Acessibilidade / Reportar erro

Termos de parentesco nas línguas Tuparí (família Tupí)

Kin terms in the Tuparian languages (Tupian family)

Resumo

Este artigo analisa os termos de parentesco nas cinco línguas do ramo Tuparí, da família linguística Tupí, em duas abordagens distintas. Inicialmente, o artigo apresenta uma comparação das terminologias de parentesco das línguas Tuparí e reconstrói correlatos no Proto-Tuparí para as principais categorias de parentes consanguíneos e afins. As cinco línguas Tuparí apresentam termos claramente cognatos e reconstruíveis para a protolíngua para as diversas posições de parentesco: avós (FF, FM, MF, MM), pais (M, F), tios (MZ, MB, FZ), irmãos (B, Z), primos (FBS, FBD), filhos (S, D), sobrinhos (BS, BD, ZD, ZS), netos (SS, SD, DS, DD) e afins (W, H, DH). A partir da comparação das terminologias de parentesco nas línguas Tuparí, o artigo discute aspectos da terminologia do sistema de parentesco Tuparí, procurando situá-lo no contexto da teoria amazônica do parentesco pós-1990, tendo como base as representações terminológicas das línguas individuais e as reconstruções postuladas para Proto-Tuparí.

Palavras-chave
Ramo linguístico Tuparí; Terminologia de parentesco; Reconstrução lexical

Abstract

This article analyzes kinship terminology in the five languages of the Tupari branch of the Tupi family through two distinct approaches. First, the article compares kinship terms used in the Tupari languages and reconstructs ancestral Proto-Tupari forms for the main categories of consanguineous kin and in-laws. The five members of the Tupari branch possess clearly cognate terms which can be reconstructed for the proto-language of the family in various shared kinship configurations: grandparents (FF, FM, MF, MM), parents (M, F), aunts and uncles (MZ, MB, FZ), siblings (B, Z) and cousins (FBS, FBD), children (S, D), nieces and nephews (BS, BD, ZD, ZS), grandchildren (SS, SD, DS, DD), and affines (W, H, DH). Building upon the comparison of kinship terms within the contemporary Tupari languages and the ancestral forms reconstructed for Proto-Tuparí, these kinship systems are then discussed through the lens of anthropological theory, situating them within the theoretical developments in Amazonian kinship studies since 1990.

Keywords
Tupari linguistic branch; Kinship terminology; Lexical reconstruction

INTRODUÇÃO

O ramo Tuparí integra a família Tupí e é composto por cinco línguas ainda faladas atualmente: Akuntsú, Wayoró, Makurap, Sakurabiat e Tuparí. Todas as línguas do ramo Tuparí são faladas no atual estado brasileiro de Rondônia, localizado na região Noroeste do país. Este artigo analisa e compara os termos de parentesco nas cinco línguas do ramo Tuparí, estabelece os padrões gerais da terminologia do sistema de parentesco e propõe a reconstrução dos principais termos de parentesco para a língua ancestral das línguas atuais, o Proto-Tuparí. Com base na comparação das terminologias de parentesco das línguas Tuparí e nos correlatos reconstruídos para Proto-Tuparí, apresenta-se, aqui, uma análise dos padrões de terminologia dos sistemas de parentesco dos grupos Tuparí, buscando-se identificar suas principais características, por meio de abordagem comparativa internamente ao ramo Tuparí e em relação às principais classificações dos sistemas de parentesco dos grupos amazônicos, especialmente dos grupos Tupí.

A classificação tradicional da família Tupí (Rodrigues, 1984-1985RODRIGUES, A. D. Relações internas na família linguística Tupí-Guaraní. Revista de Antropologia, São Paulo, v. 27/28, p. 33-53, 1984-1985.) identifica dez ramos principais pertencentes a ela: Arikém, Mondé, Puruborá, Ramarama, Tuparí, Mundurukú, Jurúna, Awetí, Mawé e Tupí-Guaraní. Desde então, novos subagrupamentos têm sido propostos, gerando um refinamento do agrupamento clássico das línguas Tupí. O subgrupo Mawetí-Guaraní reúne os ramos Mawé, Awetí e Tupí-Guaraní (Dietrich, 1990DIETRICH, W. More evidence for an internal classification of Tupi-Guarani languages. Berlin: Gebr. Mann Verlag, 1990.; Meira; Drude, 2015MEIRA, S.; DRUDE, S. A summary reconstruction of proto-maweti-guarani segmental phonology. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, Belém, v. 10, n. 2, p. 275-296, maio/ago. 2015. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1981-81222015000200005.
https://doi.org/10.1590/1981-81222015000...
), e o subgrupo Ramarama-Puruborá reúne esses dois ramos (Galucio; Gabas-Júnior, 2002GALUCIO, A. V.; GABAS-JÚNIOR, N. Evidências de agrupamento genético Karo-Puruborá, tronco Tupi. In: ENCONTRO NACIONAL DA ANPOLL, 17., Gramado, 2002. Boletim Informativo […]. Gramado: UFRGS: FAURGS, 2002. p. 163.). O ramo Tuparí é o segundo maior dentro da família linguística Tupí e ocupa posição bastante estratégica nos estudos histórico-comparativos de línguas desta família, devido ao número de línguas ainda faladas atualmente e ao grau de divergência entre elas, o que sugere uma profundidade temporal relativamente grande. Estima-se que a separação das atuais línguas do ramo Tuparí tenha ocorrido mais de 2.000 anos antes do presente.

As cinco línguas do ramo Tuparí são classificadas como gravemente ameaçadas, pois todas possuem número muito reduzido de falantes e diversos graus de interrupção em sua cadeia de transmissão. Wayoró e Akuntsú estão em situação mais crítica, seguidas de perto por Sakurabiat. O povo Akuntsú foi contatado oficialmente em 1995 pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI), nas cabeceiras do rio Omeré, como sobreviventes de massacres realizados nas décadas anteriores por fazendeiros não indígenas. Atualmente, há somente três pessoas desta etnia vivendo na Terra Indígena Omeré, os quais são falantes monolíngues de Akuntsú. O povo Wayoró está dividido em duas localidades, com população total de pouco menos de 300 pessoas. A maioria da população vive na Terra Indígena (TI) Rio Guaporé, situada no município de Guajará-Mirim, e um grupo menor vive na cidade de Rolim de Moura do Guaporé, em uma área semiurbana. Os dados de 2018 apontam que há somente três falantes plenos da língua e possivelmente cerca de oito falantes passivos, que compreendem parcialmente a língua. O povo Sakurabiat possui uma população de 87 pessoas vivendo na Terra Indígena Rio Mequens, no município de Alto Alegre dos Parecis, além de algumas outras vivendo em localidades e/ou cidades próximas. Conforme levantamento realizado em 2018, somente 13 pessoas falam a língua fluentemente e oito compreendem, mas não falam a língua. A grande maioria da população Sakurabiat que vive na TI Rio Mequens entende e conhece somente algumas palavras na língua indígena. O povo Makurap possui população total de cerca de 555 pessoas, distribuídas entre a TI Rio Guaporé e a TI Rio Branco, no município de Alta Floresta d’Oeste. Desse total, há, aproximadamente, 50 falantes fluentes, 80 semifalantes e 60 falantes passivos, distribuídos entre as duas TI. O povo Tuparí possui população total de cerca de 620 pessoas, também distribuída entre a TI Rio Guaporé e a TI Rio Branco. Desse total, há 340 falantes fluentes e 78 falantes passivos da língua Tuparí, na TI Rio Branco, além de sete falantes fluentes, oito semifalantes e 15 falantes passivos, na TI Rio Guaporé1 1 Os dados populacionais e de falantes provêm de informações obtidas in loco pelos autores e também de levantamentos sociolinguísticos realizados entre 2016 e 2018 por linguistas associados ao Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG), no âmbito do levantamento regionalacerca da situação das línguas indígenas de Rondônia, efetuado para o Inventário Nacional da Diversidade Linguística (INDL). .

Para este trabalho, os dados das línguas Sakurabiat, Tuparí e Wayoró foram coletados, respectivamente, por Ana Vilacy Galucio, Adam Roth Singerman, Antônia Fernanda Souza Nogueira e Nicole Soares-Pinto, em diferentes épocas, sendo posteriormente organizados no questionário de termos de parentesco, disponibilizado pelo projeto “Tupían and Cariban kinship terminology”, coordenado por Fiona Jordan e Joshua Birchall. Os dados de Makurap foram fornecidos por Rosana Makurap, em entrevista a Joshua Birchall. Para Akuntsú, recorremos ao material publicado sobre a língua (Aragon, 2008ARAGON, C. C. Fonologia e aspectos morfológicos e sintáticos da língua Akuntsú. 2008. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade de Brasília, Brasília, 2008., 2014ARAGON, C. C. A grammar of Akuntsú, a Tupían language. 2014. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Hawai’i at Mānoa, Honolulu, 2014.). Dados da língua Tuparí foram ainda obtidos em Caspar (2014)CASPAR, F. Os Tupari. Uma tribo indígena no Brasil ocidental. Tradução: Adriana Maria Huber Azevedo. [S. l.: s. n.], 2014. Título original: Die Tuparí, ein Indianerstamm in Westbrasilien., com adaptação dos termos para uma transcrição fonológica.

O restante deste artigo está organizado da seguinte forma: a seção “Reconstrução de termos de parentesco no ramo Tuparí” é iniciada com a apresentação das principais características da reconstrução do Proto-Tuparí (subseção “Elementos fonológico-gramaticais relevantes para a reconstrução de termos de parentesco do Proto-Tuparí”), necessárias para o entendimento das reconstruções dos termos de parentesco propostas na subseção seguinte, intitulada “Reconstrução de itens lexicais de parentesco em Proto-Tuparí”. A seção “Terminologia dos sistemas de parentesco nas línguas Tuparí em uma abordagem antropológica-comparativa” destaca algumas características proeminentes da terminologia dos sistemas de parentesco Tuparí, à luz das abordagens antropológicas das relações de parentesco e de organização social dos grupos Tupí. Na seção “Sistema de parentesco Tuparí e a tipologia de parentesco Tupí”, discutimos como o sistema de parentesco reconstruído para os grupos Tuparí pode ser comparado com o sistema mais amplo postulado para os grupos Tupí. Encerramos o artigo com algumas considerações gerais e apontamentos para investigações futuras associadas à análise da organização social e às relações de parentesco dos grupos Tuparí.

RECONSTRUÇÃO DE TERMOS DE PARENTESCO NO RAMO TUPARÍ

Através da aplicação do método histórico-comparativo, a linguística histórica permite investigar o passado das línguas, utilizando dados de línguas atuais ou de línguas conhecidas historicamente, possibilitando levantar hipóteses sobre o passado e o desenvolvimento histórico das línguas comparadas (Hock, 1991HOCK, H. H. Principles of historical linguistics. Berlin: Mouton de Gruyter, 1991.; Fox, 1995FOX, A. Linguistic reconstruction: an introduction to theory and method. Oxford: Oxford University Press, 1995.). Através da comparação sistemática de línguas para as quais há evidências de uma origem comum, o método comparativo permite estabelecer correspondências regulares de sons e propor a reconstrução de sons e palavras existentes na protolíngua, a língua postulada como sendo o ponto original a partir do qual teriam se desenvolvido as línguas comparadas. A partir da reconstrução linguística, das regras de mudanças de som reconstruídas e da forma como as línguas se desenvolveram a partir da protolíngua, podemos também fazer inferências sobre o passado das línguas e a história dos falantes.

Dessa forma, apesar das limitações do método comparativo, a partir das hipóteses sobre o passado das línguas e sua evolução histórica, pode-se fazer inferências sobre os falantes dessas línguas, especialmente sobre a cultura, meio ambiente, processos migratórios e relações sociais internas e externas (Hock, 1991HOCK, H. H. Principles of historical linguistics. Berlin: Mouton de Gruyter, 1991.). No caso das línguas amazônicas, as hipóteses levantadas a partir da comparação e da reconstrução linguísticas podem ser comparadas com os conhecimentos produzidos por outras disciplinas, como etnologia, arqueologia, genética, etnobotânica, entre outras, visando estabelecer padrões entre os resultados dos estudos linguísticos e dessas outras disciplinas que contribuam para a compreensão da história das línguas e dos povos que ocuparam a Amazônia desde tempos imemoriais. Informações sobre processos migratórios e de dispersão geográfica podem ser inferidas a partir da reconstrução linguística e das hipóteses de subagrupamentos linguísticos. Por exemplo, mudanças compartilhadas por um (sub)grupo de línguas geneticamente relacionadas, mas que habitam territórios distintos, podem indicar que esse subconjunto de línguas constituía uma unidade linguística e poderia ocupar ainda o mesmo espaço geográfico no período em que essas mudanças foram estabelecidas.

A reconstrução de palavras referentes a itens e aspectos da cultura material e imaterial pode também ser uma ferramenta para ampliar o conhecimento sobre o passado dos povos com base em inferências sobre a protocultura dos falantes, a partir do pressuposto de que deva haver uma correlação entre palavras reconstruídas para a protolíngua e coisas ou sistemas existentes na protocultura. Palavras reconstruídas para a protolíngua indicariam que as coisas e/ou os conceitos e as relações representados por tais palavras eram conhecidos e/ou utilizados pelos falantes da protolíngua. Um exemplo dessa aplicação dos resultados da linguística histórica para o conhecimento do passado dos povos na Amazônia pode ser encontrado em Rodrigues (2003)RODRIGUES, A. D. Aspectos da história das línguas indígenas da Amazônia. In: SIMÕES, M. do S. (org.). Sob o signo do Xingu. Belém: UFPA: IFNOPAP, 2003. p. 37-51.. A reconstrução para proto-Tupí de palavras para itens relacionados à agricultura, como mandioca, cavador de cova, batata-doce, permite inferir que os falantes dessa protolíngua já praticavam agricultura e utilizavam a mandioca e os instrumentos ligados ao cultivo por volta de 4.000 a 5.000 anos atrás, período estimado para a separação da família linguística Tupí (Rodrigues, 2003RODRIGUES, A. D. Aspectos da história das línguas indígenas da Amazônia. In: SIMÕES, M. do S. (org.). Sob o signo do Xingu. Belém: UFPA: IFNOPAP, 2003. p. 37-51.)2 2 Outros trabalhos que abordam esse tópico, no contexto das línguas indígenas brasileiras, incluem Rodrigues (2000), Moore e Storto (2002), Storto e Franchetto (2006), Galucio (2010), entre outros. Para exemplos das inferências sobre protocultura no âmbito dosestudos comparativos e de reconstrução do Proto-Indo-Europeu, ver Hock (1991, p. 573-578). .

Nesse sentido, muito embora não haja uma correlação direta entre língua, cultura e genética – de modo que uma conexão imediata entre a história de uma língua e a história dos falantes dessa língua, em termos culturais, biológicos e políticos, não deva ser pressuposta –, existe uma conexão que merece ser investigada (Moore; Storto, 2002MOORE, D.; STORTO, L. As línguas indígenas e a pré-história. In: PENA, S. D. J. (org.). Homo Brasilis. São Paulo: FUNPEC Editora, 2002. p. 73-92.). A reconstrução dos itens lexicais da terminologia de parentesco para a língua ancestral hipotetizada para o ramo Tuparí, o Proto-Tuparí, pode contribuir com hipóteses a respeito da organização social dos grupos Tuparí, que, aliadas aos resultados dos estudos etnológicos, podem ampliar o entendimento do sistema mais amplo das relações de parentesco Tupí, quando comparadas com termos reconstruídos para outros ramos da família. Todavia, essas correlações precisam ser analisadas com cautela, para não se incorrer no risco de oferecer extrapolações não confirmadas por cada disciplina.

Inicialmente, apresentamos, na subseção “Elementos fonológico-gramaticais relevantes para a reconstrução de termos de parentesco do Proto-Tuparí”, um resumo das principais mudanças de som e segmentos reconstruídos na evolução do Proto-Tuparí para as línguas filhas que são importantes para justificar a reconstrução dos termos de parentesco. Na subseção seguinte, apresentamos a proposta de reconstrução para os termos de parentesco, de acordo com os grupos semânticos. Procuramos estabelecer o maior número possível de termos reconstruídos, porém enfrentamos limitações devido à ausência de dados específicos em certos casos, como discutiremos nas próximas subseções.

