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As virtudes medicinais do tabaco, a ‘erva santa’, descritas por um missionário europeu no Oriente (c. século XVI)

The medical virtues of tobacco, the ‘holy herb’, described by a European missionary in the East (c. 16th century)

Resumo

Provavelmente em meados do século XVI, um religioso europeu de nome Leonel de Sousa, em missão às partes mais a leste do mundo conhecido, registrou, em um manuscrito de dez fólios, a “Vertude da Erva Sancta que he o tabaco” (n.d.). Ali, anotou os mais destacados usos da planta americana, as doenças para as quais seria útil e as formas mais precisas de manusear o elemento e extrair dele seu potencial curativo. A erva a que se refere, o tabaco, não gozava do predicado de ‘santa’ inequivocamente, sobretudo entre outros homens de fé que, em escritos diversos, sublinharam os vícios despertados por seu consumo, o que torna a compilação merecedora de uma análise mais detida. É à transcrição integral deste manuscrito, acrescida de breves comentários e indicações, que este texto se dedica.

Palavras-chave
Tabaco; Plantas; Medicina; Saúde; Oriente

Abstract

Probably in the mid-16th century, a European religious named Leonel de Sousa, on a mission to the easternmost parts of the known world, recorded in a ten-folio manuscript, the “Vertude da Erva Sancta que he o tabaco” (n.d.). There, he has revealed the most prominent uses of these American plant, such as diseases for which it was useful and the most accurate ways to handle and extract the potential healing components of the natural element. The herb he referred to as ‘holy’, the tobacco, was not unequivocally seen as so, especially among other priests or religious men who in diverse writings, underlines the addiction that could be aroused by its consumption. This characteristic makes the compilation worthy of a more thorough analysis. It is to the full transcription of this manuscript, with brief comments and indications, that this text is dedicated.

Keywords
Tobacco; Plants; Medicine; Health; East

Todos os alimentos são geralmente difíceis de desgastar, mas Deus remediou isto com uma erva, cujo fumo muito ajuda a digestão e a outros males corporais e a purgar a fleuma do estômago. . . .

Eu teria dela precisão por causa da umidade e do meu catarro, mas eu me abstenho de querer quod mihi útil est sed quod multis ut save fiant

(Leite, 1956Leite, S. (1956). Cartas dos primeiros Jesuítas do Brasil (Vol. 1). São Paulo: Comissão do IV Centenário da Cidade de São Paulo., pp. 156-169)1 1 Esta antiga expressão latina é original do evangelho (1 Cor. 10:25) e apareceu, pela primeira vez, ligada ao tabaco nos escritos do padre Manuel da Nóbrega (Nóbrega, 1988, p. 112). Foi traduzida por Caldeira (2008, p. 9) como: “Não o que é útil para mim mas para o maior número, a fim de que sejam salvos.” .

É esta uma das primeiras menções ao tabaco em língua portuguesa, presente em uma carta do conhecido Padre Manuel da Nóbrega dirigida a seu confrade Simão Rodrigues, que se encontrava em Lisboa, remetida de Porto Seguro aos seis dias do primeiro mês de 1550. Com um elogio às suas propriedades curativas e com uma ressalva moral, é a planta apresentada aos familiares e membros da Companhia de Jesus do outro lado do Atlântico. Muitos foram os que, depois dele, teceram recomendações, pautados, sobretudo, no que viam e ouviam dizer do emprego do tabaco pelos naturais da terra brasilis. Em seus depoimentos, a terapêutica (e a sociabilidade) relacionada ao consumo do tabaco – erva santa, erva de todos os males e erva da rainha mãe (Léry, 1972Léry, J. (1972). Viagem à terra do Brasil (S. Milliet, Trad. &> Not.). São Paulo: Martins.)2 2 Como homenagem à Rainha Catarina de Médici (Léry, 1972). ou, como referiram-se os viajantes europeus, petum pytyma, bettin, petigma petume, peti, pitim (Burton, 2001Burton, R. (2001). A Traveller in Brazil, 1865-1868. New York: The Edwin Mellen Press.; Kell, 1966Kell, K. (1966). Folk names for tobacco. The Journal of American Folklore, 79(314), 590-599.) (são muitas as variantes!) –, se era feita com ele mascado, aspirado como rapé, inalado em cachimbos ou cigarros, bebido ou aplicado sobre o corpo, pode ser cotejada como uma entre as diversas temáticas abordadas – os costumes dos indígenas, as benesses da terra, as formas de melhor se estabelecer no território, os sucessos ou as frustrações missionárias –, quer dizer, não é o tema exclusivo dessas cartas, crônicas ou tratados, embora seja uma referência constante. Na verdade, a própria temática da conservação ou do restabelecimento da saúde não se caracteriza, ao fim e ao cabo, como alvo primeiro dos supracitados letrados e homens pios.

Há, porém, uma série de documentos que se encaminham nesta direção, oriundos também das penas dos jesuítas e, entre eles, um que expõe, de forma bastante específica, os conhecimentos sobre as aplicações da erva santa para fins terapêuticos. Este é o documento que será aqui apresentado, transcrito e comentado, considerando-se que fora através de uma sistemática troca de informações – um dos pilares do carisma da Ordem, é verdade, como estratégia para garantir a coesão e a solidariedade de seus membros (Castelnau-L’Estoile, 2006Castelnau-L’Estoile, C. (2006). Operários de uma vinha estéril: os jesuítas e a conversão dos índios no Brasil 1580-1620 (I. S. Cohen, Trad.). Bauru: Edusc.) –, que esses missionários que rumaram a sul e a leste começaram a escrever e a fazer circular (Chambers & Gillespie, 2000Chambers, D. W., & Gillespie, R. (2000). Locality in the history of science: colonial science, technoscience, and indigenous knowledge. Osiris, 15(1), 221-240., pp. 228-231) a descrição de plantas (Henriques, 1989Henriques, I. C. (1989). Plantas e conhecimento do mundo nos séculos XV e XVI. Lisboa: Publicações Alfa.; Ferrão, 1993Ferrão, J. E. M. (1993). A aventura das plantas e os descobrimentos portugueses. Lisboa: IICT.) curativas indígenas e orientais (Russell-Wood, 1998Russell-Wood, A. J. R. (1998). Um mundo em movimento: os portugueses na África, Ásia e América (1415-1808) (V. Anastácio, Trad.). Algés: Difusão Editorial., pp. 227-276), incluindo notas descritivas de como identificar, preparar e aplicar drogas nativas até então desconhecidas do europeu (Walker, 2013Walker, T. D. (2013). The medicines trade in the Portuguese Atlantic world: dissemination of plant remedies and healing knowledge from Brazil, c. 1580-1830. Social History of Medicine, 26(3), 1-29.), como era, então, o tabaco (Febrer, 2001Febrer, J. L. F. (2001). Las primeras noticias em Europa sobre el uso medico del tabaco. Revista de Fitoterapia, 1(4), 269-276.).

Os inacianos passaram a replicar preparações conhecidas, a adaptar remédios às realidades locais e, sobretudo, a compor novas mezinhas em espaços privilegiados dos Colégios (Martín & Valverde, 1995Martín, C., & Valverde, J. L. (Orgs.). (1995). La farmacia en la América colonial: el arte de preparar medicamentos. Granada: Servicio de Publicaciones de la Universidad de Granada.), em um movimento que já não é mais lido como refratário à ciência (Fleck, 2015Fleck, E. C. D. (2015). Entre a caridade e a ciência: a prática missionária e científica da Companhia de Jesus (América platina, séculos XVII e XVIII). São Leopoldo: Oikos.; Asuá, 2014Asuá, M. (2014). Science in the Vanished Arcadia: knowledge of nature in the jesuit missions. Leiden: Brill.; Del Valle, 2009Del Valle, I. (2009). Escribiendo desde los márgenes: colonialismo y jesuítas em el siglo XVIII. México: Siglo XXI.; Di Liscia, 2002Di Liscia, M. S. (2002). Saberes, terapias y prácticas médicas en Argentina (1750-1910). Madrid: Consejo Superior de Investiga Científicas Instituto de Historia.). E isso quase desde o momento em que se instalam nas regiões colonizadas ou ocupadas pelos lusos, já em meados do século XVI – além, por certo, dos locais que firmaram no Portugal peninsular (Dias, 2009Dias, J. P. S. (2009). Documentos sobre duas boticas da Companhia de Jesus em Lisboa: Colégio de Santo Antão e Casa Professa de S. Roque. Economia e Sociologia, 88/89, 295-312.). O estabelecimento das primeiras enfermarias e boticas jesuítas datam, na Ásia, para se ter uma ideia, de 1542 em Goa, Índia e Macau e de 1563, apenas um ano depois, na China (Saldanha, 1990Saldanha, M. J. (1990). História de Goa (política e arqueológica) (Vol. 1). New Delhi: Asian Educacional., pp. 46-48; Amaro, 1992Amaro, A. M. (1992). Introdução de medicina ocidental em Macau e as receitas de segredo da botica do Colégio de São Paulo. Macau: Instituto Cultural de Macau., pp. 7-11); no Brasil, a maior das colônias portuguesas, há notícias da fundação missionária e assistencial em 1554 para São Paulo e 1549 para Salvador, com início das atividades de atendimento aos corpos enfermos pouco tempo depois. E desde então, cada vez mais sistematicamente, reuniram, mesclaram, apropriaram-se, ressignificaram e difundiram informações sobre a flora autóctone e seus usos para curar corpos, mesmo sendo ‘médicos da alma’, a fim de cumprirem seus objetivos missionários e angariarem fundos nada desprezíveis para a Ordem (Walker, 2009Walker, T. D. (2009). Acquisition and circulation of medical knowledge within the early modern Portuguese colonial empire. In D. Bleichmar, P. De Vos, K. Huffine & K. Sheehan (Eds.), Science in the Spanish and Portuguese Empires, 1500-1800 (pp. 247-270). California: Stanford University Press.).

