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A utilização dos quartzos por sociedades antigas na serra de Carajás, Amazônia, Pará

The use of quartz by ancient societies in the Serra de Carajás, Amazon, Pará

Resumo

Este artigo tem como objetivo principal apresentar os resultados das análises realizadas nas indústrias sobre quartzos presentes nas coleções de dois sítios arqueológicos – Capela e Ananás –, localizados na região de Carajás, sudeste do estado Pará, Brasil. O método aplicado compreende a análise tecnológica, e o principal conceito utilizado é o de cadeia operatória, desenvolvido pela Escola Francesa e adaptado para este trabalho. Através dos resultados obtidos, foi possível observar as escolhas e as intenções dos antigos grupos humanos quanto ao gerenciamento destas matérias-primas, quais sejam, principalmente, pequenas lascas alongadas produzidas, pouco espessas, frequentemente utilizadas sem grandes transformações, debitadas por percussão direta dura e percussão sobre bigorna.

Palavras-chave
Quartzo; Amazônia; Cadeia operatória; Tecnologia

Abstract

This article aims to present the results of the analyses conducted in the quartz industries present in the collections of two archaeological sites: Capela and Ananás, located in the region of Carajás, southeast of the state of Pará, northern Brazil. The applied method is based on technological analysis, and the main concept used is the Chaîne Operatoire, developed by the French School and adapted for this work. Through the results obtained, it was possible to observe the choices and intentions of the old human groups regarding the management of these raw materials, which are mainly the production of small, thin, and elongated flakes often used without major transformations, knapped with hard stone hammer and percussion on an anvil.

Keywords
Quartz; Amazon; Chaîne Operatoire ; Technology

INTRODUÇÃO

As indústrias líticas de quartzo têm sido, de uma maneira geral, pouco estudadas, seja no Brasil ou em outros países, talvez pelo fato de os tecnólogos acreditarem que, durante o Holoceno, o quartzo tenha sido uma matéria-prima de segunda escolha. Esse panorama começa a se modificar no Brasil, em razão dos trabalhos realizados em regiões nas quais o mineral foi abundantemente utilizado como suporte das indústrias líticas (Bassi & Rodet, 2017Bassi, L. F., & Rodet, M. J. (2017). Abordagens tecnológicas do lascamento de cristal de quartzo. In L. Fernandes, & D. Duarte-Talim (Orgs.), Tecnologia lítica na arqueologia brasileira – coletânea e (re)publicações (pp. 218-219). Museu de História Natural e Jardim Botânico, UFMG.; Bassi, 2012Bassi, L. F. (2012). Tecnologia Lítica: Análise diacrônica dos níveis mais antigos do sítio arqueológico Bibocas II, Jequitaí – MG [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais].; Isnardis, 2009Isnardis, A. (2009). Entre as pedras as ocupações pré-históricas recentes e os grafismos rupestres da região de Diamantina, Minas Gerais [Suplemento]. Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia, (10), 5-194.; Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte].; Duarte-Talim, 2019Duarte-Talim, D. (2019). (Re)visitando a Amazônia: Serra dos Carajás e Monte Alegre, estado do Pará. Análise tecnológica das indústrias líticas dos sítios antigos da passagem Pleistoceno-Holoceno e do Holoceno inicial [Tese de doutorado. Universidade Federal de Minais Gerais, Belo Horizonte, Brasil].; Â. Lima, 2013Lima, Â. P. (2013). As cavidades, as fontes minerais e as pessoas nos platôs da Serra Norte de Carajás durante o Holoceno [Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém, Brasil]., entre outros). Especificamente na região da serra de Carajás, estado do Pará, os sítios arqueológicos apresentam uma produção sistemática de suas indústrias líticas sobre o quartzo em suas diversas morfologias, colorações ou qualidade para o lascamento, desde o final do período do Pleistoceno (11224 Cal BP, Beta 410471) até o final do Holoceno médio (3810 Cal BP, Beta 410471 – Magalhães et al., 2016Magalhães, M. P., Barbosa, C. A. P., Aires da Fonseca, J., Schmidt, M. J., Maia, R. R., Mendes, K., . . . Maurity, G. (2016). Carajás. In M. P. Magalhães (Org.), Amazônia antropogênica (1. ed., pp. 259-308). Museu Paraense Emílio Goeldi.); e mesmo depois, como apontam os estudos tecnológicos realizados na região (Rodet et al., 2017Rodet, M. J., Duarte-Talim, D., Maurity, C., Teles, C., & Magalhães, M. P. (2017). O tratamento térmico da ametista: Alto bonito, garimpo das pedras, Carajás, Pará. Teoria & Sociedade, 24, 55-75.; Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte].; Duarte-Talim, 2019Duarte-Talim, D. (2019). (Re)visitando a Amazônia: Serra dos Carajás e Monte Alegre, estado do Pará. Análise tecnológica das indústrias líticas dos sítios antigos da passagem Pleistoceno-Holoceno e do Holoceno inicial [Tese de doutorado. Universidade Federal de Minais Gerais, Belo Horizonte, Brasil]., entre outros). Nota-se, sistematicamente, a utilização do mineral, seja na sua forma prismática, quartzo hialino ou mais leitoso; seja em forma de seixo, policristalino ou leitoso; ou, ainda, em blocos provenientes dos veios quartzosos.

A complexa litologia da região da serra de Carajás, com sua grande diversidade de substratos rochosos (granitos, gnaisses, anfibolitos, rochas básicas e ultrabásicas, rochas vulcânicas e sedimentares, quartzitos, formações ferríferas, além de quartzos variados), sustentou uma indústria lítica muito variada, lascada e polida, ao longo das ocupações. De acordo com Duarte-Talim (2019)Duarte-Talim, D. (2019). (Re)visitando a Amazônia: Serra dos Carajás e Monte Alegre, estado do Pará. Análise tecnológica das indústrias líticas dos sítios antigos da passagem Pleistoceno-Holoceno e do Holoceno inicial [Tese de doutorado. Universidade Federal de Minais Gerais, Belo Horizonte, Brasil]., a partir de um trabalho bibliográfico sistemático, no que se refere às indústrias líticas, os dados produzidos não são volumosos e apresentam aspectos metodológicos distintos. Inicialmente, os estudos dos materiais líticos em Carajás, especialmente entre os anos de 1991 e 2013, foram provenientes da serra Norte (5) e da serra Sul (3): Gruta do Gavião (Hilbert, 1991Hilbert, K. (1991). Organização e uso de espaço de grupos caçadores-coletores pré-históricos na Gruta do Gavião, Serra dos Carajás (PA). Organização e uso de espaço de grupos caçadores-coletores pré-históricos na Gruta do Gavião, Serra dos Carajás (PA).), grutas do Pequiá, do Rato e da Guarita (Magalhães, 2005Magalhães, M. P. (2005). A phýsis da origem: O sentido da história da Amazônia. Museu Paraense Emílio Goeldi.), abrigo 1 da Subestação (Â. Lima, 2013Lima, Â. P. (2013). As cavidades, as fontes minerais e as pessoas nos platôs da Serra Norte de Carajás durante o Holoceno [Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém, Brasil].); e S11D-001, S11D010 e S11D-098 (W. Oliveira, 2007Oliveira, W. C. (2007). Caçadores coletores na Amazônia: Eles existem [Dissertação de mestrado, Museu de Arqueologia e Etnologia, Universidade de São Paulo, São Paulo].), respectivamente. Entretanto, as análises realizadas não tinham cunho especificamente tecnológico; em geral, elas apresentavam base tipológica e quantitativa (Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte].), contudo, esses estudos já introduzem diversos aspectos da análise tecnológica (Duarte-Talim, 2019Duarte-Talim, D. (2019). (Re)visitando a Amazônia: Serra dos Carajás e Monte Alegre, estado do Pará. Análise tecnológica das indústrias líticas dos sítios antigos da passagem Pleistoceno-Holoceno e do Holoceno inicial [Tese de doutorado. Universidade Federal de Minais Gerais, Belo Horizonte, Brasil].).

