Acessibilidade / Reportar erro

Eidorfe Moreira e os sermões de Vieira na Belém Seiscentista

Eidorfe Moreira and Vieira’s sermons in 17th century Belém

Resumo

O universo intelectual de Eidorfe Moreira (1912-1989) abrigou as mais diferentes manifestações do pensamento. Tendo a Amazônia marcado profundamente a sua obra, Eidorfe Moreira, um discípulo da Geografia Cultural, construiu campos de leitura bem ilustrativos de sua formação, em que o binômio Geografia/História Cultural norteou o principal de seus trabalhos. A passagem do Padre Antônio Vieira (1608-1697) por Belém despertou-lhe o interesse, sobretudo os sermões que pregou na matriz da cidade. Eidorfe Moreira valeu-se de autores como João Lúcio de Azevedo, Raymond Cantel e João Francisco Lisboa para arguir a parenética – e a política – nos sermões de Vieira.

Palavras-chave
Eidorfe Moreira; Padre Antônio Vieira; Geografia cultural; História cultural

Abstract

The intellectual universe of Eidorfe Moreira (1912-1989) covered different manifestations of thought. As Amazonia profoundly marked his work, Eidorfe Moreira, a disciple of cultural geography, developed fields of study that were quite illustrative of his formation and in which cultural geography and history gave direction to his major works. The presence of Father Antonio Vieira (1608-1697) in Belém captured his attention, especially the sermons that he preached in the city’s parish church. Eidorfe Moreira had read authors, such as João Lúcio de Azevedo, Raymond Cantel and João Francisco Lisboa, in order to argue for the importance of eloquence – and politics – in Vieira’s sermons.

Keywords
Eidorfe Moreira; Father Antônio Vieira; Cultural geography; Cultural history

Mesmo para um leitor que peregrine, com passos seguros, pelo mundo do conhecimento, notadamente nos variados domínios do pensamento social, esse leitor não deixará de se surpreender com o que produziu Eidorfe Moreira (1912-1989). Natural de João Pessoa, na Paraíba, esse grande intelectual passou praticamente toda sua vida em Belém do Pará, onde exerceu as mais variadas funções – e onde se revelou como estudioso e notável escritor em vários domínios do conhecimento. Já nos títulos que deu à estampa no final dos anos de 1950 e no correr da década seguinte, para ficar apenas nessa provocação, mostrava-se um intelectual avant la lettre. Essa imagem não se refletia, à clara definição, no espelho da vida intelectual da Belém de então – e, em certo sentido, na vida intelectual de grande parte do Brasil. Eidorfe Moreira foi um escritor que esgrimiu pelo saber em diferentes cenários do pensamento social.

Em “Eidorfe Moreira – Nota Crítica”, escrita por Benedito Nunes no primeiro volume da edição que reuniu praticamente a totalidade dos trabalhos do autor de “Ideias para uma concepção geográfica da vida” (1960a), o grande filósofo paraense, assinalando que a sua preocupação não era sistematizadora ou classificatória, agrupou, grosso modo, os trabalhos de Eidorfe Moreira segundo três grandes identidades epistemológicas: os voltados para a Amazônia, a exemplo de “Amazônia, o conceito e a paisagem” (1960b) e “Belém e sua expressão geográfica” (1966); os “geográficos-literários”, como “Presença do mar na literatura brasileira” (1962); e, por último, os relacionados à “história cultural do Pará”, caso de “Visão Geo-Social do Círio” (1971) e “Presença hebraica no Pará” (1972), aos quais incluiríamos “Os sermões que Vieira pregou no Pará” (1970).

É possível distender o entendimento de “história cultural do Pará” pensado por Benedito Nunes, e aí incluir outros títulos de Eidorfe Moreira: “Obras escolares paraenses de história” (1977) e “O livro didático paraense” (1979), estudos voltados ao ensino médio no Pará, como também o fez com o ensino superior ao escrever “As letras jurídicas no Pará” (1973) e “Para a história da Universidade Federal do Pará” (1977). Como bem reconheceu Benedito Nunes, para além de uma preocupação meramente classificatória, essa divisão realça a diversidade dos estudos produzidos por Eidorfe Moreira “dentro do domínio das ciências humanas, e destaca a escala científico-humanista de seus temas” (Nunes, 1989NUNES, Benedito. Nota Crítica. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cejup, 1989. p. 25-28. v. 1., v. 1, p. 25).

Nesse sentido, a obra de Eidorfe Moreira – buscando-se com essa imagem à astrofísica – remete para a representação de um universo em expansão, transgressor de formalismos, transgressor de limites. Só assim é possível ao autor escrever, reunir e publicar “Estado e Ideologia” e “Política e Aretologia (a virtude como princípio político em Platão e Aristóteles)” (1959a) e, depois, “D. Quixote e o problema do conhecimento” (1968), neste caso propondo-se a uma análise epistemológica do herói de Miguel de Cervantes. Esse Eidorfe Moreira, peregrino pelos domínios da filosofia e da epistemologia, é o mesmo que, em 1969, publicaria um “Roteiro Bibliográfico de Marajó”.

As obras, formalmente observadas, são discursos distintos, mas a sua unidade estava construída na mente do autor, na forma como ele entendia ser a identidade do conhecimento, revelada no campo da relação entre sociedade e cultura, entre o homem, o ambiente e o conhecimento. Assim, mesmo que de forma incompleta, impõe-se, do ponto de vista da arqueologia do saber, recuperar o principal da história e da historicidade do universo intelectual esculpido por Eidorfe Moreira.

Na passagem da primeira para a segunda metade do século XX, os quadros intelectuais dominantes em Belém apresentavam genética diferenciada. Alguns dos seus integrantes provinham da tradição afrancesada e autodidata da belle époque da borracha e da sua cultura mundializada; outros, já procediam dos bancos acadêmicos formais, principalmente da Faculdade de Direito, centro historicamente dominante na formação de quadros brasileiros especializados, inclusive para o exercício do ensino superior. A exemplo do que antes se verificava em outros centros brasileiros, no final dos anos de 1950, aquando da constituição da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Pará, muitos dos responsáveis pelas Cadeiras dos cursos de História e de Geografia haviam saído da Faculdade de Direito.

Se um ponto de encontro houve entre essas duas admitidas correntes de homens de letras da Belém de então, foi a contingência de praticamente todos eles servirem à administração pública, à gestão do Estado. Eidorfe Moreira foi um intelectual refinado. Representava, nesse sentido, o perfil letrado dos homens de letras dotados de um saber construído em múltiplas frentes do conhecimento. Em outras palavras, trabalhando-se a bibliografia deixada por Eidorfe Moreira, sobressai, de forma clara, a pluralidade de leituras que realizou e de estudos que buscou. O escritor, é possível sustentar, criou uma identidade própria, tratando-se da vida intelectual da Belém do seu tempo. É preciso visitar alguns dos suportes que sustentaram o intelectual à frente do seu tempo que foi Eidorfe Moreira.

Quando, em 1970, publicou “Os sermões que Vieira pregou no Pará”, Eidorfe Moreira já havia escrito e publicado títulos que permitem recuperar o percurso de sua formação intelectual, de sólida erudição histórico-filosófica – para além, é claro, da sua matriz geográfica – o que certamente ilumina a sua recepção a um Vieira que, àquela altura, ainda permanecia como domínio do grande estudioso João Lúcio de Azevedo. Em 1960b, o aparecimento de “Amazônia, o conceito e a paisagem” anunciava o ensaísta que construiria sua obra de forma interdisciplinar, ou seja, sujeito intelectual para quem a geografia, a paisagem e o homem constituíam um universo a ser pensado e arguido em unívoca e interagente dimensão: espacial, social e cultural. Um ano depois, em 1959b, surgia, seguindo a mesma linha de identidade ensaística, o estudo “Sertão, a palavra e a imagem”, uma identidade que ele projetaria bem mais para frente, como fica visível em “Influências amazônicas no Nordeste (reflexos da fase áurea da borracha)”, lançado em 1982.

A identidade epistemológica estabelecida por Eidorfe Moreira aos seus primeiros trabalhos transcendia, por assim dizer, ao trato marcantemente geográfico conferido ao objeto de seus estudos. O ensaísta distendia, assim, o arco de suas leituras, de suas reflexões, interagindo e dialogando com a história, a filosofia, a literatura, as artes. Em outras palavras, desde os seus estudos iniciais, Eidorfe Moreira revelava uma formação humanística elástica, em permanente processo de solidificação, que o acompanharia em todo o exemplar processo de sua história intelectual. A construção dessa identidade epistemológica, repita-se, Eidorfe Moreira a fez do ponto de vista de um geógrafo, sim, mas no interior de um pensamento em que a geografia era considerada na relação entre espaço, tempo e cultura, e que, se tomada fora dessa relação, não existiria como possibilidade epistemológica.

