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Tremendão e Erasmo Carlos: entre o indivíduo e a celebridade1 1 Este texto foi originalmente apresentado na Intercom, em sua 43ª edição, realizada em 2020.

Tremendão and Erasmo Carlos: between the individual and the celebrity

Resumo

O ano de 1965 marca o início da Jovem Guarda, fenômeno midiático que visava construir uma cultura juvenil ao redor da música. Com canções sobre carrões e namoros, fez de jovens artistas celebridades; objetos de culto e modelos de reconhecimento, identificação e conduta. Ao estudar a emergência do Tremendão, alterego de Erasmo Carlos, o texto analisa empiricamente a construção das celebridades; processo que não se esgota em esquemas industriais de produção, mas antes reconstitui e reembala trajetórias de vida singulares para criar um efeito de autenticidade. Apoiado em registros de época — reportagens, canções, capas de disco, fotografias —, bem como entrevistas e biografias, o texto visa problematizar a relação entre o individual e o estrutural, e entre o singular e o massivo.

Palavras-chave
música popular; celebridade; trajetória; juventude; Jovem Guarda

Abstract

The year of 1965 signals the beginning of Jovem Guarda, a media phenomenon which aimed at developing a youth culture regarding music consumption. With songs about luxurious cars and dating, Jovem Guarda turned young artists into celebrities; idols and models of recognition, identification and behaviour. By studying the emergence of Tremendão, alter ego of Erasmo Carlos, this text empirically analyzes the construction of celebrities; a process which is not limited to industrial production formulas, but rather reconstitutes and repackages unique life trajectories to create an effect of authenticity. Supported by empirical data — reports, songs, album covers, photographs —, but also interviews and biographies, this paper aims at problematizing the relationship between the individual and the structural spheres, as well as between the singular and the massive ones.

Keywords
popular music; celebrity; trajectory; youth; Jovem Guarda

Introdução

Quando compôs “Festa de Arromba”2 2 “Vejam só que Festa de Arromba! / No outro dia, eu fui parar / Presentes no local, / o rádio e a televisão; /Cinema, mil jornais, / muita gente, confusão / [...] / Hey! Hey [...] Que onda! / Que festa de arromba! /[...] Mas vejam quem chegou de repente / Roberto Carlos em seu novo carrão! / Enquanto Tony e Demétrius / fumavam no jardim / Sérgio e Zé Ricardo / esbarravam em mim.” (CARLOS, 1965______. A Pescaria. Rio de Janeiro: RGE, 1965.), Erasmo Carlos não poderia imaginar que a canção se tornaria o emblema da Jovem Guarda, fenômeno midiático derivado do programa de TV homônimo que estreou em fins de 1965. Comandado por Erasmo, Roberto Carlos e Wanderléa, o show inseriu o segmento jovem no mapa musical brasileiro ao falar de diversão, carrões e namoros. São esses os signos que a canção de Erasmo registra com sua forma fragmentada e temática irreverente que descreve a atmosfera hedonista de uma festa frequentada pelos artistas do momento. Esse exemplar é representativo da música jovem que dominou as paradas nos dois anos seguintes, cujo naipe de influências incluía rock and roll, música romântica e pop italianos, além de samba-canção. Os Beatles ganharam protagonismo, não só como inspiração sonora, mas também como modelo simbólico ao principal objetivo da Jovem Guarda: construir uma cultura juvenil ao redor da música. Esse fenômeno, no entanto, seria impensável fora das possibilidades advindas da televisão, meio que lhe deu forma e corpo.

Apesar de chegar ao Brasil nos anos 1950, foi só na década seguinte que a televisão estendeu seu alcance às mais diversas classes e localidades, revelando-se um novo mediador social; espaço de negociação de valores, maneiras de ver, estar e agir no mundo. No campo da música popular, ocupou posição central antes reservada ao rádio, que passou a gravitar ao seu redor com os demais setores da indústria cultural. Uma nova gramática audiovisual se impunha. A hegemonia da televisão seria capaz de construir um sistema de estrelato que transformaria jovens artistas em celebridades, objetos de culto e modelos de reconhecimento, identificação e conduta.

A televisão transformou-se, assim, em uma plataforma de visibilidade que se desdobrava em outros produtos — canções, filmes, fotografias, reportagens, entrevistas — pelos quais uma nova geração de artistas exibia um estilo de vida hedonista, simbolizado por carrões, festas e conquistas amorosas. Suas vidas eram dissecadas em detalhes pela imprensa: amores, rivalidades, vida familiar, preferências alimentares e cortes de cabelo viravam notícia. Encenando uma “performance pública da vida privada” (McDONNEL, 2012McDONELL, A. M. Just like us: celebrity gossip magazines in American popular culture. Tese (Doutorado em Comunicação). Universidade de Michigan, 2012., p. 70), os artistas tornavam-se personagens de si mesmos.

Roberto Carlos era o Brasa, o bom moço interiorano, franzino, com ar ingênuo, religioso e trabalhador. Já Erasmo era o Tremendão, o protótipo do roqueiro rebelde inspirado em Elvis Presley. Alto, forte, temperamental e avesso a formalidades, ele não levava desaforo para casa. Wanderléa, por outro lado, dividia-se entre Ternurinha e Garota Papo Firme: delicada, vaidosa, mas ao mesmo tempo independente e ambiciosa. Os personagens remetiam a uma galeria de heróis e vilões dos quadrinhos, cinema e novelas. Discos, filmes, revistas, jornais e até uma linha de produtos composta de bonecos, calças, minissaias, bolsas, camisetas, sapatos, botas e artigos escolares permitiam consumir os ídolos em múltiplos suportes.

A trajetória de consagração dessas celebridades tem na noção de autenticidade um elemento fundamental. Diferenciar-se era necessidade em um sistema hierarquizado em que todas as posições se definiam relacionalmente. Por meio das representações, suas vidas eram convertidas em narrativas midiáticas. No entanto, quando o cotidiano é mediado desde cedo por imagens e valores retirados da mídia, são as fronteiras entre o vivido e o representado que se embaralham.

Para testar essa hipótese, analisaremos a construção do Tremendão e como ele forjou sua autenticidade recorrendo a signos que vão do rock and roll aos filmes de cowboy. Apoiada em registros documentais — reportagens, canções, capas de disco, fotografias — associados a entrevistas e registros biográficos, nossa análise conjuga uma dimensão macroscópica — atenta ao processo de modernização brasileira, à entrada em uma sociedade de consumo globalizada e à reconfiguração do mercado musical pela força da televisão — e microscópica — que mira a trajetória, a biografia, o cotidiano e o consumo cultural de Erasmo, e de que forma ele é significado pelos determinantes de classe e geração.

A intenção, assim, é lidar com um conjunto de forças que constrangem e moldam tanto o artista quanto o campo cultural no qual ele atua, esclarecendo, portanto, como a figura do Tremendão é produto tanto da indústria cultural massiva, quanto da trajetória de vida do próprio Erasmo. Nossa análise, de cunho qualitativo, está baseada nos conceitos de campo, habitus, trajetória e capital cultural, caros a Pierre Bourdieu (1996BOURDIEU, P. A Ilusão Biográfica. In: AMADO, Janaina; FERREIRA, Marieta de Moraes. Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: Editora da FGV, 1996., 2005______. As regras da arte. São Paulo: Companhia das Letras, 2005., 2007)______. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo: Zouk, 2007., mas também na contribuição dos estudos de celebridades (DYER, 2008DYER, R. Stars, Londres: British Film Institute, 2008.; MARSHALL, 1995MARSHALL, P. D. Celebrity and power: fame in contemporary culture. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1995.). As duas vertentes nos permitirão reconstituir o espaço cultural e a trajetória do cantor e analisar os materiais — canções, capas de disco, entrevistas, etc. — que constituíram o Tremendão. Cabe agora explicar como essas vertentes se combinam.