No geral, observa-se que os vestígios líticos são resultantes de processos de lascamento de pequenos quartzos de morfologia principalmente prismática, de colorações e qualidades distintas, tais como hialino, citrino, ametista, quartzo fumê, opalescente. As principais técnicas de debitagem são a percussão sobre bigorna e a percussão direta dura (Hilbert, 1991Hilbert, K. (1991). Organização e uso de espaço de grupos caçadores-coletores pré-históricos na Gruta do Gavião, Serra dos Carajás (PA). Organização e uso de espaço de grupos caçadores-coletores pré-históricos na Gruta do Gavião, Serra dos Carajás (PA).; Magalhães, 2005Magalhães, M. P. (2005). A phýsis da origem: O sentido da história da Amazônia. Museu Paraense Emílio Goeldi.; Bueno, 2006Bueno, L. (2006). Indústrias líticas do sul do Pará: Proposta de análise para sítios associados a ocupações ceramistas e de caçadores-coletores.; Â. Lima, 2013Lima, Â. P. (2013). As cavidades, as fontes minerais e as pessoas nos platôs da Serra Norte de Carajás durante o Holoceno [Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém, Brasil].; Magalhães et al., 2016Magalhães, M. P., Barbosa, C. A. P., Aires da Fonseca, J., Schmidt, M. J., Maia, R. R., Mendes, K., . . . Maurity, G. (2016). Carajás. In M. P. Magalhães (Org.), Amazônia antropogênica (1. ed., pp. 259-308). Museu Paraense Emílio Goeldi.; Rodet et al., 2016Rodet, M. J., Sousa, J., & Magalhaes, M. P. (2016). Hyaline quartz, amethyst, and citrine: basis of the lithic industries of carajás, Serra Norte, Pará, Brasil (Example Of Pa-At-316: N3-63 - Gruta Do Ananás). In XIX Congreso Nacional de Arqueologia Argentina, Tucumán (Vol. 1, pp. 2521-2527). Publicación de la Facultad de Ciencias Naturales e Instituto Miguel Lillo.; Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte].; Matos, 2019Matos, A. A. (2019). As indústrias líticas do Sítio Garganta da Jararaca, Carajás (PA) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém].; Mendes, 2019Mendes, M. K. (2019). Organização e uso do espaço interno em cavidades por grupos humanos antigos na Amazônia Oriental: Primeiros apontamentos sobre o sítio Gruta do Ananás, em Carajás-PA [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém].; Duarte-Talim, 2019Duarte-Talim, D. (2019). (Re)visitando a Amazônia: Serra dos Carajás e Monte Alegre, estado do Pará. Análise tecnológica das indústrias líticas dos sítios antigos da passagem Pleistoceno-Holoceno e do Holoceno inicial [Tese de doutorado. Universidade Federal de Minais Gerais, Belo Horizonte, Brasil].), mas há indícios da percussão orgânica (Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte].; Duarte-Talim, 2019Duarte-Talim, D. (2019). (Re)visitando a Amazônia: Serra dos Carajás e Monte Alegre, estado do Pará. Análise tecnológica das indústrias líticas dos sítios antigos da passagem Pleistoceno-Holoceno e do Holoceno inicial [Tese de doutorado. Universidade Federal de Minais Gerais, Belo Horizonte, Brasil].). Os produtos procurados são as pequenas lascas que serão transformadas em instrumentos simples, unifaciais e bifaciais ou utilizadas diretamente sem transformação. Outras matérias-primas foram empregadas para produção de instrumentos simples unifaciais (quartzito, arenito, quartzo leitoso, hematita etc.), além de terem sido utilizadas como percutores e bigornas (Hilbert, 1991Hilbert, K. (1991). Organização e uso de espaço de grupos caçadores-coletores pré-históricos na Gruta do Gavião, Serra dos Carajás (PA). Organização e uso de espaço de grupos caçadores-coletores pré-históricos na Gruta do Gavião, Serra dos Carajás (PA).; Â. Lima, 2013Lima, Â. P. (2013). As cavidades, as fontes minerais e as pessoas nos platôs da Serra Norte de Carajás durante o Holoceno [Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém, Brasil].; Magalhães et al., 2016Magalhães, M. P., Barbosa, C. A. P., Aires da Fonseca, J., Schmidt, M. J., Maia, R. R., Mendes, K., . . . Maurity, G. (2016). Carajás. In M. P. Magalhães (Org.), Amazônia antropogênica (1. ed., pp. 259-308). Museu Paraense Emílio Goeldi.; Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte].; Matos, 2019Matos, A. A. (2019). As indústrias líticas do Sítio Garganta da Jararaca, Carajás (PA) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém].; Mendes, 2019Mendes, M. K. (2019). Organização e uso do espaço interno em cavidades por grupos humanos antigos na Amazônia Oriental: Primeiros apontamentos sobre o sítio Gruta do Ananás, em Carajás-PA [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém].; Duarte-Talim, 2019Duarte-Talim, D. (2019). (Re)visitando a Amazônia: Serra dos Carajás e Monte Alegre, estado do Pará. Análise tecnológica das indústrias líticas dos sítios antigos da passagem Pleistoceno-Holoceno e do Holoceno inicial [Tese de doutorado. Universidade Federal de Minais Gerais, Belo Horizonte, Brasil].). A indústria polida, principalmente a produção de lâmina de machado, é também um elemento importante desse universo e foi realizada sobre anfibólitos, diabásio e granitoides. Outro fator marcante das ocupações de Carajás é a presença do tratamento térmico do quartzo ametista, transformando-o em citrino, que acontece a partir da camada IV, datada de aproximadamente 8630 ± 30, calibrada em 9595 a 9570 Cal BP (Rodet et al., 2016Rodet, M. J., Sousa, J., & Magalhaes, M. P. (2016). Hyaline quartz, amethyst, and citrine: basis of the lithic industries of carajás, Serra Norte, Pará, Brasil (Example Of Pa-At-316: N3-63 - Gruta Do Ananás). In XIX Congreso Nacional de Arqueologia Argentina, Tucumán (Vol. 1, pp. 2521-2527). Publicación de la Facultad de Ciencias Naturales e Instituto Miguel Lillo.). O citrino, apesar de raro na serra, está presente em muitos sítios da região (Duarte-Talim, 2019Duarte-Talim, D. (2019). (Re)visitando a Amazônia: Serra dos Carajás e Monte Alegre, estado do Pará. Análise tecnológica das indústrias líticas dos sítios antigos da passagem Pleistoceno-Holoceno e do Holoceno inicial [Tese de doutorado. Universidade Federal de Minais Gerais, Belo Horizonte, Brasil].).

Diante disso, a principal questão deste trabalho é a de apresentar as escolhas tecnológicas dos grupos humanos passados no que se refere ao quartzo, embora seja importante ressaltar que essa matéria-prima está relacionada com outras presentes nos sítios arqueológicos em questão, tais como o diabásio e a hematita/magnetita. Trata-se de matérias-primas disponíveis na região, utilizadas com objetivos diferentes.

Nosso principal exemplo se encontra na serra Sul de Carajás, no sítio arqueológico Capela. Os resultados serão complementados com as análises do material coletado do sítio Gruta do Ananás, serra Norte. Os dois sítios distam 42 km entre eles em linha reta.

LOCALIZAÇÃO E APRESENTAÇÃO DOS SÍTIOS: OS CONTEXTOS FÍSICOS E GEOMORFOLÓGICOS E A PRESENÇA HUMANA NAS PAISAGENS DE CARAJÁS

A serra de Carajás está situada no estado do Pará (Figura 1), no compartimento de topo, com altitudes entre 620/660 e 700 m. O substrato rochoso é a Formação Ferrífera e sustenta uma vegetação específica local: a mata seca de canga (Piló et al., 2015Piló, L. B., Coelho, A., & Reino, J. C. R. (2015). Geoespeleologia em rochas ferríferas: Cenário atual e conservação. In F. F. Do Carmo & L. H. Y. Kamino (Orgs.), Geossistemas ferruginosos do Brasil: áreas prioritárias para conservação da diversidade geológica e biológica, patrimônio cultural e serviços ambientais (pp. 125-148). 3i Editora.; Cunha Jr. et al., 2007Cunha Jr., Walter, R., Atzingen, N. V., & Crescencio, G. (2007). Estudos espeleológicos na serra dos Carajás, município de Parauapebas-PA. Anais do XXIX Congresso Brasileiro de Espeleologia, Ouro Preto.).

Figura 1
Em destaque no mapa, a serra Norte e a serra Sul, em Carajás.

A região está situada dentro do que é denominado de Zona Equatorial e apresenta clima tropical, quente e com alta umidade. As temperaturas têm médias anuais em 26 graus (Beisiegel & Teixeira, 2006Beisiegel, V. R., & Teixeira, J. B. G. (2006). Carajás: Geologia e ocupação humana. Museu Paraense Emílio Goeldi.). A serra de Carajás está inserida dentro da grande bacia Tocantins-Araguaia, em sua parte leste, e dos rios Tapajós e Xingu, no setor oeste. O rio Itacaiúnas é o maior responsável pelo escoamento das águas no setor, sendo o rio Parauapebas o seu maior afluente (Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte].).

A região está inserida na Província Mineral de Carajás (PMC), no domínio tectônico do cinturão Itacaiúnas, no Cráton Amazônico. O grupo Itacaiúnas é composto por uma sequência metavulcânica-sedimentar e acolhe grande parte dos depósitos minerais do setor. O supergrupo Itacaiúnas, em suas cinco unidades, hospeda rochas tais como anfibolitos, dioritos, quartzitos, gnaisses, granitos, rochas metavulcânicas básicas e xistos, metabalsaltos e importantes corpos de jaspilito, além de mica-xistos, mármores magnesíferos, rochas ferríficas e máficas, tais como os basaltos, entre outras (Equipe Docegeo - Distrito Amazônia, 1988Equipe Docegeo - Distrito Amazônia. (1988). Revisão litoestratigráfica da província mineral de Carajás. XXXV Congresso Brasileiro de Geologia, Belém. http://sbg.sitepessoal.com/anais_digitalizados/1988-BELEM/1988Prov%C3%ADncia%20Mineral%20de%20Caraj%C3%A1s.pdf
http://sbg.sitepessoal.com/anais_digital...
; Maurity, 1995Maurity, C. W. (1995). Evolução recente da cobertura de alteração no Platô N1 Serra dos Carajás [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém].). É nesse contexto que se desenvolveram as cavernas, nas quais, em suas entradas e áreas internas, foram encontrados frequentemente vestígios de ocupações passadas (Piló et al., 2015Piló, L. B., Coelho, A., & Reino, J. C. R. (2015). Geoespeleologia em rochas ferríferas: Cenário atual e conservação. In F. F. Do Carmo & L. H. Y. Kamino (Orgs.), Geossistemas ferruginosos do Brasil: áreas prioritárias para conservação da diversidade geológica e biológica, patrimônio cultural e serviços ambientais (pp. 125-148). 3i Editora.; Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte].).

Durante as prospecções no setor (raio de 5 km no entorno do sítio Gruta do Ananás), foram observados quartzos leitosos em veios, pequenos cristais de quartzo hialino e blocos decimétricos de basalto e/ou diabásio intrusivo dentro dos granitos – Granitos Formação Carajás (Rodet, 2015Rodet, M. J. (2015). As jazidas de matérias-primas (potencialmente) utilizadas pelos grupos pré-históricos que frequentaram as serras de Carajás, Pará.). O gabro é observado na região em forma de diques (C. Teles, comunicação pessoal, 20 jan. 2014). Tais matérias-primas foram sistematicamente utilizadas pelos grupos passados, ao longo das ocupações na região. A região é explorada atualmente em função dessa riqueza mineral.

Os sítios arqueológicos Capela (PA-AT 337 S11D47/48) e Gruta do Ananás (PA-AT- 316: N3-63) estão situados, respectivamente, nos municípios de Canãa (serra Sul – porção S11D) e Parauapebas (serra Norte – platô ferrífero do N3), em Carajás. Trata-se de grutas e abrigos naturais em maciços residuais de formação ferrífera e de cobertura laterítica.

O sítio Capela é composto por uma gruta e um setor abrigado. O sítio Capela é composto por uma gruta de aproximadamente 320 m2 de desenvolvimento. Sua entrada possui um grande salão, onde foram realizadas 14 intervenções de 1 m2 cada (Figura 2). De maneira geral, as escavações foram realizadas por níveis artificiais (5 cm) e atingiram profundidades próximas de 2 m (para as mais profundas) e 1 m (para as mais rasas), conforme mostra o perfil estratigráfico (Figura 3).

Figura 2
Mapa topográfico do sítio Capela com as respectivas escavações.
Figura 3
Exemplo de perfil estratigráfico do sítio Capela.