CADERNOS OU COLEÇÕES DE RECEITAS DOS JESUÍTAS

É nesse contexto em que uma das ricas ‘coleções de receitas’ dos jesuítas, ou ‘cadernos de receitas’ (Gesteira et al., 2019Gesteira, H. M., Leal, J. E. F., & Santiago, M. C. (Orgs.). (2019). Formulário médico: manuscrito atribuído aos Jesuítas e encontrado em uma arca na Igreja de São Francisco de Curitiba. Rio de Janeiro: Fiocruz.), é organizada. Trata-se do “Breve compendio de varias receitas de medicina” (n.d.)Breve compendio de varias receitas de medicina. (n.d.). (n. 59, ff. 2-79v). Biblioteque National de France, Paris., uma miscelânea de notícias sobre as ervas do oriente (Zupanov, 2005Zupanov, I. G. (2005). Missionary Tropics: the Catholic Frontier in India (16th-17th Centuries). Ann Arbor: University of Michigan Press.; Harris, 1999Harris, S. (1999). Mapping Jesuit Science: the role of travel in the geography of knowledge. In J. W. O’Malley, G. A. Bailey, S. J. Harris & T. F. Kennedy (Eds.), The Jesuits: cultures, sciences, and the artes, 1540-1773 (pp. 212-239). Toronto: University of Toronto Press., p. 214), as formas mais úteis de curar as doenças de lá e as receitas testadas por doutores e por padres radicados a leste, manuscrito de 155 fólios, salvaguardado pela Biblioteca Nacional da França (BNF) em volume, até onde sabemos, único. Seu texto mais antigo fala sobre as “Esperiencias das hervas orientaes que sua Mages[stade] mandou fazer ao vizorey Mathias de Albuquerque, anno de 1596”, mas, provavelmente, o organizador do tomo seria um religioso enviado a Macau apenas em 1656, o flamengo Francisco Rougemunt3 3 Para mais informações sobre François (ou Francisco) de Rougemont, sobretudo relacionadas a outras produções bibliográficas, ver Golvers (1999). (Rodrigues, 1944Rodrigues, F. (1944). História da Companhia de Jesus na assistência de Portugal (Vol. 2-3). Porto: Apostolado da Imprensa., p. 163). Seu nome consta na primeira página da encadernação e, ao que tudo indica, ele teria tomado algumas notas para uso pessoal do levantamento remetido ao vice-rei antes de seu envio à Ásia; úteis, por certo, na missão que o aguardava.

O ‘livro’, no entanto, não é homogêneo, sendo composto por outros textos, além das citadas “Esperiencias das hervas...”: “Regimendo das virtudes da rais de madre de Deos de Malaca”; “Regimento para o que serven os pelourinhos, do P. Francisco Homem da Companhia de Jesu”; “Mezinhas tresladadas de hum livro de maõ do P. Luca Perez”; “Regmento da pedra do bezar, do mesmo Doutor Dimas”; “Receitas [que] dizem foraõ do Conde de Vidigeira” e outros. Por serem identificados com autorias diferentes e com grafias bastante díspares entre si – inclusive com notas em francês, latim e mandarim –, é corroborada a suposição de que o missionário flamengo ‘ajuntou’ notas produzidas por outras pessoas às suas. Com sinais claros de uso e manejo, o volume parece ter sido reorganizado em algum momento, já que a paginação do conjunto de textos aparece riscada e refeita.

O MANUSCRITO SOBRE A ERVA SANTA

É nesta obra que encontramos um texto inteiramente voltado ao uso medicinal do tabaco, de maneira organizada e com pormenores, intitulado “Vertude da Erva Sancta que he o tabaco” (n.d.), assinado pelo padre Leonel de Sousa4 4 Consoante à pesquisa de Fernando do Amaral Gomes, não foram encontradas quaisquer referências a ele nas principais crônicas de ordens religiosas – dominicanos, jesuítas e franciscanos (Quétif & Echard, 1719; Leite, 2004). No entanto, é possível supor, a partir da presença do texto em uma compilação do jesuíta François/Francisco Rougemont, que Leonel de Souza obrasse nessa Ordem. . Embora o compêndio seja referido em alguns estudos sobre a presença lusa na Ásia, esse manuscrito relacionado à erva santa fora abordado, até onde pude constatar, apenas por Fernando Amaral Gomes, na década de 1960, em duas oportunidades: em forma de comunicação, no Congresso Internacional de História dos Descobrimentos (Gomes, 1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa.), e no livreto “O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado do padre Leonel de Sousa” (Gomes, 1962Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e.), cujo único exemplar se encontra na biblioteca da Universidade de Utrecht, na Holanda. Pelo quase ineditismo do documento, vale apresentá-lo com algum vagar e indicar, ainda que de maneira inicial, as potencialidades que sua análise guarda e que tem guiado a investigação em curso sobre a medicina praticada pelos inacianos em suas boticas no aquém e no além-mar.

É verdade que a santa erva não se enquadraria no grupo de plantas ‘do oriente’, posto que, como os muitos relatos anteriores e coetâneos já indicados asseveravam, sua origem é americana5 5 Há mais de sessenta espécies da planta Nicotiana: algumas poucas parecem ser nativas da Austrália e a esmagadora maioria é associada ao continente americano. , mas sua presença no volume não causa espanto por três razões principais: em primeiro lugar, pela sublinhada comunicação constante e circulação de informações, de conhecimento – e de produtos – entre os inacianos; depois, pela vulgarização do comércio do tabaco àquela altura; e, por fim, pelas muitas aplicações que a planta teria em benefício da saúde. E quais seriam eles?

O padre Leonel de Sousa, de quem pouco sabemos, inicia as anotações que se dividem em dez fólios com uma observação geral:

Tem a erva santa a virtude de aquentar, revolver e confortar[,] une e solta as feridas frescas e em breve tempo as cura. Como dizem[,] pô-la primeira intenção alimpar as chagas corruptas abrandando-as e reduzindo-as à perfeita saúde como adiante se verá.

(Vertude da Erva Sancta que he o tabaco, n.d., p. 160).

De partida, temos uma amostra do vocabulário associado à planta em sua versão medicinal e que será reiterado pelo missionário, que, ao que tudo indica, era jesuíta: curativa, confortativa; uma erva que resolve, une, solta, limpa, aquenta ou, em suma, ‘grande remédio’. Esses predicados repetir-se-ão nas dezenove preparações para males específicos que compõem o manuscrito: para dores de cabeça, para o mal da tinha – “uma espécie de lepra que dá na cabeça e faz cair o cabelo” (Silva, 1813Silva, A. M. (1813). Diccionario da lingua portugueza: recompilado dos vocabularios impressos ate agora, e nesta segunda edição novamente emendado e muito acrescentado, por Antonio de Moraes Silva. Lisboa: Typographia Lacerdina., p. 776) –, para matar piolhos, para o sono (e a falta dele), para corrimentos, para os males do peito, para dores do estômago, para fleumas do estômago, para opilações – “obstruções nos canais ou dutos do corpo” (Silva, 1813Silva, A. M. (1813). Diccionario da lingua portugueza: recompilado dos vocabularios impressos ate agora, e nesta segunda edição novamente emendado e muito acrescentado, por Antonio de Moraes Silva. Lisboa: Typographia Lacerdina., p. 376) –, para cólica e mordexim – “uma doença ordinária dos índios. . . . propriamente indigestão e falta de cozimento” (Bluteau, 1712-1728, p. 577) –, para lombrigas, para fazer desapegar as sanguessugas, para dores nas juntas, para apostemas (um tumor ou abcesso) e leicenços (‘grosso modo’, os furúnculos), para dor de dentes, para impigens (doença de pele comum e contagiosa), para venenos e feridas – com diferentes aplicações em feridas frescas e chagas velhas, sempre, segundo ele, bem sucedidas – e para boubas. Além das receitas para essa quase vintena de doenças, Sousa discrimina as regras gerais para a feitura de seis preparos com o tabaco, a saber: lambedor santo, óleo santo, um outro óleo, unguento santo, lambedor da erva seca e, por fim, o óleo da erva seca.

Ao olhar essas receitas em conjunto, para além de obter uma espécie de listagem de doenças para as quais o emprego do tabaco seria virtuoso, depreendem-se algumas questões: de que maneira a erva deveria ser ministrada? Como ingrediente simples ou como parte de um composto? Ele substituía algum fármaco já conhecido, com mais virtude, em algum achaque? Como extrair dele a plenitude de benefícios? Como identificar se ele seria, de fato, eficaz para um determinado mal?