Celebridades e a fabricação de autenticidade

Em Stars, Richard Dyer (2008)DYER, R. Stars, Londres: British Film Institute, 2008. defende que o fascínio despertado pelas estrelas do cinema é o efeito não de seu carisma singular, mas da maneira como encarnam tipos e papéis sociais. Ao condensar divisões de classe, gênero e etnia, tornam-se objetos privilegiados para ler a sociedade, pois revelam, em escala individual, dinâmicas conflituosas da vida coletiva.

O livro de Dyer é precursor dos estudos de celebridades, cujo objetivo é investigar a natureza e o significado da fama na contemporaneidade. David Marshall (1995)MARSHALL, P. D. Celebrity and power: fame in contemporary culture. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1995. entende a celebridade como uma figura de notoriedade pública dotada de uma forte carga de individualidade, expressa em termos de idiossincrasias. Seu status não é herdado pela tradição, mas depende do sucesso midiático altamente efêmero e fugaz. Nesse processo, sua vida íntima torna-se uma mercadoria, construída, embalada e vendida pelos meios de comunicação de massa. Em busca de promoção e consagração, as celebridades, assim, acionam uma performance pública da vida privada (McDONNEL, 2012McDONELL, A. M. Just like us: celebrity gossip magazines in American popular culture. Tese (Doutorado em Comunicação). Universidade de Michigan, 2012., p. 70), como já mencionado.

Desde seu início, o estudo das celebridades esteve intimamente conectado às análises de representações midiáticas. Considerando as representações como formas de “produção de significado através da linguagem” (HALL, 1997HALL, S. Representation. Londres: Sage, 1997., p. 16), um dos interesses dos estudos de celebridade é investigar os múltiplos vetores representacionais que agem na consagração de uma celebridade.

As representações de um artista estão intimamente conectadas a suas trajetórias de vida, que são reembaladas enquanto narrativas que visam legitimar o seu sucesso. Escapar a essa teleologia legitimadora é tarefa do analista que se debruça nas fontes midiáticas. É necessário escapar ao que Bourdieu (1996)BOURDIEU, P. A Ilusão Biográfica. In: AMADO, Janaina; FERREIRA, Marieta de Moraes. Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: Editora da FGV, 1996. chama de ilusão biográfica: a crença na possibilidade de reconstituir um conjunto coerente, ordenado e linear de acontecimentos que se orientam para um fim pré-determinado. Assim, é preciso tomar tanto o agente quanto o espaço social como um “devir estando sujeito a sucessivas transformações” (ibidem, p. 189), o que nos leva a atentar ao conjunto de relações objetivas que organizam esse espaço, distribuindo os indivíduos e grupos segundo relações de proximidade ou distância.

Tomar o campo de produção cultural em sua dimensão relacional e como espaço de disputa é um dos pressupostos em que nos baseamos (BOURDIEU, 1996BOURDIEU, P. A Ilusão Biográfica. In: AMADO, Janaina; FERREIRA, Marieta de Moraes. Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: Editora da FGV, 1996., 2005______. As regras da arte. São Paulo: Companhia das Letras, 2005., 2007______. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo: Zouk, 2007.) para reconstituir o cenário da música popular nos anos 1960 — seus agentes, instituições, hierarquias, objetos de disputa —, a fim de compreender a posição ocupada por Erasmo e as relações de parceria ou antagonismo em que se engajou, para, então, analisar como essas forças incidem na biografia de Erasmo e, posteriormente, na construção do Tremendão.

Uma sociedade de consumo no Brasil?

Poucas práticas têm tanta centralidade no universo simbólico da Jovem Guarda quanto o consumo. Carros, casas, roupas e mulheres3 3 O fato de mulheres ocuparem a mesma posição de carros e roupas deixa clara a sua condição subordinada em uma cultura patriarcal que as trata como uma mercadoria e um emblema de distinção masculina. Isso revela que os pressupostos de rebeldia sustentados pela Jovem Guarda têm um fundo conservador bastante evidente. figuram em letras de canções, fotografias e reportagens como emblemas de sucesso. Compreender essa ostentação desmesurada leva-nos a investigar a lógica que organiza o consumo enquanto prática social singular. Falar em cultura do consumo (FIGUEIREDO, 1998FIGUEIREDO, A. C. Liberdade é uma calça velha, azul e desbotada: publicidade, cultura de consumo e comportamento político no Brasil, 1954-1964. São Paulo: Hucitec, 1998.; SLATER, 2002SLATER, D. Cultura do consumo & modernidade. São Paulo: Nobel, 2002.) é assumir que as mercadorias, quando libertas da função estrita de garantir a subsistência humana, têm a capacidade de funcionar como mediadoras sociais. Por meio de rituais de consumo, maneiras de ser, estar e pensar são produzidas, reproduzidas e modificadas. Isso evidencia que o consumo não é somente uma prática individual, mas sobretudo uma linguagem coletiva que mobiliza sonhos e aspirações, negociando noções de classe, etnia, gênero, etc. Nesse processo, em que as relações sociais tornam-se mediadas por produtos, serviços e experiências ofertadas no mercado, a questão da identidade torna-se central. Em uma sociedade democrática que permite a mobilidade, o consumo se torna ideologia, ao fazer crer que todos são livres para se reinventar e redefinir seus lugares sociais por meio do mercado (SLATER, 2002SLATER, D. Cultura do consumo & modernidade. São Paulo: Nobel, 2002.).

A noção de sociedade do consumo ganha ênfase especial nos Estados Unidos do pós-guerra, impulsionada por uma sociedade próspera economicamente, que tem nos subúrbios racionalizados, na expansão dos meios de comunicação e no gigantesco mercado de bens de consumo voltados para o lazer uns de seus principais emblemas. Em meio a isso, músicas, roupas, filmes, programas de TV e de rádio tornavam-se os signos mais visíveis de uma nova cultura juvenil que se distinguia do universo adulto por gírias, regras de status, modos de gastar o dinheiro e aproveitar o tempo livre; práticas atreladas a um relacionamento específico com amigos, pares amorosos, escola e família.

Enquanto isso, no Brasil, o crescimento industrial e a expansão da malha urbana se tornavam a expressão material de um discurso oficial de modernização e prosperidade, que caminhavam de mãos dadas com as promessas de abundância que fundavam a ideologia de consumo norte-americana do pós- guerra. Com a integração do Brasil no circuito do capitalismo mundial, bens de consumo imprimiam noções de praticidade, conforto e progresso ao cotidiano, tornando-se, também, emblemas de distinção (MELO; NOVAIS, 1998MELO, J. M. C. de; e NOVAIS, F. Capitalismo tardio e sociabilidade moderna. In: NOVAIS, F. História da vida privada no Brasil: contrastes da intimidade contemporânea. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.). Nesse processo, filmes como Juventude Transviada, O Selvagem e Sementes da Violência, bem como discos de rock and roll, construíam, no Brasil, uma ideia de cultura juvenil em que os ideais de prazer e lazer eram seus elementos mais evidentes. Abocanhando as verbas publicitárias antes destinadas ao rádio, a TV, que se expande nos anos 1960, é uma das vitrines principais dessa nova cultura jovem e de consumo de que a Jovem Guarda é subproduto. Nesse contexto, Erasmo profissionaliza-se, dando origem ao Tremendão.

