Acessibilidade / Reportar erro

A organização do trabalho familiar sob a influência da produção de dendê em Tomé-Açu, Pará

Family working arrangements in the production of palm oil in Tomé-Açu, Pará

Resumo

O objetivo deste artigo é analisar a organização do trabalho em estabelecimentos familiares, cujos membros têm diferentesrelações com a dendeicultura na vila Água Azul, Tomé-Açu, Pará, considerando o debate sobre os impactos desta atividade no trabalho familiar e a tendência para a realização de uma agricultura com mais culturas perenes. A pesquisa envolveutrês tipos de famílias: com contrato para a produção de dendê, com algum membro assalariado na dendeicultura ou sem nenhuma relação com esta atividade. As conclusões mostram que: i) a organização do trabalho depende do tamanho daterra, do ciclo de desenvolvimento do grupo doméstico e do sistema de produção; ii) há relação direta entre a produção de dendê e a dependência da contratação de mão de obra; iii) há predominância de homens no trabalho agrícola e demulheres em outras atividades. O trabalho nos estabelecimentos resulta de numerosos arranjos e tem sido ressignificado, com a secundarização de culturas alimentares onde se cultiva dendê e com maior diversificação nos estabelecimentosque não têm relação com a dendeicultura. Aumenta, assim, a diferenciação das famílias quanto aos sistemas de produção e aos arranjos para o trabalho.

Palavras-chave
Agricultura familiar; Dendeicultura; Amazônia; Divisão do trabalho

Abstract

The aim of this article is to analyze the working arrangements on family farms where each family member has a distinct relationship with oil palm cultivation in Vila Água Azul, Tomé-Açu, Pará, considering the debate on how oil palm cultivation impacts family labor and the trend towards agriculture with more perennial crops. The research involved three types of families: those with a contract for oil palm cultivation, those with at least one family member employed in oil palmcultivation, and families which were not involved in this activity. We found that: i) working arrangements depend on the size of the land, the development cycle of the household group, and the system of production; ii) there is a directrelationship between the production of palm oil and dependence on hired labor; iii) men work predominantly in agriculture and women in other activities. Work on family farms is the result of numerous arrangements and has been re-signifiedso that cultivation of food crops becomes less important than oil palm cultivation and family farms where oil palms are not cultivated are more diversified. Families that do and do not cultivate oil palm consequently differ in terms of theirproduction systems and working arrangements.

Keywords
Family-based agriculture; Oil palm cultivation; Amazon; Division of labor

INTRODUÇÃO

No estado do Pará, cultiva-se dendê há décadas, mas só a partir de 2003 a produção tem sido incentivada por subsídios públicos, oriundos do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB) e do Programa de Produção Sustentável de Óleo de Palma (PSOP), envolvendo agricultores familiares e empresários. Buscando compreender a iniciativa, o artigo trata das mudanças na organização social do trabalho, tomando como base famílias agricultoras que mantêm relações diferenciadas com a produção de dendê no estado.

A iniciativa insere-se no contexto de incentivo à promoção da incorporação de agrocombustíveis à matriz energética nacional, com base em um forte argumento socioambiental e no apoio de políticas públicas. Como resultado, Brandão e Schoneveld (2015)BRANDÃO, Frederico; SCHONEVELD, George. The state of oil palm development in the Brazilian Amazon: trends, value chain dynamics, and business models. Bogor: CIFOR, 2015. (Working Paper, 198). estimaram uma área de 244.137 hectares em 31 municípios. Segundo os autores, cerca de 85% do total no sistema de plantation pertenciam a nove agroindústrias, e o equivalente a 15% do total pertenciam a estabelecimentos familiares, com cerca de 1.240 contratos com agricultores na condição de integração1 1 Segundo Aquino (2013), a integração garante exclusividade na aquisição da produção de agricultores pelas empresas. Em geral, essecompromisso é regulado por meio de contratos entre indústrias e agricultores. A indústria interfere após a integração na produção dosagricultores, quer seja via assistência técnica, quer seja via insumos e até equipamentos. . Os cultivos, juntamente com as plantas de processamento do dendê, geram cerca de 20 mil empregos diretos (ABRAPALMA, 2014ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PRODUTORES DE ÓLEO DE PALMA (ABRAPALMA). Planilha de mapeamento da palma de óleo no Brasil. Belém, 2014. Não paginado.).

Estudos sobre a dendeicultura mostram tendências conflitantes. Para uns, evidenciam-se impactos ambientais e sociais (Castro, 1998CASTRO, Edna. Tradição e modernidade: a propósito de formas de trabalho na Amazônia. Novos Cadernos NAEA, Belém, v. 2, n. 1, p. 1-22, jul. 1998. DOI: http://dx.doi.org/10.5801/ncn.v2i1.200. (Papers do Naea, n. 97).
https://doi.org/10.5801/ncn.v2i1.200...
; Repórter Brasil, 2010REPÓRTER BRASIL. Agricultura familiar e Programa Nacional de Biodiesel: retrato do presente, perspectivas de futuro. São Paulo, 2010.; Shiraishi Neto, 2011SHIRAISHI NETO, Joaquim. Novos movimentos sociais e padrões jurídicos no processo de redefinição da região Amazônia. In: SHIRAISHI NETO, Joaquim; LIMA, Rosirene Martins; CARDOSO, Luis Fernando Cardoso e; MESQUITA, Benjamin Alvino de (org.). Meio ambiente, territórios e práticas jurídicas: enredos em conflitos. São Luis: EDUFMA, 2011. p. 23-52.; Vieira; Magalhães, 2013VIEIRA, Ana Carolina C.; MAGALHÃES, Sônia Barbosa. Transformações no espaço rural amazônico: o plantio de dendê em comunidades camponesas do Baixo Tocantins, município de Moju/PA. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL RURALIDADES, TRABALHO E MEIO AMBIENTE, 2., 2013, São Carlos. Anais [...]. São Carlos: UFSCar, 2013. p. 79-99.). Diferentemente, há quem indique melhoria de condições de vida das famílias de agricultores (Alves, 2011ALVES, Ketiane dos Santos. Organização do trabalho de famílias agricultoras na comunidade Nossa Senhora de Lourdes, microrregião do Guamá no nordeste paraense. 2011. Dissertação (Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável) – Núcleo de Ciências Agrárias e Desenvolvimento Rural, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária-Amazônia Oriental, Universidade Federal do Pará, Belém, 2011.; Monteiro, 2013MONTEIRO, Kátia Fernanda Garcez. Análise de indicadores de sustentabilidade socioambiental em diferentes sistemas produtivos com palma de óleo no estado do Pará. 2013. Tese (Doutorado em Ciências Agrárias) – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária-Amazônia Oriental, Universidade Federal Rural da Amazônia, Belém, 2013.; Rebello, 2012REBELLO, Fabrício Khoury. Da lenha ao óleo de palma: a transformação da agricultura no nordeste paraense. 2012. Tese (Doutorado em Agroecossistemas da Amazônia) – Universidade Federal Rural da Amazônia, Belém, 2012.), mesmo que identifiquem fragilidades no quadro institucional do modelo de integração. Em todos os nossos contatos com lideranças, agricultores e moradores de mais de 300 vilas2 2 Em outra vertente do projeto Agricultura Familiar e Inclusão Social (AFInS), do qual este artigo faz parte. , foi evidenciada preocupação quanto à insegurança alimentar, ao monocultivo, à subordinação a uma processadora e às transformações na vida local. Houve também quem demonstrasse expectativas referentes à dinamização da economia local, por meio da geração de renda e, principalmente, de empregos regulares para os jovens.

Já se constatou que, nos estabelecimentos cujos agricultores têm contrato de integração, há uma reorganização do trabalho, com maior demanda de mão de obra e, paradoxalmente, maior engajamento de membros da família (notadamente homens jovens) no trabalho assalariado inserido no contexto dos monocultivos das agroindústrias (Nahum; Santos, 2013NAHUM, João Santos; SANTOS, Cleison Bastos dos. Impactos socioambientais da dendeicultura em comunidades tradicionais na Amazônia paraense. ACTA Geográfica, Boa Vista, Ed. Especial, Geografia Agrária, p. 63-80, 2013.; Sampaio, 2014SAMPAIO, Irã Carvalho. A agricultura familiar e a agroindústria do dendê no município de Tomé-Açu (PA): efeitos da agricultura por contrato na produção e no trabalho familiar. 2014. Dissertação (Mestrado em Sociologia e Antropologia) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Pará, Belém, 2014.; Vieira, 2015VIEIRA, Ana Carolina C. A integração camponesa ao monocultivo de dendê: subordinação e transformação do campesinato amazônico. 2015. Dissertação (Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável) – Universidade Federal do Pará, Belém, 2015.).

Análises realizadas nos maiores produtores mundiais de dendê, Indonésia e Malásia, reconhecem a importância econômica da atividade, que tem nos migrantes a sua força de trabalho central, diferentemente do que ocorre no Pará. Não obstante, há quem constate que a possibilidade de ter um emprego não significa uma vida decente, tanto pelas condições de trabalho quanto pelos salários (Sinaga, 2013SINAGA, Hariati. Employment and income of workers on Indonesian oil palm plantations: food crisis at the micro level. Future of Food: Journal on Food, Agriculture and Society, Witzenhausen, v. 1, n. 2, p. 64-78, Winter 2013.) ou ainda pela precariedade a que estão sujeitos e que interfere, inclusive, na constituição de uma família, pelas idas e vindas (Pye et al., 2012PYE, Oliver; DAUD, Ramlah; HARMONO, Yuyun; TATAT. Precarious lives: Transnational biographies of migrant oil palm workers. Asia Pacific Viewpoint, Wellington, v. 53, n. 3, p. 330-342, Dec. 2012. DOI: https://doi.org/10.1111/j.1467-8373.2012.01496.x.
https://doi.org/10.1111/j.1467-8373.2012...
). Grosso modo, nesses países, há preferência pela contratação de homens em empregos ocasionais, porque eles têm mais facilidade para migrar, considerando-se que as mulheres estão culturalmente responsabilizadas pela esfera doméstica e, assim, devem permanecer nos lugares de residência (Arndt et al., 2011ARNDT, Channing; BENFICA, Rui; THURLOW, James. Gender implications of biofuels expansion in Africa: the case of Mozambique. World Development, Michigan, v. 39, n. 9, p. 1649-1662, Sept. 2011. DOI: https://doi.org/10.1016/j.worlddev.2011.02.012.
https://doi.org/10.1016/j.worlddev.2011....
; Julia; White, 2012JULIA; WHITE, Ben. Gendered experiences of dispossession: oil palm expansion in a Dayak Hibun community in West Kalimantan. The Journal of Peasant Studies, Abingdon-on-Thames, v. 39, n. 3-4, p. 995-1016, July/Oct. 2012. DOI: https://doi.org/10.1080/03066150.2012.676544.
https://doi.org/10.1080/03066150.2012.67...
; Li, 2014LI, Tania Murray. The gendered dynamics of Indonesia’s Oil Palm labour regime. Singapore: Asia Research Institute, 2014. (Working Paper Series, n. 225).; Norwana et al., 2011NORWANA, Awang Ali Bema Dayang; KUNJAPPAN, Rejani; CHIN, Melissa; SCHONEVELD, George; POTTER, Lesley; ANDRIANI, Rubeta. The local impacts of oil palm expansion in Malaysia: an assessment based on a case study in Sabah State. Bogor: CIFOR, 2011. (Working Paper, n. 78).).

Nos diferentes contextos, há tensões quanto a adotar o estabelecimento de força de trabalho do grupo doméstico ou contratado para atender às exigências do cultivo. Não obstante essa constatação, as análises sobre as relações de trabalho nos processos de transformação associados à dendeicultura no Pará têm enfatizado o tema de modo ocasional, lacuna também observada no âmbito internacional, como indica Li (2015)LI, Tania Murray. Social impacts of oil palm in Indonesia: a gendered perspective from West Kalimantan. Bogor: CIFOR, 2015. (Occasional paper, n. 124)., para a Indonésia.

Considerando-se a importância da problemática, o objetivo deste artigo é analisar a organização do trabalho em estabelecimentos familiares, cujos membros têm diferentes relações com a dendeicultura, à luz do debate sobre os impactos da dendeicultura no trabalho familiar e a tendência de transição de uma agricultura itinerante (sistema de ‘corte e queima’3 3 A partir da leitura de diferentes autores, Pedroso Júnior et al. (2008, p. 154) afirmam que “A agricultura de corte e queima, na sua definição mais ampla, é qualquer sistema agrícola contínuo no qual clareiras são abertas para serem cultivadas por períodos mais curtos de tempo do que aqueles destinados ao pousio”. ou ‘roça’) para uma agricultura permanente4 4 Compreendemos por agricultura permanente a criação de culturas anuais feita continuamente na mesma área, sem pousio. . Partimos do pressuposto de que a incorporação do dendê ao sistema de produção e a proximidade dos cultivos empresariais influenciam na reorganização do trabalho das famílias nos estabelecimentos pela atratividade que exerce.