De acordo com o relatório técnico-científico de Magalhães et al. (2015)Magalhães, M. P., Guapindaia, V., & Schmidt, M. J. (2015). 5º Relatório de Atividades de Campo. Programa de Estudos Arqueológicos na Área do Projeto Ferro Carajás S11D (Paca Sul). Museu Paraense Emílio Goeldi., a estratigrafia das escavações apresentou de quatro a sete camadas antrópicas, definidas a partir de suas granulometrias e colorações. As camadas são bastante espessas (chegando até 70 cm) e, por vezes, a escavação invadia níveis estratigráficos inferiores. O solo, de maneira geral, é sempre marrom-avermelhado-escuro (Dark Reddish Brown), a variação do tom alternou-se entre 2,5 YR 3/4, 2,5 YR 2,5/4 a 2,5 YR 2,5/3. A textura é arenosa até 50 cm de profundidade; em seguida, o sedimento passou a ser argilo-arenoso. Foi possível realizar algumas remontagens entre peças líticas dos mesmos níveis estratigráficos e peças de níveis diferentes. Os resultados dessas análises tecnológicas e remontagens permitiram juntar níveis estratigráficos distintos em uma só camada. De fato, a sequência estratigráfica acompanha a presença coerente das indústrias líticas, como reforça a maior parte das remontagens – sete remontagens (Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte].). As datações (11224 Cal BP, Beta 41047;10240 Cal BP Beta 410435; 9745 Cal BP Beta 410435; 8850 Cal BP Beta 410440) apontam para ocupações antigas na região. Aqui, serão apresentadas as análises realizadas nas indústrias sobre quartzo (leitoso e hialino) oriundas de três escavações: 1.5; 3.3 e 3.2, o equivalente a 1.873 peças, dentre instrumentos, núcleos, lascas e outros.

O sítio arqueológico Gruta do Ananás (Figura 4) é composto por duas entradas de caverna, uma delas teve 22 m2 escavados de sua área total, de aproximadamente 160 m2 (12 níveis, reunidos em VI camadas estratigráficas). O método de escavação é o mesmo apresentado anteriormente, atingindo, em determinados setores, aproximadamente 1 m de profundidade. De acordo com Magalhães et al. (2015)Magalhães, M. P., Guapindaia, V., & Schmidt, M. J. (2015). 5º Relatório de Atividades de Campo. Programa de Estudos Arqueológicos na Área do Projeto Ferro Carajás S11D (Paca Sul). Museu Paraense Emílio Goeldi., o pacote com vestígios arqueológicos se concentra da superfície até por volta de 35 cm. As camadas estratigráficas são coerentes, apresentaram coloração muito parecida (2,5YR 2,5/3 Dark Reddish Brown), sendo isoladas a partir de suas granulometrias, presença/ausência de vestígios arqueológicos e naturais (líticos, cerâmicos, fogueiras, blocos etc.), variando entre 5 e 20 cm de espessura (Figura 5). Os vestígios de superfície foram plotados com estação total; os sedimentos exumados foram peneirados com malhas de 2 mm. Foram coletadas 2.426 peças líticas, antrópicas e naturais, sendo os quartzos (hialino, leitoso, citrino e ametista) a principal matéria-prima exumada (Figura 6). As outras (hematita, diabásio, granitos, quartzitos e algumas matérias-primas não identificadas) apareceram de forma anedótica (salvo o minério de ferro, matéria-prima da gruta). Ainda, 437 fragmentos cerâmicos, sementes e carvões fizeram parte da coleção. Pelo menos três áreas com fogueiras foram observadas em superfície e subsuperfície. Um conjunto de datas C14 e AMS foi produzido durante a pesquisa. Considerando somente as datas coerentes, as camadas mais profundas estão em um intervalo próximo de 9000 Cal BP (nível 6, escavação 3, 25-30 cm: 8120 ± 40 BP, 9260 a 9010 Cal BP, AMS, sobre carvão, Beta 410456; 8700 ± 30 BP, 9680 a 9545 Cal BP, 14C, sobre carvão, Beta 410454 – Magalhães et al., 2015Magalhães, M. P., Guapindaia, V., & Schmidt, M. J. (2015). 5º Relatório de Atividades de Campo. Programa de Estudos Arqueológicos na Área do Projeto Ferro Carajás S11D (Paca Sul). Museu Paraense Emílio Goeldi.).

Figura 4
Sítio arqueológico Gruta do Ananás. Os materiais estudados provêm dos setores 2 e 4. A entrada principal, mais a norte, teve 22 m2 escavados, enquanto, no conduto mais a sul, foram realizadas somente tradagens.
Figura 5
Exemplo de perfil estratigráfico do sítio Ananás.
Figura 6
Quartzos presentes no sítio Ananás.

Essas datas são congruentes não somente com o sítio anterior (sítio Capela), mas também com vários outros sítios datados na serra de Carajás (8140 BP, 9559 BP, 8260 BP, 8470 BP, Magalhães, 2005Magalhães, M. P. (2005). A phýsis da origem: O sentido da história da Amazônia. Museu Paraense Emílio Goeldi.), e são interessantes para mostrar a antiguidade das ocupações no sudeste do estado do Pará.

Os resultados apresentados neste estudo referem-se aos vestígios dos setores 2 e 4 e àqueles da coleta de superfície. Trata-se de 271 peças, entre suportes, núcleos, lascas, instrumentos etc., em diversas matérias-primas. Este artigo se concentra na principal matéria-prima observada, os quartzos (hialino, citrino, leitoso, ametista), em 165 peças, sendo a maioria delas concentrada entre a superfície até 35 cm1 1 Cinquenta e oito peças líticas em superfície, 28 entre 0-5 cm, 28 entre 5-10 cm, 95 entre 10 e 15 cm, 56 entre 15 e 20 cm, 147 entre 0 e 20 cm, 18 entre 20 cm e 1 m de profundidade. . O estudo será complementado com os dados da pesquisa realizada por Mendes (2019)Mendes, M. K. (2019). Organização e uso do espaço interno em cavidades por grupos humanos antigos na Amazônia Oriental: Primeiros apontamentos sobre o sítio Gruta do Ananás, em Carajás-PA [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém].2 2 Ressaltamos que o estudante foi amplamente orientado por uma das autoras (M. J. Rodet), a qual acompanhou e participou das análises dos vestígios que resultaram na dissertação de Mendes (2019), sendo responsável pela ficha de análise e pelo empréstimo de dados primários que entraram na pesquisa. , com 1.174 peças líticas, provenientes da superfície e das escavações do setor 1 - AE1 e dos setores 3 e 2 - AE3/AE3 (AE2.2, AE3.3, AE3.4).

O ENTORNO DOS SÍTIOS E A PRESENÇA HUMANA NAS PAISAGENS DE CARAJÁS

Os ambientes do entorno dos sítios são parecidos, predominando uma vegetação aberta, com gramíneas e plantas arbustivas, havendo, na encosta, a floresta ombrófila. Nas proximidades do sítio Capela, há palmeiras de Mauritia flexuosa L.f. (Figura 7), típicas de lugares que alagam (Sampaio & Carazza, 2012Sampaio, M. B., & Carazza, L. R. (2012). Manual tecnológico de aproveitamento integral do fruto e da folha do buriti (Mauritia flexuosa). Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN).), possuindo também várias finalidades (consumo do fruto e do palmito; madeira para confecção de móveis; as folhas geram fibras que podem ser utilizadas no artesanato, tais como tapetes, brinquedos, esteiras, cestos etc.) (Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte].). O sítio Ananás se encontra em ambiente parecido. No seu entorno, situam-se ilhas de mata, rodeadas por campos de canga. As matas são ricas em plantas e frutos variados. Não muito distante, lagos e campos brejosos marcam a paisagem, com a presença sistemática de palmeiras. A área é rica em flora e fauna. A fauna, muito provavelmente, frequentava tanto os brejos quanto as matas em busca de água, frutos, raízes, folhas etc. Os grupos humanos que viveram no local influenciaram e transformaram esses meios naturais em paisagens culturais (Magalhães et al., 2016Magalhães, M. P., Barbosa, C. A. P., Aires da Fonseca, J., Schmidt, M. J., Maia, R. R., Mendes, K., . . . Maurity, G. (2016). Carajás. In M. P. Magalhães (Org.), Amazônia antropogênica (1. ed., pp. 259-308). Museu Paraense Emílio Goeldi.).

Figura 7
A paisagem no entorno do sítio Capela. A seta vermelha indica a posição do sítio na área. Observar o campo brejoso rodeado de buritizais.

Neste artigo, entendemos paisagem e cultura como elementos estritamente interligados, ou seja, o contrário do que muito se discutia há tempos, quando o ambiente era visto como algo estático e que não influenciava nas questões simbólicas dos grupos passados, não agregando valores culturais, pois natureza e cultura eram coisas dissociáveis.

O entorno dos sítios é caracterizado por uma vegetação repleta de plantas úteis, tal como foi identificado nos estudos realizados por Santos (2017)Santos, R. S. (2017). Efeitos da ação humana na composição florística em sítios arqueológicos na Região de Carajás, Pará, Brasil [Tese de doutorado, Universidade Federal do Amazonas e Rede de Biodiversidade e Biotecnologia da Amazônia Legal, Belém]. e complementados pelas análises das sementes carbonizadas encontradas nas escavações (P. Lima, 2018Lima, P. G. C. (2018). Paleoambiente e paisagem durante o Holoceno em Canaã dos Carajás, Pará, Brasil [Tese de doutorado, Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, Brasil].). O espaço de vivência dos grupos passados resulta em uma interação profunda entre seres humanos e paisagens, criando particularidades aos lugares, dando-lhes, consequentemente, o dinamismo cultural. “As paisagens ganham sentidos e aparências na relação com as pessoas que as habitam e as pessoas desenvolvem habilidades, conhecimentos e identidades na relação com as paisagens onde se encontram” (Ingold, 2011Ingold, T. (2011). Being alive essays on movement, knowledge and description. Routledge., p. 129). Portanto, a paisagem transformada:

É um produto da construção humana, podendo ser definida como um espaço social humanizado: no tempo e no espaço. Ela passa a ser lida e interpretada como símbolo e adquirindo seu papel cultural dentro das representações sociais de um dado grupo enquanto bem cultural. A paisagem é compreendida, portanto, como uma construção social

(Fagundes, 2014Fagundes, M. (2014). Natureza e cultura: Estudos teóricos sobre o uso do conceito de paisagem nas Ciências Humanas. Revista Tarairiú, 1(7)., p. 38).

