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Fotografia: teoria, interrompida?

Photography: theory, interrupted?

Resumo

Estabeleço um diagnóstico sobre o estado da arte das teorias da fotografia, em vista dos sintomas de uma “interrupção” de seus discursos, no limite entre duas balizas que o orientaram, desde os anos 1980, a saber: a ênfase nos dispositivos técnicos de visualização e seu corolário semiótico de indexicalidade. A partir dos discursos teóricos da história e da crítica da arte e da força instauradora da obra de fotógrafos-artistas, construo um contradiscurso à dominância do dispositivo, situando a aisthésis visual e sua mediação pela história da arte como parâmetros alternativos para realocar uma interrogação genuinamente pragmática e fenomenológica acerca da experiência da imagem fotográfica.

Palavras-Chave
Teorias da Fotografia; Dispositivo; Índice

Abstract

I diagnose a state of the art in photography theories, in view of the symptoms of an “interruption” of its discourse, in the limit between two beacons that guided it, since the 1980s, namely: the emphasis on technical devices of visualization, and its semiotic corollary of indexicality. From the starting point of theoretical discourses of history and art criticism, and also the instituting force of the work of photographers-artists, I construct a counter-discourse to this dominance of visual devices, situating visual aisthésis (and its mediation by art history) as alternative parameters for reallocating a genuinely pragmatic and phenomenological inquiry about the experience of photographic images.

Keywords
Photography Theory; Device; Índex

Por uma Nova Teoria da Fotografia: sacrificar o “índice” para salvar o “dispositivo”?

Dois casos recentes disparam a sensação de algo mal parado na reflexão teórica sobre a fotografia: a publicação recente de um dossiê, no penúltimo número de uma importante revista de estudos nesse campo, na qual encontra-se uma recapitulação das últimas três décadas desse pensamento – quando vislumbramos um dos luminares dessas teorias (referência inescapável dos estudos sobre a fotografia, com sua principal obra traduzida no país em sua 11a edição) ensaiar um reposicionamento de suas idéias, em vista dos acertos de contas sobre suas ainda influentes concepções acerca da fotografia1 1 Trata-se do número 34 de Études Photographiques (publicado em 2016), com dossiê sobre “O que diz a teoria da fotografia/Interrogar a historicidade”, com artigo de Philippe Dubois, avaliando novas teorias que fujam dos pressupostos originários dos anos 1980. Esse dossiê resultou de evento no Centre Pompidou, em Paris (em maio de 2015), sob o título “Aonde se encontram as teorias da fotografia?” - do qual participaram, entre outros, Jean-Marie Schaeffer, Joel Snyder e o próprio Dubois. Quanto ao texto de Dubois, adotamos sua versão em português, publicada em dossiê sobre “Novos Olhares na Fotografia Contemporânea”, na revista Discursos Fotográficos, em: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/discursosfotograficos/article/view/30295/21457. .

A estratégia declarada pelo autor é a de uma “fuga do índice”, que demarcara praticamente todos os modos de se referir à fotografia como objeto teórico, especialmente em seu diálogo com universos culturais da arte: em seu lugar, propõe que as novas teorias da fotografia investissem nas “potências ficcionais” dessas imagens, recuperando a ontologia dos “mundos possíveis”, na conexão que estas correntes da lógica modal fazem com as estruturas perceptivas da fabulação.

Os pontos de chegada dessa linha de argumentação são menos problemáticos do que aquilo que seu diagnóstico presume: assim sendo, o que há de elogiável na desvalorização da imanência indexical da imagem fotográfica é, de algum modo, afetado pela estratégia de saída desse mesmo argumento – já que situado nas mesmas crenças que sustentaram a tese da indexicalidade, tão caras ao pensamento oitentista; a ultrapassagem do “índice” pela “ficção” é identificada tão somente com a mudança histórica havida no interior dos dispositivos tecnológicos da fotografia - com a passagem do paradigma argêntico para o digital.

A transformação é radical, primeiramente, porque todas as teorias do ‘Fotográfico’ dos anos 1980 repousavam sobre um princípio fundamental, primordial já que genético (ligado à gênese da imagem, a seu processo mesmo de constituição, a seu dispositivo – e foi por isso que ele foi ‘ontologizado’): o princípio do traço, da impressão, do ‘isto foi’, do índex (índice). A partir do momento em que este princípio genético da ligação orgânica com o real se torna o fundamento da pretendida identidade do médium, uma especificidade ‘de natureza’, fica claro que o digital ameaça diretamente essa ligação entre a imagem e seu ‘referente real’. Ele vem cortar a ligação ‘visceral’ da imagem com o mundo. A imagem digital não é mais, como a imagem fotoquímica (analógica) uma ‘emanação’ do mundo, ela não é mais ‘gerada’ por ele, ela não se beneficia da ‘transferência de realidade’ (para retomarmos a expressão de André Bazin) da coisa até a representação. E assim, tudo muda, tudo oscila, e tem que ser reconsiderado