ELEMENTOS FONOLÓGICO-GRAMATICAIS RELEVANTES PARA A RECONSTRUÇÃO DE TERMOS DE PARENTESCO DO PROTO-TUPARÍ

Moore e Galucio (1994)MOORE, Denny; GALUCIO, Ana Vilacy. Reconstruction of Proto-Tupari consonants and vowels. In: MEETING OF THE SOCIETY FOR THE STUDY OF THE INDIGENOUS LANGUAGES OF THE AMERICAS AND THE HOKAN-PENUTIAN WORKSHOP, 1994, Berkeley. Annals [...]. Berkeley: University of California, 1994. p. 119-137. reconstruíram o quadro de fones do Proto-Tuparí. Posteriormente, tal estudo foi revisto e reva>lidado por Galucio e Nogueira (2011)GALUCIO, A. V.; NOGUEIRA, A. F. Comparative study of the Tupari branch of the Tupi family: contributions to understanding its historical development and internal classification. In: CONGRESSO DE IDIOMAS INDIGENAS DE LATINOAMÉRICA, 5., 2011, Austin. Memórias [...]. Austin: Universidade do Texas, 2011. p. 1-28.. A proposta de segmentos consonantais e vocálicos do Proto-Tuparí (Galucio; Nogueira, 2011GALUCIO, A. V.; NOGUEIRA, A. F. Comparative study of the Tupari branch of the Tupi family: contributions to understanding its historical development and internal classification. In: CONGRESSO DE IDIOMAS INDIGENAS DE LATINOAMÉRICA, 5., 2011, Austin. Memórias [...]. Austin: Universidade do Texas, 2011. p. 1-28.) é apresentada nos Quadros 1 e 2 3 3 Em trabalho apresentado durante o 21º Simpósio Internacional de Iniciação Científica da Universidade de São Paulo (SIICUSP), em São Paulo, realizado no ano de 2018, Rafael Andrade de Almeida lançou uma proposta preliminar de revisão da reconstrução fonológica elexical do Proto-Tuparí. Porém, com base nos dados de que dispomos até o momento, optamos por manter a reconstrução apresentada em Moore e Galucio (1994) e Galucio e Nogueira (2011), embora devamos notar que estudos posteriores podem ajudar a esclarecer alguns pontos da reconstrução. .

Quadro 1
Consoantes reconstruídas para o Proto-Tuparí.
Quadro 2
Vogais breves orais e nasais e vogais longas orais e nasais reconstruídas para o Proto-Tuparí.

A seguir, listamos as mudanças sonoras atestadas nas línguas Tuparí que serão relevantes para a reconstrução dos termos de parentesco da protolíngua. As correspondências de som e os respectivos protossons listados a seguir estão de acordo com os Quadros 1 e 2.

  • *ts > t em Akuntsú, Wayoró, Makurap e Tuparí, exceto diante de /i/ nesta última língua, onde manteve o traço fricativo [s]; em Sakurabiat, *ts permaneceu como [ts] ou mudou para [s] conforme o ambiente. Veja, como exemplo, os cognatos para ‘veado’ e ‘mosquito, mutuca’:

    Proto-Tuparí *ɨtsɨ: : ‘veado’ > Akuntsú ɨtɨ : Wayoró ɨtɨ:4 4 A vogal central é descrita como arredondada por Santos (2010). Análises acústicas estão sendo realizadas com a finalidade de definiressa propriedade da vogal. : Makurap ɨtɨ : Sakurabiat ɨtsɨ: : Tuparí sajpare (não cognato).

    Proto-Tuparí *tsik ‘mosquito, mutuca’ > Akuntsú tik : Wayoró tik (õtɨk ‘mutuca’) : Makurap (nẽtɨk ‘mutuca’) : Sakurabiat sik : Tuparí sik.

    Novos dados da língua Akuntsú, disponíveis a partir do trabalho de Aragon (2014)ARAGON, C. C. A grammar of Akuntsú, a Tupían language. 2014. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Hawai’i at Mānoa, Honolulu, 2014., levantaram a questão sobre se Proto-Tuparí comportava também um fonema africado palatal * paralelo ao fonema africado coronal *ts. Porém, somente Akuntsú apresenta reflexo [] (ao lado de [t]) nas correspondências reconstruídas como *ts. Este reflexo [] não é observado nas outras línguas. A possibilidade de que tenha ocorrido uma inovação em Akuntsú, com a introdução de uma distinção que não ocorria na protolíngua, parece agora ser mais provável5 5 Agradecemos a um dos pareceristas anônimos por chamar a atenção para essa questão. . A oposição -t, em Akuntsú, pode ter surgido a partir da cisão nos reflexos de *ts. Como se pode observar nas palavras para ‘dor’ e ‘ver’, a seguir, as correspondências sistemáticas em todas as outras línguas são compatíveis com o protossom *ts, mas apresentam uma africada palatal como reflexo somente em Akunstú6 6 A motivação para essa cisão em Akuntsú ainda deve ser melhor investigada. . Essa alternativa analítica baseia-se também nos termos de parentesco analisados na próxima seção. O contraste -t em Akuntsú ocorre justamente nos termos para ‘mãe’ ti e ‘avó’ ipap. Do ponto de vista semântico, é muito mais provável que o termo para ‘avó’ derive da raiz para ‘mãe’, como se pode observar nas outras línguas, e não faria sentido reconstruir duas formas distintas.

    Proto-Tuparí *atsi ‘dor’ > Akuntsú ai : Wayoró ati : Makurap ati : Sakurabiat atsi : Tuparí asi.

    Proto-Tuparí *tso ‘ver’ > Akuntsú o : Wayoró to : Makurap to : Sakurabiat so : Tuparí top.

  • *d > t em Akuntsú, nd em Wayoró, em Makurap, t em Sakurabiat, h/Ø em Tuparí.

    Essa correspondência está presente em palavras como ‘casa’, ‘folha’, ‘nome’ e ‘marico; bolsa de tucum’. Conforme explicitado em Galucio e Nogueira (2011)GALUCIO, A. V.; NOGUEIRA, A. F. Comparative study of the Tupari branch of the Tupi family: contributions to understanding its historical development and internal classification. In: CONGRESSO DE IDIOMAS INDIGENAS DE LATINOAMÉRICA, 5., 2011, Austin. Memórias [...]. Austin: Universidade do Texas, 2011. p. 1-28., a maioria das palavras que participam do grupo de cognatos com a correspondência Akuntsú t: Wayoró nd : Makurap : Sakurabiat t: Tuparí h/Ø apenas manifesta essa correspondência de sons na forma possuída da palavra. Galucio e Nogueira (2011)GALUCIO, A. V.; NOGUEIRA, A. F. Comparative study of the Tupari branch of the Tupi family: contributions to understanding its historical development and internal classification. In: CONGRESSO DE IDIOMAS INDIGENAS DE LATINOAMÉRICA, 5., 2011, Austin. Memórias [...]. Austin: Universidade do Texas, 2011. p. 1-28. avaliaram as possibilidades de reconstrução como *ts, *ð ou * para tal correspondência. As autoras concluíram que a hipótese da ocorrência de um *ð ou * não refletiria as tendências no desenvolvimento histórico observado nas línguas filhas. Assim, Galucio e Nogueira (2011)GALUCIO, A. V.; NOGUEIRA, A. F. Comparative study of the Tupari branch of the Tupi family: contributions to understanding its historical development and internal classification. In: CONGRESSO DE IDIOMAS INDIGENAS DE LATINOAMÉRICA, 5., 2011, Austin. Memórias [...]. Austin: Universidade do Texas, 2011. p. 1-28. argumentam em favor da reconstrução de uma consoante alveolar vozeada, *d, alofone atestado em pelo menos uma das línguas filhas, Akuntsú7 7 Em Akuntsú, [d] é um dos alofones de /t/ (ver Aragon, 2008, 2014). , e cujos reflexos teriam desenvolvimento plausível na família linguística. Anteriormente, Moore e Galucio (1994, p. 127)MOORE, Denny; GALUCIO, Ana Vilacy. Reconstruction of Proto-Tupari consonants and vowels. In: MEETING OF THE SOCIETY FOR THE STUDY OF THE INDIGENOUS LANGUAGES OF THE AMERICAS AND THE HOKAN-PENUTIAN WORKSHOP, 1994, Berkeley. Annals [...]. Berkeley: University of California, 1994. p. 119-137. já haviam apontado para a reconstrução de tal correspondência como “[...] um segmento dental *D cuja forma fonética exata é desconhecida [...]”. Veja, como exemplo, as correspondências de som em ‘minha casa’ e ‘marico’:

    Proto-Tuparí *o-dek ‘minha casa’ > Akuntsú o-tek : Wayoró o-ndek : Makurap o-eg-et8 8 A língua Makurap possui um morfema genitivo -et, que ocorre nos sintagmas nominais (SN) possessivos e que possui quatro alomorfes {-et~-t; -en~-n}, determinados pelo traço oral ou nasal do segmento final da palavra (Braga, 2005). : Sakurabiat o-tek : Tuparí o-ek9 9 Tuparí parece ser a única língua que apresenta duas formas possuídas, sendo uma com a consoante [h], quando o possuidor é um SN ou a segunda pessoa do plural wat-, como em Konkoat h-ek ‘casa de Konkoat’ e wat h-ek ‘casa de vocês’, e uma com reflexo Ø, quando o possuidor é expresso na forma de um dos outros prefixos pessoais, conforme ilustrado acima. Em todas as outras línguas, há apenas a alternância entre a forma possuída e a não possuída, sendo a primeira sem a consoante inicial e a segunda, com os reflexos mostrados acima. . Forma não possuída ek ‘casa’.

    Proto-Tuparí endɨ : ‘marico’ > Akuntsú etɨ : Wayoró ẽndɨ : Makurap eɨ : Sakurabiat etɨ : Tuparí eʉ.

  • β > b em Akuntsú e Sakurabiat10 10 Manteve-se como ß em posição de coda silábica, em Akuntsú, e mudou para oclusiva bilabial surda /p/ em início de palavra em Sakurabiat. . Em Tuparí, observa-se três reflexos desse protossom [w], [p] (em posição de coda silábica) e [ps] (quando diante de [i])11 11 Sincronicamente, existe um processo de fricativização envolvendo a consoante oclusiva surda, em Tuparí: /p/ realiza-se foneticamente como [Ф] diante das vogais arredondadas /o/ e /ʉ/ . Em Makurap e Wayoró, β manteve-se geralmente como β.

    A correspondência reconstruída com o protofonema *β pode ser constatada em ‘estrela’.

    Proto-Tuparí *βaroβaro ‘estrela’ > Akuntsú barobaro : Wayoró βaroβaro : Makurap warowaro : Sakurabiat parobaro : Tuparí koepa epa ’iri (que significa literalmente ‘pequeno olho da lua’; claramente não cognato).

    Embora semelhanças em outras línguas da região apontem a possibilidade de empréstimo na palavra ‘estrela’, no ramo Tuparí as correspondências ilustram o desenvolvimento histórico de *β.

  • *kw e *ŋw podem perder o ponto de articulação velar ou ainda mudar para Ø em Makurap e Tuparí. Em Wayoró, mantiveram-se sem mudança, e em Akuntsú e Sakurabiat houve fusão dos reflexos dos dois segmentos em [kw].

    Tais mudanças das consoantes labiovelares da protolíngua podem ser observadas nos seguintes cognatos:

    Proto-Tuparí *ŋwajto ‘jacaré’ > Akuntsú kwato : Wayoró ŋgwajo : Makurap βato : Sakurabiat kwato : Tuparí wao.

    Proto-Tuparí *okwaj ‘rabo’ > Akuntsú okwaj : Wayoró okwaj : Makurap -oaj : Sakurabiat okwaj : Tuparí owaj.

Uma vez apresentada a reconstrução de segmentos do Proto-Tuparí e as mudanças de som relevantes, passemos à proposta de reconstrução de itens lexicais de termos de parentesco da protolíngua.

RECONSTRUÇÃO DE ITENS LEXICAIS DE PARENTESCO EM PROTO-TUPARÍ

As línguas do ramo Tuparí apresentam termos claramente cognatos e reconstruíveis para a protolíngua para as seguintes posições de parentesco: avós (FF, FM, MF, MM), pais (M, F), tios (MZ, MB, FZ), irmãos (B, Z), primos (FBS, FBD), filhos (S, D), sobrinhos (BS, BD, ZD, ZS), netos (SS, SD, DS, DD) e afins (W, H, DH). Utilizando a metodologia padrão do método histórico-comparativo (Fox, 1995FOX, A. Linguistic reconstruction: an introduction to theory and method. Oxford: Oxford University Press, 1995.), podemos propor a reconstrução desses termos e projetar a reconstrução da terminologia do sistema de parentesco12 12 Ao longo do artigo, são usadas siglas dos termos de parentesco que representam as letras iniciais das palavras em inglês: F = father (pai), M = mother (mãe), S = son (filho), D = daughter (filha), B = brother (irmão), Z = sister (irmã), W = wife (esposa), H = husband (marido) e suas combinações. .

TERMOS PARA AS GERAÇÕES G+1 E G+2, PAIS, TIOS, TIAS E AVÓS

Nas línguas Tuparí, em geral, não há um item lexical específico para se referir a ‘pais’ (‘parents’, em inglês). Também não há distinção lexical, nos termos em geral, de acordo com o ego de quem fala. Os termos para ‘pai’ e ‘mãe’ são claramente reconstruídos para a protolíngua porque possuem reflexos cognatos em todas as cinco línguas do ramo (Quadro 3). Com relação aos termos para ‘avós’, apresentados no Quadro 3, vale ressaltar que, para Akuntsú, Aragon (2014)ARAGON, C. C. A grammar of Akuntsú, a Tupían language. 2014. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Hawai’i at Mānoa, Honolulu, 2014. cita também o-toto significando ‘minha avó’, sem explicitar se se trata de FM, MM ou ambas. Em Makurap, o termo de referência para FF/MF/FM/MM não é cognato às demais línguas: o-mbopot-et13 13 Em Wayoró, a palavra mbopot significa ‘flecha’. FF/MF/FM/MM (mbopot ‘avô’, em Braga, 2005BRAGA, A. O. Aspects morphosyntaxiques de la langue Makurap/Tupi. 2005. Tese (Doutorado em Ciências da Linguagem) – Université de Toulouse-Le Mirail, Toulouse, 2005.). Os termos para ‘avós’, em Makurap, cognatos às demais línguas são os vocativos.

Quadro 3. Termos de referência para pais, tios, tias e avós.

Quadro 3
Termos de referência para pais, tios, tias e avós.

É importante mencionar que os termos de parentesco pertencem, em geral, à categoria de nomes inalienáveis nas línguas Tuparí, ou seja, eles ocorrem sempre possuídos, seja por um SN não pronominal, seja por um prefixo pessoal. Por uma questão de clareza na apresentação dos dados, listaremos, em geral, somente a raiz do termo, sem indicação do possuidor. Comentários sobre a forma possuída e/ou a indicação do possuidor serão apresentados conforme necessário.

Na palavra para ‘mãe’, em (1)14 14 Os números entre parênteses se referem às linhas dos quadros em que estão os cognatos. , a correspondência Akuntsú t: Wayoró t: Makurap t: Sakurabiat ts/s : Tuparí s foi reconstruída para Proto-Tuparí como *ts. Veremos que as correspondências vocálicas presentes nos cognatos de termos de parentesco são, em geral, idênticas e, portanto, claramente reconstruídas para o Proto-Tuparí. Por esse motivo, optamos por não discutir as correspondências vocálicas ao longo do texto, julgando não haver prejuízo para elaboração da análise.

O termo para ‘irmã da mãe (MZ)’ na fala masculina, em (2), apresenta a palavra para ‘mãe’ (*tsi) em quatro das cinco línguas, seguida de um modificador nominal significando ‘outro’, que apresenta forma cognata em Wayoró e Sakurabiat. As línguas Makurap e Tuparí apresentam, seguida da palavra para ‘mãe’, a expressão para idade relativa, ‘mais novo’ e ‘mais velho’, não cognata nas duas línguas. Dessa forma, é possível reconstruir *tsi nõ ‘outra mãe’ para (m)MZ.

