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ANÁLISE DAS RELAÇÕES ENTRE DINÂMICA POPULACIONAL, CLIMA E VETORES DE MUDANÇA NO SEMIÁRIDO BRASILEIRO: UMA ABORDAGEM METODOLÓGICA

Change Analysis of population dynamics and climate variability in the Brazilian semi-arid region: a methodological approach

Resumos

A região semiárida do Nordeste brasileiro tem sofrido os impactos das mudanças ora causadas por ações humanas, ora causadas direta ou indiretamente pelas mudanças no clima. O zoneamento de áreas mais suscetíveis a mudanças ou historicamente sob forte pressão por causa do crescimento das cidades e outros fatores antrópicos pode auxiliar em ações de planejamento mais sustentáveis nesta região. Este trabalho apresenta uma metodologia integradora para correlacionar diferentes variáveis (demográficas, climáticas e socioeconômicas) de forma a indicar áreas submetidas a potencial “pressão” por mudanças na região. A utilização de um estimador estatístico para uniformização das informações, através de modelagem em ambiente SIG, sobrepondo as variáveis consideradas, possibilitou uma integração eficiente. Os resultados apontam áreas submetidas a “forte pressão” no entorno de cidades importantes no contexto atual do semiárido nordestino, o que se reflete em alterações marcantes na forma de uso e ocupação destas regiões. Isto se configura, principalmente, por essas regiões apresentarem alta densidade populacional, acompanhada por um crescimento do PIB agropecuário nos últimos anos.

Palavras-chave:
dinâmica populacional; variáveis bioclimáticas; indicadores e Geotecnologias.


The semiarid region of Northeastern part of Brazil is under changes pressures driven by human activities or climate changes. Spatial analysis and visualization of potential land use/land cover changes (LULCC) zones can be a useful tool for helping on planning actions or decision making policies for sustainable development. This study presents a methodological and spatial approach for pointing out mainly changes drivers. GIS tools and a statistics estimator are used in a spatial modelling and standardization of all inputs from different data sources. The results show the nearest areas from some important middle cities such as “high pressure changes”. In those areas, it is possible to observe the strong correlation between LULCC and high density urban areas and an increasing of GDP (Gross Domestic Product for Livestock and Agriculture) in the last years as well.

Keywords:
population dynamics; bioclimatic variables; indicators tools; geospatial technologies


1. Introdução

O aquecimento do planeta por ação antropogênica, apesar da incerteza relativa à sua magnitude, é fato aceito pela comunidade científica (PBMC, 2013PBMC-Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas. “Contribuição do Grupo de Trabalho 2 ao Primeiro Relatório de Avalição Nacional do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas”. Sumário Executivo do GT2. PBMC, Rio de Janeiro, Brasil. 28p. 2013.). Áreas urbanas densas propiciam a formação de ilhas de calor devido ações antrópicas intensas de suas fábricas, indústrias, longas redes de tráfego rodoviário, edifícios e estacionamentos (Kato e Yamaguchi, 2010Kato, S., Yamaguchi, Y. “Influence of Shade on Surface Temperature in an Urban Area Estimated by ASTER Data”. In: International Archives of the Photogammetry, Remote Sensing and Spatial Information Science, Kyoto Japan. 2010. Vol XXXVIII, Part 8, ). A mudança climática é o resultado de um processo de intensificação do efeito estufa (Arnell, 1994Arnell, N. W. “Hydrological impacts of climate change. In: CALLOW, P. e PETTS, G. E. (Eds.). The rivers handbook. Oxford: Blackwell, vol. 2, p. 173 - 185. 1994.). Trata-se de um acúmulo de gases na atmosfera oriundos de várias fontes naturais ou fabricadas pelo homem desde a revolução industrial. Este efeito ocasiona alteração no balanço de energia, eleva as temperaturas e as taxas de evaporação, modifica o ciclo das chuvas, diminui a umidade dos solos e das águas subterrâneas e altera o escoamento superficial e fluvial.

O impacto no uso do solo concernente à dinâmica populacional no mundo se procede em todas as áreas habitadas e de várias formas. Para Girão (2004Girão, O.; Correa, A.C. de B. “A contribuição da geomorfologia para o planejamento da ocupação de novas áreas”. Revista de Geografia, UFPE DCG/NAPA, Recife, v. 21, n. 02, 2004.), a “ação antropogênica sobre o ambiente natural rapidamente promoveu inúmeras alterações, negligenciando-se a dinâmica ambiental como um dos fatores reguladores dos complexos processos responsáveis pelo equilíbrio dos sistemas físicos”.

Barbieri (2013Barbieri, A. F. Transições populacionais e vulnerabilidade às mudanças climáticas no Brasil. REDES - Ver. Des. Regional, Santo Cruz do Sul, v. 18, n. 2, p. 193-213, maio/ago 2013.) trata dos potenciais impactos de cenários futuros de mudanças ambientais, principalmente mudanças climáticas, sobre a população brasileira e se refere ao termo “vulnerabilidade populacional” como sendo a capacidade de grupos sociais preverem situações de exposição a perigos ambientais (por exemplo, eventos climáticos extremos como tempestades, secas, etc.) e de responderem aos impactos causados pelos mesmos. Para o autor essa capacidade depende de muitos fatores como localização física das populações, fatores de ordem socioeconômica, de saúde, política e cultural. Ele conclui dizendo que “vulnerabilidade populacional seria o resultado de uma ‘equação’ em que o fator de perigo (hazard) é igual a uma soma (ou combinação) de exposição, sensibilidade, e capacidade adaptativa” (Barbieri, 2013Barbieri, L. F. P., Correia, M. F., Braga, C. C., Gonçalves, W. A., Moura, M. S. B. “Desempenho de Método de Estimativa da Temperatura Média Diária: um estudo em áreas com forte pressão antrópica”. Revista Brasileira de Geografia Física. 2013.).

