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Visibilidade e intencionalidade das pinturas rupestres no sítio GO-CP-33, em Palestina de Goiás, Brasil

Visibility and intention of the rock paintings in the GO-CP-33 site, in Palestina de Goiás, Brazil

Resumo

As pinturas rupestres do sítio GO-CP-33 estão localizadas no município de Palestina de Goiás, na região sudoeste do estado de Goiás. As figuras são marcadas por expressões que remetem a movimento, elas se diferenciam das demais tradições rupestres do Brasil. A análise dos grafismos possibilitou a percepção da distribuição espacial das imagens, da medição da altura dos painéis e da organização dos dados para verificação do alcance visual das figuras, tomando como referência uma pessoa que estivesse diante dos painéis rupestres. A partir dos dados, ficou sugerido que as escolhas dos suportes rochosos estiveram relacionadas a diferentes estratégias de visibilidade: alguns grafismos foram postos para serem vistos com facilidade e outros, pouco acessíveis ao olhar. Tomou-se como base que as representações rupestres são detentoras de sentidos diversos, dotadas de agência e relacionadas a práticas culturais para as quais a memória coletiva dos ocupantes teria sido um elemento temporal relevante. Entendemos que as articulações envolvidas na visibilidade das figuras não se encerram na dicotomia em torno do ‘ver’, mas fazem parte de uma dinâmica interativa constituída pelo alcance visual, pelo tema das composições gráficas e pelo contexto em que se encontram e podem estar também articuladas a outras dimensões da cultura.

Palavras-chave
Pinturas rupestres; Palestina de Goiás; Visibilidade e intenção; Memória

Abstract

The rock paintings of the GO-CP-33 site are located in the municipality of Palestina de Goiás in the southwest of the state of Goiás. The images are characterized by expressions that suggest movement, and they differentiate from other traditions in Brazil. The rupestrian paintings were analyzed, indicating the spatial distribution of the images, the height of the panels, and the organization of the data to verify the visual range of the figures, having the person who was in front of the cave panels as a reference. It was suggested that the choices for rock support were related to different visibility strategies. Some rock paintings were made to be easily seen, and the eyes did not easily capture others. It was taken as a basis that the rock representations hold different meanings. It was taken as a basis that the rock representations hold different meanings, endowed with agency and related to cultural practices for which the collective memory of the occupants would have been a relevant temporal element. We understand that the articulations involved in the figures' visibility are not restricted to the dichotomy of “seeing”. Instead, they are part of an interactive dynamic constituted by the visual reach, the theme of the graphic compositions, and the context in which they are. It can also be articulated with other aspects of culture.

Keywords
Rock painting; Palestina de Goiá; Visibility and intention; Collective memory

APRESENTAÇÃO

Neste artigo, trataremos de algumas práticas culturais pretéritas e materializadas nos paredões rochosos do sítio arqueológico GO-CP-33: os grafismos rupestres. Eles serão tratados em termos de distribuição espacial e de potencial de visibilidade. Segundo Boado (1993Boado, F. C. (1993). Visibilidad e interpretacion del registro arqueológico. Trabajos de Prehistoria, 50, 39-56. https://doi.org/10.3989/tp.1993.v50.i0.488
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, 1995)Boado, F. C. (1995). The visibility of the archaeological record and the interpretation of social reality. In I. Hodder, M. Schanks, A. Alexanri, V. Buckhli & G. Lucas (Eds.), Interpretating archaeology: Finding meaning in the past (pp. 194-204). Routledge., os estudos acerca das condições de visibilidade dos registros arqueológicos são bons para entender aspectos da realidade sociocultural da qual eles derivam. Aspectos resultantes de práticas socioculturais podem se manifestar com ‘disposição de visibilidade’, materializando-se a partir de intenções ‘conscientes e explícitas’ ou veladas e inconscientes’, respondendo a uma lógica intrínseca e emergente dos processos nos quais estão envolvidos.

Nessa perspectiva, os grafismos rupestres não são avaliados por si mesmos ou para si mesmos, mas conectados a elementos externos, embora não desintegrados do seu contexto. Esses elementos externos são os espaços onde se situam as imagens e as pessoas produtoras dessas imagens, mas também aquelas que as viram e interagiram com elas no passado e nós que, na atualidade, as vemos a partir de outro prisma. O presente trabalho dialoga com a ‘dialética do ver’, considerada um campo reflexivo para se pensar os grafismos rupestres em que a imagem, numa perspectiva dialética, é tida como atemporal, “. . . eterna, que escapa, por essência, à historicidade” (Didi-Huberman, 2005Didi-Huberman, G. (2005). Ante el Tiempo. (Oscar Antonio Oviedo Funes, Trad.). Adriana Hidalgo Editora., p. 29), mas também histórica, ao emergir no presente (Costa, 2009Costa L. B. (2009). Imagem dialética/imagem crítica: Um percurso de Walter Benjamin a George Didi-Huberman. V Encontro de História da Arte, IFCH, UNICAMP, Campinas, São Paulo. https://www.ifch.unicamp.br/eha/atas/2009/DA%20COSTA,%20Luciano%20Bernadino%20-%20VEHA.pdf
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, p. 88). Por essa abordagem, o ato de ‘dar a ver’ não é somente o de dar visibilidade àqueles que congregam práticas comuns, mas, numa perspectiva ativa, está relacionado ao ‘inquietar o ver’, posicionando-o como provocativo, aberto “. . . entre aquele que olha e aquilo que é olhado” (Didi-Huberman, 1998Didi-Huberman, G. (1998). O que vemos, o que nos olha (P. Neves, Trad.). Ed. 34., p. 77).

Assim, interessa investigar como os espaços diferenciados de representação dos conjuntos de figuras rupestres do sítio GO-CP-33 podem estar relacionados a possíveis critérios de escolhas (intencionais ou não) de suporte e suas possíveis articulações com a dialética do ver. Numa perspectiva de longevidade, buscamos, igualmente, compreender tais manifestações enquanto partes de memórias coletivas de seus produtores e/ou de seus ocupantes posteriores.

O tema da visibilidade de grafismos rupestres vem sendo discutido no Brasil a partir de dois aspectos principais: o que considera a visibilidade do sítio integrado à paisagem – congregando as noções físicas e culturais de paisagem e as interrelações entre sítios – e aquele que se propõe ao acesso visual das figuras rupestres no interior dos sítios – buscando no alcance diferencial e em sua disposição espacial nuances referentes às escolhas vinculadas às práticas culturais.

O primeiro aspecto não se coaduna diretamente com a proposta do presente artigo. Sobre estudos voltados a paisagens e grafismos realizados no Brasil, destacamos a análise de Isnardis (2009)Isnardis, A. (2009). Interações e paisagens nas paredes de pedra – padrões de escolha de sítio e relações diacrônicas entre as unidades estilísticas de grafismos rupestres do vale do Peruaçu. Arquivos do Museu de História Natural, 21, 321-358., quando observa um crescimento nas abordagens voltadas à relação entre distribuição de sítios rupestres e elementos naturais presentes na paisagem. Tal perspectiva vem sendo fortalecida ao longo dos anos e, certamente, as pesquisas no vale do Peruaçu (Isnardis, 2009Isnardis, A. (2009). Interações e paisagens nas paredes de pedra – padrões de escolha de sítio e relações diacrônicas entre as unidades estilísticas de grafismos rupestres do vale do Peruaçu. Arquivos do Museu de História Natural, 21, 321-358.; Isnardis & Linke, 2010Isnardis, A., & Linke, W. (2010). Pedras pintadas, paisagens construídas: a integração de elementos culturalmente arquitetados na transformação e manutenção da paisagem. Revista de Arqueologia, 23(1), 42-59. https://doi.org/10.24885/sab.v23i1.288
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), em Minas Gerais, com seus diversos sítios rupestres, vinculados a diferentes unidades estilísticas, tiveram um papel importante na ampliação e no fortalecimento desse campo de estudo. Sem o propósito de dar um panorama completo, trazemos também os sítios rupestres de Jequitaí, analisados por Tobias (2013)Tobias, R. J. (2013). Arte rupestre de Jequitaí/MG: suas relações internas em oposição ao contexto arqueológico do centro norte Mineiro. Revista Espinhaço, 2(2), 132-146., que apresenta uma análise relacional dos grafismos rupestres com a paisagem, destacando que a disposição das pinturas nos suportes sugere comportamentos distintos, de acordo com as litologias dos abrigos da região, basicamente em calcário e quartzito. As pesquisas de Etchevarne (2009)Etchevarne, C. (2009). As particularidades das expressões gráficas rupestres da Tradição Nordeste, em Morro do Chapéu, Bahia. CLIO: Série Arqueológica, 24, 41-60. em sítios rupestres na região do Morro do Chapéu, na Chapada da Diamantina (Bahia), tratam das paisagens e mencionam, de forma não focal, certas estratégias diferenciadas de visibilidade de figuras em alguns dos sítios. Também as pesquisas de Pessis (2003, p. 93)Pessis, A. M. (1984). Método de interpretação da arte rupestre pré-histórica: análise preliminar da ação. Revista de Arqueologia, 2(1), 47-58. https://doi.org/10.24885/sab.v2i1.35
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que, entre outros aspectos, constataram que sítios da tradição Nordeste, na Serra da Capivara, se encontram em lugares diferenciados na paisagem, sendo que os de difícil acesso são geralmente os lugares com o maior número de representações gráficas, enquanto os sítios de fácil acesso apresentam menor número de figuras. Fagundes et al. (2018)Fagundes, M., Bandeira, A. M., & Greco, W. S. (2018). Paisagem e lugares: considerações sobre a arte rupestre do Sítio Sampaio, Felício dos Santos, Alto Araçuaí, Minas Gerais – uma análise interpretativa. Caderno de Geografia, 28(54). https://doi.org/10.5752/P.2318-2962.2018v28n54p746-768
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, em pesquisa na região do alto Araçuaí, norte de Minas Gerais, trouxeram também reflexões sobre a paisagem e os sítios arqueológicos rupestres, a partir do conceito de lugar e da visibilidade dos espaços gráficos.