Tal construção é, acima de tudo, extremamente dinâmica, pois ela expressa, por meio do mundo simbólico, os comportamentos dos grupos que ali estavam inseridos (Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte].). Para Magalhães et al. (2016)Magalhães, M. P., Barbosa, C. A. P., Aires da Fonseca, J., Schmidt, M. J., Maia, R. R., Mendes, K., . . . Maurity, G. (2016). Carajás. In M. P. Magalhães (Org.), Amazônia antropogênica (1. ed., pp. 259-308). Museu Paraense Emílio Goeldi., uma análise contextual adequada de um sítio arqueológico implica o entendimento da paisagem enquanto artefato social. Portanto, torna-se importante, na arqueologia, entender a dinâmica histórica que resultou na paisagem estabelecida e herdada por nós. Ao aceitar que a paisagem é uma construção social, deve-se admitir que ocorreram interações entre as paisagens e os grupos humanos a partir de significações e ressignificações de lugares e paisagens. Como destaca Ingold (1993, p. 156)Ingold, T. (1993). The temporality of landscape. World Archaeology, 25(2), 152–174., o “ambiente não é mais do que ‘natureza’ e a paisagem é uma construção simbólica”.

Essa pequena discussão é importante para que possamos ampliar nossos olhares para os distintos vestígios da cultura material presentes não somente intrassítio, mas também no contexto no qual o sítio está inserido. Essa perspectiva torna-se essencial “quando se deseja compreender os processos pelos quais o sítio arqueológico foi formado, ocupado e modificado ao longo do tempo, principalmente quando se busca entender as relações sociais que permearam os diferentes cenários existentes durante a ocupação do sítio” (Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte]., p. 39).

ASPECTOS METODOLÓGICOS

O estudo tecnológico busca compreender as intenções por detrás das produções dos grupos humanos; não somente a maneira como os instrumentos foram produzidos, mas também as fases que englobam utilização, abandono, reutilização e, eventualmente, retomada deles. Para tanto, consideram-se, além do objeto em si, os restos brutos de sua produção (núcleos, lascas, fragmentos etc.). Nessa perspectiva, utiliza-se o conceito de ‘cadeia operatória’, que permite entender as diferentes etapas de produção, desde o estado bruto da matéria até o instrumento final, considerando como ela se apresenta na natureza, as dificuldades para a sua exploração (distância, energia dispensada na busca da matéria-prima) (Perlès, 1980Perlès, C. (1980). Economie du débitage et économie des matières premières: deux exemples grecs. In J. Tixier (Dir.), Préhistoire et technologie lithique (pp. 37-41, Cahier n°1 de l’URA 28). Editions du CNRS.) até a qualidade das jazidas, economia do espaço e como ela chegou ao sítio (Leroi-Gourhan, 1966Leroi-Gourhan, A. (1966). La préhistoire: problèmes méthodologiques. In A. Leroi-Gourhan (Org.), Presses étude technologique des industries lithiques taillées: Bibliographies Universitaires de France (pp. 240-269). Bibliographies Universitaires de France.; Tixier, 2012Tixier, J. (2012 [1978]). Méthode pour l’étude des outillages lithiques. Notice sur les travaux scientifiques [Tese de doutorado, Université de Paris X, Nanterre]. [1978]; Inizian et al., 2017Inizian, M. L., Reduron-Ballinger, M., Roche, H., & Tixier, J. (2017). Tecnologia da Pedra Lascada. Museu de História Natural e Jardim Botânico da UFMG.; Pelegrin et al., 2017Pelegrin, J., Rodet, M. J., & Duarte-Talim, D. (2017). Métodos para estudo de indústrias líticas lascadas: a análise tecnológica. In L. Fernandes & D. Duarte-Talim (Orgs.), Tecnologia lítica na arqueologia brasileira – Coletânea e (re)publicações (pp. 13-28). Museu de História Natural e Jardim Botânico, UFMG.; Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte]., entre outros). Ainda, são analisadas as fases de transformação e os gestos envolvidos em cada uma delas (Pelegrin et al., 2017Pelegrin, J., Rodet, M. J., & Duarte-Talim, D. (2017). Métodos para estudo de indústrias líticas lascadas: a análise tecnológica. In L. Fernandes & D. Duarte-Talim (Orgs.), Tecnologia lítica na arqueologia brasileira – Coletânea e (re)publicações (pp. 13-28). Museu de História Natural e Jardim Botânico, UFMG.). Estes teriam sido constantemente repetidos e estariam encadeados como em um filme e, por consequência, poderiam ser identificados (Desrosiers, 1991Desrosiers, S. (1991). Sur le concept de chaîne opératoire. In H. Balfet (Org.), Observer l’action thecinique: Des chaines opératoires, pour quoi faire? (pp. 21-25). Éditions du Centre Nacional de la Recherche Scientifique.). Os gestos são apreendidos, ensinados e repetidos; consequentemente, trata-se de escolhas culturais. Assim, compreender as preferências tecnológicas de cada período significa isolar momentos diferentes, ocupações distintas, o que permitirá a comparação entre as tecnologias utilizadas. A intenção foi buscar as distintas cadeias operatórias de produção: as simples e as elaboradas. Nesse sentido, é importante destacar, neste trabalho, o que entendemos como cadeia operatória simples e cadeia operatória elaborada. A primeira está relacionada ao pouco nível de transformação tecnológica que é investido em um determinado instrumento, em seu processo de produção (após a debitagem, o suporte é pouco transformado, ou mesmo utilizado bruto, resultando em uma cadeia operatória curta e simples). Já a segunda seria o oposto disso, na qual o instrumento passa por diferentes fases e técnicas de produção e demanda um maior nível de savoir-faire. Logo, temos uma cadeia operatória mais longa e elaborada, com trocas de técnicas, se comparada com a primeira. No último caso, o produto final é muito distinto do produto inicial.

No que se refere mais especificamente ao quartzo, uma metodologia específica foi desenvolvida no Laboratório de Tecnologia Lítica do Museu de História Natural e Jardim Botânico, da Universidade Federal de Minas Gerais (MHNJB-UFMG), por Bassi e Rodet (2017)Bassi, L. F., & Rodet, M. J. (2017). Abordagens tecnológicas do lascamento de cristal de quartzo. In L. Fernandes, & D. Duarte-Talim (Orgs.), Tecnologia lítica na arqueologia brasileira – coletânea e (re)publicações (pp. 218-219). Museu de História Natural e Jardim Botânico, UFMG. e Bassi (2012)Bassi, L. F. (2012). Tecnologia Lítica: Análise diacrônica dos níveis mais antigos do sítio arqueológico Bibocas II, Jequitaí – MG [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais].. O interesse é em recolocar cada resto bruto de debitagem do quartzo em seu devido lugar no suporte de cristal. De acordo com N. Steno (citado em Dana & Hurlbut, 1974Dana, J. D., & Hurlbut, C. S. (1974). Manual de mineralogia (Vols.1-2). (R. R. Franco, Trad.). Livros Técnicos e Científicos.), os ângulos entre as faces correspondentes nos cristais de mesma substância são constantes em uma determinada região, mesmo sendo os cristais de tamanhos e formas variadas. Desse modo, os ângulos e suas medidas servem de referência, permitindo a identificação de onde foi retirada a lasca no suporte de origem (corpo ou ápice), caso seja possível medir tais ângulos. Assim, o método compreende que a leitura tecnológica dos cristais de quartzo envolve tomar as medidas dos ângulos das facetas, além de observar a localização e direção das estrias de crescimento. O método permite situar cada peça com presença de faceta (com ângulo mensurável) em seu devido lugar no núcleo de cristal de quartzo. Em consequência, é possível observar as escolhas técnicas de quem lascou a peça (as retiradas foram longitudinais, transversais, partiram do ápice etc.). O cristal foi teoricamente dividido em três partes (Figura 8): ápice, corpo e raiz.

Figura 8.
Terminologia proposta para os cristais de quartzo e medidas dos ângulos.

Cada peça foi analisada individualmente a partir de um gabarito que envolvia a medida dos ângulos das facetas, o tipo de matéria-prima, as técnicas utilizadas para a retirada, a presença/ausência de tratamentos específicos (tais como abrasão, émoussé) ou, ainda, o controle do lascamento (presença/ausência de acidentes). Núcleos e instrumentos são descritos separadamente e, finalmente, procurou-se entender os métodos de gerenciamento dos distintos tipos de matérias-primas e dos núcleos. No final, buscaram-se as tendências das indústrias líticas em cada nível, para, em seguida, comparar ao longo da estratigrafia (análises interníveis) e, eventualmente, entre os sítios diferentes (interssítios). Esse tipo de análise permite uma compreensão da evolução das indústrias ao longo do tempo e do lugar dos sítios dentro do espaço percorrido pelos grupos (havia intenções distintas nos diferentes sítios que puderam ser observadas através dos restos líticos deixados em cada um?).

AS CARACTERÍSTICAS DO MINERAL

O quartzo é um mineral e compõe grande parte das rochas encontradas no território brasileiro (Klein & Dutrow, 2009Klein, C., & Dutrow, B. (2009). Manual de ciência dos minerais. Bookman Editora.). Apresenta fratura concoidal e tem coloração e formação influenciada pelo ambiente no qual foi consolidado. Trata-se de um composto de dióxido de silício - SiO2 (Klein & Dutrow, 2009Klein, C., & Dutrow, B. (2009). Manual de ciência dos minerais. Bookman Editora.). “Os cristais são substâncias que manifestam uma forma externa poliédrica devido à estruturação interna de seus átomos” (Neves, 2003Neves, P. C. P. (2003). Introdução à mineralogia prática. Editora da ULBRA., p. 24). O mineral apresenta dureza 7 na escala de Mohs. Em seu estado de pureza, é cristalino, totalmente transparente, mas pode ter diferentes colorações, sendo violeta (ametista), amarelado (citrino), acinzentado, leitoso etc. Quando heterogêneo, pode apresentar setores hialinos em oposição a uma coloração esbranquiçada – phanton quartz (Favacho-Silva, 2000Favacho-Silva, M. D. (2000). Variedades gemológicas de quartzo em Minas Gerais: geologia, mineralogia, causas de cor, técnicas de tratamento e aspectos mercadológicos [Dissertação de mestrado, Belo Horizonte, Brasil].). Ainda, pode apresentar linhas de fissuras em seu interior, dificultando os lascamentos. Suas qualidades (homogeneidade, resistência, fratura concoidal) apontam para uma matéria-prima de excelência para a produção de instrumentos, a qual, mesmo sendo muito dura, é frágil. Além disso, a constância dos ângulos entre as facetas permite, muitas vezes, orientar certos produtos de lascamento em setores específicos do prisma (lei de Steno), assinalando para as escolhas de gerenciamento dessa matéria-prima pelos povos originários (Bassi & Rodet, 2017Bassi, L. F., & Rodet, M. J. (2017). Abordagens tecnológicas do lascamento de cristal de quartzo. In L. Fernandes, & D. Duarte-Talim (Orgs.), Tecnologia lítica na arqueologia brasileira – coletânea e (re)publicações (pp. 218-219). Museu de História Natural e Jardim Botânico, UFMG.; Bassi, 2012Bassi, L. F. (2012). Tecnologia Lítica: Análise diacrônica dos níveis mais antigos do sítio arqueológico Bibocas II, Jequitaí – MG [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais].; Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte].; Rodet et al., 2017Rodet, M. J., Duarte-Talim, D., Maurity, C., Teles, C., & Magalhães, M. P. (2017). O tratamento térmico da ametista: Alto bonito, garimpo das pedras, Carajás, Pará. Teoria & Sociedade, 24, 55-75.). Podemos encontrar o quartzo em jazidas primárias, mas também secundárias, como é o caso de quartzos rolados em superfície ou em cursos de água.

