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De doença da civilização a problema de saúde pública: câncer, sociedade e medicina brasileira no século XX

From disease of civilization to public health problem: cancer, society and the Brazilian medical profession in the 20th century

Resumo

Este artigo analisa o enquadramento do câncer pela medicina brasileira em três diferentes momentos do século XX, com o objetivo de verificar a transformação do câncer de uma enfermidade ligada à ideia de civilização a um problema de saúde pública, vinculado a precárias condições de vida e às dificuldades de acesso e funcionamento dos serviços de saúde. A partir de artigos científicos e discursos de médicos nacionais reputados, procura-se mostrar como as visões acerca da relação entre câncer e sociedade mudaram. Argumenta-se que essa transformação se relaciona principalmente a dois diferentes aspectos: o processo de estruturação dos saberes e práticas da medicina e o cruzamento dos conhecimentos médicos sobre a doença com interpretações sobre o desenvolvimento do país em diferentes momentos.

Palavras-chave
Câncer; Civilização; Desenvolvimento; Saúde pública

Abstract

This article analyzes perspectives on cancer by the Brazilian medical professionat three different moments in the 20th century. The aim is to analyze the transformation of the concept of cancer from a civilization-related disease to an issue of public health that is associated with precarious living conditions and with difficulties of access to – and operation of – health services. Based on scientific papers and speeches of reputed Brazilian physicians this article seeks to show how views concerning the relationship between cancer and society have changed. Such transformation arguably relates mainly to two different aspects: the process of organization of medical knowledge and the practice and crossing of medical knowledge with interpretations of Brazil’s development at different moments.

Keywords
Cancer; Civilization; Development; Public health

INTRODUÇÃO

A partir da segunda metade do século XX, intensificaram-se as preocupações com o câncer na sociedade brasileira. Tal processo o transformou em uma presença marcante na vida cotidiana e em uma vigorosa preocupação social. Recentemente, seu progressivo impacto epidemiológico e a necessidade de maior cobertura das ações, visando ao seu controle, principalmente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), têm colocado a doença no centro das discussões sobre medicina e saúde pública no Brasil. Nesse contexto, é importante analisar a historicidade dessas preocupações sociais e seus aspectos menos evidentes.

O estatuto atual do câncer se relaciona diretamente ao incremento de sua incidência e à prevalência nas diversas regiões do país, bem como às tecnologias, às iniciativas médicas e às políticas públicas surgidas para o seu controle. Muitos estudos voltaram-se para esses aspectos, mostrando que, de forma parecida ao ocorrido em outras formações sociais, o envelhecimento da sociedade e a transformação nos hábitos de vida, relacionados ao processo de urbanização, fizeram com que a doença se tornasse mais presente e visível, fator importante na sua transformação em flagelo social (Pinell, 1992PINELL, Patrice. Naissance d’un fléau: histoire de la lutte contre le cancer en France (1890-1940). Paris: Métailié, 1992.; Pickstone, 2007PICKSTONE, John V. Contested cumulations: configurations of cancer treatments through the twentieth century. Bulletin of the History of Medicine, Baltimore, v. 81, n. 1, p. 164-196, 2007.; Cantor, 2004CANTOR, David. Cancer. In: LECOURT, Dominique (Ed.). Dictionnaire dela pensée médicale. Paris: PUF, 2004. p. 195-201.; Teixeira; Fonseca, 2007TEIXEIRA, Luiz Antonio; FONSECA, Cristina. De doença desconhecida a problema de saúde pública: o INCA e o controle do câncer no Brasil. Rio de Janeiro: Ministério da Saúde, 2007.).

Embora a alta incidência e a mortalidade por meio do câncer sejam centrais à maneira como a sociedade com ele interage e o representa, esse ‘enquadramento’1 se liga também a uma série de negociações entre medicina, saúde pública e sociedade. Estas, ao longo do século XX, deram origem a uma representação, que relacionou o câncer ao grau de civilização e ao desenvolvimento da nação e, de certa maneira, ajudaram a formatar e dar sentido ao processo de significação do câncer hoje existente.

Neste artigo, aborda-se essa dimensão do processo de enquadramento do câncer no século XX. Objetiva-se refletir, a partir do discurso médico, a respeito de sua transformação de uma doença diretamente ligada a uma ideia de civilização (europeia, urbanizada, industrializada) em um problema de saúde pública, associado a precárias condições de vida e às dificuldades de acesso e de funcionamento dos serviços públicos de saúde. O argumento central é de que tal mudança está ligada principalmente a dois diferentes aspectos: o processo de estruturação dos saberes e práticas da medicina em torno do câncer, a partir da constituição de ‘redes’2 de profissionais interessados em seu controle, e o cruzamento dos conhecimentos médicos sobre a doença com interpretações sobre o desenvolvimento do país em diferentes momentos.

Para essa discussão, estabelece-se diálogo com autores e perspectivas dos Estudos Sociais das Ciências e da História da Medicina, sobretudo os trabalhos do sociólogo Bruno Latour e do historiador da medicina Charles Rosenberg. No que diz respeito à documentação, o artigo tem como base revistas médicas, teses de faculdades de medicina, anais de congressos, discursos de médicos e políticos e livros publicados por profissionais da medicina sobre câncer no século XX.

A DOENÇA DESCONHECIDA A CAMINHO DO BRASIL: O CÂNCER NAS PRIMEIRAS DÉCADAS DO SÉCULO XX

Os primeiros trabalhos médicos sobre o câncer como problema coletivo no Brasil remetem ao início do século XX. Em 1904, o artigo ‘A frequência do câncer no Brasil’, de Azevedo Sodré, publicado na revista ‘Brasil Médico’, alertava para a dificuldade de conhecer melhor a doença, devido à inexistência de dados epidemiológicos (Sodré, 1904SODRÉ, Azevedo. A frequência do câncer no Brasil. Brazil Médico, v. 18, n. 23, p. 229-232, jun. 1904.). Ao longo das décadas seguintes, outros profissionais mostraram preocupações com o tema, iniciando, de forma tímida, uma mobilização pelo controle da doença. Nos anos 1920, instituições especializadas em tratamentos radiológicos e cirúrgicos foram criadas em alguns estados da federação. Em 1922, em Belo Horizonte, foi inaugurado o Instituto do Radium, sob a direção de Borges da Costa, funcionando em associação com a Faculdade de Medicina do Estado de Minas Gerias. Em 1929, no âmbito da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, entrou em funcionamento o Instituto Dr. Arnaldo, instituição filantrópica direcionada exclusivamente ao tratamento dos cancerosos. Na concepção de Teixeira (2009)TEIXEIRA, Luiz Antonio. O câncer na mira da medicina brasileira. Revista Brasileira de História da Ciência, Rio de Janeiro, v. 2, n. 1, p. 104-117, jan.-jun. 2009., esse processo se relacionou, principalmente, ao interesse de algumas lideranças do campo médico em se aproximar das discussões e ações direcionadas à doença, que vinham ocorrendo na Europa e nos Estados Unidos. No entanto, essas iniciativas não chegaram a caracterizar um movimento mais amplo e organizado de ações contra a doença no âmbito de saúde pública.

Nesse período, a importância dada às ações anticâncer na organização dos serviços sanitários brasileiros estava bastante abaixo da atribuída a outras doenças, como as verminoses e as doenças infecciosas. No início da década de 1920, por exemplo, fora criada a Inspetoria de Lepra e Doenças Venéreas, na alçada do Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP). Embora o regulamento do DNSP indicasse que essa diretoria deveria se responsabilizar também pelas ações de controle do câncer, as atividades nesse campo foram residuais em relação às doenças transmissíveis, que dominavam as discussões sobre saúde, estruturação sanitária e higiene pública, como a hanseníase e a sífilis (Teixeira, 2009TEIXEIRA, Luiz Antonio. O câncer na mira da medicina brasileira. Revista Brasileira de História da Ciência, Rio de Janeiro, v. 2, n. 1, p. 104-117, jan.-jun. 2009.).

Dois fatores auxiliam na compreensão dessa configuração: o primeiro diz respeito ao cenário epidemiológico do período, o qual indicava que as doenças transmissíveis eram as maiores ameaças à saúde da população, especialmente nas regiões mais afastadas dos grandes centros; o segundo concerne à existência de uma forma de pensar que colocava em relação direta clima, organização social e câncer, enquadrando-o como problema de países de clima temperado e de populações mais ricas. Como aponta Gaudillière (2006)GAUDILLIÈRE, Jean Paul. Cancer. In: BOWLING, Peter; PICKSTONE, John (Ed.). The modern life and earth sciences. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. p. 486-503. (Cambridge History of Science, v. 6)., desde o fim do século XIX, começou a ser detectado, na Europa, aumento na incidência de câncer em cidades com maiores contingentes populacionais e economicamente mais desenvolvidas, sobretudo por conta da industrialização. A observação dessa incidência diferenciada associou o aparecimento da doença às melhores condições de vida dessas regiões, que permitiam o envelhecimento das pessoas, aumentando as chances de elas sofrerem de câncer.