O segundo aspecto, focado na visibilidade das figuras no sítio sem perder a noção contextual do sítio na paisagem, dialoga de forma mais próxima com o presente artigo. Nessa perspectiva, sem o intuito de exaurir a questão, trazemos Ribeiro (2006)Ribeiro, L. (2006). Os significados da similaridade e do contraste entre os estilos de arte rupestre: um estudo regional das gravuras e pinturas do alto-médio São Francisco [Tese de doutorado, Museu de Arqueologia e Etnologia, Universidade de São Paulo]. https://teses.usp.br/teses/disponiveis/71/71131/tde-11082006-111750/pt-br.php
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, com suas pesquisas realizadas com sítios rupestres na região do alto-médio rio São Francisco (norte mineiro e sudoeste baiano). A autora pondera a disposição espacial diferenciada dos estilos rupestres no meio físico (afloramento, painel, abrigo) e no contexto modificado por manifestações gráficas anteriores. Discutimos também as pesquisas de E. Pereira et al. (2016)Pereira, E., Daniel, A. R. P., Nascimento, H., Barbosa, C. A. P., & Honorato, V. (2016). Possíveis práticas rituais nas cavernas com arte rupestre de Rurópolis (Pará). Revista Habitus, 14(1), 5-20. http://dx.doi.org/10.18224/hab.v14.1.2016.5-20
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na Caverna do 110, no Pará, que suscitaram questões sobre possíveis relações entre práticas rituais no sítio e a disposição diferenciada das pinturas e gravuras rupestres. Tais figuras estão localizadas em zonas de penumbra e apresentam composições destacadamente visíveis, localizadas em áreas iluminadas por luz natural. Também destacamos o trabalho de Binant (2013)Binant, P. (2013). Boqueirão do Paraguaio: A Gorge that Shows How “to see” Serra da Capivara, Piauí, Brazil. IFRAO (2013) Proceedings, American Indian Rock Art, 40, 671-684. nos quatro abrigos que compõem o sítio Boqueirão do Paraguaio, localizado no parque da Serra da Capivara, que trata da visibilidade das pinturas integradas ao contexto do sítio (aqui considerando as características físicas do sítio e dos suportes). A autora acompanhou o comportamento das tonalidades das pinturas rupestres em diferentes estações do ano (período de chuva e de seca) e constatou diferenças na vivacidade das cores, observando que, no período de chuva, um friso de água avermelhada se integrava ao contexto das pinturas. Nessa sutil relação de trocas entre pinturas e ambiente, o contexto sugeriu à autora que os critérios de seleção dos suportes estiveram relacionados à articulação da dialética do ver.

O SÍTIO GO-CP-33 E SEU CONTEXTO REGIONAL

Segundo dados levantados em 2020 no Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (CNSA/IPHAN, 2020), estão registrados, no estado de Goiás, 128 sítios arqueológicos com representações rupestres (Figura 1). Nesse contexto, a região Sudoeste apresenta a maior ocorrência, representada, principalmente, pela concentração de sítios na região de Palestina de Goiás.

Os sítios arqueológicos dessa região concentram-se numa área de cerca de 120 km², totalizando 54 unidades, distribuídas na bacia do Córrego do Ouro e do Torres do Rio Bonito (Schmitz et al., 1986Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos.; Binant et al., 2018Binant, P., Viana, S. A., & Peña, A. P. (2018). “Ver, ser vista, e deixar de ser vista”: aspectos das relações dialéticas entre as pinturas rupestres de Caiapônia. Revista Amazônica, 10(1), 210-233. http://dx.doi.org/10.18542/amazonica.v10i1.5860
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). Desse conjunto, 35 sítios apresentam pinturas rupestres, entre elas o sítio GO-CP-33. Ressaltamos que as gravações rupestres são raras na região e estão sempre presentes em sítios onde prevalecem grafismos em pinturas.

Figura 1
Distribuição espacial dos sítios de Palestina de Goiás. Fonte: Binant et al. (2018, p. 216)Binant, P., Viana, S. A., & Peña, A. P. (2018). “Ver, ser vista, e deixar de ser vista”: aspectos das relações dialéticas entre as pinturas rupestres de Caiapônia. Revista Amazônica, 10(1), 210-233. http://dx.doi.org/10.18542/amazonica.v10i1.5860
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Embora ocorra uma quantidade significativa de sítios rupestres no estado do Goiás (Figura 2), os sítios datados são poucos, com exceção para os sítios de Serranópolis, com ocupações que seguem do Holoceno Antigo, cuja data mais antiga é de 10.580 ± 115 anos AP, até o Holoceno Recente, cuja data mais recente é de 925 ± 60 AP (Schmitz et al., 1984Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Ribeiro, M. B., & Verardi, I. (1984). Arte rupestre no Centro do Brasil: Pinturas e gravuras da pré-história de Goiás e o oeste da Bahia. Unisinos.). Os demais sítios rupestres do estado apresentam poucas datações, como os contextos arqueológicos de Doverlândia, com ocupações de 2.500 ± 60 AP a 700 ± 15 AP (Schmitz et al., 1986Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos.); de Formosa, onde os grafismos em lajedos possuem datações estimadas entre 4.500 AP e 11.000 AP 1.210 AP (F. Martins, 2016Martins, F. S. P. (2016). Arqueologia no Brasil – Direito e aplicabilidade. O estudo de caso do sítio arqueológico do Bisnau [Trabalho de conclusão de curso, Instituto CEUB de Pesquisa e Desenvolvimento, Centro Universitário de Brasília]. https://repositorio.uniceub.br/jspui/handle/235/11477
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); de Niquelândia, com sítio datado em 2.860 ± 90 AP (Pontim, 2011Pontim, R. L. (2011). A Tradição Tupiguarani na Bacia do Alto Tocantins [Tese de doutorado, Museu de Arqueologia e Etnologia, Universidade de São Paulo]. https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/71/71131/tde-17102011-162714/pt-br.php
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). Tais datas, informamos, não estão diretamente relacionadas aos grafismos rupestres. Em Palestina de Goiás, as datações variam entre 4.455 ± 155 AP a 900 ± 30 AP (Schmitz et al., 1986Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos.; Viana et al., 2016Viana, S. A., Ramos, M. P. M., Rubin, J. C. R., Barberi, M., & Boëda, E. (2016). O complexo arqueológico de Palestina de Goiás/Brasil: uma avaliação dos conjuntos líticos mais antigos em contextualização macrorregional. Cadernos do Ceom, 29(45), 188-211. https://doi.org/10.22562/2016.45.07
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). A data mais recente está relacionada ao horizonte cultural do sítio GO-CP-16, em que, além de paredões com pinturas rupestres, há presença expressiva de material lítico, poucos fragmentos cerâmicos sem decoração, carvões, fragmentos de óxido de ferro e um bastão em ocre, com extremidades desgastadas, sugerindo sua utilização para a produção das figuras rupestres (L. Pereira, 2017Pereira, L. M. (2017). Metáforas imagéticas do sítio GO-CP-16 (Palestina de Goiás) e as narrativas que constroem narrativas [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]. https://www.academia.edu/36508914/MET%C3%81FORAS_IMAG%C3%89TICAS_DO_S%C3%8DTIO_GO_Cp_16_PALESTINA_DE_GOI%C3%81S_GO_E_AS_NARRATIVAS_QUE_CONSTROEM_NARRATIVAS
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).

Figura 2
Mapa mesorregional do estado de Goiás com quantidade de sítios arqueológicos. Editado por Procópio e Viana (2018)Procópio, G. P., & Viana, S. A. (2018, maio 21-24). A distribuição espacial das imagens no Sítio GO-CP- 033 na Região de Caiapônia no Estado de Goiás e sua inserção na paisagem. VII Reunião da Associação Brasileira de Arte Rupestre, Diamantina.. Fonte: BASE, Sistema Estadual de Geoinformação – SIEG. Dados: Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos. Editado: Procópio (2018)Procópio, G. P., & Viana, S. A. (2018, maio 21-24). A distribuição espacial das imagens no Sítio GO-CP- 033 na Região de Caiapônia no Estado de Goiás e sua inserção na paisagem. VII Reunião da Associação Brasileira de Arte Rupestre, Diamantina..

O sítio GO-CP-33 está inserido na bacia hidrográfica do rio Araguaia e na microbacia do rio Caiapó, à margem direita do rio Bonito. O abrigo está em testemunho de arenito da Formação Furnas. A região está em uma altitude de, aproximadamente, 850 m, com cobertura vegetal de cerrado, atualmente modificada pelo alto índice de antropização para pastagem e agricultura. O abrigo apresenta altas dimensões e seu acesso é possível por uma vertente de inclinação íngreme. A altura do teto varia, sendo a mais baixa com 2,5 m e a mais alta com cerca de 4 m em relação ao nível do solo. A área de ocupação do sítio é estreita, composta por duas abas, denominadas A e B. A base do solo é rochosa, não apresentando evidências ocupacionais. Está entreposta por blocos caídos do teto e das paredes. As superfícies dos suportes não são homogêneas, formando nichos aplainados e irregulares (Schmitz et al., 1986Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos.).