O termo para (m)MB, em (3), é cognato em todas as línguas, com exceção de Makurap. A reconstrução de uma vogal alta anterior no início da palavra, *itej, justifica-se pela presença do segmento palatal no início da palavra jsej, em Sakurabiat, bem como pela presença da africada em Akuntsú15 15 Em (3), o termo tʃej Akuntsú é traduzido como ‘tio’ (Aragon, 2008) (assim como a palavra jõj – >Aragon, 2008). A descrição como (m) MB é uma hipótese relacionada aos cognatos nas demais línguas. , resultado de assimilação da palatalização dessa vogal, seguida de perda da mesma. Processo semelhante pode ser observado na correspondência da palavra para ‘jacaré’ *ŋwajto > Akuntsú kwato : Wayoró ŋgwajo: Makurap βato: Sakurabiat kwato : Tuparí wao, em que a presença de um segmento palatal (perdido nas demais línguas) causa, em Wayoró, a palatalização da consoante que segue16 16 Os termos para FB em Makurap, Sakurabiat e Tuparí são constituídos pela palavra para ‘pai’, seguida de um modificador nominal, como op-nõ ‘pai-outro’, em Sakurabiat. Em Wayoró, utiliza-se um sintagma genitivo com o termo para irmão (fala masculina) modificando a palavra para ‘pai’, por exemplo, aßi ike ‘irmão mais velho do pai’. Dessa forma, não há uma correspondência regular nesses itens. .

A correspondência Akuntsú t: Wayoró nd : Makurap : Sakurabiat t: Tuparí h/Ø, em (4), é reconstruída como *d. A consoante bilabial oclusiva final ocorre em correspondências regulares e pode ser reconstruída claramente como *p. Justifica-se, assim, a reconstrução da palavra para ‘pai’ como *dop.

O termo para (m)FZ17 17 Em Sakurabiat, o termo correspondente a (m)FZ é igual a (m)MZ si-rõ. O termo aqui apresentado é explicado pelo colaborador como “uma tia distante, [que] não é nem irmã da mãe, nem irmã do pai” (informação verbal in diário de campo de Ana Vilacy Galucio, TI RioMequéns, jul. 2017). , em (5), encontra duas formas em Wayoró, possuída e não possuída, cada uma delas com um correspondente cognato em Tuparí e Sakurabiat. A variação no início de palavra entre as vogais /i/ e /a/ é observada em alguns pares em Wayoró e Sakurabiat, sem que possamos, nesse momento, ter uma conclusão sobre um valor gramatical associado18 18 Exemplos em Wayoró são (f)eZ -ikej/akej e ‘caminho’ -ape/pe. Em Sakurabiat, ‘caminho’ -ape/pe; ‘velho’ poot e ‘tio (m)MeB’ jsej a-poot; ‘criança, novo’ kɨrɨt e ‘tio (m)MyB’ jsej a-kɨrɨt. .

Em (6), *aβatso ‘FF/MF’, a correspondência reconstruída com o protofonema *β pode ser constatada em outros cognatos, conforme a seção “Elementos fonológico-gramaticais relevantes para a reconstrução do Proto-Tuparí”. A consoante reconstruída como *ts apresenta a correspondência Akuntsú : Wayoró t: Makurap t: Sakurabiat ts/s. Como vimos na seção anterior, a reconstrução da consoante africada coronal *ts para essa correspondência assume que houve uma cisão em Akuntsú, a qual teria dado origem à oposição moderna t-, nessa língua. A palavra em Tuparí para ‘avô’ (FF e MF) toto encontra correspondência fonológica apenas na palavra de Akuntsú já mencionada, o-toto (Aragon, 2014ARAGON, C. C. A grammar of Akuntsú, a Tupían language. 2014. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Hawai’i at Mānoa, Honolulu, 2014.), a qual, por outro lado, ocorre como nome possuído e é traduzida como ‘minha avó’, apontando para uma possível mudança semântica.

A mesma correspondência Akuntsú : Wayoró t: Makurap t: Sakurabiat ts/s se observa em (7), no vocábulo para ‘avó’, reconstruído como *tsipap ‘FM/MM’. Semanticamente, é provável que as palavras para ‘avó’ e ‘mãe’ derivem da mesma raiz. O termo Tuparí papa ‘avó’ (FM e MM) é cognato ao termo de Wayoró, mas não aos demais.

Os termos vocativos para ‘pais’ e ‘avós’ são igualmente cognatos, como podemos verificar no Quadro 4.

Quadro 4
Termos vocativos para pais e avós.

A consoante inicial do termo vocativo para ‘mãe’ é reconstruída como *j, na correspondência em (8). Em Sakurabiat, trata-se de uma forma composta (N + N), onde se pode identificar um resquício do vocativo, ã, seguido do termo de referência tsi ‘mãe’. O mesmo processo de composição é visto na segunda forma do vocativo para ‘pai’ nessa língua: abitop = abi + top ‘pai (vocativo)-pai(referência)’.

A reconstrução da forma *aβi para o vocativo ‘pai’, em (9), pressupõe um processo de fricativização no desenvolvimento histórico de um dos reflexos de em Tuparí: *β > p > ps (diante de i), embora sincronicamente (Singerman, 2016SINGERMAN, A. R. Nasal harmony and phonotactic well-formedness in Tupari. International Journal of American Linguistics, Chicago, v. 82, n. 4, p. 453-485, Oct. 2016. DOI: https://doi.org/10.1086/688603.
https://doi.org/10.1086/688603...
, 2018SINGERMAN, A. R. The morphosyntax of Tuparí, a Tupían language of the Brazilian Amazon. 2018. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Chicago, Chicago, 2018.) a palavra apsi precise ser analisada como contendo uma sequência heterossilábica de consoantes [ap.si]. Em Wayoró, Makurap, Sakurabiat e Tuparí, as formas vocativas podem ser usadas como SN sujeitos19 19 Em Tuparí, nessa condição, os SN recebem o caso nuclear, que corresponde segmentalmente ao morfema genitivo em Makurap. Qualquer sujeito não pronominal em Tuparí precisa receber o caso nuclear (Singerman, 2018). Os termos vocativos nunca ocorrem como nomes possuídos. .

As correspondências do exemplo (10) foram discutidas no exemplo (6). Em Sakurabiat, o termo vocativo para ‘avó’ é igual ao termo de referência. No exemplo (11), observa-se duplicação da palavra para ‘mãe’ em Makurap e duplicação silábica em Wayoró e Tuparí. Em Wayoró, é possível identificar a duplicação total ou parcial em radicais nominais como processo histórico de formação de palavras, por exemplo, ɨpkɨp ‘coruja grande’ e tɨtɨɨt ‘coruja pequena’. No entanto, sincronicamente, não identificamos, até o momento, qualquer valor gramatical ou produtividade associado a este processo nessa língua20 20 É necessário observar, contudo, que há um pequeno número de radicais nominais/adjetivais duplicados cuja forma não duplicada é atestada, por exemplo, ŋwãrãkwa ‘listrar (horizontalmente)’ e ŋwãrãŋwãrã ‘listrado’, bem como ame?ko ŋgop ‘onça-vermelha’ e ŋgopŋgop ‘vermelho’. No entanto, em Akuntsú, Sakurabiat e Tuparí, por exemplo, a duplicação é um processo morfológico produtivo, que pode indicar pluralidade e/ou informações aspectuais (Aragon, 2014; Galucio, 2001; Singerman, 2018). Tais dados sugerem que a duplicação pode ter sido um processo morfológico produtivo em Proto-Tuparí, com funções gramaticais específicas. .

É possível que o termo vocativo para ‘avó’ em Proto-Tuparí tenha sido formado por duplicação, como se pode perceber em Wayoró, Makurap e Tuparí. Em Makurap e Sakurabiat, pode-se hipotetizar a formação do vocativo para ‘avó’ (FM e MM) como uma palavra complexa: em Makurap, ti + ti ‘mãe da mãe’ e em Sakurabiat si + pap ‘mãe velha’ (N + N). A composição semântica da construção em Sakurabiat não é transparente, mas pode ser formulada a partir da comparação com outros dados da língua e também com dados de Akuntsú. A hipótese é de que o segundo termo na composição si-pap, em Sakurabiat, derive historicamente de paba ‘seco; mulher idosa; anciã’21 21 Apresentamos alguns exemplos do vocábulo paba ‘seco; mulher idosa; anciã’, em Sakurabiat: a)Poret pabaap te poret setejat aemokwa pa ose ke?ra. “Aí eles (disseram): ‘Não é seco, não. Aonde será que nós vamos?”’ b)Poret te paba akwapna. “Aí a velha atrasou” (literal: “Aí a velha ficou nas costas/ficou atrás”) , com queda da vogal final. Akuntsú também oferece um dado relevante que pode corroborar essa etimologia. Como se observa no Quadro 4, não dispomos dos termos vocativos para ‘pais’ e ‘avós’, em Akuntsú. Porém, Aragon (2014)ARAGON, C. C. A grammar of Akuntsú, a Tupían language. 2014. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Hawai’i at Mānoa, Honolulu, 2014. cita papa como uma raiz adjetiva relativa à idade feminina, significando ‘mulher (após ter dado à luz, mulher de meia-idade)’22 22 Inicialmente, havíamos pensado na possibilidade de o termo si-pap corresponder semanticamente a ‘mãe’ + ‘morta’, uma vez que pap sincronicamente possui essa acepção ‘morto; embriagado (semelhante a morto)’, em Sakurabiat. Porém, essa interpretação é nomínimo pouco plausível, como indicado por um parecerista anônimo. Agradecemos a ele por nos motivar a procurar uma etimologia mais plausível para este termo. .

TERMOS PARA GERAÇÃO 0, IRMÃOS E PRIMOS

Os Quadros 5 e 6 apresentam os termos para irmãos e primos nas cinco línguas do ramo Tuparí e os termos reconstruídos para Proto-Tuparí, com base nas correspondências sonoras regulares.

Quadro 5
Termos para irmãos.
Quadro 6
Termos para primo

As reconstruções dos termos para ‘irmãos/irmãs’ (siblings) nas falas masculina e feminina em todas as posições são bastante transparentes. Os termos para ‘irmão mais velho (eB)’ e ‘irmão mais novo (yB)’ na fala masculina apresentam formas não somente cognatas, mas idênticas em quatro das cinco línguas23 23 Não possuímos o termo para (yB) em Akuntsú. . Sua reconstrução para a protolíngua como *ike e *kip, respectivamente, é plenamente justificada, apesar de não ocorrer forma cognata em Makurap. Como será descrito na seção “Terminologia dos sistemas de parentesco nas línguas Tuparí em uma abordagem antropológica-comparativa”, Makurap é a única das cinco línguas que não distingue os termos para irmãos (siblings) segundo o sexo de ego e a idade relativa dos irmãos/irmãs.

A consoante medial reconstruída para ‘irmão (B)’ na fala feminina *kw apresenta os reflexos esperados: Akuntsú kw: Wayoró kw: Makurap Ø : Sakurabiat kw: Tuparí w/Ø. Em Makurap, a forma oa, que a princípio poderia ser considerada não cognata, apresenta reflexos consistentes com a correspondência reconstruída como *kw, como em *okwaj ‘rabo’ (mencionada anteriormente), ou seja, perda do segmento labiovelar nessa língua. A consoante palatal // em oaj é possivelmente resultado de processo morfológico independente. A reconstrução do termo para ‘irmã (Z)’ na fala masculina como uma palavra morfologicamente complexa, *koj-(pet), justifica-se pela ocorrência de formas cognatas e idênticas em todas as cinco línguas, com exceção de Tuparí, que não apresenta o que seria o segundo morfema. As correspondências sistemáticas na forma para ‘irmã mais nova (yZ)’ na fala feminina ilustram o processo histórico de fricativização de [p] diante de [i] em Tuparí, já discutido anteriormente. É interessante notar a semelhança entre os termos para irmão mais velho (eB) e irmão mais novo (yB), na fala masculina, e os termos para irmã mais velha (eZ) e irmã mais nova (yZ), na fala feminina, sendo possível postular a presença de um morfema {-i/ -j} final nas palavras de gênero feminino, eZ *ike-j, yZ *kɨp-i, contrastando com a ausência desse morfema na forma masculina, eB *ike e yB *kip. Note-se ainda que, no caso de ‘irmã mais nova (yZ)’, na fala feminina, pode-se postular um processo de dissimilação que teria motivado a posteriorização da vogal inicial i > ɨ, em contraste com a forma masculina (eB)24 24 Agradecemos a um dos pareceristas anônimos por ter chamado a atenção para essa possibilidade. .

A seguir, no Quadro 6, apresentamos os termos para FBS e FBD identificados nas referências disponíveis sobre as línguas Tuparí25 25 Os dados para ‘primos’ da língua Wayoró foram projetados com base no seguinte trecho de entrevista com Paulina Macurap sobre termos de parentesco, realizada na Aldeia Ricardo Franco (Guajará-Mirim, Rondônia), em 23 jun. 2008. Quando questionada sobre os termos para ‘primos’ que são sobrinhos da mãe, a colaboradora respondeu: “Essa aí, para nós, não tem primo não. Tudo é irmã”. E acrescentou sobre os primos que são sobrinhos do pai: “Irmão do seu pai, os filhos dele, que ele tem, tudo é teu irmão” (informação verbal in diário de campo de Nicole Soares-Pinto, Guajará-Mirim, 23 jun. 2008). .

Comparando os Quadros 5 e 6, nota-se que os termos identificados e reconstruídos para ‘primos paralelos’ correspondem aos utilizados para ‘irmãos’. Em Makurap, o termo usado para (f)FBeD é, possivelmente, resultado de uma extensão do vocábulo usado por ego masculino, kojtpet26 26 Não dispomos de dados suficientes para a reconstrução das posições (f)FByD, bem como para MZD e MZS. .

TERMOS PARA GERAÇÃO G-1, FILHO, FILHA, SOBRINHOS

Os termos para filho/filha nas falas masculina e feminina são apresentados no Quadro 7, a seguir.

Quadro 7
Termos de parentesco para filho e filha.

A correspondência da consoante inicial da palavra para ‘filho (ego masculino)’ é a mesma de (٤), podendo-se reconstruir a palavra como *daɁɨp. Em Tuparí, as palavras para ‘filho (ego masculino)’ e ‘filha (ego feminino)’ fazem parte do pequeno grupo de termos que apresentam uma alternância na forma possuída. Quando possuídos por um SN não pronominal ou pela segunda pessoa plural wat-, tais palavras apresentam uma consoante inicial h- que não ocorre quando o possuidor é um dos outros prefixos pessoais: compare waɁʉp ‘meu filho (ego masculino)’ com Tigi haɁʉp ‘filho do Tigui’; wak ‘minha filha (ego feminino)’ com Tigi hak ‘filha do Tigui’27 27 Outras palavras que mostram a mesma alternância: ‘pai’ op, Tigi hop; ‘casa’ ek, Tigi hek. .

A palavra para ‘filha (ego masculino)’ pode ser reconstruída como *tak, tendo a primeira consoante sofrido queda na língua Tuparí, em alguns contextos28 28 O mesmo processo de queda de *t na língua Tuparí pode ser notado na palavra para ‘jacaré’ Akuntsú kwato: Wayoró ŋgwajtʃo: Makurap βato: Sakurabiat kwato: Tuparí wao. , e se realiza como [h] em outros. Conforme explicitado, em Tuparí, a consoante inicial h- apenas ocorre quando a palavra é possuída por um SN não pronominal ou pela segunda pessoa do plural wat-. Apesar dos reflexos da consoante inicial em Tuparí coincidirem com os reflexos de *d, optamos por reconstruir a consoante inicial como *t, e não como *d, devido a todas as outras línguas apresentarem como reflexo t, e não os reflexos esperados de *d > Akuntsú t: Wayoró nd : Makurap : Sakurabiat t.

A palavra para ‘filho’ ou ‘filha’ para ego feminino pode ser reconstruída como *mẽpit. Nesse caso, a forma em Tuparí mẽmsit evidencia novamente o processo de fricativização da consoante oclusiva surda p diante da vogal anterior alta [i], no processo de desenvolvimento histórico a partir do Proto-Tuparí, como hipotetizado na análise do termo vocativo para ‘pai’, acima.