No Brasil, as preocupações com o câncer foram decorrentes da maior informação médica sobre a doença a partir da participação de médicos em encontros internacionais e, posteriormente, nos campos de batalha da Primeira Guerra Mundial (Teixeira; Fonseca, 2007TEIXEIRA, Luiz Antonio; FONSECA, Cristina. De doença desconhecida a problema de saúde pública: o INCA e o controle do câncer no Brasil. Rio de Janeiro: Ministério da Saúde, 2007.). Tais inquietações reforçaram as discussões sobre a associação da doença ao nível de civilização das diferentes regiões. Essa afirmação pode ser observada na conferência do médico Eduardo Rabello, diretor da Inspetoria de Lepra e Doenças Venéreas, proferida no II Congresso Brasileiro de Higiene, realizado em Belo Horizonte, em 1924. Sua apresentação se recobre de maior importância por ele ocupar o cargo de diretor da inspetoria que, à época, era responsável pela organização de ações relativas à doença no órgão central da saúde pública. Vale notar também que os Congressos Brasileiros de Higiene eram encontros promovidos pela Sociedade Brasileira da Higiene – instituição que congregava a elite dos sanitaristas do período –, com o objetivo de fomentar a discussão de propostas para a saúde pública brasileira (Pykosz, 2007PYKOSZ, Lausane Correa. A higiene nos grupos escolares curitibanos: fragmentos da história de uma disciplina escolar (1917-1932). 2007. 147 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2007.).

Com o título de ’O problema do câncer’, a comunicação de Rabello (1928)RABELLO, Eduardo. O problema do câncer. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE HYGIENE, 2., 1924, Belo Horizonte. Anais... Rio de Janeiro: Pimenta de Mello e Cia., 1928. v. 1. caracteriza a doença como um problema dos países civilizados, resultado dos avanços da medicina e das condições de vida das populações urbanas. Para ele, era necessário organizar uma verdadeira guerra contra esse novo flagelo, que se caracterizava como uma triste realidade noutros países, e que, progressivamente, nos ameaçaria (Rabello, 1928RABELLO, Eduardo. O problema do câncer. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE HYGIENE, 2., 1924, Belo Horizonte. Anais... Rio de Janeiro: Pimenta de Mello e Cia., 1928. v. 1.). Tomando como patamar as estatísticas produzidas nas principais capitais europeias, que evidenciavam o aumento na mortalidade pela doença, Rabello (1928)RABELLO, Eduardo. O problema do câncer. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE HYGIENE, 2., 1924, Belo Horizonte. Anais... Rio de Janeiro: Pimenta de Mello e Cia., 1928. v. 1. ressaltava a necessidade de se atentar para o câncer no país, ainda que não o considerasse um problema de grande magnitude social naquele momento. Segundo ele:

No Brasil, tomado o território em toda sua extensão, não é ainda um problema dos mais importantes ao lado, por exemplo, do da tuberculose que, em seu conjunto, a todos sobrepuja; já vae, entretanto, caminhando para sêlo se providencias não forem tomadas, pois nos últimos quinquênios a cifra tende a subir [...] (Rabello, 1928RABELLO, Eduardo. O problema do câncer. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE HYGIENE, 2., 1924, Belo Horizonte. Anais... Rio de Janeiro: Pimenta de Mello e Cia., 1928. v. 1., p. 118).

O discurso que representava o câncer como um porvir, uma ameaça futura à população do país, era bastante recorrente nesse período e, na maioria dos casos, relacionava-se à noção de que o risco de ser por ele acometido atrelava-se diretamente ao grau de civilização dos indivíduos e da sociedade. Para Rabello (1928)RABELLO, Eduardo. O problema do câncer. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE HYGIENE, 2., 1924, Belo Horizonte. Anais... Rio de Janeiro: Pimenta de Mello e Cia., 1928. v. 1., bem como para outros médicos do período, uma noção mais ‘realista’ do impacto do câncer no país, com levantamentos estatísticos mais aprimorados, revelariam como travar a luta contra “a doença a caminho do Brasil” (Rabello, 1928RABELLO, Eduardo. O problema do câncer. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE HYGIENE, 2., 1924, Belo Horizonte. Anais... Rio de Janeiro: Pimenta de Mello e Cia., 1928. v. 1., p. 123).

Outro importante médico, engajado na criação de instituições de pesquisa e assistência à doença, o paulista Antônio Prudente, comungava da mesma opinião. Em 1934, o cirurgião paulista, fundador da Associação Paulista de Combate ao Câncer, lançou um livro/manifesto com o título “O câncer precisa ser combatido”3. Logo no preâmbulo do trabalho, ele utiliza uma retórica fatalista para se referir à doença como uma ‘ameaça do futuro’.

Nas palavras de Prudente (1934, p. V)PRUDENTE, Antônio. O câncer precisa ser combatido. São Paulo: Calvino Filho Editor, 1934.: “A mortalidade pelo câncer alarma a sociedade moderna! O número de óbitos, causado por ele, cresce ininterruptamente! Tem-se a impressão de que é o maior flagelo da humanidade atual, o destino obrigatório da humanidade do futuro”.

O livro possuía o objetivo claro de divulgar a doença, que se mostrava desconhecida à população e aos próprios médicos brasileiros. No capítulo ‘Câncer das raças e da civilização’, Prudente (1934)PRUDENTE, Antônio. O câncer precisa ser combatido. São Paulo: Calvino Filho Editor, 1934. discorria sobre o papel da composição racial e do ‘grau de civilização’ na incidência da doença nas populações. Quanto ao segundo tópico, o cirurgião afirmava haver uma relação de proporcionalidade entre civilidade e o número de óbitos pela doença, pois “a maior porcentagem do câncer nos países civilizados explica-se pelo maior número de fatores externos de propriedades cancerígenas existentes nos meios mais adiantados” (Prudente, 1934PRUDENTE, Antônio. O câncer precisa ser combatido. São Paulo: Calvino Filho Editor, 1934., p. 46). No quesito ‘raça’, Prudente (1934)PRUDENTE, Antônio. O câncer precisa ser combatido. São Paulo: Calvino Filho Editor, 1934. faz referência à literatura que afirma haver uma maior recorrência de cânceres em pessoas brancas, remetendo à maior sensibilidade da pele, à exposição ao sol e a outras lesões. O médico também indicava que a organização da ‘luta anticancerosa no Brasil’ estava em estágio muito inicial e encontrava grande dificuldade, devido aos diferentes graus de civilização entre os estados federativos. Por isso, sustentava que a organização de uma campanha contra a doença em nível nacional era necessária (Prudente, 1934PRUDENTE, Antônio. O câncer precisa ser combatido. São Paulo: Calvino Filho Editor, 1934., p. 168).

Em 1935, em comemoração ao seu cinquentenário, a Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro organizou o I Congresso Brasileiro de Câncer. Além do aspecto comemorativo, o evento, de grande envergadura, tinha entre os principais objetivos conseguir apoio do governo federal para um projeto de construção de um hospital especializado em câncer no Rio de Janeiro4. Suas mesas congregaram os mais conhecidos membros da elite médica brasileira que trabalhavam com câncer. Entre eles, destacam-se o cirurgião Mário Kroeff, que havia elaborado uma tese de livre-docência sobre a utilização da eletrocirurgia em cirurgias de câncer e aplicava essa técnica no Serviço Cirúrgico da Santa Casa do Rio de Janeiro; o já citado Antônio Prudente; e João de Barros Barreto, então diretor do Departamento de Saúde, do Ministério da Educação e Saúde Pública do governo Getúlio Vargas. O evento se mostra como um momento privilegiado para a observação da forma como os médicos enquadraram o câncer nas primeiras décadas do século XX.

De modo geral, os trabalhos apresentados no congresso tinham o objetivo de mostrar o câncer como mazela social, argumento que abria caminho para que se pensassem as possibilidades de organização de uma ação nacional para o seu controle. Para tanto, era necessário maior conhecimento sobre a doença. Assim, o certame foi aberto com uma seção direcionada aos aspectos epidemiológicos do câncer. Na primeira mesa, foi discutido o relatório oficial sobre a incidência da doença, elaborado e apresentado por Elder Jansen de Mello. Esse relatório ressaltava o contínuo crescimento da incidência do câncer nas capitais brasileiras e atentava para a importância do refinamento dos estudos estatísticos que pudessem dar conta dos diversos grupos com maior mortalidade. Para o autor, “as variações do coeficiente espelham mudanças na composição específica da população [...], com aumento ou diminuição dos grupos mais afetados; nesses casos, os coeficientes para a comparação de diferentes épocas ou locais deverão ser ajustados ou padronizados” (Mello, 1936MELLO, Elder Jansen de. Frequência e mortalidade por câncer no Brasil. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CÂNCER, 1., 1935, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Saúde Pública/Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, 1936. 2 v., p. 28). A preocupação do autor com a elaboração de taxas ajustadas de mortalidade por câncer se relacionava à busca de maior conhecimento sobre os grupos populacionais mais propícios a desenvolver a doença.