O sítio GO-CP-33 se destaca no ambiente circundante, sendo possível avistá-lo à distância (Figura 6). A ausência de pacote deposicional de sedimento, o pouco espaço abrigável, os pisos inclinados e os tetos curtos evidenciam que ele não teria sido ocupado como espaço de moradia. Corrobora essa ideia o fato de ele estar disposto em local alto, de difícil acesso, de alcance possível somente a partir de uma rampa (rochosa) de mais de 60º de inclinação. Segundo Schmitz et al. (1986)Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos., o sítio GO-CP-33 teria sido utilizado para cerimônias ou área de refúgio, ocupado por pequenos grupos para se abrigarem da chuva por períodos não muito longos.

Os grafismos do sítio GO-CP-33 são, predominantemente, figuras pintadas. Possuem temáticas variadas, sendo que as figuras geométricas são de maior representatividade. Em menor número, ocorrem representações em motivos abstratos, assim nominados por não apresentarem formas definidas, antropomorfas, zoomorfas e fitomorfas, assim como bastonetes e pontilhados. A cor das pinturas, no geral, é vermelha, possuindo algumas variações entre as tonalidades amarela e laranja. Schmitz et al. (1986)Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos. e, posteriormente, Binant et al. (2018)Binant, P., Viana, S. A., & Peña, A. P. (2018). “Ver, ser vista, e deixar de ser vista”: aspectos das relações dialéticas entre as pinturas rupestres de Caiapônia. Revista Amazônica, 10(1), 210-233. http://dx.doi.org/10.18542/amazonica.v10i1.5860
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, L. Pereira (2017)Pereira, L. M. (2017). Metáforas imagéticas do sítio GO-CP-16 (Palestina de Goiás) e as narrativas que constroem narrativas [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]. https://www.academia.edu/36508914/MET%C3%81FORAS_IMAG%C3%89TICAS_DO_S%C3%8DTIO_GO_Cp_16_PALESTINA_DE_GOI%C3%81S_GO_E_AS_NARRATIVAS_QUE_CONSTROEM_NARRATIVAS
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e Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]. notaram que os traços estilísticos dos grafismos não se enquadram nas tradições estabelecidas para os sítios rupestres do Brasil, conforme proposto por Calderón (1970)Calderón, V. (1970). Nota Prévia sobre a arqueologia das regiões Central e sudoeste do estado da Bahia. Publicações Avulsas do Museu Paraense Emílio Goeldi, (10), 107-119., G. Martins (1997)Martins, G. (1997). Pré-História do Nordeste do Brasil (2nd. ed.). Editora Universitária da UFPE., Pessis e Guidon (2000 [1992])Pessis, A., & Guidon, N. (2000 [1992]). Registros rupestres e caracterização das etnias pré-históricas. In L. Vidal (Org.), Grafismos indígenas: estudo de antropologia estética (pp. 19-33). Studio Nobel. e Prous (1992)Prous, A. (1992). Arqueologia brasileira. Editora UnB.. As diferentes temáticas, técnicas e morfologias presentes nos sítios ou num mesmo painel sugerem que os grupos que executaram as pinturas nos sítios rupestres de Palestina de Goiás nem sempre teriam partilhado dos mesmos códigos culturais (Barberi, 1984Barberi, M. (1984). Aspectos ambientais e arte rupestre no Projeto Alto Araguaia. Anuário de Divulgação Científica, (10), 61-70.). Além de diferentes temáticas, as figuras estão dispostas formando agrupamentos, associações, cenas ou então se apresentam de forma individualizada. Observando essa pluralidade, Schmitz et al. (1986)Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos. classificaram os grafismos em um estilo denominado Estilo Caiapônia, reconhecendo semelhanças com os grafismos da Tradição Planalto no que diz respeito às figuras geométricas, zoomorfas e antropomorfas chapadas, e com a Tradição Nordeste, reconhecida, principalmente, pela presença expressiva de antropomorfos em representações de cenas.

Complementamos, ainda, que o sítio GO-CP-33 não apresenta pacote deposicional de sedimento com evidências ocupacionais de grupos humanos no local em períodos prolongados, o que impossibilita correlações dos grafismos com objetos arqueológicos e datações para as ocupações do sítio por meio de materiais orgânicos. Dessa forma, as cronologias dos conjuntos rupestres desse sítio foram inferidas a partir das sobreposições de figuras e pela análise dos conjuntos estilísticos. Sobre o potencial das diferenças estilísticas das figuras rupestres como instrumento para proposições sobre momentos diferenciados de produções de grafismos, destacamos, entre outras, as reflexões de Isnardis e Linke (2010)Isnardis, A., & Linke, W. (2010). Pedras pintadas, paisagens construídas: a integração de elementos culturalmente arquitetados na transformação e manutenção da paisagem. Revista de Arqueologia, 23(1), 42-59. https://doi.org/10.24885/sab.v23i1.288
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A INTENCIONALIDADE DOS GRAFISMOS RUPESTRES

As imagens gráficas, onde incluímos os grafismos rupestres advindos de contextos antigos ou etnográficos, podem ser consideradas uma expressão estética (Vidal & Silva, 1992Vidal L., & Silva, A. L. (1992). Antropologia estética: enfoques teóricos e contribuições metodológicas. In L. Vidal & A. L. Silva (Orgs.), Grafismo indígena: estudos de antropologia estética (pp. 279-293). Studio Nobel.), por meio da qual grupos humanos, no passado, teriam ordenado e partilhado as experiências do seu mundo e de si mesmos. Além de serem entendidas como um veículo de comunicação visual e de mensagens sociais, elas, segundo Lagrou (2007, p. 28)Lagrou, E. (2007). A fluidez da forma: arte, alteridade e agência em uma sociedade amazônica (Kaxinawa, Acre). TopBooks., são também dotadas de ‘poder’ sobre uma coletividade humana. Segundo a autora, as imagens, em seus múltiplos sentidos, teriam o ‘poder’ de “. . . dar forma a ideias sobre a pessoa humana e suas relações com outras pessoas (humanas e não humanas) . . . . e com o mundo envolvente”. De forma particular, Gell (1998, p. 6)Gell, A. (1998). Art and agency: An anthropological theory. Clarendon Press. enfatiza o caráter de força de agência das imagens: “No lugar da comunicação simbólica, ponho a ênfase em agência, intenção, causação, resultado e transformação. Vejo a arte como um sistema de ação, com a intenção de mudar o mundo, em vez de codificar proposições simbólicas a respeito dele”1 1 Tradução nossa. .

Entendemos os grafismos rupestres produzidos no passado como integrantes desse ‘sistema de ação’, mencionado por Gell (1988)Gell, A. (1998). Art and agency: An anthropological theory. Clarendon Press., o qual, mediante situações de visibilidade explícita ou velada e prescrições culturais específicas, agiria sobre a coletividade humana envolvida. Segundo Severi (2019, p. 367)Severi, C. (2019). Autoridade sem autor: formas de autoridade em tradições orais. GIS-Gesto, Imagem e Som-Revista de Antropologia, 4(1), 363-382. https://doi.org/10.11606/issn.2525-3123.gis.2019.162381
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, os objetos – categoria na qual incluímos os grafismos – em sociedades tradicionais são “. . . responsabilizados pelo exercício da autoridade. . .” e detêm em si “. . . o princípio de legitimidade. . .”

Nos contextos pretéritos aos quais os grafismos estão relacionados, a percepção da materialização da gerência humana pode ser observada em aspectos que vão desde a escolha do sítio arqueológico e seus suportes rochosos – caracterizados como lugares de representações gráficas –, até a performance do conjunto das imagens rupestres: suas nuances, a exemplo das técnicas de produção; cor e textura de pigmentos e seus fixadores; estilos e temáticas; ritmo e simetria das representações; correlação das figuras entre si; associação entre temas e outras combinações gráficas; e, sem o intuito de encerrar a questão, a disposição espacial e o alcance visual das figuras. Levando em conta que a relação dos produtores dos grafismos com o sítio e os espaços gráficos não teria sido de domínio das pessoas sobre os agentes naturais, acentuamos que os elementos a seguir configuraram-se em elementos que também teriam atuado na escolha dos locais para a produção dos campos gráficos e nos modos de expressão dos grafismos rupestres: posicionamento dos sítios na paisagem; suas características físicas e de acesso; características das suas paredes rochosas, por vezes aplainadas e naturalmente lisas ou com superfícies irregulares e rugosas; assim como a presença (ou ausência) de compartimentos (nichos) naturalmente delimitados.

Pensando que a agência se encontra também na escolha dos ‘lugares’ (Tuan, 1983Tuan, Y. F. (1983). Espaço e lugar: a perspectiva da experiência. Difel.), no caso do sítio GO-CP-33, manifestada no próprio abrigo rochoso e nos paredões utilizados como espaços gráficos, entende-se que, nesses ‘lugares’, encontram-se intrínsecas as relações humanas desveladas ao longo do tempo. Os lugares eleitos, ainda que concretos, tendo em vista a sua materialidade, são considerados espaços em movimento, que se renovam a partir da dinâmica da vida dos grupos humanos a que estão relacionados. Nessa perspectiva, é oportuno que se reflita sobre a natureza dos vínculos entre espaço e tempo que, em outras palavras, são também as conexões entre lugares e memórias. Para isso, compreende-se que a memória esteja entranhada não somente nas pessoas, nos objetos, nas imagens gráficas, mas também nos lugares.