A seguir, no Quadro 8, apresentamos os termos identificados para ‘sobrinhos’29 29 Em (31), o termo em Akuntsú é registrado apenas para ZD, e o termo em Tuparí é descrito apenas para ZS. .

Quadro 8
Termos de parentesco para sobrinhos.

Pelos termos reconstruídos, é possível observar que ego masculino usa os mesmos termos para ‘filhos’ (Quadro 7) para se referir aos filhos do irmão de mesmo sexo, porém, para se referir aos filhos da irmã (sexo oposto), usa o termo reconstruído como *mãjkɨt ‘sobrinho’. De forma semelhante, ego feminino utiliza o termo para ‘filhos’ para se referir aos filhos da irmã. Este termo vem acompanhado da palavra para ‘irmã mais nova’ e ‘irmã mais velha’, em Sakurabiat. Ao passo que, para se referir aos filhos do irmão de sexo oposto, lança mão de uma palavra composta constituída pela palavra para ‘irmão’ (f)B + termo masculino usado para ‘filho/filha’ (m)S/D. Tal regularidade possibilita a reconstrução de *okwa daɁɨp (f)BS e *okwa tak(f)BD30 30 Embora as fontes diacrônicas de owaɁʉp ‘(f)BS’ e owak ‘(f)BD’, em Tuparí, sejam *okwa daɁʉp e *okwa tak, o reflexo da consoante inicial do nome possuído não se mantém na língua atual. Ou seja, em Tuparí, não se diz *owa haɁʉp (dado agramatical) para ‘(f)BS’, nem *owa hak (dado agramatical) para ‘(f)BD’, apesar de a consoante h aparecer em outros casos:Konkwat haɁʉp ‘filho de Konkwat’, Konkwat hak ‘filha de Konkwat’. .

TERMOS PARA GERAÇÃO G-2, NETOS

O Quadro 9 apresenta os termos para G-2 ‘netos’ nas cinco línguas Tuparí.

Quadro 9
Termos para netos.

Os termos femininos para ‘netos’ são uma clara duplicação da palavra reconstruída para (f)D/S ‘filho(a)’ *mẽpit. Dessa forma, teríamos (f)SS/SD/DS/DD *mẽpit + mẽpit em Proto-Tuparí. É necessário acrescentar que, em Sakurabiat, o termo duplicado é usado para se referir ao coletivo mẽpirẽpit ‘netos/netas’ (grandchildren). Nas quatro línguas, a palavra duplicada sofre queda da consoante inicial, resultando em ẽpit como forma duplicada. Dada a presença desse morfema nos termos para ‘netos’ da fala masculina, em Akuntsú, Sakurabiat e Tuparí, é possível que, por analogia aos termos da fala feminina, ẽpit tenha se afixado ao termo (m)SD *tak e se generalizado como termo para ‘netos’ da fala masculina, tal como pode se observar em Sakurabiat e Tuparí. Dessa forma, é possível propor a reconstrução para Proto-Tuparí de ‘neto/neta (m)SS/SD/DS/DD’, na fala masculina, como *tak-ẽpit. A língua Makurap não apresenta termos cognatos para neto/neta, seja na fala feminina seja na fala masculina. Já a língua Wayoró apresenta cognatos reconstruíveis para Proto-Tuparí apenas nos termos usados por ego feminino. Porém, o termo para neto/neta para ego masculino, em Wayoró, é cognato com o termo para neto/neta em Makurap, considerando um processo de metátese envolvendo as consoantes, em Wayoró tɨm e em Makurap mbɨt31 31 Braga (1992) descreve a mudança de /t/ para [ɾ] ou [l] em fronteira de morfema. . Não há dados disponíveis em Akuntsú para a fala masculina em todas as posições. Somente temos registro do termo para (m)SD, no qual o morfema ẽpit, ora mencionado, também ocorre.

TERMOS PARA AFINS

No Quadro 10, apresentamos os cognatos e a proposta de reconstruções dos termos para os afins W, H e DH.

Quadro 10
Termos reconstruídos para afins.

Entre os termos cognatos para afins, é possível encontrar tanto termos lexicalizados em separado da grade de parentes consanguíneos quanto tecnônimos codificados a partir da grade de parentes. No Quadro 10, apresentamos somente as reconstruções dos termos de afins independentes da grade de parentes.

O termo para ‘esposa’ reconstruído como *ai(+)tsi, embora historicamente possa ter sido criado a partir de uma composição contendo a palavra para ‘mãe’, seguiu uma evolução fonológica distinta e já não é morfologicamente transparente. Por outro lado, as formas das línguas Makurap e Tuparí permitem propor que o desenvolvimento da palavra para ‘esposa’ foi baseado em um tecnônimo formado pelos termos ‘filho’ e ‘mãe’ em uma relação sintática genitiva. Contudo, a forma em Makurap que poderia ser traduzida como ‘mãe do filho’32 32 Em Makurap (Braga, 2005) e Tuparí, a palavra para ‘esposa’ é analisada como morfologicamente indivisível. A divisão aqui proposta é realizada para fins comparativos. (tradução também possível em Tuparí, conforme Caspar, 2014CASPAR, F. Os Tupari. Uma tribo indígena no Brasil ocidental. Tradução: Adriana Maria Huber Azevedo. [S. l.: s. n.], 2014. Título original: Die Tuparí, ein Indianerstamm in Westbrasilien.) apresenta a consoante sonora [nd], enquanto a palavra ‘mãe’ ti apresenta uma consoante surda [t], nessa língua. Galucio e Nogueira (2011)GALUCIO, A. V.; NOGUEIRA, A. F. Comparative study of the Tupari branch of the Tupi family: contributions to understanding its historical development and internal classification. In: CONGRESSO DE IDIOMAS INDIGENAS DE LATINOAMÉRICA, 5., 2011, Austin. Memórias [...]. Austin: Universidade do Texas, 2011. p. 1-28. afirmaram que Proto-Tuparí foi sensível ao ambiente em que um possuidor ou um determinante estava presente no sintagma nominal. Esse ambiente sintático está diretamente ligado à alternância do segmento inicial em alguns grupos de palavras, que ocorre de modo mais ou menos produtivo em todas as línguas do ramo Tuparí. Por exemplo, em Wayoró, embora não ativos no sistema da língua, reflexos de uma morfologia cognata à alternância descrita como prefixos relacionais em Akuntsú (Aragon, 2014ARAGON, C. C. A grammar of Akuntsú, a Tupían language. 2014. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Hawai’i at Mānoa, Honolulu, 2014.) e Makurap (Braga, 2005BRAGA, A. O. Aspects morphosyntaxiques de la langue Makurap/Tupi. 2005. Tese (Doutorado em Ciências da Linguagem) – Université de Toulouse-Le Mirail, Toulouse, 2005.) podem ser encontrados em algumas palavras, como em ‘mingau’: atiti ape ‘mingau de milho’ e ndape ‘mingau’33 33 No campo semântico da terminologia de parentesco, confira, ainda em Wayoró, a alteração inicial da palavra para (m)S ndaɨp em (f)BS okwa taɨp. . Rodrigues e Cabral (2012)RODRIGUES, A. D.; CABRAL, A. S. A. C. Tupían. In: CAMPBELL, L.; GRONDONA, V. (ed.). The indigenous languages of South America: a comprehensive guide. Berlin: Walter de Gruyter, 2012. p. 495-574. propõem, para o Proto-Tupí, que tais segmentos iniciais sejam prefixos relacionais, definidos, de forma ampla, como prefixo que indica se um radical constitui ou não uma unidade sintática com seu determinante, o qual é a expressão imediatamente precedente. Tais alternâncias no segmento inicial de uma palavra foram extensivamente discutidas para a família Tupí-Guaraní por Meira e Drude (2013)MEIRA, S.; DRUDE, S. Sobre a origem histórica dos “prefixos relacionais” das línguas tupí-guaraní. Cadernos de Etnolinguística, v. 5, n. 1, p. 1-30, maio 2013., os quais concluíram que tanto uma análise relacional quanto uma análise de raízes alternantes parecem ser “[...] igualmente razoáveis [...]” (Meira; Drude, 2013MEIRA, S.; DRUDE, S. Sobre a origem histórica dos “prefixos relacionais” das línguas tupí-guaraní. Cadernos de Etnolinguística, v. 5, n. 1, p. 1-30, maio 2013., p. 25). Assim, é possível que a correspondência em questão esteja relacionada historicamente a um alomorfe nominal, o que poderia explicar os reflexos sonoros [nd] em Wayoró e Makurap, em vez do esperado [t]34 34 Moore e Galucio (1994) postularam a reconstrução de uma consoante africada sonora *(n)dz para as correspondências ilustradas nessa palavra, porém, as informações de ordem morfológica discutidas acima nos levam a manter somente a consoante africada surda *ts paraProto-Tuparí. .

Embora o termo para ‘esposa’ em Tuparí, aɁʉsi, já esteja lexicalizado como uma palavra independente, mantivemos, no Quadro 10, a análise em termos de tecnonímia baseada nas palavras aɁʉp ‘filho’ + si ‘mãe’ = ‘mãe do filho’, considerando as correspondências sistemáticas de som documentadas no desenvolvimento histórico dessa língua. A queda da consoante bilabial /p/ pode ser explicada pelo processo de mutação consonantal que ocorre em fronteira de morfemas35 35 Singerman (2016, 2018) apresenta a queda de consoantes bilabiais /p/ e /m/ em posição final de morfema, mas somente quando seguidos de um sufixo iniciado em vogal. . Outro motivo para analisar aɁʉsi como aɁʉ ‘filho’ + si ‘mãe’ é o fato de existirem outros termos formados por processos semelhantes. Por exemplo, o termo para sogra na fala feminina – ou seja, (f)HM – é mẽmsiropsi, transparentemente construído pelos seguintes termos: mẽmsit ‘filho/filha de mulher’, (h)op ‘pai’, si ‘mãe’. Ou seja, a sogra é a mãe do pai dos filhos. Neste termo, não aparece a consoante inicial h que ocorre quando o possuidor do termo (h)op ‘pai’ é um SN, como em Konkwat hop ‘o pai de Konkwat’.

Os termos para ‘nora’ (SW) são tecnônimos distintos de acordo com a língua: em Wayoró, temos mẽpirẽpit ti ‘mãe do neto (fala feminina)’, enquanto que, em Sakurabiat, temos mẽpit aisi ‘esposa do filho (fala feminina)’ e, em Tuparí, mẽmsit aɁʉsi ‘esposa do filho (fala feminina)’.

TERMINOLOGIA DOS SISTEMAS DE PARENTESCO NAS LÍNGUAS TUPARÍ EM UMA ABORDAGEM ANTROPOLÓGICA-COMPARATIVA

Laraia (1972)LARAIA, R. B. Organização social dos Tupí contemporâneos. 1972. Tese (Doutorado em Ciências Sociais/Antropologia Social) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 1972. apontava, a partir dos estudos de campo entre os Suruí, bem como de sua análise de uma série de estudos anteriores – a saber, Murphy (1960)MURPHY, R. Headhunter’s heritage. Berkeley: University of California Press, 1960. entre os Mundurukú, Betts (1967)BETTS, L. Anthropological check list Parintintin. [S.l.]: Summer Institute of Linguistics, 1967. Mimeografado. com os Parintintin – uma “[...] tendência [tupí] para sistemas de duas seções, onde, pelo menos teoricamente, é possível a segmentação social [...]” (Laraia, 1987LARAIA, R. B. Os estudos de parentesco no Brasil. BIB: Revista Brasileira de Informação Bibliográfica em Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 23, p. 3-17, sem. 1987., p. 8). Esses dados – em conjunto com os de Fernandes (1963)FERNANDES, F. A organização social dos Tupinambá. 2. ed. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1963. acerca dos Tupí da Costa, baseados em fontes seiscentistas, de Wagley e Galvão (1946)WAGLEY, C.; GALVÃO, E. O parentesco Tupi-Guarani. Boletim do Museu Nacional, Nova Série, Antropologia, Rio de Janeiro, n. 6, p. 1-24, jan. 1946., referindo-se aos Kaiowá, Tenetehara e Tapirapé; de Watson, V. (1944)WATSON, V. D. Notas sobre o sistema de parentesco dos índios Cayuá. Sociologia, Porto, v. 6, n. 1, p. 31-48, 1944. e Watson, J. (1952)WATSON, J. B. Cayuá culture change: a study in acculturation and methodology. Menasha: American Anthropological Association, 1952., com os Kaiowá; de Baldus (1970)BALDUS, H. Tapirapé: tribo tupí no Brasil Central. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1970., Shapiro (1968)SHAPIRO, J. Tapirapé kinship. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi, Nova Série, Antropologia, Belém, n. 37, p. 1-37, 1968. e Wagley (1977)WAGLEY, C. Welcome of tears: the Tapirapé Indians of Brazil. Oxford: Oxford University Press, 1977., a respeito dos Tapirapé – levaram Laraia (1987)LARAIA, R. B. Os estudos de parentesco no Brasil. BIB: Revista Brasileira de Informação Bibliográfica em Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 23, p. 3-17, sem. 1987. a delinear o modelo de estrutura social Tupí em contraposição às definições de descendência bilateral que dominavam as análises desses autores. Ele afirmava que essa estrutura corresponderia a

um sistema de relações que apresenta a fusão bifurcada na primeira geração ascendente, e termos de primos do tipo Iroquês na geração de Ego [...] regra de descendência patrilinear, patrilocalidade e matrimônios preferenciais com as primas cruzadas bilaterais e filha da irmã

(Laraia, 1987LARAIA, R. B. Os estudos de parentesco no Brasil. BIB: Revista Brasileira de Informação Bibliográfica em Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 23, p. 3-17, sem. 1987., p. 8).

Em termos da etnografia Tupí mais geral, Fausto (1995)FAUSTO, C. De primos e sobrinhas: terminologia e aliança entre os Parakanã (Tupi) do Pará. In: VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo (org.). Antropologia do parentesco: estudos ameríndios. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1995. p. 61-120. chamou a atenção para a instabilidade das relações entre primos cruzados, pois as terminologias não possuem palavras exclusivas para esta categoria de parentes. A análise do autor se refere à interferência entre uma estrutura horizontal dravidiana e uma estrutura oblíqua avuncular, combinando, assim, avunculato e patrilaterato, em uma “[...] ideologia patrifiliativa da aliança [...]” (Fausto, 1995FAUSTO, C. De primos e sobrinhas: terminologia e aliança entre os Parakanã (Tupi) do Pará. In: VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo (org.). Antropologia do parentesco: estudos ameríndios. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1995. p. 61-120., p. 102). No estudo específico do parentesco Parakanã (Tupí-Guaraní) (Fausto, 1995FAUSTO, C. De primos e sobrinhas: terminologia e aliança entre os Parakanã (Tupi) do Pará. In: VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo (org.). Antropologia do parentesco: estudos ameríndios. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1995. p. 61-120.), notam-se as seguintes características: ausência de termos específicos para primos cruzados, presença de termos de afinidade separados, uma distinção importante entre colaterais e lineares. A primeira e a segunda características estão presentes nas terminologias aqui abordadas, e a distinção para posições colaterais e lineares ainda deve ser melhor precisada, embora a terminologia Sakurabiat, como veremos, apresente indicações neste sentido36 36 Notam-se, ainda, outras interpretações importantes, sumarizadas em Soares-Pinto (2019, p. 109): a “[...] primazia lógica do casamento avuncular sobre o esquema dravidiano – Dal Poz Neto (Dal Poz, 2004) para os Tupi Mondé – e de um modelo interpretativo da organização dualista kagwahiva como imbricação entre um sistema de parentesco dravidiano e um sistema de metades exogâmicas (Peggion, 2011). A não coincidência entre distinção terminológica para primos cruzados e regra prescritiva de casamento, bem como a ‘subordinação do conhecimento genealógico aos fatores de residência e intensidade de interação social’ (Pereira, 1999, passim) [p. 74-79] estaria presente entre os kaiowá.”. .