Do bar divino à televisão

Analisar a construção do Tremendão é compreender como imagens consumidas por Erasmo — que vão de Elvis Presley até John Wayne, passando por James Dean — foram reembaladas e incorporadas com vista à produção de um personagem. Ídolos de Erasmo desde a infância, esses personagens deixam claro como sua forma de ver o mundo, mesmo antes do estrelato, já era formada e conformada por um quadro de referências retirado de um regime cotidiano de saturação midiática.

Para localizar esse processo, é necessário examinar o ambiente sociocultural que lastreou o consumo cultural e a trajetória de vida do cantor. Segundo Erasmo, a Tijuca, bairro onde nasceu, era um típico cenário da Zona Norte carioca

Tinha de tudo lá: um posto de saúde com um entra e sai constante de ambulâncias que davam carona aos moradores; um templo batista também frequentado pelos garotos católicos (afinal, havia meninas lá); casarões decadentes que viraram casas de cômodo, nas quais cada quarto era alugado para uma família; vilas com casas simples; pensões; mansões com direito a um zoológico particular; hotel; fortaleza de jogo do bicho; pequenas indústrias de fundo de quintal; e um comércio variado, que incluía também os ambulantes, como comprador de garrafas, o amolador de facas e a “vaca-leiteira”, pequeno carro-pipa que vendia leite nas esquinas). Era uma babel de comportamentos, com gente de todos os tipos.

(CARLOS, 2009______. Minha Fama de mau. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009., p. 13)

Entre o bar e as discussões acaloradas de futebol, um circuito ostensivo de sociabilidades se formava: “todos sabiam dos segredos de todos e se frequentavam” (ibidem, p. 14). Era numa casa de cômodos que a auxiliar de enfermagem dona Diva morava com seu filho adolescente na segunda metade dos anos 1950: Erasmo, sua mãe e mais onze pessoas. No lugar da família nuclear burguesa, fundamental para a construção das noções de privacidade e individualidade modernas, percebemos a existência de famílias estendidas, que não obedecem aos laços sanguíneos e nem se mantêm fechadas na esfera privada da casa, fazendo da rua seu espaço de sociabilidade por excelência. Isso nos leva a perceber como Erasmo e seus amigos ocupavam o espaço público.

Apropriadas pelas turmas de bairro, as ruas demarcavam espaços de conhecimento, reconhecimento e construção de múltiplas identidades jovens. Cada grupo definia-se pela posição que ocupava em um sistema hierárquico no qual as mulheres e os bens de consumo eram exibidos como emblemas de poder e distinção. Enquanto Erasmo se divertia com futebol, pipa, carrinho de rolimã, ioiô e pião, os rapazes da Praça Saens Peña, famoso centro comercial da Tijuca, desfilavam de carro ou moto com suas namoradas, em uma clara disputa de status (CARLOS, 2009______. Minha Fama de mau. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.; MONTEIRO, 2008MONTEIRO, D. Dez! Nota Dez! Eu sou Carlos Imperial. São Paulo: Matrix, 2008.). O mais famoso dos grupos era provavelmente a turma da Miguel Lemos, rua que desembocava na Praia de Copacabana, localizada na zona sul carioca. “A mocidade esnobe que vive depois do túnel” é como Stanislaw Ponte Preta (1957, p. 7)PONTE PRETA, S. Exu baixou ao som do rock and roll. Última Hora, 18 jan. 1957, p. 7. definia a endinheirada juventude de Copacabana em seu desprezo aos suburbanos, como eram pejorativamente rotulados Erasmo e seus amigos.

A polarização entre subúrbio e zona sul é um efeito direto do adensamento carioca experimentado nos anos 1950. Nessa época, o bairro de Copacabana vivia uma intensa especulação imobiliária, que levou à proliferação de enormes edifícios com apartamentos minúsculos que contrastavam com as espaçosas unidades da orla ocupadas pelas elites. Como resultado, assistimos à expansão do setor de comércio e consequente atração de mão de obra vinda, muitas vezes, dos subúrbios cariocas (VELHO, 1973VELHO, G. A utopia urbana: um estudo de antropologia social. Rio de Janeiro: Zahar, 1973.). Serventes, empregadas domésticas, faxineiros e demais recém-chegados eram pejorativamente tachados de suburbanos. No campo musical, o estigma se traduzia no veto à participação de suburbanos nos círculos bossanovistas, formados, justamente, pela moçada esnobe.

Em meio a isso, o jovem Erasmo construía suas noções de vida noturna e glamour por meio de imaginários midiáticos, alimentado pelas colunas sociais de jornais e revistas. Com o rádio, formava seu gosto musical, que incluía bossa-nova e samba encontrando, no entanto, seu porto seguro no rock and roll de Elvis Presley. Consumia também a literatura de Monteiro Lobato, os quadrinhos de Flash Gordon, os desenhos de Tom e Jerry, as chanchadas da Atlântida e westerns do ídolo John Wayne. Não perdia, ainda, filmes-chave da cultura jovem norte-americana, como Ao balanço das horas, Juventude transviada e Sementes da violência. Em Balada sangrenta e O prisioneiro do rock, estrelados por Elvis Presley, pôde conhecer o visual, a rebeldia e os meneios de outro ídolo (CARLOS, 2009______. Minha Fama de mau. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009., p. 59).

Erasmo reproduzia a seu modo o visual o que colhia no cinema: “calça far-west nacional (o mais perto que se tinha do jeans que víamos nos filmes americanos), camisa de gola alta, cabelo comprido e costeleta [...], o protótipo do rockeiro”. Brigava por qualquer motivo “[...] Quem não podia ter um canivete igual ao do filme Juventude Transviada comprava uma imitação [...]. Eu usava um fio de aço [...] simulando um chicote” (CARLOS, 2009______. Minha Fama de mau. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009., p. 65). Assim, o repertório midiático moldava o cotidiano de Erasmo e das turmas de bairro, informando rituais de sociabilidade e modos de se apropriar do território.

Nomes como Tim Maia, Jorge Ben e Wilson Simonal se encontravam em frente ao Bar Divino, na Tijuca, para conversar sobre quadrinhos, cinema, tocar rock e bossa nova. Desses encontros, surge os Snakes, primeiro grupo vocal de Erasmo, que se apresentava com Tim Maia em igrejas e festas de bairro no subúrbio. Quando este lhe ensinou rudimentos de violão, Erasmo começou a compor (ARAUJO, 2006ARAUJO, P. C. de. Roberto Carlos em detalhes. Rio de Janeiro: Editora Planeta, 2006.).