Conforme Confalonieri & Barata (2011Confalonieri, U.E; Barata, M. “Avaliação da Vulnerabilidade Municipal no Estado do Rio de Janeiro às Mudanças Climáticas” (Relatório de pesquisa). Rio de Janeiro: Fiocruz, 2011.) uma característica recorrente na literatura sobre análise de vulnerabilidade é a definição sobre a forma como uma população está exposta a um fator de perigo, em particular mudanças climáticas, e a sua sensibilidade de resposta, ou capacidade adaptativa a esse perigo. Qualquer atividade humana ou desastre natural que altere significativamente a quantidade da vegetação e de áreas úmidas proporcionará alterações no clima tanto espacial quanto temporal (Weng, 2001Weng, Q. “A remote sensing-GIS evaluation of urban expansion and its impact on surface temperature in the Zhujiang Delta, China”. International Journal of Remote Sensing, v. 22, n.10, p. 1999 - 2014. 2001.; Chudnovsky et al, 2004Chudnovsky, A., Ben-Dor, E., Saaroni, H. “Diurnal thermal behavior of selected urban objects using remote sensing measurements”. Energy and Buildings, n.36, p.1063 - 1074. 2004.).

É exatamente nesse contexto que o sensoriamento remoto (SR) possibilita à comunidade científica quantificar e/ou estimar os fluxos de energia entre a atmosfera e a superfície terrestre de maneira a capturar os dados praticamente em tempo real, diariamente, com alta resolução temporal e espacial. Além disso, a produção e distribuição gratuita de softwares de Geoprocessamento, bem como a facilidade de se encontrar dados disponíveis de boa qualidade de produtos de Sensoriamento Remoto em websites aumentaram significativamente nos últimos anos.

É o caso do projeto Worldclim (Hijmans et al., 2005Hijmans, R. J., Cameron, S. E., Parra, J. L., Jones, P. G., Jarvis, A. “Very high resolution interpolated climate surfaces for global land areas”. In: International Journal of Climatology. 25: 1965-1978. 2005.), uma base de dados bioclimáticos globais, que fornece variáveis bioclimáticas para estudos ambientais com resolução de aproximadamente 1 Km². Pode-se encontrar também uma vasta gama de dados censitários, igualmente de fácil acesso na Internet, os quais muitas vezes não são utilizados por gestores por se encontrarem em formato inadequado para uma rápida análise. Tais dados vêm proporcionando à comunidade acadêmico/cientifica e público em geral a produção de materiais de qualidade e a custos baixíssimos para ajudar na tomada de decisão. O fator preponderante, no entanto, não é mais a produção de dados em si, mas como utilizá-los de maneira eficaz para se obter o resultado desejado, ou seja, qual metodologia mais apropriada para a produção de informações relevantes.

Neste contexto, o presente trabalho propõe uma metodologia integradora de variáveis bioclimáticas e censitárias com vistas a um indicador único que represente áreas submetidas à forte pressão no semiárido brasileiro. Neste sentido, quatro indicadores socioeconômicos foram selecionados a partir de variáveis censitárias: densidade populacional e população rural, Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) e Produto Interno Bruto (PIB) agropecuário. Além disso, três variáveis bioclimáticas foram escolhidas e utilizadas na análise: temperatura média anual (BIO1), precipitação anual (BIO12) e sazonalidade da precipitação (BIO15). Toda a análise foi feita em ambiente SIG levando em consideração os conceitos advindos da teoria dos conjuntos difusos ou nebulosos para os métodos de sobreposição dos planos de informação.

2. Área de Estudo

O Semiárido brasileiro, apresentado na Figura 1, é uma das regiões semiáridas mais populosas de todo globo terrestre. É também a maior área territorial que compõe os espaços naturais da região Nordeste do Brasil. Seu clima é constituído de amplitudes térmicas elevadas, com médias térmicas acima de 26°C, duas estações climáticas bem definidas: uma chuvosa, com precipitações irregulares que vão de um mínimo de 300 mm a um máximo de 800 mm, ocorrida durante os meses de Fevereiro a Maio de cada ano, chamado de quadra chuvosa (Alves e Repelli, 1992Alves, J.M.B., Repelli, C. A. “A variabilidade pluviométrica no setor norte do Nordeste e os eventos El Niño-Oscilação Sul (ENOS)”. Revista Brasileira de Meteorologia, v.7, n.2, p.583-92, 1992.), e outra seca, na qual há sempre uma média muito baixa de precipitação.

Figura 1:
Localização de identificação da área de estudo..

