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Preservação da capacidade reprodutiva de Meloidogyne exigua em mudas de pimentão

Maintenance of the reproductive capacity of Meloidogyne exigua on pepper seedlings

Resumos

O cafeeiro é o hospedeiro tipo de Meloidogyne exigua, no qual a produção de inóculo em larga escala demanda tempo prolongado. Objetivou-se comparar a reprodução de populações de M. exigua em plantas de café e pimentão, e avaliar a possível ocorrência de seletividade fisiológica depois de sucessivas gerações em pimentão. A reprodução foi estudada em cinco populações e a seletividade envolveu uma população que foi mantida em plantas de café e pimentão por 30 meses, com as avaliações realizadas a cada 90 dias. O número de galhas e de ovos foi sempre superior em pimentão. A taxa reprodutiva de M. exigua foi cerca de quatro vezes maior em pimentão do que em cafeeiro. Não houve diferença na reprodução de M. exigua em cafeeiro, para as duas fontes de inóculo, cafeeiro e pimentão, durante os 30 meses. Conclui-se que o pimentão é melhor hospedeiro que o cafeeiro para a multiplicação de inóculo de M. exigua, inclusive, para as populações que não se multiplicam em tomateiro, com as vantagens da rapidez e facilidade de condução das plantas em casa de vegetação. Assim, a produção de grande quantidade de inóculo de M. exigua é possível pela utilização do pimentão, uma vez que o nematóide não perde sua habilidade de infectar o cafeeiro.

Nematóide das galhas; Capsicum annuum; produção de inóculo; 'Early California Wonder'


Coffee is the host-type of Meloidogyne exigua and significant inoculum production on this plant takes a long time. The objective of this study was to evaluate the reproduction of five M. exigua populations on coffee comparatively with reproduction on pepper, and the possible occurrence of physiological selectivity after successive generations on pepper. In the selectivity test, one population was maintained on coffee and pepper for 30 months and reproduction was evaluated 10 times, at 90 day intervals. The number of galls and eggs was always higher in pepper roots than in coffee ones. The reproductive rate in pepper was four times higher than in coffee. There was no difference in nematode reproduction in coffee between the two inoculum sources, coffee and pepper, during 30 months. Pepper proved to be a better host than coffee for the rearing of M. exigua, including those populations unable to reproduce in tomato roots, since pepper plants are easy to manage under green-house conditions and nematode reproduction is faster than in coffee. Therefore, pepper should be used to rear M. exigua since the nematode does not lose its ability to infect coffee.

Root-knot nematode; Capsicum annuum; inoculum production; 'Early California Wonder'


RESEARCH ARTICLE ARTIGO

Preservação da capacidade reprodutiva de Meloidogyne exigua em mudas de pimentão

Maintenance of the reproductive capacity of Meloidogyne exigua on pepper seedlings

Rodrigo V. Silva; Rosângela D.L. Oliveira; Patrícia S. Ferreira; Dalila J. Sêni; Douglas B. Castro

Departamento de Fitopatologia, Universidade Federal de Viçosa, 36570-000, Viçosa, MG, Brasil

RESUMO

O cafeeiro é o hospedeiro tipo de Meloidogyne exigua, no qual a produção de inóculo em larga escala demanda tempo prolongado. Objetivou-se comparar a reprodução de populações de M. exigua em plantas de café e pimentão, e avaliar a possível ocorrência de seletividade fisiológica depois de sucessivas gerações em pimentão. A reprodução foi estudada em cinco populações e a seletividade envolveu uma população que foi mantida em plantas de café e pimentão por 30 meses, com as avaliações realizadas a cada 90 dias. O número de galhas e de ovos foi sempre superior em pimentão. A taxa reprodutiva de M. exigua foi cerca de quatro vezes maior em pimentão do que em cafeeiro. Não houve diferença na reprodução de M. exigua em cafeeiro, para as duas fontes de inóculo, cafeeiro e pimentão, durante os 30 meses. Conclui-se que o pimentão é melhor hospedeiro que o cafeeiro para a multiplicação de inóculo de M. exigua, inclusive, para as populações que não se multiplicam em tomateiro, com as vantagens da rapidez e facilidade de condução das plantas em casa de vegetação. Assim, a produção de grande quantidade de inóculo de M. exigua é possível pela utilização do pimentão, uma vez que o nematóide não perde sua habilidade de infectar o cafeeiro.