A PESQUISA

O quadro de análise ampara-se nas reflexões que consideram a intensificação dos processos de diversificação dos meios de vida de grupos da Amazônia, os quais têm na produção familiar a sua sustentação econômica e cultural. Essa diversificação é, muitas vezes, imposta por “[...] interesses alheios [...]” (Moreira; Hébette, 2009MOREIRA, Edma do Socorro Silva; HÉBETTE, Jean. Metamorfoses de um campesinato nos Baixo Amazonas e Baixo Xingu paraenses. In: GODOI, Emilia Pietrafesa de; MENEZES, Marilda Aparecida de; MARIN, Rosa Acevedo (org.). Diversidade do campesinato: expressões e categorias. São Paulo: Editora Unesp; Brasília: Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural, 2009. p. 187-206., p. 204), mas, via de regra, ela está associada aos conhecimentos agroecológicos, produtos de diversas histórias ou trajetórias econômicas (Fraser et al., 2017FRASER, James Angus; CARDOSO, Tiago; STEWARD, Angela; PARRY, Luke. Amazonian peasant livelihood differentiation as mutuality-market dialectics. The Journal of Peasant Studies, Abingdon-on-Thames, v. 45, n. 7, p. 1382-1409, May 2017. DOI: https://doi.org/10.1080/03066150.2017.1296833.
https://doi.org/10.1080/03066150.2017.12...
). Considerando-se tal compreensão, neste artigo, centramos a nossa análise na problemática do trabalho familiar, tomando como foco o ciclo de desenvolvimento do grupo doméstico (Fortes, 2011FORTES, Meyer. O ciclo de desenvolvimento do grupo doméstico. Tradução Alcida Rita Ramos. Brasília: UNB, 2011. (Série Tradução, v. 1). Título original: The Developmental Cycle in Domestic Groups.).

Interessa-nos, particularmente, analisar a influência da dendeicultura na organização do trabalho no interior de estabelecimentos familiares – que têm diferentes perfis e que se relacionam diferentemente com esta atividade –, como também no entorno dos monocultivos empresariais de dendê. Entendemos como influência da dendeicultura todas as ações decorrentes dos processos de produção de commodity que influem, de algum modo, nas dinâmicas dos estabelecimentos familiares no que diz respeito ao trabalho (divisão do trabalho, elenco de atividades, disponibilidade de mão de obra e mercado de trabalho).

Metodologicamente, optamos pela realização de um estudo de caso, método que supõe o conhecimento do fenômeno a partir da exploração, em profundidade, de um único caso (Becker, 1999BECKER, Howard S. Métodos de pesquisa em ciências sociais. 4. ed. Tradução Marco Estevão e Renato Aguiar. São Paulo: Hucitec, 1999.), aqui considerado um universo de 30 famílias, ou seja, a totalidade daquelas que cultivavam dendê na ocasião. A pesquisa foi realizada na vila Água Azul, em Tomé-Açu5 5 O município também se destaca pelo dinamismo da fruticultura, pela experiência com os Sistemas Agroflorestais (SAF) e com a produção da pimenta-do-reino. O traço cultural constituído pela influência da cultura dos paraenses, japoneses e nordestinos conforma uma agricultura diversificada e com forte associação com o mercado nacional e internacional. , Pará (Figura 1). Esse município é emblemático em relação à produção de dendê, por ter sido palco do lançamento do Programa Federal de Produção Sustentável de Palma de Óleo (PSOP), pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva (Lula), em 2010, e por ali estarem situados cultivos de duas empresas, produtores independentes e agricultores que têm contrato de integração. A escolha da vila Água Azul para a realização do estudo de caso decorre da existência de: i) agricultores integrados à dendeicultura, que já estavam produzindo o fruto, ii) assalariados nas agroindústrias de dendê e iii) monocultivos empresariais de dendê nos arredores da vila.

Figura 1
Localização da vila Água Azul, Tomé-Açu, no Pará. Mapa: Laboratório de Sensoriamento Remoto da EMBRAPA Amazônia Oriental (2017).

Os principais procedimentos metodológicos constaram de observações da vida social e do trabalho nos estabelecimentos, bem como da realização de entrevistas diretivas e não diretivas6 6 As entrevistas diretivas faziam referência a dois períodos: o passado, quando as famílias chegaram para ocupar o espaço e ali estabelecer residência (a partir do ano de 1967); e o presente, referente ao momento da pesquisa (2016). As perguntas versavam sobre a história de chegada, a conformação da vila e dos estabelecimentos, além de abordarem o trabalho (atividades, espaços de trabalho, divisão sexual do trabalho e mudanças recentes). As entrevistas não diretivas trataram do trabalho no passado e no presente, visando apreender ossignificados atribuídos à vida social local e às diferentes relações com o mercado, após à integração. . Foram envolvidas 12 famílias de agricultores, as quais, para fins analíticos, foram classificadas em três tipos: i) quatro apresentando membros com contrato de integração para a produção de dendê no estabelecimento familiar, ii) quatro com algum membro assalariado na dendeicultura e iii) quatro sem relação direta com a dendeicultura. Para o primeiro tipo, consideramos todo o universo ali existente; já para os dois últimos, a seleção foi aleatória.

A fundação da vila Água Azul data de 1967 e está relacionada com a migração de nordestinos, inicialmente cearenses e, posteriormente, maranhenses e piauienses, como parte de estratégias de reprodução social, porque esses migrantes tinham acesso precário à terra e às condições de produção nos seus lugares de origem. Além do acesso aos recursos, essa migração – frequente na ocupação do espaço no nordeste paraense (NEP) – prometia uma tranquilidade, que também era considerada nos critérios de decisão, como registra o depoimento de um dos primeiros moradores da vila:

Antes de chegar aqui, tinha a opção de ir ou pra região de Marabá, ou pra cá em Tomé-Açu. Meu amigo me disse: se você pensa em um dia talvez enricar, vá para Marabá, mas se você quiser levar uma vida tranquila, venha para Tomé-Açu. Eu escolhi a vida tranquila. (M. R., 60 anos, agricultor).

A memória oral registra que três eventos marcam a história da vila: 1) a construção da estrada PA-256 no início dos anos 70, o que incentivou a vinda de novas famílias e a mudança daquelas que antes moravam nos lotes agrícolas para a margem da estrada; 2) a instalação da energia elétrica no início dos anos 80; 3) a implantação de monocultivos empresariais de dendê, o que atraiu dezenas de migrantes, pela possibilidade de emprego, e incentivou a abertura de novas ruas em um bairro chamado Bairro Novo.

Em 2015, a vila Água Azul contava com 150 famílias e 600 pessoas. As residências e os principais prédios públicos são voltados para a PA-256 e formam uma rua, na qual se localizam a escola de ensino fundamental, uma igreja católica e uma evangélica, e estabelecimentos comerciais (mercearias, salão de beleza, loja de roupas, lanchonete, mercadinhos, distribuidora de bebidas, padaria e restaurante). A vila dispõe de campo de futebol e de um balneário, e a principal festa religiosa é a de Santa Luzia, em dezembro.

A PRODUÇÃO DE DENDÊ, AÇÃO DO ESTADO E GRUPOS DE INTERESSES

No Brasil, a implementação de uma política em favor da dendeicultura é parte de uma estratégia de reprimarização da economia, que ocorreu, principalmente, depois da crise financeira mundial de 2007-2008. Essa crise, que comprometeu o financiamento do modelo social democrata dos governos do Partido dos Trabalhadores (PT), “[...] provocou uma retração do mercado mundial e uma redução na dinâmica das trocas, mostrou, no entanto, que os produtos primários continuam a ter papel importante na economia e na balança comercial brasileira” (Castro, 2012CASTRO, Edna. Amazônia: sociedade, fronteiras e políticas. Caderno CRH, Salvador, v. 25, n. 64, p. 9-16, jan./abr. 2012. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-49792012000100001.
https://doi.org/10.1590/S0103-4979201200...
, p. 10). Nesse contexto, a produção de dendê é deficitária em comparação aos produtos primários oriundos da Amazônia (soja, carne e minério) que constam na liderança da pauta de exportação brasileira, sendo o Brasil importador de cerca de 90% do total da matéria-prima para atender à demanda interna (Bentes; Homma, 2016BENTES, Elisabeth dos Santos; HOMMA, Alfredo Kingo Oyama. Importação e exportação de óleo e palmiste de dendezeiro no Brasil (2010-2015). Belém: Embrapa Amazônia Oriental, 2016. (Boletim de pesquisa e desenvolvimento, n. 101).).

Não obstante às diferenças e ao reconhecimento da demanda nacional, a recente expansão da dendeicultura na Amazônia tem atraído acalorados debates, espelhados nas experiências internacionais quanto aos impactos ambientais e sociais. O dendê ocupa 20% das áreas de cultivos permanentes no mundo, com previsão de crescimento de duas a três vezes até 2050. Em 2018, a distribuição estimada indicava: Ásia (65.320 mil toneladas de frutos), América (4.463 mil toneladas) e África (2.796 mil toneladas) (USDA, 2018UNITED STATES DEPARTMENT OF AGRICULTURE (USDA). Palm oil production by country in 1000 MT. Washington, 2018. Disponível em: https://www.indexmundi.com/agriculture/?commodity=palm-oil. Acesso em: 17 jun. 2018.
https://www.indexmundi.com/agriculture/?...
). As corporações dominam a cadeia produtiva e têm grandes áreas de monoculturas coexistindo com os cultivos de médios e pequenos produtores, segundo diferentes formatos e contratos para o fornecimento da matéria-prima a ser utilizada em diversos produtos, com destaque para o óleo vegetal, um dos recursos mais utilizado para a cocção de alimentos no mundo.

No estado do Pará, a experiência com dendê é relativamente recente e teve início na década de 1940, muito embora Homma (2016)HOMMA, Alfredo Kingo Oyama. Cronologia do cultivo do dendezeiro na Amazônia. Belém: Embrapa Amazônia Oriental, 2016. (Documentos, n. 423). indique que a sua chegada ao Brasil remonte ao período entre 1539/1542. Da produção brasileira, 90% advêm do estado do Pará, com cerca de 300 mil toneladas de frutos (IBGE, 2017INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Base de dados SIDRA. Rio de Janeiro, 2017. Disponível em: http://www.sidra.ibge.gov.br/. Acesso em: 13 maio 2018.
http://www.sidra.ibge.gov.br/...
). Apesar da previsão da produção de agrocombustível, a oleaginosa no país é predominantemente direcionada à indústria alimentícia e farmacêutica.

O registro da produção de dendê tem como referência principal o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), única fonte nacional que comporta uma série histórica de 27 anos (1988 a 2015), e permite visualizar a área plantada, a produção e os municípios envolvidos. Para fins analíticos, demarcamos três fases emblemáticas na expansão da dendeicultura no Pará (Quadro 1).

Quadro 1
Fases de expansão da dendeicultura no Pará.

A mesorregião do nordeste paraense concentra 95% da produção do estado, enquanto a região metropolitana de Belém detém apenas 5% da produção (Oliveira Júnior, 2017OLIVEIRA JÚNIOR, Moises C. Mourão de. Modelização espacial de territorialidades no estado do Pará: entre a Amazônia dos rios e das estradas. 2017. Tese (Doutorado em Geografia e Planejamento Urbano) ‒ Université Sorbonne Nouvelle, Paris, 2017.). Mesmo que discordem quanto à área plantada indicada pelo IBGE, Brandão e Schoneveld (2015)BRANDÃO, Frederico; SCHONEVELD, George. The state of oil palm development in the Brazilian Amazon: trends, value chain dynamics, and business models. Bogor: CIFOR, 2015. (Working Paper, 198). indicam o mesmo número de municípios e afirmam que cerca de 85% do total no sistema de plantation pertencem a nove agroindústrias e que o equivalente a 15% corresponde a cerca de 1.124 estabelecimentos familiares na condição de integração para o cultivo de até dez hectares de dendê, contando com a força de trabalho do grupo doméstico e a contratação ocasional de trabalhadores. Os cultivos, juntamente com as plantas de processamento do dendê, geram cerca de 20 mil empregos diretos (ABRAPALMA, 2014ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PRODUTORES DE ÓLEO DE PALMA (ABRAPALMA). Planilha de mapeamento da palma de óleo no Brasil. Belém, 2014. Não paginado.).

Na fase de expansão, diferentes iniciativas de políticas públicas foram instituídas para consolidar regiões produtoras de matérias-primas, entre as quais, dendê, mamona e pinhão manso para agrocombustíveis. Têm destaque o Programa Nacional de Produção de Biocombustível (PNPB), o Programa de Produção Sustentável de Palma de Óleo (PSOP) e o Zoneamento Agroecológico (ZAE-PALMA), bastante analisados na literatura quanto às suas efetividades, cuja exceção para o estado do Pará se evidencia pela baixa adesão ao Selo Combustível Social7 7 Selo Combustível Social (SCS) é um distintivo que assegura a quem o possui, desde que atenda a certas regras, o diferencial de promotor da inclusão social, porque prevê a recepção de matéria-prima produzida pelos agricultores familiares que, mediante contrato de integração, receberiam apoio técnico e creditício para o aumento de renda, sem comprometimento da segurança alimentar. O modelo persiste até 2018. Entretanto, estudos mostram que a adesão ao selo não foi como prevista quanto ao número de agricultores familiares envolvidos (Pires, 2015). A obtenção do SCS oferece vantagens financeiras e operacionais às empresas certificadas, desde que atendam aos critérios legais, em especial aqueles concernentes à aquisição de 15% da produção advinda da agricultura familiar. , mecanismo que prevê incentivos aos grupos empresariais.