Corria o ano de 1958, e Roberto Carlos já dublava e imitava os trejeitos de Elvis na TV. Foi o gosto por Elvis que deu início à amizade com Erasmo. Por meio de Roberto, Erasmo acabou assumindo o posto de ajudante geral do produtor do programa, Carlos Imperial. No início dos anos 1960, os Snakes, que até então se limitavam a acompanhar Roberto e Tim em suas apresentações, conseguiram gravar dois compactos e um long play (LP).

Os compactos incluíam duas composições de Carlos Imperial, “Calypso rock”4 4 “Se você gosta de mambo e o chá-chá-chá dançou / Você vai tocar Calypso / O rock que chegou.” , uma mistura dos ritmos latinos e do rock and roll, e Namorando”, uma típica canção juvenil sobre festinhas adolescentes, que lembra o tom inocente dos rocks já popularizados por Celly Campello5 5 “Eu tenho doze anos / Preciso namorar / Papai é antiquado / Mas um jeito eu vou dar / Papai foi ao cinema /Mamãe foi viajar / Vamos todos lá pra casa / Uma festa organizar.” . Outra faixa do compacto é “Sh-Boom”, uma versão da canção homônima dos Chords, um dos muitos quartetos negros que influenciou o rock em seu início. O LP Só Twist representava uma releitura moderna e acelerada de sucessos de diversos gêneros; inclui Dançando o twist”, de Ray Conniff, mas também o bolero “Cachito” e ainda “Jambalaya”, rock balada popularizado por Brenda Lee nos anos 1950. Nenhum deles fez sucesso: era o fim dos Snakes.

Estávamos em 1962, o programa de TV Clube do rock havia sido substituído por Os brotos comandam. Além de apresentar esse programa na TV e no rádio, Imperial administrava uma caravana de cantores e dançarinos que se apresentavam em shows itinerantes realizados em clubes e ginásios. Também era o responsável por “O mundo é dos brotos”, coluna da Revista do Rádio que divulgava as novidades da música jovem no Brasil e promovia seus próprios artistas. Erasmo, a essa altura, era o secretário de Imperial (MONTEIRO, 2008MONTEIRO, D. Dez! Nota Dez! Eu sou Carlos Imperial. São Paulo: Matrix, 2008.). Além de atuar como produtor e cantor em eventos, aproveitava a revista para plantar notas sobre si: “Erasmo Carlos (secretário de Carlos Imperial) namorava um brotinho de 14 anos. Agora está de romance com uma vedete de mais de 35” (MEXERICOS..., 1962MEXERICOS da Candinha. Revista do Rádio, Rio de Janeiro, 15 set. 1962, p. 23., p. 23).

Enquanto isso, o grupo Renato e seus Blue Caps contrata Erasmo como crooner e lança um LP eclético (BLUE CAPS, 1963RENATO e seus Blue Caps. Renato e seus blue caps. Rio de Janeiro: Som, 1963.), contendo faixas instrumentais — uma delas era a versão de um sucesso de Chubby Checker, o rei do twist, e outra se inspirava no rock instrumental inglês dos Shadows —, uma regravação de Ray Charles e outras duas versões: “Estrelinha” trata de jovens sonhadores e suas confidências de amor; já “Lobo mau”6 6 “Eu sou do tipo que não gosta de casamento / E tudo que eu faço ou falo é fingimento / Eu pego o meu carro e começo a rodar / E tenho mil garotas uma em cada lugar / me chamam lobo mau, me chamam lobo mau / eu sou o tal, tal, tal, tal, tal.” , de um playboy conquistador. O endereçamento ao público jovem unia a diversidade musical do repertório. “Um prêmio ao talento de jovens músicos e um grande lançamento para a juventude brasileira”, diz o texto da contracapa, assinado por Jair de Taumaturgo, apresentador do show televisivo Hoje é dia de rock. Na capa, temos um visual muito semelhante aos Elegants, grupo vocal de sucesso.

Figura 1
The Elegants (1958) e Renato e Seus Blue Caps (1963).

A partir de 1963, Erasmo assume a carreira solo e a composição. As parcerias com Roberto ganham centralidade: o primeiro compacto solo de Erasmo contava com duas delas, “Jacaré”7 7 “Peguei a minha prancha e fui correndo para o mar / A onda era boa, sorrindo vim em pé / Deslizando... num jacaré... / Foi quando eu notei que o broto já me olhava.” e “Terror dos namorados”8 8 “Eu vivo num dilema / Não sei como parar / Eu tenho um problema / Minha vida é beijar / [...] E por isso que me chamam / Terror dos namorados / O homem que possui / Aquele beijo tão falado.” . A primeira traduzia a ambiência da surf music que então despontava nos Estados Unidos, falando de um rapaz que conquistara um broto ao exibir suas habilidades de surfista; já a segunda trata de um beijoqueiro inveterado. Nessas composições, o tom cerimonioso das orquestras que havia acompanhado Roberto e Erasmo até então dava lugar ao teclado Hammond de Lafayette Coelho. Muito comum em filmes de ficção cientifica da época, como O dia em que a terra parou, o timbre agudo e futurista do instrumento traduzia musicalmente a noção cara de despojamento e cosmopolitismo à música jovem.

A figura do playboy conquistador de Jacaré” e “Terror dos namorados” retorna em “Fama de mau”9 9 “Meu bem às vezes diz / que deseja ir ao cinema / [...] / e digo não, por favor / não insista [...] / não quero torturar meu coração [...] / ir ao cinema é uma coisa normal / mas é que eu tenho / que manter a minha fama de mau!” , lançada no compacto seguinte de Erasmo, na qual o protagonista transforma a namorada em emblema e pré-requisito para manter sua fama de mau. Ironizando e, ao mesmo tempo, exacerbando a representação masculina hegemônica, o Tremendão aos poucos começava a se desenhar.

O terceiro compacto continha o primeiro grande sucesso de Erasmo, Festa de arromba”, que antecipou o fenômeno da Jovem Guarda e seus símbolos: o consumo ostentatório, as festas, danças, o visual extravagante e culto aos ídolos, como mencionado no início do texto. Nesse momento em que o programa Jovem Guarda ainda não tinha estreado, canções, representações nos jornais, TV e revistas ajudavam a dar forma e sentido àquilo que então se chamava música jovem.

Figura 2
Compactos Terror dos Namorados (1964), esta de Arromba (1965) e LP A Pescaria (1965).

O ano de 1965 marca a estreia de Erasmo em long play. A Pescaria evidenciava suas filiações na música jovem enquanto expunha as estratégias utilizadas para firmar sua autenticidade. O disco possui composições de José Messias e Renato Barros, figuras destacadas no meio, e nenhuma de Imperial, o que mostra a tentativa de se descolar deste que fora seu tutor no início da carreira. Para se diferenciar dos imitadores dos Beatles, que se multiplicavam, afirmava, em uma faixa, sua intenção de “acabar com a beatlemania”10 10 “Vou acabar / Com a beatlemania / Que atacou o meu bem / É a ordem do dia / Cabelo comprido / Nunca foi prova de ser mau / Se eu não puder na mão / Eu brigo até de pau / [...].” . “Dia de escola”, versão de “School day”, de Chuck Berry, deixava clara a inspiração do rock and roll dos anos 1950. Em entrevista ao autor, Erasmo afirmou que a canção era uma tentativa de chamar a atenção para os artistas jovens brasileiros, desprestigiados em relação aos estrangeiros11 11 Entrevista ao autor em 3 de maio de 2015. , o que evidencia mais uma vez a tentativa de construir a sua música jovem.