Para discorrer sobre memória, baseamo-nos em Smolka (2000)Smolka, A. L. B. (2000). A memória em questão: uma perspectiva histórico-cultural. Educação & Sociedade, (71), 166-193. https://doi.org/10.1590/S0101-73302000000200008
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, que trata dos muitos modos historicamente construídos de se compreender e refletir sobre memória, assim como em Nora (1997, p. 186)Nora, P. (1997). Le lieux de mémoire (Vol. 7). Quarto Gallimard., para quem investigar a memória “. . . é estudar os meios, os modos, os recursos criados coletivamente no processo de produção e apropriação da cultura”. Nessa perspectiva, interessam-nos, igualmente, os ‘lugares de memória’ vistos como formas de externalização da memória coletiva. Assim, nesse contexto, refletimos que o abrigo rochoso, por nós denominado de sítio arqueológico GO-CP-33, e seus espaços gráficos teriam sido percebidos pela coletividade pretérita como um de seus ‘lugares de memória’.

Avançando nesse espectro, os lugares de memória teriam sido tecidos e articulados ao longo do tempo pelas relações entre pessoas, imagens rupestres e lugares. Essa trama teria também colaborado tanto no revigoramento de articulações entre grupos, como nas interdições e nas rupturas intergrupais.

Reforçando a perspectiva de ‘lugares de memórias’, Bruzzone (2010)Bruzzone, F. L. (2010). La memoria en la piedra: Um estudio exploratorio sobre arte rupestre y memoria colectiva en el sitio Los Mellizos Provincia de Choapa, Chile. Santiago, Chile., com base em estudos realizados nos sítios Loz Mellizos, em Choapa, no Chile, entende que as manifestações rupestres nesse sítio podem, entre outras abordagens, ser investigadas como estratégias de acesso a parcelas de memórias sociais pretéritas de caráter coletivo. Nesse sentido, ressalta que a prática cultural sistemática de (re)grafar figuras nos paredões rochosos em tempos pretéritos pode ser compreendida como ato de (re)memorar eventos, tornando esses espaços repositórios (lugares) de memória. Assim, com base em Smolka (2000)Smolka, A. L. B. (2000). A memória em questão: uma perspectiva histórico-cultural. Educação & Sociedade, (71), 166-193. https://doi.org/10.1590/S0101-73302000000200008
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, pode-se compreender que a memória, como mecanismo ‘mnemotécnico’, teria, tanto nos lugares (topoi) como nas imagens rupestres, e em suas narrativas, importantes agentes mentais que indicariam a externalização da memória, a ‘memória nas coisas’, ampliada às práticas e aos eventos culturais.

Nesse sentido, os grafismos rupestres, tidos como eventos emergentes de práticas socioculturais em contextos pretéritos, poderiam também ser vistos pelos seus produtores como vetores de acesso às memórias coletivas e revigoramento de suas tradições culturais. As tradições culturais persistem temporalmente em estado de ‘estabilidade’ (Smolka, 2000Smolka, A. L. B. (2000). A memória em questão: uma perspectiva histórico-cultural. Educação & Sociedade, (71), 166-193. https://doi.org/10.1590/S0101-73302000000200008
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), o que não significa inércia ou saturação; ao contrário, numa articulação dialética, significa pensar a tradição cultural dotada de conexão entre os interesses do grupo em mantê-la e a pluralidade de elementos culturais constituídos no campo da diferença, da mudança, da desordem e da dessemelhança. A sua constância, atrelada ao potencial de renovação (mudança), possibilita que as tradições se reconstruam e sejam lembradas e vivenciadas pelos indivíduos. Nessa perspectiva, destacamos também Sahlins (1997, p. 136)Sahlins, M. (1997). O “pessimismo sentimental” e a experiência etnográfica: por que a cultura não é um “objeto” em via de extinção. Mana, 3(1), 103-150. https://doi.org/10.1590/S0104-93131997000200004
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, ao evidenciar que interesses diferenciais incluindo pessoas, coletivos humanos, tradições e culturas estão envolvidos no campo da tradição; ademais, leva em conta a dinamicidade dos sistemas simbólicos, nos quais as mudanças e persistências estão integradas às tradições: “. . . a defesa da tradição implica alguma consciência, a consciência da tradição implica alguma invenção, a invenção da tradição implica alguma tradição”.

Numa perspectiva de tempo em longa duração (Reis, 1996Reis, J. C. (1996). O conceito de tempo histórico em Ricoeur, Koselleck e "Annales": uma articulação possível. Síntese Nova Fase, 23(73), 229-252., p. 244), em que se considera a sua pluralidade – em sentido ‘múltiplo, descontínuo, heterogêneo, não linear’ – ritmada pelo movimento dos eventos sociais, os símbolos rupestres presentes nos paredões de certos sítios podem ter sido produzidos em temporalidades distintas, resultantes de práticas culturais vivenciadas e ressignificadas por gerações de grupos humanos culturalmente vinculados ou não. Nesse sentido, estamos de acordo com Ribeiro (2008, p. 65), para quem “. . . a arte rupestre pré-colonial continuou (e continua) a participar da produção de significados muito depois do desaparecimento de suas comunidades autoras”. Assim, se para nós, arqueólogas, os sentidos e valores de tais símbolos e práticas não são acessíveis, teriam sido para os seus produtores e/ou para aqueles que, no passado, ocuparam os locais onde tais manifestações já existiam, interagindo e ressignificando de acordo com suas teias culturais. Na atualidade, a comunidade acadêmica e a comunidade rural que têm acesso a tais sítios tomam tais imagens de acordo com os seus interesses.

O estado de longevidade dos grafismos rupestres pode ser percebido, entre outros, pelas nuances dos processos de construção e/ou renovação de figuras presentes em certos espaços gráficos. Essa dinâmica de reconstrução pode se manifestar de diferentes formas, entre elas: sobreposições de figuras; complementações de traços de figuras; diferenças estilísticas e tecnológicas das figuras; escolhas diferenciadas de suportes; associação espacial entre figuras e temas, entre outros. Importante pensar essas situações para além do ato em si, pois, além de revigorarem e/ou ampliarem a visibilidade gráfica, elas representam o encontro de imagens em movimento, dado pela extinção total ou parcial de uma figura ou sua modificação (por meio, por exemplo, de sobreposições) e, de outro lado, pela emersão de outra, quando poderia (ou não) ser constituída de outros significados.

Com o intuito de exemplificar a situação de longevidade, trazemos algumas percepções tratadas por Isnardis (2009)Isnardis, A. (2009). Interações e paisagens nas paredes de pedra – padrões de escolha de sítio e relações diacrônicas entre as unidades estilísticas de grafismos rupestres do vale do Peruaçu. Arquivos do Museu de História Natural, 21, 321-358. e Ribeiro (2006)Ribeiro, L. (2006). Os significados da similaridade e do contraste entre os estilos de arte rupestre: um estudo regional das gravuras e pinturas do alto-médio São Francisco [Tese de doutorado, Museu de Arqueologia e Etnologia, Universidade de São Paulo]. https://teses.usp.br/teses/disponiveis/71/71131/tde-11082006-111750/pt-br.php
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acerca dos conjuntos gráficos da Tradição São Francisco e o Complexo Montalvânia. A partir da análise estilística de grafismos, suas sobreposições, características de suportes e distribuição espacial das figuras, constataram conexão entre conjuntos gráficos mais antigos e mais recentes, o que os levaram a perceber aspectos de continuidade e mudança cultural no interior dos painéis, presentes em mais de um sítio. Nessa perspectiva de continuidade cultural, trazemos ainda os grafismos rupestres de sítios de Kakadu (Galeria Anbangbang), na Austrália, datados em cerca de 4.000-6.000 anos antes do presente e que continuaram sendo produzidos até 1963/1964. De acordo com May et al. (2020)May, S. K., Huntley, J., Marshall, M., Miller, E., Hayward, J. A., . . . . & Tac, P. S. C. (2020). New insights into the rock art of Anbangbang Gallery, Kakadu National Park. Journal of Field Archaeology, 45(2). https://doi.org/10.1080/00934690.2019.1698883
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, a continuidade de execução foi identificada por meio de novas tecnologias (pXRF) associadas à investigação arqueológica, com escavações, e antropológica, com o registro da história oral. Segundo as últimas gerações de artistas de Kakadu, a reatualização das pinturas permitiu o acesso a um maior número de pessoas sobre clã, parentesco, criação e fertilidade acerca dessa tradição cultural. Também entendem que as complexas mensagens em ‘multicamadas’ deixadas nos suportes rochosos continuarão estimulando as novas gerações a refletirem sobre a arte e a cultura em Kakadu.

Ampliando a noção de indissociabilidade entre práticas culturais, materialidades e temporalidades, destacamos alguns comportamentos culturais que, ao contrário de manter a vivacidade (visibilidade) de certos objetos e asseverar sua longevidade, retira-os de seu contexto de significado, movimentando-os para outra instância. Assim, para além da remoção de figuras rupestres ou de suas partes, comportamentos possíveis de serem encontrados em contextos rupestres, destacamos outras práticas que, embora de outra natureza e temporalidade, fazem refletir sobre práticas culturais relacionadas a longevidade/brevidade de materialidades humanas. Os ameríndios Kaxinawa (língua Pano), localizados, atualmente, no estado do Acre (Brasil) e na Amazônia peruana, segundo Lagrou (2007, p. 19)Lagrou, E. (2007). A fluidez da forma: arte, alteridade e agência em uma sociedade amazônica (Kaxinawa, Acre). TopBooks., vivem a “. . . ambígua tensão entre produção e destruição das imagens. . .”: os objetos culturais desaparecem junto com seus produtores ou usuários, seja por envelhecimento ou pela sua destruição intencional por ocasião do falecimento de seu detentor. Assim, ao contrário de manter a longevidade do objeto, enquanto detentor de memória, há o rompimento de suas relações com o sujeito e o tempo. Entre os Bororo (língua Macro-Jê), Canajó e, segundo um interlocutor de Novaes (2016, p. 106)Novaes, S. C. (2016). Iconografia e oralidade: sobre objetos e pessoa entre os Bororo. GIS-Gesto, Imagem e Som-Revista de Antropologia, 1(1), 89-114. https://doi.org/10.11606/issn.2525-3123.gis.2016.116351
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, os objetos dos mortos são destruídos: “Queima tudo, estraga tudo, joga no rio, enterra”. Em ambos os casos citados, mas não exclusivos, segundo os autores, a partir do rompimento das relações da pessoa com o objeto no tempo vivido, constroem-se novos fios relacionais estabelecidos a partir de outros sentidos e em outra dimensão temporal, de forma que a destruição do objeto não significa seu niilismo.