Uma peregrinação pela bibliografia trabalhada em “Amazônia, o conceito e a paisagem” e também em “Sertão, a palavra e a imagem” indica que Eidorfe Moreira já dominava, no final dos anos de 1950, um universo bibliográfico expressivo. E esse domínio já se revelava o bastante para lhe permitir um tratamento e uma leitura interdisciplinares dos cenários buscados por sua arguição, construindo uma abordagem em que os quadros geográficos são culturalmente pensados e problematizados. Esse suporte epistemológico fez com que em ambos os títulos encontrem-se referências à literatura de Euclides da Cunha, Guimarães Rosa e Vianna Moog; à história de Capistrano de Abreu, Visconde de Taunay, Henri Berr, Rômulo de Araújo Lima e Arthur Cézar Ferreira Reis; à geografia de Emmanuel De Martonne, Pierre Deffontaines e Pierre Gourou; à literatura, de interesse antropológico, histórico e geográfico, dos viajantes Johann Baptist von Spix, Carl Friedrich von Martius, Henry Bates, Alfred Wallace e Louis Agassiz.

Notem-se, ainda, as referências do ensaísta a nomes como Paul Vidal de la Blache, geógrafo francês que, no início do século XX, esteve próximo de historiadores e sociólogos, e que em 1891 fundou os “Annales de Geographie”. Foi o que se deu em relação a Lucien Febvre, um dos deflagradores do movimento dos Annales no começo do século XX, em que a relação interdisciplinar passou a sustentar a nova história feita então na França. Não sem razão, a revista “Annales d’histoire économique et sociale”, surgida em 1929 sob a liderança de Marc Bloch e Lucien Febvre, teve como modelo os “Annales de Géographie” de La Blache, contando em seu conselho editorial com a presença do geógrafo Albert Demangeon.

Fica evidente, em outras palavras, que Eidorfe Moreira, ao final dos anos de 1950, estava a par do que já se havia manifestado, na França, como uma nova relação entre história e geografia no quadro epistemológico das ciências humanas, processo remissivo à vida acadêmica francesa do início do século XX, relação essa que o sábio Elisée Réclus logrou sintetizar na célebre fórmula “a História é a Geografia no tempo; a Geografia é a História no espaço”. Essa aproximação de Eidorfe Moreira com as matrizes das chamadas ciências humanas francesas, na forma como aqui se procura mostrar, influenciaria sua obra como um todo, uma obra essencialmente inter e transdisciplinar.

Registre-se, nesse sentido, que, em “Ideias para uma concepção geográfica da vida”, de 1960a, Eidorfe Moreira faz referência a Henri Berr e sua “Revue de Synthése Historique”, um dos títulos identitários do movimento intelectual francês dos Annales, em estudo em que Henri Berr reporta-se aos geógrafos alemães Carl Ritter e Friedrich Ratzel. Enfatize-se, nesse sentido, que Henri Berr, interessado na geografia histórica, influenciou fortemente Lucien Febvre a desenvolver um grande projeto, “La terre et l’évolution humaine”, cujos resultados, em forma de livro, foram publicados em 1922 e 1925, neste caso, em edição inglesa (Burke, 1991BURKE, Peter. A escola dos Annales (1929-1989): a Revolução Francesa da historiografia. São Paulo: Unesp, 1991.). Repita-se, assim, que a presença da história e da cultura em “Ideias para uma concepção geográfica da vida” reflete a aproximação de Eidorfe Moreira com as matrizes epistemológicas que fundaram, na França, a relação entre história e geografia na origem do movimento dos Annales, no que manifestou a superação acadêmica e heurística da Escola Metódica Alemã, de Leopold von Ranke e Berthold Niebuhr, e sua projeção nos meios acadêmicos franceses.

Observe-se, no entanto, que, entre os títulos consultados e referidos por Eidorfe Moreira em “Ideias para uma concepção geográfica da vida”, não figura explicitamente qualquer das obras em que Lucien Febvre manifestou seus reconhecidos itinerários pela geografia histórica, sobretudo “La terre et l’évolution humaine”. Para ficar na questão dos Annales, é de se notar, também neste caso, que não figura nas fontes buscadas por Eidorfe Moreira um outro grande lugar da geografia histórica, a saber, “La Méditerranée et le monde méditerranéen à l’époque de Philippe II”, de Fernand Braudel, cuja primeira edição data de 1949. Mesmo que essas obras não compareçam às referências de “Ideias para uma concepção geográfica da vida”, parece evidente que o estudo de Eidorfe Moreira, a considerar-se a sua estrutura narrativa, indica que ao escritor não foi desconhecida a geografia histórica produzida na França ao abrigo dos Annales.

Um segundo grande trabalho foi dado à estampa por Eidorfe Moreira nesse mesmo período, mais exatamente em 1962: “A presença do mar na literatura brasileira”. Este estudo está fundado nos suportes teóricos e metodológicos da Geografia Cultural, manifestando o entendimento do autor acerca da natureza multifacetada do saber geográfico, suas leituras e representações. Escolheu-se esse estudo – como poderia ter sido escolhido “Ideias para uma concepção geográfica da vida” – para que melhor ficasse revelada a natureza do conhecimento inter e transdisciplinar construído por Eidorfe Moreira. O arco distendeu-se o bastante para abrigar domínios diversificados do saber, como, no caso, o estudo dos sermões que Vieira pregou no Pará.

Em “A presença do mar na literatura brasileira”, Eidorfe Moreira vai trabalhar a literatura brasileira como também reflexiva da forte presença da paisagem na narrativa literária historicamente construída desde o período colonial, seja nos domínios da poesia, seja nos espaços da prosa. Como a paisagem em si resulta da relação entre natureza e cultura, seu corpus é também discursivo, tanto no tocante à imagética quanto à narrativa escrita. Afinal, os próprios personagens da peripécia literária revelam-se como agentes ativos atuando na construção dos quadros da paisagem.

Para tanto, Eidorfe Moreira faz dele as palavras de Antônio Candido em “Formação da literatura brasileira”, ao dizer que “o nosso romance tem fome de espaço e uma ânsia topográfica de apalpar todo o país” (Candido, 1959CANDIDO, Antonio. Formação da literatura brasileira. São Paulo: Martins, 1959. p. 114. v. 2. apud Moreira, 1989aMOREIRA, Eidorfe. A presença do mar na literatura brasileira. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989a. p. 7-177. v. 3., v. 3, p. 9). A paisagem, contudo, lembra Eidorfe Moreira, comparece à estrutura da narrativa literária como agente de seu enredo, e não como cenário, a exemplo do verificado em Guimarães Rosa. De qualquer modo, na construção da paisagem como enredo, em jogo está, assegure-se, o que Eidorfe Moreira identifica como a “unidade orgânica da Natureza, da Cultura e da História” (Moreira, 1989aMOREIRA, Eidorfe. A presença do mar na literatura brasileira. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989a. p. 7-177. v. 3., v. 3, p. 10).

Ao escrever as considerações gerais de “A presença do mar na literatura brasileira”, Eidorfe Moreira fundou a sua leitura teórica em nomes que, à época, figuravam na vanguarda da história e da crítica literárias no Brasil. Além de Antônio Cândido, Eidorfe Moreira recorreu a Graça Aranha, Alceu Amoroso Lima, Viana Moog, Adonias Filho e Afrânio Coutinho. Valeu-se ele, também, do linguista e filósofo francês Albert Dauzat, na obra “Le sentiment de la nature et son expression artistique”, de 1914.

No corpus de “A presença do mar na literatura brasileira”, como um todo, Eidorfe Moreira trabalha inicialmente o mar na poesia brasileira produzida no período colonial, para, depois, passar pelo romantismo, parnasianismo, simbolismo e modernismo. No tocante à prosa – objeto desta leitura – o estudo de Eidorfe Moreira privilegia a de ficção e, também, memórias e ensaios – nestes casos, nos quadros da vida intelectual brasileira do século XIX e primeira metade do XX. Para distender um arco de tão amplo alcance investigativo, Eidorfe Moreira considera “a polivalência de sentido e de expressão que o mar tem na vida nacional, a soma de atividades, motivos e influências que lhe inspira, suscita ou promove em toda a extensão de nossa costa”. Tudo isso nos mostra a riqueza de motivações literárias que podemos encontrar nele (Moreira, 1989aMOREIRA, Eidorfe. A presença do mar na literatura brasileira. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989a. p. 7-177. v. 3., v. 3, p. 17).

Focando-se, no que diz respeito à prosa, o campo dos ensaios, Eidorfe Moreira faz referências a Victor Hugo, Pierre Loti e Jules Michelet, antes de começar a trabalhar com os ensaístas brasileiros. E o faz com Rui Barbosa em “Cartas da Inglaterra”, em sua “Lição do Extremo-Oriente”, ao tratar da relação entre o mar e a defesa do Estado brasileiro, assim como da também relação com o poder naval e com a marcha de um país em direção ao progresso. A leitura do mar feita por Rui Barbosa reverbera de forma entusiástica em Eidorfe Moreira, para quem o autor de “Cartas da Inglaterra”, mesmo não sendo um profissional do mar, construiu “uma visão global e estrutural do nosso problema náutico, de acordo com as perspectivas e o espírito da época” (Moreira, 1989aMOREIRA, Eidorfe. A presença do mar na literatura brasileira. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989a. p. 7-177. v. 3., v. 3, p. 153).