Palavras-chave: Nematóide das galhas, Capsicum annuum, produção de inóculo, 'Early California Wonder'.

ABSTRACT

Coffee is the host-type of Meloidogyne exigua and significant inoculum production on this plant takes a long time. The objective of this study was to evaluate the reproduction of five M. exigua populations on coffee comparatively with reproduction on pepper, and the possible occurrence of physiological selectivity after successive generations on pepper. In the selectivity test, one population was maintained on coffee and pepper for 30 months and reproduction was evaluated 10 times, at 90 day intervals. The number of galls and eggs was always higher in pepper roots than in coffee ones. The reproductive rate in pepper was four times higher than in coffee. There was no difference in nematode reproduction in coffee between the two inoculum sources, coffee and pepper, during 30 months. Pepper proved to be a better host than coffee for the rearing of M. exigua, including those populations unable to reproduce in tomato roots, since pepper plants are easy to manage under green-house conditions and nematode reproduction is faster than in coffee. Therefore, pepper should be used to rear M. exigua since the nematode does not lose its ability to infect coffee.

Keywords: Root-knot nematode, Capsicum annuum, inoculum production, 'Early California Wonder'.

INTRODUÇÃO

Meloidogyne exigua Goeldi, 1887, apesar de não ser a mais agressiva dentre as espécies de nematóides das galhas que parasitam o cafeeiro, provavelmente é a espécie que acarreta os maiores prejuízos à cafeicultura nacional (Gonçalves & Silvarolla, 2001; Silva et al., 2006a). Essa consideração advém de sua disseminação generalizada nos cafezais e uma ampla distribuição geográfica, ocorrendo praticamente em todas as regiões cafeeiras do país (Souza et al., 2000; Gonçalves & Silvarolla, 2001; Krzyzanowski et al., 2001; Lordello et al., 2001; Barbosa et al., 2004a; Campos & Villain, 2005; Oliveira et al., 2005b; Castro et al., 2008), onde constitui um fator limitante para a obtenção de alta produtividade (Barbosa et al., 2004b).

Nos programas de melhoramento que visam à seleção de genótipos resistentes a M. exigua, como o desenvolvido pela parceria Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais e Universidade Federal de Viçosa, há uma demanda de grande quantidade de inóculo na forma de ovos e, ou de juvenis de segundo estádio, uma vez que centenas de progênies são avaliadas simultaneamente.

Essa espécie por ser um patógeno biotrófico, alimenta-se exclusivamente do citoplasma de células vegetais vivas. Portanto, o mesmo necessita de plantas hospedeiras para sua sobrevivência e multiplicação. A sua reprodução em cafeeiro, embora seja o seu hospedeiro-tipo, é baixa e demorada em relação a algumas espécies de plantas (Lima et al., 1985; Oliveira et al., 2005a). O tomateiro, por ser um bom hospedeiro (Oliveira et al., 2005a), é utilizado para a multiplicação de populações deste nematóide em casa de vegetação. Comparativamente, as plantas de tomate apresentam como vantagens a maior rapidez na obtenção da muda e na multiplicação do inóculo. Entretanto, devido à variabilidade fisiológica observada em M. exigua, algumas populações foram incapazes de se reproduzir em tomateiro (Carneiro & Almeida, 2000; Silva et al., 2006a). Assim, seria importante encontrar uma espécie hospedeira alternativa, que permitisse multiplicar também essas populações.