Segundo dados do último censo (IBGE, 2011IBGE. Base de informações do Censo Demográfico 2010: Resultados do Universo por setor censitário. Rio de Janeiro, 2011. Disponível em: Disponível em: http:// www.ibge.gov.br . Acesso em 10 de agosto de 2014.
http:// www.ibge.gov.br...
), a população do semiárido supera os 22 milhões de habitantes, o que representa quase 12% de toda população brasileira. Possui 1.135 municípios distribuídos por 9 estados da região Nordeste e norte da região Sudeste, segundo a Portaria n° 89 do Ministério da Integração Nacional (BRASIL, 2005Brasil.Ministério da Integração Nacional.DOU, Portaria Número 89 de 10 de Março de 2005.Brasília-DF, 2005. ). Esta densidade populacional gera uma pressão bastante considerável sobre os recursos naturais, especialmente sobre os recursos hídricos, que somado ao fator físico-climático potencializa a escassez hídrica na região. A precipitação é muito irregular no tempo e no espaço, as altas temperaturas proporcionam elevadas taxas de evapotranspiração, o que compromete a sustentabilidade da população rural devido à escassez desse recurso em quantidade e também em qualidade.

3. Escolha das variáveis e abordagem metodológica

Uma das grandes dificuldades nos estudos sobre as mudanças no uso e ocupação do solo no semiárido é a mensuração de fatores físicos como clima e fatores socioeconômicos como pressões causada por crescimento demográfico. Mesmo compreendendo que estas questões estão intimamente relacionadas (por exemplo: uma seca prolongada pode causar uma procura por fontes alternativas de subsistência o que pode implicar em alterações na forma de apropriação e uso do solo), na maioria das vezes as análises precisam ser realizadas isoladamente por limitações metodológicas ou mesmo de compatibilização dos diversos formatos de dados envolvidos. No tocante às variáveis socioeconômicas, estão usualmente agregadas por municípios, enquanto as variáveis físicas e climáticas são especializadas usualmente de forma contínua ao longo da superfície estudada. Neste trabalho, as variáveis socioeconômicas são convertidas em superfícies de forma a permitir uma combinação direta das mesmas com outros dados de diferente natureza, mas com o mesmo padrão espacial.

Um procedimento comum de análise espacial é a “subtração” de dados de diferentes datas. Desta forma, e com procedimentos de legenda, torna-se possível a visualização dos municípios por “níveis de mudança” em valores absolutos de “aumento” ou “diminuição” da população. Apesar de rápido e eficiente, para uma área com 1.135 municípios como o semiárido e com grande diferença de extensão territorial dos mesmos, a leitura e análise deste resultado por vezes é limitada pelo nível de agregação espacial da informação (limite municipal). Não há como perceber facilmente, por exemplo, vetores ou tendências de mudanças ao longo de um certo grupo de municípios.

Martin (1996Martin, D. An assessment of surface and zonal models of Population. International Journal of Geographical Information p. 973-989, 1996.) afirma que a excessiva fragmentação do território no modelo de polígonos impõe limitações na percepção da totalidade do fenômeno. Assim, a compreensão do território não pode estar restrita a esse tipo de representação e deve-se complementar essa visão com representações do espaço urbano através de imagens e superfícies. O modelo de superfície quando aplicado a dados socioeconômicos consegue representar a população de forma contínua. A leitura desta realidade torna mais difícil um estabelecimento de fronteiras rígidas entre os diferentes territórios. Além disso, as transições são graduais.

De certo modo é apropriado pensar que a população de um município se distribui continuamente (Almeida et al, 2009Almeida, C. M. de; Câmara, G.; Monteiro, A. M. (Org.). Geoinformação em urbanismo: cidade real x cidade virtual. São Paulo: Oficina de Textos, 2009. 368 p.). Assim, utilizou-se um estimador de densidade kernel que permite a análise do dado por unidade de área (limitada pela resolução do pixel escolhida). A função quadrática representada pela Figura 2, segundo (Silverman, 1998Silverman, B. W. Density Estimation for Statistics and Data Analysis. London: Chapman & Hall/CRC, 1998. ), está presente em alguns SIG, e permite que os dados, antes agregados por polígono (neste caso, os municípios), sejam espacializados através de superfícies.

Em estatística, estimativa de densidade kernel (EDK) é uma forma não-paramétrica para estimar a função de densidade de probabilidade de uma variável aleatória. Estimação da densidade kernel é um problema fundamental de suavização de dados onde inferências sobre a população são feitas, com base numa amostra de dados finita (Silverman, 1998Silverman, B. W. Density Estimation for Statistics and Data Analysis. London: Chapman & Hall/CRC, 1998. ).

Figura 2:
Representação esquemática de um estimador kernel (Fonte: Almeida et al, 2009Almeida, C. M. de; Câmara, G.; Monteiro, A. M. (Org.). Geoinformação em urbanismo: cidade real x cidade virtual. São Paulo: Oficina de Textos, 2009. 368 p.)

Estimadores kernel são funções que determinam a intensidade de um determinado evento nos diferentes pontos da área de estudo. Para calcular a intensidade populacional local de uma localidade j, o estimador kernel é posicionado no centroide da unidade j e computa a média ponderada dos dados populacionais da área de estudo conforme pode ser observado na Figura 2. Os pesos utilizados neste cômputo dependem da parametrização do estimador kernel estabelecida pelo pesquisador/usuário (Almeida et al, 2009Almeida, C. M. de; Câmara, G.; Monteiro, A. M. (Org.). Geoinformação em urbanismo: cidade real x cidade virtual. São Paulo: Oficina de Textos, 2009. 368 p.).