A PRESENÇA DO MINERAL NOS SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS

As indústrias líticas sobre quartzo foram as mais recorrentes no sítio Capela. Elas apareceram principalmente em forma de pequenos cristais hialinos (dimensões próximas de 3 e 5 cm de comprimento, pouco espessos, por volta de 2 cm), em quartzo de veio/leitoso e policristalino, ou ainda em forma de seixos rolados em rio. Estes últimos são, de maneira geral, de pequenas e médias dimensões e formas variadas (entre 3 e 8 cm, mais e menos arredondados e/ou alongados).

Os quartzos leitosos, em sua formação, preencheram as fraquezas das rochas de Carajás. Eles são observados no entorno do sítio a uma distância próxima de 5 km. Os seixos utilizados (leitosos ou hialinos) são provenientes de jazidas secundárias, muito distantes de sua formação inicial. Um dos locais onde foram observados se encontra por volta de 6 km, no rio Sossego. Ainda, as ametistas, em posição primária, foram observadas no município de Marabá (Alto Bonito, serra Sul), a 62 km do sítio em estudo, assim como o cristal de quartzo hialino (M. J. Rodet, comunicação pessoal, 10 jun. 2012; J. Oliveira, 2000Oliveira, J. K. M. (2000). Mapeamento estrutural com ênfase na geometria dos Veios de Ametistas de Alto Bonito, Carajás-PA [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Federal do Pará, Belém].). No sítio Capela, observa-se a presença de restos brutos de lascamento (lascas e núcleos), com facetas naturais e neocorticais, apontando que os lascamentos foram realizados in situ.

Os estudos do sítio Ananás apontam para uma utilização sistemática de pequenos cristais de quartzos hialino, ametista ou citrino de 3, 4 ou 5 cm de comprimento. Em geral, as jazidas de matéria-prima secundária do quartzo se encontram no entorno do sítio (área de 5 a 10 km). As jazidas primárias de cristais hialino e ametista podem ser provenientes, como para o sítio anterior, das minas da região do Alto Bonito – garimpo das Pedras (Rodet et al., 2017Rodet, M. J., Duarte-Talim, D., Maurity, C., Teles, C., & Magalhães, M. P. (2017). O tratamento térmico da ametista: Alto bonito, garimpo das pedras, Carajás, Pará. Teoria & Sociedade, 24, 55-75.), que dista aproximadamente 20 km, em linha reta, do sítio Ananás. As prospecções realizadas no entorno do sítio mostraram a presença de veios de quartzo leitoso e pequenos cristais hialinos dentro dos granitos da Formação Carajás. De maneira geral, as prospecções demonstraram que a grande maioria das matérias-primas utilizadas ao longo da ocupação está presente num raio de 5 km. A exceção é o quartzo citrino, ainda não observado de maneira sistemática na serra de Carajás (Rodet, 2015Rodet, M. J. (2015). As jazidas de matérias-primas (potencialmente) utilizadas pelos grupos pré-históricos que frequentaram as serras de Carajás, Pará.).

OS PRODUTOS PROCURADOS: SÍTIO ARQUEOLÓGICO CAPELA

De acordo com Maia (2017)Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte]., as análises indicam a utilização de técnicas e métodos específicos na produção de instrumentos, sendo o quartzo a base da produção de instrumentos sobre bruto de debitagem (baseando na presença de macrotraços) e instrumentos simples unifaciais e bifaciais (estes últimos mais raros). As lascas-suporte são pequenas (cerca de 0,3 e 3 cm). A hematita/magnetita foi outra matéria-prima utilizada nesse tipo de produção (lascas com cerca de 4 a 9 cm). A hematita/magnetita também foi utilizada para produzir instrumentos sobre restos brutos de debitagem (presença de macrotraços). Já a indústria lítica sobre diabásio foi utilizada na produção dos instrumentos mais elaborados encontrados no sítio Capela (fragmentos de lâminas de machado e uma ‘mão de mó’), além da presença de percutores/bigornas, núcleos e lascas.

As técnicas de lascamento mais observadas ao longo da estratigrafia escavada foram: percussão direta com pedra dura, seguida por percussão sobre bigorna. A percussão tangencial orgânica, mais rara, foi utilizada principalmente para as fases de façonagem/retoque. A percussão direta dura esteve presente mais expressivamente nos cristais de quartzo hialino, por volta de 9520 Cal BP (Beta 461158). E a percussão sobre bigorna foi utilizada, principalmente, sobre os quartzos leitosos de veio, sendo também observada por volta de 11224 Cal BP (Beta 461160).

A percussão direta dura e a percussão sobre bigorna produziram os suportes mais observados nas coleções analisadas, quais sejam: instrumentos de pequena dimensão, realizados sobre lascas de quartzo hialino ou leitoso, apresentando macrotraços de possível utilização (serrilhados, arredondamento etc.); e instrumentos simples unifaciais (com pouca transformação do suporte), frequentemente com retiradas diretas, mais raramente inversas ou mesmo nas duas faces, sendo setoriais ou ocupando toda a borda. Os ângulos dos gumes variam um pouco, mas a maior parte se encontra por volta de 50º. Essa síntese demonstra que os instrumentos encontrados no sítio Capela são principalmente realizados sobre lascas de debitagem, além de apresentarem macrotraços de utilização em setores recorrentes. Esse resultado indica que, muito provavelmente, as pessoas que frequentaram o local buscavam produzir instrumentos com ângulos próximos de 50º. Gumes com esse ângulo são extremamente cortantes, e os produtos poderiam ser utilizados para atividades cotidianas (Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte]., p. 245).

Foram identificadas três cadeias operatórias, simples e elaborada.

CADEIA OPERATÓRIA SIMPLES

  1. Os instrumentos sobre lascas apresentam somente uma etapa: retirada da lasca-suporte por percussão direta por pedra dura ou percussão sobre bigorna. O suporte, depois de retirado, está pronto para ser utilizado sem transformação. Os gumes são cortantes, podendo ser utilizados para realizar atividades como cortar e/ou raspar. Arqueologicamente, apresentam pequenos negativos de utilização, localizados, principalmente, na face superior, indicando o sentido do gesto (Figuras 9 e 10) (Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte]., pp. 244-245).

  2. Instrumento simples: cadeia operatória com pouco investimento tecnológico. Qualquer produto resultante da debitagem serve como suporte. Duas etapas compõem a cadeia operatória: debitagem e retoque do suporte (Figura 11). Em consequência, o objeto final é muito parecido com o suporte inicial (cadeia operatória simples). Observam-se, nesses instrumentos, retoques unifaciais (diretos) e, mais raramente, bifaciais em setores específicos (Figura 12). A análise tecnológica (Tixier, 2012Tixier, J. (2012 [1978]). Méthode pour l’étude des outillages lithiques. Notice sur les travaux scientifiques [Tese de doutorado, Université de Paris X, Nanterre]. [1978]) possibilitou aproximar poucos núcleos de lascas que serviram como suporte de instrumentos, visto que as dimensões finais dos núcleos abandonados nos sítios são menores que aquelas dos instrumentos. Mesmo os núcleos iniciais (ou cristais) deixados no abrigo são de menor tamanho. Consequentemente, eles não poderiam produzir as lascas que serviram de suporte para tais instrumentos. Por outro lado, eles podem ter sido muito maiores ou, ainda, os núcleos maiores não observados na coleção podem estar em quadrantes não escavados ou não analisados (Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte]., p. 246).

Figura 9
Esquema de uma cadeia operatória simples.
Figura 10
Exemplos de possíveis instrumentos sobre brutos de debitagem. Observar os macrotraços (pequenas retiradas e arredondamento do gume de possível utilização).
Figura 11
Esquema de uma cadeia operatória simples com instrumento pouco transformado.
Figura 12
Exemplos de instrumentos com retoques unifaciais realizados sobre lascas de quartzo.

CADEIA OPERATÓRIA ELABORADA

Nas indústrias sobre quartzo, apenas um instrumento relacionado a uma cadeia operatória elaborada foi identificado. Trata-se de um instrumento com retoques biface, suporte não identificado, realizado em quartzo incolor (2,4 x 1,9 x 0,7 cm - Figura 13). A fase de façonagem aponta para a utilização de percutor orgânico e gesto tangencial. A façonagem foi realizada a partir de duas séries de negativos, a primeira (mais longos que largos, pouco profundos, raros acidentes), bem controlada, e uma segunda, com negativos mais largos do que longos. Os retoques, curtos, finalizam a delineação do gume (Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte]., pp. 246-247).

Figura 13
Instrumento bifacial sobre quartzo hialino.

Além desses instrumentos, foi observado um número expressivo de instrumentos brutos como percutores: seixos de quartzos de diferentes morfologias e dimensões (Figura 14). Os mais pesados podem ter sido utilizados para debitar os núcleos, sobre bigorna ou percussão direta, como apontam as pequenas marcas situadas setorialmente e resultantes do impacto dos golpes aplicados. As cúpulas localizadas nas extremidades ogivais e periferias são relacionadas à utilização da percussão direta. Aquelas situadas em setores aplainados dos seixos indicam uma utilização sobre bigorna. Esta última necessita de uma maior estabilidade do percutor, que deve, então, apresentar um setor plano, permitindo tocar no núcleo diretamente com essa face. Ainda, tais peças foram eventualmente ‘reaproveitadas’ e utilizadas como núcleos.

Figura 14
Instrumentos sobre seixos de quartzo com marcas de utilização.