Sublinhar sua filiação a Berry, indo na contramão da beatlemania vigente, mas também dispensar as contribuições de Imperial, era uma forma de assumir sua autenticidade. Outro movimento nesse sentido está no repertório, que tem cinco composições e somente duas versões. Até então o carro- chefe dos intérpretes de sucesso na música jovem, como Sergio Murilo e Celly Campello, eram as versões. Ir contra a tendência, apostando em um trabalho mais autoral, reforça ainda mais a busca pela autenticidade.

As cinco composições eram todas parcerias com Roberto. A proximidade entre os dois cantores resultava na grande semelhança de parte de seus repertórios: o playboy conquistador de Fama de mau” e “Terror dos namorados”, faixas relançadas em A Pescaria, também comparecia em Splish splash”, gravada por Roberto e composta por Erasmo, e ainda em “Parei na contramão”, gravada por Roberto e composta por ambos. Isso resultou em comparações na imprensa como “Erasmo Carlos não quer desbancar Roberto Carlos” (TODA A VIDA..., 1965TODA A VIDA de Roberto Carlos. Revista do Rádio, 7 fev. 1965., p. 4), ou “O que Erasmo Carlos e Roberto Carlos têm demais?” (MEXERICOS..., 1966MEXERICOS da Candinha. Revista do Rádio, Rio de Janeiro, 29 nov. 1966., p. 19). Pelo repertório, talvez fosse difícil assinalar a diferença entre os dois no início da carreira, mas bastava comparar duas fotografias para perceber o contraste.

Figura 3
Imagens contrastantes de Erasmo e Roberto.

Franzino, tímido e introspectivo, Roberto cultivava o semblante de rapaz desprotegido e sonhador, imagem afinada a sua voz pequena e seu canto sussurrado em tom confessional, marca de várias composições românticas. Já Erasmo, com 1,85 metro de altura e 90 quilos, soube explorar sua hexis corporal como recurso distintivo e investir na imagem de roqueiro rebelde. As ideias de simplicidade, franqueza e despojamento, caras também a Roberto, ganhavam, em Erasmo, uma centralidade. Isso se traduz em uma recorrente imagem fotográfica em que ele aparece deitado. Numa rede, sofá ou cama; sem camisa ou de pijama: tratava-se de encenar uma ideia de espontaneidade.

Figura 4
Erasmo e a construção de sua simplicidade.

Ao mesmo tempo, notinhas e fofocas aqui e ali afirmavam que comer em excesso era um de seus grandes prazeres — “almoça tranquilo, comendo em prato fundo e de colher, porque detesta garfo” (MEU PATRÃO..., 1967, p. 22); “Roberto diz que quem mais fila o almoço em sua casa é Erasmo Carlos, até quando Roberto está em viagem o amigo vai almoçar lá” (MEXERICOS..., 1966, p. 19) ; “Antes de entrar em cena, mesmo que já tenha almoçado ou jantado, Erasmo Carlos sempre forra o estômago com um sanduíche de queijo e refrigerante” (CONFIDENCIAL, 1967CONFIDENCIAL, InTerValo, 1 jan, 1967, p.12., p. 12). Se comer em excesso é uma particularidade confirmada em sua biografia (CARLOS, 2009______. Minha Fama de mau. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.), o que interessa é compreender como uma característica outrora desimportante ao ser insistentemente citada na imprensa acaba funcionando como um elemento de distinção e fabricação de um personagem singular. O que se busca encenar é uma relação aparentemente natural — não mediada culturalmente — com o alimento. O primado da substância se opõe ao da forma, e o gosto pela fartura traduz, novamente, a noção de espontaneidade.

Tudo isso fica ainda mais claro pela maneira como seu corpo é representado:

Alto, 1,85 m, forte e corpulento, 90 quilos, o Tremendão [...] é — em tamanho também — um dos mais destacados bonitões da TV. Erasmo é tranquilo. Seu temperamento [...] pode variar [...]: tanto pode chorar, como distribuir sopapos a granel. Simpático e inteligente, ele é autêntico. Gosta de dizer tudo o que pensa.

(SONHO..., 1966SONHO de Erasmo é uma casa para sua mãe. InTerValo, São Paulo, 27 nov. 1966, p. 19., p. 17.)

Comendo ou dormindo, chorando ou brigando, Erasmo parecia obedecer somente a seus instintos e necessidades primárias, ignorando as regras de etiqueta e interdições que caracterizam a passagem da natureza para a cultura e entrada do ser humano no processo civilizador (ELIAS, 1994): “Não gosto de luxo [...] gosto de sentar, botar os pés na poltrona, bem à vontade [...]” (ERASMO..., 1966aERASMO Carlos: se for morar com Roberto, chuto a bandeja desse mordomo. InTerValo, São Paulo, 1 maio 1966, p. 14-15., p. 14). Essa espontaneidade encenada, portanto, era um elemento central de construção de autenticidade. Erasmo deixava isso ainda mais claro ao exacerbar o seu caráter alienado (“A gente [...] pergunta o que ele pensa de Sartre. ‘Quem é esse cara? Tá cantando onde?’” (ERASMO..., 1966bERASMO é lenha no Ié-Ié-Ié. InTerValo, São Paulo, 23 jan. 1966b, p. 15., p. 15, grifos no original). Segundo o cantor12 12 Entrevista a Marcelo Fróes em 1996. Disponível em: <http://www.jovemguarda.com.br/entrevista-erasmo-carlos.php>. Acesso em: 5 nov. 2021 essa estratégia era a mesma utilizada pelos Beatles em suas declarações debochadas à imprensa. Isso mostra que a influência da banda no Brasil não se restringia à sonoridade, mas sobretudo aos mecanismos de construção imagética.

Outro traço do Tremendão era a indisciplina. Segundo a revista InTerValo, dormir no expediente, faltar ao serviço ou agir com displicência eram as razões para ter sido demitido dos diversos empregos anteriores à carreira musical (OS DEZ..., 1967OS DEZ empregos de Erasmo. InTerValo, São Paulo, 23 abr. 1967, p. 18-19., p. 18). Não é um acaso a semelhança com Elvis Presley. Nos primeiros filmes do cantor, como Balada sangrenta, o protagonista entra em choque com a família, o trabalho e a escola, demonstrando aversão a todo o tipo de cerceamento institucional.

Assim, tanto em Elvis como em Erasmo, o rock and roll legitimava-se como vocação, o único local passível de acomodar uma agressividade supostamente intrínseca. O que se tem é uma narrativa que celebra a figura do outsider, cuja intenção era viver o mundo de acordo com suas regras. A especificidade, no caso de Erasmo é que a rebeldia é pontuada por um tom jocoso, o que diminui sua carga subversiva tornando-o um ídolo palatável ao público jovem. Percebe-se, mais uma vez, como imagens midiáticas e detalhes de trajetória se retroalimentam na construção de um personagem.