Para estabelecer um indicador de áreas sob forte “pressão” do ponto de vista de mudanças ao longo dos anos foi proposta uma metodologia de “sobreposição Fuzzy” utilizando ferramentas do ambiente SIG. A Figura 3 é uma representação esquemática desta metodologia proposta. Uma sobreposição fuzzy final foi realizada entre estes planos de informação para a obtenção de um único indicador de área sob forte “pressão a mudanças”. O resultado é apresentado ao final do texto (resultados) em forma de mapa com o nível de pressão hierarquizado através de uma legenda de cores.

Figura 3:
Representação esquemática da metodologia proposta.

O conceito de conjuntos difusos ou nebulosos (Fuzzy Sets) foi proposto por Zadeh (1965Zadeh, L. A. Fuzzy sets. Information and Control, 8:338-353. 1965.), como uma generalização do conceito da Teoria Clássica dos Conjuntos. Os conjuntos Difusos são uma metodologia de caracterização de classes, que por várias razões não têm ou não podem definir limites rígidos (bordas) entre classes. Essas classes definidas de maneira inexata são chamadas de Conjuntos Difusos. A utilização de um Conjunto Difuso é indicada sempre que se tiver que lidar com ambiguidade, abstração e ambivalência em modelos matemáticos ou conceituais de fenômenos empíricos (Burrough & McDonnell, 1998Burrough, P. A., McDonnell, R. A. Principles of Geographic Information Systems. Oxford, Oxford University Press. 1998.).

As sobreposições fuzzy foram realizadas em 3 etapas: Atividades Humanas1 (que considerou os dados de densidade populacional, população rural, realizando mapas de diferença), Atividades Humanas 2 (que considerou o IDHM e o PIB agropecuário) e critérios climáticos (que considerou três variáveis climáticas e sua adequação à análise).

3.1 Atividades Humanas 1: Dinâmica populacional

A população mundial tem crescido vertiginosamente nas últimas décadas. Este fenômeno está muito relacionado ao aumento dos centros urbanos. Estima-se que até 2050, mais de 6 bilhões de pessoas (cerca de dois terços da população mundial) estarão vivendo em cidades ou em áreas urbanizadas (Simpson, 2013Simpson, R. Introduction: A Green Economy for Green Cities. In: Local Suistainability, Volume 3, pp 13-16, 2013.). O aumento da população nas cidades comumente causa uma pressão por recursos naturais disponíveis em seu entorno, seja no âmbito alimentar, energético ou na extração de materiais diretamente relacionados com a construção civil. Logo, municípios que apresentam uma dinâmica populacional de grandes mudanças em um certo período tendem a apresentar alterações no uso do solo de seu território, não apenas nas áreas urbanizadas, como em todo o seu entorno.

O último Censo Demográfico realizado pelo IBGE revela que a população residente no Semiárido brasileiro alcançou a marca de 22.598.318 habitantes em 2010, o que corresponde a 11,85% da população brasileira ou 42,57% da população nordestina. Possui densidade demográfica de 23,05 habitantes por Km², o que lhe caracteriza como a região semiárida mais populosa do mundo. Esta elevada densidade populacional para uma região semiárida impõe forte pressão sobre os recursos naturais (Ab’Saber, 1999Ab’Sáber, A. N., Dossiê Nordeste Seco. Estudos Avançados, São Paulo, 13 (36), 1999. Disponível em: <Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ea/v13n36/v13n36a02.pdf >. Acesso em: 25/05/2015.
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), contribuindo para a degradação da Caatinga e para o avanço do processo de desertificação presente em quase metade do território do Semiárido Brasileiro. A Tabela 1 apresenta esta dinâmica em números e as migrações e êxodos da população em zonas urbanas e rurais ao longo de duas décadas.

Tabela 1:
Êxodo rural e do Semiárido nos períodos 1991-200 e 2000-2010 (Fonte: Alves, 2015Alves, E., Souza, G. S. O Semiárido segundo o Censo Agropecuário 2006 e os censos de população 1991, 2000 e 2010. Revista de Política Agrícola, Brasília, DF, ano 24, n. 1, jan./fev./mar. 2015.).

Para este trabalho, foram utilizados dados dos censos de 1980 e 2010, ou seja, um intervalo de 30 anos. Dados censitários são bons indicadores de dinâmica populacional por permitirem a visualização imediata do aumento/diminuição da densidade demográfica de uma região, o que por si só já caracteriza uma mudança. A Figura 4 mostra a população do semiárido nas décadas de 1980 e 2010, respectivamente, espacializadas por nível de agregação por polígonos e por superfícies kernel.