A preocupação de Melo (1936)MELLO, Elder Jansen de. Frequência e mortalidade por câncer no Brasil. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CÂNCER, 1., 1935, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Saúde Pública/Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, 1936. 2 v. residia na possibilidade de diferentes grupos raciais apresentarem níveis específicos de suscetibilidade ao câncer. Essa preocupação é facilmente observada pelo fato de ele tomar como base de sua discussão um trabalho publicado pelo médico João de Barros Barreto, então diretor do Departamento Nacional de Saúde, sobre o câncer. Nele, Barreto discutia uma comunicação apresentada por outros dois importantes médicos, Eduardo Rabello e Sérgio de Azevedo, no II Congresso Brasileiro de Higiene, na qual afirmavam que a crescente mortalidade pela doença no Sul do país poderia ser decorrente da maior concentração de estrangeiros provenientes da Europa (Barreto, 1935BARRETO, João de Barros. Campanha contra o câncer: bases para a sua realização no Rio de Janeiro. Arquivos de Higiene, v. 5, n. 2, p. 75-98, dez. 1935.).

A primeira comunicação apresentada após o relatório de Jansen de Mello foi feita por Antônio Prudente, o qual discutiu a frequência e a mortalidade por câncer em São Paulo. Ele alertava que a frequência do câncer aumentava dia a dia, enquanto os índices de outras doenças, como a tuberculose, vinham diminuindo consideravelmente (Prudente, 1936PRUDENTE, Antônio. A frequência do câncer em São Paulo. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CÂNCER, 1., 1935, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Saúde Pública/ Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, 1936. 2 v.). Para compreender esse movimento, Prudente (1936)PRUDENTE, Antônio. A frequência do câncer em São Paulo. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CÂNCER, 1., 1935, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Saúde Pública/ Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, 1936. 2 v. buscava aproximações com casos de cidades europeias, como Viena, apontando que:

O aumento da frequência do câncer é mais acentuado entre os povos mais civilizados; esse facto pode ser constatado na observação dos seguintes dados: na Inglaterra, em 1911, havia, em cada 15 óbitos, 1 por câncer, em 1926, 1 para cada 8 óbitos; na Alemanha, a letalidade por câncer atinge hoje mais de dez por cento da mortalidade geral; o mesmo aumento se observa na França e na Itália, sendo que, neste país, segundo Lutrario, a mortalidade por câncer, no período de 1887 a 1923, passou de 427 a 714 por milhão de habitantes (Prudente, 1936PRUDENTE, Antônio. A frequência do câncer em São Paulo. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CÂNCER, 1., 1935, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Saúde Pública/ Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, 1936. 2 v., p. 34).

O ponto central do argumento de Prudente (1936)PRUDENTE, Antônio. A frequência do câncer em São Paulo. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CÂNCER, 1., 1935, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Saúde Pública/ Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, 1936. 2 v. era que, em países civilizados, o câncer começou a ser uma causa de morte maior do que as principais doenças, em especial a tuberculose. Além disso, sua intenção, ao abordar o câncer como uma ‘doença da civilização’, era aludir à necessidade de maior atenção aos levantamentos estatísticos sobre as diversas formas da doença e os grupos que ela mais atingia, pois, segundo ele, os dados existentes estavam longe de sugerir um cenário próximo da realidade.

De forma semelhante ao relatório de Mello (1936)MELLO, Elder Jansen de. Frequência e mortalidade por câncer no Brasil. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CÂNCER, 1., 1935, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Saúde Pública/Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, 1936. 2 v., Prudente (1936)PRUDENTE, Antônio. A frequência do câncer em São Paulo. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CÂNCER, 1., 1935, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Saúde Pública/ Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, 1936. 2 v. afirmava que o câncer atingia mais fortemente a população estrangeira, e postulava a necessidade de ampliação dos estudos epidemiológicos sobre a doença para melhor conhecimento dos grupos com maior suscetibilidade:

[...] os estrangeiros em geral oferecem uma porcentagem quase sempre acima de 10% da letalidade geral, enquanto para os brasileiros essa porcentagem é apenas de 1,62%. Esse fato é, em parte, justificado pela mortalidade infantil que praticamente não existe para o elemento estrangeiro, o qual emigra quase sempre já adulto. Mas, mesmo considerando tal fato, mantém-se a desproporção exagerada, pois em 1928 e 1929 morreram mais italianos vitimados pelo Câncer em São Paulo do que brasileiros, apesar do número de brasileiros adultos ser seguramente cinco vezes maior do que o de italianos (Prudente, 1936PRUDENTE, Antônio. A frequência do câncer em São Paulo. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CÂNCER, 1., 1935, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Saúde Pública/ Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, 1936. 2 v., p. 41).

As comunicações sobre a incidência e a mortalidade provocada pelo câncer indicam que os participantes do congresso compartilhavam a compreensão da doença como um problema oriundo das ‘nações mais civilizadas’. A percepção do nível diferenciado de sua frequência entre elementos nacionais e estrangeiros também aponta que essa ideia se apresentava de forma ambígua, mesclando uma visão que identificava a doença com a sociedade onde ela parecia estar mais presente em relação à outra, relacionada à raça ou à herança genética dos que vieram dessas regiões. Independentemente das incongruências dessas formas de pensar, a principal atividade a ser incentivada era a ampliação dos conhecimentos epidemiológicos sobre a doença, de modo a possibilitar o seu controle.

A associação entre doenças e ‘civilização’, segundo Rosenberg (2007)ROSENBERG, Charles. Pathologies of progress: the idea of civilization as risk. In: ROSENBERG, Charles (Ed.). Our present complaint: American Medicine, then and now. Baltimore: John Hopkins University Press, 2007. p. 77-95., era recorrente desde meados do século XIX na Europa, com a indicação de que os processos de urbanização e industrialização traziam consigo benesses à população, mas também criavam novas enfermidades. No Brasil, essa relação entre civilização e câncer encontrava um cenário ambíguo. Por um lado, os médicos investiam em argumentos sobre o aumento da incidência da doença nas capitais dos estados e na importância de quantificá-la de forma mais precisa.

Por outro, a imagem que se impunha no pensamento sanitário – e social – brasileiro era de um país que ainda lidava com o problema das endemias rurais e as marcas do atraso social e econômico, sintetizado duas décadas antes na frase ‘o Brasil é um imenso hospital’, proferida pelo médico Miguel Pereira (Hochman; Lima, 1996HOCHMAN, Gilberto; LIMA, Nísia Trindade. Condenado pela raça, absolvido pela medicina: o Brasil descoberto pelo movimento sanitarista da Primeira República. In: MAIO, Marcos Chor; SANTOS, Ricardo Ventura (Org.). Raça, ciência e sociedade. Rio de Janeiro: FIOCRUZ/CCBB, 1996. p. 23-40.).

Todavia, pensar o câncer como uma doença ‘estrangeira’ não representava indicar que ela não ocorresse em nosso país, nem que era desnecessário pensar em estruturas para o seu controle. Como foi indicado, desde a década de 1920, vinham surgindo iniciativas de criação de espaços específicos para tratar os doentes de câncer de forma adequada. No I Congresso de Câncer, a possibilidade de ampliação dessas instituições e sua transformação em uma ação coordenada no campo da saúde ganharam um lugar de destaque, a partir de diferentes propostas para a criação de uma campanha nacional contra o câncer.

Uma das propostas nesse sentido foi a de João de Barros Barreto, diretor do Departamento Nacional de Saúde Pública e figura influente no círculo médicoprofissional. Sua comunicação mostrava-se como a publicização da ‘agenda’ do DNSP em relação à doença e previa que o controle do câncer se faria de forma conjunta pela iniciativa estatal e filantrópica – modelo de organização do controle de doenças crônicas à época. Assim, caberia ao governo federal organizar, dar as diretrizes, fiscalizar e colaborar com os fundos necessários para suprir as instituições existentes ou a serem criadas. Além disso, também deveria se responsabilizar pela implantação de um centro especializado no Distrito Federal. Os governos estaduais deveriam criar postos de diagnóstico por todo o país, além de centros de maior complexidade em alguns estados mais populosos. À sociedade civil caberia organizar diversas ligas que se responsabilizariam pela execução de uma grande campanha para a obtenção de fundos visando à construção de hospitais dedicados aos doentes e, também, a criação de comitês de popularização das medidas de prevenção (Teixeira et al., 2012TEIXEIRA, Luiz Antonio; PORTO, Marco Antonio; NORONHA, Claudio. O câncer no Brasil: passado e presente. Rio de Janeiro: Outras Letras, 2012.).