AS INTENÇÕES PRESENTES NAS INDÚSTRIAS LÍTICAS DO SÍTIO GRUTA DO ANANÁS

Os vestígios analisados da Gruta do Ananás permitiram indicar quais técnicas foram eleitas nas produções de seus instrumentos e como gerenciaram as suas matérias-primas nesses processos. As técnicas mais observadas ao longo de todo o período de ocupação (Figura 15) foram a percussão direta dura (79 peças, 44%) e a percussão sobre bigorna (40 peças, 22%) para produção de pequenas lascas, as quais, provavelmente, foram utilizadas ainda brutas de debitagem ou pouco transformadas (cadeia operatória simples). Essa tendência se confirma com o estudo apresentado por Mendes (2019)Mendes, M. K. (2019). Organização e uso do espaço interno em cavidades por grupos humanos antigos na Amazônia Oriental: Primeiros apontamentos sobre o sítio Gruta do Ananás, em Carajás-PA [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém]. no mesmo sítio, que indica a percussão direta dura como a principal técnica utilizada na retirada das lascas (340 lascas, 84%), seguida pela percussão sobre bigorna (34 lascas, 19%). No nosso estudo, há uma quantidade importante de lascas que trazem estigmas das duas técnicas numa mesma peça e não puderam ser colocadas de maneira específica dentro de uma ou outra classe (40 lascas, 22%). Essa dificuldade vem do fato de que, no lascamento sobre a bigorna, se houver uma leve inclinação da peça no momento da percussão e o ângulo do golpe não for de 90º (split), os estigmas resultantes são uma mistura dos dois tipos de técnica (a fratura pode ser inicializada em split e, em seguida, pela inclinação dada à peça, continuar em fratura concoidal) (Rodet et al., 2013Rodet, M. J., Duarte-Talim, D., & Abrahan, L. (2013). Experimentações da percussão sobre bigorna no cristal de quartzo. Revista Espinhaço, 2(2), 147-152. https://doi.org/10.5281/zenodo.3967739
https://doi.org/10.5281/zenodo.3967739...
). Quanto à percussão tangencial orgânica, não há um número contundente de lascas no conjunto de vestígios líticos exumados do sítio para que se possa afirmar com segurança a sua utilização. Entretanto, nada impede que ela tenha sido utilizada na fase de façonagem de instrumentos unifaciais ou bifaciais, como indicam outros estudos da região (Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte].).

Figura 15
Técnicas utilizadas ao longo da estratigrafia: as técnicas utilizadas nas coleções do sítio Ananás são principalmente a percussão direta dura e a percussão sobre bigorna, não havendo uma preferência ao longo do tempo ou sobre matérias-primas especificas. Mesmo que o número de ‘indeterminados’ seja significativo (28 peças, 15%), ele não poderia modificar a tendência do resultado, caso os espécimes fossem de uma classe ou de outra.

Em síntese, pode-se afirmar que a percussão direta dura e a percussão sobre bigorna estiveram presentes lado a lado ao longo de toda a estratigrafia, mesmo se, em alguns momentos, houve uma pequena tendência da utilização de uma ou de outra técnica. Em toda a coleção exumada, os núcleos em quartzo são de pequenas dimensões, sendo a grande maioria com 2 a 3 cm de comprimento (raramente atingiram 4 cm); a largura é de 1,5 a 2 cm; a espessura variou entre 0,3 a 2 cm. Nota-se, ainda, que não existe uma real relação entre a utilização de uma técnica e um tipo de quartzo específico.

Quatro métodos foram sistematicamente utilizados na abertura dos cristais ao longo do tempo e podem ser sintetizados:

Três métodos longitudinais (Quadro 1).

Quadro 1
Métodos longitudinais identificados no cristal de quartzo. Fonte: M. J. Rodet.

Um método por percussão transversal (Quadro 2).

Quadro 2
Método identificado no cristal de quartzo. Fonte: M. J. Rodet.

Os métodos geraram pequenos suportes que foram utilizados diretamente sem transformação (brutos de debitagem), instrumentos provenientes de cadeias operatórias simples no que se refere ao investimento tecnológico. Os raros acidentes do tipo refletido ou quebra apontam para um bom controle do lascamento. A produção de pequenas lascas retiradas longitudinalmente (a partir do ápice ou da raiz) ou transversalmente, utilizando as facetas naturais do quartzo como plano de percussão, resultou na produção de lascas mais longas do que largas ou mais largas do que longas. Tais suportes (27) apresentam macrotraços de possíveis utilizações (pequenos negativos nas proximidades dos gumes e serrilhamento, com ângulos tendendo entre 300, 400, 600 e 700) e foram interpretados como instrumentos sobre bruto de debitagem. Na coleção analisada, não aparecem instrumentos elaborados. Tais informações são, em parte, coerentes com os resultados apresentados por Mendes (2019)Mendes, M. K. (2019). Organização e uso do espaço interno em cavidades por grupos humanos antigos na Amazônia Oriental: Primeiros apontamentos sobre o sítio Gruta do Ananás, em Carajás-PA [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém]., nos quais a maior parte dos suportes observados é utilizada diretamente sem transformação (16 instrumentos), com presença de serrilhamentos e pequenos negativos nas proximidades dos gumes, principalmente em ângulos entre 300 e 600. Os instrumentos transformados a partir de retoques bifaciais e unifaciais são raros, havendo apenas três: dois com retoques bifaciais, sendo um em cristal citrino (20-25 cm) e outro em diabásio (entre 5 e 10 cm); e um unifacial em quartzo leitoso (5-10 cm). Ainda foram identificados: um instrumento que apresenta técnica de polimento (matéria-prima não reconhecida) (15-20 cm), um percutor sobre seixo (matéria-prima sem identificação) em superfície e outro em hematita (15-20 cm).

Um dado interessante observado nos primeiros 15 cm da escavação – momento com o maior número de peças em quartzos (149) – é a presença mais marcante de quartzo hialino e leitoso (54 peças) nos níveis mais profundos (15 cm), enquanto o citrino e a ametista são discretos (20 peças). Essa tendência se inverte no final da sequência (5 cm) e em superfície, quando há aumento discreto da presença do citrino (28 peças) e na diminuição do quartzo hialino e leitoso (47). Essa tendência se confirma com os estudos de Mendes (2019)Mendes, M. K. (2019). Organização e uso do espaço interno em cavidades por grupos humanos antigos na Amazônia Oriental: Primeiros apontamentos sobre o sítio Gruta do Ananás, em Carajás-PA [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém]., 942 peças, nos primeiros 15 cm, sobre 1.235 vestígios3 3 O estudo de Mendes (2019) é referente a 1.345 peças: 0-5 cm, 163 peças; 5-10 cm, 456 peças; 10-15 cm, 323; 15-20 cm, 138; 20-25 cm, 126 peças; 25-30 cm, 92 peças; 30-35 cm, 47 peças. Os tipos se distribuem da seguinte maneira: entre 0-5 cm, 20 peças de quartzo hialino, 5 em leitoso, 9 em citrino; 5-10 cm, 165 em hialino, 28 em leitoso, 46 em citrino e 5 em ametista; 10-15 cm, 158 em quartzo hialino, 31 em leitoso, 28 em citrino e 12 em ametista; 15-20 cm, 78 em quartzo hialino, 16 em leitoso, 27 em citrino e 9 em ametista. , e diminuição do quartzo hialino e leitoso nos primeiros 5 cm. Entretanto, nessa amostra, a presença do citrino é reduzida nos primeiros centímetros, sendo mais importante entre 5 e 20 cm (e em superfície).

Um elemento importante da pesquisa nesse sítio é a escolha dos grupos em utilizar não somente o quartzo hialino, mas também a ametista e o citrino. De acordo com os geólogos que trabalham no setor, o citrino não aflora abundantemente na região, em oposição à ametista e ao quartzo hialino. Na região, a ametista pode ser encontrada principalmente na região do Alto Bonito, situada ao nordeste da serra de Carajás, aproximadamente 20 km do sítio em questão (J. Oliveira, 2000Oliveira, J. K. M. (2000). Mapeamento estrutural com ênfase na geometria dos Veios de Ametistas de Alto Bonito, Carajás-PA [Trabalho de conclusão de curso, Universidade Federal do Pará, Belém].; Rodet et al., 2017Rodet, M. J., Duarte-Talim, D., Maurity, C., Teles, C., & Magalhães, M. P. (2017). O tratamento térmico da ametista: Alto bonito, garimpo das pedras, Carajás, Pará. Teoria & Sociedade, 24, 55-75.). De acordo com Favacho-Silva (2000)Favacho-Silva, M. D. (2000). Variedades gemológicas de quartzo em Minas Gerais: geologia, mineralogia, causas de cor, técnicas de tratamento e aspectos mercadológicos [Dissertação de mestrado, Belo Horizonte, Brasil]., as jazidas de citrino naturalmente amarelado são raras, sendo as mais comuns no Brasil encontradas nos estados de Bahia, Goiás, Minas Gerais, Tocantins e Rio Grande do Sul. Por outro lado, na Amazônia boliviana, província de Santa Cruz, há um mineral denominado ametrino, que é a presença de citrino e ametista no mesmo arranjo mineral, em rocha calcária dolomítica, em um contexto de brecha hidrotermal. Seu desenvolvimento ainda não foi totalmente compreendido pelos pesquisadores (Vasconcelos et al., 1994Vasconcelos, P. M., Kenk, H.-K., & Rossman, G. R. (1994). The Anahi Ametrine, Bolivia. Gems & Gemology, 30(1), 4–23.; Duarte-Talim, 2019Duarte-Talim, D. (2019). (Re)visitando a Amazônia: Serra dos Carajás e Monte Alegre, estado do Pará. Análise tecnológica das indústrias líticas dos sítios antigos da passagem Pleistoceno-Holoceno e do Holoceno inicial [Tese de doutorado. Universidade Federal de Minais Gerais, Belo Horizonte, Brasil].).