A adoção de uma largura de banda mais estreita (raio de influência) implica na consideração de localidades que serão extremamente influenciadas pelas unidades de área mais próximas, enquanto que a adoção de maiores raios de influência implica na inclusão de localidades em um entorno mais abrangente, que por sua vez já refletem a influência de outras localidades mais distantes. Na Figura 3 pode-se observar uma tendência de ocorrência de forma mais clara quando os dados são espacializados em superfícies. A principal vantagem desta metodologia de espacialização é tornar possível a análise cruzada e sobreposta com as variáveis bioclimáticas que, em sua maioria, estão discretizadas em grades de pixels com resoluções específicas. Neste trabalho a resolução adotada para todas as grades de pixels foi de 1.000m (1Km)

Figura 4:
Densidade populacional em 1980 e 2010. (a) Nível de agregação espacial “limite municipal”; (b) Dinâmica populacional em superfície pelo uso da função Kernel em 1980 e 2010.

Figura 5:
Dinâmica da população rural para os anos de 1980 e 2010 (utilizando superfície kernel).

Na Tabela 1 é possível perceber que no período 1991-2000 houve migração rural para outras regiões que não as cidades do Semiárido, mas em ambos os períodos o êxodo rural é bastante elevado comprovando uma tendência de crescimento das cidades e seu entorno. A Figura 5 torna possível a visualização desta dinâmica que pode implicar em dinâmica no uso do solo por atividades agropecuárias e/ou por êxodo rural. A metodologia de espacialização utilizada anteriormente para a população municipal foi também utilizada para a população rural por município

3.2 Atividades humanas 2: dados socioeconômicos

O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é o índice mais utilizado para representar de maneira prática e resumida a qualidade de vida de uma população. É atualizado anualmente no Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH) do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). O IDH reúne indicadores de saúde, educação e renda, o que demonstra que as pessoas necessitam basicamente de: vida longa e saudável, acesso ao conhecimento e poder desfrutar de um padrão de vida digno. Assim, o IDH é composto por três outros indicadores: Expectativa de vida, o acesso ao conhecimento e o Produto Interno Bruto (PIB). O Brasil está classificado na posição 75° do ranking mundial com IDH de 0,755 entre 188 países.

Publicado pela primeira vez em 1990, o IDH é calculado anualmente. Desde 2010, sua série histórica é recalculada devido ao movimento de entrada e saída de países e às adaptações metodológicas, o que possibilita uma análise de tendências. Aos poucos, o IDH tornou-se referência mundial.

O Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHMB,2013Índice de Desenvolvimento Humano Municipal Brasileiro - Brasília: PNUD, Ipea, FJP, 2013.) é uma medida composta de indicadores de três dimensões do desenvolvimento: longevidade, educação e renda, igualmente variando de 0 a 1, porém este adequa a metodologia global ao contexto brasileiro e à disponibilidade de indicadores nacionais. O IDHM indica diferentes graus de desenvolvimento existentes entre os municípios e no interior de um mesmo município (no caso das metrópoles) e é capaz de identificar tendências de longo prazo e, portanto, tornou-se uma importante ferramenta para analisar e acompanhar a evolução na qualidade de vida dos brasileiros onde de fato moram (Ipea, 2015Ipea - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. O Financiamento da Agropecuária Brasileira no Período Recente. 2015. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/3407/1/td_2028.pdf Acesso em: Fevereiro de 2016.
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). A Figura 6 apresenta a espacialização utilizando o estimador de densidade kernel para os anos de 2000 e 2010. Percebe-se uma tendência discreta de melhoria do IDHM em algumas regiões no período de uma década.

Figura 6:
IDHM nos anos de 2000 e 2010 em superfície kernel.

O Produto Interno Bruto (PIB) representa a soma de todos os bens e serviços finais, em valores monetários, produzidos em uma determinada região, seja ela cidade, estado ou país em determinado período de tempo. É um indicador econômico que tem o objetivo de quantificar a atividade econômica da região em estudo e é dividido em três setores: Agropecuária, Indústria e serviços.

O Produto Interno Bruto dos Municípios é desenvolvido desde o ano 2000 e coordenado pelo IBGE em parceria com órgãos estaduais. É calculado sob metodologia uniforme para todas as unidades da federação, e é integrado aos procedimentos adotados nos Sistemas de Contas Nacionais e Regionais do país, de modo que seu resultado seja coerente entre si e com os resultados nacionais e regionais. Pode-se achar também o PIB per capita de cada município que é estimado pelo quociente entre o valor do PIB do município e a sua população residente (IBGE, 2012IBGE - Instituto Nacional de Geografia e Estatística. Produto Interno Bruto dos Municípios. 2012. Disponível em: Disponível em: http://biblioteca.ibge.gov.br/visualização/livros/liv91152.pdf Acesso em: fevereiro de 2016.
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).

O PIB agropecuário cresceu 3,9% ao ano (a.a.) contra 3,6% da economia no período 2000-2011, mantendo sua trajetória de crescimento (IBGE, 2012IBGE - Instituto Nacional de Geografia e Estatística. Produto Interno Bruto dos Municípios. 2012. Disponível em: Disponível em: http://biblioteca.ibge.gov.br/visualização/livros/liv91152.pdf Acesso em: fevereiro de 2016.
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). A produção de grãos, oleaginosas, cereais e fibras saltou de 83 milhões para 163 milhões de toneladas nos últimos doze anos. A agropecuária teve saldo comercial proporcionado pelo agronegócio de US$ 77,4 milhões em 2012 e desde 2007 este setor tem sido o principal responsável pelo saldo positivo na balança comercial com uma participação expressiva de mais de 40% nas exportações (Ipea, 2015Ipea - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. O Financiamento da Agropecuária Brasileira no Período Recente. 2015. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/3407/1/td_2028.pdf Acesso em: Fevereiro de 2016.
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). Neste trabalho um aumento de PIB agropecuário é entendido como um indicador de mudanças principalmente em atividades que interferem diretamente no uso e ocupação do solo como a agricultura e a pecuária. A Figura 7 apresenta a espacialização desta variável para os anos de 2000 e 2010 utilizando a mesma metodologia anterior. Os dados obtidos originalmente agregados por municipalidades foram especializados em superfícies utilizando o estimador Kernel.