(DUBOIS, 2017DUBOIS, P. "Da imagem-traço à imagem-ficção: o movimento das teorias da fotografia de 1980 a nossos dias" (trad. Henrique Codato e Leonardo Gomes Pereira). In: Discursos fotográficos 13/22, 2017, p. 32-51., p. 41-42)

Do mesmo modo que em outros momentos de sua obra (em sintonia com uma escola inteira de pensamento que localiza a fotografia no entroncamento dos regimes artísticos da imagem na contemporaneidade), este afastamento do “índice” exprime a sobrevivência de um “argumento do dispositivo”, sobre o qual tenho me debruçado constantemente (PICADO, 2011aPICADO, B. "Sobre/pelo/contra o dispositivo: revisitando a arché da fotografia". In: Matrizes. 4/2, 2011a, p. 165-181, 2011b): o “turno digital” da fotografia seria o disparador de uma tal fuga do índice para a ficção, do mesmo modo que a confluência da fotografia, do cinema e do vídeo haviam configurado para outros autores localizados nessa tradição (caso de Raymond Bellour) uma espécie de “ecologia mediática” de aparatos de visualização que haviam deflacionado a metafísica do índice.2 2 A reavaliação sobre a hipotética centralidade dos dispositivos específicos da fotografia feita por Dubois e Bellour apenas concede que o problema do dispositivo seja pensado no quadro mais alargado das interações entre aparatos do cinema e do mundo da arte, algo que se materializa na idéia de um espaço intersticial das formas de produção (BELLOUR, 1990) - cuja presumida “querela” se dá, em verdade, na relação entre dispositivos, e não (por assim dizer), aquém dos mesmos (BELLOUR, 2012).

Segundo sintoma desse mal-estar das teorias da fotografia: em 2005, num debate na Universidade de Cork, na Irlanda, reúnem-se alguns dos mais importantes pensadores da fotografia (quase todos falantes da língua inglesa) em um seminário sobre o estado da arte dessas teorias, em que testemunhamos uma longa interlocução acerca da compulsória “indexicalidade” da fotografia, a tal ponto que o coordenador do seminário, ao tentar avançar a conversa para outras ordens de questões conceituais, reconhece finalmente a “feroz tenacidade” da tópica do índice.3 3 O debate em questão foi integralmente transcrito na coletânea organizada por James Elkins, em Photography Theory (ELKINS, 2007): a única voz destoante dessa dominância das teses da indexicalidade é a do critico e historiador Joel Snyder – sendo seu endereço preferencial menos o da ortodoxia semiológica e mais o de sua recepção americana, por obra de Rosalind Krauss.

Neste caso, trata-se da dificuldade de pensar a categoria semiótica do índice na sua real correlação com a definição da fotografia enquanto objeto teórico: a excitação das vozes no debate decorre menos do esforço por fazer sentido de um tal recurso à indexicalidade, e mais do fato de que boa parte delas ainda encontra-se capturada no mesmo paradigma ontológico que estruturou as teorias da fotografia – a saber, a suposição de uma espécie de “natureza” constituinte de suas imagens, por seu turno enraizada na differentia specifica com respeito a outros universos da representação pictórica (como os da pintura e do desenho).

Este (a indexicalidade) é um assunto ferozmente tenaz, dado que apenas alguns de nós desejam recuperar ao menos uma parte dele. Mas eu desejo realmente continuar na tarefa da primeira parte dessa conversa, que é a de um inventário provisório das maneiras pelas quais a fotografia tem sido explanada nas últimas três décadas. É significativo que o índice sirva como o alfa e o ômega das questões da fotografia (...), mas eu desejaria considerar outros modelos, igualmente.

(ELKINS, 2007ELKINS, J. (org.). Photography theory. London: Routledge, 2007., p. 156)

Retiro desses dois cenários de reflexão a motivação para lançar a hipótese de que a teoria da fotografia interrompeu-se em torno de dois pontos fundamentais, a saber: a especificidade atribuída aos processos “filogenéticos” da imagem fotográfica (invocando a centralidade de seus dispositivos e modalidades técnicas) e o caráter semioticamente determinado por esse traço de sua origem (demarcando a insistência no caráter “indexical” de suas imagens).

Em suma, o “argumento do dispositivo” e o “argumento do índice” implicaram-se mutuamente na história das teorias da fotografia, conferindo-as com a marca de um discurso interrompido no espectro entre essas duas balizas: mesmo as eventuais críticas à dominância de qualquer um desses dois parâmetros nunca ultrapassa por inteiro essa condição imposta à reflexão; nos dois casos aqui expostos, tal a priori dos dispositivos resiste nas teorias da fotografia, mesmo quando a indexicalidade é sacrificada em seu altar.