PREPAROS E VIRTUDES

Em relação às formas de preparar a erva dita santa, para aplicação, parece ter sido o formato de sumo o mais recorrente, com quinze ocorrências, seguido de nove indicações para uso como óleo, oito para administração de suas folhas (inteiras ou quentes) ou por meio de unguentos, cinco para uso como lambedores, três ocorrências de seu uso da erva pisada, em rescaldo ou como vomitório e apenas duas menções como pó. Aqui, é importante sublinhar que o religioso não recomenda o uso do pó para inalação como rapé, forma usual entre os indígenas do Brasil, e que rendeu algumas críticas e interditos ao consumo de tabaco, mesmo que para fins medicinais, por missionários como o referido Manuel da Nóbrega: nas duas ocorrências da erva em pó, para lombrigas e para fazer desprender as sanguessugas, ela deveria ser ou ingerida, como no primeiro caso, ou, como no segundo, assoprada com um canudo sobre as partes. Vale dizer que, nessa quantificação, considerou-se a possibilidade de haver mais de uma forma de aplicação do tabaco para o mesmo achaque: no caso das feridas frescas, por exemplo, tanto o sumo quanto a folha pisada seriam proveitosos.

A erva santa, que, segundo ele, deveria ser sempre ‘colhida no mês de maio’, vem para substituir o solimão, uma composição, de acordo com o dicionarista e também jesuíta Raphael Bluteau, de “azougue, sal amoníaco ou salitre e vitríolo sublimados. . . . mortalmente venenosa”, se ingerida em excesso, “mas que se toma pela boca com muita segurança e suavidade” (Bluteau, 1712-1728, p. 707), se bem preparada, na função de contraveneno. Ela aparecerá, ainda, como medicamento singular em doze das dezenove receitas; nas fórmulas gerais, com exceção do unguento santo (que seria fabricado com alguma cera, cuja especificação não é fornecida pelo padre), todas levam um ingrediente ‘comestível’. No grupo geral de menções ao longo do manuscrito, há leite (citado uma vez), vinagre (5), mel (3), vinho (1), óleos de coco e de gergelim (duas vezes cada), uma proeminência da mistura com açúcar comum ou clarificado (citado sete vezes, com as duas versões aninhadas juntas no gráfico) e certa variedade de outras plantas ou ervas. Nesse grupo, incluem-se malva, com duas menções, acelga, alface, almeirão, chicória, dormideira e erva moura, com uma alusão cada. Assim como o tabaco, essas plantas seriam de fácil acesso não só entre os asiáticos, mas também nos quintais, hortas e boticas dos Colégios ‘dos quatro cantos do mundo’.

De posse desses complementos fitoterápicos e da santa erva, proceder-se-ia ao uso do medicamento, em linhas gerais, por oito vias diferentes: esfregando o preparo; untando ou fomentando a parte enferma, através de um pano morno ou de um pano quente; soprando sobre a chaga; ou, com maior frequência, aplicando-o diretamente sobre o mal; ou, ainda, ingerindo-o. Mas tudo isso só seria possível – ou melhor, só faria com que o enfermo recobrasse a saúde – se a doença e sua manifestação no corpo fossem corretamente identificadas, por isso, um outro aspecto digno de nota está na descrição da malignidade a partir de sua ‘qualificação’. O religioso, como outros de sua Ordem que obrariam como enfermeiros ou boticários (Leite, 1952Leite, S. (1952). Serviços de saúde da Companhia de Jesus no Brasil (1549-1760). Brotéria, (4), 386-403.), parece ser versado nos pressupostos da teoria humoral6 6 Em linhas bastante gerais, a teoria humoral, também referida como hipocrático-galênica, pressupunha ser o corpo uma espécie de microcosmo, em que as qualidades dos quatro elementos constituintes da natureza poderiam ser encontrados. A saúde seria alcançada ou mantida quando essas partes constituintes, os humores, encontravam-se em equilíbrio; a doença, por sua vez, poderia ser explicada pela sua falta, excesso ou corrupção. Sangue, fleuma, cólera e melancolia são os quatro humores primários, ao passo que seco/úmido, frio/quente, delgado/grosso e doce/amargo configuram-se como suas qualidades, aos pares. , o grande viés de entendimento das causas das enfermidades daquele tempo – e sendo praticamente uníssona entre os lusos, ao menos até meados do século XVIII (Dias, 2010Dias, J. P. S. (2010). Até que as luzes os separem. Hipócrates e Galeno na literatura médico-farmacêutica portuguesa dos séculos XVII e XVIII. In I. Ornellas (Org.), Revisitar os saberes. Referências clássicas na cultura portuguesa do Renascimento à época Moderna (pp. 77-88). Lisboa: Centro de Estudos Clássicos FLUL e IELT.) –, o que o fez julgar como importante delimitar, tanto quanto possível, a proveniência da doença por essas balizas: fria, quente, fleumática; oriunda de viscosidade ou de ventosidade.

Ao observarmos mais de perto uma dessas receitas, é possível melhor visualizar as estratégias utilizadas pelo padre para preparar, ele mesmo, alguma mezinha ou, como é possível supor, instruir seus possíveis leitores sobre o método correto de manejo do santo ingrediente. Nas indicações de atalhamento dos ‘males do peito’, por exemplo, identificamos com facilidade alguns aspectos da exposição: suas considerações sobre as causas da doença (no caso, a frialdade, ou os humores frios); a forma correta de ministrar o remédio (pela boca); de que maneira o tabaco entraria na receita (sumo ou lambedor santo); algum ingrediente complementar ao preparo (aqui, o açúcar); a virtude do remédio para a dita doença (abrandar a tosse e purgar o catarro); para quem a fórmula seria destinada (nesse caso, para qualquer idade); e, por fim, algumas advertências sobre a quantidade (não passar de três onças de sumo e não usar de forma contínua, para que a natureza do corpo não se habituasse aos efeitos do medicamento).

Aqui, além dos aspectos anteriormente avaliados, salta aos olhos a necessidade de observar sua preocupação em destacar o destinatário do remédio – o que se repete em diversos outros, indicados ‘para homens’, ‘para homens e mulheres’, ‘tanto para grandes quanto para pequenos’ – e o constante cuidado para não tomar esse ou aquele composto em excesso, tanto pelo malefício imediato que poderia causar, como pela ineficácia do uso contínuo ou mesmo por suscitar um tipo de vício. Essas advertências, ao mesmo tempo em que especificavam a quem a receita deveria ser ministrada, evitariam que as fórmulas fossem utilizadas em casos impróprios e descredibilizassem o autor.

EXPERIMENTAR E DISSEMINAR O CONHECIMENTO

Nesse mesmo sentido, outro recurso de que se vale o padre Leonel de Sousa – como era, aliás, próprio de seu tempo – é a experimentação como mecanismo de validação do conhecimento. Nas receitas, ele afirma ter testado, provado, utilizado ou aplicado ele mesmo os preparos e sua eficácia, ou, na outra via, quando não teria submetido o método à prova, registrava a informação junto ao passo a passo. É o que faz no caso das dores de dente, a título de ilustração, em que ele anota que “será bom a raiz da dita [erva]”, mas afirma que sabe dessa forma de utilização “porque me disseram, mas ainda não experimentei” (Vertude da Erva Sancta que he o tabaco, n.d., p. 170).

O missionário estava convencido de que a lista de doenças e preparos para emendá-las ainda tinha muito a crescer. Já ao final da última receita, a de boubas, ele registra uma advertência, em que se lê o seguinte:

Outras muitas virtudes tem a erva que até agora não andam em uso e por isso não as ponho aqui, mas o tempo as irá descobrindo para que todos nós aproveitemos delas, o certo é que a erva é proveitosa particularmente aos pobres pela qual razão lhe dei bem o nome que por excelente lhe puseram que é erva santa

(Vertude da Erva Sancta que he o tabaco, n.d., p. 87).

