Ele ainda atuava como trainee e, apesar de frisar o elevado nível de tensão a que o evento os expôs ("tanta adrenalina"), ele presenciou o que aparentemente seria uma conduta insólita dos membros de sua equipe, pois as falas após o grave incidente não traduziam o desespero que se instaurou no curso do evento: "Como ninguém se machucou... Todo mundo, pô, foi maneiro, não sei o quê...". Mais do que mostrar uma outra possível indicação de atuação dos sistemas defensivos, na linha da exaltação do perigo, nosso intuito é salientar que a adesão a tais condutas tidas como estereotipadas vai se dando tanto no cotidiano do trabalho, como em episódios marcantes, quando ainda se é trainee, acontecimentos que ao fazerem 'inscrições' na subjetividade também podem produzir elos importantes para a constituição dos sistemas defensivos coletivos, com maior ou menor grau de intensidade e adesão. Inscrições que vão se constituindo em um verdadeiro patrimônio das entidades coletivas relativamente pertinentes (Schwartz, 1995) que estão vivenciando essas espécies de 'ritos de passagem' coletivos.

A família Schlumberger e o 'mundo paralelo'

Sabendo das enormes dificuldades para manter profissionais sob um regime de trabalho dessa natureza, a empresa garante condições para que os profissionais possam ter sua atenção e energia voltadas exclusivamente para o trabalho. Disponibiliza infraestrutura para dar suporte às mais variadas demandas, pois há um setor voltado inteiramente para resolução dos afazeres pessoais cotidianos das equipes de campo. De pronto, a empresa oferece casa mobiliada com serviços domésticos, e as contas a pagar chegam diretamente para este setor, que se transforma numa espécie de "apoio familiar" para os profissionais, na visão do engenheiro. A empresa monta um arranjo capaz de aproveitar ao máximo o potencial de seus funcionários, o que também passaria por manter certo aproveitamento do tempo vivido fora do espaço produtivo e obter uma espécie de "capitalização do descanso". Uma tentativa de ampliação do controle ininterrupto que se dá na esfera da produção para a esfera da reprodução social. Para melhor compor com este arranjo, os trabalhadores permanecem munidos de dois celulares e um rádio que devem permanecer ligados para qualquer emergência que implique a interrupção do tempo de descanso, ou mesmo das férias, se a urgência for imperiosa. Pode-se ter de alterar repentinamente os planos da vida pessoal, ainda que de antemão se tenha alertado a empresa que o momento é de indisponibilidade para o trabalho no poço:

- É, uma vez, ela, minha esposa foi pra lá, ia passar duas semanas, então eu já tinha avisado que eu ia tirar uma semana de férias e na outra semana tinha sido programado de eu não ir pro poço, pra eu ficar na base, trabalhando na base. Tirei uma semana de férias e os caras falaram: 'Tem poço, não tem ninguém pra ir, você vai, mas faz o trabalho e volta'. Eu fiquei uma semana e dormi um dia em casa. E isso porque estava avisado que eu não ia pro poço. E aí teve um dia que eu falei: 'Bom, minha mulher veio pra cá...'. Aí peguei ela e levei pro poço. Ela ficou no poço comigo... Ficou uns dois dias e depois voltou. Dormindo na caminhonete, comendo mal, sem banheiro (E 1).

- E daí, o que ela falou? (P 2).

- Ah, vida de maluco, né? (E 1).

Ao abordar tais aspectos do trabalho, a técnica reconhece que seu salário é elevado em relação à média nacional, porém entende ser mal remunerada quando considera as condições do trabalho a que se expõe e os constrangimentos pelos quais é obrigada a passar:

- A gente que está lá dentro, a gente quando está numa roda de amigos, comenta... Eu sou muito mal paga... O povo diz 'você está maluca!'. Ainda mais com as remunerações que a gente tem aqui no Brasil, né... 'Pô, você está louca, é salário de engenheiro...' Eu sou muito mal paga! Olha os riscos que eu passo, os constrangimentos que eu tenho que passar... Sem contar, o pior dos piores, que mais me incomodava: domingo, estou doida pra ir pra praia, já botei o isopor no carro, cerveja, estou com o marido já no carro, meus amigos, e toca o celular... Ou, pior ainda, acabei de chegar na praia, uma hora de viagem... Aí eu falo pro pessoal: 'Não estraga a vida de vocês não, fica aí que eu pego um táxi'... Aí eu falo: 'É a escravidão, o mundo Schlumberger...'. A sua família é um mundo paralelo, a Schlumberger em primeiro lugar.... (T 1).