Estudos prévios realizados no laboratório de Nematologia da Universidade Federal de Viçosa demonstraram que plantas de pimentão constituem-se em uma excelente hospedeira para a multiplicação de populações de M. exigua(Silva et al., 2006b). Desde então, esta espécie vegetal é empregada com sucesso nos trabalhos de pesquisa desenvolvidos na instituição. A utilização de plantas de pimentão para a produção de inóculo de M. exigua tem como vantagens a maior rapidez e a facilidade de manutenção das mesmas em casa de vegetação.

Seletividade fisiológica já foi observada em algumas espécies de Meloidogyne, as quais, durante poucas gerações em tomateiro tiveram redução significativa na reprodução em cafeeiro (Carneiro & Jorge, 2001, Oliveira, 2006). Porém, ainda não se tem informações a respeito da ocorrência desse fenômeno em M. exigua . Diante do exposto, objetivou-se comparar a reprodução de populações de M. exigua em plantas de pimentão e cafeeiro, e avaliar a possível ocorrência de seletividade fisiológica depois de sucessivas gerações em pimentão.

MATERIAL E MÉTODOS

Informações gerais

Os ensaios foram conduzidos em casa de vegetação do Departamento de Fitopatologia da Universidade Federal de Viçosa, localizada na região da Zona da Mata de Minas Gerais, com latitude 20º45'14" S e longitude 42º52'53" W.

Foram estudadas cinco populações de M. exigua coletadas em raízes de cafeeiro de diferentes localidades (Tabela 1) de modo a abranger, pelo menos, parte da variabilidade existente nesse patógeno, combinando os fenótipos de esterase e as raças sugeridas para esta espécie (Esbenshade & Triantaphyllou, 1985; Carneiro & Almeida, 2000; Oliveira et al., 2005b; Silva et al., 2007). As populações 1 e 2 não se reproduzem em tomateiro, raça 1, enquanto as demais são capazes de se multiplicar em tomateiro, raça 2. As populações foram identificadas pelo fenótipo de esterase, usando-se a técnica de eletroforese vertical em sistema descontínuo, conforme Ornstein (1964) e Davis (1964). Para a caracterização fisiológica, as populações de M. exigua foram inoculadas nos seguintes hospedeiros: tomateiro 'Santa Cruz Kada', pimentão 'Early California Wonder', cafeeiro 'Catuaí Vermelho IAC 44' e seringueira clone RRIM 600, conforme realizado por Silva et al.(2007). As populações de M. exigua foram multiplicadas em mudas de cafeeiros 'Catuaí Vermelho IAC 44' por um período de aproximadamente um ano.

Os ovos de M. exigua foram extraídos conforme o método de Hussey & Barker (1973) modificado por Boneti & Ferraz (1981). A concentração de ovos foi determinada em câmara de contagem de Peters e a suspensão calibrada para 1000 ovos por mL. Para os testes, mudas de cafeeiro 'Catuaí Vermelho IAC 44' foram preparadas 70 dias antes das mudas de pimentão 'Early California Wonder', devido ao tempo requerido para atingir o estádio adequado para a inoculação. As plantas foram transplantadas para vasos de plástico com capacidade de 2,0 L, contendo uma mistura de solo e areia 2:1 (v/v) previamente esterilizada.

Multiplicação de populações de Meloidogyne exigua em mudas de café e pimentão

Durante o período experimental, as temperaturas médias mínimas e máximas foram de 18,6 e 29,7ºC, respectivamente. A inoculação foi realizada quando as plantas atingiram o estádio de três a quatro pares de folhas completamente desenvolvidas, cerca de 50 dias para o pimentão e 120 dias para o cafeeiro. O inóculo constou de 5.000 ovos por planta, que foram colocados em quatro orifícios de aproximadamente 3 cm de profundidade, eqüidistantes de 1 cm do colo da planta. O experimento foi instalado em delineamento inteiramente casualizado, em esquema fatorial 5x2 (cinco populações x duas espécies de plantas), com oito repetições por tratamento. Decorridos 90 dias da inoculação realizou-se a avaliação do número de galhas (NG) e número de ovos (NO) por sistema radicular. Esta última variável foi utilizada para a determinação do fator de reprodução (FR = Pf/Pi), em que Pf e Pi representam as populações final e inicial do nematóide, respectivamente (Oostenbrink, 1966).