No âmbito das políticas públicas, os argumentos oficiais apontam para a diversificação da matriz energética, a redução da dependência brasileira de importação de combustíveis fósseis e a questão ambiental, com o apelo a “[...] projetos ecologicamente sustentáveis e de desenvolvimento em áreas já antropizadas [...]” (Backhouse, 2013BACKHOUSE, Maria. A desapropriação sustentável da Amazônia: o caso dos investimentos em dendê no Pará. Berlin: Freie Universität Berlin, 2013. (Fair Fuels? Working Paper, n. 6)., p. 6). Ademais, objetivava-se a implementação de um modelo inovador, com o suporte do Estado e o envolvimento de empresas, sindicatos e agricultores familiares no setor de biodiesel brasileiro (Abramovay; Magalhães, 2007ABRAMOVAY, Ricardo; MAGALHÃES, Reginaldo. O acesso dos agricultores familiares aos mercados do biodiesel: parcerias entre grandes empresas e movimentos sociais. In: CONFERÊNCIA DA ASSOCIAÇÃO INTERNACIONAL DE ECONOMIA ALIMENTAR E AGROINDUSTRIAL, 2., 2007. Londrina. Anais [...]. Londrina: Alea, 2007. Disponível em: http://downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto_06_2007.pdf. Acesso em: 19 dez. 2018.
http://downloads.fipe.org.br/content/dow...
), cujos resultados têm sido aquém do previsto, tanto quantitativamente quanto relativos ao envolvimento equitativo dos diferentes atores (Gomes, D., 2018GOMES, Lucinaldo Soares; MAGALHÃES, Sônia Barbosa. Agricultores integrados do dendê e questões relativas ao sistema de produção no PA, Terra Nova. EcoDebate, Rio de Janeiro, 30 maio 2016. Disponível em: https://www.ecodebate.com.br/2016/05/30/agricultores-integrados-do-dende-e-questoes-relativas-ao-sistema-de-producao-no-pa-terra-nova-por-lucinaldo-soares-gomes-e-sonia-barbosa-magalhaes/. Acesso em: 31 jan. 2017.
https://www.ecodebate.com.br/2016/05/30/...
; Pires, 2015PIRES, Vívian Beatriz Lopes. Impacto social do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB) no Nordeste: 2008/2013. 2015. Dissertação (Mestrado em Agronegócio) – Universidade de Brasília, Brasília, 2015.).

Para além das iniciativas federais citadas, registram-se ações de apoio à consolidação da dendeicultura localmente, quer seja na escala estadual quer seja na municipal. Entre essas, destaque-se a Frente Parlamentar da Palma (FPP), na Assembleia Estadual do Pará, a partir de 2017. Trata-se de uma iniciativa frequente no parlamento brasileiro nos últimos anos e, em tese, anunciada como suprapartidária e não ideológica. Na prática, Coradini (2010, p. 241) afirma que “[...] ocorre uma forte associação entre a distribuição dos deputados na participação em frentes parlamentares e os alinhamentos políticos e a filiação partidária”. Constata, ainda, que a participação dos parlamentares depende “[...] diretamente das relações com os grupos de interesse e com as condições e a posição no espaço social” (Coradini, 2010CORADINI, Odaci Luiz. Frentes parlamentares, representação de interesses e alinhamentos políticos. Revista Sociologia e Política, Curitiba, v. 18, n. 36, p. 241-256, jun. 2010., p. 254-255). No caso da dendeicultura, a relação da FPP com o grupo de interesse (empresários da dendeicultura) evidencia-se na matéria:

A FPP foi criada [...] objetivando valorizar a cultura da palma como atividade essencial para o desenvolvimento socioeconômico do Pará e melhorar a qualidade de vida da população local. Entre seus objetivos está a promoção de parcerias entre o poder público e a iniciativa privada, com vistas a desenvolver ações conjuntas voltadas ao desenvolvimento sustentável.

(ABRAPALMA, 2017ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PRODUTORES DE ÓLEO DE PALMA (ABRAPALMA). Frente parlamentar da palma discute infraestrutura. Belém, 2017. (Relatório de atividades)., p. 3).

Coexistem iniciativas de prefeituras municipais para dar suporte à dendeicultura. Em 2002, a prefeitura de Moju, em parceria com uma empresa e outras instituições, realizou a seleção de agricultores em projeto pioneiro, entre outras responsabilidades (Cruz, 2006CRUZ, Benedito Ely Valente da. Territorialização e organização espacial do Grupo Agropalma. 2006. Dissertação (Mestrado em Geografia) ‒ Universidade Federal do Pará, Belém, 2006.). Em janeiro de 2011, a prefeitura de São Domingos do Capim firmou um convênio de cooperação técnica com a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER), com a finalidade de fortalecer a execução das atividades de assistência técnica para cerca de 800 agricultores familiares, para os quais se estimava a integração ao PNPB (Gomes, L.; Magalhães, 2016GOMES, Lucinaldo Soares; MAGALHÃES, Sônia Barbosa. Agricultores integrados do dendê e questões relativas ao sistema de produção no PA, Terra Nova. EcoDebate, Rio de Janeiro, 30 maio 2016. Disponível em: https://www.ecodebate.com.br/2016/05/30/agricultores-integrados-do-dende-e-questoes-relativas-ao-sistema-de-producao-no-pa-terra-nova-por-lucinaldo-soares-gomes-e-sonia-barbosa-magalhaes/. Acesso em: 31 jan. 2017.
https://www.ecodebate.com.br/2016/05/30/...
). A prefeitura de Irituia realizou a divulgação das vantagens da dendeicultura, muito embora segmentos da igreja católica tenham feito um trabalho sistemático de oposição, inclusive durante os sermões de padres nas missas. Mais recentemente, em 2017, a prefeitura de Garrafão do Norte apoiou uma das empresas, com a disponibilização de máquinas para a terraplanagem do terreno onde será construída uma indústria processadora, grande esperança da população local quanto à geração de empregos (Gomes, D., 2018GOMES, Dérick Lima. Os limites da inclusão social: agricultores integrados às agroindústrias de dendê no Pará. 2018. Dissertação (Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável) – Universidade Federal do Pará, Belém, 2018.).

Apesar das variadas formas de incentivo, os dados mostram a existência de um arrefecimento da expansão da dendeicultura a partir de 2015, em decorrência da “Instabilidade política, condições econômicas e de mercado desfavoráveis e ineficiência das políticas de biocombustíveis [...]” (Brandão et al., 2018BRANDÃO, Frederico; SCHONEVELD, George; PACHECO, Pablo. Integração da agricultura familiar à cadeia da palma de óleo na Amazônia Brasileira: análise e recomendações. Infobrief, Bogor, n. 207, p. 1-6, mar. 2018. DOI: https://doi.org/10.17528/cifor/006849.
https://doi.org/10.17528/cifor/006849...
, p. 3).

SOBRE O TRABALHO NO ESPAÇO RURAL

O debate acadêmico tem ressaltado o aumento do número de arranjos entre tipos e tempos de trabalho em diferentes sociedades (Cousins; Tang, 2004COUSINS, Christine R.; TANG, Ning. Working time and work and family conflict in the Netherlands, Sweden and the UK. Work, Employment and Society, Belmont, v. 18, n. 3, p. 531-549, Sept. 2004. DOI: https://doi.org/10.1177/0950017004045549.
https://doi.org/10.1177/0950017004045549...
; De la Garza, 2013DE LA GARZA, Enrique. Trabajo no clássico y flexibilidad. Caderno CRH, Salvador, v. 26, n. 68, p. 315-330, maio/ago. 2013. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-49792013000200007.
https://doi.org/10.1590/S0103-4979201300...
; Gindling; Newhouse, 2014GINDLING, Thomas (Tim); NEWHOUSE, David. Self-employment in the developing world. World Development, Michigan, v. 56, p. 313–331, Apr. 2014. DOI: https://doi.org/10.1016/j.worlddev.2013.03.003.
https://doi.org/10.1016/j.worlddev.2013....
). Tal constatação aplica-se para além do trabalho assalariado urbano, sendo também válida para grupos sociais que têm no trabalho familiar e no acesso aos recursos naturais (terra, floresta, mar etc.) a base de sua reprodução social, atuando como extrativistas e agricultores familiares no espaço rural na Amazônia brasileira (Alves, 2011ALVES, Ketiane dos Santos. Organização do trabalho de famílias agricultoras na comunidade Nossa Senhora de Lourdes, microrregião do Guamá no nordeste paraense. 2011. Dissertação (Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável) – Núcleo de Ciências Agrárias e Desenvolvimento Rural, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária-Amazônia Oriental, Universidade Federal do Pará, Belém, 2011.; Moreira; Hébette, 2009MOREIRA, Edma do Socorro Silva; HÉBETTE, Jean. Metamorfoses de um campesinato nos Baixo Amazonas e Baixo Xingu paraenses. In: GODOI, Emilia Pietrafesa de; MENEZES, Marilda Aparecida de; MARIN, Rosa Acevedo (org.). Diversidade do campesinato: expressões e categorias. São Paulo: Editora Unesp; Brasília: Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural, 2009. p. 187-206.). Não obstante, a literatura sobre o trabalho é rara nessa região e, quando disponível, é focada na questão salarial ou econômica, em coerência com a teoria clássica (Castro, 1998CASTRO, Edna. Tradição e modernidade: a propósito de formas de trabalho na Amazônia. Novos Cadernos NAEA, Belém, v. 2, n. 1, p. 1-22, jul. 1998. DOI: http://dx.doi.org/10.5801/ncn.v2i1.200. (Papers do Naea, n. 97).
https://doi.org/10.5801/ncn.v2i1.200...
).

No Pará, iniciativas de especialização da agricultura têm se constituído em um desafio quanto à compreensão de novos processos de trabalho instituídos na produção de dendê, que implicam arranjos envolvendo o trabalho familiar e o assalariado (regular e ocasional) para a produção especializada de uma commodity vinculada a mercados globais, sob argumentos ambientais.

Inspirados em Neves (1981)NEVES, Delma Pessanha. Lavradores e pequenos produtores de cana: estudo das formas de subordinação dos pequenos produtores agrícolas ao capital. Rio de Janeiro: Zahar, 1981. (Coleção Agricultura e Sociedade)., compreendemos o trabalho familiar como o domínio e o exercício de práticas e saberes para a obtenção do necessário à reprodução da força de trabalho da família. Para além dos propósitos de produção, atributos de socialização são conferidos ao trabalho familiar, pela possibilidade do aprendizado de um ofício e de códigos morais e de hierarquias por parte dos membros da família. Na unidade de produção familiar, a organização do trabalho é amparada em relações de gênero e de geração, e põe em prática funcionamentos e movimentos particulares em sintonia com o ciclo de desenvolvimento do grupo doméstico e com o uso e a destinação do produto final, influenciados também pelas formas de subordinação externas.

O debate acadêmico sobre o trabalho familiar pode ser visto segundo diferentes perspectivas. De modo geral, em uma primeira perspectiva, há consenso sobre a importância da divisão sexual do trabalho no estabelecimento familiar, no qual a atividade é realizada pelos membros da família de acordo com as diferenças de sexo, de idade e de geração. Estudiosos destacam que os membros da família trabalham para a satisfação de suas necessidades, apresentando, no entanto, especificidades quanto ao que realizam, porque nem todos os membros realizam tudo. ‘Grosso modo’, o homem é considerado o responsável pelas decisões tomadas na esfera da produção, enquanto a mulher é a responsável pela esfera do consumo.

Essa forma particular da divisão social do trabalho tem dois princípios organizadores: o princípio de separação (existem trabalhos de homens e trabalhos de mulheres) e o princípio hierárquico (um trabalho de homem “vale” mais que um trabalho de mulher). Esses princípios são válidos para todas as sociedades conhecidas, no tempo e no espaço.

(Hirata; Kergoat, 2007HIRATA, Helena; KERGOAT, Danièle. Novas configurações da divisão sexual do trabalho. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 37, n. 132, p. 595-609, set./dez. 2007. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-15742007000300005.
https://doi.org/10.1590/S0100-1574200700...
, p. 599).

O trabalho, além de fornecer bens materiais, permite o exercício de hierarquias e a formação para a vida adulta (Garcia Júnior, 1983GARCIA JÚNIOR, Afrânio Raul. Terra de trabalho: trabalho familiar de pequenos produtores. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.; Brumer et al., 1993BRUMER, Anita; DUQUE, Ghislaine; LOURENÇO, Fernando Antonio; WANDERLEY, Maria de Nazareth Baudel. A exploração familiar no Brasil. In: LAMARCHE, Hugues (coord.). A agricultura familiar: comparação internacional: uma realidade multiforme. Campinas: UNICAMP, 1993. v. 1, p. 179-234.; Lamarche, 1998LAMARCHE, Hugues (coord.). Agricultura familiar: comparação internacional: do mito à realidade. Campinas: UNICAMP, 1998. v. 2.; Woortmann, E.; Woortmann, K., 1997WOORTMANN, Ellen F.; WOORTMANN, Klaas. O trabalho da terra: a lógica e a simbólica da lavoura camponesa. Brasília: Ed. da UnB, 1997.).

Em uma segunda perspectiva, Brumer et al. (1993)BRUMER, Anita; DUQUE, Ghislaine; LOURENÇO, Fernando Antonio; WANDERLEY, Maria de Nazareth Baudel. A exploração familiar no Brasil. In: LAMARCHE, Hugues (coord.). A agricultura familiar: comparação internacional: uma realidade multiforme. Campinas: UNICAMP, 1993. v. 1, p. 179-234. afirmam que a organização do trabalho familiar depende da quantidade de atividades existentes no estabelecimento e do espaço em que estão localizadas. Os autores argumentam que homens e mulheres trabalham, mas reconhecem que os lugares de trabalho se diferenciam segundo o gênero, sendo os negócios na esfera pública atribuídos aos homens. Em contraste, análises tratam da dupla jornada das mulheres.