Proponho um diagnóstico desse estado de coisas, partindo desses sintomas e identificando essa “interrupção” das teorias da fotografia, em algum lugar entre o índice e o dispositivo. Mas também o faço em nome de uma genuína inflexão de crítica epistemológica, que delineie outros destinos para tais teorias, em vista de duas variáveis fundamentais da inversão que propomos aos vetores da conceituação nesse campo: primeiramente, uma maior atenção ao trabalho dos historiadores e críticos, em sua relação não apenas com procedimentos artísticos, mas com os quadros históricos das práticas fotográficas (tema da próxima sessão do artigo); em segundo lugar, um reposicionamento das teorias, deslocando-as da perspectiva inicial centrada no “ato fotográfico” (especialmente quando implica a fotografia com a arte), em favor da valorização da “experiência” da imagem (assunto da terceira parte desse texto).

Para além dos limites entre fotografia e pintura: constâncias históricas de uma modernidade pictórica

No contexto das teorias da fotografia com maior valor de caixa entre nós, é notável o quão pouco tais idéias derivam de uma compreensão rigorosamente histórica acerca de seu objeto: isto é ilustrado pelo recurso que Dubois faz, ao introduzir suas famosas teses sobre o “ato fotográfico”, partindo de um exemplo que fundaria a possibilidade de uma teoria da fotografia enquanto “pragmática do índice”. Vejamos como Dubois assinala nesse exemplo a razão mesma de sua formulação:

Fig. 1
Michael Snow, “Authorization” (1969) – National Gallery of Canada, Ottawa

Descrever essa obra não é fácil, justamente porque não é simplesmente uma imagem, uma foto, mas, antes, um dispositivo (uma instalação, para retomar um termo da arte contemporânea) que coloca em situação, de acordo com uma estratégia complexa que vou descrever, o fotografo e observador. A obra de Michael Snow é de fato urdida de forma a nos mostrar finalmente apenas suas próprias condições de surgimento e de recepção. As três perguntas fundamentais que se fazem a qualquer obra de arte (O que está representado? Como aconteceu? Como é percebida?) formam aqui uma única. A partir de então, descrever essa obra colocando-se do ponto de vista do espectador e acompanhando o desenrolar de sua percepção é, num mesmo movimento, acompanhar o processo pelo qual a obra se constituiu. Eis porque Authorizationauto-retrato fotográfico – é bem mais do que uma foto: é um acionamento da própria fotografia.

(DUBOIS, 1993_____. O ato fotográfico e outros ensaios (trad. Marina Appenzellier). Campinas: Papirus, 1993;, p. 16)

É curioso que pese sobre um artista como Snow (ou sobre uma obra como “Authorization”) o caráter da prova oferecida por Dubois a suas vindicações da fotografia enquanto “dispositivo”: é significativo que O Ato Fotográfico (publicada originalmente em 1983) encontre num caso tão próximo de paradigmas conceitualistas da arte da década anterior o caso que ilustra suas teses.

Pergunto-me por que tal escolha não recai sobre a obra de alguém como Jeff Wall: a inflexão deste outro corpus sobre os debates acerca da posição da fotografia no sistema das artes (especialmente em seus trabalhos posteriores a 1978, mais coevos à reflexão de Dubois) vindica uma concepção que em quase nada corresponde ao pensamento predominante a partir dos anos 1980: o que esta obra propõe é, ao contrário, uma interrogação sobre o diálogo da fotografia com a pintura - numa mediação que mobiliza menos as características de “automatismo” ou “autenticação”, derivadas dos engenhos de visualização fotográficos (como no caso de Snow), e mais a estruturação dos gêneros de experiência de testemunho visual consagrados por instituições, modelos e práticas culturais em torno da imagem pictórica (em suma, pela mediação da própria história da arte).

Fig. 2
Jeff Wall, “Picture for Women” (1979) – Centre Georges Pompidou, Paris

O exame crítico sobre a obra desse fotógrafo-artista encontra-se inclusive no centro de uma retomada do interesse teórico acerca da fotografia, feito por inúmeros historiadores e críticos da arte: predomina aí a noção de que tal corpus combina a capacidade de instalar a fotografia no centro de importantes transformações da arte contemporânea (especialmente nas fases posteriores à pop art), sem com isto invocar quaisquer discursos sobre uma “natureza fotográfica”, imune à evolução histórica das formas pictóricas e de seus regimes experienciais.