- Quando a Schlumberger te libera, você vê sua família, né?... (P 3)

- Isso. Folga era garantida? A gente brigou muito lá. O cara está de folga, dá um jeito, chama o papa, mas não chama o cara que está de folga, mas eles chamavam... (T 1).

Ao que expusemos anteriormente, agrega-se o "pior dos piores", o que mais a incomoda, isto é, o que vivencia como escravidão no mundo Schlumberger. Se já é recorrente a referência aos 'dois mundos' no regime de embarque, as relações de trabalho nesta empresa assumem tal conformação que é como se no 'mundo de lá' - do offshore, do trabalho em turnos da indústria do petróleo também presente no onshore, em meio ao isolamento e ao confinamento - houvesse um submundo onde estes e outros subcontratados se expõem a tais vivências de modo mais incisivo. Nesta dinâmica, a vida na esfera familiar adquire a condição de 'mundo paralelo' em detrimento da primazia assumida pelo mundo Schlumberger. Como se alguns traços daquilo que Goffman (1974) denominou de "instituições totais", de sequestro, ecoassem pelos liames das relações que vão sendo tecidas no interior da empresa, ou pela produção de subjetividades que vai se engendrando nas relações interpessoais de seus integrantes.

Por isso, não nos causa estranheza que com o passar do tempo aumente a sensação de 'saturação' por causa da 'escravidão'. Além do difícil cotidiano que implica suportar o potencial de nocividade das condições de trabalho, há situações que acirram em demasia o conflito pessoal gerado pela transigência indesejada no plano dos princípios, o que evoca o também difícil debate de valores que perpassa o curso das atividades no mundo do trabalho (Schwartz, 2010). Por exemplo, quando o funcionário arca individualmente com o ônus da demissão - ou da humilhação que a iminência desta provoca, quando atribuída a uma falha do trabalhador, sem se considerar a cadeia de eventos que a precede - ao ser responsabilizado pela ocorrência de um acidente ou incidente, como o que envolveu a técnica. São situações que funcionam também como possíveis fatores de intensificação da vivência de cisão entre o mundo paralelo e o mundo Schlumberger, tornando ainda mais difícil a elaboração do sofrimento, sobretudo quando já se tenha atingido o nível de saturação:

- Eles cortaram minha cabeça, quer dizer, não vou dizer que eles cortaram minha cabeça, porque eu não quis mais trabalhar também, depois dessa [o incidente que havia descrito anteriormente]. Eu já estava muito saturada disso tudo, e por mais dinheiro no mundo que você ganhe, nesse período da Schulmberger eu tive meu filho, né. Então por mais dinheiro que você ganhe, você deixou de ver seu filho andar, deixou de ver seu filho falar, deixou de passar Natal com a sua família... (T 1).

- Você teve filho trabalhando? (P 1).

- Tive. E graças a Deus peguei dois gerentes que me apoiaram. O primeiro gerente, quando eu estava grávida, me tirou do campo imediatamente, e o outro, logo depois, porque eles trocam a cada dois anos, né, e esse primeiro quando eu engravidei já estava no final, quando eu voltei de licença, que eu passei seis meses de licença, porque eu tinha muitas folgas, então peguei os quatro meses da licença e muitas folgas, saí juntando tudo e fiquei [mais] dois meses em casa. Quando voltei, peguei um gerente novinho, que estava entrando, e ele falou pra mim: 'Não, você tem seu filho novo, vou te deixar só em terra'. Aí fiquei só em terra. Porque no mar, você perde vários dias, porque só até você chegar lá... (T 1).

- Em terra, mas indo a campo, né? (P 2).

- Indo a campo, indo a campo. Mas só em terra. Eu passei um ano só em terra. Então ele me ajudou muito nisso, porque ele não tinha obrigação nenhuma de me ajudar nesse sentido. Mas você abre mão de muita coisa, então você entra em conflito com seus princípios... Será que vale, o dinheiro vale isso tudo? (T 1).

Na continuação de sua fala, a técnica expõe uma série de situações cuja vivência se viu impedida pelas demandas de trabalho. Algo que ganha contornos de 'vida paralela', em que as heterodeterminações dos usos de si pelos outros se sobrepujam de modo acentuado às autodeterminações dos usos de si por si (Schwartz, 2010). Impedimentos que vão de uma simples ida à praia até o acompanhamento da internação do filho, passando pela presença na data especial em que toda a família estará reunida. Por maior que seja a capacidade de regulação das configurações coletivas singulares diante de tais injunções, por intermédio de uma ajuda mútua e providencial, buscando o melhor arranjo para cada um de seus membros, o esquema de trabalho não os poupará de tais vicissitudes, ainda mais estando em jogo projetos que envolvem centenas de milhares de dólares.