Considerando que, em termos epistemológicos e contextuais, as tradições culturais se definem distintamente, estamos em acordo com Moosa (2009, p. 272)Moosa, E. (2009). Transições no ‘progresso’ da civilização: teorização sobre a história, a prática e a tradição. In B. S. Santos & M. P. Meneses (Orgs.), Epistemologias do Sul (pp. 261-280). Edições Almedina. SA., ao afirmar que, para além das concepções ocidentais, as tradições culturais podem ser tidas como “. . . conjunto de práticas interiorizadas. . .” que se renovam ao longo do tempo. Assim, sem a pretensão de deslindar as subjetividades inerentes às práticas culturais pré-coloniais, cujas tramas foram rompidas ou modificadas por eventos históricos e a que, portanto, jamais teremos alcance, buscaremos, neste artigo, algumas nuances de sentidos dessas tradições pretéritas.

AS DINÂMICAS DE VISIBILIDADE

As práticas culturais pretéritas podem ser abordadas pela arqueologia por meio da descrição e da análise das condições de visibilidade, conferidas, especificamente no caso dos sítios rupestres, a partir da disposição dos grafismos e do próprio sítio na paisagem. Segundo Boado (1993)Boado, F. C. (1993). Visibilidad e interpretacion del registro arqueológico. Trabajos de Prehistoria, 50, 39-56. https://doi.org/10.3989/tp.1993.v50.i0.488
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, tais condições são concebidas de diferentes maneiras e pressupõem escolhas culturais do grupo, com a intenção de tornar visível ou não a ação social, constituindo-se em recursos potenciais para a interpretação do contexto gráfico.

Boado (1993, p. 44)Boado, F. C. (1993). Visibilidad e interpretacion del registro arqueológico. Trabajos de Prehistoria, 50, 39-56. https://doi.org/10.3989/tp.1993.v50.i0.488
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compreende que “. . . tanto el proceso de objetivación del que deriva la Cultura Material y sus productos, como el proceso de orientación de la sociedad hacia el mundo y sus efectos” possibilitam o entendimento das ‘estratégias de visibilização’. Assim, ao nos depararmos com um sítio rupestre com painéis altamente visíveis e outros de menor visibilidade, ou com a presença de figuras rupestres com dimensões maiores ou menores em relação a outras, ou com posicionamento alocado em suportes irregulares, ou em locais de difícil visualização, ou ainda com tipos diferenciados de temáticas das figuras rupestres, faz-se necessário entender que tais elementos se relacionam com estratégias culturais de partilhar signos e seus significados.

O processo de construção da visibilidade dos registros arqueológicos é apresentado por Boado (1993, p. 45)Boado, F. C. (1993). Visibilidad e interpretacion del registro arqueológico. Trabajos de Prehistoria, 50, 39-56. https://doi.org/10.3989/tp.1993.v50.i0.488
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a partir das seguintes categorias: as ‘matérias-primas’, base pela qual se contrói a materialidade; as ‘dimensões’ em que a materialidade se projeta em termos espaciais e temporais; e a utilização de ‘recursos’, que permitem a constituição e a dimensão da visibilidade. A partir da interação dessas categorias, projeta-se um número expressivo de possibilidades de estratégias de visibilização, entre elas, estratégias de ‘inibição’, de ‘ocultação’ e de ‘exibição’.

Sobre essas estratégias de visibilização, Ribeiro (2008, p. 53)Ribeiro, L. (2008). Contexto arqueológico, técnicas corporais e comunicação: Dialogando com a arte rupestre do Brasil Central (Alto-Médio São Francisco). Revista de Arqueologia, 21(2), 51-72. https://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/ra/article/view/3006
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, com base nos estudos das pinturas rupestres do complexo Montalvânia, presente na Lapa Tikão, no vale do Peruaçu, em Minas Gerais, entende que as figuras desse sítio teriam sido executadas para um ‘auditório pré-concebido’, com o intuito de restringir a sua visibilidade. De acordo com sua análise, a relação dos espaços escolhidos e a visibilidade das figuras rupestres nos painéis da Lapa do Tikão estão quase sempre em superfícies baixas, onde os espaços limitam não apenas a disposição corporal do pintor ou pintora que as fizeram, mas também do auditório que as contemplava. A exibição desses painéis no abrigo é baixa e, ao contrário, as pinturas do estilo são-franciscano, presentes nesse mesmo sítio, foram produzidas de modo a serem vistas – a sua visibilidade é constatada à distância: “Os elevados, coloridos e chamativos painéis São Francisco parecem ter sido feitos para serem observados de longe, o que evoca uma comunicação estabelecida com público amplo e talvez pouco selecionado. . .” (Ribeiro, 2008Ribeiro, L. (2008). Contexto arqueológico, técnicas corporais e comunicação: Dialogando com a arte rupestre do Brasil Central (Alto-Médio São Francisco). Revista de Arqueologia, 21(2), 51-72. https://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/ra/article/view/3006
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, p. 65). Outro aspecto sobre a visibilidade, agora voltado ao sítio e à paisagem envolvente, diz respeito à localização preferencial de certos sítios rupestres em áreas destacadas na formação cárstica dos cânions do Peruaçu. Isnardis e Linke (2010)Isnardis, A., & Linke, W. (2010). Pedras pintadas, paisagens construídas: a integração de elementos culturalmente arquitetados na transformação e manutenção da paisagem. Revista de Arqueologia, 23(1), 42-59. https://doi.org/10.24885/sab.v23i1.288
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destacam que os sítios dessa região estão carregados de significações, tanto para os que operam dentro deles como para os que teriam interagido com os grafismos. Consideram que preferências culturais e não escassez de espaços livres nos paredões teriam fundamentado a escolha dos suportes para a representação gráfica. Etchevarne (2009)Etchevarne, C. (2009). As particularidades das expressões gráficas rupestres da Tradição Nordeste, em Morro do Chapéu, Bahia. CLIO: Série Arqueológica, 24, 41-60., por sua vez, ao analisar as particularidades dos grafismos rupestres da Tradição Nordeste na Toca da Figura, no Morro do Chapéu (Bahia), observa a existência de um conjunto de zoomorfos em miniaturas pintados em ‘posição de ocultamento’, localizados cerca de 80 cm da superfície do solo, não podendo ser vistos por uma pessoa em pé. Representam, segundo o autor, uma clara intenção de deixar os grafismos em difícil visualização.

DESENVOLVIMENTO

O desenvolvimento metodológico da pesquisa baseou-se em atividades de campo realizadas nos anos de 2018 e 2019, quando foram efetuados: análises e medições das figuras e painéis rupestres do sítio; novos registros fotográficos; apontamentos e percepções do sítio e das figuras quanto ao alcance visual; e estudo dos dados produzidos na década de 1980 por Schmitz et al. (1986)Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos.. Em laboratório, foram realizadas a análise dos decalques em plásticos, pranchas e fotos oriundos da década de 1980 (Schmitz et al., 1986Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos.) e a seleção e a edição de imagens. Os acervos fotográficos antigos e os atuais foram trabalhados comparativamente por meio dos softwares DStretch, versão 8.41, e CorelDraw X7, versão 18.0.

ORGANIZAÇÃO DOS ESPAÇOS GRÁFICOS

Conhecidas a extensão do sítio GO-CP-33 e a quantidade expressiva de figuras presentes, totalizando quase mil unidades, e com o objetivo de melhor organizar o registro e a análise dos grafismos, manteve-se a divisão do sítio em alas A e B e a numeração dos painéis conforme utilizado pela equipe de Schmitz et al. (1986)Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos.. Todavia, as divisões dos intervalos receberam novas nomeclaturas. O espaço de circulação da ala B é menor em relação ao da ala A, limitado pelas paredes de fundo, pela linha de goteira e pela linha da base do terreno. A ala A está dividida em dois intervalos: I-II (frontal) e II-III (lateral), com presença de dois blocos com figuras rupestres. A ala B está dividida nos intervalos III-IV, IV-V e V-VI, sendo que foi investigado pela pesquisa apenas o intervalo III-IV.

Assim, de acordo com o exposto, para esse momento, apenas a ala A foi investigada, com exceção de alguns grafismos da ala B referentes a uma cena miniaturizada de antropomorfos. O motivo da inclusão se fundamenta pelo seu potencial interpretativo no conjunto dos painéis da ala A. Na Figura 3, é apresentado o croqui reeditado da planta do sítio GO-CP-33, baseado em Schmitz et al. (1986)Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos..

Figura 3
Planta do sítio GO-CP-33. Fonte: Schmitz et al. (1986, p. 185). Editado: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]..