Uma vez mais, a importância desta obra fotográfica decorre da capacidade que Wall teve de colocar a fotografia no eixo dos debates sobre a experiência pictórica, precisamente por restaurar um determinado quadro de experiências visuais, através de certas operações artísticas (associadas a temas da representação e a escolhas plásticas) e discursos teóricos (trazendo a história da arte como instância mediadora dessa discussão).

Dentre os variados recursos artísticos dessa operação própria à arte de Wall, encontra-se a inscrição da fotografia àquilo que Jean-François Chevrier designou como a “forma-tableau” - isto é, os materiais, procedimentos e temas que consagraram a pintura de salões na França, por volta do século XVIII: primeiramente, do ponto de vista material, essa forma implica a valorização da bi-dimensionalidade e da portabilidade não-monumental para a disposição física das obras (abundantemente empregada pela pintura setecentista e oitocentista); quanto a seus procedimentos de apresentação, ela implica a disponibilidade da imagem em uma proporção adequada à escala humana de apreciação (ao alcance dos olhos, mas sobretudo à distância devida do corpo inteiro); por fim, ela emprega a viabilidade poética dos temas mais propícios a uma experiência dúplice de alienação dos ambientes de exposição (salas de museus e galerias) e de absorção na materialidade pictórica da representação (em tópicas da vida doméstica e do cotidiano, avessa a um ethos “teatralizado” de apresentação).

Quaisquer que sejam os elementos que aí se integrem, ele (o tableau) supõe uma unidade deduzida dessa delimitação; ele é um lugar, e não uma porção recortada do espaço contínuo. Mais que representar qualquer coisa, ele apresenta um lugar, e um lugar outro que não o espaço circundante. Ele apresenta a própria imagem que o constitui (em sua autonomia material). Ele já é, em si mesmo, uma forma de apresentação da imagem; ao ponto de permitir que se pense que a imagem não possui outra razão de ser.

(CHEVRIER, 2006CHEVRIER, J. F. Jeff Wall. Paris: Hazan, 2006a., p. 180)

Na medida em que incorpora a fotografia a uma vocação pictórica, alinhando seus modos de exposição a uma história da experiência visual da pintura, Wall institui uma dupla transformação da percepção da fotografia enquanto medium artístico: em primeiro lugar, ele coloca em suspensão as crenças no paradigma “modernista” das teorias e histórias da fotografia, que a situavam como restrita aos formatos impressos (com sua escala reduzida de resolução visual), para então viabilizando sua inscrição à forma do quadro pictórico – para indicar uma continuidade histórica dos dois regimes materiais da visualidade (o pictórico e o fotográfico); em decorrência dessa abertura ofertada à fotografia, Wall apresenta os gêneros consagrados pela pintura de salões, com especial ênfase sobre a paisagem e o retrato, incorporando seus regimes experienciais, implicados por aquilo que Michael Fried identificou como sendo os temas “absortivos” da pintura setecentista, à época de Diderot (FRIED, 1980FRIED, M. Absortion and theatricality: painting and beholder in the age of Diderot. Chicago: University of Chicago Press, 1980;).

Um dos mais importantes desenvolvimentos nas assim chamadas artes visuais dos últimos vinte ou mais anos tem sido a emergência de fotografias em grande formato, no tamanho de quadros, que em virtude de sua dimensão pedem para ser penduradas em paredes de galerias no mesmo modo das pinturas de cavalete, em outros aspectos também aspirando àquilo que poderia vagamente ser chamado de uma significação retórica da pintura, dirigida ao espectador ao mesmo tempo em que declara sua identidade de artefato enquanto fotografia.

(FRIED, 2008_____. Why photography matters as art as never before. New Haven: Yale University Press, 2008;, p. 37)

Para além de permitir um outro tipo de discussão acerca da fotografia (menos determinada por seus dispositivos de gênese e de circulação), Wall introduz uma dimensão da experiência estética da fotografia, situada no diálogo que “forma-tableau” faz diálogo com a matriz histórica da modernidade pictórica – sobretudo nos aspectos desse regime visual que fazem o jogo entre a nova escala física da imagem fotográfica e as condições da sua percepção, subtraindo a fotografia dos imperativos mediáticos de sua circulação em formatos impressos e em padrões de serialização.