A sexualidade presente nas primeiras produções de Erasmo ficava ainda mais clara em seu segundo LP (CARLOS, 1966______. Você me acende. Rio de Janeiro: RGE, 1966.) que se aproveitou do enorme sucesso do programa Jovem Guarda, que estreara em fins de 1965. Na capa do disco, a guitarra, quase uma extensão fálica, e o cigarro, sinalizam a construção do roqueiro; na contracapa, fotogramas apresentam o cantor em êxtase. Na faixa título, “Você me acende”13 13 “Meu bem, meu bem / Beija bem devagarinho / Me abraça / E me chama de benzinho / Ahan! / Me acende com carinho / Uh! uh! uh! uh! uh! uh! / Me acende!” , o protagonista afirma sua excitação e pede para a mulher amada o acender com um beijo. Aos típicos diminutivos (devagarinho e benzinho), encontrados em várias canções da música jovem, eram adicionados gemidos, uma clara referência ao sexo. O protagonista conquistador retorna em Deixa de banca” e “Gatinha manhosa”, canções em que toda a resistência da mulher em relação ao homem aparecem como simples estratégias para barganhar atenção.

Figura 5
Você me acende (1966).

“O carango”14 14 “Copacabana carro vai zarpar / Todo lubrificado / Pra não enguiçar / Roda tala larga genial / Botando minha banca / Muito natural / Camisa verde clara, calça santropê / Combinando com o carango / Todo mundo vê/ Ninguém sabe o duro que dei / Pra ter fonfom / Trabalhei, trabalhei / [...] Capota levantada pra ninguém nos ver / Um abraço e um beijinho / Isso é que é viver / Ninguém sabe o duro que dei / Pra ter fonfom / Trabalhei, trabalhei / [Roberto, Simonal e Wanderley, vejam só o carango que eu comprei... é o carango, mora?.” , composição de Imperial, ilustra com precisão o nexo entre consumo e hedonismo que está no cerne do universo simbólico da Jovem Guarda. A canção soa como uma revanche, se comparada a “Ser bem”15 15 “Ser bem / É no Copa debutar / É sair todo domingo / Na revista do Pouchart / Ser bem / É andar de Cadillac / É dizer que está ‘in love’ / Mesmo que seja de araque / [...] Ser bem é na Hípica jantar / É no Jóquei desfilar e de noite, no Sacha’s / Com Baby, juntinho dançar / Mamãe, eu também quero ser bem.” (CARLOS, 1961CARLOS, R. Louco por você. Rio de Janeiro: CBS, 1961.), composição de quatro anos antes, em que o mesmo Imperial, na voz de um Roberto Carlos ainda desconhecido, traduzia a ânsia dos jovens suburbanos, como Erasmo e Roberto, em participar da vida noturna de Copacabana. As duas canções são ambientadas no mesmo bairro, mas se em “Ser bem”, o cantor invejava a riqueza alheia, em O carango” se faz invejar pelo seu carrão. Lida a partir da trajetória de Erasmo, a afronta tem um sabor especial, pois revela não só a adesão de Erasmo à disputa por carrões, mobilizada pelos artistas da Jovem Guarda, mas soa ainda como uma provocação aos círculos da Bossa Nova e das turmas de bairro que, poucos anos antes, haviam-no tachado de suburbano. O déficit de capital cultural e social que ele carregara no início de sua carreira era compensado, então, com a multiplicação de capital econômico, esfregado na cara de seus oponentes.

A canção também deixa claro como a classe social incide na apropriação simbólica dos territórios. A Copacabana dos suburbanos jovem-guardistas não era a mesma da Bossa Nova; a perspectiva contemplativa e distanciada dos apartamentos à beira-mar não era a mesma das esquinas da Tijuca. A ironia presente em “O carango”, portanto, só é compreensível quando reconstituímos o perfil sociobiográfico de Erasmo e as disputas simbólico- territoriais por ele experimentadas desde a sua adolescência. Isso reforça a ideia de que as celebridades são mais que o efeito de uma racionalidade produtiva, mas, antes, o resultado de condições objetivas de existência que são retrabalhadas, transfiguradas e reconstruídas enquanto componentes de uma representação midiática.

Em sua temática, O carango” aproxima-se de “O homem da motocicleta”, outra faixa do mesmo disco, cujo protagonista faz parte de uma gangue de motociclistas para quem o freio “serve só para enfeitar”. As canções celebravam o presente, o prazer e a ausência de limites, deixando claro como o consumo midiático de Erasmo, alimentado pela cultura juvenil norte-americana, é fonte fundamental da construção do Tremendão. Ambas evocavam o universo da juventude transviada, categoria que não remetia somente ao filme norte-americano estrelado por James Dean, mas sobretudo às gangues de jovens motorizados que apavoravam Copacabana nos anos 1950, tópico exaustivamente debatido na imprensa. Isso deixa clara a maneira como as representações midiáticas têm o poder de simbolizar o mundo em uma cadeia infinita de remissões intertextuais. Formado pela confluência de várias representações, o Tremendão é mais um texto midiático que tem a possibilidade de se desdobrar em diversos subtextos.

Assim, não surpreende que a Magaldi, Maia & Prosperi, agência responsável pela publicidade do programa Jovem Guarda, tenha utilizado Erasmo para a venda de diversos artigos de consumo, repetindo a fórmula já testada em Roberto Carlos. Surge assim a marca Tremendão, representada por uma estrela de xerife e composta de colete, chapéu de caubói, bonecos e demais artefatos.

É difícil encontrar menções ao Tremendão antes da metade de 1966. Essa data marcou o lançamento do disco O Tremendão, de sua marca de roupas e também de uma reportagem de capa na revista InTerValo com intenção clara de fixar o rótulo ao cantor. O texto assinalava o seu sucesso, o lançamento da linha de roupas e frisava que “Erasmo conhece a história dos bravos como ninguém” (A HORA e..., 1966A HORA e a vez do Tremendão. InTerValo, 31 jul. 1966.). Na época, além dos seriados Bronco, Bonanza e Bat Masterson, a TV exibia filmes de velho oeste diariamente. Mas não é só isso que explica o visual do Tremendão.

Figura 6
A linha de produtos Tremendão. Fonte: Folha de S. Paulo, 28 ago. 1966, p. 1; Cartão promocional e foto de boneco. Fonte: Acervo pessoal de Orlando Rodrigues; Produtos Tremendão. Fonte: CARAS, 1996CARAS. Almanaque da Jovem Guarda, v. 6, out. 1996., p. 24.
Figura 7
InTerValo lança o Tremendão.

Consumindo essa produção desde cedo, Erasmo reconhecia-se em suas imagens de masculinidade e bravura, o que fomentava a ideia de que a conversão em Tremendão era um processo quase natural. O processo experimentado por Erasmo não diferia de seus pares, que por meio de canções, entrevistas, declarações na imprensa e aparições na TV construíam e davam credibilidade à sua imagem, resgatando e reembalando símbolos e imaginários que circulavam no corpo social, no universo da música popular e em sua própria experiência de vida, com vista à produção de uma imagem autêntica. O que se tem aqui não são fórmulas de sucesso garantidas de antemão, mas sim um processo em que diversos significados vão se construindo de acordo com a sua disponibilidade, seja na biografia do indivíduo, seja no horizonte massivo de produção, e criando efeitos que nem a máquina industrial nem o artista são capazes de controlar como um todo. Ainda que claramente forjada, a imagem do Tremendão foi muito bem incorporada por Erasmo, pois ela dizia muito sobre sua própria identidade, formada e conformada desde cedo por signos midiáticos.