Também Euclides da Cunha foi visitado por Eidorfe Moreira em busca de registros sobre o mar feitos pelo autor de “Os sertões”, o que ele não encontraria certamente na epopéia euclidiana sobre Canudos, salvo de forma tangencial, já que, nesse caso, a narrativa ambienta-se no cenário plantado em meio ao semiárido nordestino. No geral, tratando-se do Brasil, a busca de Eidorfe Moreira sobre o mar em Euclides da Cunha encontra referências em “Contrastes e confrontos”, quando seu autor discute sobre os desafios brasileiros diante de um litoral de tão grande extensão. E também em “Os sertões”, como acima lembrado, Euclides da Cunha faz algumas considerações sobre a Serra do Mar. Também em “À margem da história” e em “Contrastes e confrontos”, registros euclidianos sobre o mar aparecem no tocante à Rússia e sua relação ao Pacífico, e aos Estados Unidos, aqui relativamente à costa oeste norte-americana.

Visitação também a Gilberto Freyre marca a preocupação ensaística de Eidorfe Moreira em se tratando da representação do mar. Segundo o articulista, “a contribuição de Gilberto Freire no que tange aos assuntos do mar é notável, sobretudo por ter realçado a significação e o papel do negro em relação ao mar”. Em “Sobrados e Mucambos” e, ainda, em “Nordeste”, este dado à estampa em 1927, Gilberto Freyre foca o negro “nas suas relações diretas com o mar [...] projetando, por assim dizer, o negro na paisagem marinha” (Moreira, 1989aMOREIRA, Eidorfe. A presença do mar na literatura brasileira. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989a. p. 7-177. v. 3., v. 3, p. 163). Assim, em “Sobrados e Mucambos”, Eidorfe Moreira capta, por exemplo, uma dada leitura social do mar quando Gilberto Freyre registra que “as praias, nas proximidades dos muros dos sobrados do Rio de Janeiro, de Salvador, do Recife até os primeiros anos do século XIX eram lugares por onde não se podia passear, muito menos tomar banho salgado” (Freyre, 1951FREYRE, Gilberto. Sobrados e mucambos. Rio de Janeiro: José Olympio, 1951. p. 412-413. v. 2. apud Moreira, 1989aMOREIRA, Eidorfe. A presença do mar na literatura brasileira. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989a. p. 7-177. v. 3., v. 3, p. 159).

A fim de definir claramente a relação do negro com o mar, Gilberto Freyre assinala, como aponta Eidorfe Moreira, que além do caboclo, o negro também foi canoeiro, jangadeiro e remeiro, atividades para as quais projetou comportamentos da sua cultura matricial. O espaço da pesca no nordeste litorâneo, assim, foi marcado, nas práticas que conheceu, também pela presença cultural do negro, e não apenas pela do caboclo. Fica claro, dessa forma, que a preocupação de Eidorfe Moreira é mostrar que a presença do mar como geradora de práticas sociais já estava construída na sociedade e na cultura brasileiras do período colonial.

Em outro domínio da ensaística brasileira, o dos estudos literários, Eidorfe Moreira trabalha com Gonzaga Duque, um esteta do mar. Em “Graves e frívolos”, por exemplo, o escritor trabalha a representação da praia como paisagem natural e como paisagem social, na forma como a imagem se instalou nas mentalidades do Brasil que abria o século XX. No quadro dos grandes ensaístas brasileiros que incorporaram o mar como recurso literário, Eidorfe Moreira aponta ainda Gilberto Amado. A inflexão estética, literária, do ensaísta sobre o mar não o impede, contudo, de também centrar sua narrativa na relação entre as águas e a história. Nesse sentido, em “A dança sobre o abismo”, de 1952, que abriga uma incursão de Gilberto Amado sobre o Mediterrâneo, um mar que figura, segundo Eidorfe Moreira, “não só como fonte e berço, mas também como imagem e síntese da Civilização [no] quadro histórico do progresso humano” (Moreira, 1989aMOREIRA, Eidorfe. A presença do mar na literatura brasileira. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989a. p. 7-177. v. 3., v. 3, p. 162).

Ainda na ensaística brasileira da primeira metade do século XX, mas agora seguindo o eixo da geografia histórica – um dos pólos dominantes de seus estudos –, Eidorfe Moreira chega ao geógrafo Alberto Lamego em “O homem e a restinga” e “O homem e a Guanabara”, entre outros trabalhos. São estudos que se sustentam numa leitura da formação histórica das áreas litorâneas do Rio de Janeiro, daí o fato de o seu autor trabalhar “a colonização da costa fluminense [...] numa sequência que vai mostrado o seu lento desprendimento da gravitação e das influências oceânicas” (Moreira, 1989aMOREIRA, Eidorfe. A presença do mar na literatura brasileira. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989a. p. 7-177. v. 3., v. 3, p. 166-167). Fica evidente que Alberto Lamego empresta à geografia, em seus trabalhos, um tratamento histórico-cultural, focando a relação entre meio e modo social das populações, daí os títulos desses trabalhos anunciarem o homem como ponto primordial da leitura.

Das leituras finais realizadas por Eidorfe Moreira em “A presença do mar na literatura brasileira”, uma foi sobre o geógrafo Josué de Castro e seus “Documentários do Nordeste”, de 1957a. Segundo Eidorfe Moreira, o texto de Josué de Castro, feito narrativa literária, enfatiza um processo que relaciona homem e meio, na forma, por exemplo, da “paisagem geo-social dos mangues pernambucanos, com sua vida anfíbia e miserável [...]todo esse mundo ambivalente entre terra e água se reflete com seu colorido típico e natural” (Moreira, 1989aMOREIRA, Eidorfe. A presença do mar na literatura brasileira. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989a. p. 7-177. v. 3., v. 3, p. 169-170). Essa abordagem de uma geografia histórico-cultural, Josué de Castro igualmente manifesta em “Um ensaio de geografia humana: a cidade de Recife”, de 1957b. Aqui, a cidade, em dupla face, volta-se tanto para o mar das pescas e das jangadas, quanto para o mar das canas, quer para o litoral pesqueiro, quer para a terra canavieira.

Trata-se, no caso, da forma como Recife se relacionou com os domínios históricos da sua construção social. Aliás, quanto às jangadas como representação sócio-cultural, e de forma a salientar o tratamento cultural da geografia, domínio por excelência da sua preocupação epistemológica, Eidorfe Moreira busca a antropologia de Câmara Cascudo em seu estudo “A jangada”, publicado em 1957. Nesse sentido, sustenta o articulista que “quem diz jangada diz naturalmente uma tipologia humana e geográfica, um tipo de embarcação e um processo haliêutico” (Moreira, 1989aMOREIRA, Eidorfe. A presença do mar na literatura brasileira. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989a. p. 7-177. v. 3., v. 3, p. 173). Conclui Eidorfe Moreira sustentando que “a parte final do trabalho de Câmara Cascudo é uma antologia da jangada, o reflexo das suas influências em nossas letras” (Moreira, 1989aMOREIRA, Eidorfe. A presença do mar na literatura brasileira. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989a. p. 7-177. v. 3., v. 3, p. 177).

Em “A presença do mar na literatura brasileira”, Eidorfe Moreira redefiniu e melhor alargou preocupações já manifestadas em “Ideias para uma concepção geográfica da vida”, de 1960a. O investimento do articulista numa geografia histórica e culturalmente trabalhada produziu, assim, os seus frutos, na medida em que o fio condutor de sua análise levou-o ao encontro das dimensões sócio-históricas da geografia. Dispensa enfatizar que, em outros trabalhos que publicaria posteriormente, no correr da década de 1970, redefiniria ele os paradigmas dessa geografia, tomada também como linguagem e representação cultural.

Ainda em 1966, seguindo essa mesma linha de construção epistemológica, surgiu o estudo “Belém e sua expressão geográfica”. Por isso mesmo, neste ensaio seu autor funda a sua leitura no solo fértil da narrativa histórica, recorrendo, para tanto, a historiadores luso-brasileiros, como João Lúcio de Azevedo, Oliveira Martins e Sérgio Buarque de Holanda; a historiadores franceses, a exemplo de Fustel de Coulanges e Lucien Romier, além de Domingos Antônio Raiol, Manuel Barata e Bernardo Pereira de Berredo. Nos domínios da geografia, o estudo recorre aos geógrafos franceses Pierre George, Auguste Plane e Pierre Monbeig, uma geografia também pensada em termos de sua utilização na narrativa literária de José Lins do Rego e Leandro Tocantins. Como o olhar de Eidorfe Moreira para a expressão geográfica de Belém está fundado, repita-se, sobre uma perspectiva histórica, o quadro que pinta é o dos cenários físicos e culturais em que a cidade surgiu e foi se afirmando, historicamente falando.

Vale-se o escritor, para tanto, também de registros feitos por viajantes que passaram pela Amazônia nos séculos XVIII e XIX, um procedimento que é essencial à sua narrativa. Assim, o ensaísta recepcionou, em seu estudo, Charles-Marie de La Condamine, Spix, Martius, Hercule Florence e Paul Le Cointe, sabidamente responsáveis por uma leitura dita naturalista, cientificamente falando, da Amazônia. A relação cultural construída por Eidorfe Moreira entre Geografia e História, para pensar a Amazônia, revelou-se, ainda uma vez mais, em “Visão geo-social do Círio” (1971). E para reforçar ainda mais a transdisciplinaridade do trabalho de Eidorfe Moreira – agora Geografia e Filosofia – veja-se que, um ano depois, ele apareceria com “Kant como geógrafo” (1972a), este último depois integrado em “Geografias mágicas” (1985), obra esta com que o estudioso e grande construtor do pensamento social fechou sua fecunda bibliografia.