Figura 7:
PIB Agropecuário para os anos de 2000 e 2010 em superfície kernel

3.3. Variáveis Climáticas

A variabilidade climática tem sido ao longo dos anos, a principal causa de flutuações na produção global de alimentos em regiões áridas e semiáridas dos países tropicais em desenvolvimento. Picos de aquecimento e resfriamento, secas e inundações e várias outras formas de variações climáticas tem causado estragos na agricultura e pecuária destas regiões. Tudo isto, somado a outros condicionantes físicos e a questões sociais e econômicas podem fazer com que as mudanças climáticas tenham um forte impacto econômico e organizacional da população (Sivakumar et al., 2005Sivakumar, M. V. K., Das, H. P. and Brunini, O. Impacts of present and future climate variability and change on agriculture and forestry in the arid and semi-arid tropics. In: Climatic Change 70: 31-72. Springer. 2005.).

Existem diversas bases de dados climáticos globais disponíveis para uso em SIG. As geotecnologias permitem integrar diferentes dados de fontes e formatos variados. Nos dias atuais, o desafio científico não é mais a produção do dado em si, mas a definição da metodologia mais “apropriada” para usar de forma eficiente a vasta gama de dados disponível.

Para criar uma série temporal de dados de chuva para múltiplas localizações é necessário um trabalho árduo de coleta dos dados das estações que usam, por sua vez, diferentes instrumentos e métodos e o resultado é um conjunto de dados que nem sempre tem uma boa distribuição espacial. Segundo Chapman (2010Chapman, G. “Popular perception and climate change: mapping the varying experience of precipipation”. In: W. Østreng (ed): Transference. Interdisciplinary Communications 2008/2009. CAS, Oslo (Internet publication, http://www.cas.uio.no/publications_/ transference.php, ISBN:978-82-996367-7-3). 2010.
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), na última década esses registros foram criados, e em seguida, através de procedimentos de interpolação sofisticados, os dados foram reexpressos em pixels de latitude e longitude em diferentes níveis de resolução. Os dados de precipitação utilizados neste estudo e apresentados na Figura 8, integram uma base de dados previamente interpolada através do Projeto WordClim.

O Projeto WorldClim (Hijmans et al, 2005Hijmans, R. J., Cameron, S. E., Parra, J. L., Jones, P. G., Jarvis, A. “Very high resolution interpolated climate surfaces for global land areas”. In: International Journal of Climatology. 25: 1965-1978. 2005.) é uma base de dados climáticos (climate grids) globais com resolução de 1 km2 O objetivo desta base de dados é fornecer variáveis bioclimáticas globais para estudos ambientais. Os dados mensais definidos para as superfícies globais (excluindo Groenlândia e Antártida) para o mesmo período (1951-2000) estão disponíveis em três resoluções diferentes (0,5 ° lat/lon, 1,0 ° lat/lon, 2,5 ° lat/lon).

A observação da variável da temperatura média anual - Figura 8a - é extremamente importante para o semiárido brasileiro. Sua variação traz grandes implicações na manutenção das lavouras, criação de animais, níveis de reservatórios, etc. O aumento da temperatura desestrutura o ciclo hidrológico, pois eleva a temperatura dos mananciais fazendo com que grandes massas de água evaporem. Há previsões de aumento nos níveis de temperatura e taxas de evaporação e acentuação de eventos meteorológicos extremos. Deste modo, altas temperaturas médias anuais podem ser um indicador de maiores impactos nos níveis de reservatórios no semiárido, base do planejamento e gestão dos recursos hídricos da região.

A precipitação média anual - Figura 8b - é a variável que mais se destaca em todo semiárido, pois quase que sua totalidade apresenta baixas precipitação com médias em torno dos 346mm. Observa-se ainda que todo o semiárido está envolto por um perímetro que possui precipitação elevada em torno dos 1911mm, assim como algumas poucas regiões no interior do semiárido como Iguatu e Crato, por exemplo.

A sazonalidade da precipitação é calculada baseada no coeficiente de variação e é apresentada na Figura 8c. De acordo com Hijmans et al. (2005Hijmans, R. J., Cameron, S. E., Parra, J. L., Jones, P. G., Jarvis, A. “Very high resolution interpolated climate surfaces for global land areas”. In: International Journal of Climatology. 25: 1965-1978. 2005.), o coeficiente de variação é o desvio padrão da precipitação semanal estimada, expressa pelo percentual da média das estimativas (i.e. da média anual). Pode-se observar através desta variável que em países de clima tropical há uma variabilidade maior da precipitação. De acordo com Chapman (2010Chapman, G. “Popular perception and climate change: mapping the varying experience of precipipation”. In: W. Østreng (ed): Transference. Interdisciplinary Communications 2008/2009. CAS, Oslo (Internet publication, http://www.cas.uio.no/publications_/ transference.php, ISBN:978-82-996367-7-3). 2010.
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), a visualização desta variável em mapa mostra as áreas da superfície terrestre em que, para qualquer valor da média, a precipitação é sazonalmente "agrupada".