Dado esse pano de fundo, a emergência dos tableaux fotográficos de Jeff Wall no fim dos anos 1970, combinando valores pictóricos francos com intenções críticas, era algo de inesperado. Wall era bem formado nas teorias críticas da imagem, mas escolheu fazer imagens únicas com nenhum texto além dos tradicionais títulos, num formato específico para a parede da galeria (...). Não havia razão porque a arte fotográfica não poderia explorar a escala e o ilusionismo que haviam sido tão importantes para a evolução dos museus e galerias modernos. Encontrar uma obra de arte em tais espaços é experimentar uma incorporação física, em muitos aspectos distinta daquela de ver a fotografia na página impressa ou em sua escala própria,

(CAMPANY, 2011CAMPANY, D. Picture for women. London: Afterall Books, 2011., p. 11-12)

Nesse contexto de reposicionamento da fotografia no campo das artes, constata-se que o gesto pelo qual Dubois salienta as “potências ficcionais” da fotografia – mencionados na introdução desse artigo – é não apenas equivocado em sua motivação (ao associar essa nova inflexão às mudanças acontecidas nos dispositivos fotográficos), como é também anacrônico (no tocante a movimentos em curso no mundo da arte, antes mesmo do lançamento da primeira edição de O Ato Fotográfico): a obra de Wall nos concede o testemunho de uma transformação das relações da fotografia com a arte não apenas colocando os problemas de seu dispositivo entre parênteses, mas também demandando a mediação da história da arte como matriz de uma concepção sobre possibilidades de dignificação da experiência da fotografia, não obstante seu fundamento material ou tecnológico.

Ademais, a obra de Wall prenuncia (e com quase quatro décadas de antecedência ao “acerto de contas” proposto agora por Dubois) a questão dos horizontes ficcionais da fotografia, apenas que partindo dessa compreensão “histórica” de uma cultura visual que não faz tamanha distinção entre modalidades tecnológicas da produção da imagem – inscrevendo o perfil “pictórico” de todo esse universo, sem infirmar a predominância da pintura de cavalete como paradigma da produção do efeito estético próprio às imagens fotográficas. E na medida em que a apreciação dessa obra é atravessada por um sólido pensamento acerca da fotografia (submetendo a compreensão sobre esse medium artístico na sua relação com uma ilimitada capacidade de produção de efeitos e valores pictóricos) pode-se dizer que a discursividade crítica instalada a partir de seu trabalho dá provas do estado de letargia epistêmica de algumas das mais célebres teorias da fotografia ainda consagradas entre nós.

De volta ao “índice”, agora como “transparência” fotográfica

Como já argumentei antes, o caminho da “fuga do índice” é sintomático de uma interrupção das teorias da fotografia nos “argumentos do dispositivo”: a reflexão de críticos e historiadores da arte sobre a obra de Jeff Wall aponta em outra direção da valorização das alegadas “potências ficcionais” da imagem fotográfica, o que talvez nos exija a inversão desse sacrifício feito ao “índice” – pois, em última instância, a verdadeira “água suja” a se dispensar deveria ser a do próprio conceito de “dispositivo” (com as implicações que ele traz, direta ou indiretamente, de uma determinação instrumental ou tecnológica dos regimes de sentido da imagem).

Consideremos, então, outra referência teórica de boa circulação entre nós, A Imagem Precária, de Jean-Marie Schaeffer: nascida em contexto similar ao de Dubois (sua primeira edição data de 1987), sua linha argumentativa avança mais densamente nas implicações filosóficas da indexicalidade – por isso mesmo introduzindo variantes do debate teórico tradicionalmente desconsideradas nas vertentes dominantes de reflexão sobre uma “natureza” fotográfica. Em primeiro lugar, Schaeffer dissocia a “ontologia” do fotográfico das problematizações sobre o status à “imagem” - o que, ao menos em princípio, facilita a compreensão sobre sua suposta especificidade (já que, sendo da ordem de uma arché, ela invocaria a consideração do lugar mais próprio dos dispositivos fotográficos). Não por acaso, as primeiras frases de seu livro enunciam o programa geral de valorização desta “origem” da significação fotográfica:

Para começar, proponho colocar provisoriamente entre parênteses a noção de ‘imagem fotográfica’ e partir da descrição do dispositivo fotográfico. Pelo menos duas razões me parecem justificar tal decisão. A primeira é totalmente banal: a imagem fotográfica é, em sua especificidade, a resultante de um uso do dispositivo fotográfico em sua totalidade. Resulta daí que a própria identidade da imagem só pode ser captada partindo de sua gênese. A segunda razão é de ordem heurística: as atuais idéias sobre a noção de ‘imagem’ pressupõem que ela poderia apenas ser a reprodução de uma visão (esta última precedendo-a do ponto de vista lógico). Ora, tal concepção impede que se capte a especificidade da imagem fotográfica, ligada ao fato de que ela é sempre o registro de um traço físico-químico.

(SCHAEFFER, 1996SCHAEFFER, J. M. A imagem precária: sobre o dispositivo fotográfico (trad. Eleonora Bottman). Campinas: Papirus, 1996., p. 11)

A impressão predominante nessa outra versão do “argumento do dispositivo” é a de que a noção mesma do “índice” não surge aqui em qualquer correlação com a ortodoxia semiótica do conceito: a “indexicalidade” da fotografia se correlaciona com o problema geral da significação, como também não decorrendo de decisões e capacidades inferenciais da interpretação (como na fonte de uma semiótica do índice, em Peirce), mas apenas como corolário material (afirmado em uma ordem “lógica”) dos modos de funcionamento dos aparatos técnicos da fotografia.