Outros trabalhos de Eidorfe Moreira poderiam ainda ser aqui relacionados e arguidos, a exemplo de “O nefelismo de El Greco” (1972b), “O livro didático paraense; breve notícia histórica” (1979) ou – no limite – “Jesus visto pelo geógrafo” (1984), saído pela imprensa local. Tal não se fez porque esse procedimento acabaria por implicar uma exegese da sua obra, o que não seria o caso, já que a preocupação maior deste trabalho é recuperar a leitura que Eidorfe Moreira fez dos sermões que o Padre Antônio Vieira pregou no Pará na passagem da primeira para a segunda metade do século XVII. Note-se, entretanto, que a argumentação e a arguição antes desenvolvidas acerca de obras que antecederam o estudo dos sermões pregados por Vieira no Pará são fundamentais, haja vista que indicam algumas das leituras que o autor desenvolveu e que utilizou como suporte teórico para a sua narrativa vieiriana.

“Os sermões que Vieira pregou no Pará” é um opúsculo de 23 páginas dado à estampa em 1970 pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Em seu estudo, Eidorfe Moreira chama a si os quatro sermões que Vieira recitou na igreja matriz da Belém entre 1656 e 1658. O Grão-Pará, na época, abrigava importantes missões jesuíticas fincadas no interior. Em seu breve relato sobre o quê em Belém produziu o sermonário vieiriano, Eidorfe Moreira trabalhou com uma bibliografia polimórfica. De um lado, reuniu os títulos clássicos de João Lúcio de Azevedo, a saber: “História de Antônio Vieira”, com seus dois tomos publicados em Lisboa entre 1918 e 1921, e “Os jesuítas no Grão-Pará”, dado à estampa em Coimbra em 1930. No tocante ao sermonário de Vieira como um todo, Eidorfe Moreira valeu-se de outro clássico, “Les sermons de Vieira; étude du style”, de Raymond Cantel, publicado em Paris em 1959. E do próprio Vieira o estudioso paraense consultou os “Sermões”, em 15 volumes, publicados em Lisboa entre 1907 e 1909.

Outros monumentos bibliográficos sustentam a leitura de Eidorfe Moreira sobre o quadro histórico em cujo interior estava presente a Companhia de Jesus no Grão-Pará de então. É o caso, por exemplo, da “História da Companhia de Jesus na extinta província do Maranhão e Pará”, estampada por Cândido Mendes de Almeida nos dois tomos de suas “Memórias para a história do extinto Estado do Maranhão”, saídos no Rio de Janeiro em 1860 e 1874. Veja-se, ainda, que não escapou e nem poderia escapar a Eidorfe Moreira a “História da Companhia de Jesus no Brasil”, de Serafim Leite, cujos dez tomos foram dados à estampa entre 1938 e 1950, em Lisboa e no Rio de Janeiro.

A bibliografia consultada por Eidorfe Moreira, à época, respondia, em parte, pelo então estado das questões acerca do Vieira histórico. E certamente demarcava os limites do campo de leitura privilegiado por Eidorfe Moreira acerca das representações da praxis vieiriana no que era a Belém de uma iniciada segunda metade do século XVII. Isso explica a ausência de títulos que alargassem a linha de leitura da obra de Vieira, a exemplo de outros do já citado Raimond Cantel, assim como de diferentes autores que se debruçaram sobre Vieira, a exemplo de Hernâni Cidade.

É verdade que, na Belém do final dos anos de 1960, quando Eidorfe Moreira certamente pensou em trabalhar os sermões que Vieira proferiu na cidade, era difícil ter em mãos, por exemplo, títulos saídos quer no Brasil quer na Europa sobre o sujeito histórico Antônio Vieira. Tal contingência, de qualquer modo, deve ser relativizada porque a biblioteca particular de Eidorfe Moreira, como ele mesmo revelou, era de uma riqueza invulgar. Assim, os títulos que elegeu para contingenciar, histórica e estilisticamente, “Os sermões que Vieira pregou no Pará”, iam ao encontro, segundo o seu entendimento, da narrativa que elaborou acerca da presença de Vieira na seiscentista Belém do Grão-Pará. É importante lembrarmos que somente a partir dos anos de 1990 passaram a surgir, por exemplo, em Portugal e no Brasil, novos estudos a alargar o horizonte de leitura tanto do Vieira histórico da Companhia de Jesus quanto o do discurso teológico inaciano. Assim, a bibliografia consultada por Eidorfe Moreira respondia, à altura em que ele escreveu o seu opúsculo, aos imperativos epistemológicos do seu estudo. Eidorfe Moreira foi, a seu tempo, um intelectual à frente do seu próprio tempo.

Para além de qualquer concessão que se possa fazer à ideia de um Antônio Vieira apenas reflexivo da retórica católica lusitana seiscentista, o grande pregador e missionário jesuíta e também homem de Estado do seiscentos português foi um intelectual refinado e douto. Transgressor dos limites estabelecidos pela Ratio Studiorum, próximos e, mesmo, redesenhados pelos mecanismos censórios da Inquisição, Antônio Vieira, a seu tempo, e em sentido amplamente considerado, foi um arqueólogo da cultura humanística, assim como da História e das Escrituras, um escritor que esgrimiu a língua portuguesa para além das regras sintáticas e dos engenhos tropológicos do teatro retórico do barroco (Coelho, 2009COELHO, Geraldo Mártires. O espelho da natureza: poder, escrita e imaginação na revelação do Brasil. Belém: Paka-Tatu, 2009.).

Ao chamá-lo de “Imperador da Língua Portuguesa”, Fernando Pessoa, ele mesmo um mago da língua, certamente tinha em mente, além da capacidade inventiva de Vieira, viva em seu vórtice linguístico, a totalidade por ele emprestada ao português como língua universal. Sem considerar outras feições assumidas pelo seu pensamento e pela conformação fundadora da sua narrativa, bastariam os “Sermões” para descortinar o rigor, a lucidez e a universalidade do pensamento e das formas retóricas próprias do élan vieiriano. A parenética de Vieira, o grande engenho de sua retórica em torno e em função do Verbo, ainda comportaria, tratando-se da questão da liberdade quer dos cristãos-novos portugueses, quer dos índios brasileiros, um universal e ético composto humanístico (Vieira, 2000VIEIRA, Antônio. Sermões I. Organização Alcir Pécora. São Paulo: Hedra, 2000., v. 1, 2001, v. 2).

Os anos de 1653 a 1661, os que Antônio Vieira esteve à frente do sistema missionário jesuítico no Maranhão e Grão-Pará, foram tempos de múltiplos significados e de distintas dimensões para o religioso e homem de Estado que ele fora. À medida que foi se desenvolvendo o corpus doutrinário de Vieira, em cujo interior sobressairia uma representação empírica e histórica do cristianismo, na forma última assumida pela figuração e fulguração do Quinto Império, uma nova leitura acerca do poder foi esculpida pela demiurgia vieiriana. O Estado, para Vieira, por isso mesmo, seria um Estado cristão universal e, como tal, não um domínio em si mesmo da política, antes objeto da teologia política e cujo fim seria trazer hereges e gentios para o império de Cristo (Pécora, 1994PÉCORA, Alcir. Teatro do Sacramento. São Paulo: Iedusp, 1994., p. 130). Seria, a partir dessa teologização da política, leia-se, da monarquia portuguesa, que Vieira empreenderia seus esforços em prol do Verbo, daí o difícil lugar que assumiu diante da escravidão negra no Brasil.

Por conta das exigências de uma prática que encarnava, a um só tempo, teologia e política, Palavra e Lei, o grande pregador precisou transitar por cenários que eram o púlpito e a arena política, os domínios da Fé e os espaços da polis, lançando mão de um discurso em que, por vezes, o Verbo cedia lugar ao argumento dirigido à res publica. Que dinâmicas, que demandas produziram o pluralismo do discurso de Vieira, misto de sermão e de juízo crítico, nos domínios religiosos e civis do Maranhão e do Grão-Pará, a ponto de levar à expulsão dos jesuítas do norte do Brasil, incluindo Antônio Vieira? A questão central desse enredo foi a escravização do indígena, feita pelos colonos no Maranhão e no Grão-Pará. Sucede que, com Vieira, o índio era uma criatura vista não pelo empirismo dos negócios mercantis, mas pelas lentes de seu profetismo político, de suas leituras testamentárias da História, um engenho teológico que já se projetava em direção ao Quinto Império.

Além da escravização indígena como significante de uma dada forma de combate cultural, os cenários sociais e culturais da Amazônia seiscentista, agregados politicamente falando ao corpo do Estado do Maranhão e Grão-Pará, foram palcos de conflitos envolvendo religiosos, leigos e índios. Contrariamente ao que projeta a tradicional historiografia do Brasil colonial, esses conflitos não refletiam tão-somente o choque entre religiosos e moradores da região, geralmente em torno do domínio da mão de obra indígena. Antes, os choques em causa refletiam dinâmicas outras, inclusive de espectro político, envolvendo religiosos entre si e religiosos e leigos, conflitos sempre relacionados às redes de sociabilidade construídas nos espaços coloniais (Chambouleyron, 2006CHAMBOULEYRON, Rafael. Missionários, índios, capitães e moradores: relações e conflitos na Amazônia seiscentista. In: FORLINE, Louis Carlos; MURROETA, Rui; VIEIRA, Ima Célia Guimarães (Org.). Amazônia: além dos 500 anos. Belém: Museu Paraense Emílio Goeldi, 2006. p. 129-150.).