A presença marcante de citrino nas camadas estratigráficas levou-nos a refletir sobre a existência do mineral no sítio Ananás em particular, mas também em outros sítios da região (Gruta do Gavião, Gruta do N1, Gruta do Grilo, entre outros). Diversos cristais ou lascas da coleção apresentam cores variadas, indo da branca-transparente até a totalmente amarelada, passando por resquícios de violeta ou opalescência. Esses são encontrados no sítio Ananás como um todo, mas também relacionados especificamente às estruturas de combustão. Algumas vezes, observou-se a ocorrência em uma mesma estrutura de restos de carvões, fragmentos cerâmicos e presença de quartzo, inclusive ametistas e citrinos. Para melhor compreender a presença do citrino nas coleções arqueológicas de Carajás, realizamos duas abordagens: (i) um trabalho etnográfico junto aos garimpeiros do Alto Bonito, que transformam, atualmente, a ametista em citrino a partir de fornos elétricos, sem praticamente nenhuma perda ou acidente (Rodet et al., 2017Rodet, M. J., Duarte-Talim, D., Maurity, C., Teles, C., & Magalhães, M. P. (2017). O tratamento térmico da ametista: Alto bonito, garimpo das pedras, Carajás, Pará. Teoria & Sociedade, 24, 55-75.); (ii) experimentações controladas com ametistas colocadas dentro de vasilhas cerâmicas (com e sem a utilização de cinzas) e estas assentadas sobre fogueiras. Os trabalhos experimentais foram baseados tanto nos resultados obtidos junto aos garimpeiros quanto nos resultados de pesquisas realizadas na Universidade de Brasília (UnB), por Silva e Nascimento (2013), que transformaram a ametista em citrino. Essa pesquisa demonstrou que a ametista é transformada em citrino a partir de uma temperatura de aproximadamente 450º, ficando por volta de nove horas em forno (elétrico). Nessas condições, os cristais vão se tornar totalmente amarelos, entretanto, períodos menores ou temperaturas diferentes dão resultados distintos, como mostra o Quadro 3.

Quadro 3
Transformação da ametista em citrino: experimento realizado por Silva e Nascimento (2013).

Nossas experimentações utilizando fogueiras (realizadas no MHNJB-UFMG) demonstraram a possibilidade real da transformação da ametista dentro de vasilhas cerâmicas, mas também possibilitaram a observação e a descrição dos diversos tipos de acidentes que podem atingir a matéria-prima durante o tratamento térmico. O conjunto dos resultados indica a possibilidade de os grupos que frequentaram o sítio Ananás buscarem transformar a ametista em citrino. Inclusive, na estrutura de combustão da escavação AE1, foi encontrado um cristal parte ametista, parte citrino (K. Mendes, comunicação pessoal, 15 jan. 2014). Ressalta-se, entretanto, que, de acordo com Lameiras (2012)Lameiras, F. S. (2012). The relation of FTIR signature of natural colorless quartz to color development after irradiation and heating. In V. Morozhenko (Ed.), Infrared Radiation (pp. 41-56). IntechOpen., não há modificação na estrutura do quartzo através do calor, ou seja, não há melhoria da matéria-prima para o lascamento, como acontece em outros tipos de matérias-primas (Rodet et al., 2016Rodet, M. J., Sousa, J., & Magalhaes, M. P. (2016). Hyaline quartz, amethyst, and citrine: basis of the lithic industries of carajás, Serra Norte, Pará, Brasil (Example Of Pa-At-316: N3-63 - Gruta Do Ananás). In XIX Congreso Nacional de Arqueologia Argentina, Tucumán (Vol. 1, pp. 2521-2527). Publicación de la Facultad de Ciencias Naturales e Instituto Miguel Lillo., 2017; Duarte-Talim, 2019Duarte-Talim, D. (2019). (Re)visitando a Amazônia: Serra dos Carajás e Monte Alegre, estado do Pará. Análise tecnológica das indústrias líticas dos sítios antigos da passagem Pleistoceno-Holoceno e do Holoceno inicial [Tese de doutorado. Universidade Federal de Minais Gerais, Belo Horizonte, Brasil].). Por outro lado, é possível que o interesse dos frequentadores do sítio tenha sido a transformação da coloração do mineral.

Em síntese, pode-se afirmar que as análises dos vestígios líticos da Gruta do Ananás apresentam resultados que complementam aqueles vistos até agora, tanto no sítio Capela quanto em outros sítios arqueológicos da região (cf. Introdução). O quartzo, em suas mais diversas morfologias e constituições, foi a matéria-prima mais observada nas indústrias líticas (cristal hialino, citrino, ametista, fumê, além de quartzo leitoso de veio e em forma de seixo). A hematita-magnetita, quartzito e arenito são matérias-primas locais ou do entorno próximo e são raras na coleção, o que permite inferir o quartzo como uma escolha cultural dos grupos que frequentaram a caverna. Cadeias operatórias simples sobre cristais de quartzo foram sistematicamente observadas e reúnem principalmente as seguintes características gerais: (i) a percussão direta dura e a percussão sobre bigorna foram frequentemente utilizadas para abrir os pequenos cristais de quartzo e produzir lascas alongadas, estreitas e frequentemente pouco espessas; (ii) as facetas naturais do quartzo foram, por vezes, utilizadas como plano de percussão para retirada de pequenas lascas por percussão direta dura, transversais ao eixo longitudinal, gerando lascas mais largas do que longas. Nota-se, no conjunto das indústrias líticas estudadas da serra de Carajás, que os pequenos cristais foram utilizados para produzir principalmente lascas que foram utilizadas diretamente, sem transformação ou com poucos retoques, principalmente unifaciais, mais raramente bifaciais.

Diversas variedades de quartzo foram utilizadas, tais como quartzo hialino, leitoso, ametista e citrino. Este último foi, muito provavelmente, obtido a partir do tratamento térmico da ametista.

DISCUSSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS

De modo geral, as indústrias líticas sobre quartzo estudadas na serra de Carajás podem estar relacionadas a distintas atividades, necessidades ou intenções. Os macrotraços de possíveis utilizações, observados de maneira sistemática em determinados gumes (ângulos recorrentes), deixam pensar que os instrumentos podem ter sido empregados em atividades no próprio sítio. Nesse caso, é provável que esses pequenos instrumentos tenham tido uma relação com atividades cotidianas. Em complemento às análises que indicaram presença marcante de fibras vegetais e frutos na entrada dos sítios (Santos, 2017Santos, R. S. (2017). Efeitos da ação humana na composição florística em sítios arqueológicos na Região de Carajás, Pará, Brasil [Tese de doutorado, Universidade Federal do Amazonas e Rede de Biodiversidade e Biotecnologia da Amazônia Legal, Belém].), é possível pensar que esses instrumentos tenham servido, dentre outras atividades, para cortar fibras, raspar cascas, abrir frutos etc., entretanto, ainda não foram realizadas análises tracelógicas. Trata-se de indústrias essencialmente simples em termos de investimentos tecnológicos, com predomínio de pequenos instrumentos produzidos sobre qualquer produto proveniente da debitagem e que apresentam macrotraços e instrumentos simples (pouca transformação do suporte), com presença de retoques a partir de uma só das superfícies (unifaciais) ou, mais raramente, retoques biface. Ao longo da estratigrafia, em menor ou maior quantidade, de acordo com os diferentes níveis e camadas, esses elementos foram observados em todos os quadrantes escavados do sítio Capela. Os métodos e as técnicas observadas sobre os núcleos apontam para lascamentos sobre bigorna e por percussão direta dura, realizados a partir da geometria do bloco ou conforme os ângulos dos planos de debitagem a partir de uma cadeia operatória simples. As lascas-suporte foram modificadas setorialmente a partir de alguns poucos retoques ou utilizadas diretamente (Maia, 2017Maia, R. R. (2017). A tecnologia lítica dos antigos grupos humanos de Carajás: Sítio Capela (PA-AT-337: S11D47/48) [Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte]., p. 249). O segundo sítio, Gruta do Ananás, situado a 42 km em linha reta do primeiro, não está muito distante desse contexto. A partir das mesmas técnicas, as intenções da produção que puderam ser observadas relacionam-se com pequenos instrumentos realizados sobre quartzo hialino, ametista e citrino, os quais serão utilizados diretamente, sem transformação. Entretanto, nota-se que as escolhas para gerenciar as debitagens, os métodos, são distintas entre os dois locais. Por outro lado, a opção de trabalhar sistematicamente a ametista e transformá-la em citrino não aparece no sítio Capela. Todavia, o citrino está presente em outros sítios da serra (Duarte-Talim, 2019Duarte-Talim, D. (2019). (Re)visitando a Amazônia: Serra dos Carajás e Monte Alegre, estado do Pará. Análise tecnológica das indústrias líticas dos sítios antigos da passagem Pleistoceno-Holoceno e do Holoceno inicial [Tese de doutorado. Universidade Federal de Minais Gerais, Belo Horizonte, Brasil].). A questão é a de saber se estamos diante de grupos distintos ou se os mesmos grupos utilizavam os abrigos de maneiras distintas.

Se a transformação térmica da ametista não interfere na estrutura do quartzo, por outro lado, ela modifica totalmente sua cor, a qual pode variar entre violeta e amarela, passando pela opalescência. Pode-se dizer que os vestígios analisados nos dois estudos da Gruta do Ananás não apresentam acidentes de maneira sistemática (fissuras, fragmentações, cúpulas etc.), indicando que os grupos tinham um conhecimento técnico e um bom controle dessa alteração térmica. Ressalta-se que grande parte das cúpulas térmicas apresentadas no estudo de Mendes (2019)Mendes, M. K. (2019). Organização e uso do espaço interno em cavidades por grupos humanos antigos na Amazônia Oriental: Primeiros apontamentos sobre o sítio Gruta do Ananás, em Carajás-PA [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém]. está situada na face inferior da lasca, indicando que a mesma aconteceu em um momento posterior ao lascamento, portanto ao tratamento térmico, muito provavelmente por contato térmico. Transformar esse mineral remete a um controle do tempo de exposição dessa matéria ao calor, mas também ao domínio desse calor, que não deve se alterar de maneira brusca, o que pode ter como consequência fragmentação ou fissura das peças. As análises realizadas até o momento indicam justamente que o objetivo de modificar as peças foi muito bem atingido, demonstrando que os grupos dominavam a técnica, pois não aparecem muitos acidentes relacionados ao calor.