Estudos diversos referem-se à intersecção entre trabalho familiar e assalariado (Cavalcanti; Bendine, 2014CAVALCANTI, Josefa Salete Barbosa; BENDINI, Mónica Isabel. Globalization and change in labor relations in fruit regions of Brazil and Argentina. Research in Rural Sociology and Development, Bingley, v. 20, p. 3-32, July 2014. DOI: http://dx.doi.org/10.1108/S1057-1922_2014_0000020001.
https://doi.org/10.1108/S1057-1922_2014_...
; Sampaio, 2014SAMPAIO, Irã Carvalho. A agricultura familiar e a agroindústria do dendê no município de Tomé-Açu (PA): efeitos da agricultura por contrato na produção e no trabalho familiar. 2014. Dissertação (Mestrado em Sociologia e Antropologia) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Pará, Belém, 2014.; Menezes, 2017MENEZES, Marilda Aparecida de. Agricultores expropriados: terra, migrações e trabalho. In: DELGADO, Guilherme Costa; BERGAMASCO, Sonia Maria Pessoa Pereira (org.). Agricultura familiar brasileira: desafios e perspectivas de futuro. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário, 2017. p. 418-433.), porque o trabalho familiar nem sempre supre as demandas, sendo necessário recorrer-se a trabalhadores temporários, do mesmo modo que há assalariamento de membros da família fora dos estabelecimentos. Lamarche (1998)LAMARCHE, Hugues (coord.). Agricultura familiar: comparação internacional: do mito à realidade. Campinas: UNICAMP, 1998. v. 2. chama a atenção para a intensidade da utilização das diferentes frações de mão de obra, tanto na unidade de produção quanto fora dela. Segundo este autor, “As estratégias familiares em torno da organização do trabalho fazem parte, sem dúvida, das dimensões mais importantes que orientam a vida das unidades de produção familiares” (Lamarche, 1998LAMARCHE, Hugues (coord.). Agricultura familiar: comparação internacional: do mito à realidade. Campinas: UNICAMP, 1998. v. 2., p. 169). As relações de trabalho assalariado dentro e fora dos estabelecimentos familiares dão-se, muitas vezes, entre trabalhadores que não são expropriados dos meios de produção, mas buscam complementação de rendimentos para a sobrevivência e outros fins.

Por trabalho assalariado8 8 Também denominado de ‘contratado’, para tratar de situações concretas. , compreendemos as relações que se estabelecem entre um empregado e um empregador para a produção de bens e de serviços, legalizadas ou não, com tempo variável e remuneração segundo acordos preestabelecidos, constantes ou não nos marcos regulatórios nacionais. Reconhecemos que qualquer conceito que seja atribuído ao trabalho assalariado tem limites para abarcar o conteúdo do trabalho permanentemente em transformação.

Em se tratando especificamente do trabalho na produção de dendê, na escala internacional, estudos têm sido realizados predominantemente na Indonésia e na Malásia, líderes desse tipo de produção no mundo. Na Indonésia, em estudo sobre trabalho na plantation, Li (2014)LI, Tania Murray. The gendered dynamics of Indonesia’s Oil Palm labour regime. Singapore: Asia Research Institute, 2014. (Working Paper Series, n. 225). chamou a atenção para a preferência pela contratação de homens em empregos ocasionais. Em diferentes partes do mundo, evidenciam-se processos de ‘masculinização’ da força de trabalho, em decorrência da facilidade de migração e da preferência por homens jovens para o assalariamento, como se observa na Indonésia, na Malásia e em Moçambique (Arndt et al., 2011ARNDT, Channing; BENFICA, Rui; THURLOW, James. Gender implications of biofuels expansion in Africa: the case of Mozambique. World Development, Michigan, v. 39, n. 9, p. 1649-1662, Sept. 2011. DOI: https://doi.org/10.1016/j.worlddev.2011.02.012.
https://doi.org/10.1016/j.worlddev.2011....
; Julia; White, 2012JULIA; WHITE, Ben. Gendered experiences of dispossession: oil palm expansion in a Dayak Hibun community in West Kalimantan. The Journal of Peasant Studies, Abingdon-on-Thames, v. 39, n. 3-4, p. 995-1016, July/Oct. 2012. DOI: https://doi.org/10.1080/03066150.2012.676544.
https://doi.org/10.1080/03066150.2012.67...
; Li, 2014LI, Tania Murray. The gendered dynamics of Indonesia’s Oil Palm labour regime. Singapore: Asia Research Institute, 2014. (Working Paper Series, n. 225).). Uma das consequências mais visíveis é a ‘feminização’ da agricultura de alimentos, porque as mulheres permanecem nos lugares de residência (Norwana et al., 2011NORWANA, Awang Ali Bema Dayang; KUNJAPPAN, Rejani; CHIN, Melissa; SCHONEVELD, George; POTTER, Lesley; ANDRIANI, Rubeta. The local impacts of oil palm expansion in Malaysia: an assessment based on a case study in Sabah State. Bogor: CIFOR, 2011. (Working Paper, n. 78).).

Mais recentemente, enfocando os impactos sociais da produção de dendê na Indonésia, Li (2015)LI, Tania Murray. Social impacts of oil palm in Indonesia: a gendered perspective from West Kalimantan. Bogor: CIFOR, 2015. (Occasional paper, n. 124). privilegiou o trabalho familiar na sua análise, chamando a atenção para o trabalho conjunto de casais nas suas pequenas parcelas (próprias ou arrendadas). A autora identificou que as mulheres estavam ativamente envolvidas na gestão do dendê e os homens, na colheita, uma tarefa considerada extenuante para elas. Em consequência, contratam trabalhadores e desenvolvem sistemas de ajuda mútua.

No Pará, estudos têm tratado secundariamente do trabalho, confirmando uma tendência mundial. Três fenômenos marcam as análises: i) as transformações no trabalho familiar; ii) a intersecção entre trabalhos familiar e assalariado; iii) a masculinização da força de trabalho, tanto em estabelecimentos familiares com contrato de produção de dendê quanto nos empresariais.

Em estudo recente, Mota et al. (2015)MOTA, Dalva Maria da; SILVA, Edfranklin Moreira da; SCHMITZ, Heribert; ALVES, Lívia Navegantes; FERREIRA, Maria do Socorro Gonçalves. Produção de culturas alimentares e dendê nos estabelecimentos familiares no nordeste paraense. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL DA AMÉRICA LATINA: POLÍTICA E CONFLITOS CONTEMPORÂNEOS, 2015, Belém. Anais [...]. Belém: GETTAM: NAEA: UFPA, 2015. p. 119-125. constataram que as famílias que cultivam dendê por meio de contrato de integração dedicam-se preferencialmente a essa cultura por causa dos compromissos legais, e que os homens predominam no trabalho. Tal iniciativa é uma ruptura com o padrão tradicional de envolvimento de toda a família, e os principais argumentos são o peso do trabalho, a interdição das crianças9 9 Interdição difundida no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e controlada pelas empresas que assinaram o contrato, em conformidade com as diretrizes sobre o trabalho decente dadas pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). e a mudança recente dos procedimentos técnicos, dominados por poucos membros da família (pai e filhos mais velhos). Os autores apontam que já não se cultivavam culturas anuais em 24% dos estabelecimentos. Consequentemente, há transformação no padrão de organização do trabalho, com a tendência de permanência das mulheres e das crianças no domicílio, muito embora elas sejam titulares de 20% dos contratos para a produção de dendê, e apenas 10% façam a gestão do plantio (Nascimento, 2017NASCIMENTO, Diocélia Antônia Soares do. Trabalho e autonomia em campo de domínio masculino: mulheres que têm contratos de produção com agroindústrias de dendê em São Domingos do Capim-PA. 2017. Dissertação (Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável) - Universidade Federal do Pará, Belém, 2017.).

Na maioria dos estabelecimentos familiares em que culturas anuais persistem, a força de trabalho necessária ao seu cultivo é principalmente familiar (Vieira, 2015VIEIRA, Ana Carolina C. A integração camponesa ao monocultivo de dendê: subordinação e transformação do campesinato amazônico. 2015. Dissertação (Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável) – Universidade Federal do Pará, Belém, 2015.). Constatação diferente foi feita por Sampaio (2014)SAMPAIO, Irã Carvalho. A agricultura familiar e a agroindústria do dendê no município de Tomé-Açu (PA): efeitos da agricultura por contrato na produção e no trabalho familiar. 2014. Dissertação (Mestrado em Sociologia e Antropologia) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Pará, Belém, 2014., que identificou a tendência do aumento do uso e da demanda por trabalhadores temporários em todos os estabelecimentos com culturas do dendê e alimentares. A realização de todos os tratos culturais, no momento adequado, exige mão de obra suficiente do agricultor familiar; dada a pouca disponibilidade existente na família, os tratos culturais no dendê atrasam, o que se reflete na produção da planta. A predominância do trabalho da família ou a sua intersecção com trabalhadores contratados depende da área cultivada e do ciclo de reprodução do grupo doméstico, entre outras influências.

A preponderância do trabalho de homens – sob argumentos relacionados à força física, a exigências técnicas do dendê e à capacidade para lidar com agentes bancários e da agroindústria – é uma unanimidade entre os autores.

DIFERENCIAÇÃO DA AGRICULTURA FAMILIAR E TENDÊNCIA PARA MAIS CULTURAS PERENES

Nas primeiras décadas após a sua fundação, a organização do trabalho na vila Água Azul, como em outras localidades do nordeste paraense, esteve tradicionalmente vinculada à disponibilidade de recursos naturais, que possibilitaram o extrativismo e a agricultura no sistema de ‘corte e queima’. A partir da década de 1970, as atividades foram estruturadas em torno das culturas de ciclo anual (mandioca, feijão, milho e arroz), que compunham a base do sistema de produção familiar, em associação com o extrativismo animal (caça) e vegetal (látex da maçaranduba, conhecido como balata). Um marco na história do grupo foi o contato com os japoneses10 10 Tomé-Açu tem uma importante colônia de japoneses, constituída por imigrantes que começaram a chegar a partir dos anos 20 do século XX, os quais se dedicaram à agricultura e ao cooperativismo, conformando uma das economias mais dinâmicas do Pará. ali residentes e especializados no cultivo de pimenta-do-reino e de frutíferas.

As atividades eram desenvolvidas em regime familiar, segundo uma divisão do trabalho amparada nos critérios referentes a sexo e a idade. O extrativismo, entretanto, era realizado exclusivamente por adultos homens, e os nordestinos recém-chegados aprendiam o processo com os paraenses. O látex era comercializado localmente e destinava-se ao mercado internacional, alimentado pelo sistema de aviamento até os anos 1970 (Carvalho, 2013CARVALHO, Luciana Gonçalves de. Relações de trabalho nos balatais do Pará. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, v. 19, n. 39, p. 373-400, jan./jun. 2013. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-71832013000100015. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-71832013000100015&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 28 jul. 2016.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
).

No período de 2014 a 2015, a principal atividade econômica da vila centrava-se na agricultura, em estabelecimentos familiares. Porém, o foco mudou de culturas anuais para perenes (frutíferas, pimenta-do-reino e dendê). A mudança deveu-se à impossibilidade de continuação do sistema de ‘corte e queima’, em razão do crescimento demográfico, da inexistência de áreas de mata, da diminuição da área disponível para o pousio e da redução do tempo desse sistema, com a consequente redução da fertilidade do solo (Hurtienne, 2005HURTIENNE, Thomas Peter. Agricultura familiar e desenvolvimento rural sustentável na Amazônia. Novos Cadernos do NAEA, Belém, v. 8, n. 1, p. 19-71, jun. 2005.). Segundo relato de um agricultor entrevistado:

Quando nós chegamos, nós trabalhávamos para os outros, aí depois que casei comprei esse lote dos japoneses, trabalhava antes com pimenta, arroz, mandioca, cupuaçu, de tudo eu plantava um pouco, mas agora com a idade e com a saída dos filhos, estou só na pimenta, nas frutas e no dendê, a terra também não está mais boa pro arroz.

(A. S. L., 65 anos, agricultor).

A situação da produção agrícola de cada uma das famílias nos seus estabelecimentos pode ser visualizada na Figura 2.

Figura 2
Cultivos realizados nos estabelecimentos por famílias na vila Água Azul, Tomé-Açu, no estado do Pará. Gráfico elaborado pelos autores a partir de pesquisa de campo realizada em 2017.

As maiores áreas cultivadas concentram-se nas quatro primeiras famílias e coincidem com aquelas que produzem dendê, pois dispor de área é uma das condições para ter acesso aos contratos. Não obstante, a maior diversidade e o maior equilíbrio entre os diferentes cultivos encontram-se nas últimas quatro famílias, caracterizadas como aquelas que não têm relação com a dendeicultura. As demais possuem as menores áreas e a menor variedade de cultivos.

Para além da agricultura, ocorrem assalariamentos nos serviços públicos e privados na vila Água Azul, para atender às demandas dos recém-chegados, atraídos pelas possibilidades de emprego nos monocultivos localizados nas proximidades da sede da vila. Em consequência, registramos em torno de 90 jovens migrantes, atraídos pela possibilidade de assalariamento nas agroindústrias de dendê em Tomé-Açu e nos municípios de Moju e Tailândia.