Não resta dúvida de que as investiduras de Vieira e seu trânsito junto à Corte de D. João IV (1604-1656) levavam o pregador a definir espaços de autoridade e de poder diante dos governos do Maranhão e do Grão-Pará. Admite-se que semelhante e distinta postura ocorria mesmo quando se tratava de tópicos que, em tese, eram interessantes ao Estado português, como a procura de metais preciosos de valor estratégico para o mercantilismo. Assim, uma outra dimensão da palavra política de Vieira no Pará manifestou ele em seu “Sermão da Primeira Oitava da Páscoa”, pregado na Matriz de Belém em 1656, depois do fracasso da expedição em busca de ouro no rio Pacajá, aventura estimulada pelo governo da Capitania e na qual morreu o jesuíta João de Souto Maior, amigo e antecessor de Vieira nas missões amazônicas (Moreira, 1989bMOREIRA, Eidorfe. Os sermões que Vieira pregou no Pará. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989b. p. 11-21. v. 4., v. 4, p. 9).

A busca do eldorado sempre alimentou a imaginação dos colonos, mas depois do fracasso de sua busca Vieira insistia que a grande riqueza do Grão-Pará eram seus habitantes naturais, as milhares de almas espalhadas pela floresta, numa posição politicamente confrontante com a lógica mercantil do Estado português. E vergasta o governo lembrando que a existência do ouro seria ônus elevado, pois traria para a Capitania “poderosos” que lucrariam com a servidão dos colonos nas prisões em que se transformariam as minas de prata e ouro que porventura existissem. E tudo passaria para as mãos dos representantes da Coroa, ávidos de riquezas, ávidos de poder (Vieira, 2000VIEIRA, Antônio. Sermões I. Organização Alcir Pécora. São Paulo: Hedra, 2000., v. 1, p. 563).

A ação de Vieira diante da busca do eldorado por colonos estabelecidos no Grão-Pará, ainda que reflexiva do que pensava ser a catequese e seu significado, essa ação estava centrada sobre um eixo de claro matiz político. Como as questões da catequese eram também questões de Estado, na medida em que submetiam os índios à autoridade colonial, Vieira investia contra um desvio da função catequética que lhe parecia determinante para o sucesso da presença portuguesa na Amazônia. E essa presença também se representava pelo complexo das missões jesuíticas estabelecidas nas profundezas da Amazônia.

Diz, nesse sentido, João Lúcio de Azevedo, que os jesuítas estavam presentes em imenso território e agiam sobre uma expressiva população tribal. Em outras palavras, “onze aldeias de índios mansos no Maranhão e Gurupi; seis nas vizinhanças do Pará, sete no Tocantins, vinte e oito no Amazonas, constituíam por então o domínio efetivo dos jesuítas [que] sonhavam imperar em todo o imenso rio, ainda incógnito, que, no seu longo curso e nas inúmeras ramificações, era povoado de tantas e tão diversas gentes, matéria-prima escolhida da catequese” (Azevedo, 1999AZEVEDO, João Lúcio. Os jesuítas no Grão-Pará. 2. ed. Belém: Secult, 1999., p. 64-65).

Fica evidente, assim, que as já referidas investiduras que Vieira conduzia ao chegar ao Maranhão e ao Grão-Pará, observados os significados simbólicos da sua representação, projetar-se-iam, qualquer que fosse o contexto, sobre a organização e o exercício do poder na colônia, conhecidas as fidelidades que aproximavam os corpos constitutivos da anatomia mercantilista. No caso em questão, essa projeção seria inevitavelmente mais profunda e abrangente, considerando-se os instrumentos políticos com que Antônio Vieira, dando forma à vontade de D. João IV, chegou ao Maranhão e Grão-Pará: regente da evangelização, do governo espiritual das almas. É nesse sentido que Vieira encarnava a condição de homem de Estado, na medida em que a questão e o lugar do índio no interior da ordem colonial eram essencialmente – para além da problemática da evangelização – uma questão política.

As peças desse jogo de forças entre os agentes da colonização e os jesuítas, peças essas movidas que foram em clima de crescente tensionamento, permitiram que Vieira, sem o recurso retórico dos sermões, viesse a usar a palavra no sentido político propriamente dito. Em sucessivas oportunidades, o grande pregador teria que lidar diretamente com os quadros da Câmara de Vereadores de Belém, fazendo-se ouvir pelos edis, portavozes do descontentamento dos colonos com a presença da Companhia de Jesus no Grão-Pará. Fica claro, como revela a documentação conhecida, que a administração do Maranhão e do Grão-Pará não assimilava a presença e a interferência dos jesuítas na região, o que não ocorria de forma manifesta relativamente a outras ordens religiosas atuantes nos mesmos espaços sociais do norte do Brasil.

O painel histórico aqui construído tem por fim enquadrar, entre os sermões que Viera pregou na matriz de Belém, aquele com maior ressonância, tratando-se da já referida relação entre Palavra e Política: o “Sermão da Primeira Oitava da Páscoa”, pregado em 1656. A peça é referente à explosão, em 1649, da febre do ouro, contagiando colonos estabelecidos no Grão-Pará, apoiados pelo governo, sem dúvida interessado nos resultados da aventura. Diz, nesse sentido, o cronista Antônio Baena: “expede o Capitão-Mor [Ayres de Souza Chichorro] no dia 24 de agosto de 1649 uma grande Bandeira, da qual nomeou cabeça a Bartolomeu Barreiros de Ataíde com a patente de Capitão-Mor para a descoberta das minas do rio Agurico ou do Ouro [...] em cujo ânimo a viagem de Pedro Teixeira a Quito havia implantado a cobiça das minas...” (Baena, 1969BAENA, Antônio. Compêndio das eras da Província do Pará. Belém: Universidade Federal do Pará, 1969., p. 63).

É ainda Antônio Baena quem diz que, no sermão, Vieira “discursou largamente [...] mostrando quanto eram prejudiciais as minas de ouro e prata; e descrevendo e amplificando os perigos internos e externos, que de tal descoberta podem resultar; e demonstrando com exemplos tirados da Espanha e do reinado de Salomão os inconvenientes das minas, e quais poderiam ser úteis, e em conclusão dizendo que foi grande favor e providência do Céu que se não descobrissem, e que era errada e desencaminhada a esperança dos que empreendem tais explorações” (Baena, 1969BAENA, Antônio. Compêndio das eras da Província do Pará. Belém: Universidade Federal do Pará, 1969., p. 70).

É possível que essa fracassada bandeira rumo às distantes terras do rio Pacajá, saída de Belém ainda na primeira metade do século XVII rumo a uma Amazônia ainda pouco conhecida dos portugueses, desbravando domínios físicos de grande complexidade, tenha despertado interesse em Eidorfe Moreira e sua já construída geografia histórica. Se lembrarmos que, tratando-se da revelação da Amazônia, Pedro Teixeira já havia realizado sua grande viagem ao Peru, mesmo com a fracassada bandeira rumo ao rio Pacajá ampliava-se, rumo a novos quadrantes, o conhecimento sobre a região.

Afinal, foi em torno dessa busca do eldorado que Vieira pregou, como já antes referido, o seu “Sermão da Primeira Oitava da Páscoa”. Além desse, Vieira ainda recitaria três outros sermões na matriz de Belém, a saber: “Sermão da Madrugada da Ressurreição”, “Sermão de Nossa Senhora da Graça” – estes sem indicação do ano – e “Sermão da Ressurreição de Cristo”, este em 1658. De todos, foi o “Sermão da Primeira Oitava da Páscoa” aquele que, para os estudiosos de Vieira, maior ressonância apresentou, até porque seu conteúdo também refletiria situações relativas à presença da Companhia de Jesus no Estado do Maranhão e Grão-Pará. São essas peças, integrantes do vasto sermonário de Vieira, que Eidorfe Moreira reuniu em “Os sermões que Vieira pregou no Pará”, dado à estampa em 1970.

No pano de fundo da prática sermonária de Vieira em Belém, Eidorfe Moreira identifica o pregador como a figura-chave do quadro histórico, social e culturalmente observado do Pará aquando da sua passagem pela Capitania, entre 1653 e 1661, na condição de superior das missões jesuíticas no norte do Brasil. Enfatiza o articulista que a luta de Vieira pela liberdade do índio manifestou, tratando-se do patrimônio intelectual vieiriano, a combinação de filosofia e ministério, cultura humanística e apostolado. É de se ressaltar que Vieira, àquela altura, figurava como importante homem de Estado, não apenas pela relação entre a Espada e a Cruz na obra da colonização, mas ainda pela sua marcante proximidade com o rei D. João IV de Portugal.