Reprodução de Meloidogyne exigua em cafeeiro, depois de sucessivas gerações em pimentão

Durante o período experimental,as temperaturas médias mínimas e máximas foram de 16,7 e 30,6ºC, respectivamente. A população de M. exigua, coletada em cafeeiro no município de Canaã-MG, foi selecionada para esse estudo. Nessa época, a referida população já era mantida em cafeeiro por aproximadamente um ano. Plantas de café e pimentão foram inoculadas com 5000 ovos por planta e mantidas em casa de vegetação por um período de 30 meses. As plantas de pimentão eram substituídas a cada seis meses, mantendo-se o inóculo original. Em intervalos de 90 dias, durante 30 meses, obtinham-se ovos de M. exigua de café e pimentão, os quais eram inoculados em mudas de café. O nível de inóculo e o estádio de desenvolvimento das mudas foram os mesmos citados anteriormente. A avaliação foi realizada aos 90 dias após a inoculação pela quantificação do número de galhas e de ovos por sistema radicular. O experimento foi instalado em delineamento inteiramente casualizado, com oito repetições por tratamento.

Análise estatística

Os dados foram transformados em √x e submetidos à análise de variância. As médias dos tratamentos foram comparadas pelo teste de Tukey, a 5% de probabilidade, e a análise estatística foi realizada utilizando-se o programa SAEG versão 9.1 (SAEG, 2007).

RESULTADOS

Multiplicação de populações de Meloidogyne exigua em mudas de café e de pimentão

Não houve interação significativa (P>0,05) entre os fatores população do nematóide e espécie hospedeira para as variáveis analisadas. Entretanto, houve diferença (P<0,05) entre os tratamentos quando analisados isoladamente (Tabela 2).

O número de galhas e de ovos foi sempre superior (P<0,05) em plantas de pimentão, independente da população de M. exigua. No cafeeiro, todas as populações apresentaram comportamento reprodutivo semelhante (P>0,05). As populações 1 e 2, que são incapazes de se reproduzir em tomateiro, diferiram entre si (P<0,05) quanto à capacidade reprodutiva em plantas de pimentão, e foram superiores às demais populações. A população de Canaã apresentou maior reprodução do nematóide, com número médio de ovos de 42.398 e 9.610 por sistema radicular de plantas de pimentão e café, respectivamente. O fator de reprodução (FR) em cafeeiro variou de 1,33 a 1,92, enquanto no pimentão esse valor variou de 5,56 a 8,48. A taxa reprodutiva de M. exigua em pimentão chegou a ser mais de quatro vezes superior àquela do cafeeiro (Tabela 2).

Destaca-se o elevado número de galhas em raízes de pimentão comparado às do cafeeiro. Entretanto, observou-se que em plantas de pimentão, grande parte das massas de ovos encontrava-se na superfície das raízes, enquanto no cafeeiro as mesmas desenvolviam-se internamente, como esperado (Figura 1).


Reprodução de Meloidogyne exigua em cafeeiro, depois de sucessivas gerações em pimentão

Não foi observada diferença significativa (P>0,05) na formação de galhas e produção de ovos de M. exigua em cafeeiro, tanto pelo inóculo oriundo do cafeeiro quanto o do pimentão. A população de M. exigua de Canaã manteve sua habilidade reprodutiva no cafeeiro durante as dez avaliações ou 30 meses. Nesse período, o número médio de galhas induzidas nas raízes de cafeeiro 'Catuaí Vermelho IAC 44' foi de 91 e 102 para o inóculo originado de plantas de café e pimentão, respectivamente (Figura 2). O número médio de ovos por sistema radicular foi de 8919 e 9638 para o inóculo multiplicado em plantas de café e pimentão, respectivamente (Figura 3).