FAMÍLIAS QUE TÊM CONTRATO DE INTEGRAÇÃO COM AS AGROINDÚSTRIAS PARA A PRODUÇÃO DE DENDÊ

A agricultura por contrato ou sob a condição de integração é uma nova modalidade no universo de relações econômicas de quatro famílias em Água Azul. Os contratos de integração são firmados por um dos membros da família. Por meio deles, uma área do estabelecimento é destinada ao cultivo de dendê, sob a assistência técnica da empresa contratante, para crédito e venda para a agroindústria. Os recursos que viabilizam a produção são oriundos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), referentes ao PRONAF Eco Dendê.

No estado do Pará, em 80% dos casos, os contratos são formalizados pelos homens, e os demais, por outros membros da família (Banco da Amazônia, 2015BANCO DA AMAZÔNIA. Diretoria Comercial e de Distribuição. Gerência de Microfinanças e Agricultura Familiar. Coordenadoria de Agricultura Familiar. Sistema de Relatórios. Belém, 2015. Não publicado.). Em Água Azul, dos quatro contratos firmados, dois estão em nome de filhos, um em nome de uma filha e apenas um em nome do pai. A descentralização do financiamento é fruto de uma estratégia familiar, para que simultâneos créditos possam ser obtidos, uma vez que essas famílias possuem, no universo investigado, áreas de terra maiores do que as demais, por pertencerem a famílias fundadoras da vila.

A decisão para firmar um contrato de integração ampara-se na compreensão de que ele proporcionará a participação regular em cadeias comerciais (compra garantida, crédito, assistência técnica) e, assim, aumentará a renda familiar. O dendê, segundo informam os entrevistados, é uma cultura a mais no processo de substituição de culturas alimentares por cultivos perenes em sistemas de produção diversificados, que diminuem a vulnerabilidade. Tal iniciativa denota mudanças importantes tanto do itinerário técnico nas operações agrícolas nos estabelecimentos, ditadas pelo calendário agrícola do dendê e das espécies perenes, como em relação ao uso de maquinários e de herbicidas para o controle de plantas invasoras. A opção por tais práticas está relacionada também com à estratégia dos agricultores em minimizar a necessidade de uso da mão de obra familiar, visto que esta, com o passar dos anos, se reconfigura em outros afazeres, diminuindo a sua disponibilidade. Sem contar que o tamanho das áreas e a densidade populacional já não permitem longos períodos de pousio e, com isso, a agricultura de ‘corte e queima’ fica impossibilitada “[...] de ser manejada de forma ecologicamente sustentável, sem comprometer drasticamente a fertilidade dos solos” (Pedroso Júnior et al., 2008PEDROSO JÚNIOR, Nelson Novaes; MURRIETA, Rui Sergio Sereni; ADAMS, Cristina. A agricultura de corte e queima: um sistema em transformação. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, Belém, v. 3, n. 2, p. 153-174, maio/ago. 2008. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1981-81222008000200003.
https://doi.org/10.1590/S1981-8122200800...
, p. 156).

As quatro famílias que constituem este grupo residem na vila Água Azul. Duas delas têm sete membros, e as outras duas têm quatro e dois membros, respectivamente, totalizando 20 pessoas. Registra-se apenas um jovem, com menos de 20 anos, além de ser assinalada a ausência de crianças. Os demais têm entre 26 e 88 anos, com predominância de pessoas com 50 anos (seis pessoas) e 20 anos (quatro pessoas). Quanto ao ciclo de desenvolvimento, todas as famílias encontram-se na fase de dispersão ou de cisão. Segundo Fortes (2011, p. 11)FORTES, Meyer. O ciclo de desenvolvimento do grupo doméstico. Tradução Alcida Rita Ramos. Brasília: UNB, 2011. (Série Tradução, v. 1). Título original: The Developmental Cycle in Domestic Groups., “Esta [fase] começa com o casamento do filho mais velho e continua até todos os filhos se casarem [...]”.

Os estabelecimentos têm áreas que variam entre 20 e 54 hectares, nas quais são cultivados os produtos especificados na Figura 2. Como mostram os dados, duas famílias (50% do grupo) já não têm culturas anuais porque, segundo explicam, implicam muito trabalho e são pouco rentáveis. A decisão tem relação não com o tamanho da área de terra, mas com a estratégia familiar. Segundo a literatura, em diversas experiências de integração que, consequentemente, implicam especialização da produção, há tendência de diminuição dos cultivos tradicionais, conforme analisado entre produtores de cana, no estado do Rio de Janeiro (Neves, 1981NEVES, Delma Pessanha. Lavradores e pequenos produtores de cana: estudo das formas de subordinação dos pequenos produtores agrícolas ao capital. Rio de Janeiro: Zahar, 1981. (Coleção Agricultura e Sociedade).).

No Pará, estudos recentes sobre a produção de dendê indicam o seu impacto direto na produção de alimentos (Homma; Vieira, 2012HOMMA, Alfredo Kingo Oyama; VIEIRA, Ima Célia Guimarães. Colóquio sobre dendezeiro: prioridades de pesquisas econômicas, sociais e ambientais na Amazônia. Amazônia: Ciência & Desenvolvimento, Belém, v. 8, n. 15, p. 79-90, jul./dez. 2012.; Nahum, 2014NAHUM, João Santos (org.). Dendeicultura e dinâmicas territoriais do espaço agrário na Amazônia paraense. Belém: GAPTA: UFPA, 2014.; Rapiau, 2013RAPIAU, Julien. La culture du palmier à huile, facteur de transformation des systèmes agricoles famíliaux en Amazonie orientale. 2013. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Rural Sustentável) - Institut Supérieur d’Agriculture et d’Agroalimentaire Rhone-Alpes, Lyon, 2013.; Ribeiro, 2016RIBEIRO, Laiane Bezerra. O trabalho sob influência da dendeicultura em vilas rurais paraenses. 2016. Dissertação (Mestrado em Agriculturas Amazônicas) – Universidade Federal do Pará, Belém, 2016.; Sampaio, 2014SAMPAIO, Irã Carvalho. A agricultura familiar e a agroindústria do dendê no município de Tomé-Açu (PA): efeitos da agricultura por contrato na produção e no trabalho familiar. 2014. Dissertação (Mestrado em Sociologia e Antropologia) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Pará, Belém, 2014.; Timone-Martinez, 2013TIMONE-MARTINEZ, Eva. La culture du palmier à huile en région amazonienne: entre acceptation, résignation et résistance. 2013. Dissertação (Mestrado em Meio Ambiente, Desenvolvimento, Territórios e Sociedades) – AgroParisTech, Paris, 2013.; Vieira, 2015VIEIRA, Ana Carolina C. A integração camponesa ao monocultivo de dendê: subordinação e transformação do campesinato amazônico. 2015. Dissertação (Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável) – Universidade Federal do Pará, Belém, 2015.; Vieira; Magalhães, 2013VIEIRA, Ana Carolina C.; MAGALHÃES, Sônia Barbosa. Transformações no espaço rural amazônico: o plantio de dendê em comunidades camponesas do Baixo Tocantins, município de Moju/PA. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL RURALIDADES, TRABALHO E MEIO AMBIENTE, 2., 2013, São Carlos. Anais [...]. São Carlos: UFSCar, 2013. p. 79-99.).

Das culturas plantadas por essas famílias, a que mais se destaca em área plantada é o dendê, com média de 22 hectares por família. Mesmo assim, a dendeicultura faz parte de um sistema diversificado, no qual a pimenta-do-reino e frutíferas são suporte para uma economia menos vulnerável às oscilações de preço.

Comparativamente, predomina a capina mecanizada nas áreas com dendê, em contraste com o trabalho manual nas demais. O crédito e o tamanho das áreas são determinantes para tal procedimento. Os dados relativos ao trabalho sistemático e aos cultivos realizados nos estabelecimentos podem ser observados na Figura 3.

Figura 3
Dados referentes à realização do trabalho nos estabelecimentos que têm titular de contrato de integração na vila Água Azul, Tomé-Açu, no estado do Pará. Gráfico elaborado pelos autores a partir de pesquisa de campo realizada em 2017.

Para a realização do trabalho, 50% dos membros da família trabalham somente no estabelecimento, e diversos arranjos são instituídos, havendo sete diferentes possibilidades. Em ordem de frequência, prevalece o trabalho do pai, seguido do pai/diarista, do filho/diarista e do diarista, o que mostra a participação de membros da família no controle do trabalho. Há maior dependência de trabalho assalariado para a pimenta-do-reino e frutíferas.

Nessas quatro famílias, apenas duas mulheres trabalham nas atividades agrícolas, particularmente no plantio e na colheita de pimenta-do-reino. Em nenhum caso foi registrado o trabalho delas na dendeicultura. Entretanto, todas as mulheres (oito) trabalham no processamento de frutas no espaço doméstico. Esse trabalho é considerado nos discursos como ‘leve’, ao qual as mulheres não atribuem o status de trabalho, muito embora os recursos advindos da sua venda sejam importantes na composição da renda familiar. Persiste o entendimento de que o trabalho é leve em função de quem o realiza. Portanto, são consideradas leves as atividades realizadas por mão de obra feminina e infantil, conforme analisado por Paulilo (1987)PAULILO, Maria Ignez S. O peso do trabalho leve. Revista Ciência Hoje, Rio de Janeiro, v. 5, n. 28, p. 64-70, jan./fev. 1987..

No que se refere ao volume de trabalho, todas as atividades agrícolas são desenvolvidas com a contratação de mão de obra, o que também foi constatado por Sampaio (2014)SAMPAIO, Irã Carvalho. A agricultura familiar e a agroindústria do dendê no município de Tomé-Açu (PA): efeitos da agricultura por contrato na produção e no trabalho familiar. 2014. Dissertação (Mestrado em Sociologia e Antropologia) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Pará, Belém, 2014., no mesmo município. No entanto, a contratação tem enfrentado dificuldades, porque os jovens preferem trabalhar como assalariados nas empresas. Dada a escassez, contratações ocorrem com maior frequência nos períodos de repouso (finais de semana) ou quando há demissionários nas empresas de dendê. Esse é um dos reflexos da reestruturação do mercado de trabalho, com a escassez ocasional de trabalhadores em certos enclaves e a maior exploração da força de trabalho.

A exclusividade da comercialização é dos homens, membros da família, o que implica o controle da produção e o manuseio dos recursos que subsidiarão o processo de reprodução social a curto e a longo prazos (Almeida, 1986ALMEIDA, Mauro William Barbosa de. Redescobrindo a família rural. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 1, n. 1, p. 66-83, 1986.). A comercialização de produtos é realizada no próprio estabelecimento para ‘atravessadores’. Os preços recebidos são inferiores aos praticados pela Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu (CAMTA), sob o argumento de que os ‘atravessadores’ pagam na hora da venda. Os compradores vêm de outras regiões, interessados nas polpas de frutas, preparadas pelas mulheres, e na pimenta-do-reino. Há também a compra da pimenta na folha11 11 A compra da pimenta na folha é tida como a venda antecipada, ou seja, antes da colheita do produto. O agricultor vende sua pimenta aos atravessadores por um preço menor, antes da colheita. , sistema no qual o comprador paga antecipadamente a produção, muito embora com preços mais baixos, em uma relação em que laços de confiança e de dependência mútua sustentam o acordo oral. Para o dendê, a integração implica a venda a uma determinada empresa que coleta os produtos em pontos previamente definidos e paga um preço determinado internacionalmente12 12 Aproximadamente, 10% do valor do óleo bruto no porto de Roterdã, Holanda. .

A organização do trabalho familiar nesses estabelecimentos sofreu mudanças em decorrência da introdução do dendê, da substituição dos cultivos anuais por perenes e da possibilidade local de assalariamento regular. As mudanças influem na predominância do trabalho de homens na agricultura e na diversificação do trabalho das mulheres (agricultura e residência). A concorrência pelo trabalho de homens jovens é recente e constitui uma das características do mercado de trabalho local, sob a influência da produção de commodity em larga escala.

FAMÍLIAS QUE POSSUEM ALGUM MEMBRO ASSALARIADO NA DENDEICULTURA

O segundo grupo também é formado por quatro famílias, que possuem quatro dos seus membros assalariados regularmente na dendeicultura. Em três famílias, os filhos homens são assalariados e, em uma, é o próprio pai.

As quatro famílias residem na vila Água Azul. Duas delas têm quatro membros e as outras duas famílias têm três, totalizando 14 pessoas. São as menores famílias no conjunto das 12 pesquisadas. Registra-se a presença de duas crianças e de cinco jovens (21 a 26 anos). Os demais têm entre 34 e 65 anos, com predominância na faixa dos 50 aos 60. Quanto à fase de desenvolvimento, três famílias encontram-se na fase de dispersão ou de cisão (Fortes, 2011FORTES, Meyer. O ciclo de desenvolvimento do grupo doméstico. Tradução Alcida Rita Ramos. Brasília: UNB, 2011. (Série Tradução, v. 1). Título original: The Developmental Cycle in Domestic Groups.) e uma, composta pelo casal e por duas crianças, na fase de expansão. Tal momento implica uma menor disponibilidade de força de trabalho.

Os estabelecimentos têm áreas que variam entre 1 e 2,3 hectares, condição que caracteriza o grupo como aquele que tem as menores áreas de terra, porque alguns chegaram mais recentemente, quando já havia maior pressão pelas terras, mas também porque as venderam ou dividiram por herança. Os cultivos que realizam podem ser observados na Figura 2.