A variabilidade da precipitação na região semiárida é bastante elevada e as mudanças no uso do solo diretamente dependentes e relacionadas a esta sazonalidade. A representação da sazonalidade da precipitação é de grande relevância para a avaliação dos impactos do clima em recursos hídricos e agricultura. O início do plantio das culturas e o regime fluvial são condicionados pela distribuição temporal das chuvas. Uma má representação desta sazonalidade compromete a avaliação dos impactos das mudanças climáticas sobre os recursos hídricos e agricultura (Silveira et al, 2014Silveira, C. S., Oliveira, J. L., Silva, R. F. V., Nóbrega, M., Souza, S. A. Variabilidade e Mudanças Climáticas na Bacia do Rio São Francisco - Avaliação dos modelos Globais quanto à Representação da Precipitação. XII Simpósio de Recursos Hídricos do Nordeste. Natal-RN. 2014.), os quais, causam impactos diretos no uso do solo na região Nordeste do Brasil

Figura 8:
(a)Temperatura média anual, (b) Precipitação média anual e (c) Sazonalidade da precipitação na região semiárida a partir das variáveis bioclimáticas do Projeto Wordclim.

4. Resultados e discussões

A metodologia proposta para a obtenção de um indicador de mudança do uso do solo, levando em consideração a dinâmica populacional, indicadores socioeconômicos e variáveis climáticas no semiárido brasileiro foi realizada em três etapas. Inicialmente as variáveis climáticas foram ponderadas e realizada uma sobreposição fuzzy ponderada. As atividades humanas foram sobrepostas em dois agrupamentos, utilizando metodologia semelhante. Ao final, os resultados de todas as sobreposições também foram cruzados de forma a obter-se um indicador final em forma de mapa temático. A Figura 9 apresenta um resumo esquemático de toda a metodologia utilizada neste trabalho.

Os parâmetros adotados para a análise multicriterial, a saber: limiares máximos e mínimos, bem como ponderações, foram baseados em estudos anteriores. Para a temperatura, por exemplo, os trabalhos de Silva, (2013Silva, V. M. D. A., Patrício, M. D. C. M., Ribeiro, V. H. D. A., & DE Medeiros, R. M. O desastre seca no Nordeste Brasileiro. POLÊM!CA, 12(2), 284-293. 2013.), Sousa et. al., (2013Sousa, F. M., Gilson, L. F. P., Lima, M. G., Sousa, M. Zoneamento agroclimático da cultura da goiabeira no estado do Piauí, Brasil. Agropecuária Científica no Semiárido. 2013.) e Souza Borges et. al., (2014Souza, B. T. K., Montenegro, A. A. A, Santos, T. E. M., Silva, D. D., Silva Júnior, V. P. Influência de práticas conservacionistas na umidade do solo e no cultivo do milho (Zeamays l.) em semiárido nordestino. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 38, n. 6, p. 1862-1873, 2014.). Para a região do semiárido considera-se neste trabalho, que temperaturas médias anuais, inferiores a um valor 25o (Celsius), são tidas como amenas para a região e não causariam “pressão” às culturas. Ou seja, não exerceriam influência sobre a dinâmica do uso do solo por serem temperaturas amenas para uma região de elevadas amplitudes térmicas. Portanto, até este valor médio a influência da Temperatura na dinâmica do uso do solo seria desconsiderada. A partir deste limiar, considera-se que, quanto maior a temperatura maior a “pressão” por mudança. Ou seja, quanto maior a temperatura, maior a evapotranspiração, maior será o impacto ocasionado sobre solo, fauna e flora como apresentado na Figura 10.

Para as variáveis precipitação média e precipitação sazonal, o modelo conceitual da Figura 10, considera que quanto maior a precipitação, menor a “pressão” por mudança; quanto maior a sazonalidade da precipitação, menor será a “pressão” no uso do solo. Ou seja, quanto menor a precipitação, quanto mais curto o período chuvoso, maior a “pressão” sobre aquela região. Conforme Silveira et. al. (2014Silverman, B. W. Density Estimation for Statistics and Data Analysis. London: Chapman & Hall/CRC, 1998. ), o início do plantio das culturas e o regime fluvial são condicionados pela distribuição temporal das chuvas. Portanto, uma variação na sazonalidade da precipitação interfere diretamente no bom desenvolvimento das lavouras, e para o modelo conceitual considerado neste estudo, quanto mais regular ou sazonal forem as precipitações, menor a “pressão” no uso do solo, pois as culturas terão concluído seu ciclo.