A ala A do sítio tem cerca de 700 figuras, agrupadas em 44 painéis. A ala B possui cerca de 277, distribuídas em 36 painéis. Os blocos desmoronados têm cerca de 12 figuras, sendo que, no bloco 01, há nove imagens agrupadas em três painéis e, no bloco 02, há três figuras agrupadas em dois painéis (Schmitz et al., 1986Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos.). As figuras, em geral, apresentam-se em estado de preservação mediano, com contornos pouco nítidos devido a ações intempéricas provocadas, principalmente, pela irradiação solar que atua diretamente no abrigo.

Foram objeto de análise: 215 grafismos localizados na ala A; 17 figuras na ala B (relacionadas à cena miniaturizada); e quatro figuras presentes nos blocos 01 e 02. A análise classificou 28 painéis (Tabelas 1 e 2).

Tabela 1
Quantidade de painéis vetorizados. Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]..
Tabela 2
Quantidade de figuras vetorizadas. Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]..

ALTURA DOS PAINÉIS E ALCANCE VISUAL

Os suportes rochosos foram divididos em cinco níveis de altura: baixíssima, baixa, média, alta e altíssima (Tabela 3), considerando uma pessoa de 1,45 m.

Tabela 3
Divisão dos níveis de visibilidade. Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]..

Buscando parâmetros técnicos para determinar quais níveis de altura utilizar como referência do alcance visual, com base em uma pessoa no interior do abrigo, foi utilizada a NBR 9050 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT, 2015Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). (2015). NBR 9050: acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Rio de Janeiro.). Mesmo se referindo a contexto distinto, a referida norma estabelece padrões sobre ângulos de alcance visual para edificações e outras estruturas físicas, levando em conta as diversas condições de percepção e estatura de uma pessoa. Nela, encontramos elementos para balizar a presente pesquisa e estabelecer mecanismos suficientes para o alcance de resultados.

No que diz respeito ao alcance visual (níveis de visibilidade), baseamo-nos em princípios envolvidos na percepção visual a partir de ângulos verticais de uma pessoa de 1,45 m de altura em pé, com os olhos e a cabeça posicionados em relação à distância da área expositiva, o painel rupestre (Figura 4).

Na Figura 4, observa-se que, quando os olhos se movimentam de forma consciente, conseguem alcançar um ângulo de 25° acima e 30° abaixo, podendo ter uma variação, nesse caso, de 7,5° no ângulo inferior (ABNT, 2015Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). (2015). NBR 9050: acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Rio de Janeiro.). Com a movimentação natural da cabeça da pessoa, o ângulo total é de 90° e, com o movimento consciente, esse cone visual, em um plano horizontal, se amplia em um total de 120°, sendo 60° superior ou inferior.

Figura 4
Ângulo da movimentação da cabeça e dos olhos de uma pessoa em pé. Fonte: ABNT (2015, pp. 25-26)Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). (2015). NBR 9050: acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Rio de Janeiro..

Nesta análise, a distância é um fator importante para a percepção do painel rupestre no sítio. Para isso, consideramos o campo visual (cone visual), a posição neutra da cabeça da pessoa ao contemplar o grafismo e os limites dos ângulos com a movimentação dos olhos e da cabeça (Figura 5).

Diante da relação entre ângulo/distância apresentada na Figura 5 e das dimensões do sítio GO-CP-33, adotamos os limites máximos e mínimos do campo visual para que sejam estabelecidos os níveis de visibilidade dos painéis do abrigo. A distância considerada entre o painel e a pessoa foi de 2,00 m, já que o piso do abrigo é curto e o limite do patamar não alcança três metros. Conforme mostra a Figura 5, de acordo com a distância de dois metros, o mínimo para o alcance visual é de 30 cm e o maior, de 354 cm. Sendo assim, pela altura dos painéis (altíssima, alta, média, baixa e baixíssima), nomeamos os seguintes parâmetros: ótimo alcance visual (entre as alturas baixa e média, ou seja, 51 cm a 179 cm), médio alcance visual (entre 180 cm a 250 cm, alta altura) e alcance visual comprometido (abaixo de 50 cm, ou seja, baixíssima altura, e acima de 251 cm, altíssima altura).

Figura 5
Distância e cone visual de uma pessoa em pé. Fonte: ABNT (2015, p. 27).

RESULTADOS

Ao compararmos as características de sítios utilizados em práticas rituais ressaltadas em Argüello García e Rodriguez Buitrago (2013)Argüello García, P. M., & Rodríguez Buitrago, J. C. (2013). Arte rupestre y ritual: Un estudio arqueológico de los petroglifos de El Colegio (Cundinamarca). Revista Colombiana de Antropología, 49(1), 241-277. e as peculiaridades do sítio Abrigo do Índio (GO-CP-33) – posicionamento destacado na paisagem em termos de visibilidade e de dificuldade de acesso (Figura 6); ausência de outros vestígios de cultura material que evidenciem atividades rotineiras; área de circulação altamente restrita, delimitada por íngreme despenhadeiro; e as características do conjunto dos campos gráficos a serem apresentados a seguir –, consideramos que o sítio GO-CP-33 não foi ocupado para atividades domésticas e utilitárias. Essa situação se diferencia de parte representativa da maioria dos sítios da região de Palestina de Goiás, onde marcas de atividades ordinárias estão materializadas pelos remanescentes de objetos líticos e cerâmicos presentes em diversos sítios (Viana et al., 2016Viana, S. A., Ramos, M. P. M., Rubin, J. C. R., Barberi, M., & Boëda, E. (2016). O complexo arqueológico de Palestina de Goiás/Brasil: uma avaliação dos conjuntos líticos mais antigos em contextualização macrorregional. Cadernos do Ceom, 29(45), 188-211. https://doi.org/10.22562/2016.45.07
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). Sítios cujas características remetem a possíveis finalidades de práticas rituais foram também observados em outras partes do território brasileiro, como na Caverna do 110, no Pará (E. Pereira et al., 2016Pereira, E., Daniel, A. R. P., Nascimento, H., Barbosa, C. A. P., & Honorato, V. (2016). Possíveis práticas rituais nas cavernas com arte rupestre de Rurópolis (Pará). Revista Habitus, 14(1), 5-20. http://dx.doi.org/10.18224/hab.v14.1.2016.5-20
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).

Com isso, não estamos assumindo uma relação dicotômica entre esfera doméstica e ritual, haja vista que rituais e símbolos permeiam a vida diária (Bradley, 2005Bradley, R. (2005). Ritual and domestic life in prehistoric Europe. Routledge.). Tampouco estamos considerando a presença da arte rupestre em si mesma, mas sim concebendo o sítio como um espaço reservado, que não esteve diretamente relacionado às práticas domésticas de grupos humanos pretéritos das bacias dos rios Bonito e Córrego do Ouro, mas que, certamente, foi um lugar de referência cultural onde se construíram, negociaram e partilharam memórias coletivas ao longo dos anos.

Figura 6
Vista frontal do sítio GO-CP-33. Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]./acervo da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC Goiás)/Instituto Goiano de Pré-História e Antropologia (IGPA).

O sítio é aqui compreendido não somente pelas figuras rupestres, mas por todo o exuberante volume, forma e cor que o constituem. Pode ser dado como um imponente geoindicador na região e um marco cultural de destaque na paisagem, possibilitando sua identificação à distância. Sua alta visibilidade e seu caráter monumental seguem ao encontro da proposta de lugares (topoi). Nesse sentido, sugere-se que esse abrigo rochoso seja considerado enquanto agente indicador de externalização de memórias coletivas (Smolka, 2000Smolka, A. L. B. (2000). A memória em questão: uma perspectiva histórico-cultural. Educação & Sociedade, (71), 166-193. https://doi.org/10.1590/S0101-73302000000200008
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). As características do sítio também congregam as estratégias de monumentalidad propostas por Boado (1993, 1995), que dizem respeito às altas visibilidades intencionais de elementos naturais incorporados ao pensamento do grupo, outorgando-lhe uma conotação simbólica, vinculada a aspectos socioculturais, cosmológicos ou de outra natureza. Tal posicionamento teria também possibilitado a ocupantes pretéritos uma visão ampla do vale, de onde é possível observar ou controlar lugares caracterizados como potencialmente importantes enquanto referências paisagísticas de caráter protetivo e econômico.

ABORDAGENS TEMPORAIS

Observando a inexistência de datações para esse sítio, as abordagens temporais para ele levantadas se basearam nas sobreposições entre figuras e nas variabilidades estilísticas. Embora as sobreposições sejam quantitativamente pouco representativas (Figuras 7 e 8), elas são bem evidentes. Estão relacionadas às figuras com técnica, cor e temática distintas, o que reforça a hipótese de momentos diferenciados de execução: figuras geométricas de cores amarela e vermelha, executadas pela técnica de traços lineares abertos, fechados, paralelos e também chapados, se sobrepõem a unidades gráficas classificadas como antropomorfos e outros elementos não identificados (painel 1, Figura 8).

A variabilidade estilística enquanto indicador temporal foi registrada em diferentes sítios da região de Palestina de Goiás, onde se observam, sob aspectos diferenciados, recorrências de combinações gráficas, como técnica, cor, temática, suporte de execução de grafismos e posicionamento espacial de determinadas figuras no painel (Schmitz et al., 1986Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos.; Péclat, 2011Péclat, T. A. C. (2011). Sobrepondo conceitos: Reflexões sobre os momentos de produção dos grafismos rupestres do sítio arqueológico GO-Cp.-09 [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás].; L. Pereira, 2017Pereira, L. M. (2017). Metáforas imagéticas do sítio GO-CP-16 (Palestina de Goiás) e as narrativas que constroem narrativas [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]. https://www.academia.edu/36508914/MET%C3%81FORAS_IMAG%C3%89TICAS_DO_S%C3%8DTIO_GO_Cp_16_PALESTINA_DE_GOI%C3%81S_GO_E_AS_NARRATIVAS_QUE_CONSTROEM_NARRATIVAS
https://www.academia.edu/36508914/MET%C3...
; Binant et al., 2018Binant, P., Viana, S. A., & Peña, A. P. (2018). “Ver, ser vista, e deixar de ser vista”: aspectos das relações dialéticas entre as pinturas rupestres de Caiapônia. Revista Amazônica, 10(1), 210-233. http://dx.doi.org/10.18542/amazonica.v10i1.5860
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).