Em razão da pequena disponibilidade de terras, apenas 20% dos membros das famílias desses estabelecimentos trabalham nas atividades agrícolas; 28% são assalariados e apenas ocasionalmente trabalham nos estabelecimentos. Registra-se, nesse grupo, a única situação em que uma mulher vende ocasionalmente sua força de trabalho na colheita local de pimenta. Os demais membros não têm ocupações na agricultura e identificam-se como doméstica, estudante e aposentado.

As inserções ocupacionais dos membros desses grupos apontam para uma maior dificuldade de reprodução social a partir do próprio estabelecimento, por condições particulares que evidenciam o menor número de pessoas por grupo doméstico, a menor disponibilidade de terra e a maior incidência de assalariamento.

No que diz respeito ao trabalho associado ao sistema de produção desenvolvido nos estabelecimentos, os dados podem ser observados na Figura 4.

Figura 4
Dados referentes à realização do trabalho nos estabelecimentos que têm assalariados na dendeicultura na vila Água Azul, Tomé-Açu, no estado do Pará. Gráfico elaborado pelos autores a partir de pesquisa de campo realizada em 2017.

As culturas limitam-se à pimenta-do-reino e a frutíferas, e os estabelecimentos são os menos diversificados entre os três grupos aqui analisados, em decorrência da pequena disponibilidade de terra e de força de trabalho. Das culturas plantadas por essas famílias, as que mais se destacam são as frutíferas, com uma média de 1 ha por família, e a pimenta, com cerca de 0,5 ha. A opção por estas culturas constitui uma iniciativa de ruptura com o sistema de ‘corte e queima’, seja pela impossibilidade de pousio seja pela indisponibilidade de força de trabalho, que resultam em mudanças no uso do solo e na relação com o mercado, uma vez que já não são mantidas culturas alimentares para o autoconsumo, entre outras transformações.

Segundo a memória oral, a área com culturas anuais, principalmente de mandioca13 13 Um dos principais produtos da dieta dos paraenses no espaço rural, a mandioca, depende de processamento para que haja a transformação em farinha. e arroz, diminuiu no decorrer dos anos, em razão da pequena disponibilidade de mão de obra e da oscilação do preço da farinha no mercado. Em compensação, culturas perenes, como o cupuaçu e o cacau, tiveram sua área aumentada pela facilidade de comercialização. Segundo um dos entrevistados: “Era muito pesado ter que trabalhar duro por meses e vender o saco do arroz ou da farinha baratinho, compensava mais o cara trabalhar assalariado e depois comprar o arroz e a farinha na venda” (A. P. C., 47 anos, agricultor e assalariado).

Para a realização do trabalho no estabelecimento, cinco diferentes arranjos são postos em prática (Figura 4). Há menor quantidade de membros da família trabalhando do que nos demais tipos, e somente 20% dedicam-se exclusivamente ao trabalho no estabelecimento. Quanto à frequência, prevalecem os diaristas, com equivalência para pai/diarista e filho/diarista, pai e filho. As mulheres estão ausentes do trabalho agrícola.

Situação díspar em relação ao próprio grupo é a de uma família com apenas três membros (um dos quais é um idoso aposentado), na qual todas as atividades, com exceção da comercialização, contam somente com um trabalhador assalariado, porque o filho trabalha regularmente como assalariado na agroindústria de dendê. A única mulher da família desenvolve atividades no setor público e divide as tarefas domésticas com o marido. Em termos de renda familiar, os recursos advêm da aposentadoria e dos salários da mãe e do filho, além da venda dos produtos agrícolas.

Nos demais casos, o trabalho familiar concentra-se no pai ou no filho, não se baseando nos dois ao mesmo tempo em nenhuma situação. Os diaristas estão em 66% das atividades, o que configura uma tendência de substituição do trabalho familiar pelo assalariado no estabelecimento. A exceção está apenas na comercialização dos produtos.

Os assalariados são predominantemente migrantes que vieram em busca de emprego e se estabeleceram em um bairro em uma das extremidades da localidade, ocupando novas residências que os moradores mais antigos construíram para alugar. Como em outras regiões do Brasil, as migrações para o trabalho são parte das estratégias de reprodução da força de trabalho. Nesse caso, entretanto, as migrações ocorrem dentro da própria região e com grupos familiares que ali se estabelecem em residências alugadas, chamadas localmente de kitnets.

Nesses estabelecimentos, a organização do trabalho familiar passa por mudanças relevantes, com dependência do trabalho assalariado em todas as suas etapas, exceto na comercialização.

FAMÍLIAS QUE NÃO TÊM RELAÇÃO DIRETA COM A DENDEICULTURA

O terceiro e último grupo estudado é formado por quatro famílias cujos membros não têm relação direta com a dendeicultura, apesar da grande expansão dessa cultura na região nos anos recentes. Entretanto, as mudanças promovidas no mercado de trabalho pela produção de uma commodity influenciam a organização do trabalho nos estabelecimentos.

As quatro famílias residem na vila Água Azul. Uma delas têm apenas dois membros, todos com mais de 54 anos. Duas são compostas por quatro pessoas, e uma tem oito, todos com idades variadas. Registra-se a presença de apenas uma criança. Há somente três jovens (com idades entre 16 e 24 anos). A maior frequência de pessoas está na faixa de 50 a 60 anos. Quanto à fase de desenvolvimento, as quatro famílias encontram-se na fase de dispersão ou de cisão, como as famílias do primeiro grupo, e três do segundo (Fortes, 2011FORTES, Meyer. O ciclo de desenvolvimento do grupo doméstico. Tradução Alcida Rita Ramos. Brasília: UNB, 2011. (Série Tradução, v. 1). Título original: The Developmental Cycle in Domestic Groups.).

A atividade principal das famílias desse grupo é a agricultura, com sistemas de produção compostos de cultivos anuais e perenes em todos os estabelecimentos, cujas áreas variam de 2,2 a 9 hectares, condição que situa o grupo em uma posição intermediária, em relação aos dois anteriores. Os dados sobre os sistemas de produção nos estabelecimentos que conformam esse tipo podem ser observados na Figura 2.

Essas famílias têm maior área de cultivos anuais (feijão, arroz, mandioca e milho), em comparação com os outros dois grupos. As culturas alimentares apresentaram uma pequena diminuição em relação ao tamanho da área plantada no passado, com exceção do arroz e da mandioca, que tiveram uma diminuição mais significativa.

Existe, nesse grupo, um equilíbrio entre os cultivos para a venda e para o consumo, e a produção de culturas anuais faz com que algumas dessas famílias contribuam para o abastecimento de farinha, milho e feijão da vila Água Azul. Preenchem, portanto, uma janela de mercado que se abriu com a maior dedicação ao dendê pelos agricultores do primeiro grupo analisado. Esse é o grupo que mais agrega os seus membros às atividades no estabelecimento (Figura 5), e os seus membros identificam-se como agricultores.

Figura 5
Dados referentes à realização do trabalho em estabelecimentos cujos membros não têm relação com a dendeicultura na vila Água Azul, Tomé-Açu, no estado do Pará. Gráfico elaborado pelos autores a partir de pesquisa de campo realizada em 2017.

Na realização do trabalho, cinco diferentes tipos de arranjos são postos em prática para levar a cabo as atividades no estabelecimento, e 69% dos membros das famílias trabalham exclusivamente no estabelecimento, havendo um maior equilíbrio entre eles. Em ordem de importância, registramos a predominância do trabalho conjunto do pai/filho em todas as culturas, depois o pai (especialmente nas culturas anuais e na venda) e, em menor proporção, pai/filho/diarista e mãe. O trabalho de terceiros é observado nas famílias que tiveram uma diminuição no número de membros aptos a realizar a atividade agrícola, diminuição provocada pelo casamento dos filhos e pela prioridade dada ao estudo. Apenas nesse tipo ocorrem mutirões (limpeza da área das culturas anuais e a colocação de estacas para o plantio da pimenta-do-reino), porque há maior autonomia na gestão do tempo, uma vez que não há nem assalariados nem integrados à dendeicultura.

Como nos demais grupos, a comercialização é exclusividade dos homens, também os mais envolvidos nas atividades de produção. As mulheres, nessas famílias, atuam predominantemente na esfera doméstica e, ocasionalmente, na colheita de culturas anuais e de pimenta-do-reino e na despolpa de frutas. As mais jovens priorizam o estudo, mas, quando solicitadas, realizam as mesmas atividades anteriormente descritas. As mulheres entrevistadas consideram essas atividades como uma ‘ajuda’, que realizam somente em momentos de necessidade.

Quanto ao volume de trabalho, mesmo que cultivos anuais e permanentes componham os sistemas de produção, esse é o tipo que depende menos da contratação de mão de obra, em decorrência do maior número de membros da família dedicados ao estabelecimento, sendo, inclusive, priorizado o trabalho familiar, em detrimento do assalariamento.

Das quatro famílias que fazem parte desse grupo, três possuíam jovens assalariados na dendeicultura. Em 2015, porém, esses jovens retornaram ao trabalho familiar na agricultura porque o preço da pimenta-do-reino era considerado mais compensador, e o trabalho, mais cômodo do que o serviço assalariado. Esse retorno ocasionou o rearranjo do uso da terra da família e a divisão das atividades de forma mais equilibrada, com a diminuição da contratação de diaristas. Como afirmou um dos entrevistados: “A penosidade de se trabalhar com essas culturas, principalmente a pimenta, é menor do que o trabalho na roça ou como assalariado” (F. S. C., 30 anos, agricultor).

A opção pelos cultivos anuais em composição com culturas perenes é um dos fatores que contribuiu para a não prevalência da dendeicultura. Os cultivos anuais são considerados mais penosos porque exigem maior disponibilidade de mão de obra para a limpeza e a manutenção da área, além de obterem menor valor de mercado. Porém, algumas famílias continuam produzindo culturas alimentares porque valorizam o fato de poder consumir o que produzem e porque a prioridade dada ao dendê, em detrimento de culturas alimentares, nos outros estabelecimentos, abriu uma importante brecha de mercado.

Os integrantes dessas famílias trabalham mais no estabelecimento do que os membros dos dois outros grupos e desenvolvem atividades de ajuda mútua, como o mutirão para colheita de pimenta-do-reino e de culturas anuais, o que evidencia maior inserção nas redes de reciprocidade com fins produtivos.

CONCLUSÕES

Neste artigo, tratamos da organização do trabalho em estabelecimentos familiares cujos membros têm diferentes relações com a dendeicultura. Pretendemos, com os resultados, mostrar a tendência de transição para uma agricultura com mais culturas perenes em um contexto de crescente disputa pela terra, mediante o incentivo público da produção de uma commodity, com base em um argumento socioambiental. Mostramos também transformações recentes nas configurações do trabalho, com o aumento de arranjos que implicam a intersecção entre trabalho familiar e assalariado.

Confirmamos o pressuposto de que a incorporação de uma commodity ao sistema de produção e a expansão do monocultivo nos arredores da vila Água Azul influenciariam a reorganização do trabalho das famílias nos estabelecimentos, independentemente da relação que elas tivessem com a cultura. Quatro conclusões fundamentam a confirmação do pressuposto. A primeira é de que, nos estabelecimentos cujos sistemas de produção incluem o dendê, os cultivos anuais sofreram uma redução de 50% e deixaram de ser cultivados nos demais 50%, porque o volume de trabalho supera a capacidade da família e a contratação de trabalhadores ultrapassaria as possibilidades de pagamento. Em consequência desse acúmulo, pratica-se a ajuda mútua apenas naqueles estabelecimentos cujos membros não têm relação direta com a dendeicultura, produzem mais culturas anuais e os seus membros dispõem de maior autonomia sobre a organização do próprio trabalho.

A segunda conclusão é de que, nos estabelecimentos das famílias com membros assalariados na dendeicultura, a possibilidade de assalariamento regular na agroindústria para enfrentar as condições adversas ligadas à disponibilidade de áreas diminutas de terra agravou a carência de mão de obra e ampliou a dependência da contratação de diaristas. O assalariamento dos filhos e de um dos pais têm motivos diversos, ancorados no desejo de independência financeira dos primeiros e de obtenção de renda para equilibrar o sustento da família por parte do segundo. No último caso, a iniciativa de assalariamento gera ganhos regulares para pagar os diaristas que trabalham no estabelecimento e, assim, permanecerem com a terra na condição de agricultores familiares.

A terceira conclusão é de que, com a redução das áreas de cultivo de produtos alimentares nos estabelecimentos que têm contrato de integração, uma janela de mercado foi aberta localmente para os que não têm relação direta com a dendeicultura. Assim, as culturas anuais que eles produzem destinam-se ao mercado local. A maior parte de membros dessas famílias dedica-se ao trabalho na agricultura, atribuindo importância ao equilíbrio entre as culturas para a venda e para o consumo familiar.

A quarta e última conclusão é de que, em decorrência da instalação de monocultivos de dendê nos arredores, houve maior oferta de empregos e, consequentemente, menor disponibilidade de mão de obra localmente. Portanto, há maior concorrência por assalariados entre agricultores familiares e empresários, com a tendência de autoexploração da força de trabalho, porque trabalhadores assalariam-se no final de semana para aumentar os rendimentos.

Em todas as situações, na organização do trabalho nos estabelecimentos, coexistem membros da família com trabalhadores contratados, mas com arranjos diferentes daqueles em que havia a predominância dos membros da família em suas diferentes faixas etárias. A atividade agrícola está concentrado nos homens: pais, filhos mais velhos e diaristas, com visível masculinização da força de trabalho agrícola. As mulheres têm pequena participação na agricultura e destacam-se no processamento de frutos, na esfera doméstica. Em nenhum dos estabelecimentos, foi verificada a participação de crianças e de jovens menores de idade, visto que os pais desejam, sobretudo, que os filhos estudem e tenham outras profissões.