Apesar do interesse pelo câncer, os médicos brasileiros imaginavam que ele ainda era um problema de pequena monta no país, se comparado às dificuldades que produzia na Europa. Para a compreensão desse aspecto, é preciso levar em conta o cenário da saúde brasileira no período. Em meados da década de 1930, nossas estatísticas sanitárias ainda eram dominadas pelo poder destruidor de doenças infecciosas e parasitárias, como a malária, a tuberculose e a febre amarela. Em um país onde a realidade da maior parte da população produtiva se debatia com problemas de ordem sanitária, que poderiam ser debeláveis por ações preventivas, debater problemas historicamente relacionados ao envelhecimento do corpo parecia uma veleidade. O câncer era, finalmente, uma doença a caminho do Brasil, mas que chegava a passos lentos.

UM NOVO PROBLEMA DO BRASIL: O CÂNCER COMO DOENÇA DO DESENVOLVIMENTO

A partir da década de 1940, as agendas dos médicos dedicados ao controle do câncer no Brasil ganharam maior ressonância, devido, entre outras coisas, a um novo cenário político e institucional que se desenhava no país. Durante a ditadura de Vargas, o processo de estruturação da saúde pública teve como um dos pontos marcantes a criação de serviços nacionais dedicados a doenças específicas, como o Serviço Nacional de Tuberculose e o Serviço Nacional de Malária5. Em 1941, foi criado o Serviço Nacional de Câncer (SNC), com o objetivo de promover a pesquisa, a educação sanitária e a assistência aos cancerosos. A criação do SNC atendia aos interesses apresentados pelos médicos no congresso de 1935, com a demarcação de um espaço institucional específico para o controle da doença no país.

O ingresso do câncer na órbita dos serviços nacionais se relacionou também a dois diferentes aspectos. Por um lado, o desenvolvimento técnico no campo da cirurgia, em particular com o aperfeiçoamento da eletrocirurgia, e de técnicas de prevenção e diagnóstico precoce de alguns cânceres (colo de útero e mama) potencializou as preocupações médicas com a doença. Por outra parte, a atuação de personagens importantes no campo médico, com grande influência na criação de políticas públicas, como Antônio Prudente e Mario Kroeff, favoreceu ainda mais essa ampliação.

Com a fundação do SNC, presenciou-se o surgimento de novas ligas, sociedades e instituições de assistência a cancerosos nos estados da federação, claramente com o intuito de serem agregadas à campanha nacional contra a doença. Essa inserção abria a possibilidade de reconhecimento por parte dos pares e, principalmente, de recursos públicos federais para as pesquisas e, sobretudo, para as atividades de assistência. Por outro lado, a criação de um aparato institucional e a expectativa de recursos e novas possibilidades no campo profissional levaram a uma mobilização dos médicos pela conformação de sua prática nos moldes de uma especialidade.

Em 1946, criou-se a Sociedade Brasileira de Cancerologia (SBC), ligada aos fundadores do SNC e voltada para a organização da prática médica, com a proposta de elaborar cursos de formação em cancerologia e outras ações para o direcionamento dos profissionais (Teixeira; Fonseca, 2007TEIXEIRA, Luiz Antonio; FONSECA, Cristina. De doença desconhecida a problema de saúde pública: o INCA e o controle do câncer no Brasil. Rio de Janeiro: Ministério da Saúde, 2007.). No âmbito do SNC e da SBC, foi lançada a Revista Brasileira de Cancerologia (RBC), uma publicação, a princípio trimestral, com o objetivo de “tornar conhecidos os trabalhos elaborados no SNC” (RBC, 1947REVISTA BRASILEIRA DE CANCEROLOGIA (RBC). [S.l: s.n.], v. 1, n. 1, p. 1-2, set. 1947., p. 7), visando também a estabelecer diálogos com experiências de outros estados. Nos momentos iniciais da publicação, a RBC foi um importante veículo para os médicos defenderem a noção do câncer como uma ‘mazela social’, repensando um novo enquadramento para a doença no país.

Em 1951, Mário Kroeff, então diretor do Serviço Nacional de Câncer, publicou um artigo intitulado ‘O câncer como flagelo’, no qual faz uma análise comparativa da situação do câncer no Brasil e em outros países, como os Estados Unidos. O trabalho segue uma tendência de outros artigos que atentavam para o estatuto do câncer como mazela social, procurando apontar diversas estatísticas de frequência e mortalidade pela doença nas capitais brasileiras. Segundo o cirurgião:

Como já tivemos ocasião de salientar, a população da América Latina vive menos do que vivem os americanos do Norte. Nossa gente morre no caminho, antes de chegar à idade do câncer, que é dos 40 em diante. Assim, nosso baixo índice de incidência por câncer não significa sinal de civilização, mas de atraso sanitário (Kroeff, 1951KROEFF, Mário. O câncer como flagelo: exposição feita à Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 4, n. 7, p. 68-77, jan.-jun. 1951., p. 70).

A observação de Kroeff (1951)KROEFF, Mário. O câncer como flagelo: exposição feita à Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 4, n. 7, p. 68-77, jan.-jun. 1951. sobre o câncer se aproxima do que foi apontado para a década de 1930: a ideia de uma doença associada à ‘civilização’, a um estado superior de organização social e que teria ‘superado’ as doenças transmissíveis. Porém, é importante atentar para um novo termo que surge na fala do cirurgião, o ‘atraso sanitário’. Essa expressão traz consigo uma série de significados para o câncer em uma época na qual as visões em torno das ações em saúde e do próprio conhecimento médico se transformavam.

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, a discussão em torno do papel da ciência e da medicina na sociedade ganhou novos tons, em parte impulsionados pelos avanços tecnológicos, como a quimioterapia e a radiação por cobalto. Contrapondo-se ao clima de tensão social remanescente dos conflitos, ganha forma uma visão positiva em torno da capacidade do conhecimento médico em solucionar os problemas de saúde das populações. No mundo médico brasileiro, essa visão positiva da saúde esteve diretamente relacionada ao processo de intensificação da urbanização e de emergência da industrialização no país, no contexto de vigência do ideal desenvolvimentista6. Tratava-se, então, de utilizar o poder da ciência e da medicina para erradicar diversas doenças, com novos recursos tecnológicos e terapêuticos (como o diclorodifeniltricloroetano – DDT, os antibióticos, os inseticidas etc.). Associadas a essa forma de pensar o controle das doenças, estavam as proposições, então em debate, de que o desenvolvimento socioeconômico era um pré-requisito para a melhoria da saúde e de que investir na saúde da população era investir no progresso e no desenvolvimento do país (Hochman, 2009HOCHMAN, Gilberto. “O Brasil não é só doença”: o programa de saúde pública de Juscelino Kubitschek. Revista História, Ciências, Saúde -Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 16, p. 313-331, jul. 2009. Suplemento.).

Nessa perspectiva, o discurso que via o Brasil como um país atrasado, por conta das endemias rurais, onde o câncer parecia estar presente de forma ainda muito tímida, se defrontava com a ideia do país em franco desenvolvimento, em que as ações de saúde proveriam as condições para o avanço socioeconômico7. Assim, o câncer assumia um novo enquadramento, sendo cada vez mais identificado como um problema de grande importância, agora relacionado ao intenso processo de desenvolvimento vivenciado ou esperado.

Desde o final do século XIX, a associação do câncer com fatores urbanos e industriais ganhou maior relevância nos estudos da etiologia da doença (Imbault-Huart, 1985IMBAULT-HUART, Marie-José. História do cancro. In: LE GOFF, Jacques (Org.). As doenças têm história. Lisboa: Terramar, 1985. p. 165-176.). O conceito de carcinogênese, relacionado ao processo de constituição dos tumores, contribuiu para uma noção menos vaga do que poderia estar relacionado ao surgimento de células cancerosas no corpo humano (Löwy, 2010LÖWY, Ilana. Preventive strikes: woman, precancer and prophylatic surgery. Baltimore: John Hopkins University Press, 2010.). Essas associações compreendiam desde elementos físicos até aspectos diretamente ligados à vida urbana e ao mundo industrial, como a contaminação por derivados do alcatrão (Cantero, 1952CANTERO, A. Considerações gerais sobre o problema do câncer. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 5, n. 8, p. 94-95, jun. 1952.). Nesse cenário, a doença foi gradativamente configurada como um problema urbano e industrial, sendo o aumento de sua incidência um resultado direto da ampliação das cidades e das fábricas, além das mudanças nos hábitos cotidianos.