Na teoria amazônica do parentesco pós-1990 – incluindo-se aqui, além dos grupos Tupí, os Yanomami e os Carib-guianenses, nos quais Viveiros de Castro (2002b)VIVEIROS DE CASTRO, E. O problema da afinidade na Amazônia. In: VIVEIROS DE CASTRO, E. A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia. São Paulo: Cosac & Naify, 2002b. p. 87-180. baseou suas formulações sobre uma matriz organizacional geral –, a categoria de afinidade descola-se do cálculo categorial, transformando-se na verdadeira categoria sociocosmológica amazônica. Introduz-se o componente de distância cuja consequência é o elemento ‘ternário’ (incluindo afins, consanguíneos e coafins) e ‘concêntrico’ do campo do parentesco ameríndio, antes que dual e diametral (característica do dravidiano clássico). Em relação a esta última característica, diz o autor, na Amazônia, parentes consanguíneos distantes são afinizados, enquanto afins corresidentes são consanguinizados. Uma pista nesse sentido é dada pela terminologia afim Tuparí, acima destacada, na qual o termo para sogra na fala feminina – ou seja, (f)HM – é mẽmsiropsi, ‘mãe do pai dos filhos’.

A análise da interferência sociocosmológica amazônica sobre a distinção categorial consanguinidade/afinidade foge do escopo deste artigo. Para os objetivos aqui expostos, deve-se lembrar que, no paradigma Tamil/Dravidiano (Índia do Sul37 37 Ver Dumont (1953). ), as línguas não apresentariam termos de afinidade separados, já que a afinidade estaria codificada na grade dos parentes (FZ=WM; MB=WF, sendo os primos cruzados [MBC e FZC] cônjuges prescritos); apresenta-se regularidade terminológica, pois o cálculo de paralelismo e cruzamento varre toda a grade de parentes, numa terminologia de duas seções (ou ‘bifurcate merging38 38 Ver Murdock (1949). ).

Com efeito, a segmentação social de tipo patrifiliativa é passível de ser postulada para os povos cujas terminologias são aqui enfocadas (Soares-Pinto, 2SOARES-PINTO, N. Uma incontornável diferença: parentesco nas terras baixas da América do Sul (1996-2016). BIB: Revista Brasileira de Informação Bibliográfica em Ciências Sociais, São Paulo, v. 1, n. 87, p. 105-132, 2019.009). Nas terminologias estudadas, a afinidade não se encontra codificada na grade de parentes, contando com termos separados. A redundância estrutural de germanos de mesmo sexo é observada, convivendo com um importante princípio de idade relativa no conjunto de germanos e, no caso Sakurabiat (mais adiante), com a classificação conjunta de algumas posições femininas cruzadas e paralelas. Igualmente, é possível aventar a presença de tipos de cruzamento diferentes do dravidiano, pela terminologia separada para afins e pela tendência à hawaianização na geração de ego encontrada pelos pesquisadores, embora os dados disponíveis não permitam identificar os tipos de cruzamento ali presentes.

Inicialmente, é preciso ter em mente que uma caracterização comparativa das terminologias de parentesco e do(s) sistema(s) de aliança de casamento que envolve(m) o conjunto de povos aqui enfocados, e relacionados desde tempos imemoriais, ainda está por ser realizada. Soares-Pinto (2016)SOARES-PINTO, N. Terminologia de parentesco e casamento djeoromitxi: um caso ngawbe na Amazônia? Anuário Antropológico, Brasília, v. 41, p. 123-151, 2016. DOI: https://doi.org/10.4000/aa.1744.
https://doi.org/10.4000/aa.1744...
registrou uma terminologia de feição Crow entre os Djeoromitxi (do tronco Macro-Jê39 39 Ver Ribeiro e Voort (2010). ), vizinhos e afins dos Wayoró, Makurap e Tuparí, bem como caracterizou o sistema de alianças Djeoromitxi como estando baseado em um cálculo diferente do dravidiano. Ou seja, pelo menos nas alianças realizadas pelos Djeoromitxi com os povos de língua Tuparí a eles relacionados estariam presentes cálculos oblíquos. Na maioria das vezes, as alianças de casamento envolvem primos cruzados de pais e filhos de primos cruzados, expressos pela categoria wirá. O sistema Djeoromitxi

[...] implica proibições dos cognatos cruzados em G0, mas não as estende para as gerações adjacentes. Assim, a categoria wirá cobre certas posições que seriam, do ponto de vista dravidiano e iroquês, paralelas (‘F’Ch), cruzadas (‘FZ’Ch; (m) ‘Z’Ch; (f) ‘B’ Ch) e neutras (‘Ch’Ch)

(Soares-Pinto, 2SOARES-PINTO, N. Uma incontornável diferença: parentesco nas terras baixas da América do Sul (1996-2016). BIB: Revista Brasileira de Informação Bibliográfica em Ciências Sociais, São Paulo, v. 1, n. 87, p. 105-132, 2019.016, p. 130).

Assim, também Caspar (2014)CASPAR, F. Os Tupari. Uma tribo indígena no Brasil ocidental. Tradução: Adriana Maria Huber Azevedo. [S. l.: s. n.], 2014. Título original: Die Tuparí, ein Indianerstamm in Westbrasilien. havia postulado uma terminologia oblíqua, mas com feições Omaha, entre os Tuparí, na década de 1950. Em que medida estamos presenciando uma mudança no tratamento para primos cruzados entre tais povos, que passam de um tratamento oblíquo para um tratamento hawaiano, ou, ainda, a existência de uma convivência contemporânea de diversos sistemas são questões para análises futuras.

No ramo Tuparí, os filhos dos irmãos do pai e os filhos das irmãs da mãe não são considerados ‘primos’, mas sim irmãos, uma vez que, como mencionado, germanos do mesmo sexo são estruturalmente redundantes. Do mesmo modo, na primeira geração descendente, há uma fusão na terminologia das categorias de filhos/sobrinhos, de acordo com o gênero de ego. Para ego masculino, os filhos (S/D) dos irmãos são equiparados aos próprios filhos (BS/BD=S/D), e há um termo distinto (termo independente ou tecnônimo) para se referir aos filhos da irmã (ZS/ZD). Para ego feminino, a terminologia se inverte. Os filhos (S/D) das irmãs da mulher são equiparados aos próprios filhos (ZS/ZD=S/D), enquanto os filhos dos irmãos (BS/BD) são referidos por um termo distinto. Tal traço parece estar presente em todas as línguas do ramo Tuparí40 40 Para a língua Tuparí, Caspar (2014) reporta os termos para ‘filho do irmão’ <aöp> /aɁʉp/; ‘filha do irmão’ <ak>. Os mesmos termos são usados por homens em geral, ou seja, o homem trata o próprio filho como /waɁʉp/ e a filha como /wak/. , com exceção de Sakurabiat. Isso é ilustrado nas Figuras 1 e 2, para Sakurabiat, e nas Figuras 3 e 4, para Wayoró. Veja, na terminologia Sakurabiat (Figuras 1 e 2), que, nos termos da fala masculina, ocorre o mesmo que na terminologia Wayoró (Figuras 3 e 4): [S≠D]; [S=BS≠ZS]; [D=BD≠ZD]; mas os termos da fala feminina diferem. Enquanto na terminologia Wayoró os termos da fala feminina [ZS/ZD=S/D] acompanham o mesmo cálculo que os termos para a fala masculina para parentes de ligação de mesmo sexo41 41 Ver adiante a discussão em relação aos filhos dos irmãos de sexo oposto para ego feminino na terminologia Wayoró. , entre os Sakurabiat, ego feminino não utiliza o mesmo termo para seus filhos e os filhos de suas irmãs [S=D]; [ZD≠D; S≠ZS]42 42 Confira as terminologias e diagramas completos preenchidos com os dados disponíveis do ramo Tuparí nas Figuras 9 a 18, disponíveis no Apêndice. .

Figura 1
Sakurabiat: termos para ‘irmãos’, ‘filhos’ e ‘sobrinhos’ em G0 e G-1 (ego masculino).
Figura 2
Sakurabiat: termos para ‘irmãos’, ’filhos’ e ‘sobrinhos’ em G0 e G-1 (ego feminino).
Figura 3
Wayoró: termos para ‘irmãos’, ‘filhos’ e ‘sobrinhos’ em G0 e G-1 (ego masculino).
Figura 4
Wayoró: termos para ‘irmãos’, ‘filhos’ e ‘sobrinhos’ em G0 e G-1 (ego feminino).

Na terminologia Sakurabiat, observa-se mais evidentemente uma deriva hawaiana para as parentas femininas em G+1: [M=MZ=FZ]. Diz-se ‘deriva’ pois, tal como algumas sociedades melanésias (Keesing, 1975KEESING, R. M. Kin groups and social structure. New York: Holt, Rinehart and Winston, 1975.), os Sakurabiat reservam a MB uma classificação distinta de F e FB [F=FB≠MB], o que não ocorre no tipo hawaiano ideal43 43 No sentido precisado por R. Keesing: “Instead of equating only same-sex siblings, Hawaian terminologies ‘lump’ relatives together by sex and generation” (Keesing, 1975, p. 104). . Acompanhando a neutralização da oposição entre consanguíneos e afins para as parentas femininas em G+1, em G-1, ego feminino chama os filhos dos irmãos de ambos sexos como eles os chamam, mas acrescenta o termo para irmão/irmã dependendo do sexo do parente de ligação: os termos para parentes cruzados e paralelos em G-1 são vocábulos descritivos em que se utiliza do termo de ego feminino para filhos (C) (children) (Figura 2). Insinua-se, assim, no âmbito deste conjunto de parentes, um elemento de colateralidade, o que não ocorre para ego masculino, que chama os filhos de seus irmãos de mesmo sexo de ‘filhos’ e os filhos de irmãos de sexo oposto por ‘sobrinhos’. Se essa diferença está ancorada em cálculos patrilaterais de casamento, ainda resta investigar. Em todo caso, tal diferença insinua a não presença da troca simétrica ou bilateral em sua estrutura de aliança de casamento. Se acompanharmos o paradigma da escola aliancista, segundo o qual “[a] função de um sistema de parentesco é gerar possibilidades e impossibilidades de matrimônios [...] ele age como um agente operador num sistema de trocas matrimoniais dentro da comunidade” (Lévi-Strauss, 1969LÉVI-STRAUSS, C. Organização social. In: LARAIA, R. B. (org.). Organização social. Rio de Janeiro: Zahar, 1969. p. 124-144., p. 127), essa característica Sakurabiat destoa sobremaneira das terminologias amazônicas. Lembremos que a característica irredutível da lei estrutural amazônica seria, segundo Viveiros de Castro (1996, p. 83, grifo do autor)VIVEIROS DE CASTRO, E. Ambos os três: sobre algumas distinções tipológicas e seu significado estrutural na teoria do parentesco. Anuário Antropológico, Brasília, v. 95, p. 9-91, 1996.,

a presença de uma oposição não-neutralizável em G+1: a oposição entre consanguíneos e afins resultante da troca simétrica que teve lugar na geração imediatamente anterior a de Ego, e que comanda a transmissão de afinidade nas gerações subsequentes.

Caso em que ainda se pode falar em ‘dravidiano’. Com efeito, um ponto importante das terminologias de parentesco das línguas Tuparí, e que as distancia relativamente de boa parte das terminologias amazônicas, é a não observância, nas terminologias Sakurabiat e Makurap, da oposição entre consanguíneos e afins em G+1, o que as distingue das terminologias Tuparí e Wayoró, onde tal oposição está presente.

Por sua vez, merece destaque a existência de termos de afinidade separados, diferentes dos demais itens da grade de parentesco, não expressos por tecnonímia. Como dito, a presença de termos de afinidade separados na grade terminológica seria uma das características do dravidianato amazônico, pois, no paradigma dravidiano (Índia do Sul), as línguas não apresentariam tais termos separados, uma vez que a afinidade já estaria codificada na grade dos parentes (FZ=WM; MB=WF)44 44 Ver Dumont (1953). .

O termo mẽjom é usado para se referir às categorias afins DH, ZH e FZH45 45 Em Wayoró, ego feminino e masculino refere a FZH como m?jom. em Wayoró, DH em Makurap, DH e ZH em Tuparí. Trata-se de um termo distinto da terminologia de parentesco dessas línguas. Por outro lado, em Wayoró, observamos [M=MZ=FBW46 46 Em Wayoró, ego feminino e masculino refere a FBW como jã nõ. ≠FZ], o que parece remeter a um padrão de afinidade serial47 47 No sentido estabelecido por Kaplan (1972), quando dois irmãos podem casar com duas irmãs. .

Nas línguas Akuntsú e Sakurabiat, apesar de não cognato ao termo mẽjom, o item jõkõjẽ é também um termo utilizado para se referir a afins. Observa-se, contudo, que, pelo menos em Sakurabiat, jõkõjẽ é usado de maneira mais abrangente, englobando tanto os esposos dos irmãos (ZH, BW) quanto os irmãos dos esposos (WB, WZ, HB, HZ). Note-se que tal item não é utilizado para DH, como a categoria mẽjom nas demais línguas do ramo.

Um fator digno de nota nas terminologias aqui estudadas é a ampla diversificação dos termos segundo o sexo de ego e a idade relativa para irmão (siblings), com uma curiosa exceção para o caso Makurap, onde tal diversificação não é observada. Além disso, observa-se diversificação segundo o sexo de ego nos termos para filhos (children). Em relação a essa última questão, ego masculino utiliza termos distintos segundo o sexo do(a) filho(a), enquanto ego feminino utiliza somente um termo tanto para filho (S) quanto para filha (D)48 48 Ver nas Figuras 1 e 2 os dados de Sakurabiat; nas Figuras 3 e 4 os de Wayoró; e nas Figuras 5 e 6 os de Tuparí. . Existem, ainda, termos específicos para ego masculino se referir aos filhos das irmãs (ZC). Contudo, ego feminino, em relação aos filhos de seus irmãos (BC), utiliza-se, no conjunto das terminologias aqui estudadas, de diferentes estratégias.

Na terminologia Sakurabiat e Wayoró, trata-se de um sintagma genitivo do tipo N + N, em que o primeiro termo é a palavra para ‘irmão’ (f)B + termo masculino usado para ‘filho/filha’ (m)S/D. Ou seja, a mulher se refere aos filhos(as) do irmão usando o termo para filhos utilizado pelo falante de sexo masculino (m)S/D, e se refere aos filhos(as) da irmã usando o termo para filhos (f)C utilizado pelo sexo feminino. A referência aos filhos dos irmãos/irmãs se dá a partir do ponto de vista do progenitor, o que, na perspectiva gramatical, implica ser o possuidor do sintagma genitivo.

Essa correlação também pode ser observada nos termos Wayoró para afins: ego feminino e masculino tomam o ponto de vista de seu pai na relação com os ‘tomadores de mulheres’ (FZH=ZH), mantendo-os como afins; o que difere sensivelmente do tratamento para as ‘mulheres tomadas’, que acabam consanguinizadas [FBW=MZ(=M)]. A relação entre tais características na terminologia, referentes à diferença de sexo de ego, e o modo de pertencimento grupal (patrifiliação Wayoró, por exemplo) podem ser matéria de futuras análises. No caso Sakurabiat, ademais, o princípio de idade relativa presente nos termos para germanos das terminologias Tuparí é ainda complementado pela hawaianização dos termos para irmão/irmã (siblings)49 49 Ainda que se deva registrar a ausência de termos disponíveis para as posições dos primos cruzados matrilaterias, no caso de ego feminino. .

Nas gerações distais, observa-se, em G-2, uma similaridade nas terminologias Wayoró e Tuparí, que utilizam somente a diferença de sexo de ego como marcadora, independente do sexo de alter. Desse modo, há somente dois termos para netos, sendo um para ego feminino e outro para ego masculino, sendo que, dentro de cada categoria, os termos são todos equiparados [SS=SD=DS=DD]50 50 Ver nas Figuras 5 e 6 os termos para G-2 da língua Tuparí. . Por outro lado, na terminologia Sakurabiat, há uma distinção na geração G-2 dependendo do sexo de ego. Enquanto para ego masculino, como em Wayoró e Tuparí, unifica-se os termos em G-2 independente do sexo de alter [SS=SD=DS=DD] (Figura 7), os termos Sakurabiat em G-2 para ego feminino divergem segundo o sexo de alter. Utiliza-se um tecnônimo formado com base no termo feminino para S e D, combinado aos termos masculinos para as mesmas relações (Figura 8). É como se, na terminologia Sakurabiat, a não diferenciação entre cruzados e paralelos em G0, e em relação a alter feminino em G+1, fosse de alguma maneira compensada por outros tipos de diferenciações nas gerações descendentes.