Considerações finais: a inversão da perspectiva clínica do trabalho

O que foi apresentado ao longo deste artigo é mais um exemplo que confirma a gravidade da situação em que se encontra grande parte dos terceirizados quanto aos parâmetros que pautam a organização do trabalho nas inúmeras empresas em que atuam. No caso em foco, estão expostos a uma completa extrapolação da ampliação da jornada de trabalho. Devemos sublinhar que esta ampliação também pode ser favorecida pelas exigências ligadas ao cumprimento de metas de produção mal dimensionadas, que, via de regra, desconsideram vários dos contraints presentes no curso do trabalho real, cuja efetivação deve dar conta da defasagem entre organização prescrita e organização real do trabalho (Wisner, 1994; Dejours, 1997). Estas metas ainda podem induzir à intensificação na execução de determinadas tarefas e, em ambas as circunstâncias, ampliação da jornada e intensificação do trabalho, expõem estes trabalhadores de forma mais incisiva aos riscos daí advindos. Este conjunto de problemas merece especial atenção, pois não devemos perder de vista que, a partir do final da década de 1980, foi ganhando vulto a lógica de terceirizar não somente as atividades-meio, mas também algumas das atividades-fim, alterando, drasticamente, ainda na década de 1990, a proporção entre efetivos e terceirizados como demonstram os dados apresentados em Figueiredo e Alvarez (2007).

Diante desta maior exposição dos terceirizados aos riscos de acidentes, às inadequações da organização do trabalho, fonte potencial de danos à saúde mental, e do despreparo de muitos deles para lidarem com a intensidade das dramáticas do uso de si (Schwartz, 1992) que eclodem em determinadas situações, fica a indagação acerca do alcance do 'sofrimento patogênico' (Dejours, Abdoucheli e Jayet, 1994) presente nessa organização do trabalho. Sofrimento esse que resulta dos bloqueios interpostos na relação dos humanos com a organização do trabalho, do comprometimento da possibilidade de sublimação ofertada pelo trabalho - e a consequente conversão do sofrimento em criatividade que esta operação viabiliza - ou ainda, do comprometimento, como prefere Schwartz (2004a), da condição de possibilidade de circulações.

No que se refere ao caso desta multinacional, que aborda em seus cursos de formação um conteúdo ligado às 'técnicas de administração do sono', o que se constata é a exposição de seus trabalhadores a condições-limite, com a empresa priorizando flagrantemente a adaptação dos humanos ao trabalho, e não o contrário, em frontal antagonismo com os preceitos elementares das abordagens clínicas do trabalho. Diante da inversão aí presente, somos obrigados a insistir na necessidade de uma profunda revisão de aspectos da organização do trabalho, sob pena de introduzir-se mais um componente de risco dentre os inúmeros já presentes neste tipo de sistema. Ademais, a alegação de que a posição sólida e de liderança da empresa no mercado justificaria a continuação de tal estratégia, calcada em princípios de organização do trabalho como os expostos ao longo deste texto, também não se sustentaria se não pensássemos nas consequências apenas sob a ótica do incremento da produtividade e da riqueza. Como observa Dejours (2004), se este incremento resulta em boa parte da adoção de tais princípios, estes, por sua vez, também acarretam a erosão do lugar acordado à subjetividade e à vida no trabalho, com todos os seus graves desdobramentos no campo das patologias mentais.

Com isto não estamos querendo, em absoluto, negar a capacidade das pessoas de se manterem no registro da normalidade, não obstante o custo extremamente elevado que isto possa representar. Como salienta Schwartz (2010d), "as pessoas não estão todas enlouquecendo". Logo, certa cautela é fundamental para não endossarmos a visão de que as subjetividades no trabalho estariam capturadas por completo, que nessa esfera estaria "tudo dominado", como afirma a canção popular. Segundo Figueiredo e Alvarez (2004), afirmar a gravidade do quadro atual neste campo é fundamental por tudo que já constatamos em todos estes anos de investigação no setor, mas sem deixarmos nossa escuta bloqueada para os devires sempre presentes na potência da vida, permanecendo atentos à dinâmica entre poder (do capital) e potência (da multidão) (Negri, 2002).

Nota do Editor

Este artigo é produto do projeto de pesquisa "Trabalho, saúde e segurança na indústria petrolífera offshore na bacia de Campos (RJ)", desenvolvido pelo Núcleo de Estudos em Inovação, Conhecimento e Trabalho (NEICT), desde 2003, em parceria com o Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense (Sindipetro NF). Ao longo dos anos já recebeu apoio da Faperj, Capes e recebe bolsas Pibic do CNPq.