Figura 7
Painel 10. Sobreposição de figuras geométricas sobre antropomorfo. Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]./acervo PUC Goiás/IGPA.
Figura 8
Painel 1. Sobreposição de figura geométrica sobre antropomorfo. Fonte: Procópio (2019/acervo PUC Goiás/IGPA.

Especificamente no sítio GO-CP-33, as variabilidades estilísticas estão presentes no contexto de certos painéis, nos quais se observam unidades gráficas com determinadas temáticas, tonalidades e estilos distintos que teriam sido encaixadas entre os espaços de alguns painéis, respeitando os limites de figuras. Que se tomem como exemplo os painéis 6 e 12, localizados na ala A, no teto.

No primeiro (Figura 9), ainda que ocorram algumas sobreposições, elas são parciais e não refletem intrepidez. Ao contrário, parecem compor o quadro. No segundo painel (Figura 10), não há nenhuma sobreposição e, ainda que haja um mesmo estilo e técnica de execução, as figuras apresentam uma coloração que, nitidamente, se distingue das demais. E acrescente-se também sua disposição encaixada no espaço, entre as pinturas 48, 50 e 51, o que nos faz aventar que, embora tenha sido executada em outro momento, parece se ajustar ao contexto do painel. Nesses casos, poderíamos aventar a hipótese de atualização e revigoramento da visibilidade do espaço gráfico.

Figura 9
Painel 6 com figuras sobrepostas (grafismos 166, 167, 168, 169, 171, 174 e 175). Fonte: Procópio (2019/acervo PUC Goiás/IGPA.
Figura 10
Painel 12, com destaque para os grafismos 48, 50 e 51. Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]./acervo PUC Goiás/IGPA.

Entendemos que as situações mencionadas, relacionadas a certa disposição e integração de figuras de estilos distintos num mesmo painel e a poucas sobreposições de unidades gráficas, não somente representariam coerência entre práticas culturais, mas também se relacionariam a estratégias próprias de integração e negociação entre os antigos ocupantes da região de Palestina de Goiás.

AS ESCOLHAS DOS SUPORTES

No espaço relativo às paredes rochosas do sítio, também se constatam escolhas determinadas de áreas específicas (suportes) para a representação dos grafismos. Nota-se que nem todas as paredes ou espaços foram utilizados. Existe uma variação de suportes no sítio GO-CP-33, sendo classificados como ‘regulares’ aqueles de superfícies aplainadas, que apresentam certa uniformidade em sua superfície, e ‘irregulares’ aqueles que apresentam superfície assimétrica, bastante desfigurada, onde constam superfícies variadas, por exemplo, depressões, saliências, fissuras e desplacamentos de porções de paredes rochosas antes da execução das pinturas. Registram-se, ainda, compartimentos naturalmente delimitados que foram selecionados como suportes gráficos.

Observamos que, entre os intervalos espaciais I e II (ala A), o suporte é quase integralmente plano, apresentando superfícies com poucas anomalias. Todavia, trata-se da área com o menor número de pinturas. Ao contrário, entre os intervalos II e III, onde os suportes são irregulares e com poucas superfícies aplainadas, ocorre a maior quantidade de grafismos. Num primeiro momento, consideramos, a partir da concepção do ‘menor esforço’, que o suporte mais adequado para a representação das figuras seria aquele de áreas mais planas e regulares. Contudo, percebemos que a maioria das figuras (60%) da ala A se encontra em suportes irregulares, o que nos indica uma situação de inversão – ou seja, outras lógicas culturais, distintas da nossa, de natureza ocidental – permeou as escolhas dos suportes rochosos. Com isso, constata-se que a eleição de tais espaços não esteve ligada à boa regularidade da superfície das paredes: os dados sugerem que os critérios de seleção dos espaços escolhidos estavam relacionados à opção do ‘ver’. Destacamos que situação semelhante foi descrita para grafismos concernentes à tradição Nordeste, no sítio Boqueirão da Pedra Furada, onde “. . . o suporte irregular era a regra” (Pessis, 2003Pessis, A. M. (2003). Imagens da pré-história. Fundham., p. 95).

Com o intuito de discorrer sobre critérios de seleção envolvidos na escolha desses suportes irregulares, tomamos como exemplo a Figura 11, que corresponde a uma cena de zoomorfos, localizada entre os intervalos I e II (área frontal da ala A).

Figura 11
Grafismos do painel 14 em suporte irregular e destaque das superfícies assimétricas (as setas apontam para porções elevadas e depressivas da rocha). Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]./acervo PUC Goiás/IGPA.

O painel 14 é composto por grafismos que lembram animais (zoomorfos), produzidos em suporte irregular, a uma altura aproximada de 2,20 m em relação ao nível do solo e, de acordo com os critérios estabelecidos na presente análise, considerado de alta visibilidade. A cor vermelha das pinturas, em contraste com o tom opaco do paredão, o tamanho das imagens, o posicionamento em relação ao alcance visual e o seu destaque no suporte rochoso, naturalmente proeminente, as tornam explícitas ao olhar. Acrescente-se que as irregularidades nas superfícies da rocha, constituída por áreas depressivas e elevadas, parecem ter sido usadas propositalmente para compor o conjunto gráfico, conforme indicam as setas da Figura 11. A observação in loco, quando diante da cena, faz-nos perceber que o arranjo das pinturas apresenta uma perspectiva de volume e profundidade, dando ao observador a sensação de que os animais representados estão em movimento, encontram-se em ‘ação’. O conceito de ação, nas concepções de Pessis (1984, p. 47), pressupõe um “. . . [comportamento de pessoas ou animais] em um movimento que pode ser mais ou menos pronunciado e que se desenvolve em um tempo mensurável”.

ALTURA DOS PAINÉIS

A análise da visibilidade foi realizada em todos os painéis localizados nas alas A e B, nos intervalos I-II (área frontal), II-III (área lateral), e ala B, no intervalo III-V, e também nos blocos 1 e 2, tendo em vista os cinco níveis de altura dos painéis: visibilidade baixíssima, baixa, média, alta e altíssima.

  • Altura dos painéis da ala A – intervalos I-II – área frontal

  • Pela análise individual dos 16 painéis distribuídos na ala A, área frontal, foi constatado que eles se concentram nos níveis de altura baixo, alto e altíssimo (Tabela 4 e Figura 12)2 2 Observe-se que o número de painéis na Tabela 4 (total de 19) é superior aos analisados. Isso ocorre devido à variação da altura em que as imagens de um mesmo painel se encontram distribuídas no suporte rochoso. Um exemplo é o painel de número 8 (ver Figura 15), cuja altura em relação ao solo é de 2,00 m, estendendo-se até 3,00 m, considerado, portanto, de altura alta/altíssima. .

Tabela 4
Quantidade de painéis por nível de altura (área frontal da ala A). Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]..
Figura 12
Croqui da ala A (intervalo I-II), área frontal, e divisão dos painéis por altura. Fonte: Schmitz et al. (1986, p. 186). Editado: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]..
  • Altura dos painéis da ala A – intervalos II-III – área lateral

  • Na ala A, área lateral, foram nove painéis analisados. Desse total, dois foram de altura média, um de alta, e seis altíssimos, conforme a Tabela 5 e a Figura 13.

Tabela 5
Quantidade de painéis por nível de visibilidade da área lateral da ala A. Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]..
Figura 13
Croqui da ala A, intervalo II-III, área lateral, e divisão dos painéis por altura. Fonte: Schmitz et al. (1986, p. 193). Editado: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]..
  • Altura dos painéis da ala B – intervalos III-IV

  • Na ala B, foi selecionado o painel da cena em miniaturas, classificado como de baixíssima altura por estar a 3 cm da base do sítio (Tabela 6 e Figura 14).

Tabela 6
Quantidade de painéis por nível de altura na ala B. Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]..
Figura 14
Croqui da ala B, intervalo III-IV, e a divisão do painel por altura. Fonte: Schmitz et al. (1986, p. 212)Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos.. Editado: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]..
  • Altura de painéis nos blocos 1 e 2

  • Nos blocos 1 e 2, ocorreu apenas um painel em cada, os dois classificados, respectivamente, em altura alta e baixa (Tabela 7 e Figura 15).

Tabela 7
Quantidade de painéis por nível de altura nos blocos 1 e 2. Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]..
Figura 15
Croqui dos blocos 1 e 2 e divisão do painel por altura. Fonte: Schmitz et al. (1986, p. 203)Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos.. Editado: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]..

Em termos quantitativos, observa-se, pela Figura 16, que a maior distribuição espacial de painéis se encontra altíssima, com mais de 60%, enquanto os espaços mais baixos foram pouco ocupados para o registro das figuras. Constatamos, portanto, a escolha preferencial da produção de painéis em espaços mais altos dos paredões do sítio.

Figura 16
Quantidade de painéis por nível de altura. Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]..