Essa expectativa, e mesmo a longa exaltação que faz sobre o uso do tabaco, pode ser explicada, ao menos em parte, pelo maravilhamento do padre Leonel e seus coetâneos nos primeiros contatos com a erva, tomada, então, como quase que milagreira. E mesmo que com o passar do tempo o consumo de tabaco tenha se afastado significativamente do campo dos benefícios médicos para florescer no comércio ultramarino7 7 Um balanço historiográfico sobre o papel do tabaco na economia colonial pode ser consultado em Acioli (2005). e que juízos moralizantes sobre os efeitos da planta, sob alguns formatos, tenham se cristalizado, veremos ainda suas aplicações, de forma bem menos sistematizada e não como tópico de um texto inteiro, é verdade, em outras das ‘coleções de receitas’, também manuscritas, rapidamente mencionadas anteriormente8 8 Apenas para indicá-las, destaco que, já no Setecentos, mais precisamente em 1720, o padre Afonso da Costa, missionário da Companhia em Goa, remete-se, em um trabalho que lhe ocupou por mais de três décadas, a “Árvore da Vida dilatada em vistosos e salutiferos ramos ornados de muitas aprasiveis, e saudiveis folhas, em que se deixa ver muitos e singulares remedios assim simplices, como compostos, que a Arte, e experiencia, a industria, e a curiosidade descubrio, para curar com facilidade quasi todas as doenças, e queixas, a que o corpo esta sogieto, principalmente em terras desitiduas de Medicos e Boticos. Copiados de diversos Authores assim impressos, como manuscriptos, de varias noticias e experiencias vistas e aprovadas... Offerecida pelo Padre Affonso da Costa da Companha de Jesus da Provincia de Goa” (Costa, 1720). Em 1766, já após a expulsão dos inacianos dos domínios lusos, encontramos na “Colleção de varias receitas e segredos particulares das principais boticas da nossa Companhia de Portugal, da Índia de Macao e do Brazil compostas e experimentadas pelos melhores médicos e boticários mais célebres que tem havido nestas partes” (1766), compilação anônima valorosa para compreender a disseminação do conhecimento médico no mundo colonial português, o emprego da erva santa no ‘emplastro magistral’, elaborado na Botica do Colégio de Macau (com a referência a ‘nicociana’) e no ‘emplastro de tabaco’, do Irmão André da Costa, da Botica do Colégio da Bahia (como tabaco), pelas virtudes curadoras de chagas, e como ‘sal de tabaco’ na mais famosa receita do mesmo Colégio, a ‘Triaga Brasílica’, entre mais de trezentas preparações médicas detalhadas. A “Colleção de varias receitas e segredos particulares das principais boticas da nossa Companhia de Portugal, da Índia de Macao e do Brazil compostas e experimentadas pelos melhores médicos e boticários mais célebres que tem havido nestas partes” (1766) foi recentemente editada por Viotti e França (2019). .

Ao desenvolverem, disseminarem e, por certo, apropriarem-se de informações sobre um mundo natural que passou a ser experimentado após os movimentos expansionistas lusos, sobretudo nos usos médico-farmacêuticos que dele poderiam ser extraídos, os jesuítas firmaram-se como produtores de ciência, em moldes definidos, e não a ela refratários, como por muito tempo se afirmou. Recolheram, sistematizaram e espalharam, pela observação e pelo contato mais ou menos violento com o nativo, sementes, frutas, folhas e raízes que sanavam os males dos homens da terra e do mar, funções, muitas vezes, até então estranhas àqueles produtos. A exploração das virtudes curativas do tabaco a partir de um manuscrito muito pouco conhecido, transcrito e apresentado integralmente ao leitor, a seguir, pode ser tomada como um exemplo interessante para entender os mecanismos possíveis à época para o movimento (>Russell-Wood, 1998Russell-Wood, A. J. R. (1998). Um mundo em movimento: os portugueses na África, Ásia e América (1415-1808) (V. Anastácio, Trad.). Algés: Difusão Editorial.) e para a realização de trocas de conhecimento, de produtos, de pessoas; da relação entre as esferas morais e científicas; da ponte possível entre a feitura de um saber temporal, mas sempre cercado de certa inspiração espiritual; da ressignificação de elementos para fins específicos. Trata-se de uma planta que nasce na América e é aproveitada alhures, minuciosamente escrutinada por um religioso, em prol do erário régio, da Companhia e da saúde. É um entre os muitos produtos que transitaram lá e cá, talvez nem todos ‘santos’, mas que deram novos contornos aos cuidados com o corpo no ‘novo’ e nos ‘velhos’ mundos.

UMA PALAVRA SOBRE A TRANSCRIÇÃO

Como supraindicado, este texto busca apresentar, integralmente, a transcrição e a edição da “Vertude da Erva Sancta que he o tabaco” (n.d.Vertude da Erva Sancta que he o tabaco (n.d.). In Breve compendio de varias receitas de medicina (n. 59, ff. 2-79v). Biblioteque National de France, Paris.), do padre Leonel de Sousa. Para tanto, além do manuscrito salvaguardado pela BNF, tomado como base para este trabalho, as duas edições localizadas da obra, empreendidas por Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., 1962)Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e. em um curto espaço de tempo – mas que, ainda assim, diferem entre si –, foram consultadas e as divergências mais significativas entre as opções que apresento (ou mesmo as diferenças entre as duas transcrições conhecidas) são referendadas em notas. Vale dizer que os dois empreendimentos de Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., 1962)Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e. não dão pistas sobre a trajetória do padre Leonel de Sousa ou apresentam comentários acerca das palavras incógnitas ou, para ele, irreconhecíveis ou ilegíveis do texto.

Optei, pois, por modernizar a grafia das palavras, de modo a facilitar o contato com o documento pelo leitor contemporâneo, bem como incluí, quando necessário, sinais de pontuação que tornam o texto mais próximo da leitura corrente. As indicações das inclusões de sinais gráficos constam entre colchetes [ ]. No entanto, ao contrário do empreendido por Gomes (1961, 1962), mantive o que seriam as linhas do texto como no manuscrito original, de modo que o leitor consiga visualizar a quantidade de linhas e a disposição do texto no livreto. Complementarmente, indico também em notas de rodapé, ao longo do texto, o significado de algumas palavras que potencialmente são desconhecidas do leitor não especializado ou que caíram em desuso e não são facilmente encontradas em dicionários contemporâneos.

Por fim, é importante destacar que a paginação indicada na transcrição segue a numeração atribuída pelo autor, e difere ao longo do manuscrito. Naquele que seria o fólio 1 da “Vertude da Erva Sancta que he o tabaco” (n.d.)Vertude da Erva Sancta que he o tabaco (n.d.). In Breve compendio de varias receitas de medicina (n. 59, ff. 2-79v). Biblioteque National de France, Paris., há duas marcações no canto superior direito da página: o número 159, que aparece sobrerriscado, e, ao seu lado, à esquerda, o número 80. O autor do texto ora mantém a paginação que se inicia com o número 159, ora faz correções a ela; essa variação foi indicada ao longo do documento (Figura 1).