Notas

Recebido em 28/01/2011

Aprovado em 19/02/2011

Agradecemos à participação na finalização deste artigo da nossa coorientanda e bolsista de mestrado Michele Brum da Silva do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense. Agradecemos também ao então bolsista Pibic Andrei Polivanov (desde 2008, engenheiro de produção) pela ajuda no levantamento dos dados.

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  • 1
    Professor associado I do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, Rio de Janeiro, Brasil; pesquisador do Núcleo de Estudos em Inovação, Conhecimento e Trabalho (NEICT). Doutor em Engenharia de Produção pela Coppe da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com pós-doutorado em Psicologia do Trabalho pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (PPGPS/Uerj). <
  • 2
    Professora associada I do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, Rio de Janeiro, Brasil; pesquisadora do Núcleo de Estudos em Inovação, Conhecimento e Trabalho (NEICT) e do grupo Pesquisa e Intervenção em Atividade de Trabalho, Saúde e Relações de Gênero (Pistas), do Centro de Estudos em Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana, da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, da Fundação Oswaldo Cruz (Cesteh/Ensp/Fiocruz). Doutora em Engenharia de Produção pela Coppe da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com pós-doutorados pelo Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Ensp/Fiocruz, e pelo Departamento de Ergologia da Universidade de Provence, França. <
  • 3
    Essa comunidade envolveu os pesquisadores diretos (coordenadores do projeto), o grupo sindical (demandante) e um grupo de trabalhadores interessados (contatados via sindicato), além de dois pesquisadores indiretos (para acompanhamento da pesquisa sem participação sistemática no campo) - Milton Athayde, do PPGPS/Uerj, e Jussara Brito, do Cesteh/Ensp/Fiocruz, - em função das supervisões dos pós-doutoramentos dos coordenadores do projeto.
  • 4
    Doravante passaremos a fazer menção a ambos como o 'engenheiro' e a 'técnica'.
  • 5
    Entretanto, neste artigo não foi possível incorporar esse conteúdo à nossa análise.
  • 6
    A Halliburton é a principal concorrente da Schlumberger e a segunda no
    ranking mundial de empresas que atuam em perfuração e perfilagem de poços de petróleo.
  • 7
    Doravante passaremos a fazer menção a ela como a 'engenheira'.
  • 8
    Quando um
    kick (fluxo indesejável de fluidos do interior do poço) não é devidamente controlado, pode se transformar em uma erupção (descontrolada) denominada de
    blow out. Os mais intensos podem ocasionar acidentes de grande magnitude (Thomas, 2001).
  • 9
    Em plataformas
    offshore esse revezamento (denominado 14 x 14) se dá ao longo de 14 dias de embarque, período após o qual o trabalhador desembarca e permanece 14 dias em terra. Na Schlumberger, o tempo de embarque pode ultrapassar os 14 dias ou o período desembarcado pode se reduzir (regime de 14 x 7, por exemplo). O trabalhador pode, ainda, desembarcar e ter de retornar ao mar três ou quatro dias depois.
  • 10
    Apenas como base de comparação, num esquema tradicional de trabalho, esses oitos dias corresponderiam aos quatro finais de semana do mês. Em nosso país, entretanto, além dos finais de semana, não são computados como dias de trabalho os feriados e os trinta dias de férias.
  • 11
    Se a cada mês eles têm direito a quatro dias de férias e a quatro de descanso, em dois meses e meio têm direito de usufruir dez dias de férias e dez de descanso (vinte dias), ou seja, em torno de três semanas de folga, tal como o engenheiro assinala.
  • 12
    Os possíveis motivos para a adoção dessa jornada extensa são discutidos no item "A aviltante ampliação da jornada de trabalho" deste artigo.
  • 13
    Alusão ao filme homônimo estrelado por Daniel Day-Lewis em 2007.
  • 14
    Para estabelecer a comunicação entre a formação produtora e o interior do poço, perfura-se o revestimento deste com o emprego de cargas explosivas especialmente moldadas para tal finalidade (o canhoneio) (Thomas, 2001).
  • *
    Correspondência: Departamento de Engenharia de Produção da Universidade Federal Fluminense (UFF). Rua Passo da Pátria, 156, Bloco D, sala 306, CEP 24210-240, São Domingos, Niterói, Rio de Janeiro, Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Dez 2011
    • Data do Fascículo
      2011

    Histórico

    • Recebido
      28 Jan 2011
    • Aceito
      19 Fev 2011
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