Voltando ao caso do “Sermão da Primeira Oitava da Páscoa”, também para Eidorfe Moreira foi “a mais importante pregação de Vieira no Pará”, haja vista as implicações e as projeções que essa peça da retórica sermonária vieiriana comportou e refletiu, respectivamente. Aliás, o ensaísta chama atenção para uma circunstância problemática envolvendo esse sermão e o fato que o motivou, levantada que foi por João Lúcio de Azevedo em seu já citado “Os jesuítas no Grão-Pará” (Moreira, 1989bMOREIRA, Eidorfe. Os sermões que Vieira pregou no Pará. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989b. p. 11-21. v. 4., v. 4, p. 9). E tal circunstância seria o fato de o próprio Vieira, segundo aquele historiador, haver sugerido ou mesmo assentido “a viagem ao Pacajá, de onde havia muito chegava a fama de tesouros” (Azevedo, 1999AZEVEDO, João Lúcio. Os jesuítas no Grão-Pará. 2. ed. Belém: Secult, 1999., p. 70).

Eidorfe Moreira, ainda que sem revelar os fundamentos da sua leitura sobre o caso, contesta a observação de João Lúcio de Azevedo, sem dúvida um lugar problemático envolvendo a passagem de Vieira pelo Pará de então. De todo modo, registre-se que Eidorfe Moreira lembra, aliás de forma acertada e procedente, que, no “Sermão da Primeira Oitava da Páscoa”, Vieira assume uma posição abertamente crítica contra a busca de ouro no rio Pacajá. Faz ver nesse sentido que Vieira, inclusive, valeu-se de casos na história em que, como ocorreu na antiga Israel e na moderna Espanha, as práticas metalistas foram sempre danosas.

Segundo Eidorfe Moreira, o ponto central do “Sermão da Primeira Oitava da Páscoa” revela-se quando Vieira, opondo-se à lógica do mercantilismo português, denuncia que a existência de ouro em terras do Grão-Pará traria para a sua realidade o peso, então aqui ainda não conhecido, da máquina fiscal metropolitana. E esta, além de rigorosa e despótica, abrigava ainda os poderosos e seus abusos. Para tanto, Eidorfe Moreira retira do sermão as passagens em que Vieira aponta as condições dramáticas em que passaria a viver o Grão-Pará sob o peso da legislação e das práticas políticas metalistas. É preciso lembrar que Vieira assim procedia porque ainda vivo estava D. João IV, seu grande protetor, morto, aliás, em novembro daquele mesmo ano de 1656.

Como bem observou Eidorfe Moreira, recorrendo mais uma vez ao corpo do “Sermão da Primeira Oitava da Páscoa”, Vieira bem demarcou a sua posição contra a febre do ouro e seus malefícios. Para tanto, exaltava ele o que considerava as “minas do céu”, ou seja, as populações tribais espalhadas pela floresta à espera da Revelação, da Palavra, razão de ser do missionarismo e do ministério da Companhia de Jesus. Afinal, proclamava Vieira em seu sermão, a “salvação de uma só alma vale mais que todo o ouro, toda a prata ou todos os haveres do mundo” (Moreira, 1989bMOREIRA, Eidorfe. Os sermões que Vieira pregou no Pará. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989b. p. 11-21. v. 4., v. 4, p. 11), imagem que bem define a natureza do corpo evangélico, cristológico, da missão jesuítica no mundo.

A plenitude desse corpo doutrinário, observadas as realidades concretas do mundo, Vieira exalta ao findar o seu sermão, passagem chamada por Eidorfe Moreira para definir a posição do pregador contra a busca do eldorado: “concedo-vos que se descobrissem as minas que desejáveis, e que essa nossa cidade estivesse lajeada de barras de prata e cobertas de telhas de ouro; que importa tudo isso à alma? Havia-lhe de levar alguma coisa dessas consigo? Havia-lhe de importar alguma coisa para a conta? Pois se tudo cá há de ficar, por que não tomamos o conselho de Cristo, que tantas vezes nos disse que fizéssemos o nosso tesouro no céu: Thesaurizate vobis thesauros in coelo?” (Moreira, 1989bMOREIRA, Eidorfe. Os sermões que Vieira pregou no Pará. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989b. p. 11-21. v. 4., v. 4, p. 11).

Além do ora comentado “Sermão da Primeira Oitava da Páscoa”, Vieira recitou, possivelmente em 1658, o “Sermão da Madrugada da Ressurreição”, o menor entre todos os que apresentou na matriz de Belém. O fim último do sermão, registra Eidorfe Moreira, é a manifestação da unidade mística do Filho com a Mãe, de Jesus com Maria, de tal forma que chegar a Cristo é passar por Maria. O analista destaca o fato de o sermão, mesmo sem identificar o ano e o local de sua pregação, acabou, mesmo, sendo identificado por Vieira ao proclamar que “nesta Casa da Senhora da Graça, que é a Casa da sua Mãe” (Moreira, 1989bMOREIRA, Eidorfe. Os sermões que Vieira pregou no Pará. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989b. p. 11-21. v. 4., v. 4, p. 13).

Ainda subordinado à mesma linha discursiva do sermão acima, Vieira pregou ainda, em 1658, o “Sermão da Ressurreição de Cristo”, considerado por Eidorfe Moreira como “o menos interessante dos que o insigne jesuíta pregou no Pará”. Ressalta o articulista que a ressurreição de Cristo é “uma das predileções temáticas da parenética vieirense”. Nesse sentido, acentua Eidorfe Moreira que o “fundo edificativo do sermão”, como acima já se mencionou, é o mesmo do anterior, daí em Vieira ficar consagrado que “procurar e seguir Cristo” é o caminho único para a ressurreição (Moreira, 1989bMOREIRA, Eidorfe. Os sermões que Vieira pregou no Pará. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989b. p. 11-21. v. 4., v. 4, p. 14).

Finalmente, Eidorfe Moreira debruça-se sobre o “Sermão de Nossa Senhora da Graça”, “a maior e mais complexa das peças oratórias” que Vieira recitou em Belém, “tão extensa e complexa como a que pregou em Lisboa” no ano de 1651. Assinala Eidorfe Moreira que “o sermão é todo ele teológico, versando sobre a preeminência da graça sobre a glória...”. Neste sermão, como bem assinala o articulista, Vieira se reporta diretamente à matriz de Belém, “a primeira e maior de uma tão dilatada província, e cabeça de todas”. (Moreira, 1989bMOREIRA, Eidorfe. Os sermões que Vieira pregou no Pará. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989b. p. 11-21. v. 4., v. 4, p. 15).

Numa primeira ordem de consideração, após recuperar os quadros retóricos dos sermões estudados, Eidorfe Moreira volta-se para o estilo de Vieira, para a arquitetura retórica dominante em seu sermonário. Registra, nesse sentido, os estudos clássicos que consultou, como os de Jamil Almansur Haddad e Raymond Cantel, para enfatizar alguns dos pontos de formatação e de sustentação do discurso, do sermonário de Vieira, elementos-chave à identificação da modelagem em que se sustenta a parenética do grande pregador do barroco luso-brasileiro. Seguidamente, Eidorfe Moreira pensa os sermões pregados por Vieira no Grão-Pará em relação direta com a Belém histórica de então, cenário social e cultural de recepção da palavra do grande orador sacro.

Compreende-se a preocupação de Eidorfe Moreira ao seguir essa linha de problematização, considerando a relação entre a palavra e o sujeito histórico-cultural que era Antônio Vieira no seiscentos, tanto na Europa como no Brasil. Nesse sentido, e estreitando as bases da relação acima referida, lembra Eidorfe Moreira que a Belém que recepcionou os sermões de Vieira era um núcleo colonial sem grande expressão, quer social, quer culturalmente falando. É preciso notar, entretanto, que do ponto de vista de Vieira e da Companhia de Jesus, e assim demonstra o número de missões organizadas na Amazônia, a importância de Belém residia na sua condição de centro de onde os jesuítas demandavam as suas ações, tanto as de catequese como as de defesa da liberdade indígena.

Conforme Vieira registrou na chamada “Resposta aos Capítulos que deu contra os Religiosos da Companhia de Jesus o Procurador do Maranhão Jorge de Sampaio”, de 1652, Belém tinha em torno de 80 moradores. E sobre esse número o próprio pregador não tece qualquer consideração, haja vista, repita-se, que interessava mais diretamente a Vieira e aos jesuítas as sociedades tribais habitando a Amazônia. Admitindo-se que esse fosse, de fato, o número de residentes em Belém, tal número era interessante se visto pela ótica dos jesuítas, já que indicava a existência de um mercado de limitadas necessidades para a escravização da mão de obra indígena em atividades urbanas.

Relativamente aos 80 habitantes de Belém registrados por Vieira, trata-se de um número discutível! Para arguir o registro de Vieira, Eidorfe Moreira recorre a dados disponíveis em diversos autores, a saber: Maurício de Heriarte, cronista francês que passou pela cidade no século XVII e que escreveu uma “Descrição do Estado do Maranhão, Pará, Corupá e Rio das Amazonas”; João Francisco Lisboa em suas “Obras”; e, ainda, João Lúcio de Azevedo em seu já citado “Os jesuítas no Grão-Pará”. Neste caso, este último autor levanta a possibilidade de o número de 80 moradores dizer respeito apenas aos titulares de famílias então aqui radicadas, sem contar, por exemplo, o número de soldados.