Aliado a isso, o desenvolvimento de novas tecnologias, ligadas ao tratamento e ao diagnóstico do câncer, tornou a enfermidade cada vez mais relacionada à prática médica de ponta, com intervenções que iam além do espaço clínico e da habilidade do cirurgião. O avanço da quimioterapia e dos tratamentos de radiação, desenvolvidos após a Segunda Guerra, fez com que as atenções para a pesquisa médica e o uso das novas técnicas ganhassem importância cada vez maior. Em casos de cânceres específicos, como o de colo do útero, as técnicas de detecção ganhavam maior destaque, como, por exemplo, o exame colposcópico e a citologia (Teixeira, 2015aTEIXEIRA, Luiz Antonio. O câncer de colo do útero no Brasil. In: TEIXEIRA, Luiz Antonio (Org.). Câncer de mama e de útero no Brasil: conhecimentos, políticas e práticas. Rio de Janeiro: Outras Letras, 2015a. p. 75-114., 2015bTEIXEIRA, Luiz Antonio. From gynaecology offices to screening campaigns: a brief history of cervical cancer prevention in Brazil. Revista História, Ciências, Saúde - Manguinhos, v. 22, n. 1, p. 221-239, jan.-mar. 2015b.). Foi em meio a esse desenvolvimento de novas tecnologias e das mudanças institucionais favoráveis ao controle do câncer, que se iniciou um processo mais intenso de conformação de redes de médicos dedicados ao câncer, intitulando-se de cancerologistas.

Enquadrado como um problema de saúde urbanoindustrial e objeto das novas tecnologias científicas, o câncer (como outras doenças crônicas) foi alçado ao estatuto de um ‘sinal de desenvolvimento’. Nesse sentido, a baixa incidência da doença no país era interpretada pelos médicos como um indicativo de ‘atraso sanitário’, ou seja, prevaleciam as endemias rurais e o Brasil seguia majoritariamente pobre e rural. A partir do impulso desenvolvimentista e da mobilização pela organização da cancerologia e do controle do câncer no país, a perspectiva da doença como uma realidade nacional passou a vigorar de forma mais constante.

No programa para a área da saúde, Juscelino Kubitschek, candidato à presidência em 1955, apontava o câncer como um ‘novo problema nacional’, que seria derrotado pelo ‘poder da ciência médica’ (Kubitschek, 1955KUBITSCHEK, Juscelino. Programa de saúde pública do candidato. São Paulo: L. Nicollini, 1955.). De acordo com o candidato mineiro, tratava-se de “um novo problema de saúde que não é apenas nosso, mas de todos os países civilizados” (Kubitschek, 1955KUBITSCHEK, Juscelino. Programa de saúde pública do candidato. São Paulo: L. Nicollini, 1955., p. 28). Assim, a doença servia de elemento retórico para reposicionar o país, sugerindo que o aumento de sua incidência era resultante da ampliação do grau de desenvolvimento socioeconômico do Brasil. O uso retórico da doença, nesse sentido, ajuda a compreender a maior importância a ela atribuída e sua nova forma de se vincular às representações sobre a sociedade brasileira.

Em 1954, um dos eventos de maior reconhecimento no campo da cancerologia foi realizado em São Paulo. O VI Congresso Internacional de Câncer foi organizado pela Union Internationale Contre le Cancer, instituição criada para compartilhar os conhecimentos e as ações para o controle da doença entre diversos países. Contando com a participação de 586 médicos, dos quais 199 eram brasileiros, a edição do congresso foi estruturada em sessões temáticas, conferências, exibições de filmes, discursos de autoridades públicas e visitas a instituições de controle do câncer. Parte do material apresentado no congresso foi publicada nos números da Revista Brasileira de Cancerologia, e o conjunto de resumos das comunicações, além de informações gerais sobre o evento, foi publicado em um livro de anais (RBC, 1954REVISTA BRASILEIRA DE CANCEROLOGIA (RBC). [S.l: s.n.], v. 10, n. 8, ago. 1954.; CIC, 1955CONGRESSO INTERNACIONAL DE CÂNCER (CIC), 6., 1955, São Paulo. Anais... São Paulo: Union Internationale Contre le Cancer, 1955.).

O evento foi sediado em São Paulo, provavelmente devido à atuação do então diretor do Serviço Nacional de Câncer, o paulista Antônio Prudente. Mais do que representar um marco importante para a legitimação da cancerologia, o VI Congresso Internacional de Câncer também reforçou junto às autoridades a necessidade de maior atenção para a doença. Além disso, a realização de um evento desse porte no Brasil indicava um maior nível de organização da área médica em torno da doença e o fortalecimento da rede de cancerologistas.

No discurso inaugural do congresso, o então governador de São Paulo, Lucas Nogueira Garcez, sintetizou a perspectiva apresentada em outras falas oficiais acerca do câncer, qualificando-o como uma doença relacionada à industrialização, à urbanização e ao avanço do conhecimento científico:

Sua importância decorre, paradoxalmente, dos progressos da Medicina, que, ampliando a duração média da vida, oferece oportunidades maiores para o seu aparecimento, conhecida que é sua predileção pela velhice. O aperfeiçoamento do diagnóstico é outro responsável pelo relevo com que hoje figura o câncer nas estatísticas da mortalidade. Mas é indubitável que isso só não explica proporções de calamidade que essa doença está assumindo, ceifando vidas em todas as idades, enraizando-se em todas as latitudes com a enfermidade típica do século, ou melhor, da civilização que a Ciência, a técnica, a indústria e a democracia estão edificando no mundo dos nossos dias (Garcez, 1954GARCEZ, Lucas Nogueira. VI Congresso Internacional de Câncer. São Paulo, 1954. (Comunicação oral)., comunicação oral).

Se o câncer era apresentado como a ‘doença da civilização’, era fundamental identificar a sua incidência no território brasileiro, a fim de dimensionar o problema (e qualificar a enfermidade como tal). Nesse sentido, Jorge de Marsillac, chefe da Seção de Organização e Controle do Serviço Nacional de Câncer, apresentou, juntamente com o sanitarista Naim Merched, um estudo amplo sobre as estatísticas de câncer no país. Segundo o médico, “as observações estatísticas demonstram, sem dúvida alguma, a importância que o mesmo vem assumindo em nosso país, fazendo-se traduzir, a exemplo do que ocorre em todo o mundo, pela ascensão progressiva da mortalidade pelo terrível flagelo” (Marsillac; Merched, 1954MARSILLAC, Jorge de; MERCHED, Naim. Câncer e estatística. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 10, n. 12, p. 40-65, dez. 1954., p. 41). Marsillac e Merched (1954) sugeriam que o câncer havia ingressado no rol de problemas sanitários nacionais, ainda que houvesse inúmeras limitações na quantificação dos casos. Para os autores, já se podia prever que, em um futuro próximo, “a doença ocupará os primeiros postos no obituário, a exemplo do que já ocorre em outros países mais adiantados” (Marsillac; Merched, 1954MARSILLAC, Jorge de; MERCHED, Naim. Câncer e estatística. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 10, n. 12, p. 40-65, dez. 1954., p. 42).

É interessante observar, na análise de Marsillac e Merched (1954)MARSILLAC, Jorge de; MERCHED, Naim. Câncer e estatística. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 10, n. 12, p. 40-65, dez. 1954., a relação entre o aumento da mortalidade por câncer, o sucesso no controle das doenças transmissíveis e a melhoria nos padrões de vida, decorrente do desenvolvimento das técnicas de prevenção de diversas doenças e do desenvolvimento em geral.

Entre os primeiros estão incluídos a maior longevidade do homem na atualidade e principalmente a maior facilidade do que se dispõe hoje para o diagnóstico da doença. À medida que o homem é melhor defendido contra as infecções e infestações de toda natureza, que a sua alimentação é melhor balanceada e que a medicina preventiva ocupa o lugar que deve, o gênero humano aumenta gradativamente a média de vida (Marsillac; Merched, 1954MARSILLAC, Jorge de; MERCHED, Naim. Câncer e estatística. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 10, n. 12, p. 40-65, dez. 1954., p. 42).