DISCUSSÃO

O pimentão demonstrou ser um excelente hospedeiro para a multiplicação de M. exigua. A maior taxa reprodutiva do nematóide, proporcionada por essa planta, se deve, provavelmente, ao rápido desenvolvimento de seu sistema radicular, enquanto o cafeeiro gasta um tempo maior para atingir o mesmo volume de raízes (Lima et al., 1985). O maior volume de raízes, na ocasião da inoculação, aumenta as chances dos juvenis de segundo estádio encontrarem e invadirem as mesmas. Apesar de não ter sido quantificada a massa do sistema radicular, verificou-se que, as plantas de pimentão apresentavam um sistema radicular mais desenvolvido que o cafeeiro, principalmente nos estádios iniciais de desenvolvimento vegetativo.

As populações de M. exigua, provenientes de Canaã MG e Ribeirão Preto SP foram as que induziram o maior número de galhas e produziram mais ovos em raízes de pimentão. Intrigantemente, estas duas populações não se reproduzem em tomateiro (a raça 1, conforme Carneiro & Almeida, 2000). Entretanto, o mecanismo e, ou, a base genética que gera esse tipo de especialização fisiológica ainda é pouco conhecida.

Elevados níveis de variabilidade intraespecífica são comuns nas espécies do gênero Meloidogyne (Caswell & Roberts, 1987). A constatação dessa variação pode ser averiguada pela análise morfológica, citogenética, de padrão izoenzimático e perfis de DNA, além da preferência e capacidade reprodutiva em relação a determinadas plantas hospedeiras (Caswell & Roberts, 1987; Roberts & Thomason, 1989). Relativo à capacidade reprodutiva já foram observadas diferenças intraespecíficas nas principais espécies de Meloidogyne em diversos hospedeiros. Duas populações de M. arenaria variaram quanto à virulência e a capacidade reprodutiva em dois porta-enxertos de videira (Anwar et al., 2000). Anwar et al.(2007) avaliaram a reprodução de quatro populações de M. incognita em seis cultivares de algodoeiro e observaram que houve variação entre as populações em todas as cultivares de algodão quanto ao número de massas de ovos por sistema radicular e de ovos por grama de raiz. Até mesmo em M. javanica, cuja variabilidade é mais restrita que as demais espécies comuns do gênero, há diferenças na virulência em relação às cultivares de pimentão California Wonder e Suryamukhi Green (Khan et al., 2003). Populações que infectaram apenas 'Suryamukhi Green' foram designadas raça 1, e as que infectaram ambas as cultivares raça 2. Essas diferenças quanto à preferência por determinados hospedeiros ou cultivares de uma espécie de planta podem ser explicadas pelo surgimento de populações bem adaptadas. Segundo Castagnone-Sereno (2006), vários eventos são responsáveis por criar variabilidade nos nematóides do gênero Meloidogyne que se reproduzem por partenogênese mitótica, como os rearranjos cromossômicos, os transposons e, principalmente, as mutações. Em M. exigua, que se reproduz por partenogênese meiótica facultativa, pode ocorrer também a reprodução sexual, o que possibilita a recombinação entre cromossomos homólogos (Cook & Evans, 1987).