Comparando a organização do trabalho nos três tipos de estabelecimentos, concluímos que eles têm em comum a diversidade de arranjos para a realização das atividades em sistemas de produção, com a predominância de culturas perenes. Diferenciam-se, entretanto, porque se observa, de um lado, a escassez de força de trabalho nas famílias que têm assalariados na dendeicultura e, de outro, a ocorrência de mutirões e menor contratação de diaristas apenas nas famílias sem relação com a dendeicultura e com maior número de membros, que, sem dependência de condicionamentos externos (itinerário técnico da dendeicultura e rotina do assalariamento), organizam com autonomia o seu trabalho no próprio estabelecimento ou no de terceiros.

A prática de ajuda mútua foi rotineira durante décadas em todos os grupos, mas paulatinamente tem diminuído porque os cultivos perenes (entre os quais, o dendê) demandam trabalho continuamente, intensificando-se o uso de mecanização para capina no dendezal.

Concluímos que a organização do trabalho em estabelececimentos familiares tem sido ressignificada, com uma tendência para a coexistência da especialização e da diversificação conforme modelos em que o trabalho não mais corresponde ao padrão baseado em sexo, idade e geração. No presente, as atividades agrícolas e domésticas são bem demarcadas, intensifica-se a diminuição do revezamento entre essas duas esferas, o trabalho agrícola concentra-se em homens idosos e as mulheres vislumbram outras carreiras.

Evidenciam-se processos de diferenciação social que, constitutivos das práticas sociais históricas do grupo, são ressignificados. De uma condição agroextrativista nos anos de 1970, o grupo passa para a de agricultor, mediante o esgotamento dos recursos, o conhecimento ecológico, as oportunidades locais de comercialização e os desejos quanto ao futuro dos filhos. Persistem as iniciativas de ajuda mútua ocasional para a produção e frequentes para outras esferas da vida social (religiosa e social).

Em se tratando das estratégias produtivas, entretanto, há maior diferenciação entre as famílias, amparada pelas suas trajetórias e características e pela disponibilidade de terra. Marca a diferenciação a intensificação da relação com o mercado por meio de um contrato para a produção de dendê para um grupo de famílias, o assalariamento para membros de outro grupo e a diversificação da produção para mercados locais para um terceiro grupo. Em comum, os três grupos têm a possibilidade de mesclar estratégias produtivas. Diferentemente, o grupo de famílias que produz dendê enfrenta, em particular, a impossibilidade de se excluir desta atividade por causa do contrato de 25 anos, compromisso que demarca uma novidade naquele contexto. Os desdobramentos de tal diversidade de estratégias representam um desafio a ser continuamente observado pelos estudiosos e demais interessados no trabalho familiar no mundo rural da Amazônia.

Por fim, mesmo que persistam práticas de ‘corte e queima’ entre as famílias estudadas, a tendência é a sua extinção, considerando-se a redução de áreas de cultivos anuais pela ocupação com culturas perenes, por causa dos maiores ganhos, a repressão pela incidência de fogo e o vislumbre com a renda regular que o dendê proporciona.

  • 1
    Segundo Aquino (2013)AQUINO, Silvia Lima de. Sobre agricultores, cultivo de eucalipto e estratégias agroindustriais: resistir e adaptar-se ao sistema de produção integrada. 2013. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013., a integração garante exclusividade na aquisição da produção de agricultores pelas empresas. Em geral, essecompromisso é regulado por meio de contratos entre indústrias e agricultores. A indústria interfere após a integração na produção dosagricultores, quer seja via assistência técnica, quer seja via insumos e até equipamentos.
  • 2
    Em outra vertente do projeto Agricultura Familiar e Inclusão Social (AFInS), do qual este artigo faz parte.
  • 3
    A partir da leitura de diferentes autores, Pedroso Júnior et al. (2008, p. 154)PEDROSO JÚNIOR, Nelson Novaes; MURRIETA, Rui Sergio Sereni; ADAMS, Cristina. A agricultura de corte e queima: um sistema em transformação. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, Belém, v. 3, n. 2, p. 153-174, maio/ago. 2008. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1981-81222008000200003.
    https://doi.org/10.1590/S1981-8122200800...
    afirmam que “A agricultura de corte e queima, na sua definição mais ampla, é qualquer sistema agrícola contínuo no qual clareiras são abertas para serem cultivadas por períodos mais curtos de tempo do que aqueles destinados ao pousio”.
  • 4
    Compreendemos por agricultura permanente a criação de culturas anuais feita continuamente na mesma área, sem pousio.
  • 5
    O município também se destaca pelo dinamismo da fruticultura, pela experiência com os Sistemas Agroflorestais (SAF) e com a produção da pimenta-do-reino. O traço cultural constituído pela influência da cultura dos paraenses, japoneses e nordestinos conforma uma agricultura diversificada e com forte associação com o mercado nacional e internacional.
  • 6
    As entrevistas diretivas faziam referência a dois períodos: o passado, quando as famílias chegaram para ocupar o espaço e ali estabelecer residência (a partir do ano de 1967); e o presente, referente ao momento da pesquisa (2016). As perguntas versavam sobre a história de chegada, a conformação da vila e dos estabelecimentos, além de abordarem o trabalho (atividades, espaços de trabalho, divisão sexual do trabalho e mudanças recentes). As entrevistas não diretivas trataram do trabalho no passado e no presente, visando apreender ossignificados atribuídos à vida social local e às diferentes relações com o mercado, após à integração.
  • 7
    Selo Combustível Social (SCS) é um distintivo que assegura a quem o possui, desde que atenda a certas regras, o diferencial de promotor da inclusão social, porque prevê a recepção de matéria-prima produzida pelos agricultores familiares que, mediante contrato de integração, receberiam apoio técnico e creditício para o aumento de renda, sem comprometimento da segurança alimentar. O modelo persiste até 2018. Entretanto, estudos mostram que a adesão ao selo não foi como prevista quanto ao número de agricultores familiares envolvidos (Pires, 2015PIRES, Vívian Beatriz Lopes. Impacto social do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB) no Nordeste: 2008/2013. 2015. Dissertação (Mestrado em Agronegócio) – Universidade de Brasília, Brasília, 2015.). A obtenção do SCS oferece vantagens financeiras e operacionais às empresas certificadas, desde que atendam aos critérios legais, em especial aqueles concernentes à aquisição de 15% da produção advinda da agricultura familiar.
  • 8
    Também denominado de ‘contratado’, para tratar de situações concretas.
  • 9
    Interdição difundida no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e controlada pelas empresas que assinaram o contrato, em conformidade com as diretrizes sobre o trabalho decente dadas pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).
  • 10
    Tomé-Açu tem uma importante colônia de japoneses, constituída por imigrantes que começaram a chegar a partir dos anos 20 do século XX, os quais se dedicaram à agricultura e ao cooperativismo, conformando uma das economias mais dinâmicas do Pará.
  • 11
    A compra da pimenta na folha é tida como a venda antecipada, ou seja, antes da colheita do produto. O agricultor vende sua pimenta aos atravessadores por um preço menor, antes da colheita.
  • 12
    Aproximadamente, 10% do valor do óleo bruto no porto de Roterdã, Holanda.
  • 13
    Um dos principais produtos da dieta dos paraenses no espaço rural, a mandioca, depende de processamento para que haja a transformação em farinha.

AGRADECIMENTOS

Esta pesquisa foi realizada no âmbito do Projeto Agricultura Familiar e Inclusão Social (AFInS), financiado pela EMBRAPA, sob o título “Integração da agricultura familiar na produção do dendê no Pará: possibilidade de inclusão social?”. Aexecução do projeto tem ocorrido por meio de parcerias com a Universidade Federal do Pará (UFPA) e com sindicatos rurais do nordeste paraense no período de 2014/2019.