Ainda assim, numa brevíssima nota final de A imagem precária, Schaeffer noticia sua descoberta, no momento em que entregava as provas de seu livro ao editor, de um artigo do filósofo norte-americano Kendall T. Walton (“Transparent pictures: on the nature of photographic realism”, publicado na revista Critical Inquiry, em 1984) e com o qual Schaeffer encontrava-se “praticamente de acordo em tudo”: ao ter conhecimento deste texto, ele manifesta admiração face ao que considerava ser uma feliz coincidência de propósitos entre os dois argumentos (não necessariamente símiles na abordagem), naquilo que concernia à preocupação original com a natureza do fenômeno fotográfico.

Por vezes coincidimos até em pontos de detalhe: como a utilização da distinção griceana entre significado natural e não-natural e, inclusive, coincidência improvável mas ainda assim certa, em referencia ao monstro do Lago Ness para ilustrar a especificidade da imagem fotográfica (a argumentação de Walton, não obstante, difere da minha).

(SCHAEFFER, 1996SCHAEFFER, J. M. A imagem precária: sobre o dispositivo fotográfico (trad. Eleonora Bottman). Campinas: Papirus, 1996., p. 161)

De um lado, este episódio desvelaria a coincidência temporal da renascença de um interesse genericamente teórico pela fotografia, especialmente no tocante à simultaneidade e proximidade de diagnósticos de textos de diferentes matrizes teóricas e geográficas: Schaeffer e Walton pareceriam insistir na idéia de que a fenomenologia (ou pragmática) do fotográfico se instalaria num limite próprio, com respeito àquele que demarcou o pensamento sobre outros gêneros de representação visual (em especial, a pintura e o desenho).

Contudo, esta é uma impressão incompleta e equivocada, quando examinamos diretamente o texto de Walton considerando em separado as fontes de seu pensamento: diferentemente de Schaeffer, o “realismo” que atribui à fotografia (justificando o subtítulo de seu artigo) não invoca consigo a diferenciação quase axiológica entre formas de representação (fotografia, de um lado; desenho e pintura, de outro); no início de seu ensaio, Walton insiste contra a idéia de um “realismo” intrínseco à fotografia, recusar-se a singularizá-la nos aspectos que conferem tal compromisso ontológico da imagem aos enlaces propiciados pelos mecanismos de fixação visual.

Mas o ‘realismo fotográfico’ não é tão especial se isso é tudo o que importa nele: fotografias apenas usufruem mais de alguma coisa que outras imagens possuem em menor quantidade. Essas diferenças de grau, ademais, não são diferenças entre fotografias enquanto tais e desenhos enquanto tais. Pinturas podem ser tão realistas como a mais realista das fotografias, se o realismo residir em sutilezas do sombreamento, perspectiva habilidosa, e assim por diante; algumas delas são, de fato, virtualmente indistinguíveis de fotografias.

(WALTON, 1984_____. "Transparent pictures: on the nature of the photographic realism". In: Critical inquiry. 11, 1984, p. 246-277., p. 249)

Por outro lado, seu texto interpela algo de próprio – ainda que não exclusivo – no modo como a fotografia estatui um sentido de realismo visual: em boa medida, Walton exercita plenamente o horizonte “pragmático” de sua teoria, ao contrário do caso de Schaeffer – só menos do ponto de visa da história de sua recepção4; em Walton, o realismo fotográfico é deslocado da “filogênese” da imagem (sua aparição determinado pelas condições do dispositivo) para o da “relação” (pragmática e ontogenética) entre imagens e sistemas de crenças da percepção comum. Ao instaurar a “transparência” da representação, a resposta de Walton sobre “O que há de especial na fotografia?” assume um perfil distinto daquele de Schaeffer.

Nossa teoria precisa, de qualquer maneira, de um termo que se aplique simultaneamente a meu ‘ver’ meu bisavô quando olho para sua fotografia e meu ver meu pai quando o tenho diante de mim. O que é importante é que reconheçamos uma comunidade fundamental entre os dois casos, um tipo natural simples ao qual ambos pertencem. Poderíamos dizer que eu percebo meu bisavô mas não o vejo, reconhecendo um modo de percepção (‘ver-através-de-fotografias’) distinto da visão – se a idéia de que eu percebo meu bisavô é tomada a sério. Ou poder-se-ia fazer esse mesmo ponto de uma outra maneira. Eu prefiro a formulação mais ousada: o espectador de fotografias vê, literalmente, a cena que foi fotografada.