No momento em que se organizava a campanha contra a bouba no Brasil (Muniz, 2013MUNIZ, Érico Silva. Basta aplicar uma injeção? Desafios e contradições da saúde pública nos tempos de JK (1956-1961). Rio de Janeiro: FIOCRU, 2013.), o combate à doença de Chagas (Kropf, 2009KROPF, Simone. Doença de Chagas, doença do Brasil: ciência, saúde e nação (1909-1962). Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2009.), as ações pela erradicação da malária (Campos, 2006CAMPOS, André Luiz Vieira de. Políticas internacionais de saúde na Era Vargas: o Serviço Especial de Saúde Pública (1942-1960). Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2006.), entre outras ações sanitárias dirigidas a doenças vinculadas à pobreza, o argumento de que o país progredia e, com isso, passava a encarar problemas de saúde típicos de nações desenvolvidas pode parecer contraditório, mas encontrou aceitação na esfera pública, bem como legitimidade entre os médicos, à medida que parecia indicar que estava em marcha a superação das doenças que nos acorrentavam a um passado de atraso.

Para os cancerologistas, o país finalmente começava a fazer parte do conjunto de nações confrontadas com os problemas do desenvolvimento. Essa situação reforçava sua posição profissional, justificava a mobilização pela criação de novas instituições de assistência a cancerosos e pela ampliação da campanha nacional contra a doença, cada vez mais considerada um problema social relevante. Avaliado como uma doença do desenvolvimento, da urbanização, da indústria, agora assentada no país, o câncer teve mais espaço na agenda da saúde pública nacional.

DE PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA À DOENÇA TROPICAL: O CÂNCER COMO DOENÇA DO SUBDESENVOLVIMENTO

Na abertura da III Jornada Brasileira de Cancerologia, realizada em Recife (PE), em outubro de 1963, o presidente da Sociedade Brasileira de Cancerologia, Ivo Roesler, proferiu um discurso no qual, ao versar sobre os problemas de saúde do Nordeste, propunha a reconsideração do cenário epidemiológico local, apontando que, mesmo em porções mais atrasadas desse território, o quadro nosológico estabelecido na Primeira República já não mais servia às ações do poder público. Segundo o médico:

As doenças de massa, infecciosas e parasitárias, estão sendo vencidas pela educação sanitária e pelos modernos recursos terapêuticos, diminuindo gradativamente entre nós a sua incidência, enquanto se avoluma cada vez mais o número de pacientes com câncer. Esta afecção está hoje como uma das principais causas de mortalidade nos países mais desenvolvidos, e à medida que se acelera o progresso econômico-social deste país, aumenta a sua casuística, seja pelo aumento da vida média dos brasileiros, seja pelo aprimoramento dos métodos de detecção precoce. Infelizmente, nem todas as regiões do país possuem já facilidades hospitalares para o seu tratamento em grande escala, e em nosso Estado, apenas 20% dos pacientes com câncer podem ser devidamente tratados, perdendo-se, assim, um considerável número de vidas ainda numa idade de plena capacidade de trabalho (Roesler, 1963ROESLER, Ivo Carlos. III Jornada Brasileira de Cancerologia. Recife, 1963. (Comunicação oral)., comunicação oral).

Apesar de descrever um cenário demasiado positivo, no qual as ‘doenças de massa’ (Roesler, 1963ROESLER, Ivo Carlos. III Jornada Brasileira de Cancerologia. Recife, 1963. (Comunicação oral)., comunicação oral) estariam sendo ‘derrotadas’ pelo progresso médico – o que, certamente, não condiz com a realidade social do Nordeste no período, quando a seca, a exploração latifundiária e as endemias levavam várias pessoas a migrarem para grandes cidades –, o presidente da SBC apresenta um argumento importante para compreender o cenário da doença naquele momento: a falta de condições socioeconômicas de uma região é considerada um entrave para o pleno funcionamento do controle do câncer. Uma observação que pode parecer óbvia, no entanto, inverte a equação câncer e desenvolvimento, até então apresentada.

No discurso do médico, a associação entre os avanços da sociedade e o aumento da mortalidade pelo câncer havia se consolidado. Porém, se até os anos 1950 essa relação formatava a doença como um ‘sintoma de civilização’, a partir da década de 1960, ganha força essa nova interpretação que atribuía a maior dificuldade para o controle de diversos tipos de canceres à falta de assistência aos setores mais pobres da população. No encerramento da III Jornada Brasileira de Cancerologia, Moacyr Santos Silva, diretor do Instituto Nacional de Câncer, recorre ao mesmo argumento:

E não pensem os menos avisados que o problema do câncer não seja importante no Nordeste assolado pela fome e pelas doenças do subdesenvolvimento. Segundo o que se observa no Serviço da Cátedra de patologia do prof. Barros Coelho e segundo me foi referido pelo Dr. Adonis Carvalho, ilustre e operoso secretário geral desse Congresso, o câncer do aparelho genital feminino na cidade do Recife já contribui mais que a eschistossomose como causa de morte da mulher pernambucana. E nesse ponto, o câncer pode e tem que ser considerado doença ligada ao subdesenvolvimento (Silva, 1963SILVA, Moacyr Santos. III Jornada Brasileira de Cancerologia. Recife, 1963. (Comunicação oral)., comunicação oral).

Nesse discurso, fica clara a associação entre câncer e pobreza, praticamente invertendo a chave interpretativa predominante até os anos 1950: o câncer não era mais um sinal de desenvolvimento ou civilização e, sim, a marca do atraso. E, nesse ponto, havia também o interesse dos cancerologistas em elevar a doença ao estatuto de problema de saúde pública, apontando a mortalidade como o índice, e a pobreza como a causa. A observação do câncer como causa mortis superior à esquistossomose é relevante, pois essa verminose figurava entre os principais temas discutidos na região desde a década de 1940, quando passaram a ser organizados os Congressos Médicos do Nordeste Brasileiro (CMNB, 1953CONGRESSO MÉDICO DO NORDESTE BRASILEIRO (CMNB), 2., 1953, Fortaleza. Anais... Fortaleza: Centro Médico Cearense, 1953.).

Nos anos seguintes à III Jornada, o Brasil passaria por mudanças sociais e políticas profundas e a área da saúde se depararia com um novo cenário instalado pelos governos militares. O fortalecimento da medicina previdenciária e o total desmantelamento do Ministério da Saúde, nos primeiros anos após 1964, determinaram a ampliação da visão governamental a respeito do câncer e de outras doenças crônicas, como doenças individuais, a serem tratadas pela medicina curativa de base previdenciária, filantrópica ou privada.

Frente a esse cenário, o médico Adonis de Carvalho8 publicou, em 1967, na Revista Brasileira de Cancerologia, um denso trabalho intitulado ‘Câncer como problema de medicina tropical’. Fruto de comunicações apresentadas nas III e IV Jornadas Brasileiras de Cancerologia, seu trabalho apresenta um argumento extremamente refinado em relação às noções de câncer como uma doença do subdesenvolvimento, defendidas por seus pares nos congressos anteriores e em outros trabalhos mencionados pelo autor. A proposta do patologista era pensar não somente um novo lugar da doença na sociedade, mas também um novo estatuto para ela na ciência médica.

Há alguns anos atrás, pareceria absurdo um artigo sobre câncer como problema de Medicina Tropical. Esse absurdo deriva do fato de que os tradicionais centros de ensino médico localizam-se na Europa. A patologia ‘normal’ desses centros é a patologia das doenças comumente vistas por lá. A maioria desses países colonialistas tinha interesse no conhecimento das doenças que grassavam nas colônias, principalmente visando à proteção dos seus colonos. Em verdade, as afecções encontradas nas populações nativas, como sabemos hoje, dependem muito mais de condições precárias de vida, em ambientes hostis não dominados pelo homem, do que de circunstâncias outras climáticas ou ligadas à geografia da região (Carvalho, 1967CARVALHO, Adonis de. Câncer como Problema de Medicina Tropical. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 23, n. 35, p. 65-89, dez. 1967., p. 67).

A Medicina Tropical é uma área tradicional do conhecimento biomédico, cujas origens remontam ao contexto colonialista da Europa no século XIX. Seu objeto seriam as doenças transmissíveis, provenientes das regiões mais quentes, muitas delas difundidas a partir da ação de vetores. Entretanto, uma discussão mais aprofundada sobre o conceito de ‘doenças tropicais’, realizada pela historiografia da medicina, aponta para os aspectos sociais da construção dessa noção, mostrando a predominância de um argumento social para a definição da enfermidade como tropical, em contraponto à determinação climatológica e geográfica. Ou seja: as doenças seriam dos trópicos porque aqui há condições socioeconômicas precárias para o seu controle, não porque o clima determina a recorrência dessas enfermidades9.

O próprio Adonis de Carvalho indica que a imprecisão do conceito de Medicina Tropical vinha sendo discutida pelos médicos do período, que passavam a associá-la aos trópicos o subdesenvolvimento, e não à climatologia (Carvalho, 1967CARVALHO, Adonis de. Câncer como Problema de Medicina Tropical. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 23, n. 35, p. 65-89, dez. 1967.). O autor propunha que se pensasse em uma ‘Cancerologia Tropical’, a fim de dar conta das particularidades do problema do câncer nessa região. Para tanto, procurou demonstrar em seu trabalho a elevada incidência da doença na região Nordeste do Brasil, que, segundo ele, melhor representaria um lugar de condições socioeconômicas precárias, particularmente em Recife, lugar de fala do médico e espaço onde desenvolveu suas pesquisas clínicas.