Depois de “Você me acende”, Erasmo lança O Tremendão no início de 1967. Seu quarto LP é a tentativa mais bem-acabada de traduzir a sua imagem em canção. A faixa título16 16 “Ponho o meu chapéu / E saio por aí / Entro no meu carro / Que é para me exibir / Acerto o meu colete / Penteio o cabelão / E compro uma briga / Só por causa de esbarrão... / Sou Tremendão / Tremendão, Tremendão / Hei! Hei! [...] / Corro mais que posso / Só pra esnobar / Adoro ver garotas / Ao me verem desmaiar / Gosto de teimar / Mesmo sem razão / Sou lelé da cuca / Sempre digo ‘não’.” , que abre o disco, evocava todos os signos visuais característicos de seu personagem — chapéu, carro, colete, cigarro, cabelo — que estavam ali só para esnobar. Brigão, teimoso e dono de si, o artista fazia da rebeldia um signo de distinção. A imagem se completa com “Eu não me importo”17 17 “Eu não me importo com o que falam de mim / Eu até gosto, quando fazem assim / Pois quando eu passo todos olham e começam a falar / Até sai comentário do meu modo de andar / Mas eu não me importo, com o que fala essa gente / Pois eu sou o tipo diferente.” , canção que reafirmava seu caráter autocentrado e autêntico: ele era “um tipo diferente” e as críticas que recebia eram fruto de inveja por ele “ser alguém”. Entre vitoriosos e fracassados, a ascensão social costurava uma narrativa em que a inveja, o mote de tantos melodramas populares, restava àqueles que não triunfaram.

O ponto alto do disco está na composição de Carlos Imperial, “Vem quente que eu estou fervendo”18 18 “Se você quer brigar / E acha que com isso estou sofrendo / Se enganou meu bem / Pode vir quente que eu estou fervendo / Pode tirar seu time de campo / Que o meu coração é do tamanho de um trem / Iguais a você eu apanhei mais de cem / Pode vir quente que eu estou fervendo.” . O que a princípio parecia uma discussão amorosa poderia, na boca do Tremendão, soar facilmente como convite ao sexo. O ritmo acelerado, os vocais enérgicos, os solos de saxofone e urros diversos traduziam o fervor sexual do protagonista masculino.

Mas a noção de rebeldia fazia concessões: em “Não vivo sem você”19 19 “Vou pedir / Uma vez para você não ir / [...]/ Porque eu / Não vivo sem você.” , afirmava sua dependência em relação à mulher amada; em “A grande mágoa”20 20 “Noite após noite / Vivo sonhando / Dia após dia /Fico esperando.” tentava reconquistá-la; já em “Não fiques triste”21 21 “Não fiques triste / Nunca te deixarei / Juro, eu te amo / Jamais te esquecerei.” declarava amor eterno. A maior surpresa, no entanto, estava em “Eu sonhei que tu estavas tão linda”22 22 “Eu sonhei que tu estavas tão linda / Numa festa de raro esplendor / A orquestra tocou uma valsa dolente / Tomei-te aos braços, fomos dançando / ambos silentes.” , uma valsa de Lamartine Babo, cujo vocabulário rebuscado fugia aos padrões da Jovem Guarda. Como forma de dialogar e se viabilizar diante de um público que ia além dos fãs de música jovem, Erasmo mostrava seu débito com a tradição romântica que vinha do rádio, mas ganhava nova leitura com dicção mais despojada e acompanhamento de teclados e guitarras. Isso deixava claro que a rebeldia do Tremendão tinha seus contrapesos.

Esses contrapesos ficaram ainda mais claros em uma série de reportagens na imprensa nas quais o Tremendão demonstrava o seu lado humano. Visitar uma creche (ERASMO..., 1966cERASMO provoca um caso no jardim de infância. InTerValo, São Paulo, 30 out. 1966c, p. 19.) ou se vestir de sorveteiro (UM SORVETEIRO..., 1967UM SORVETEIRO Tremendão. InTerValo. São Paulo, 3 dez. 1967f, p. 10-11., p. 10-11) eram algumas das intervenções produzidas pela InTerValo em que o cantor aparecia rodeado de crianças. Gravou ainda duas músicas dirigidas ao segmento infantil — “Tom e Jerry” e “O pica-pau” — que remetiam, novamente, a produtos consumidos pelo cantor desde cedo. Além das crianças, sua mãe foi outra figura que ajudou a dosar a rebeldia do Tremendão. Como Erasmo só conheceu o pai quando tinha mais de 20 anos, foi Dona Diva, como era conhecida na mídia, que sustentou o filho até ele se estabelecer profissionalmente. A relação afetiva entre eles era tema de diversas reportagens, o que suavizava as imagens do roqueiro rebelde.

Em relação à imagem de simplicidade, é interessante perceber como ela foi negociada em vista de sua ascensão econômica. Fotografado ao lado de emblemas caricaturais de riqueza, como seu Rolls Royce, buscava, ao mesmo tempo, manter a ideia de homem do povo que estava no cerne de sua construção identitária: o britânico Erasmo Carlos [...] vive como um rei, veste-se como um lorde e recebe os amigos como um irmão” (O BRITÂNICO..., 1967O BRITANICO Erasmo Carlos. Melodias, São Paulo, jul. 1967, p. 4-5., p. 5). Declarações como a de seu secretário — “Tremendão jamais nos tratou como empregados ou subordinados. Encara a todos como amigos” (MEU PATRÃO..., 1967MEU PATRÃO Erasmo Carlos, InTerValo, São Paulo, 10 ago. 1967, p. 22., p. 22) — simulavam uma proximidade com a audiência, estratégia cara aos ídolos populares.

O estilo britânico estampava a capa de seu quinto LP (CARLOS, 1967______. O Tremendão. Rio de Janeiro: RGE, 1967a.), em que aparece de blazer e gola rolê. A imagem requintada assume tons de zombaria na contracapa, ilustrada por seis clones do bem-vestido Tremendão rodeando o Rolls Royce parado na estrada: um deles troca o pneu. Mais uma vez, a ironia afirma-se como estratégia para gerenciar uma imagem que oscila entre a sofisticação e o despojamento.

Explorando o humor como poucos, não surpreende que Erasmo tenha protagonizado Ternurinha e Tremendão, um show de comédia em que vilões e mocinhos viviam aventuras em cenários como Paris ou o velho oeste. Lançado em janeiro de 1968, durou poucos meses, mas evidenciou como a figura do Tremendão, conhecida e reconhecida, havia se despregado de Erasmo e ganhado vida própria.

Figura 8
Erasmo Carlos (1967).

Considerações Finais

Desde o início da carreira, até o sucesso com o Tremendão, Erasmo deixa claro como é difícil pensar o cotidiano e a trajetórias de vida fora de seu atravessamento midiático. As representações, assim, ganham primazia, como elementos aptos a codificarem simbolicamente as forças que moldam a realidade. Suas análises ajudam-nos a compreender os códigos da indústria cultural, bem como a maneira pela qual personagens específicos as incorporam. No caso do Tremendão, as brigas, as mulheres, os carros e as festas simbolizadas em canções, reportagens, fotografias e entrevistas são, ao mesmo tempo, fabulações retiradas do cinema, dos quadrinhos, dos desenhos animados e das colunas sociais, mas que acabaram ganhando carne e corpo nas práticas sociais em que se engajou Erasmo, seja como jovem suburbano que sonhava em ser um artista, seja como um astro da Jovem Guarda.