(WALTON, 1984_____. "Transparent pictures: on the nature of the photographic realism". In: Critical inquiry. 11, 1984, p. 246-277., p. 252)

Há dois pontos adicionais no argumento de Walton que se destacam das linhas em que fazia o debate sobre caráter representacional da fotografia em Schaeffer e Dubois: trata-se do deslocamento da artisticidade da fotografia, contraposta aos gêneros de experiência visual constituídos por ela neste quesito, Walton nos instrui sobre uma abordagem genuinamente estética do fenômeno fotográfico, ao deslocar a questão da ontologia do fotográfico introduzindo as variáveis percepcionais das figuras visuais desse universo.

A razão pela qual vemos através de fotografias mas não de pinturas está relacionada a uma diferença em como adquirimos informação através de imagens desses dois tipos. Suponha um explorador que emergiu da selva da África central com uma coleção de imagens fotográficas de dinossauros, propriamente obtidas no mato e processadas de imediato. As imagens (...) podem nos convencer de que havia um dinossauro vagando na selva. Alternativamente, suponha que ele surja com um caderno de esboços de dinossauros, devidamente desenhados ao vivo, no campo. Novamente, podemos ficar convencidos da existência de um dinossauro (...). A diferença importante é que, no caso dos esboços, confiamos na crença do desenhista de que havia um dinossauro, de um modo que não acontece no caso das fotografias.

(WALTON, 1984_____. "Transparent pictures: on the nature of the photographic realism". In: Critical inquiry. 11, 1984, p. 246-277., p. 262-263)

Em segundo lugar, esses “modos de ver” são correlativos a um dado originário das formas visuais, justificando a introdução do atributo da “transparência” para as figuras visuais da imagem fotográfica. Assim sendo, a atenção às modalidades visuais da transparência reforçam a rejeição a um discurso acerca de “representações fotográficas”: o que se modificou fundamentalmente foi, como já vimos, o acento mais apropriado na questão dos “modos de ver”, ao invés de um recurso ao conceito de representação enquanto fundada na admissão de uma instância intencional – com uma mediação de origem técnica ou artística.

O mais decisivo na formulação de Walton concerne, portanto, menos a uma ontologia do fotográfico, e mais a uma fenomenologia da experiência visual - endereçada às “imagens” enquanto objeto e atravessadas de um sentido próprio de “realismo”. Na origem destas idéias, a transparência atribuída às fotografias se clarifica no contexto de uma antropologia da experiência ficcional - eventualmente enunciada em seu texto, como guia de suas questões sobre a natureza da fotografia, mas demarcando igualmente segmentos de sua obra filosófica sobre universos visuais (WALTON, 1990WALTON, K. Mimesis as make-believe. Cambridge: Harvard University Press, 1990.).

Na lição a se tirar desse percurso, consigna-se uma hipótese genuinamente pragmática acerca do fenômeno fotográfico, uma vez suspendida sua consideração enquanto “dispositivo”: deslocando-nos do que ocorre na “gênese automática” da imagem (e mesmo consideradas suas diferentes operações artísticas ou técnicas), a “transparência” fotográfica situa-se muito mais na “parte do espectador” e dos costumes perceptivos que estruturam sua experiência visual – no interior da qual fica inclusive preservada a qualidade “indexical” dessa estesia.

Epílogo

Na história das teorias da fotografia, estipulou-se um ponto de observação instalado entre o aparato técnico e sua operação, algo de evidente no modo como Dubois e Schaeffer sediaram a ideia da fotografia enquanto “dispositivo”. A força desse argumento nos chega, contudo, como impossibilidade de ir além (ou ficar aquém) desse ponto, dada a imensa força imposta por esse discurso até aqui: três décadas após essas teorias experimentarem seu apogeu, os acertos de contas sobre tais pressupostos em torno de uma “natureza” fotográfica ainda se fazem em nome preservação daquilo que se passa entre o dispositivo e sua agência – como questão de “arte”, ou como de “técnica”.

Mas os termos dessa avaliação não podem dispensar aquilo que o historiador e crítico Joel Snyder nos recorda, ao afirmar que seu maior temor “sobre essa coisa da causalidade é que ela nos impede de ver fotografias enquanto imagens” (ELKINS, 2007ELKINS, J. (org.). Photography theory. London: Routledge, 2007., p. 155): não é tanto a “feroz tenacidade” do índice que deveria nos concernir, pois a evocação das tais “potências ficcionais” da imagem fotográfica não está impedida de emergir por obra dessa categoria semiótica – a parcialidade informativa do índice é operativa tanto em regimes veriditivos quanto ficcionais (nesse particular, é algo que certas teorias do suspense nos ensinam). Desse modo, o grande obstáculo das teorias da fotografia é mesmo a noção do “dispositivo” – pois foi em seu nome que o problema da imagem foi obliterado pela questão da agência dos “engenhos de visualização”.