Figura 1
Fólio n. 1 (grafado como p. 80) do manuscrito.
80 159 Jesus Maria José Re Vco R.g Virtude da erva santa que é o tabaco Tem a erva santa a virtude de aquentar revolver e confortar[,] une e solda as feridas frescas e em breve tempo as cura Como dizem[,] pô-la primeira intenção a limpar as chagas corruptas abrandando-as e reduzindo-as à perfeita saúde como adiante se verá[.] p. 160 - Em branco
p. 81 161 Para as dores de cabeça Tem a erva santa particular virtude de curar as dores de cabeça[,] particularmente as que procedem de coisa fria[,] e da mesma maneira cura a enxaqueca quando é de humores9 frios o[u] viscosos[,] aplicando-lhe as folhas quentes no rescaldo[,] repetindo-as10 todas às vezes que for necessário até que a dor se acabe. Serve assim mesmo para as bostelas11 que nascem na cabeça[,] esfregando-as com as folhas da erva santa pisada com sumo da dita erva[,] repetindo às vezes que for necessário[,] e depois se fará no mesmo lugar uma untura com óleo santo de que abaixo notaremos[.] É remédio mui[to] provado e seguro12 para grandes e pequenos -
Para o mal de tinha 13| Serve para toda a sorte de tinha14[,] aplicando-lhe primeiro o sumo as vezes que for necessário até que as bostelas comecem a cair[,] e depois se faça unturas nas mesmas bostelas com o óleo p. 162 santo[,] particularmente se houver matéria nas bostelas[,] de cada qual destas coisas se tem feito largas experiências.
Para matar piolhos Para matar piolhos da cabeça ou de outra parte[,] esfregando com a sua folha pisada o[u] sumo dela[,] e não bastando isso pode usar do óleo o[u] unguento[;] e isso se repita às vezes que for necessário até não haver piolhos[,] porque é coisa provada[.]
Para o sono Aproveita[da] para os que com falta de sono por razão de alguma enfermidade causada de frio[,] como são paralisia[,] apoplexia15 e as doenças que vulgarmente se chamam de ar[,] molhando pano no sumo da dita erva estando morno e aplicando sobre a testa e fonte16.
Para corrimentos Para os corrimentos o[u] outra qualquer dor causada de frio em qualquer parte do corpo que seja[,] aplicando suas folhas p. 82 quentes no rescaldo o[u] molhando17 panos em seu sumo morno[,] aplicadas à parte enferma maravilhosamente aproveita[,] ainda que seja na cabeça [para curar membros encolhidos de frio grandemente[,] serve o óleo da pág. 175 etc. Esfregando o quente sobre a parte enferma também esquentada diante do fogo]18
Para males do peito Particularmente aqueles que escarram matéria pela boca quando é causada de frialdade. E muito particularmente socorre aos asmáticos[,] tomando pela boca o sumo da dita erva com um pequeno de açúcar por três o[u] quatro dias[,] da primeira vez se pode tomar meia19 onça20 e depois irá acrescenta[ndo] conforme a necessidade[,] mas não passe de três onças[,] posto que não faz mais dano que virar a cabeça e[,] desta maneira[,] muitas vezes faz vomitar e lançar muitas fleumas21 pela boca. Também para esta enfermidade pode usar do nosso lambedor22 santo que abaixo trataremos[,] que ainda tem mais forças para lançar as fleumas[,] viscosidades e umidades do peito[,] abranda a tosse[,] purga o catarro causado do frio e pode-se tomar de meia23 onça até duas conforme a idade e necessidade de cada um porque [página sem numeração] se for muito faz vomitar e por isso não é bem que se tome tanto por junto se não de pouco a pouco aos tragos[.] Advirta-se que todas as coisas que aqui se fala não se querem muito continuadas[,] porque uso faz habituar a natureza de tal modo que depois não pode fazer a mezinha sua obra perfeita[.]
Para dores do estômago Para as dores do estômago[,] quando é de frio o[u] de Ventosidade[,] aplicando suas folhas quentes sobre[,] repetindo-as todas às[as] vezes que for necessário até que a dor se abrande[,] e depois de feita esta fomentação que assim se chama se pode fazer uma untura com o óleo santo o[u] unguento[,] e depois de feita se apartará o estômago com uma toalha[.]
Para fleumas do estômago É grande remédio para as fleumas ou tosse ou sem ela[,] usar do sumo da erva santa tomando por modo do vomitório24[,] a saber[,] uma onça de sumo da erva santa clarificado p. 83 145 outra de mel ou açúcar e meia25 onça de vinagre tudo junto morno se tome em jejum pela manhã[.] Outro vomitório para o mesmo[:] meia26 onça de lambedor Santo[,] quatro oitavas de vinagre e três onças de água[,] tudo junto morno se tome pela manhã em jejum[,] advirta-se que estes vomitórios para fazerem proveito se pode tomar duas ou três vezes ou acrescentando de cada vez dobrado de que fica dito[,] porque estes vomitórios sendo em grande quantidade não fazem outro dano que virar a cabeça um pouco[,] porém nunca se passe de três onças do sumo e duas do lambedor[,] serve assim mesmo para as fleumas[,] a erva seja trazida na cabeça por algum tempo a quantidade que cada um quiser[.]
Para opilações Aproveita nossa erva santa nas aplicações do estômago e baço fazendo fomentações com seu sumo do modo seguinte - uma canada27 do sumo da dita erva e quatro onças de bom vinagre[,] estando tudo bem quente molhará panos de lã no dito sumo quanto quente o enfermo puder sofrer[,] se aplicarão a parte enferma pondo um pano e tirando. p. 10028 Outro o que se repetirá dez ou quinze vezes[,] espremendo um pouco o pano para que não leve muito sumo[,] e feito isto se fará uma untura na mesma parte com o nosso óleo santo morno[,] pode-se isto continuar oito ou dez dias[,] e querendo fazer duas vezes no dia pode-se fazer havendo disposições para isso[.]
Para dor de cólica e mordexim Para dor de cólica e mordexim29 Para todas as cólicas causadas de frio o[u] ventosidade aplicará no modo seguinte[:] o primeiro se usará das folhas quentes no rescaldo[,] aplicado sobre a dor[,] repartindo às vezes que parecer[,] e se com isso não abrandar fará uma fomentação 30 do sumo da dita erva do modo que fica dito nas opilações dores 31 do estômago e depois de feita fará uma untura sobre a dor com o óleo santo quente moderadamente[,] p. 84 157 e se com tudo não obedecer[,] darão ao enfermo 32 vomitório[,] a saber uma onça e meia de lambedor santo[,] duas oitavas de vinagre e duas de água e tudo morno dê a beber ao enfermo para que vomite[,] e se com tudo isto não abrandar[,] aplicarão ao enfermo uma ajuda do modo seguinte[:] tomará cozimento de malvas com oito onças do sumo da erva santa e duas onças de óleo e uma de mel[,] de tudo se faça ajuda quente[,] se lhe aplique[,] e sendo caso que alcance logo se lhe dê outra na mesma conformidade que acima fica dito[,] porque as ajudas nas cólicas é necessário que retenham por muito tempo para mover a frialdade o[u] ventosidade[,] e se com todos estes remédios não houver mudança[,] torne a repetir às[as] vezes que for necessário[.]
Para lombrigas Primeiramente aplicar as folhas machucadas sobre o umbigo[,] depois dará a beber duas oitavas de pós da dita erva seja com p. 16833 leite o[u] com açúcar clarificado[,] e isto a pessoas grandes[;] aos pequenos basta uma oitava de pós da dita erva, também para o mesmo serve uma onça de sumo com um pouco de açúcar o[u] mel, e da mesma maneira se pode tomar a modo do vomitório[,] uma onça de lambedor[,] duas de água e meia de vinagre aproveita também para deitar as lombrigas[,] untará a boca do estômago e umbigo com óleo santo e botar-lhe em cima uma oitava de pós da erva[,] e apertando com uma toalha par[a] não lhe cair os pós.
|para desapegadas Para sanguessugas também serve cal viva|34 Para fazer despegar as sanguessugas de qualquer parte que estiver[,] assim aos homens como as mulheres[,] tomará um pouco de pós da dita erva seca[,] os quais meterão em um canudo de bambu delgado[,] e soprando sobre a sanguessuga de modo que lhe toque[,] porque em tocando logo o fez despegar[.] Este segredo me ensinou uma pessoa grave com o qual se faz em Alentejo muito serviço a nosso Senhor pelas muitas p. 85 169 sanguessugas que havia lá naquela terra[.]
Para dores de juntas As dores[,] sendo de frio[,] aplicará suas folhas quentes do modo que fica dito[,] repetindo as vezes que for necessário[,] também o sumo pode aplicar a modo de cólica e desta maneira resolve o humor poderosamente[;] e se as dores forem de humor quente não serve[m] este[s] remédios que farão dano[,] salvo quando o humor quente estiver já resolvido, o que tiver de útil e ficar somente o grosso porque neste caso: aproveita como se fosse coisa fria[.] Advirto que não somente nas juntas senão em qualquer parte do corpo que houver dores causadas de frio o[u] de ventosidade [é virtuosa].