Em cafeeiro não foi observada tal variabilidade entre as populações do patógeno, provavelmente devido ao cafeeiro ser uma espécie perene, de crescimento inicial lento. O período experimental de 90 dias transcorridos a partir de mudas recém transplantadas, talvez não fosse suficiente para detectar pequenas variações na produção de ovos por tais populações. Em comparação com o cafeeiro, hospedeiro tipo desse patógeno, maiores taxas reprodutivas também já foram demonstradas em plantas daninhas (Lima et al.1985), em cultivares de tomateiro (Ferraz & Santos, 1984) e em outras plantas cultivadas (Oliveira et al., 2005a). Dessas, o tomateiro é preferencialmente escolhido para a multiplicação de inóculo, pois algumas dessas plantas apresentam problemas com a aquisição de sementes e, ou, hábito de crescimento indeterminado, o que inviabiliza o seu cultivo em casa de vegetação. A obtenção de grande quantidade de inóculo de M. exigua a partir de mudas de cafeeiro não é tarefa fácil, pois requer mudas com seis pares de folhas definitivas, o que leva em torno de seis meses para serem produzidas e, pelo menos, mais quatro meses para uma reprodução satisfatória do nematóide (Silva et al., 2006a). Além disso, requer grande espaço em casa de vegetação para acomodação dos vasos, por se tratar de uma planta perene, e necessitar assim, de recipiente com maior volume. Comparativamente, a produção de uma muda de pimentão gasta aproximadamente 50 dias, e com mais 90 dias já é possível obter uma grande quantidade de ovos de M. exigua , como observado no presente estudo. Outra vantagem apresentada pelo pimentão é a sua capacidade de multiplicar as populações que não se reproduzem em tomateiro. Até o presente, todas as populações de M. exigua oriundas de cafeeiro, cerca de 70 analisadas no laboratório de Nematologia da UFV, foram capazes de se reproduzir nesse hospedeiro. Com relação aos aspectos fitossanitários, poucos são os problemas que o pimentão apresenta quando cultivado em casa-de-vegetação. A presença de ácaros é o mais comum, e com menor freqüência pulgões e cochonilha, que são facilmente controlados com uma ou, no máximo, duas pulverizações durante o seu ciclo. O tomateiro, nas mesmas condições, é atacado por vários patógenos e pragas, como a traça do tomateiro, mosca branca, o oídio, mancha de Alternaria e mancha de Cladosporium, dentre outros. Ressaltam-se as duas primeiras pragas, que requerem várias pulverizações com intervalos semanais.

Apenas uma boa planta hospedeira não é suficiente para o sucesso na produção de inóculo. O conhecimento dos fatores que afetam a reprodução do nematóide também é imprescindível. Desses, a temperatura constitui-se no fator abiótico que mais influencia o ciclo de vida dos nematóides (Van Gundy, 1985). Sabe-se que a temperatura ambiente ótima para a reprodução de M. exigua, em mudas de cafeeiro, está em torno de 26ºC e que nessa temperatura a produção de ovos foi 5,7 vezes maior do que a 18ºC (Silva et al., 2006a). Além disso, o controle da umidade do solo também concorre para uma elevada reprodução do patógeno. Mudas de cafeeiro infectadas com M. exigua têm seu desenvolvimento vegetativo prejudicado, em especial, quando a população do nematóide está alta (Rodrigues & Crozzoli, 1995; Di Vito et al., 2000) e as condições ambientais são desfavoráveis (Silva et al., 2006a). No caso de mudas de pimentão, acredita-se que essa redução no crescimento da planta seja ainda maior devido à elevada taxa reprodutiva do nematóide. Portanto, é apropriado inferir que mudas inoculadas não devem ser mantidas por períodos prolongados, em casa de vegetação, enquanto se produz o inóculo. Para minimizar os danos acarretados pelo ataque de M. exigua é recomendado, além da adubação de plantio, uma suplementação com solução nutritiva, como a de Hoagland (Hoagland & Arnon, 1950) a cada 10 dias.

Diferentemente do que ocorre na interação M. exigua cafeeiro, onde a maioria das massas de ovos se encontra dentro das raízes (Mendes et al., 1977; Lima et al., 1985), em pimentão foram observadas bastante massas de ovos externas às mesmas. Essa informação é relevante por ocasião da avaliação de experimentos, pois o índice de massas de ovos pode ser utilizado como uma das variáveis que mede a reprodução do nematóide. Essa por sua vez é mais fácil de ser analisada, pois demanda apenas a coloração das massas gelatinosas com corante específico antes contagem.