Em suma, os termos em que a “fuga do índice” se exprime em certos discursos contemporâneos sobre a fotografia resultam em sua interrupção, sob os marcos tradicionais de uma recusa à experiência da imagem – e de uma conseqüente valorização da hipótese sobre a diferença específica da fotografia. A meu ver, a saída desse estado de coisas implica em reconhecer certas práticas (artísticas e teórico-discursivas) nas quais tal distinção não precise ser o ponto de partida das teorias da fotografia: descobriremos assim que o índice não necessita ser ofertado ao sacrifício do discurso teórico, mas que a idéia da fotografia enquanto “dispositivo” talvez tenha contados os seus últimos dias.

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    Trata-se do número 34 de Études Photographiques (publicado em 2016), com dossiê sobre “O que diz a teoria da fotografia/Interrogar a historicidade”, com artigo de Philippe Dubois, avaliando novas teorias que fujam dos pressupostos originários dos anos 1980. Esse dossiê resultou de evento no Centre Pompidou, em Paris (em maio de 2015), sob o título “Aonde se encontram as teorias da fotografia?” - do qual participaram, entre outros, Jean-Marie Schaeffer, Joel Snyder e o próprio Dubois. Quanto ao texto de Dubois, adotamos sua versão em português, publicada em dossiê sobre “Novos Olhares na Fotografia Contemporânea”, na revista Discursos Fotográficos, em: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/discursosfotograficos/article/view/30295/21457.
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    A reavaliação sobre a hipotética centralidade dos dispositivos específicos da fotografia feita por Dubois e Bellour apenas concede que o problema do dispositivo seja pensado no quadro mais alargado das interações entre aparatos do cinema e do mundo da arte, algo que se materializa na idéia de um espaço intersticial das formas de produção (BELLOUR, 1990BELLOUR, R. L’entre-images. Paris: Éditions de La Différence., 1990.) - cuja presumida “querela” se dá, em verdade, na relação entre dispositivos, e não (por assim dizer), aquém dos mesmos (BELLOUR, 2012_____. La querelle des dispositifs: cinema - installations, expositions. Paris: P.O.L., 2012.).
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    O debate em questão foi integralmente transcrito na coletânea organizada por James Elkins, em Photography Theory (ELKINS, 2007ELKINS, J. (org.). Photography theory. London: Routledge, 2007.): a única voz destoante dessa dominância das teses da indexicalidade é a do critico e historiador Joel Snyder – sendo seu endereço preferencial menos o da ortodoxia semiológica e mais o de sua recepção americana, por obra de Rosalind Krauss.
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    Ao reavaliar suas próprias concepções acerca da fotografia (no evento do Centre Pompidou referido na primeira nota de rodapé desse artigo), o próprio Schaeffer recorda-se de como a recepção continuada de L’image precaire situou suas idéias sobre a fotografia no âmbito das teorias “ontológicas” nesse campo – sentido oposto ao de sua esperança manifesta de oferecer um modelo “pragmático” de reflexão sobre a fotografia.

Referências

  • BELLOUR, R. L’entre-images Paris: Éditions de La Différence., 1990.
  • _____. La querelle des dispositifs: cinema - installations, expositions. Paris: P.O.L., 2012.
  • CAMPANY, D. Picture for women London: Afterall Books, 2011.
  • CHEVRIER, J. F. Jeff Wall Paris: Hazan, 2006a.
  • DUBOIS, P. "Da imagem-traço à imagem-ficção: o movimento das teorias da fotografia de 1980 a nossos dias" (trad. Henrique Codato e Leonardo Gomes Pereira). In: Discursos fotográficos 13/22, 2017, p. 32-51.
  • _____. O ato fotográfico e outros ensaios (trad. Marina Appenzellier). Campinas: Papirus, 1993;
  • ELKINS, J. (org.). Photography theory London: Routledge, 2007.
  • FRIED, M. Absortion and theatricality: painting and beholder in the age of Diderot. Chicago: University of Chicago Press, 1980;
  • _____. Why photography matters as art as never before New Haven: Yale University Press, 2008;
  • PICADO, B. "Sobre/pelo/contra o dispositivo: revisitando a arché da fotografia". In: Matrizes 4/2, 2011a, p. 165-181
  • SCHAEFFER, J. M. A imagem precária: sobre o dispositivo fotográfico (trad. Eleonora Bottman). Campinas: Papirus, 1996.
  • WALTON, K. Mimesis as make-believe Cambridge: Harvard University Press, 1990.
  • _____. "Transparent pictures: on the nature of the photographic realism". In: Critical inquiry 11, 1984, p. 246-277.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2017

Histórico

  • Recebido
    Jul 2017
  • Aceito
    Ago 2017
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