Para apostemas e leicenços Para apostemas e leicenços35 de toda a sorte[,] principalmente as que são de frio[,] porque as desfaz e resolve36 em breve tempo[,] lavando-a primeiro com o sumo da dita erva quente e pondo em cima suas folhas machucadas assim mesmo quente[.] E depois que apostema estiver aberta[,] p. 170 aberta pode lhe aplicar unguento santo com a sua mecha se for necessário[,] e quando não seja fios secos em cima[,] uma prancheta37 do dito unguento[,] e fazendo desta maneira em breve tempo sararão. Até encourar não tem necessidade de outra cirurgia[,] e quem usar desta cura esteja38 certo que nunca [a] apostema criará corrupção[.]
Para dor dos dentes Principalmente as dores que são causadas de humores frios ou de reumas39 caídas da cabeça lavará primeiro os dentes com o sumo da dita erva e há de ser morna[,] lavará três [deixando estar na boca por alguns espaços de cada vez]40 ou quatro vezes, que se tomar, depois de feito isto se meterá uma pequena da erva no buraco dos dentes se o tiver[,] não tendo buraco ponha a roda dos dentes, também será bom a raiz da dita porque me disseram[,] mas ainda não experimentei[.]
Para impigens Para toda a sorte de impigens seja nova p. 86 171 o[u] velha[,] aplicando primeiro o sumo algumas vezes[,] esfregando a impigem com ela[,] e depois untará unguento santo as vezes que for necessário até sarar[.] e[E] para [ter] mais força este unguento lhe botará outro tanto de de sumo de alhos o[u] arroz41[,] fervendo tudo junto em fogo brando até gastar o sumo[.]
Para veneno e feridas venenosas Aplicando seu sumo sobre as feridas[,] a mesma erva quente um pouco sobre o rescaldo[,] e com este remédio escusa o solimão42 de que antes usavam por ser muito mais eficaz[.] Serve assim mesmo a dita erva aos que tem veneno tomado pela boca[,] o[u] seja solimão[,] o[u] cabelo de tigre[,] o[u] outra qualquer coisa[,] e[,] finalmente[,] para todo o gênero de peçonhas[,] tomando logo o sumo da erva santa pela boca [-] a quantidade de uma onça de primeira vez [-]. e[E] depois se pode acrescentar43 mais[,] não passe de três onças de cada vez, e deste sumo serve, por alguns dias[.] [tomar a dita erva fresca ou seca, mastigada por si só ou misturada com outra coisa] Também serve para o mesmo[,] se pode usar p. 172 do lambedor santo tomando por algumas vezes[,] quantidade de uma onça por cada vez mais ou menos[,] conforme a idade que tem a pessoa[.] Também para o mesmo será bom tomar uma ajuda que é o seguinte[:] tomará cozimento de malvas com onças de acelgas[,] duas onças da erva santa[,] uma onça de mel o[u] iagra 44 [,] uma onça de óleo santo[,] tudo morno[,] se fará ajuda e se aplique ao enfermo[,] o qual fará para reter muito tempo[,] e sendo caso que alcance logo será bem tomar outra[.]
Para feridas frescas Para toda a sorte de feridas frescas faz a nossa erva santa espantosas curas[,] porque unindo-as ao sol[,] dando-as pela primeira intenção e depois pouco a pouco as vai trazendo à perfeita saúde.
Modo de curar Primeiramente lavando-a com vinho quente[,] e se houver necessidade[,] cortando a superfície[.] Feito isto[,] se lhe aplicarão panos molhados no sumo da dita erva o[u] a mesma erva pisada[,] e apertando bem se deixe esta erva p. 87 173 por espaço de 24 horas[,] e passadas se fará outra cura como a primeira[,] e daí por diante[,] pode ir curando com as sobre ditas coisas[,] as vezes que for necessário conforme parece de quem fizer a cura[.] E depois que a ferida tiver matéria[,] se lhe aplicará sua mecha molhada no óleo santo[,] em cima uma prancheta [d]o unguento santo[,] e não havendo buraco para mecha se pode usar de fios secos[.] E somente esta cura se pode continuar até encourar ferida[,] porque o mesmo unguento tem singular virtude para isso[.]
Advertência Em semelhante cura só deve ter muito bom Regimento[,] e fazendo exa cura soins45 como sangrias[,] purgas leves[,] e o que mais parecer o[u] quem curar conforme a ferida e as feridas que curarem com o benefício da erva[,] raramente chegarão [as quais vem logo ou que vier]46 a curar herpes nem alguma outra corrupção [quando venha cura]47[.]
Para chagas velhas Para chagas velhas[,] ainda que sejam de 12 e de 15 anos[,] a nossa erva santa faz maravilhosas curas, e que aplicando primeiro o sumo e as folhas e depois o unguento e óleo mais as chagas sejam lavadas e alimpadas a podridão[.]
Para boubas Para quem tiver boubas no rosto ou na cabeça[,] do modo que afetam muito[,] pode-se aplicar o sumo da erva as partes onde estiverem as boubas[,] e depois de continuar alguns dias[,] se lhe pode aplicar umas vezes o unguento e outras vezes o óleo[,] e com isso se pode curar de todo o corpo[,] senão para as advertir e afugentar destes lugares que para as demais se deve usar das curas que apontam os médicos[.] Outras muitas virtudes têm a erva que até agora não andam em uso e por isso não as ponho aqui[,] mas o tempo as irá descobrindo para que todos nós aproveitemos delas[,] o certo é que a erva é proveitosa particularmente aos pobres pela qual razão lhe dei 48 bem o nome que por excelente lhe puseram que é erva santa[.]
Lambedor santo Tomarão a erva colhida no mês de maio[,] a quantidade que quiser[,] a qual se pisará muito bem em gral49 de pedras o[u] de pau[,] espremerá50 seu sumo[,] feito isto se cozerá em fogo brando[,] tirando-lhe a espuma que alevantar por cima e como não deitar espuma[,] então tomará p. 88 175 a quantidade que quiser[,] e ajunte com outro tanto [de] açúcar assim clanficado[,] e depois ferva tudo junto em fogo brando até ter ponto grosso de conserva [,]e feito desta maneira dura um ano[,] e deste lambedor se pode tomar de cada vez de meia onça até duas conforme a necessidade [de] força[.] Este lambedor feito desta maneira fica muito forte, querendo usar de outro mais brando tomará uma parte de sumo[,] uma e meia de açúcar e de tudo se fará lambedor pelo modo que fica dito[,] e por esta ordem se pode fazer mais brando e mais forte conforme a necessidade de cada um[.] Também se pode ajuntar a este lambedor quando se fizer para mitigar sua quentura algum sumo de erva fresca como são almeirões[,] chicórias[,] erva moura[,] dormideira e outra erva desta sorte como alface e do sumo da dita erva[,] pode se ajuntar pouco mais o[u] menos conforme a pessoa a quem se há de aplicar for mais ou menos quente do fígado[.]
Para fazer óleo santo Tomará o sumo da dita erva colhida no mês de maio[,] clarificado a quantidade que quiser[,] o qual ajuntará outro tanto de azeite de coco que não seja antigo de muito tempo ou azeite de gergelim[,] e tudo junto ferva em fogo brando até gastar o sumo que logo se sai quando não faz matinada no ferver[,] nem levantar um certo vapor ou umidade que levanta qualquer licor úmido quando ferve[,] p. 176 e desta maneira fica óleo perfeito[,] e guarda no vaso de vidro o[u] vidrado que durará dois anos
Outro óleo [vide alium modum quenime docuit P ígnacius da Costa 177] 51 Este óleo feito de três permutações que tem mais força - Tome azeite de gergelim o[u] de coco[,] uma canada e dois arráteis da erva colhida no mês de maio machucada[,] e botará no dito azeite em um vaso capaz, o qual se porá ao sol por sete dias e depois se porá a cozer no fogo brando até gastar toda a umidade[,] o qual se conhece quando não faz matinado nem levantar vapor. Feito isto se coará o azeite e tire a erva fora[,] e no mesmo azeite se botará outros dois arráteis da erva e faça como da primeira vez[,] pondo ao sol e depois se cozerá como fica dito[,] como acabar fará outra do mesmo modo como fica da primeira e [d]a segunda vez[,] e quem o fizer desta maneira terá óleo perfeito de três permutações como de ordinário manda fazer os médicos[.]
Unguento santo Unguento santo não é outra coisa senão tomar uma parte de cera e três do óleo de qualquer que seja do sobredito[,] e querendo unguento mais duro lhe pode botar mais pouca coisa de cera e não muito porque a cera não é outra coisa[,] se não para dar corpo[.]
Lambedor da erva seca p. 89 177 Em duas canadas de água[,] estando fervendo[,] se bote meio arrátel da erva seca com o qual dará uma fervura[,] e depois tire do fogo e [a]bafe por espaço de seis horas[,] depois disso coará por um pano[,] depois a mesma água fervendo outra vez se bote outro meio arrátel da erva[,] e por esta ordem se pode dar a dita água mais ou menos infusões conforme quiserem o lambedor mais ou menos forte[.] Depois lhe ajuntará outro tanto [de] açúcar clarificado[,] com qual ferverá em fogo brando até ficar em ponto grosso de conserva[,] e também desta maneira fica o lambedor muito perfeito e durará um ano e tomasse de meia onça até duas[.]
Óleo de erva seca De infusão da erva seca feita com cinco permutações[,] do modo que para o lambedor fica dito uma parte de azeite de coco o[u] de gergelim e outro tanto da erva[,] e tudo junto ferva até gastar a umidade como acima fica dito[,] feito deste modo fica muito perfeito[,] e deste óleo também se pode fazer unguento[,] ajuntando será na forma que acima fica dito - este é lambedor óleo o[u] unguento que acima falei tratando a virtude da erva santa[.] Finis íaus deo 52 Leonel de Souza 53