Figura 7
Termos para 2ª geração descendente em Sakurabiat (G-2 ego masculino).

Em termos de uma análise comparativa mais ampla, contudo, há de se notar algumas dificuldades. O caráter de idade relativa da obliquidade estrutural Parakanã está, segundo Fausto (1995)FAUSTO, C. De primos e sobrinhas: terminologia e aliança entre os Parakanã (Tupi) do Pará. In: VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo (org.). Antropologia do parentesco: estudos ameríndios. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1995. p. 61-120., em íntima relação com o casamento com primas cruzadas e sobrinhas. Embora, por ora, não tenhamos condições de sugerir a mesma relação entre estrutura de classificação terminológica e regra de casamento entre os povos aqui estudados, é notável que a idade relativa é uma função importante nos termos Tuparí disponíveis. As causas e os efeitos dessa importância ainda restam a ser pesquisados, mas já é possível afirmar que, tal como entre os Parakanã, as terminologias aqui pesquisadas parecem exibir uma face não elementar, i.e., ausência de codificação do casamento na grade de parentes, ou não coincidência de fechamento consanguíneo e redobramento de alianças numa única geração, e quiçá a idade relativa seja um operador importante na preferência conjugal51 51 Vale notar, no entanto, ainda que de passagem, que a terminologia Wayoró dá pistas de um cruzamento de tipo iroquês com obliquidade geracional: HM tipap nãn pode ser traduzido como ‘tornar-se avó’. . Em relação aos primos cruzados, entre os Parakanã, “[...] os primos cruzados mais velhos que Ego, independente de sua lateralidade, são assimilados aos germanos da mãe, os mais novos o são aos filhos de ‘irmã’ [...]” (Fausto, 1995FAUSTO, C. De primos e sobrinhas: terminologia e aliança entre os Parakanã (Tupi) do Pará. In: VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo (org.). Antropologia do parentesco: estudos ameríndios. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1995. p. 61-120., p. 68). Aqui residem as maiores dificuldades na análise das terminologias Tuparí contemporâneas. Seja pela vitalidade atual das línguas, seja pelos dados disponíveis, essa posição não foi passível de reconstrução.

Figura 5
Tuparí: termos para irmãos (siblings) e filhos (children), segundo sexo e idade relativa (termos da fala feminina).
Figura 6
Tuparí: termos para irmãos (siblings) e filhos (children), segundo sexo e idade relativa (termos da fala masculina).
Figura 8
Termos para 2ª geração descendente em Sakurabiat (G-2 ego feminino).

Os termos para primos paralelos também exibem lacunas importantes. Por tais motivos e pelas importantes diferenças internas às terminologias Tuparí, não é possível realizar aqui uma análise antropológica-comparativa definitiva, que possibilitasse posicionar as terminologias Tuparí no cenário amazônico, embora algumas de suas especificidades tenham sido apontadas.

É importante ressaltar que os tipos de cruzamento pertinentes aos sistemas de parentesco desses povos ainda precisam ser analisados em estudos posteriores, e que tal rota de investigação precisará se haver com a dificuldade de estabilização dos termos para primos cruzados. Somente desse modo poderemos averiguar de maneira mais detida, em relação às terminologias aqui investigadas, a intuição de Viveiros de Castro (2002b)VIVEIROS DE CASTRO, E. O problema da afinidade na Amazônia. In: VIVEIROS DE CASTRO, E. A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia. São Paulo: Cosac & Naify, 2002b. p. 87-180. em relação ao caso Tuparí. Em “O problema da afinidade na Amazônia”, indica-os como uma “[...] cultura de floresta tropical [...]”, ao lado dos Sirionó e Pakaa-Nova (Wari), que “[...] utilizariam sistemas semelhantes aos centros-brasileiros [...]” (Viveiros de Castro, 2002bVIVEIROS DE CASTRO, E. O problema da afinidade na Amazônia. In: VIVEIROS DE CASTRO, E. A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia. São Paulo: Cosac & Naify, 2002b. p. 87-180., p. 89), isto é, sistemas distintivos por sua “[...] terminologia sem correlatos matrimoniais claros, que evocam, em suas equações oblíquas, o tipo Crow-Omaha [...]” (Viveiros de Castro, 2002b, p. 89).

SISTEMA DE PARENTESCO TUPARÍ E A TIPOLOGIA DE PARENTESCO TUPÍ

A partir das posições analisadas na seção “Terminologia dos sistemas de parentesco nas línguas Tuparí em uma abordagem antropológica-comparativa” e dos termos reconstruídos na seção “Reconstrução de itens lexicais de parentesco em Proto-Tuparí”, traçamos paralelos com o sistema reconstruído para Proto-Tupí. O presente trabalho apresenta um leque maior de termos de parentesco reconstruído para Proto-Tuparí do que foi reconstruído para Proto-Tupí. O Quadro 11 apresenta a reconstrução para diversas posições não disponíveis na literatura comparativa para Proto-Tupí. Em todo caso, a comparação dos termos de parentesco em Proto-Tuparí (Quadro 11), com os termos reconstruídos para Proto-Tupí (Rodrigues, 2007RODRIGUES, A. D. As consoantes do Proto-Tupi. In: CABRAL, A. S. A. C.; RODRIGUES, A. D. (ed.). Línguas e culturas Tupí. Campinas: Curt Nimuendajú; Brasília: LALi, 2007. p. 167-203., 2010RODRIGUES, A. D. Linguistic reconstruction of elements of prehistoric Tupi culture. In: CARLIN, Eithne B.; VAN DE KERKE, Simon (ed.). Linguistics and Archaeology in the Americas: the historization of language and society. Leiden: Brill, 2010. p. 1-10. DOI: https://doi.org/10.1163/9789047427087_002.
https://doi.org/10.1163/9789047427087_00...
), conforme o Quadro 12, mostra que várias categorias observadas no ramo Tuparí não só já estavam presentes em Proto-Tupí, como são termos cognatos. Esse é o caso, por exemplo, dos termos para M, F, S (termos da fala masculina), S/D (termos da fala feminina), eZ (termos da fala feminina), yZ (termos da fala feminina), W e H. Isso indica que o sistema de classificação da terminologia de parentesco reconstruída para Proto-Tuparí espelha a terminologia reconstruída para Proto-Tupí, pelo menos nas posições reconstruídas para ambas protolínguas.

Quadro 11. Termos de parentesco em Proto-Tuparí.

Quadro 11
Termos de parentesco em Proto-Tuparí.
Quadro 12
Termos de parentes e afins reconstruídos para Proto-Tupí (Rodrigues, 2007RODRIGUES, A. D. As consoantes do Proto-Tupi. In: CABRAL, A. S. A. C.; RODRIGUES, A. D. (ed.). Línguas e culturas Tupí. Campinas: Curt Nimuendajú; Brasília: LALi, 2007. p. 167-203., 2010).

A distinção por idade entre irmãos do mesmo sexo – eB e yB para falantes do sexo masculino e eZ e yZ para falantes do sexo feminino – reconstrói para Proto-Tupí. Nesse sentido, Makurap teria inovado, pois, como visto anteriormente, essa diversificação na terminologia na geração de ego para irmãos (siblings), segundo o sexo e a idade relativa, não ocorre em Makurap.

Da mesma forma, na geração G-1 filho/filha, o sistema reconstruído para Proto-Tuparí, espelha o sistema do Proto-Tupí, com a diversificação segundo o sexo de ego nos termos para filho/filha (children). Ego masculino utiliza termos distintos segundo o sexo do(a) filho(a), enquanto ego feminino utiliza somente um termo tanto para filho (S) quanto para filha (D).

Por outro lado, a hawaianização terminológica na geração de ego, com a extensão dos termos para irmãos (siblings) para todos os parentes, observada em Sakurabiat, parece ser uma inovação nessa língua, uma vez que esse modelo de organização não reconstrói para Proto-Tuparí.

Nas gerações ascendentes (G+1), observa-se que, assim como no ramo Tuparí, há uma correlação entre os termos para tios/tias (FB, MZ)52 52 Rodrigues (2007, 2010) não apresenta os termos reconstruídos para (m)D, FZ e MB, em Proto-Tupí. em Proto-Tupí que são claramente derivados dos termos para pai (F) e mãe (M), respectivamente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A descrição e reconstrução dos termos de parentesco nas línguas Tuparí deixa claro que uma característica notável na formação de palavras deste campo semântico nessas línguas é o uso de processos morfológicos produtivos de duplicação e composição. Observa-se o uso de tecnônimos na construção de termos descritivos, principalmente expressando relações de afinidade, tal como ‘nora’ (SW), em Wayoró mẽpirẽpit ti ‘mãe do neto (fala feminina)’, Sakurabiat mẽpit aisi ‘esposa do filho (fala feminina)’ e Tuparí mẽmsit aɁʉsi ‘esposa do filho (fala feminina)’.

É interessante notar que, apesar de as línguas irmãs usarem o mesmo recurso morfossintático, diferem nos itens selecionados para a construção do termo. Enquanto em Wayoró utiliza-se dois termos que expressam posições consanguíneas, as demais línguas não utilizam esse recurso. Em que medida essa opção expressa diferenças em relação ao estatuto da afinidade e/ou inimizade nos grupos estudados, ainda é uma questão a ser respondida por estudos etnográficos mais detalhados.

Como apontamentos para pesquisas futuras, vale notar que as raízes de alguns termos de parentesco extrapolam o campo do parentesco stricto sensu, remetendo a conexões entre estratégias de diferenciação de coletividades de pessoas e um campo cosmológico. Aqui, como em outras formações, incluindo a Tupí, “[...] a terminologia é um sistema de classes de relações que pode operar num campo mais amplo do que aquele definido por laços genealógicos [...]” (Fausto, 1995FAUSTO, C. De primos e sobrinhas: terminologia e aliança entre os Parakanã (Tupi) do Pará. In: VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo (org.). Antropologia do parentesco: estudos ameríndios. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1995. p. 61-120., p. 63). Isso pode ser observado entre os Wayoró, por exemplo, nas palavras awat ‘vovô’ e awar-iat ‘espíritos ou povo do céu’ (Soares-Pinto, 2009SOARES-PINTO, N. Do poder do sangue e da chicha: os Wajuru do Guaporé (Rondônia). 2009. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2009.). Que essa seja uma estratégia para relacionar por consanguinidade mortos e vivos ainda é algo a ser explorado em termos de suas consequências para uma teoria ameríndia que assumidamente transforma mortos em inimigos e/ou afins potenciais (Cunha, 1978CUNHA, M. C. Os mortos e os outros: uma análise do sistema funerário e da noção de pessoa entre os índios Krahó. São Paulo: Editora Hucitec, 1978.; Viveiros de Castro, 2002aVIVEIROS DE CASTRO, E. Multinaturalismo na América indígena. In: VIVEIROS DE CASTRO, E. A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia. São Paulo: Cosac & Naif, 2002a. p. 345-401.), o que não deixa de ser observado na etnografia Wayoró, principalmente quando se trata de pajés já mortos. Soares-Pinto (2009, p. 73)SOARES-PINTO, N. Do poder do sangue e da chicha: os Wajuru do Guaporé (Rondônia). 2009. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2009. observa que

Por outro lado, o sufixo coletivizador iat também pode ser utilizado como referência à coletividade de pessoas ligadas a Ego por relações de afinidade atuais. Assim, por exemplo, para Ego feminino, o termo de referência para HZ [irmã do marido] umepit ipoit (que pode ser traduzido como tia dos meus filhos, cunhada), também se aplica a HZD [filha da irmã do marido] (cunhadinha). Em referência às pluralidades de suas cunhadas (HZ + HDZ), Ego feminino utiliza-se do termo umepit ipoir-iat. Para Ego masculino, utakti (W) [esposa] também se aplica para WZ [irmã da esposa], e em referência à sua esposa e às irmãs dela conjuntamente Ego pode se utilizar do termo utakti-iat53 53 As notações em forma fonológica, tal como utilizada neste artigo, das palavras aqui mencionadas seriam o-m?pit ipoj, o-tak ti, em que o- é a primeira pessoa do singular possessiva. .

Essa aplicação do morfema coletivizador/pluralizador na composição da terminologia de parentesco e de relações sociais é comum a todas as línguas do ramo Tuparí. Em Sakurabiat, o termo usado por ego masculino para se referir ao conjunto de irmãos do sexo masculino é onojat ‘meus irmãos’, termo descritivo, que literalmente significa ‘os outros eus’ ou ‘meus’ – o-no-jat ‘1SINGULAR-outro-COLETIVO’. Outro termo interessante nesse contexto é o vocábulo usado para se referir ao conjunto de ascendentes (avós, pais, tios etc.). Nesse caso, independente do sexo de ego, o termo comum é opooriat taabiat ‘meus ancestrais; meus mais velhos’ – o-poot-jat taap-jat ‘1SINGULAR-velho-COLETIVO ?- COLETIVO’. Em Tuparí também ocorre o sufixo coletivizador -Ɂeat, que serve para indicar grupos grandes: onõɁeat ‘meus parentes, meus outros’, kiaɁʉsiɁeat ‘nossas esposas/nossas mulheres’, imenɁeat ‘os homens/esposos delas’.

Ainda em relação às diferenciações coletivas, é importante frisar que as relações uterinas mereceriam um enfoque maior em pesquisas sobre parentesco e pessoa entre os grupos aqui abordados. Entre os povos atualmente residentes na TI Rio Guaporé, destaca-se com maior nitidez o pertencimento patrifiliativo na definição de unidades ‘trocadoras de cônjuges’ – com a vistosa exceção dos Makurap, que podem se casar com pessoas Makurap, desde que de patrigrupos distintos. Isso não impede, contudo, a participação das substâncias femininas na constituição da pessoa e nas escolhas matrimoniais que estão, por exemplo, na base de alguns casos de encerramentos consanguíneos no interior de subgrupos Djeoromitxi (Soares-Pinto, 2009SOARES-PINTO, N. Do poder do sangue e da chicha: os Wajuru do Guaporé (Rondônia). 2009. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2009., 2017SOARES-PINTO, N. “Pequeno manual para se casar e não morrer”: o parentesco djeoromitxi. Mana, Rio de Janeiro, v. 23, n. 2, p. 519-549, maio/ago. 2017. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1678-49442017v23n2p519.
https://doi.org/10.1590/1678-49442017v23...
, 2015SOARES-PINTO, N. Entre as teias do marico: parentes e pajés djeoromitxi. 2015. Tese (Doutorado em Antropologia Social) – Universidade de Brasília, Brasília, 2015.).

Por fim, vale dizer que a combinação das abordagens antropológica e linguística para a análise de termos de parentesco nas línguas Tuparí visa lançar as bases para um entendimento mais aprofundado da organização

social característica desses povos. Considerando a posição estratégica do ramo Tuparí, dentro da família Tupí, a reconstrução para Proto-Tuparí dos termos para FF/MF, F/M, yB/eB, (f)B, yZ/eZ, (m)Z, (m)S/D, (f)C, (m)CC, (f)CC, H/W, DH, ZH, ZS/ZD é uma contribuição decisiva para a reconstrução de Proto-Tupí, especialmente por demonstrar que o Proto-Tuparí parece ser, em vários aspectos, conservador em relação ao sistema do Proto-Tupí.

AGRADECIMENTOS

Ana Vilacy Galúcio agradece ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científica e Tecnológico (CNPq) de onde éBolsista de Produtividade em Pesquisa 2 (308286/2016-2).

Apêndice

Figura 9
Diagrama da terminologia Akuntsú - ego feminino.
Figura 10
Diagrama da terminologia Akuntsú - ego masculino.
Figura 11
Diagrama da terminologia Wayoró - ego feminino.
Figura 12
Diagrama da terminologia Wayoró - ego masculino.
Figura 13
Diagrama da terminologia Makurap - ego feminino.
Figura 14
Diagrama da terminologia Makurap - ego masculino.
Figura 15
Diagrama da terminologia Sakurabiat - ego feminino.
Figura 16
Diagrama da terminologia Sakurabiat - ego masculino.
Figura 17
Diagrama da terminologia Tuparí - ego feminino.
Figura 18
Diagrama da terminologia Tuparí - ego masculino.