Seu trabalho enumera os principais tipos de tumores recorrentes em países de clima tropical e nos estados brasileiros, levando-o ao argumento de que certos tipos de câncer seriam mais comuns em regiões pobres (lábio, língua, boca, faringe, esôfago, estômago, laringe, útero e pele), outros em regiões ricas (cólon, intestino delgado, mama e ovário), enquanto alguns seriam indiferentes a fatores econômicos (reto, pulmões e próstata) (Carvalho, 1967CARVALHO, Adonis de. Câncer como Problema de Medicina Tropical. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 23, n. 35, p. 65-89, dez. 1967.). Assim, haveria um grupo de canceres característicos das regiões tropicais que poderiam ser objeto de estudos de uma ‘Cancerologia Tropical’, que se dedica-se, principalmente, aos tumores ocorridos em tecidos de revestimento, os quais, segundo o autor, eram os principais das regiões subdesenvolvidas.

Para a perspectiva analítica aqui adotada, o estudo de Carvalho (1967)CARVALHO, Adonis de. Câncer como Problema de Medicina Tropical. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 23, n. 35, p. 65-89, dez. 1967. coloca-se como produto de um novo enquadramento da doença, então vista como um problema com especificidades próprias no Brasil, e não mais como um sintoma de um estágio de civilização a que o país almejava chegar ou pensava ter chegado. Agora, o câncer era relacionado às mazelas e precariedades, frutos de uma desigualdade social historicamente construída. Em seus comentários, Carvalho (1967)CARVALHO, Adonis de. Câncer como Problema de Medicina Tropical. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 23, n. 35, p. 65-89, dez. 1967. chega a classificar alguns tumores como ‘doenças de massa’, indicando a necessidade de se encarar a doença como um problema médico e social alarmante; no caso, a solução defendida pelo médico é a criação de uma Cancerologia Tropical como uma área da ciência biomédica, de modo similar à Medicina Tropical. A proposta de Adonis de Carvalho não gerou consequências práticas; no entanto, ela não pode ser vista como fruto de uma observação isolada do problema do câncer no Brasil, mas, sim, como uma mudança na interpretação da doença, que paulatinamente crescia no país. (Carvalho, 1967CARVALHO, Adonis de. Câncer como Problema de Medicina Tropical. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 23, n. 35, p. 65-89, dez. 1967.).

A partir de meados da década de 1970 – quando o intenso crescimento econômico se conectou à progressiva busca dos governos militares de ampliação da cobertura das ações de saúde, como concessões a demandas sociais que lhes poderiam garantir o mínimo apoio social (Escorel, 2012ESCOREL, Sarah. História das políticas de saúde no Brasil de 1964 a 1990: do golpe militar à reforma sanitária. In: GIOVANELLA, L.; ESCOREL, S.; LOBATO, L. V.; NORONHA, J. C.; CARVALHO, A. I. (Org.). Políticas e sistema de saúde no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2012. p. 323-364.) –, o câncer voltou a ter maior visibilidade. Com a criação do Plano Nacional de Combate ao Câncer, em 1973, a doença passou a ocupar ainda mais espaço nas pautas da saúde pública, tornando-se cada vez mais uma questão socialmente reconhecida. A partir da década de 1980, o maior desenvolvimento do Instituto Nacional do Câncer trouxe uma nova perspectiva para o controle da doença. A elaboração de ações integradas entre o Instituto e o Ministério da Saúde e a mobilização em torno da educação sanitária e da detecção precoce colocavam o câncer em um novo patamar de importância. Nesse contexto, as iniciativas nacionais para a detecção de tumores específicos, como o de colo do útero e o de mama, e as ações para o controle do tabaco ganharam maior dimensão, ampliando ainda mais a visibilidade da doença (Teixeira; Fonseca, 2007TEIXEIRA, Luiz Antonio; FONSECA, Cristina. De doença desconhecida a problema de saúde pública: o INCA e o controle do câncer no Brasil. Rio de Janeiro: Ministério da Saúde, 2007.).

A associação entre condições socioeconômicas precárias e as dificuldades em detectar e tratar o câncer foram se consolidando nas décadas seguintes. A observação da relação entre alguns cânceres – como o de colo e o de pulmão – com pobreza, nível educacional e carência de informações fortaleceu esse processo (Salvatore, 1976SALVATORE, Carlos Alberto. Epidemiologia do câncer ginecológico e mamário. Ginecologia Brasileira, v. 8, n. 6, p. 217-228, 1976.).

Em relação ao câncer de colo, a partir da década de 1960, o consenso médico sobre a ampliação dos riscos da doença em mulheres tabagistas, com grande número de parceiros sexuais e/ou vivendo sob condições de higiene inadequadas ampliou as preocupações com a doença, até então vista como um mal democrático, que atingia todas as mulheres indiscriminadamente. No final da década de 1970, a descoberta da associação desse câncer ao vírus HPV (Human papillomavirus) fortaleceu a compreensão de o maior risco de contrair a doença estar entre as populações mais pobres e desassistidas, aspecto que proporcionou, duas décadas mais tarde, a criação do primeiro programa nacional para a prevenção da doença – o Viva Mulher (Teixeira, 2015bTEIXEIRA, Luiz Antonio. From gynaecology offices to screening campaigns: a brief history of cervical cancer prevention in Brazil. Revista História, Ciências, Saúde - Manguinhos, v. 22, n. 1, p. 221-239, jan.-mar. 2015b.).

No que tange ao câncer de pulmão, as evidências científicas sobre a gigantesca ampliação do risco de contraí-lo em função do uso do tabaco vinham se acumulando desde a década de 1960 e, aos poucos, passaram a ser preocupações dos médicos brasileiros. Ações educativas e tentativa de criação de leis que freassem o grande consumo do produto foram buscadas por associações médicas, em particular pela Associação Brasileira de Cancerologia, que, em 1979, liderou um conjunto de associações científicas e instituições ligadas à saúde, com o objetivo de elaborar um Programa Nacional Contra o Fumo (Jaques, 2010JAQUES, Tiago A. Impasses e estratégias: convenção-quadro e controle do tabagismo no Brasil (1986-2005). 2010. 130 f. Dissertação (Mestrado em História das Ciências e da Saúde) – Casa de Oswaldo Cruz, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2010.). De forma semelhante ao câncer de colo, a observação da relação entre câncer de pulmão, uso de tabaco e pobreza foi um dos motores para a ampliação da mobilização contra o tabaco, que possibilitou ao país tornar-se um dos primeiros signatários da Convenção Quadro para Controle do Tabaco, em 2003, e, a ela, aderir, formalmente, em 200510.

Os exemplos acima mostram que a concepção da doença exteriorizada por Carvalho (1967)CARVALHO, Adonis de. Câncer como Problema de Medicina Tropical. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 23, n. 35, p. 65-89, dez. 1967. manteve-se relevante nas décadas finais do século XX. O câncer não podia ser mais encarado como uma doença da civilização ou sintoma do progresso. Deveria ser visto como um problema de saúde (pública) do Brasil, envolvido pelos aspectos sociais e culturais diversos existentes no país.

CONCLUSÃO

A análise da associação entre doença e sociedade ao longo de várias décadas revela como esses aspectos foram vistos pelos atores sociais de uma época, a partir de seus interesses e visões de mundo. No caso do câncer, a ideia de uma doença vinculada à civilização e ao desenvolvimento socioeconômico marcou os primeiros anos de organização das ações para o seu controle no país. Essa concepção estava diretamente ligada aos projetos de nação elaborados desde a Primeira República, que se baseavam na noção de que o Brasil tinha como destino o estatuto de país civilizado, com grandes cidades ao estilo europeu, onde se estabeleceriam novos hábitos e estilos de vida, em contraste com o atraso que ainda imperava, em especial nas zonas rurais.

Na década de 1930, no ambiente de reestruturação da saúde pública do governo Vargas, a ideia de que seria possível ‘salvar a raça pela medicina’ (Hochman; Lima, 1996HOCHMAN, Gilberto; LIMA, Nísia Trindade. Condenado pela raça, absolvido pela medicina: o Brasil descoberto pelo movimento sanitarista da Primeira República. In: MAIO, Marcos Chor; SANTOS, Ricardo Ventura (Org.). Raça, ciência e sociedade. Rio de Janeiro: FIOCRUZ/CCBB, 1996. p. 23-40.), oriunda do movimento sanitarista dos anos 1920, direcionava as ações públicas ao combate às enfermidades transmissíveis, sobretudo as verminoses e as infecções. Ainda assim, no ambiente das grandes cidades, em que a urbanização e a industrialização apontavam para novos problemas e possibilidades da vida cotidiana e do mundo do trabalho, a preocupação de grupos específicos com as doenças consideradas ‘da civilização’ trouxe à luz o câncer e suas implicações como mazela social.