A seletividade fisiológica já foi observada em algumas espécies de Meloidogyne, tais como M. paranaensis e M. incognita, as quais, durante poucas gerações em tomateiro tiveram redução significativa na reprodução em cafeeiro (Carneiro & Jorge, 2001; Oliveira, 2006). Este último autor observou que a habilidade reprodutiva de populações de M. incognita em cafeeiro reduziu cerca 95% depois de multiplicada por dois anos e meio em tomateiro. Seleção para virulência ao tomateiro portador do gene Mi, a partir de populações naturalmente avirulentas, ocasionou redução da adaptabilidade ou 'fitness' a tomateiro suscetível, característica avaliada pela taxa de fecundidade do nematóide (Castagnone-Sereno et al., 2007). O termo 'fitness' é definido em fitopatologia, como a capacidade de um determinado organismo sobreviver e reproduzir, ou seja, transmitir seus genes para a próxima geração (Holliday, 2001). Apesar de adaptações fisiológicas ocorrerem com nematóides das galhas, este fenômeno não foi observado com as populações de M. exigua, mesmo quando multiplicadas por 30 meses em plantas de pimentão.

Contudo, o resultado obtido nesses dois anos e meio não descarta a existência de seletividade fisiológica em M. exigua. Considera-se esta hipótese pela existência de uma população dentro dessa espécie que causa sérios prejuízos à cultura da seringueira no Estado do Mato Grosso (Santos et al., 1992; Bernardo et al., 2003). Esta foi incapaz de parasitar o cafeeiro, independente da temperatura, estádio de desenvolvimento da muda e do genótipo de cafeeiro analisado (Silva et al., 2006a, 2007). Devido à sua capacidade de parasitar apenas a seringueira foi denominada 'biótipo seringueira' (Silva et al., 2007). Uma provável explicação é a adaptação fisiológica sofrida por M. exigua ao longo do tempo nessas áreas cultivadas com a cultura (Silva et al., 2007). Considerou-se ser esta uma outra espécie de Meloidogyne, mas, estudos envolvendo análise morfológica, isoenzimática, molecular e citogenética, confirmaram tratar-se de M. exigua (Muniz, 2007).

Mesmo que possa ocorrer seletividade de M. exigua em plantas de pimentão, quando forem multiplicadas por mais de 30 meses, essa não iria interferir na produção de inóculo, já que o período utilizado para esse fim, geralmente não ultrapassa seis meses. Para a manutenção de populações de M. exigua , por mais de seis meses, o ideal é a utilização do cafeeiro, hospedeiro tipo, que dispensa a periódica substituição das plantas, por ser uma cultura perene. Conclui-se que o pimentão 'Early California Wonder' é melhor hospedeiro que o cafeeiro para a multiplicação de inóculo de M. exigua, inclusive, para as populações que não se multiplicam em tomateiro, com as vantagens da rapidez e facilidade de condução das plantas em casa de vegetaçãoAssim, para a produção de grande quantidade de inóculo de M. exigua recomenda-se a utilização do pimentão, uma vez que o nematóide não perde sua habilidade de infectar o cafeeiro.

AGRADECIMENTOS

O primeiro autor agradece a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais - FAPEMIG pela concessão da bolsa de estudo.

Recebido 9 Maio 2008

Aceito 30 Outubro 2008

Autor para correspondência: Rosângela D.L. Oliveira, e-mail: rdlima@ufv.br

TPP 8057

Editor Associado: Regina Maria D.G. Carneiro

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Jan 2009
  • Data do Fascículo
    Out 2008

Histórico

  • Recebido
    09 Maio 2008
  • Aceito
    30 Out 2008
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