Mesmo considerando que Belém era, à altura em que Vieira ali pregou, um núcleo colonial sem maior expressão social e cultural, Eidorfe Moreira assinala que, mesmo assim, os sermões do grande pregador ali solenizados mantiveram a mesma estrutura narrativa, a mesma arquitetura retórica daqueles que Vieira apresentou em diferentes cenários culturais da Europa. Como em jogo estavam a Palavra e o imperativo teológico da sua propagação, Vieira fez do mundo, qualquer mundo, o humano cenário de recepção da Palavra. Se em Belém, em Roma ou em Lisboa, Vieira fazia da pregação a razão de ser de seu imperativo como missionário e mensageiro do Verbo. Para Eidorfe Moreira, “a dignidade e a elevação em que tinha esta função não lhe permitiam fazer concessões ao público seja a que título fosse” (Moreira, 1989bMOREIRA, Eidorfe. Os sermões que Vieira pregou no Pará. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989b. p. 11-21. v. 4., v. 4, p. 17), daí o porquê de os seus sermões manterem uma mesma identidade, tratando-se do rigor com que o pregador erguia e movimentava o engenho de sua fala.

Um outro domínio da abordagem construída por Eidorfe Moreira para trabalhar os sermões que Vieira pregou no Pará diz respeito à relação entre o conteúdo das peças e o quadro das realidades então dominantes, fossem de ordem física, fossem de ordem social e cultural. Segundo Eidorfe Moreira, à exceção do “Sermão da Primeira Oitava da Páscoa”, “nenhum outro que [Viera] aqui pregou oferece interesse sob o ponto de vista mesológico”, já que os demais já referidos foram “pregações puramente doutrinárias, sem ligações diretas e imediatas com o meio”. Adianta, ainda, o articulista que surpreende que, durante a sua estada no Pará, “não tenha Vieira aproveitado como objeto ou pelo menos como pretexto de pregação nenhum dos fatos ou acontecimentos de que foi pars magna” (Moreira, 1989bMOREIRA, Eidorfe. Os sermões que Vieira pregou no Pará. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989b. p. 11-21. v. 4., v. 4, p. 17).

Feito esse balanço, Eidorfe Moreira assinala que “também como expressão geográfica a Amazônia não figura no sermonário de Vieira”, mesmo tendo ele passado vários anos em meio ao complexo físico da grande floresta tropical, navegando pelos seus rios, avançando pelo seu universo botânico. Diz Eidorfe Moreira, apropriadamente, que foi nas cartas, aproximadamente em número de 12, saídas de Belém, que Vieira contingenciou o meio físico amazônico “em termos de paisagem”. Lembra, nesse sentido, que Vieira, como pregador, “sempre foi pouco sensível aos quadros naturais, ou pelo menos pouco interessado em evocá-los como recurso oratório”, já que a natureza, quando figurada no sermonário de Vieira, o é como recurso estilístico, na forma de representações a ornar a retórica com imagens buscadas tanto no Velho como no Novo Testamento (Moreira, 1989bMOREIRA, Eidorfe. Os sermões que Vieira pregou no Pará. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989b. p. 11-21. v. 4., v. 4, p. 18).

De qualquer modo, é preciso ressaltar, tratando-se da relação entre Vieira e os cenários amazônicos, é que foi precisamente em Cametá, às margens do rio Tocantins, que Vieira produziu um dos principais documentos de sua história como pregador, missionário e homem de Estado: a chamada carta “Esperanças de Portugal, Quinto Império do Mundo, Primeira e Segunda Vida del-Rei D. João o Quarto Escritas por Gonçalo Eanes Bandarra”. Para Eidorfe Moreira, “Esperanças de Portugal...” é um documento marcado “pela extensão e beleza literária” (Moreira, 1989bMOREIRA, Eidorfe. Os sermões que Vieira pregou no Pará. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989b. p. 11-21. v. 4., v. 4, p. 18).

Escrita em 1659 e formalmente dirigida ao bispo do Japão, o jesuíta André Fernandes, a carta pretendia confortar a rainha D. Luísa de Gusmão pela morte de D. João IV, ocorrida em 1656. O documento depois se transformaria em forte argumento para os opositores de Vieira levarem-no ao Tribunal da Inquisição, em um processo que correria entre 1663 e 1667. Vieira, que em 1652 já era suspeito de heresia por defender judeus e cristãos-novos, seria também acusado de profetismo por proclamar a volta de D. João IV, ressuscitado, a um Quinto Império cristão, lusitano e universal. E lícito é sustentar que nesse Quinto Império, pensado necessariamente como possibilidade histórica, estavam a Amazônia e as milhares de almas de suas sociedades tribais, o genus angelicum à espera da Palavra, do Verbo (Coelho, 2009COELHO, Geraldo Mártires. O espelho da natureza: poder, escrita e imaginação na revelação do Brasil. Belém: Paka-Tatu, 2009.).

Considerando as linhas de análise traçadas por Eidorfe Moreira para situar os sermões que Vieira pregou no Pará, é natural que o articulista assim conclua a sua leitura: “com uma única exceção (“Sermão da Primeira Oitava da Páscoa”), esses sermões não refletem fatos ou motivações locais, oferecendo, portanto, pouco interesse sob o ponto de vista mesológico, ao contrário do que acontece com as cartas do pregador” (Moreira, 1989bMOREIRA, Eidorfe. Os sermões que Vieira pregou no Pará. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989b. p. 11-21. v. 4., v. 4, p. 19). Em sua arguição à ausência da natureza amazônica nos sermões que Vieira pregou no Pará, Eidorfe Moreira lembra que o sermão em que mais diretamente comparecem os cenários sociais e culturais paraenses, amazônicos, é o “Sermão da Epifania”, pregado por Vieira na Capela Real de Lisboa em 1662. Por isso mesmo, Eidorfe Moreira o considera “o mais ‘amazônico’, sem dúvida dos [...] sermões” pregados por Vieira (Moreira, 1989bMOREIRA, Eidorfe. Os sermões que Vieira pregou no Pará. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira. Belém: Cultural Cejup, 1989b. p. 11-21. v. 4., v. 4, p. 18), daí a necessidade de ser recuperado neste artigo, ainda que tangencialmente.

Em 1661, expulsos os jesuítas do Estado do Maranhão e Grão-Pará, Vieira saiu preso de Belém para São Luiz e, de lá, para Lisboa. Em 1662, na Capela Real de Lisboa, diante de D. Luísa de Gusmão e do futuro rei, D. Afonso VI, Vieira pregou o fulgurante “Sermão da Epifania”. Reportava-se ao grande mal que fora a expulsão dos jesuítas do Maranhão e do Pará, antes terras do Verbo, depois pátria do Anticristo. Defendia ele a volta dos jesuítas ao norte do Brasil, para garantir a liberdade dos índios e para os serviços espirituais necessários à colônia, sem os quais não mais triunfaria o Verbo naqueles domínios. Era o começo de uma prolongada crise envolvendo Vieira, o Trono e a Igreja Católica em Portugal (Coelho, 2010COELHO, Geraldo Mártires. O visionário da Amazônia. Revista de História da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, n. 63, dez., p. 22-24, 2010.).

Tratando-se do universo da visitação de Eidorfe Moreira à palavra de Antônio Vieira, geografia e história cruzam-se nessa leitura. Esse cruzamento fica ainda mais evidente quando o ensaísta realça a importância do grande pregador nos quadros de uma Belém apenas despertada para a história, mas de um despertar expressivo para a lógica do Estado colonial ibérico. Afinal, fundar e fundamentar a presença portuguesa na Amazônia impunha-se à geopolítica metropolitana para o norte do Brasil, uma região até então pouco conhecida, mas já alvo de manifesto interesse de várias potências européias. E como esses primeiros tempos da história do espaço amazônico ocorrem sob a União Ibérica (1580-1640), também em jogo estavam os interesses do Estado espanhol na Amazônia. Outra seria a Amazônia da Restauração portuguesa, quando D. João IV assume o trono português, precisamente a Amazônia na qual atuaria o gênio político, teológico e ontológico de Antônio Vieira.

Escrito iniciados os anos de 1970, o ensaio “Os sermões que Vieira pregou no Pará”, de Eidorfe Moreira, inscreve-se no conjunto de estudos com que o autor trabalhou, fundado na Geografia Cultural, visitou a sociedade e a cultura do Pará e da Amazônia. Incluem-se nesse conjunto trabalhos como “Roteiro Bibliográfico do Marajó” (1969), “Visão Geo-Social do Círio” (1971), “Presença hebraica no Pará” (1972c) e “Funções extramilitares do Forte do Castelo” (1980). Se, entretanto, a questão cultural for tratada do ponto de vista acadêmico, docente, Eidorfe Moreira privilegiou o organismo pedagógico paraense. Assim, escreveu trabalhos como “Obras escolares paraenses de história” (1977a) e “O livro didático paraense” (1979), estudos voltados ao ensino médio no Pará, como também o fez com o ensino superior ao publicar “As letras jurídicas no Pará” (1973) e “Para a história da Universidade Federal do Pará” (1977b).

Pelo conjunto da sua obra, como ficou manifestado em sucessivas passagens deste artigo, Eidorfe Moreira construiu sua bagagem intelectual fora dos muros da academia, da Universidade, como, aliás, outros intelectuais paraenses e brasileiros do tempo. Ele ingressou na Faculdade de Direito do Pará em 1934, quando a formação acadêmica de então, nos cursos jurídicos, mostrava-se formal e positivista. De qualquer forma, as suas atividades no magistério, concluído o curso de Direito, já indicavam o intelectual em visível processo de amadurecimento.