AGRADECIMENTOS

Este artigo é fruto das pesquisas desenvolvidas pela autora em estágio de pós-doutoramento realizado junto ao Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (PPGHCS/FIOCRUZ), financiado por essa instituição, e sob supervisão da Profa. Dra. Lorelai Brilhante Kury. Faz parte, ainda, das reflexões empreendidas pelo grupo de pesquisa “Escritos sobre os novos mundos” (processo FAPESP 13/14786-6), do qual é membro.

  • 1
    Esta antiga expressão latina é original do evangelho (1 Cor. 10:25) e apareceu, pela primeira vez, ligada ao tabaco nos escritos do padre Manuel da Nóbrega (Nóbrega, 1988Nóbrega, M. (1988). Cartas jesuíticas 1. Belo Horizonte: Itatiaia., p. 112). Foi traduzida por Caldeira (2008, p. 9)Caldeira, A. M. (2008). O tabaco: percurso de uma “planta medicinal” entre a América e a Europa. In Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos Trópicos, Instituto de Investigação Científica Tropical, Lisboa. como: “Não o que é útil para mim mas para o maior número, a fim de que sejam salvos.”
  • 2
    Como homenagem à Rainha Catarina de Médici (Léry, 1972Léry, J. (1972). Viagem à terra do Brasil (S. Milliet, Trad. &> Not.). São Paulo: Martins.).
  • 3
    Para mais informações sobre François (ou Francisco) de Rougemont, sobretudo relacionadas a outras produções bibliográficas, ver Golvers (1999)Golvers, N. (1999). François de Rougemont, S. J., Missionary in Ch’ang-Shu (Chiang-Nan): a study of the account book (1674-1676) and the Elogium (Vol. 7). Leuven: Ferdinand Verbiest Foundation K. U. Leuven..
  • 4
    Consoante à pesquisa de Fernando do Amaral Gomes, não foram encontradas quaisquer referências a ele nas principais crônicas de ordens religiosas – dominicanos, jesuítas e franciscanos (Quétif & Echard, 1719Quétif, J., & Échard, J. (1719). Scriptores ordinis praedicatorum recensiti, notisque historicis et criticis illustrati. Paris: Ballard et Simart.; Leite, 2004Leite, S. (2004). História da Companhia de Jesus no Brasil (Vol. 4). São Paulo: Loyola.). No entanto, é possível supor, a partir da presença do texto em uma compilação do jesuíta François/Francisco Rougemont, que Leonel de Souza obrasse nessa Ordem.
  • 5
    Há mais de sessenta espécies da planta Nicotiana: algumas poucas parecem ser nativas da Austrália e a esmagadora maioria é associada ao continente americano.
  • 6
    Em linhas bastante gerais, a teoria humoral, também referida como hipocrático-galênica, pressupunha ser o corpo uma espécie de microcosmo, em que as qualidades dos quatro elementos constituintes da natureza poderiam ser encontrados. A saúde seria alcançada ou mantida quando essas partes constituintes, os humores, encontravam-se em equilíbrio; a doença, por sua vez, poderia ser explicada pela sua falta, excesso ou corrupção. Sangue, fleuma, cólera e melancolia são os quatro humores primários, ao passo que seco/úmido, frio/quente, delgado/grosso e doce/amargo configuram-se como suas qualidades, aos pares.
  • 7
    Um balanço historiográfico sobre o papel do tabaco na economia colonial pode ser consultado em Acioli (2005)Acioli, G. (2005). A ascensão do primo pobre: o tabaco na economia colonial da América portuguesa – um balanço historiográfico. Saeculum: Revista de História, (12), 22-37..
  • 8
    Apenas para indicá-las, destaco que, já no Setecentos, mais precisamente em 1720, o padre Afonso da Costa, missionário da Companhia em Goa, remete-se, em um trabalho que lhe ocupou por mais de três décadas, a “Árvore da Vida dilatada em vistosos e salutiferos ramos ornados de muitas aprasiveis, e saudiveis folhas, em que se deixa ver muitos e singulares remedios assim simplices, como compostos, que a Arte, e experiencia, a industria, e a curiosidade descubrio, para curar com facilidade quasi todas as doenças, e queixas, a que o corpo esta sogieto, principalmente em terras desitiduas de Medicos e Boticos. Copiados de diversos Authores assim impressos, como manuscriptos, de varias noticias e experiencias vistas e aprovadas... Offerecida pelo Padre Affonso da Costa da Companha de Jesus da Provincia de Goa” (Costa, 1720Costa, A. (1720). Árvore da Vida dilatada em vistosos e salutiferos ramos ornados de muitas aprasiveis, e saudiveis folhas, em que se deixa ver muitos e singulares remedios assim simplices, como compostos, que a Arte, e experiencia, a industria, e a curiosidade descubrio, para curarcom facilidade quasi todas as doenças, e queixas, a que o corpo esta sogieto, principalmente em terras desitiduas de Medicos e Boticos. Copiados de diversos Authores assim impressos, como manuscriptos, de varias noticias e experiencias vistas e aprovadas... Offerecida pelo Padre Affonso da Costa da Companha de Jesus da Provincia de Goa. (fl.1720). Londres: Wellcome Library.). Em 1766, já após a expulsão dos inacianos dos domínios lusos, encontramos na “Colleção de varias receitas e segredos particulares das principais boticas da nossa Companhia de Portugal, da Índia de Macao e do Brazil compostas e experimentadas pelos melhores médicos e boticários mais célebres que tem havido nestas partes” (1766)Colleção de varias receitas e segredos particulares das principais boticas da nossa Companhia de Portugal, da Índia de Macao e do Brazil compostas e experimentadas pelos melhores médicos e boticários mais célebres que tem havido nestas partes. (1766). Archive of the Society of Jesus, Roma., compilação anônima valorosa para compreender a disseminação do conhecimento médico no mundo colonial português, o emprego da erva santa no ‘emplastro magistral’, elaborado na Botica do Colégio de Macau (com a referência a ‘nicociana’) e no ‘emplastro de tabaco’, do Irmão André da Costa, da Botica do Colégio da Bahia (como tabaco), pelas virtudes curadoras de chagas, e como ‘sal de tabaco’ na mais famosa receita do mesmo Colégio, a ‘Triaga Brasílica’, entre mais de trezentas preparações médicas detalhadas. A “Colleção de varias receitas e segredos particulares das principais boticas da nossa Companhia de Portugal, da Índia de Macao e do Brazil compostas e experimentadas pelos melhores médicos e boticários mais célebres que tem havido nestas partes” (1766)Colleção de varias receitas e segredos particulares das principais boticas da nossa Companhia de Portugal, da Índia de Macao e do Brazil compostas e experimentadas pelos melhores médicos e boticários mais célebres que tem havido nestas partes. (1766). Archive of the Society of Jesus, Roma. foi recentemente editada por Viotti e França (2019)Viotti, A. C. C., & França, J. M. C. (2019). Coleção de várias receitas e segredos de nossa Companhia de Portugal, da Índia, de Macau e do Brasil. São Paulo: Edições Loyola..
  • 9
    Humor pode ser compreendido como líquido que gira e circula nos vasos do corpo humano e nos das plantas para a vegetação de todos os corpos (Silva, 1813Silva, A. M. (1813). Diccionario da lingua portugueza: recompilado dos vocabularios impressos ate agora, e nesta segunda edição novamente emendado e muito acrescentado, por Antonio de Moraes Silva. Lisboa: Typographia Lacerdina.); medicamente falando, pelos humores, não se entende só os quatro humores do corpo, como é o sangue, a fleuma, a cólera e a melancolia, mas todas as mais umidades, como é o leite, o esperma e, ainda, os humores excrementícios, como a saliva, as lágrimas e o soro do sangue (Bluteau, 1712-1728Bluteau, R. (1712-1728). Vocabulario portuguez, e latino, aulico, anatomico, architectonico, bellico, botanico...: autorizado com exemplos dos melhores escritores portuguezes, e latinos; e offerecido a El Rey de Portugal D. Joaõ V. (Vol. 8). Coimbra: Collegio das Artes da Companhia de Jesus/Lisboa: Officina de Pascoal da Sylva.).
  • 10
    Há, entre as linhas 5 e 6, uma anotação ilegível, como se se tratasse de uma nota, indicada com o número 1. Essa menção não aparece em nenhuma das duas edições consultadas de Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., 1962)Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e..
  • 11
    Bostela significa pústula ou ferida (Silva, 1813Silva, A. M. (1813). Diccionario da lingua portugueza: recompilado dos vocabularios impressos ate agora, e nesta segunda edição novamente emendado e muito acrescentado, por Antonio de Moraes Silva. Lisboa: Typographia Lacerdina.).
  • 12
    Em Gomes (1962, p. 11)Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., consta ‘asseguro’.
  • 13
    Há uma anotação – com transcrição literal, “scabiejin – star movbus est in capile pueri sus obnoxi” – que não é indicada em nenhuma das obras de Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., 1962)Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e..
  • 14
    Tinha corresponde a escábia; sarna chata; espécie de lepra na cabeça (Bluteau, 1712-1728Bluteau, R. (1712-1728). Vocabulario portuguez, e latino, aulico, anatomico, architectonico, bellico, botanico...: autorizado com exemplos dos melhores escritores portuguezes, e latinos; e offerecido a El Rey de Portugal D. Joaõ V. (Vol. 8). Coimbra: Collegio das Artes da Companhia de Jesus/Lisboa: Officina de Pascoal da Sylva.); lepra que faz cair cabelo (Silva, 1813Silva, A. M. (1813). Diccionario da lingua portugueza: recompilado dos vocabularios impressos ate agora, e nesta segunda edição novamente emendado e muito acrescentado, por Antonio de Moraes Silva. Lisboa: Typographia Lacerdina.).
  • 15
    Apoplexia significa ataque do cérebro que priva da sensibilidade e movimento, com ronquido e dificuldade de respirar (Silva, 1813Silva, A. M. (1813). Diccionario da lingua portugueza: recompilado dos vocabularios impressos ate agora, e nesta segunda edição novamente emendado e muito acrescentado, por Antonio de Moraes Silva. Lisboa: Typographia Lacerdina.); mal que, como raio, fere e derruba subitamente (Bluteau, 1712-1728Bluteau, R. (1712-1728). Vocabulario portuguez, e latino, aulico, anatomico, architectonico, bellico, botanico...: autorizado com exemplos dos melhores escritores portuguezes, e latinos; e offerecido a El Rey de Portugal D. Joaõ V. (Vol. 8). Coimbra: Collegio das Artes da Companhia de Jesus/Lisboa: Officina de Pascoal da Sylva.).
  • 16
    No manuscrito, há a inscrição em latim “tempore – [ilegível]”, não mencionada nas duas edições consultadas.
  • 17
    Em Gomes (1962, p. 12)Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., está como “no rescaldo e molhando”.
  • 18
    Em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., 1962)Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., a passagem é inclusa na sequência da receita, inserindo um ponto final.
  • 19
    Em Gomes (1961, p. 219; 1962, p. 12)Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., se escreve muita.
  • 20