REFERÊNCIAS

  • ABRAMOVAY, Ricardo; MAGALHÃES, Reginaldo. O acesso dos agricultores familiares aos mercados do biodiesel: parcerias entre grandes empresas e movimentos sociais. In: CONFERÊNCIA DA ASSOCIAÇÃO INTERNACIONAL DE ECONOMIA ALIMENTAR E AGROINDUSTRIAL, 2., 2007. Londrina. Anais [...]. Londrina: Alea, 2007. Disponível em: http://downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto_06_2007.pdf Acesso em: 19 dez. 2018.
    » http://downloads.fipe.org.br/content/downloads/publicacoes/textos/texto_06_2007.pdf
  • ALMEIDA, Mauro William Barbosa de. Redescobrindo a família rural. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 1, n. 1, p. 66-83, 1986.
  • ALVES, Ketiane dos Santos. Organização do trabalho de famílias agricultoras na comunidade Nossa Senhora de Lourdes, microrregião do Guamá no nordeste paraense 2011. Dissertação (Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável) – Núcleo de Ciências Agrárias e Desenvolvimento Rural, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária-Amazônia Oriental, Universidade Federal do Pará, Belém, 2011.
  • AQUINO, Silvia Lima de. Sobre agricultores, cultivo de eucalipto e estratégias agroindustriais: resistir e adaptar-se ao sistema de produção integrada. 2013. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013.
  • ARNDT, Channing; BENFICA, Rui; THURLOW, James. Gender implications of biofuels expansion in Africa: the case of Mozambique. World Development, Michigan, v. 39, n. 9, p. 1649-1662, Sept. 2011. DOI: https://doi.org/10.1016/j.worlddev.2011.02.012.
    » https://doi.org/10.1016/j.worlddev.2011.02.012
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PRODUTORES DE ÓLEO DE PALMA (ABRAPALMA). Frente parlamentar da palma discute infraestrutura Belém, 2017. (Relatório de atividades).
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PRODUTORES DE ÓLEO DE PALMA (ABRAPALMA). Planilha de mapeamento da palma de óleo no Brasil Belém, 2014. Não paginado.
  • BACKHOUSE, Maria. A desapropriação sustentável da Amazônia: o caso dos investimentos em dendê no Pará. Berlin: Freie Universität Berlin, 2013. (Fair Fuels? Working Paper, n. 6).
  • BANCO DA AMAZÔNIA. Diretoria Comercial e de Distribuição. Gerência de Microfinanças e Agricultura Familiar. Coordenadoria de Agricultura Familiar. Sistema de Relatórios Belém, 2015. Não publicado.
  • BECKER, Howard S. Métodos de pesquisa em ciências sociais 4. ed. Tradução Marco Estevão e Renato Aguiar. São Paulo: Hucitec, 1999.
  • BENTES, Elisabeth dos Santos; HOMMA, Alfredo Kingo Oyama. Importação e exportação de óleo e palmiste de dendezeiro no Brasil (2010-2015) Belém: Embrapa Amazônia Oriental, 2016. (Boletim de pesquisa e desenvolvimento, n. 101).
  • BRANDÃO, Frederico; SCHONEVELD, George; PACHECO, Pablo. Integração da agricultura familiar à cadeia da palma de óleo na Amazônia Brasileira: análise e recomendações. Infobrief, Bogor, n. 207, p. 1-6, mar. 2018. DOI: https://doi.org/10.17528/cifor/006849.
    » https://doi.org/10.17528/cifor/006849
  • BRANDÃO, Frederico; SCHONEVELD, George. The state of oil palm development in the Brazilian Amazon: trends, value chain dynamics, and business models. Bogor: CIFOR, 2015. (Working Paper, 198).
  • BRUMER, Anita; DUQUE, Ghislaine; LOURENÇO, Fernando Antonio; WANDERLEY, Maria de Nazareth Baudel. A exploração familiar no Brasil. In: LAMARCHE, Hugues (coord.). A agricultura familiar: comparação internacional: uma realidade multiforme. Campinas: UNICAMP, 1993. v. 1, p. 179-234.
  • CARVALHO, Luciana Gonçalves de. Relações de trabalho nos balatais do Pará. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, v. 19, n. 39, p. 373-400, jan./jun. 2013. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-71832013000100015. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-71832013000100015&lng=en&nrm=iso Acesso em: 28 jul. 2016.
    » https://doi.org/10.1590/S0104-71832013000100015» http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-71832013000100015&lng=en&nrm=iso
  • CASTRO, Edna. Amazônia: sociedade, fronteiras e políticas. Caderno CRH, Salvador, v. 25, n. 64, p. 9-16, jan./abr. 2012. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-49792012000100001.
    » https://doi.org/10.1590/S0103-49792012000100001
  • CASTRO, Edna. Tradição e modernidade: a propósito de formas de trabalho na Amazônia. Novos Cadernos NAEA, Belém, v. 2, n. 1, p. 1-22, jul. 1998. DOI: http://dx.doi.org/10.5801/ncn.v2i1.200. (Papers do Naea, n. 97).
    » https://doi.org/10.5801/ncn.v2i1.200
  • CAVALCANTI, Josefa Salete Barbosa; BENDINI, Mónica Isabel. Globalization and change in labor relations in fruit regions of Brazil and Argentina. Research in Rural Sociology and Development, Bingley, v. 20, p. 3-32, July 2014. DOI: http://dx.doi.org/10.1108/S1057-1922_2014_0000020001.
    » https://doi.org/10.1108/S1057-1922_2014_0000020001
  • CORADINI, Odaci Luiz. Frentes parlamentares, representação de interesses e alinhamentos políticos. Revista Sociologia e Política, Curitiba, v. 18, n. 36, p. 241-256, jun. 2010.
  • COUSINS, Christine R.; TANG, Ning. Working time and work and family conflict in the Netherlands, Sweden and the UK. Work, Employment and Society, Belmont, v. 18, n. 3, p. 531-549, Sept. 2004. DOI: https://doi.org/10.1177/0950017004045549.
    » https://doi.org/10.1177/0950017004045549
  • CRUZ, Benedito Ely Valente da. Territorialização e organização espacial do Grupo Agropalma 2006. Dissertação (Mestrado em Geografia) ‒ Universidade Federal do Pará, Belém, 2006.
  • DE LA GARZA, Enrique. Trabajo no clássico y flexibilidad. Caderno CRH, Salvador, v. 26, n. 68, p. 315-330, maio/ago. 2013. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-49792013000200007.
    » https://doi.org/10.1590/S0103-49792013000200007
  • FORTES, Meyer. O ciclo de desenvolvimento do grupo doméstico Tradução Alcida Rita Ramos. Brasília: UNB, 2011. (Série Tradução, v. 1). Título original: The Developmental Cycle in Domestic Groups.
  • FRASER, James Angus; CARDOSO, Tiago; STEWARD, Angela; PARRY, Luke. Amazonian peasant livelihood differentiation as mutuality-market dialectics. The Journal of Peasant Studies, Abingdon-on-Thames, v. 45, n. 7, p. 1382-1409, May 2017. DOI: https://doi.org/10.1080/03066150.2017.1296833.
    » https://doi.org/10.1080/03066150.2017.1296833
  • GARCIA JÚNIOR, Afrânio Raul. Terra de trabalho: trabalho familiar de pequenos produtores. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
  • GINDLING, Thomas (Tim); NEWHOUSE, David. Self-employment in the developing world. World Development, Michigan, v. 56, p. 313–331, Apr. 2014. DOI: https://doi.org/10.1016/j.worlddev.2013.03.003.
    » https://doi.org/10.1016/j.worlddev.2013.03.003
  • GOMES, Dérick Lima. Os limites da inclusão social: agricultores integrados às agroindústrias de dendê no Pará. 2018. Dissertação (Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável) – Universidade Federal do Pará, Belém, 2018.
  • GOMES, Lucinaldo Soares; MAGALHÃES, Sônia Barbosa. Agricultores integrados do dendê e questões relativas ao sistema de produção no PA, Terra Nova. EcoDebate, Rio de Janeiro, 30 maio 2016. Disponível em: https://www.ecodebate.com.br/2016/05/30/agricultores-integrados-do-dende-e-questoes-relativas-ao-sistema-de-producao-no-pa-terra-nova-por-lucinaldo-soares-gomes-e-sonia-barbosa-magalhaes/ Acesso em: 31 jan. 2017.
    » https://www.ecodebate.com.br/2016/05/30/agricultores-integrados-do-dende-e-questoes-relativas-ao-sistema-de-producao-no-pa-terra-nova-por-lucinaldo-soares-gomes-e-sonia-barbosa-magalhaes/
  • HIRATA, Helena; KERGOAT, Danièle. Novas configurações da divisão sexual do trabalho. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 37, n. 132, p. 595-609, set./dez. 2007. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-15742007000300005.
    » https://doi.org/10.1590/S0100-15742007000300005
  • HOMMA, Alfredo Kingo Oyama. Cronologia do cultivo do dendezeiro na Amazônia Belém: Embrapa Amazônia Oriental, 2016. (Documentos, n. 423).
  • HOMMA, Alfredo Kingo Oyama; VIEIRA, Ima Célia Guimarães. Colóquio sobre dendezeiro: prioridades de pesquisas econômicas, sociais e ambientais na Amazônia. Amazônia: Ciência & Desenvolvimento, Belém, v. 8, n. 15, p. 79-90, jul./dez. 2012.
  • HURTIENNE, Thomas Peter. Agricultura familiar e desenvolvimento rural sustentável na Amazônia. Novos Cadernos do NAEA, Belém, v. 8, n. 1, p. 19-71, jun. 2005.
  • INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Base de dados SIDRA Rio de Janeiro, 2017. Disponível em: http://www.sidra.ibge.gov.br/ Acesso em: 13 maio 2018.
    » http://www.sidra.ibge.gov.br/
  • JULIA; WHITE, Ben. Gendered experiences of dispossession: oil palm expansion in a Dayak Hibun community in West Kalimantan. The Journal of Peasant Studies, Abingdon-on-Thames, v. 39, n. 3-4, p. 995-1016, July/Oct. 2012. DOI: https://doi.org/10.1080/03066150.2012.676544.
    » https://doi.org/10.1080/03066150.2012.676544
  • LAMARCHE, Hugues (coord.). Agricultura familiar: comparação internacional: do mito à realidade. Campinas: UNICAMP, 1998. v. 2.
  • LI, Tania Murray. Social impacts of oil palm in Indonesia: a gendered perspective from West Kalimantan. Bogor: CIFOR, 2015. (Occasional paper, n. 124).
  • LI, Tania Murray. The gendered dynamics of Indonesia’s Oil Palm labour regime Singapore: Asia Research Institute, 2014. (Working Paper Series, n. 225).
  • MENEZES, Marilda Aparecida de. Agricultores expropriados: terra, migrações e trabalho. In: DELGADO, Guilherme Costa; BERGAMASCO, Sonia Maria Pessoa Pereira (org.). Agricultura familiar brasileira: desafios e perspectivas de futuro. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário, 2017. p. 418-433.
  • MONTEIRO, Kátia Fernanda Garcez. Análise de indicadores de sustentabilidade socioambiental em diferentes sistemas produtivos com palma de óleo no estado do Pará 2013. Tese (Doutorado em Ciências Agrárias) – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária-Amazônia Oriental, Universidade Federal Rural da Amazônia, Belém, 2013.
  • MOREIRA, Edma do Socorro Silva; HÉBETTE, Jean. Metamorfoses de um campesinato nos Baixo Amazonas e Baixo Xingu paraenses. In: GODOI, Emilia Pietrafesa de; MENEZES, Marilda Aparecida de; MARIN, Rosa Acevedo (org.). Diversidade do campesinato: expressões e categorias. São Paulo: Editora Unesp; Brasília: Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural, 2009. p. 187-206.
  • MOTA, Dalva Maria da; SILVA, Edfranklin Moreira da; SCHMITZ, Heribert; ALVES, Lívia Navegantes; FERREIRA, Maria do Socorro Gonçalves. Produção de culturas alimentares e dendê nos estabelecimentos familiares no nordeste paraense. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL DA AMÉRICA LATINA: POLÍTICA E CONFLITOS CONTEMPORÂNEOS, 2015, Belém. Anais [...]. Belém: GETTAM: NAEA: UFPA, 2015. p. 119-125.
  • NAHUM, João Santos (org.). Dendeicultura e dinâmicas territoriais do espaço agrário na Amazônia paraense Belém: GAPTA: UFPA, 2014.
  • NAHUM, João Santos; SANTOS, Cleison Bastos dos. Impactos socioambientais da dendeicultura em comunidades tradicionais na Amazônia paraense. ACTA Geográfica, Boa Vista, Ed. Especial, Geografia Agrária, p. 63-80, 2013.
  • NASCIMENTO, Diocélia Antônia Soares do. Trabalho e autonomia em campo de domínio masculino: mulheres que têm contratos de produção com agroindústrias de dendê em São Domingos do Capim-PA. 2017. Dissertação (Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável) - Universidade Federal do Pará, Belém, 2017.
  • NEVES, Delma Pessanha. Lavradores e pequenos produtores de cana: estudo das formas de subordinação dos pequenos produtores agrícolas ao capital. Rio de Janeiro: Zahar, 1981. (Coleção Agricultura e Sociedade).
  • NORWANA, Awang Ali Bema Dayang; KUNJAPPAN, Rejani; CHIN, Melissa; SCHONEVELD, George; POTTER, Lesley; ANDRIANI, Rubeta. The local impacts of oil palm expansion in Malaysia: an assessment based on a case study in Sabah State. Bogor: CIFOR, 2011. (Working Paper, n. 78).
  • OLIVEIRA JÚNIOR, Moises C. Mourão de. Modelização espacial de territorialidades no estado do Pará: entre a Amazônia dos rios e das estradas. 2017. Tese (Doutorado em Geografia e Planejamento Urbano) ‒ Université Sorbonne Nouvelle, Paris, 2017.
  • PAULILO, Maria Ignez S. O peso do trabalho leve. Revista Ciência Hoje, Rio de Janeiro, v. 5, n. 28, p. 64-70, jan./fev. 1987.
  • PEDROSO JÚNIOR, Nelson Novaes; MURRIETA, Rui Sergio Sereni; ADAMS, Cristina. A agricultura de corte e queima: um sistema em transformação. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, Belém, v. 3, n. 2, p. 153-174, maio/ago. 2008. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1981-81222008000200003.
    » https://doi.org/10.1590/S1981-81222008000200003
  • PIRES, Vívian Beatriz Lopes. Impacto social do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB) no Nordeste: 2008/2013. 2015. Dissertação (Mestrado em Agronegócio) – Universidade de Brasília, Brasília, 2015.
  • PYE, Oliver; DAUD, Ramlah; HARMONO, Yuyun; TATAT. Precarious lives: Transnational biographies of migrant oil palm workers. Asia Pacific Viewpoint, Wellington, v. 53, n. 3, p. 330-342, Dec. 2012. DOI: https://doi.org/10.1111/j.1467-8373.2012.01496.x.
    » https://doi.org/10.1111/j.1467-8373.2012.01496.x
  • RAPIAU, Julien. La culture du palmier à huile, facteur de transformation des systèmes agricoles famíliaux en Amazonie orientale 2013. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Rural Sustentável) - Institut Supérieur d’Agriculture et d’Agroalimentaire Rhone-Alpes, Lyon, 2013.
  • REBELLO, Fabrício Khoury. Da lenha ao óleo de palma: a transformação da agricultura no nordeste paraense. 2012. Tese (Doutorado em Agroecossistemas da Amazônia) – Universidade Federal Rural da Amazônia, Belém, 2012.
  • REPÓRTER BRASIL. Agricultura familiar e Programa Nacional de Biodiesel: retrato do presente, perspectivas de futuro. São Paulo, 2010.
  • RIBEIRO, Laiane Bezerra. O trabalho sob influência da dendeicultura em vilas rurais paraenses 2016. Dissertação (Mestrado em Agriculturas Amazônicas) – Universidade Federal do Pará, Belém, 2016.
  • SAMPAIO, Irã Carvalho. A agricultura familiar e a agroindústria do dendê no município de Tomé-Açu (PA): efeitos da agricultura por contrato na produção e no trabalho familiar. 2014. Dissertação (Mestrado em Sociologia e Antropologia) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Pará, Belém, 2014.
  • SHIRAISHI NETO, Joaquim. Novos movimentos sociais e padrões jurídicos no processo de redefinição da região Amazônia. In: SHIRAISHI NETO, Joaquim; LIMA, Rosirene Martins; CARDOSO, Luis Fernando Cardoso e; MESQUITA, Benjamin Alvino de (org.). Meio ambiente, territórios e práticas jurídicas: enredos em conflitos. São Luis: EDUFMA, 2011. p. 23-52.
  • SINAGA, Hariati. Employment and income of workers on Indonesian oil palm plantations: food crisis at the micro level. Future of Food: Journal on Food, Agriculture and Society, Witzenhausen, v. 1, n. 2, p. 64-78, Winter 2013.
  • TIMONE-MARTINEZ, Eva. La culture du palmier à huile en région amazonienne: entre acceptation, résignation et résistance. 2013. Dissertação (Mestrado em Meio Ambiente, Desenvolvimento, Territórios e Sociedades) – AgroParisTech, Paris, 2013.
  • UNITED STATES DEPARTMENT OF AGRICULTURE (USDA). Palm oil production by country in 1000 MT Washington, 2018. Disponível em: https://www.indexmundi.com/agriculture/?commodity=palm-oil Acesso em: 17 jun. 2018.
    » https://www.indexmundi.com/agriculture/?commodity=palm-oil
  • VIEIRA, Ana Carolina C. A integração camponesa ao monocultivo de dendê: subordinação e transformação do campesinato amazônico. 2015. Dissertação (Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentável) – Universidade Federal do Pará, Belém, 2015.
  • VIEIRA, Ana Carolina C.; MAGALHÃES, Sônia Barbosa. Transformações no espaço rural amazônico: o plantio de dendê em comunidades camponesas do Baixo Tocantins, município de Moju/PA. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL RURALIDADES, TRABALHO E MEIO AMBIENTE, 2., 2013, São Carlos. Anais [...]. São Carlos: UFSCar, 2013. p. 79-99.
  • WOORTMANN, Ellen F.; WOORTMANN, Klaas. O trabalho da terra: a lógica e a simbólica da lavoura camponesa. Brasília: Ed. da UnB, 1997.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2019
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2019

Histórico

  • Recebido
    21 Fev 2018
  • Aceito
    27 Fev 2019
MCTI/Museu Paraense Emílio Goeldi Coordenação de Pesquisa e Pós-Graduação, Av. Perimetral. 1901 - Terra Firme, 66077-830 - Belém - PA, Tel.: (55 91) 3075-6186 - Belém - PA - Brazil
E-mail: boletim.humanas@museu-goeldi.br