Por outro lado, se tal transformação não responde a questões técnicas, a que podemos relacioná-la? Acreditamos que tais modificações de cor podem estar relacionadas com a dimensão cerimonial ou imaginária desses grupos. Roux (2000)Roux, V. (2000). La cornaline de l’Inde: Des pratiques techniques de Cambay aux techno-systémes de l’Indus. Maison des Sciences de l’Homme. chama atenção para os produtores de contas de colares na Índia, que transformam a ágata em cornalina na busca de uma cor específica. Ou, ainda, podemos citar a presença sistemática de pontas-projétil arqueológicas no Uruguai, que foram frequentemente realizadas em silexito de coloração avermelhada ou amarelada (J. Lopez Mazz, comunicação pessoal, 28 mar. 2016), apesar da variedade de cores dessa matéria-prima nas jazidas uruguaias (Rodet et al., 2017Rodet, M. J., Duarte-Talim, D., Maurity, C., Teles, C., & Magalhães, M. P. (2017). O tratamento térmico da ametista: Alto bonito, garimpo das pedras, Carajás, Pará. Teoria & Sociedade, 24, 55-75.). Mesmo se as questões relacionadas com as cores dos instrumentos não interessassem muito aos tecnólogos, temos observado que as cores amarela e vermelha têm estado presentes frequentemente em coleções de objetos elaborados, como é o caso da coleção de pontas bifaciais depositadas no Museu Lauro da Escócia, Mossoró, Rio Grande do Norte, ou, ainda, na ponta encontrada no município de Itamarandiba, Minas Gerais (Rodet et al., 2014Rodet, M. J., Duarte-Talim, D., Souza, J., & Cruz, I. R. (2014). Nota sobre a ponta bifacial em sílex encontrada no município de Itamarandiba, estado de Minas Gerais. Arquivos do Museu de História Natural e Jardim Botânico da UFMG, 23(2), 142–151.). Modificar a estrutura ou a cor de uma rocha ou mineral demanda uma aquisição de conhecimento muito importante, um domínio de técnicas específicas que pode, certamente, ser relacionado culturalmente com um alto nível de savoir-faire dessas populações.

As técnicas utilizadas para realizar essa transformação ainda estão em estudo, mas podem estar relacionadas com a produção de fornos, utilização de vasilhas cerâmicas como fornos, ou ainda as peças a serem ‘transformadas’ podem ter sido enterradas sob uma fogueira a uma certa profundidade.

Enfim, pode-se afirmar que o quartzo tem sido utilizado de maneira sistemática na região da serra de Carajás desde a passagem entre os períodos Pleistoceno e Holoceno, não como uma matéria-prima secundária, mas como uma escolha técnica e social. As prospecções no entorno do sítio Gruta do Ananás mostraram claramente uma variedade de matéria-prima disponível, mas foram os quartzos a mais exumada nas escavações. Essa matéria-prima, por suas qualidades intrínsecas, respondeu de maneira consistente às diferentes necessidades e desejos desses grupos, e, certamente, eles estabeleceram com ela relações que vão bem além do que nós, tecnólogas, conseguimos observar.

No que se refere ao ambiente no entorno dos dois sítios arqueológicos, notamos que eles são parecidos. Os sítios estão localizados no topo de platôs das serras Sul e Norte, onde predomina uma vegetação aberta, com gramíneas e plantas arbustivas, e na encosta a floresta ombrófila. Nas proximidades do sítio Capela, o bioma é uma vegetação seca, específica do substrato rochoso (canga), complementado pela floresta amazônica típica, além de campos alagados, com presença de palmeiras. No entorno do sítio Ananás, situam-se ilhas de matas rodeadas por campos de canga. As matas são ricas em plantas úteis e frutos variados, e a presença da água é marcante, o que demonstra, mais uma vez, as escolhas culturais de instalação em ambientes selecionados pelos grupos.

Com base nos trabalhos sobre os ambientes dos sítios amazônicos (Junqueira et al., 2011Junqueira, A. B., Shepard, G. H., & Clement, C. (2011). Secondary forests on anthropogenic soils of the Middle Madeira river: Valuation, local knowledge, and landscape domestication in Brazilian Amazonia. Economic Botany, 65(1), 85–99.; Levis et al., 2012Levis, C., De Souza, P. F., Schietti, J., Emilio, T., Da Veiga Pinto, J. L. P., Clement, C. R., & Costa, F. R. (2012). Historical human footprint on modern tree species composition in the Purus-Madeira interfluve, central Amazonia. PloS One, 7(11), e48559. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0048559
https://doi.org/10.1371/journal.pone.004...
; Magalhães et al., 2016Magalhães, M. P., Barbosa, C. A. P., Aires da Fonseca, J., Schmidt, M. J., Maia, R. R., Mendes, K., . . . Maurity, G. (2016). Carajás. In M. P. Magalhães (Org.), Amazônia antropogênica (1. ed., pp. 259-308). Museu Paraense Emílio Goeldi.), que relatam a presença de ações antrópicas antigas na floresta regional, Santos (2017)Santos, R. S. (2017). Efeitos da ação humana na composição florística em sítios arqueológicos na Região de Carajás, Pará, Brasil [Tese de doutorado, Universidade Federal do Amazonas e Rede de Biodiversidade e Biotecnologia da Amazônia Legal, Belém]. apresentou resultados sobre estudos botânicos e arqueobotânicos no entorno do sítio em estudo. Nesse ambiente, sobretudo em uma área de campo brejoso, além das palmeiras citadas, Santos (2017)Santos, R. S. (2017). Efeitos da ação humana na composição florística em sítios arqueológicos na Região de Carajás, Pará, Brasil [Tese de doutorado, Universidade Federal do Amazonas e Rede de Biodiversidade e Biotecnologia da Amazônia Legal, Belém]. identificou 18 espécies úteis. A diversidade das espécies identificadas variava desde o seu uso como alimento e para confecção de utensílios, até para o uso de cobertura de casas (Balée, 1994Balée, W. (1994). Footprints of the Forest: Ka’apor ethobotany – the historical ecology of plan utilization by an Amazonian people. Columbia University Press.; Santos, 2017Santos, R. S. (2017). Efeitos da ação humana na composição florística em sítios arqueológicos na Região de Carajás, Pará, Brasil [Tese de doutorado, Universidade Federal do Amazonas e Rede de Biodiversidade e Biotecnologia da Amazônia Legal, Belém].). Como resultado de suas pesquisas, Santos (2017)Santos, R. S. (2017). Efeitos da ação humana na composição florística em sítios arqueológicos na Região de Carajás, Pará, Brasil [Tese de doutorado, Universidade Federal do Amazonas e Rede de Biodiversidade e Biotecnologia da Amazônia Legal, Belém]. destaca a dominância de espécimes silvestres de Manihot sp., além de uma composição florística rica em plantas comestíveis, como o inajá (Attalea maripa), o pequiá (Caryocar villosum), a bacaba (Oenocarpus distichus) e o uxi-amarelo (Endopleura uchi), entre outras plantas, notadamente associadas a fatores antrópicos (Santos, 2017Santos, R. S. (2017). Efeitos da ação humana na composição florística em sítios arqueológicos na Região de Carajás, Pará, Brasil [Tese de doutorado, Universidade Federal do Amazonas e Rede de Biodiversidade e Biotecnologia da Amazônia Legal, Belém]., p. 78).

A partir dessas considerações, é possível refletir que o entorno do sítio, seus campos com presença de água, palmeiras comestíveis, assim como a mata presente na entrada imediata do sítio, têm sido importantes fontes de alimentos para os grupos que frequentaram o local. Além dos benefícios da vegetação, a água disponível nos lagos provavelmente atraía os animais, os quais, muito possivelmente, serviam de alimento. A água presente nos lagos do entorno certamente era outro elemento atrativo, pois, para além de todos os seus benefícios, atraía a caça.

Por outro lado, diante dos resultados expostos, não podemos deixar de pensar que a Amazônia sempre foi um local possível para as ocupações humanas. Os sítios arqueológicos de Carajás mostram claramente ocupações de longa duração. Os locais foram habitados desde o Holoceno inicial e seguiram ocupados ao longo do tempo. Os grupos estavam muito bem integrados à floresta amazônica e compunham com ela uma relação intrínseca, na qual se reconheceram e se desenvolveram não de maneira dicotômica, mas, ao contrário, como parte dinâmica dessa paisagem.

Os estudos realizados nos últimos anos na serra de Carajás demonstram claramente a interação desses grupos aos distintos ambientes, um conhecimento muito específico não apenas de suas plantas e animais, mas também de suas matérias-primas líticas, o que remete a uma inter-relação entre humanos e domínios naturais. As produções técnicas dos grupos estão relacionadas não somente com as suas necessidades de ordem funcional, seja do ponto de vista prático, seja do simbólico, mas, ainda, trata-se de produzir objetos socialmente referendados. Estar inserido em uma determinada paisagem durante um período longo significa estabelecer relações profundas com ela. O conhecimento das jazidas de matérias-primas dentro do espaço de vida dos grupos, as escolhas de quais minerais e rochas utilizar, os conhecimentos minuciosos nas produções líticas e a manipulação térmica dos minerais são elementos que demonstram estabilidade ocupacional na região da serra de Carajás.

  • Maia, R. R., Rodet, M. J., & Magalhães, M. P. (2022). A utilização dos quartzos por sociedades antigas na serra de Carajás, Amazônia, Pará. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, 17(3), e20210032. doi: 10.1590/2178-2547-BGOELDI-2021-0032
  • 1
    Cinquenta e oito peças líticas em superfície, 28 entre 0-5 cm, 28 entre 5-10 cm, 95 entre 10 e 15 cm, 56 entre 15 e 20 cm, 147 entre 0 e 20 cm, 18 entre 20 cm e 1 m de profundidade.
  • 2
    Ressaltamos que o estudante foi amplamente orientado por uma das autoras (M. J. Rodet), a qual acompanhou e participou das análises dos vestígios que resultaram na dissertação de Mendes (2019)Mendes, M. K. (2019). Organização e uso do espaço interno em cavidades por grupos humanos antigos na Amazônia Oriental: Primeiros apontamentos sobre o sítio Gruta do Ananás, em Carajás-PA [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém]., sendo responsável pela ficha de análise e pelo empréstimo de dados primários que entraram na pesquisa.
  • 3
    O estudo de Mendes (2019)Mendes, M. K. (2019). Organização e uso do espaço interno em cavidades por grupos humanos antigos na Amazônia Oriental: Primeiros apontamentos sobre o sítio Gruta do Ananás, em Carajás-PA [Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Pará, Belém]. é referente a 1.345 peças: 0-5 cm, 163 peças; 5-10 cm, 456 peças; 10-15 cm, 323; 15-20 cm, 138; 20-25 cm, 126 peças; 25-30 cm, 92 peças; 30-35 cm, 47 peças. Os tipos se distribuem da seguinte maneira: entre 0-5 cm, 20 peças de quartzo hialino, 5 em leitoso, 9 em citrino; 5-10 cm, 165 em hialino, 28 em leitoso, 46 em citrino e 5 em ametista; 10-15 cm, 158 em quartzo hialino, 31 em leitoso, 28 em citrino e 12 em ametista; 15-20 cm, 78 em quartzo hialino, 16 em leitoso, 27 em citrino e 9 em ametista.

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Responsabilidade editorial: Martijn van den Bel

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    07 Maio 2021
  • Aceito
    14 Mar 2022
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