  • 1
    Os dados populacionais e de falantes provêm de informações obtidas in loco pelos autores e também de levantamentos sociolinguísticos realizados entre 2016 e 2018 por linguistas associados ao Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG), no âmbito do levantamento regionalacerca da situação das línguas indígenas de Rondônia, efetuado para o Inventário Nacional da Diversidade Linguística (INDL).
  • 2
    Outros trabalhos que abordam esse tópico, no contexto das línguas indígenas brasileiras, incluem Rodrigues (2000)RODRIGUES, A. D. Hipótese sobre as migrações dos três subconjuntos meridionais da família tupí-guaraní. In: CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE LINGUÍSTICA, 2., 2000, Florianópolis. Atas [...]. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 2000. p. 1596-1605., Moore e Storto (2002)MOORE, D.; STORTO, L. As línguas indígenas e a pré-história. In: PENA, S. D. J. (org.). Homo Brasilis. São Paulo: FUNPEC Editora, 2002. p. 73-92., Storto e Franchetto (2006)STORTO, L.; FRANCHETTO, B. Hipóteses linguísticas sobre o povoamento das Américas: é o ameríndio a língua original do continente sul-americano? In: SILVA, H.; RODRIGUES-CARVALHO, C. (ed.). Nossa origem: o povoamento das Américas: visões interdisciplinares. Rio de Janeiro: Vieira and Lent, 2006. p. 105-133., Galucio (2010)GALUCIO, A. V. A relação entre linguística, etnografia e arqueologia: um estudo de caso aplicado a um sítio com ocupação tupiguarani no sul do estado do Pará. In: PEREIRA, E; GUAPINDAIA, V. (org.). Arqueologia amazônica. Belém: MPEG: IPHAN: SECULT, 2010. v. 2, p. 795-824., entre outros. Para exemplos das inferências sobre protocultura no âmbito dosestudos comparativos e de reconstrução do Proto-Indo-Europeu, ver Hock (1991, p. 573-578)HOCK, H. H. Principles of historical linguistics. Berlin: Mouton de Gruyter, 1991..
  • 3
    Em trabalho apresentado durante o 21º Simpósio Internacional de Iniciação Científica da Universidade de São Paulo (SIICUSP), em São Paulo, realizado no ano de 2018, Rafael Andrade de Almeida lançou uma proposta preliminar de revisão da reconstrução fonológica elexical do Proto-Tuparí. Porém, com base nos dados de que dispomos até o momento, optamos por manter a reconstrução apresentada em Moore e Galucio (1994)MOORE, Denny; GALUCIO, Ana Vilacy. Reconstruction of Proto-Tupari consonants and vowels. In: MEETING OF THE SOCIETY FOR THE STUDY OF THE INDIGENOUS LANGUAGES OF THE AMERICAS AND THE HOKAN-PENUTIAN WORKSHOP, 1994, Berkeley. Annals [...]. Berkeley: University of California, 1994. p. 119-137. e Galucio e Nogueira (2011)GALUCIO, A. V.; NOGUEIRA, A. F. Comparative study of the Tupari branch of the Tupi family: contributions to understanding its historical development and internal classification. In: CONGRESSO DE IDIOMAS INDIGENAS DE LATINOAMÉRICA, 5., 2011, Austin. Memórias [...]. Austin: Universidade do Texas, 2011. p. 1-28., embora devamos notar que estudos posteriores podem ajudar a esclarecer alguns pontos da reconstrução.
  • 4
    A vogal central é descrita como arredondada por Santos (2010)SANTOS, J. F. Documentação da língua Wayoró: para a preservação das línguas indígenas amazônicas. 2010. Dissertação (Mestrado em Ciência da Linguagem) – Fundação Universidade de Rondônia, Guajará-Mirim, 2010.. Análises acústicas estão sendo realizadas com a finalidade de definiressa propriedade da vogal.
  • 5
    Agradecemos a um dos pareceristas anônimos por chamar a atenção para essa questão.
  • 6
    A motivação para essa cisão em Akuntsú ainda deve ser melhor investigada.
  • 7
    Em Akuntsú, [d] é um dos alofones de /t/ (ver Aragon, 2008ARAGON, C. C. Fonologia e aspectos morfológicos e sintáticos da língua Akuntsú. 2008. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade de Brasília, Brasília, 2008., 2014ARAGON, C. C. A grammar of Akuntsú, a Tupían language. 2014. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Hawai’i at Mānoa, Honolulu, 2014.).
  • 8
    A língua Makurap possui um morfema genitivo -et, que ocorre nos sintagmas nominais (SN) possessivos e que possui quatro alomorfes {-et~-t; -en~-n}, determinados pelo traço oral ou nasal do segmento final da palavra (Braga, 2005BRAGA, A. O. Aspects morphosyntaxiques de la langue Makurap/Tupi. 2005. Tese (Doutorado em Ciências da Linguagem) – Université de Toulouse-Le Mirail, Toulouse, 2005.).
  • 9
    Tuparí parece ser a única língua que apresenta duas formas possuídas, sendo uma com a consoante [h], quando o possuidor é um SN ou a segunda pessoa do plural wat-, como em Konkoat h-ek ‘casa de Konkoat’ e wat h-ek ‘casa de vocês’, e uma com reflexo Ø, quando o possuidor é expresso na forma de um dos outros prefixos pessoais, conforme ilustrado acima. Em todas as outras línguas, há apenas a alternância entre a forma possuída e a não possuída, sendo a primeira sem a consoante inicial e a segunda, com os reflexos mostrados acima.
  • 10
    Manteve-se como ß em posição de coda silábica, em Akuntsú, e mudou para oclusiva bilabial surda /p/ em início de palavra em Sakurabiat.
  • 11
    Sincronicamente, existe um processo de fricativização envolvendo a consoante oclusiva surda, em Tuparí: /p/ realiza-se foneticamente como [Ф] diante das vogais arredondadas /o/ e /ʉ/
  • 12
    Ao longo do artigo, são usadas siglas dos termos de parentesco que representam as letras iniciais das palavras em inglês: F = father (pai), M = mother (mãe), S = son (filho), D = daughter (filha), B = brother (irmão), Z = sister (irmã), W = wife (esposa), H = husband (marido) e suas combinações.
  • 13
    Em Wayoró, a palavra mbopot significa ‘flecha’.
  • 14
    Os números entre parênteses se referem às linhas dos quadros em que estão os cognatos.
  • 15
    Em (3), o termo tʃej Akuntsú é traduzido como ‘tio’ (Aragon, 2008ARAGON, C. C. Fonologia e aspectos morfológicos e sintáticos da língua Akuntsú. 2008. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade de Brasília, Brasília, 2008.) (assim como a palavra jõj – >Aragon, 2008ARAGON, C. C. Fonologia e aspectos morfológicos e sintáticos da língua Akuntsú. 2008. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade de Brasília, Brasília, 2008.). A descrição como (m) MB é uma hipótese relacionada aos cognatos nas demais línguas.
  • 16
    Os termos para FB em Makurap, Sakurabiat e Tuparí são constituídos pela palavra para ‘pai’, seguida de um modificador nominal, como op-nõ ‘pai-outro’, em Sakurabiat. Em Wayoró, utiliza-se um sintagma genitivo com o termo para irmão (fala masculina) modificando a palavra para ‘pai’, por exemplo, aßi ike ‘irmão mais velho do pai’. Dessa forma, não há uma correspondência regular nesses itens.
  • 17
    Em Sakurabiat, o termo correspondente a (m)FZ é igual a (m)MZ si-rõ. O termo aqui apresentado é explicado pelo colaborador como “uma tia distante, [que] não é nem irmã da mãe, nem irmã do pai” (informação verbal in diário de campo de Ana Vilacy Galucio, TI RioMequéns, jul. 2017).
  • 18
    Exemplos em Wayoró são (f)eZ -ikej/akej e ‘caminho’ -ape/pe. Em Sakurabiat, ‘caminho’ -ape/pe; ‘velho’ poot e ‘tio (m)MeB’ jsej a-poot; ‘criança, novo’ kɨrɨt e ‘tio (m)MyB’ jsej a-kɨrɨt.
  • 19
    Em Tuparí, nessa condição, os SN recebem o caso nuclear, que corresponde segmentalmente ao morfema genitivo em Makurap. Qualquer sujeito não pronominal em Tuparí precisa receber o caso nuclear (Singerman, 2018SINGERMAN, A. R. The morphosyntax of Tuparí, a Tupían language of the Brazilian Amazon. 2018. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Chicago, Chicago, 2018.). Os termos vocativos nunca ocorrem como nomes possuídos.
  • 20
    É necessário observar, contudo, que há um pequeno número de radicais nominais/adjetivais duplicados cuja forma não duplicada é atestada, por exemplo, ŋwãrãkwa ‘listrar (horizontalmente)’ e ŋwãrãŋwãrã ‘listrado’, bem como ame?ko ŋgop ‘onça-vermelha’ e ŋgopŋgop ‘vermelho’. No entanto, em Akuntsú, Sakurabiat e Tuparí, por exemplo, a duplicação é um processo morfológico produtivo, que pode indicar pluralidade e/ou informações aspectuais (Aragon, 2014ARAGON, C. C. A grammar of Akuntsú, a Tupían language. 2014. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Hawai’i at Mānoa, Honolulu, 2014.; Galucio, 2001GALUCIO, A. V. The morphosyntax of Mekens (Tupi). 2001. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Chicago, Chicago, 2001.; Singerman, 2018SINGERMAN, A. R. The morphosyntax of Tuparí, a Tupían language of the Brazilian Amazon. 2018. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Chicago, Chicago, 2018.). Tais dados sugerem que a duplicação pode ter sido um processo morfológico produtivo em Proto-Tuparí, com funções gramaticais específicas.
  • 21
    Apresentamos alguns exemplos do vocábulo paba ‘seco; mulher idosa; anciã’, em Sakurabiat:
    a)Poret pabaap te poret setejat aemokwa pa ose ke?ra.
    “Aí eles (disseram): ‘Não é seco, não. Aonde será que nós vamos?”’
    b)Poret te paba akwapna.
    “Aí a velha atrasou” (literal: “Aí a velha ficou nas costas/ficou atrás”)
  • 22
    Inicialmente, havíamos pensado na possibilidade de o termo si-pap corresponder semanticamente a ‘mãe’ + ‘morta’, uma vez que pap sincronicamente possui essa acepção ‘morto; embriagado (semelhante a morto)’, em Sakurabiat. Porém, essa interpretação é nomínimo pouco plausível, como indicado por um parecerista anônimo. Agradecemos a ele por nos motivar a procurar uma etimologia mais plausível para este termo.
  • 23
    Não possuímos o termo para (yB) em Akuntsú.
  • 24
    Agradecemos a um dos pareceristas anônimos por ter chamado a atenção para essa possibilidade.
  • 25
    Os dados para ‘primos’ da língua Wayoró foram projetados com base no seguinte trecho de entrevista com Paulina Macurap sobre termos de parentesco, realizada na Aldeia Ricardo Franco (Guajará-Mirim, Rondônia), em 23 jun. 2008. Quando questionada sobre os termos para ‘primos’ que são sobrinhos da mãe, a colaboradora respondeu: “Essa aí, para nós, não tem primo não. Tudo é irmã”. E acrescentou sobre os primos que são sobrinhos do pai: “Irmão do seu pai, os filhos dele, que ele tem, tudo é teu irmão” (informação verbal in diário de campo de Nicole Soares-Pinto, Guajará-Mirim, 23 jun. 2008).
  • 26
    Não dispomos de dados suficientes para a reconstrução das posições (f)FByD, bem como para MZD e MZS.
  • 27
    Outras palavras que mostram a mesma alternância: ‘pai’ op, Tigi hop; ‘casa’ ek, Tigi hek.
  • 28
    O mesmo processo de queda de *t na língua Tuparí pode ser notado na palavra para ‘jacaré’ Akuntsú kwato: Wayoró ŋgwajtʃo: Makurap βato: Sakurabiat kwato: Tuparí wao.
  • 29
    Em (31), o termo em Akuntsú é registrado apenas para ZD, e o termo em Tuparí é descrito apenas para ZS.
  • 30
    Embora as fontes diacrônicas de owaɁʉp ‘(f)BS’ e owak ‘(f)BD’, em Tuparí, sejam *okwa daɁʉp e *okwa tak, o reflexo da consoante inicial do nome possuído não se mantém na língua atual. Ou seja, em Tuparí, não se diz *owa haɁʉp (dado agramatical) para ‘(f)BS’, nem *owa hak (dado agramatical) para ‘(f)BD’, apesar de a consoante h aparecer em outros casos:Konkwat haɁʉp ‘filho de Konkwat’, Konkwat hak ‘filha de Konkwat’.
  • 31
    Braga (1992)BRAGA, A. O. A fonologia segmental e aspectos morfofonológicos da língua Makurap (Tupí). 1992. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1992. descreve a mudança de /t/ para [ɾ] ou [l] em fronteira de morfema.
  • 32
    Em Makurap (Braga, 2005BRAGA, A. O. Aspects morphosyntaxiques de la langue Makurap/Tupi. 2005. Tese (Doutorado em Ciências da Linguagem) – Université de Toulouse-Le Mirail, Toulouse, 2005.) e Tuparí, a palavra para ‘esposa’ é analisada como morfologicamente indivisível. A divisão aqui proposta é realizada para fins comparativos.
  • 33
    No campo semântico da terminologia de parentesco, confira, ainda em Wayoró, a alteração inicial da palavra para (m)S ndaɨp em (f)BS okwa taɨp.
  • 34
    Moore e Galucio (1994)MOORE, Denny; GALUCIO, Ana Vilacy. Reconstruction of Proto-Tupari consonants and vowels. In: MEETING OF THE SOCIETY FOR THE STUDY OF THE INDIGENOUS LANGUAGES OF THE AMERICAS AND THE HOKAN-PENUTIAN WORKSHOP, 1994, Berkeley. Annals [...]. Berkeley: University of California, 1994. p. 119-137. postularam a reconstrução de uma consoante africada sonora *(n)dz para as correspondências ilustradas nessa palavra, porém, as informações de ordem morfológica discutidas acima nos levam a manter somente a consoante africada surda *ts paraProto-Tuparí.
  • 35
    Singerman (2016SINGERMAN, A. R. Nasal harmony and phonotactic well-formedness in Tupari. International Journal of American Linguistics, Chicago, v. 82, n. 4, p. 453-485, Oct. 2016. DOI: https://doi.org/10.1086/688603.
    https://doi.org/10.1086/688603...
    , 2018)SINGERMAN, A. R. The morphosyntax of Tuparí, a Tupían language of the Brazilian Amazon. 2018. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Chicago, Chicago, 2018. apresenta a queda de consoantes bilabiais /p/ e /m/ em posição final de morfema, mas somente quando seguidos de um sufixo iniciado em vogal.
  • 36
    Notam-se, ainda, outras interpretações importantes, sumarizadas em Soares-Pinto (2019, p. 109): a “[...] primazia lógica do casamento avuncular sobre o esquema dravidiano – Dal Poz Neto (Dal Poz, 2004) para os Tupi Mondé – e de um modelo interpretativo da organização dualista kagwahiva como imbricação entre um sistema de parentesco dravidiano e um sistema de metades exogâmicas (Peggion, 2011). A não coincidência entre distinção terminológica para primos cruzados e regra prescritiva de casamento, bem como a ‘subordinação do conhecimento genealógico aos fatores de residência e intensidade de interação social’ (Pereira, 1999, passim) [p. 74-79] estaria presente entre os kaiowá.”.
  • 37
    Ver Dumont (1953)DUMONT, L. The Dravidian kinship terminology as an expression of marriage. Man, London, v. 53, p. 34-39, Mar. 1953. DOI: http://dx.doi.org/10.2307/2794868.
    https://doi.org/10.2307/2794868...
    .
  • 38
    Ver Murdock (1949)MURDOCK, G. P. Social structure. New York: Macmillan, 1949..
  • 39
    Ver Ribeiro e Voort (2010)RIBEIRO, E. R.; VOORT, H. V. D. Nimuendajú was right: the inclusion of the Jabutí language family in the Macro-Jê stock. International Journal of American Linguistics, Chicago, v. 76, n. 4, p. 517-570, Oct. 2010. DOI: https://doi.org/10.1086/658056.
    https://doi.org/10.1086/658056...
    .
  • 40
    Para a língua Tuparí, Caspar (2014)CASPAR, F. Os Tupari. Uma tribo indígena no Brasil ocidental. Tradução: Adriana Maria Huber Azevedo. [S. l.: s. n.], 2014. Título original: Die Tuparí, ein Indianerstamm in Westbrasilien. reporta os termos para ‘filho do irmão’ <aöp> /aɁʉp/; ‘filha do irmão’ <ak>. Os mesmos termos são usados por homens em geral, ou seja, o homem trata o próprio filho como /waɁʉp/ e a filha como /wak/.
  • 41
    Ver adiante a discussão em relação aos filhos dos irmãos de sexo oposto para ego feminino na terminologia Wayoró.
  • 42
    Confira as terminologias e diagramas completos preenchidos com os dados disponíveis do ramo Tuparí nas Figuras 9 a 18, disponíveis no Apêndice.
  • 43
    No sentido precisado por R. Keesing: “Instead of equating only same-sex siblings, Hawaian terminologies ‘lump’ relatives together by sex and generation” (Keesing, 1975KEESING, R. M. Kin groups and social structure. New York: Holt, Rinehart and Winston, 1975., p. 104).
  • 44
    Ver Dumont (1953)DUMONT, L. The Dravidian kinship terminology as an expression of marriage. Man, London, v. 53, p. 34-39, Mar. 1953. DOI: http://dx.doi.org/10.2307/2794868.
    https://doi.org/10.2307/2794868...
    .
  • 45
    Em Wayoró, ego feminino e masculino refere a FZH como m?jom.
  • 46
    Em Wayoró, ego feminino e masculino refere a FBW como jã nõ.
  • 47
    No sentido estabelecido por Kaplan (1972)KAPLAN, J. O. Cognation, endogamy, and teknonymy: the piaroa example. Southwestern Journal of Anthropology, Albuquerque, v. 28, n. 3, p. 282-297, Autumn 1972., quando dois irmãos podem casar com duas irmãs.
  • 48
    Ver nas Figuras 1 e 2 os dados de Sakurabiat; nas Figuras 3 e 4 os de Wayoró; e nas Figuras 5 e 6 os de Tuparí.
  • 49
    Ainda que se deva registrar a ausência de termos disponíveis para as posições dos primos cruzados matrilaterias, no caso de ego feminino.
  • 50
    Ver nas Figuras 5 e 6 os termos para G-2 da língua Tuparí.
  • 51
    Vale notar, no entanto, ainda que de passagem, que a terminologia Wayoró dá pistas de um cruzamento de tipo iroquês com obliquidade geracional: HM tipap nãn pode ser traduzido como ‘tornar-se avó’.
  • 52
    Rodrigues (2007RODRIGUES, A. D. As consoantes do Proto-Tupi. In: CABRAL, A. S. A. C.; RODRIGUES, A. D. (ed.). Línguas e culturas Tupí. Campinas: Curt Nimuendajú; Brasília: LALi, 2007. p. 167-203., 2010)RODRIGUES, A. D. Linguistic reconstruction of elements of prehistoric Tupi culture. In: CARLIN, Eithne B.; VAN DE KERKE, Simon (ed.). Linguistics and Archaeology in the Americas: the historization of language and society. Leiden: Brill, 2010. p. 1-10. DOI: https://doi.org/10.1163/9789047427087_002.
    https://doi.org/10.1163/9789047427087_00...
    não apresenta os termos reconstruídos para (m)D, FZ e MB, em Proto-Tupí.
  • 53
    As notações em forma fonológica, tal como utilizada neste artigo, das palavras aqui mencionadas seriam o-m?pit ipoj, o-tak ti, em que o- é a primeira pessoa do singular possessiva.