Figura 9:
Representação esquemática da metodologia proposta

Para as variáveis demográficas que constituem o critério atividade humana 1, o modelo conceitual da Figura 10, considera que quanto maior a diferença entre a densidade populacional dos municípios (refletida principalmente por suas zonas urbanizadas) para os dois censos estudados (1980 e 2010), maior será a “pressão” por mudança no uso do solo. Quanto mais pessoas vivendo por Km², maior a pressão sobre os recursos naturais e energéticos, maior a interferência (antropismo) no uso e ocupação do solo, entre outros fatores

Figura 10:
Representação esquemática das funções de adequação adotadas na sobreposição fuzzy.

No caso da densidade de população rural, a modelagem considera o inverso: quanto maior a fixação do homem nas zonas rurais desta região menor a pressão por mudanças. É possível perceber que no período 1980-2010 houve dinâmica populacional por ocupação rural nas cidades que compõem o Semiárido brasileiro. Muito provavelmente um dos motivos é o êxodo rural, conforme afirma Alves, (2015Alves, E., Souza, G. S. O Semiárido segundo o Censo Agropecuário 2006 e os censos de população 1991, 2000 e 2010. Revista de Política Agrícola, Brasília, DF, ano 24, n. 1, jan./fev./mar. 2015.). O abandono das terras de produção rural é uma realidade, seja pelo risco de desertificação, ou pela falta de opções em substituir uma atividade de agricultura de subsistência por outra atividade econômica (manejo de diferentes culturas e atividades) mais adaptada à região.

Figura 11:
Pressão a mudanças no uso do solo (Mapa final).

Ao sobrepor os três vetores de pressão a mudanças considerados, observa-se na Figura 11, que há uma espécie de estabelecimento de faixas ou áreas que estão submetidas a “pressão”. No sentido litoral - sertão o modelo resultou em uma faixa de áreas sob “muito alta pressão”, seguida por “alta pressão”, “média pressão” e “baixa pressão”, respectivamente. Porém há algumas “ilhas”, por assim dizer, de áreas submetidas à “muito alta pressão” distribuídas em toda região semiárida. Por exemplo, nas sub bacias hidrográficas do Rio São Francisco, especificamente nas cidades de Juazeiro, Petrolina e seu entorno. Algumas faixas classificadas como de “alta pressão” sofrem o efeito da alta urbanização das cidades litorâneas. Entretanto, este estudo não considerou os dados demográficos das capitais litorâneas do Nordeste Brasileiro.

Franca, 2013Franca, C. Dinâmicas globais e arranjos produtivos para agricultura familiar: o caso do polo de fruticultura Juazeiro-Petrolina no território do Vale do Submédio do Rio São Francisco, Região Nordeste do Brasil. Centro de Investigação em Ciências Sociais. Configurações Território e Desenvolvimento. 2013. fez um resgate do polo de fruticultura de Juazeiro-Petrolina e constatou que a região está submetida a forte pressão no uso do solo pela atividade econômica exercida com agricultura irrigada. Corrobora com o trabalho de Franca (2013)Franca, C. Dinâmicas globais e arranjos produtivos para agricultura familiar: o caso do polo de fruticultura Juazeiro-Petrolina no território do Vale do Submédio do Rio São Francisco, Região Nordeste do Brasil. Centro de Investigação em Ciências Sociais. Configurações Território e Desenvolvimento. 2013. o trabalho de Barbieri et. al, (2013Barbieri, A. F. Transições populacionais e vulnerabilidade às mudanças climáticas no Brasil. REDES - Ver. Des. Regional, Santo Cruz do Sul, v. 18, n. 2, p. 193-213, maio/ago 2013.) que propôs avaliar o desempenho de método de estimativa da temperatura média diária em áreas sob forte pressão antrópica na região do polo de irrigação de Petrolina-Juazeiro.

5. Considerações Finais

A modelagem espacializada de fatores físicos e socioeconômicos muitas vezes é impossibilitada pela natureza dos dados envolvidos, com formatos e níveis de agregação completamente diferentes. A utilização de um estimador estatístico para uniformização das informações, através de modelagem em ambiente SIG, sobrepondo variáveis demográficas, socioeconômicas e climáticas, possibilitou uma integração eficiente e pode ser utilizada com diferentes critérios a serem adicionados à metodologia proposta.

Neste sentido, a métrica proposta neste trabalho (indicador de pressão a mudanças), se bem operacionalizados em ambiente SIG, demonstra de maneira qualitativa onde estão as maiores tendências à mudanças e facilitam sua identificação e entendimento no território. A partir de um indicador como este, outras análises em escala de bacia hidrográfica podem ser realizadas como detecção de mudanças de uso do solo utilizando imagens de satélite de múltiplas datas ou a agregação de outras variáveis ambientais. A metodologia proposta considera que dados espaciais globais podem e devem ser utilizados em análises regionais e que podem apresentar resultados consistentes mesmo para áreas menores como pequenas bacias, sendo a validação de resultados e o confrontamento com alguma verdade de campo (ground truth) fundamental nestes casos. A combinação de dados climáticos e dados censitários também podem ajudar num melhor entendimento e mensuração de impactos no semiárido brasileiro. Recomenda-se em trabalhos futuros uma etapa de mensuração e quantificação destes resultados nos mais diversos níveis de agregação (município, bacia, etc), de forma a permitir uma hierarquização dos dados e subsidiar diretrizes de gestão em unidades de planejamento compatíveis.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar 2017

Histórico

  • Recebido
    13 Jan 2016
  • Aceito
    11 Ago 2016
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