    Onça é a duodécima parte de uma libra romana (Bluteau, 1712-1728Bluteau, R. (1712-1728). Vocabulario portuguez, e latino, aulico, anatomico, architectonico, bellico, botanico...: autorizado com exemplos dos melhores escritores portuguezes, e latinos; e offerecido a El Rey de Portugal D. Joaõ V. (Vol. 8). Coimbra: Collegio das Artes da Companhia de Jesus/Lisboa: Officina de Pascoal da Sylva.); medida de líquidos de boticário (Silva, 1813Silva, A. M. (1813). Diccionario da lingua portugueza: recompilado dos vocabularios impressos ate agora, e nesta segunda edição novamente emendado e muito acrescentado, por Antonio de Moraes Silva. Lisboa: Typographia Lacerdina.).
  • 21
    Fleuma significa humor úmido e frio que se acha no corpo humano; flegma; pituita (Silva, 1813Silva, A. M. (1813). Diccionario da lingua portugueza: recompilado dos vocabularios impressos ate agora, e nesta segunda edição novamente emendado e muito acrescentado, por Antonio de Moraes Silva. Lisboa: Typographia Lacerdina.).
  • 22
    Lambedor é uma composição farmacêutica, de consistência mediana entre o xarope e os eletuários moles, assim chamado porque o enfermo não o bebe propriamente, mas o deixa deslizar aos poucos pela garganta, de certo modo lambendo-o (Bluteau, 1712-1728Bluteau, R. (1712-1728). Vocabulario portuguez, e latino, aulico, anatomico, architectonico, bellico, botanico...: autorizado com exemplos dos melhores escritores portuguezes, e latinos; e offerecido a El Rey de Portugal D. Joaõ V. (Vol. 8). Coimbra: Collegio das Artes da Companhia de Jesus/Lisboa: Officina de Pascoal da Sylva.).
  • 23
    Em Gomes (1962, p. 12)Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., a palavra aparece equivocadamente como “muita”.
  • 24
    Vomitório significa medicamento que tomado pela boca obriga o estômago a expelir os maus humores que tem (Bluteau, 1712-1728Bluteau, R. (1712-1728). Vocabulario portuguez, e latino, aulico, anatomico, architectonico, bellico, botanico...: autorizado com exemplos dos melhores escritores portuguezes, e latinos; e offerecido a El Rey de Portugal D. Joaõ V. (Vol. 8). Coimbra: Collegio das Artes da Companhia de Jesus/Lisboa: Officina de Pascoal da Sylva.).
  • 25
    Em Gomes (1962, p. 13; 1961, p. 219)Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., a palavra aparece escrita erroneamente como “muita”.
  • 26
    Em Gomes (1962, p. 13; 1961, p. 219)Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., se escreve erroneamente “muita”.
  • 27
    Canada significa medida de líquidos; contém quatro quartilhos, a duodécima parte de um almude (Silva, 1813Silva, A. M. (1813). Diccionario da lingua portugueza: recompilado dos vocabularios impressos ate agora, e nesta segunda edição novamente emendado e muito acrescentado, por Antonio de Moraes Silva. Lisboa: Typographia Lacerdina.).
  • 28
    A paginação do manuscrito é 100, mas, em Gomes (1962Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., 1961)Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., a paginação é 83v.
  • 29
    Mordexim é uma doença ordinária entre os índios que enfraquece o estômago e causa contínuos suores, indigestão e falta de cozimento (Bluteau, 1712-1728Bluteau, R. (1712-1728). Vocabulario portuguez, e latino, aulico, anatomico, architectonico, bellico, botanico...: autorizado com exemplos dos melhores escritores portuguezes, e latinos; e offerecido a El Rey de Portugal D. Joaõ V. (Vol. 8). Coimbra: Collegio das Artes da Companhia de Jesus/Lisboa: Officina de Pascoal da Sylva.); cólera-morbo (Silva, 1813Silva, A. M. (1813). Diccionario da lingua portugueza: recompilado dos vocabularios impressos ate agora, e nesta segunda edição novamente emendado e muito acrescentado, por Antonio de Moraes Silva. Lisboa: Typographia Lacerdina.).
  • 30
    Em Gomes (1961, p. 220)Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., está como “fermentação”.
  • 31
    Em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., p. 220; 1962Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., p. 13), não há indicação da rasura.
  • 32
    Em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., p. 220; 1962Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., p. 13), grafa-se erroneamente “inferno”.
  • 33
    Em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., p. 220; 1962Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., p. 14), aqui se inicia a página F84v.
  • 34
    Frase situada na linha 1 e entre as linhas 1 e 2 da receita.
  • 35
    Leicenço significa tumor com inflamação nas partes carnosas; furúnculo (Bluteau, 1712-1728Bluteau, R. (1712-1728). Vocabulario portuguez, e latino, aulico, anatomico, architectonico, bellico, botanico...: autorizado com exemplos dos melhores escritores portuguezes, e latinos; e offerecido a El Rey de Portugal D. Joaõ V. (Vol. 8). Coimbra: Collegio das Artes da Companhia de Jesus/Lisboa: Officina de Pascoal da Sylva.).
  • 36
    Em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., p. 220; 1962Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., p. 15), está escrito “revolve”.
  • 37
    Prancheta é um tipo de massa de fios chata, usada para curar feridas (Silva, 1813Silva, A. M. (1813). Diccionario da lingua portugueza: recompilado dos vocabularios impressos ate agora, e nesta segunda edição novamente emendado e muito acrescentado, por Antonio de Moraes Silva. Lisboa: Typographia Lacerdina.).
  • 38
    Em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., p. 221; 1962Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., p. 15), consta “esteia”.
  • 39
    Reuma é um fluxo ou corrimento de humor crasso ou indigesto (Silva, 1813Silva, A. M. (1813). Diccionario da lingua portugueza: recompilado dos vocabularios impressos ate agora, e nesta segunda edição novamente emendado e muito acrescentado, por Antonio de Moraes Silva. Lisboa: Typographia Lacerdina.).
  • 40
    A observação aparece entre as linhas três e quatro da receita. Em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., p. 221; 1962Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., p. 15), a frase fica apresentada da seguinte maneira: “lavará três o quatro vezes deixando estar na boca por alghu espaço de cada vez que se tomar”.
  • 41
    Em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., p. 222; 1962Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., p. 16), se escreve “o parros”.
  • 42
    Solimão é uma composição de azougue, sal amoníaco, ou salitre e vitríolo sublimados e reduzidos a uma massa mortalmente venenosa; veneno. Prepara-se, porém, o solimão de um modo que se toma pela boca com muita segurança e suavidade (Bluteau, 1712-1728). Em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., p. 222; 1962Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., p. 16), se escreve “o limão”.
  • 43
    Em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., p. 222; 1962Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., p. 16), se escreve como “encontrar”.
  • 44
    Iagra é o açúcar de palmeiras; jagra (Bluteau, 1712-1728Bluteau, R. (1712-1728). Vocabulario portuguez, e latino, aulico, anatomico, architectonico, bellico, botanico...: autorizado com exemplos dos melhores escritores portuguezes, e latinos; e offerecido a El Rey de Portugal D. Joaõ V. (Vol. 8). Coimbra: Collegio das Artes da Companhia de Jesus/Lisboa: Officina de Pascoal da Sylva.).
  • 45
    O trecho é incluído em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., 1962)Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e. como exe a cura suins. Exa, do latim exire (sair, derivar), e, acreditamos, soins, em tradução livre do francês, cuidar. As três palavras – exa cura soins – estão grifadas no manuscrito.
  • 46
    Entre as linhas 5 e 6 da ‘advertência’ da receita. A frase não foi incluída em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., p. 223; 1962Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., p. 17).
  • 47
    Linha abaixo da receita. A frase não foi incluída em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., p. 223; 1962Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., p. 17).
  • 48
    Em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., p. 223; 1962Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., p. 17), se escreve “diz”.
  • 49
    Gral (de pedra) é um instrumento como vaso fundo de mármore ou marfim no qual se pisam ou trituram medicamentos (Silva, 1813Silva, A. M. (1813). Diccionario da lingua portugueza: recompilado dos vocabularios impressos ate agora, e nesta segunda edição novamente emendado e muito acrescentado, por Antonio de Moraes Silva. Lisboa: Typographia Lacerdina.); almofariz (Bluteau, 1712-1728Bluteau, R. (1712-1728). Vocabulario portuguez, e latino, aulico, anatomico, architectonico, bellico, botanico...: autorizado com exemplos dos melhores escritores portuguezes, e latinos; e offerecido a El Rey de Portugal D. Joaõ V. (Vol. 8). Coimbra: Collegio das Artes da Companhia de Jesus/Lisboa: Officina de Pascoal da Sylva.).
  • 50
    Em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., p. 223; 1962Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e., p. 18), se escreve “e as primeira”.
  • 51
    Esta anotação aparece ao lado esquerdo da receita, referindo que um outro preparo poderia ser encontrado sob o registro do padre Inácio da Costa. Em Machado (1759, p. 303)Machado, D. B. (1759). Bibliotheca lusitana, histórica critica, e chronologica na qual se compreende a noticia: dos authores portuguezes, e das obras, que compozerão defde o tempo da promulgação da Ley da Graça até o tempo prefente (Vol. 4.) Lisboa: Na Officina Patriarcal de Francisco Luiz Ameno., ver breve menção a este religioso.
  • 52
    Em referência à expressão latina ‘louvado seja Deus’ e ao final do texto.
  • 53
    Há, após a assinatura, um breve parágrafo quase no rodapé do fólio, pouco legível e em latim, com indicações, ao que pudemos inferir, sobre as virtudes do emprego do óleo de gergelim e do óleo de rosas, indicados nas páginas 175 e 176 (em que constam as receitas de lambedor santo e óleo santo). Não há menção a este pequeno adendo em Gomes (1961Gomes, F. A. (1961). Contribuição para o estudo da medicina portuguesa no período da expansão. In Actas do Congresso International de História dos Descobrimentos, Lisboa., 1962)Gomes, F. A. (1962). O estudo da erva santa que é o tabaco: manuscrito ignorado pelo Padre Leonel de Sousa. Porto: s/e..
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Abr 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    11 Dez 2019
  • Aceito
    04 Fev 2020
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