REFERÊNCIAS

  • ARAGON, C. C. A grammar of Akuntsú, a Tupían language 2014. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Hawai’i at Mānoa, Honolulu, 2014.
  • ARAGON, C. C. Fonologia e aspectos morfológicos e sintáticos da língua Akuntsú 2008. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade de Brasília, Brasília, 2008.
  • BALDUS, H. Tapirapé: tribo tupí no Brasil Central. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1970.
  • BETTS, L. Anthropological check list Parintintin [S.l]: Summer Institute of Linguistics, 1967. Mimeografado.
  • BRAGA, A. O. Aspects morphosyntaxiques de la langue Makurap/Tupi 2005. Tese (Doutorado em Ciências da Linguagem) – Université de Toulouse-Le Mirail, Toulouse, 2005.
  • BRAGA, A. O. A fonologia segmental e aspectos morfofonológicos da língua Makurap (Tupí) 1992. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1992.
  • CASPAR, F. Os Tupari Uma tribo indígena no Brasil ocidental. Tradução: Adriana Maria Huber Azevedo. [S. l: s. n], 2014. Título original: Die Tuparí, ein Indianerstamm in Westbrasilien.
  • CUNHA, M. C. Os mortos e os outros: uma análise do sistema funerário e da noção de pessoa entre os índios Krahó. São Paulo: Editora Hucitec, 1978.
  • DAL POZ, J. Dádivas e dívidas na Amazônia: parentesco, economia e ritual nos Cinta-Larga. 2004. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2004.
  • DIETRICH, W. More evidence for an internal classification of Tupi-Guarani languages Berlin: Gebr. Mann Verlag, 1990.
  • DUMONT, L. The Dravidian kinship terminology as an expression of marriage. Man, London, v. 53, p. 34-39, Mar. 1953. DOI: http://dx.doi.org/10.2307/2794868.
    » https://doi.org/10.2307/2794868
  • FAUSTO, C. De primos e sobrinhas: terminologia e aliança entre os Parakanã (Tupi) do Pará. In: VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo (org.). Antropologia do parentesco: estudos ameríndios. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1995. p. 61-120.
  • FERNANDES, F. A organização social dos Tupinambá 2. ed. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1963.
  • FOX, A. Linguistic reconstruction: an introduction to theory and method. Oxford: Oxford University Press, 1995.
  • GALUCIO, A. V.; NOGUEIRA, A. F. Comparative study of the Tupari branch of the Tupi family: contributions to understanding its historical development and internal classification. In: CONGRESSO DE IDIOMAS INDIGENAS DE LATINOAMÉRICA, 5., 2011, Austin. Memórias [...]. Austin: Universidade do Texas, 2011. p. 1-28.
  • GALUCIO, A. V. A relação entre linguística, etnografia e arqueologia: um estudo de caso aplicado a um sítio com ocupação tupiguarani no sul do estado do Pará. In: PEREIRA, E; GUAPINDAIA, V. (org.). Arqueologia amazônica Belém: MPEG: IPHAN: SECULT, 2010. v. 2, p. 795-824.
  • GALUCIO, A. V.; GABAS-JÚNIOR, N. Evidências de agrupamento genético Karo-Puruborá, tronco Tupi. In: ENCONTRO NACIONAL DA ANPOLL, 17., Gramado, 2002. Boletim Informativo […]. Gramado: UFRGS: FAURGS, 2002. p. 163.
  • GALUCIO, A. V. The morphosyntax of Mekens (Tupi) 2001. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Chicago, Chicago, 2001.
  • HOCK, H. H. Principles of historical linguistics Berlin: Mouton de Gruyter, 1991.
  • KAPLAN, J. O. Cognation, endogamy, and teknonymy: the piaroa example. Southwestern Journal of Anthropology, Albuquerque, v. 28, n. 3, p. 282-297, Autumn 1972.
  • KEESING, R. M. Kin groups and social structure New York: Holt, Rinehart and Winston, 1975.
  • LARAIA, R. B. Os estudos de parentesco no Brasil. BIB: Revista Brasileira de Informação Bibliográfica em Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 23, p. 3-17, sem. 1987.
  • LARAIA, R. B. Organização social dos Tupí contemporâneos 1972. Tese (Doutorado em Ciências Sociais/Antropologia Social) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 1972.
  • LÉVI-STRAUSS, C. Organização social. In: LARAIA, R. B. (org.). Organização social Rio de Janeiro: Zahar, 1969. p. 124-144.
  • MEIRA, S.; DRUDE, S. A summary reconstruction of proto-maweti-guarani segmental phonology. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, Belém, v. 10, n. 2, p. 275-296, maio/ago. 2015. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1981-81222015000200005.
    » https://doi.org/10.1590/1981-81222015000200005
  • MEIRA, S.; DRUDE, S. Sobre a origem histórica dos “prefixos relacionais” das línguas tupí-guaraní. Cadernos de Etnolinguística, v. 5, n. 1, p. 1-30, maio 2013.
  • MOORE, Denny; GALUCIO, Ana Vilacy. Reconstruction of Proto-Tupari consonants and vowels. In: MEETING OF THE SOCIETY FOR THE STUDY OF THE INDIGENOUS LANGUAGES OF THE AMERICAS AND THE HOKAN-PENUTIAN WORKSHOP, 1994, Berkeley. Annals [...]. Berkeley: University of California, 1994. p. 119-137.
  • MOORE, D.; STORTO, L. As línguas indígenas e a pré-história. In: PENA, S. D. J. (org.). Homo Brasilis São Paulo: FUNPEC Editora, 2002. p. 73-92.
  • MURDOCK, G. P. Social structure New York: Macmillan, 1949.
  • MURPHY, R. Headhunter’s heritage Berkeley: University of California Press, 1960.
  • PEGGION, E. A. Relações em perpétuo desequilíbrio: a organização dualista dos povos Kagwahiva da Amazonia. São Paulo: ANNABLUME: FAPESP: ISA, 2011.
  • PEREIRA, L. M. Parentesco e organização social Kaiowá 1999. Dissertação (Mestrado em Antropologia) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1999.
  • RIBEIRO, E. R.; VOORT, H. V. D. Nimuendajú was right: the inclusion of the Jabutí language family in the Macro-Jê stock. International Journal of American Linguistics, Chicago, v. 76, n. 4, p. 517-570, Oct. 2010. DOI: https://doi.org/10.1086/658056.
    » https://doi.org/10.1086/658056
  • RODRIGUES, A. D.; CABRAL, A. S. A. C. Tupían. In: CAMPBELL, L.; GRONDONA, V. (ed.). The indigenous languages of South America: a comprehensive guide. Berlin: Walter de Gruyter, 2012. p. 495-574.
  • RODRIGUES, A. D. Linguistic reconstruction of elements of prehistoric Tupi culture. In: CARLIN, Eithne B.; VAN DE KERKE, Simon (ed.). Linguistics and Archaeology in the Americas: the historization of language and society. Leiden: Brill, 2010. p. 1-10. DOI: https://doi.org/10.1163/9789047427087_002.
    » https://doi.org/10.1163/9789047427087_002
  • RODRIGUES, A. D. As consoantes do Proto-Tupi. In: CABRAL, A. S. A. C.; RODRIGUES, A. D. (ed.). Línguas e culturas Tupí Campinas: Curt Nimuendajú; Brasília: LALi, 2007. p. 167-203.
  • RODRIGUES, A. D. Aspectos da história das línguas indígenas da Amazônia. In: SIMÕES, M. do S. (org.). Sob o signo do Xingu Belém: UFPA: IFNOPAP, 2003. p. 37-51.
  • RODRIGUES, A. D. Hipótese sobre as migrações dos três subconjuntos meridionais da família tupí-guaraní. In: CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE LINGUÍSTICA, 2., 2000, Florianópolis. Atas [...]. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 2000. p. 1596-1605.
  • RODRIGUES, A. D. Relações internas na família linguística Tupí-Guaraní. Revista de Antropologia, São Paulo, v. 27/28, p. 33-53, 1984-1985.
  • SANTOS, J. F. Documentação da língua Wayoró: para a preservação das línguas indígenas amazônicas. 2010. Dissertação (Mestrado em Ciência da Linguagem) – Fundação Universidade de Rondônia, Guajará-Mirim, 2010.
  • SHAPIRO, J. Tapirapé kinship. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi, Nova Série, Antropologia, Belém, n. 37, p. 1-37, 1968.
  • SINGERMAN, A. R. The morphosyntax of Tuparí, a Tupían language of the Brazilian Amazon 2018. Tese (Doutorado em Linguística) – University of Chicago, Chicago, 2018.
  • SINGERMAN, A. R. Nasal harmony and phonotactic well-formedness in Tupari. International Journal of American Linguistics, Chicago, v. 82, n. 4, p. 453-485, Oct. 2016. DOI: https://doi.org/10.1086/688603.
    » https://doi.org/10.1086/688603
  • SOARES-PINTO, N. Uma incontornável diferença: parentesco nas terras baixas da América do Sul (1996-2016). BIB: Revista Brasileira de Informação Bibliográfica em Ciências Sociais, São Paulo, v. 1, n. 87, p. 105-132, 2019.
  • SOARES-PINTO, N. “Pequeno manual para se casar e não morrer”: o parentesco djeoromitxi. Mana, Rio de Janeiro, v. 23, n. 2, p. 519-549, maio/ago. 2017. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1678-49442017v23n2p519.
    » https://doi.org/10.1590/1678-49442017v23n2p519
  • SOARES-PINTO, N. Terminologia de parentesco e casamento djeoromitxi: um caso ngawbe na Amazônia? Anuário Antropológico, Brasília, v. 41, p. 123-151, 2016. DOI: https://doi.org/10.4000/aa.1744.
    » https://doi.org/10.4000/aa.1744
  • SOARES-PINTO, N. Entre as teias do marico: parentes e pajés djeoromitxi. 2015. Tese (Doutorado em Antropologia Social) – Universidade de Brasília, Brasília, 2015.
  • SOARES-PINTO, N. Do poder do sangue e da chicha: os Wajuru do Guaporé (Rondônia). 2009. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2009.
  • STORTO, L.; FRANCHETTO, B. Hipóteses linguísticas sobre o povoamento das Américas: é o ameríndio a língua original do continente sul-americano? In: SILVA, H.; RODRIGUES-CARVALHO, C. (ed.). Nossa origem: o povoamento das Américas: visões interdisciplinares. Rio de Janeiro: Vieira and Lent, 2006. p. 105-133.
  • VIVEIROS DE CASTRO, E. Multinaturalismo na América indígena. In: VIVEIROS DE CASTRO, E. A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia São Paulo: Cosac & Naif, 2002a. p. 345-401.
  • VIVEIROS DE CASTRO, E. O problema da afinidade na Amazônia. In: VIVEIROS DE CASTRO, E. A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia São Paulo: Cosac & Naify, 2002b. p. 87-180.
  • VIVEIROS DE CASTRO, E. Ambos os três: sobre algumas distinções tipológicas e seu significado estrutural na teoria do parentesco. Anuário Antropológico, Brasília, v. 95, p. 9-91, 1996.
  • WAGLEY, C. Welcome of tears: the Tapirapé Indians of Brazil. Oxford: Oxford University Press, 1977.
  • WAGLEY, C.; GALVÃO, E. O parentesco Tupi-Guarani. Boletim do Museu Nacional, Nova Série, Antropologia, Rio de Janeiro, n. 6, p. 1-24, jan. 1946.
  • WATSON, J. B. Cayuá culture change: a study in acculturation and methodology. Menasha: American Anthropological Association, 1952.
  • WATSON, V. D. Notas sobre o sistema de parentesco dos índios Cayuá. Sociologia, Porto, v. 6, n. 1, p. 31-48, 1944.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Abr 2019
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2019

Histórico

  • Recebido
    23 Mar 2018
  • Aceito
    01 Mar 2019
MCTI/Museu Paraense Emílio Goeldi Coordenação de Pesquisa e Pós-Graduação, Av. Perimetral. 1901 - Terra Firme, 66077-830 - Belém - PA, Tel.: (55 91) 3075-6186 - Belém - PA - Brazil
E-mail: boletim.humanas@museu-goeldi.br