As relações de Eidorfe Moreira com o ensino da Geografia começam em 1943, bem antes do começo do ensino superior de Geografia no Pará, o que se deu em 1955, aquando da criação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, inexistente ainda o organismo da Universidade Federal do Pará. Aliás, convém lembrar que fora ainda na década de 1930 que o ensino superior de Geografia começou no Brasil, mais exatamente em São Paulo (1934) e no Rio de Janeiro (1936).

A obra de Eidorfe Moreira, abrangendo diversas áreas do conhecimento, revelou-se como sólida expressão de um intelectual que esteve à frente do seu tempo e das condições acadêmicas institucionais na Belém de então. Ser, hoje, revisitada, manifesta o reconhecimento da contemporaneidade pelo trabalho exemplarmente construído por esse modelar homem de letras.

REFERÊNCIAS

  • AMADO, Gilberto. A dança sobre o abismo São Paulo: José Olympio, 1952.
  • AZEVEDO, João Lúcio de. História de Antônio Vieira Lisboa: Clássica, 1918.
  • AZEVEDO, João Lúcio. Os jesuítas no Grão-Pará 2. ed. Belém: Secult, 1999.
  • BAENA, Antônio. Compêndio das eras da Província do Pará Belém: Universidade Federal do Pará, 1969.
  • BARBOSA, Ruy. Cartas de Inglaterra Rio de Janeiro: Typ Leuzinger, 1896.
  • BRAUDEL, Fernand. La méditeranée et le monde méditerranéen à l’époque de Philippe II. Bibliothèque de l’École des Chartres, Paris, v. 109, n. 2, p. 339-344, 1949.
  • BURKE, Peter. A escola dos Annales (1929-1989): a Revolução Francesa da historiografia. São Paulo: Unesp, 1991.
  • CANDIDO, Antonio. Formação da literatura brasileira São Paulo: Martins, 1959. p. 114. v. 2.
  • CANTEL, Raymond. Les sermons de Vieira: étude de style. Paris: Ediciones Hispano-Americanas, 1959.
  • CASCUDO, Luís da Câmara. A jangada Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Cultura, Serviço de Documentação, 1957.
  • CASTRO, Josué de. Documentários do nordeste São Paulo: Brasiliense, 1957a.
  • CASTRO, Josué de. Um ensaio de geografia humana: a cidade de Recife. São Paulo: Brasiliense, 1957b.
  • CHAMBOULEYRON, Rafael. Missionários, índios, capitães e moradores: relações e conflitos na Amazônia seiscentista. In: FORLINE, Louis Carlos; MURROETA, Rui; VIEIRA, Ima Célia Guimarães (Org.). Amazônia: além dos 500 anos. Belém: Museu Paraense Emílio Goeldi, 2006. p. 129-150.
  • CIDADE, Hernani. Padre Antonio Viera Lisboa: Presença, 2007.
  • COELHO, Geraldo Mártires. O espelho da natureza: poder, escrita e imaginação na revelação do Brasil. Belém: Paka-Tatu, 2009.
  • COELHO, Geraldo Mártires. O visionário da Amazônia. Revista de História da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, n. 63, dez., p. 22-24, 2010.
  • CUNHA, Euclides da. À Margem da história Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 1909.
  • CUNHA, Euclides da. Contrastes e confrontos Rio de Janeiro: Record, 1975.
  • CUNHA, Euclides da. Os sertões São Paulo: Três, 1984.
  • DAUZAT, Albert. Le sentiment de la nature et son expression artistique Estados Unidos: Nabu Press, 1914.
  • DUQUE, Gonzaga. Graves e frívolos Lisboa: Livraria Clássica, 1910.
  • FEBVRE, Lucien. La terre et l’evolution humaine: introdction geographique á l’histoire. Revue Belge de Philologie et d’Histoire, Bélgica, v. 2, n. 3, p. 538-540, 1923.
  • FREYRE, Gilberto. Nordeste São Paulo: José Olympio, 1937.
  • FREYRE, Gilberto. Sobrados e mucambos Rio de Janeiro: José Olympio, 1951. p. 412-413. v. 2.
  • HERIARTE, Mauricio. Descrição do Estado do Maranhão, Pará, Corupá e Rio das Amazonas Viena: G. Gerold, 1874.
  • LAMEGO, Alberto. O homem e a Guanabara Rio de Janeiro: IBGE, Conselho Nacional de Geografia, 1964.
  • LAMEGO, Alberto. O homem e a restinga Rio de Janeiro: Lidador, 1974.
  • LEITE, Serafim. História da Companhia de Jesus no Brasil Lisboa: Portugália; Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1938-1950. 10 v.
  • LISBOA, João Francisco. Obras São Luiz: Typ. de Mattos, 1864-1865. 4 v.
  • MORAES, José de. História da Companhia de Jesus na extinta Província do Maranhão e Pará Rio de Janeiro: Brito & Braga, 1860.
  • MOREIRA, Eidorfe. Estado e ideologia. Separata da: Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Pará, n. 4, 1959a.
  • MOREIRA, Eidorfe. Sertão, a palavra e a imagem Belém: [s.n.], 1959b.
  • MOREIRA, Eidorfe. Ideias para uma concepção geográfica da vida Belém: H. Barra, 1960a.
  • MOREIRA, Eidorfe. Amazônia: o conceito e a paisagem. Rio de Janeiro: SPEVEA, 1960b.
  • MOREIRA, Eidorfe. A presença do mar na literatura brasileira Belém: H. Barra, 1962.
  • MOREIRA, Eidorfe. Belém e sua expressão geográfica Belém: Imprensa Universitária, 1966.
  • MOREIRA, Eidorfe. D. Quixote e o problema do conhecimento [Belém]: [s.n.], 1968.
  • MOREIRA, Eidorfe. Roteiro bibliográfico de Marajó Belém: Idesp, 1969.
  • MOREIRA, Eidorfe. Os sermões que Vieira pregou no Pará Belém: Imprensa Universitária, 1970.
  • MOREIRA, Eidorfe. Visão geo-social do Círio Belém: EDUFPA, 1971.
  • MOREIRA, Eidorfe. Kant como geográfo Belém: Pará, 1972a.
  • MOREIRA, Eidorfe. O nefilismo de El Greco. Separata da: Revista da Universidade Federal do Pará, Belém, ano 2, n. 2, 1. sem. 1972b. (Série 1).
  • MOREIRA, Eidorfe. Presença hebraica no Pará Belém: Falangola, 1972c.
  • MOREIRA, Eidorfe. As letras jurídicas no Pará Belém: Conselho Estadual de Cultura, 1973.
  • MOREIRA, Eidorfe. Obras escolares paraenses de história Separata da: Revista de Cultura do Pará, Belém, n. 26-27, jan./jun., 1977a.
  • MOREIRA, Eidorfe. Para a história da Universidade federal do Pará Belém: Globo, 1977b.
  • MOREIRA, Eidorfe. O livro didático paraense Belém: Imprensa Oficial, 1979.
  • MOREIRA, Eidorfe. Funções extra militares do Forte do Castelo [s.l.: s.n.], 1980.
  • MOREIRA, Eidorfe. Influências amazônicas no nordeste Belém: Universidade Federal do Pará, Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, 1982.
  • MOREIRA, Eidorfe. Geografias mágicas Belém: Gráfica e Editora Universitária, 1985.
  • MOREIRA, Eidorfe. A presença do mar na literatura brasileira. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira Belém: Cultural Cejup, 1989a. p. 7-177. v. 3.
  • MOREIRA, Eidorfe. Os sermões que Vieira pregou no Pará. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira Belém: Cultural Cejup, 1989b. p. 11-21. v. 4.
  • NUNES, Benedito. Nota Crítica. In: MOREIRA, Eidorfe. Obras reunidas de Eidorfe Moreira Belém: Cejup, 1989. p. 25-28. v. 1.
  • PÉCORA, Alcir. Teatro do Sacramento São Paulo: Iedusp, 1994.
  • VIEIRA, Antônio. Sermão da Epifania Matriz de Belém, [s.d.].
  • VIEIRA, Antônio. Sermão da Madrugada da Ressurreição Matriz de Belém, [1658?].
  • VIEIRA, Antônio. Sermão da Primeira Oitava da Páscoa Matriz de Belém, 1656.
  • VIEIRA, Antônio. Sermão da Ressurreição de Cristo Matriz de Belém, 1658.
  • VIEIRA, Antônio. Sermão de Nossa Senhora da Graça Matriz de Belém, [s.d.].
  • VIEIRA, Antônio. Sermões I Organização Alcir Pécora. São Paulo: Hedra, 2000.
  • VIEIRA, Antônio. Sermões II Organização Alcir Pécora. São Paulo: Hedra, 2001.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2016

Histórico

  • Recebido
    15 Jul 2013
  • Aceito
    06 Abr 2015
MCTI/Museu Paraense Emílio Goeldi Coordenação de Pesquisa e Pós-Graduação, Av. Perimetral. 1901 - Terra Firme, 66077-830 - Belém - PA, Tel.: (55 91) 3075-6186 - Belém - PA - Brazil
E-mail: boletim.humanas@museu-goeldi.br