ALTURA DOS PAINÉIS E VISIBILIDADE DAS FIGURAS DE ACORDO COM SUA TEMÁTICA

Pela análise da preferência temática dos grafismos e sua relação com a visibilidade (alcance visual) no espaço, pudemos observar que os antropomorfos foram os únicos presentes na altura baixíssima (abaixo de 0,5 m); em baixa (0,51 m a 1,59 m), estão os geométricos; e em média (1,60 m a 1,79 m), todas as figuras, com exceção dos bastonetes e fitomorfos; em alta (1,80 m a 2,50 m), os abstratos e geométricos foram predominantes; em alta/altíssima e altíssima (acima de 2,51 m), o geométrico foi o mais representativo (Tabela 8).

Tabela 8
Quantidade de grafismos rupestres em relação à temática e à altura dos painéis. Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]..

ESCOLHA TEMÁTICA E VISIBILIDADE

No que diz respeito à maior ocorrência de grafismos no quesito temática, Schmitz et al. (1986)Schmitz, P. I., Barbosa, A. S., Jacobus, A. L., & Ribeiro, M. B. (1986). Arqueologia nos cerrados do Brasil: Caiapônia. Unisinos. e, posteriormente, Procópio (2019, p. 153)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]., com maior detalhe, registraram que as “. . . figuras geométricas foram a maioria, seguidas de abstratos, antropomorfos, bastonetes, objeto, fitomorfo e pontilhado”, conforme apresentado na Figura 17.

Figura 17
Preferência de temáticas no sítio GO-CP-33. Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]..

Em ótimo alcance visual, na altura de 160 cm a 179 cm (média altura), não houve preferência temática. Ao contrário, segundo Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]., observa-se similaridade nas escolhas entre as figuras abstratas (23%), geométricas (22%), antropomorfas (22%) e os objetos (22%). A menor representação, com 11%, são os grafismos pontilhados. Ao contrário, em baixa altura (51 cm a 179 cm), os geométricos são as figuras com maior representatividade.

Em médio alcance visual, a preferência temática são as figuras abstratas (42%) e geométricas, com 25%.

E, por último, em alcance visual comprometido, tem-se as figuras antropomorfas em baixíssima altura e as abstratas em altura máxima, representadas por temáticas geométricas, zoomorfas e abstratas (Figura 18).

Cientes de que, num mesmo painel, pode ocorrer variação em mais de um nível de altura (alta e altíssima), Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]. registrou que as figuras numericamente mais presentes são as abstratas (21%), as geométricas (41%) e as zoomorfas (20%). Foram classificadas em médio e comprometido alcance visual, como mostra, por exemplo, o painel 8 (Figura 19).

Figura 18
Painel 1 da ala B, de alcance visual comprometido, em baixíssima altura. Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]./acervo PUC Goiás/IGPA.
Figura 19
Painel 8, de alcance visual médio a comprometido. Fonte: Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]./acervo PUC Goiás/IGPA.

Mediante os resultados apresentados pela pesquisa, observou-se que houve uma intencionalidade fundamentada em aspectos culturais e materializada em estratégias de disposição das figuras rupestres nas paredes e nos blocos, de modo que algumas foram pensadas para serem vistas e destacadas no abrigo, com um ótimo alcance visual, e outras, colocadas em locais de ocultamento ou não projetadas para serem destacadas, apresentando alcance visual comprometido.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da análise dos dados, inicialmente elaborada por Procópio (2019)Procópio, G. P. (2019). Reflexões espaciais e visibilidade dos grafismos rupestres no sítio GO-CP-33 de Palestina de Goiás [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Católica de Goiás]. e rediscutida neste artigo, com ampliação de dados e novas reflexões teóricas, entendemos o sítio GO-CP-33 como local não utilizado para atividades domésticas e utilitárias, e onde práticas culturais, nas quais se envolviam produções de figuras rupestres, representavam materializações de memórias coletivas de grupos humanos que ocuparam a região de Palestina de Goiás em tempos pretéritos. Considerando que a memória está intrinsecamente envolvida nas coisas (Smolka, 2000Smolka, A. L. B. (2000). A memória em questão: uma perspectiva histórico-cultural. Educação & Sociedade, (71), 166-193. https://doi.org/10.1590/S0101-73302000000200008
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; Zarankin & Salerno, 2016Zarankin, A., & Salerno, M. A. (2016). Espacio para de la memoria: Narrativas sobre la violencia. Revista de Arqueologia Pública, 10(2), 3-28.) e que os seres humanos são inseparáveis de uma “. . .extensa e diversificada teia de objetos. . .” (Gonçalves, 2007Gonçalves, J. R. S. (2007). Antropologia dos objetos: coleções, museus e patrimônios. Garamond., p. 14), entendemos o referido sítio arqueológico e os seus conjuntos de pinturas rupestres como lugares de memórias, dotados de relevância social e simbólica de diferentes sentidos. Sutilezas acerca da percepção desses sentidos puderam ser constatadas nas preferências por determinados suportes rochosos, pela escolha da temática das figuras e pelo seu arranjo espacial nos paredões, de forma a torná-las ou perceptíveis ou de alcance visual comprometido.

Mediante às estratégias de visibilidade discutidas, os autores e/ou autoras dos conjuntos gráficos intencionaram o lugar de exposição e as pessoas que teriam acesso aos campos gráficos. Nesse jogo de múltiplos alcances visuais, as categorias inibição, ocultação e exibição (Boado, 1993Boado, F. C. (1993). Visibilidad e interpretacion del registro arqueológico. Trabajos de Prehistoria, 50, 39-56. https://doi.org/10.3989/tp.1993.v50.i0.488
https://doi.org/10.3989/tp.1993.v50.i0.4...
, 1995Boado, F. C. (1995). The visibility of the archaeological record and the interpretation of social reality. In I. Hodder, M. Schanks, A. Alexanri, V. Buckhli & G. Lucas (Eds.), Interpretating archaeology: Finding meaning in the past (pp. 194-204). Routledge.) foram importantes para que os conjuntos rupestres fossem pensados no contexto espacial do sítio e nos aspectos físicos do próprio sítio, onde se inclui a sua opulência visual. Nessa perspectiva, a análise, para além de revelar a variabilidade das disposições dos grafismos, nos estimula a considerar além da dicotomia do ‘ver (não ver), ser visto e deixar ser visto’ (Binant et al., 2018Binant, P., Viana, S. A., & Peña, A. P. (2018). “Ver, ser vista, e deixar de ser vista”: aspectos das relações dialéticas entre as pinturas rupestres de Caiapônia. Revista Amazônica, 10(1), 210-233. http://dx.doi.org/10.18542/amazonica.v10i1.5860
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).

É importante também considerar a hipótese de execução das figuras em temporalidades distintas. Essa situação pode ser observada a partir das sobreposições de algumas unidades rupestres, já mencionadas (Figuras 7 e 8), que são nítidas, embora quantitativamente limitadas, assim como pelo jogo de composição de certos painéis, como o representado pela Figura 9, cujas pinturas apresentam clara variabilidade estilística. Ressalte-se que as figuras rupestres de estilos diferenciados estão dispostas de modo a compor o painel e não se percebe situação de intrusão de espaço. Esse conjunto de dados sugere não somente a existência de momentos diferenciados de produção, mas também retornos ao local e ‘conexão entre autoras(es) e não distanciamento’, conforme também observado por Ribeiro (2008, p. 61)Ribeiro, L. (2008). Contexto arqueológico, técnicas corporais e comunicação: Dialogando com a arte rupestre do Brasil Central (Alto-Médio São Francisco). Revista de Arqueologia, 21(2), 51-72. https://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/ra/article/view/3006
https://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php...
, para o estilo rupestre da tradição São Francisco e do Complexo Montalvânia. Acrescente-se, ainda, o contexto de ocupação pretérito da região, composta por dezenas de sítios arqueológicos datados em período de cerca de 4.000 anos até cerca de 900 anos antes do presente. Embora não se disponha de datação direta para a execução dos grafismos, o horizonte cronológico identificado pelas datações de C14 serve de referência para se pensar a dinâmica ocupacional para a região e os grafismos rupestres.

Com base nos dados apresentados, sugerimos que os signos rupestres do sítio GO-CP-33 possam ser considerados, numa perspectiva espaço-temporal, não somente como meios de comunicação transferidos e ressignificados pelos grupos sociais por diversas gerações, mas também como categorias dotadas de agência que teriam estimulado estratégias culturais para que as crenças, práticas e significados continuassem desempenhando seus papéis. A dimensão espacial do sítio, com sua topografia particular, teria favorecido a composição dos espaços gráficos, de acordo com a articulação da dialética do ver. A extensão dessa abordagem aos demais sítios da região de Palestina de Goiás possibilitará a construção de um panorama mais amplo acerca desse tema, assim como as implicações espaciais dessa dinâmica visual poderá nos levar a considerações acerca dos processos de construção da paisagem arqueológica construída pelos grupos humanos pretéritos, ocupantes dos sítios dessa região.

AGRADECIMENTOS

Esta pesquisa foi financiada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), por meio do ConselhoNacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (FAPEG).

  • Procópio, G. P., & Viana, S. A. (2021). Visibilidade e intencionalidade das pinturas rupestres no sítio GO-CP-33, em Palestina de Goiás, Brasil. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, 16(3), e20200050. doi: 10.1590/2178-2547-BGOELDI-2020-0050
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    Tradução nossa.
  • 2
    Observe-se que o número de painéis na Tabela 4 (total de 19) é superior aos analisados. Isso ocorre devido à variação da altura em que as imagens de um mesmo painel se encontram distribuídas no suporte rochoso. Um exemplo é o painel de número 8 (ver Figura 15), cuja altura em relação ao solo é de 2,00 m, estendendo-se até 3,00 m, considerado, portanto, de altura alta/altíssima.

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Editado por

Responsabilidade editorial: Cristiana Barreto

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Dez 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    09 Jun 2020
  • Aceito
    15 Abr 2021
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