Nos anos 1950, por sua vez, foi ampliada a capacidade propositiva dos grupos relacionados ao controle da doença compostos por médicos, filantropos, políticos e pessoas da elite de modo geral. Tal processo vinculou-se à criação de aparatos institucionais para o controle do câncer, tanto em nível local quanto nacional, bem como pelo impulso da ideologia desenvolvimentista no país, que trouxe ideais de modernidade e de consumismo, e o acirramento do processo de industrialização nas grandes cidades brasileiras. Nesse cenário, o câncer não era mais encarado como a doença específica de uma zona ‘civilizada’ do mundo ou de alguma composição étnico/genética relacionada a essas regiões, mas, sim, ingressava no rol de preocupações da população brasileira, como um sinal de que o país progredira em seu projeto de nação.

Finalmente, no período da ditadura civil-militar – momento de desenvolvimento econômico e ampliação de desigualdades sociais –, os médicos passaram a ver a doença por outro viés, pensando nas limitações de abrangência dos serviços de saúde e nas condições de subsistência que ampliavam o risco de contrair certos tipos de câncer. A observação da iniquidade social e sua relação com alguns tipos de câncer potencializaram uma nova concepção da doença, agora vista como um problema com forte impacto em países subdesenvolvidos, principalmente pelas dificuldades de subsistência e de acesso a serviços médicos vividas por grande parte da população.

O longo período discutido nas páginas precedentes sugere como o quadro mais amplo das interpretações sobre a sociedade brasileira articulou-se aos conhecimentos médicos, à organização institucional da medicina e às demandas mais gerais da saúde pública na conformação de novos sentidos para o câncer. Apesar de colocar a discussão em termos biomédicos e da organização da medicina em nível profissional e acadêmico, os médicos articularam diversos elementos de interpretação da sociedade para criar ou, pelo menos, buscar consensos sobre uma doença que, mesmo rodeada por novos conhecimentos e técnicas, seguia cercada de grandes incógnitas para a medicina.

Na perspectiva dos trabalhos de Rosenberg (1992ROSENBERG, Charles E. Framing disease: studies in cultural history. New Brunswick: Rutgers University Press, 1992., 2007)ROSENBERG, Charles. Pathologies of progress: the idea of civilization as risk. In: ROSENBERG, Charles (Ed.). Our present complaint: American Medicine, then and now. Baltimore: John Hopkins University Press, 2007. p. 77-95., é possível afirmar que as transformações no processo de ‘enquadramento’ da doença se deram em meio a questões que extrapolaram o campo médico. De doença da civilização a problema de saúde pública, o câncer foi significado de diversas formas pela medicina brasileira, atendendo não somente a demandas e disputas do campo médico, mas também às preocupações e às tensões em torno da nação que se construía ao longo do século XX.

  • 1
    O enquadramento (framing) é um conceito desenvolvido pelo historiador Rosenberg (1992)ROSENBERG, Charles E. Framing disease: studies in cultural history. New Brunswick: Rutgers University Press, 1992., o qual propõe uma análise acerca das negociações entre medicina, poder público e sociedade a respeito dos significados das doenças.
  • 2
    As redes, segundo Latour (2000)LATOUR, Bruno. Ciência em ação: como seguir cientista e engenheiros sociedade afora. São Paulo: UNESP, 2000., são os caminhos através dos quais a atividade científica transita entre diversas localidades, com a circulação de pessoas, instrumentos, técnicas e ideias. A partir da conformação das redes, é possível a construção de fatos científicos e artefatos técnicos, ou seja, os cientistas são capazes de legitimar sua prática e elaborar consensos.
  • 3
    Antônio Prudente era um afamado cirurgião paulista dedicado a cirurgias de câncer. Além de fundar a Associação Paulista de Combate ao Câncer, foi responsável pela criação do maior hospital filantrópico de tratamento da doença, na década de 1950, o então chamado Hospital A. C. Camargo. Prudente chegou a dirigir o Serviço Nacional do Câncer em dois diferentes momentos (Teixeira; Fonseca, 2007TEIXEIRA, Luiz Antonio; FONSECA, Cristina. De doença desconhecida a problema de saúde pública: o INCA e o controle do câncer no Brasil. Rio de Janeiro: Ministério da Saúde, 2007.).
  • 4
    Na década de 1920, uma articulação entre Carlos Chagas e Guilherme Guinle deu início ao esforço pela criação de um centro de cancerologia, mantido pela Fundação Oswaldo Cruz (Sanglard, 2008SANGLARD, Gisele. Entre os salões e os laboratórios: Guilherme Guinle, a saúde e a ciência no Rio de Janeiro, 1920-1940. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2008.). Embora o projeto de hospital para cancerosos não tenha obtido êxito, serviu de base para as movimentações da ‘Liga brasileira contra o câncer’, visando à criação da instituição, considerada o primeiro passo para uma campanha contra o câncer no país (Teixeira, 2009TEIXEIRA, Luiz Antonio. O câncer na mira da medicina brasileira. Revista Brasileira de História da Ciência, Rio de Janeiro, v. 2, n. 1, p. 104-117, jan.-jun. 2009.).
  • 5
    A criação dessas seções no âmbito do Ministério da Educação e Saúde marcou o chamado modelo vertical, em que a atenção à saúde da população era direcionada a doenças específicas, em detrimento de uma linha mais ampla de cuidados. Sobre a estruturação da saúde pública estatal nesse período, ver Fonseca (2007)FONSECA, Cristina. Saúde na Era Vargas (1930-1945): dualidade institucional de um bem público. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2007..
  • 6
    Em linhas gerais, o desenvolvimentismo propunha a complementaridade entre Estado e mercado, defendendo a adoção de uma estratégia estatal de transformação produtiva que permitisse potencializar o processo de industrialização e de crescimento e compatibilizá-lo com uma melhor distribuição de renda (Pereira, 2011PEREIRA, José Maria Dias. Uma breve história do desenvolvimentismo no Brasil. Cadernos do Desenvolvimento, Rio de Janeiro, v. 6, n. 9, p. 121-141, jul.-dez. 2011.).
  • 7
    Nesse período, havia uma intensa discussão em torno da relação entre doença e desenvolvimento socioeconômico. Alguns médicos e intelectuais defendiam que a melhoria das condições sociais era a maneira de resolver o problema das endemias rurais. Outros acreditavam que esse desenvolvimento tinha essas doenças como obstáculos e propunham seu imediato controle. Evidentemente, essas concepções estavam envoltas em questões de cunho político. Para a compreensão das visões sobre a relação saúde/riqueza e doença/pobreza, ver Hochman (2009HOCHMAN, Gilberto. “O Brasil não é só doença”: o programa de saúde pública de Juscelino Kubitschek. Revista História, Ciências, Saúde -Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 16, p. 313-331, jul. 2009. Suplemento., 2015)HOCHMAN, Gilberto. Samuel Barnsley Pessoa e os determinantes sociais das endemias rurais. Ciência & Saúde Coletiva, v. 20, n. 2, p. 425-431, 2015..
  • 8
    Adonis de Carvalho, mencionado na citação de Moacyr Santos Silva, era um importante nome da medicina em Pernambuco, ocupando a cátedra de Anatomia e Fisiologia Patológica da Faculdade de Medicina, da Universidade Federal de Pernambuco, além de ser o patologista-chefe da Clínica de Câncer do Recife.
  • 9
    Tal questão é bem discutida em relação à hanseníase no estudo de Pumar (2009)PUMAR, Letícia. Sentidos de um “país tropical”: a lepra e a chaulmoogra brasileira. 2009. 157 f. Dissertação (Mestrado em História das Ciências e da Saúde) – Casa de Oswaldo Cruz, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2009..
  • 10
    A Convenção Quadro para Controle do Tabaco é um tratado internacional de saúde pública, proposto e realizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) a partir de 1999. Negociado por 194 países, tem como objetivo a adoção, por seus diversos membros, de medidas de restrição ao consumo de cigarros e outros produtos derivados do tabaco (Jaques, 2010JAQUES, Tiago A. Impasses e estratégias: convenção-quadro e controle do tabagismo no Brasil (1986-2005). 2010. 130 f. Dissertação (Mestrado em História das Ciências e da Saúde) – Casa de Oswaldo Cruz, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2010.).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2017

Histórico

  • Recebido
    13 Maio 2016
  • Aceito
    30 Set 2016
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