Com o fim do programa de TV em 1968, Erasmo seguiu carreira solo. Ao contrário de Roberto e Wanderléa, que abandonaram as imagens de Brasa e Ternurinha, o Tremendão ainda cultiva a figura de roqueiro e as referências à sexualidade, como deixam claro os discos de 2009 e 2011, Rock and Roll e Sexo. Na ocasião do lançamento deste, declarou: “Meu vício é o amor que consigo através do sexo [...] Muita mulher gostaria de ser devassa e o homem é que não incentiva” (PAIXÃO, 2011PAIXÃO, Sara. Erasmo Carlos lança o CD ‘Sexo’ e diz: ‘Esse assunto inexplicavelmente ainda é tabu’. Extra Online, 20 ago. 2011. Disponível em: <https://extra.globo.com/tv-e-lazer/erasmo-carlos-lanca-cd-sexo-diz-esse-assunto-inexplicavelmente-ainda-tabu-2490087.html>. Acesso em: 19 dez. 2021.
https://extra.globo.com/tv-e-lazer/erasm...
). Tentativas de colocar o sexo como signo inerente à sua construção artística e talvez retratar-se pelas representações moralistas e misóginas de início da sua carreira, as falas ganham um sentido ampliado se lidas pelas lentes do Tremendão. Isso deixa claro como a tentativa de separar Erasmo e Tremendão, a pessoa e o personagem, é difícil de estabelecer. Encarar essa dualidade é um desafio de quem busca compreender as celebridades como índices da vida social.

  • 1
    Este texto foi originalmente apresentado na Intercom, em sua 43ª edição, realizada em 2020.
  • 2
    “Vejam só que Festa de Arromba! / No outro dia, eu fui parar / Presentes no local, / o rádio e a televisão; /Cinema, mil jornais, / muita gente, confusão / [...] / Hey! Hey [...] Que onda! / Que festa de arromba! /[...] Mas vejam quem chegou de repente / Roberto Carlos em seu novo carrão! / Enquanto Tony e Demétrius / fumavam no jardim / Sérgio e Zé Ricardo / esbarravam em mim.”
  • 3
    O fato de mulheres ocuparem a mesma posição de carros e roupas deixa clara a sua condição subordinada em uma cultura patriarcal que as trata como uma mercadoria e um emblema de distinção masculina. Isso revela que os pressupostos de rebeldia sustentados pela Jovem Guarda têm um fundo conservador bastante evidente.
  • 4
    “Se você gosta de mambo e o chá-chá-chá dançou / Você vai tocar Calypso / O rock que chegou.”
  • 5
    “Eu tenho doze anos / Preciso namorar / Papai é antiquado / Mas um jeito eu vou dar / Papai foi ao cinema /Mamãe foi viajar / Vamos todos lá pra casa / Uma festa organizar.”
  • 6
    “Eu sou do tipo que não gosta de casamento / E tudo que eu faço ou falo é fingimento / Eu pego o meu carro e começo a rodar / E tenho mil garotas uma em cada lugar / me chamam lobo mau, me chamam lobo mau / eu sou o tal, tal, tal, tal, tal.”
  • 7
    “Peguei a minha prancha e fui correndo para o mar / A onda era boa, sorrindo vim em pé / Deslizando... num jacaré... / Foi quando eu notei que o broto já me olhava.”
  • 8
    “Eu vivo num dilema / Não sei como parar / Eu tenho um problema / Minha vida é beijar / [...] E por isso que me chamam / Terror dos namorados / O homem que possui / Aquele beijo tão falado.”
  • 9
    “Meu bem às vezes diz / que deseja ir ao cinema / [...] / e digo não, por favor / não insista [...] / não quero torturar meu coração [...] / ir ao cinema é uma coisa normal / mas é que eu tenho / que manter a minha fama de mau!”
  • 10
    “Vou acabar / Com a beatlemania / Que atacou o meu bem / É a ordem do dia / Cabelo comprido / Nunca foi prova de ser mau / Se eu não puder na mão / Eu brigo até de pau / [...].”
  • 11
    Entrevista ao autor em 3 de maio de 2015.
  • 12
    Entrevista a Marcelo Fróes em 1996. Disponível em: <http://www.jovemguarda.com.br/entrevista-erasmo-carlos.php>. Acesso em: 5 nov. 2021
  • 13
    “Meu bem, meu bem / Beija bem devagarinho / Me abraça / E me chama de benzinho / Ahan! / Me acende com carinho / Uh! uh! uh! uh! uh! uh! / Me acende!”
  • 14
    “Copacabana carro vai zarpar / Todo lubrificado / Pra não enguiçar / Roda tala larga genial / Botando minha banca / Muito natural / Camisa verde clara, calça santropê / Combinando com o carango / Todo mundo vê/ Ninguém sabe o duro que dei / Pra ter fonfom / Trabalhei, trabalhei / [...] Capota levantada pra ninguém nos ver / Um abraço e um beijinho / Isso é que é viver / Ninguém sabe o duro que dei / Pra ter fonfom / Trabalhei, trabalhei / [Roberto, Simonal e Wanderley, vejam só o carango que eu comprei... é o carango, mora?.”
  • 15
    “Ser bem / É no Copa debutar / É sair todo domingo / Na revista do Pouchart / Ser bem / É andar de Cadillac / É dizer que está ‘in love’ / Mesmo que seja de araque / [...] Ser bem é na Hípica jantar / É no Jóquei desfilar e de noite, no Sacha’s / Com Baby, juntinho dançar / Mamãe, eu também quero ser bem.”
  • 16
    “Ponho o meu chapéu / E saio por aí / Entro no meu carro / Que é para me exibir / Acerto o meu colete / Penteio o cabelão / E compro uma briga / Só por causa de esbarrão... / Sou Tremendão / Tremendão, Tremendão / Hei! Hei! [...] / Corro mais que posso / Só pra esnobar / Adoro ver garotas / Ao me verem desmaiar / Gosto de teimar / Mesmo sem razão / Sou lelé da cuca / Sempre digo ‘não’.”
  • 17
    “Eu não me importo com o que falam de mim / Eu até gosto, quando fazem assim / Pois quando eu passo todos olham e começam a falar / Até sai comentário do meu modo de andar / Mas eu não me importo, com o que fala essa gente / Pois eu sou o tipo diferente.”
  • 18
    “Se você quer brigar / E acha que com isso estou sofrendo / Se enganou meu bem / Pode vir quente que eu estou fervendo / Pode tirar seu time de campo / Que o meu coração é do tamanho de um trem / Iguais a você eu apanhei mais de cem / Pode vir quente que eu estou fervendo.”
  • 19
    “Vou pedir / Uma vez para você não ir / [...]/ Porque eu / Não vivo sem você.”
  • 20
    “Noite após noite / Vivo sonhando / Dia após dia /Fico esperando.”
  • 21
    “Não fiques triste / Nunca te deixarei / Juro, eu te amo / Jamais te esquecerei.”
  • 22
    “Eu sonhei que tu estavas tão linda / Numa festa de raro esplendor / A orquestra tocou uma valsa dolente / Tomei-te aos braços, fomos dançando / ambos silentes.”

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    19 Dez 2021
  • Aceito
    11 Abr 2022
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