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Controle da pinta preta dos frutos cítricos em cultivo orgânico com agentes de biocontrole e produtos alternativos

Biocontrol and alternative products for managing citrus black spot in organic cropping systems

Resumos

Bacillus subtilis, Trichoderma harzianum e leite foram avaliados no controle da pinta preta de laranja 'Pêra' orgânica, nas safras 2004/2005 e 2005/2006. Os tratamentos estudados foram: Bacillus (10(7) e 10(8) ufc/mL), meio de cultura para fermentação de Bacillus, Trichoderma (10(6) conídios/mL), leite (5%) e testemunha (biofertilizante a 3%). Os produtos, exceto biofertilizante (pulverizado mensalmente), foram pulverizados 28, 56, 84, 112, 140 e 168 dias depois da primeira pulverização (08/12/2004 e 09/12/2005, respectivamente). A severidade da doença foi avaliada utilizando escala de notas de 1 a 6 em 50 frutos/repetição. Na safra 2004/2005, as plantas pulverizadas com leite e Bacillus (10(8) ufc/mL) apresentaram maior número de frutos com nota 1 (26,3 e 19,4%, respectivamente) e menor com notas de 3 a 6 (29,8 e 35,6%, respectivamente). Na safra 2005/2006, o maior número de frutos com nota 1 (7,4 e 3,7%) e o menor na faixa de 3 a 6 (64,4 e 71,0%) foram observados nas plantas pulverizadas com leite e Bacillus (10(7) ufc/mL), respectivamente. O índice de doença (ID), na safra 2004/2005, foi de 0,36 para os tratamentos com leite e Bacillus 10(8) ufc/mL, e de 0,43 para o tratamento com biofertilizante. Em 2005/2006, os IDs foram 0,51; 0,53 e 0,53 para os tratamentos leite, Bacillus 10(7) ufc/mL e biofertilizante, respectivamente. As plantas tratadas com Trichoderma apresentaram IDs de 0,47 e 0,58 nas safras 2004/2005 e 2005/2006, respectivamente.

Guignardia citricarpa; mancha preta dos frutos cítricos; controle alternativo; controle biológico; chá de composto


Bacillus subtilis, Trichoderma harzianum, and milk were evaluated in 2004/2005 and 2005/2006 cropping seasons to control citrus black spot in organic systems. The treatments studied were: Bacillus (10(7) and 10(8) cfu/mL), media for the fermentation of Bacillus, Trichoderma (10(6) conidia/mL), milk (5%) and check (compost tea 3%). The products, except compost tea (sprayed monthly), were sprayed at scheduled intervals (28, 56, 84, 112, 140, and 168 days) starting on December 8th, 2004 and December 9th, 2005. Disease severity was evaluated by a six-category scale in 50 fruits. In 2004/2005, plants sprayed with milk and Bacillus (10(8) cfu/mL) did not differ from each other. These treatments presented an increase in the percentage of fruits in class 1 (26.3% and 19.4%, respectively), and a decrease in the percentage of fruits in class 3-6 (29.9% and 35.6%, respectively). In 2005/2006, spraying milk and Bacillus (10(7) cfu/mL) resulted in the highest percentage of fruits in class 1 (7.4 and 3.7%, respectively) and the lowest percentage of fruits in class 3-6 (64.4 and 71.0%, respectively). Plants treated with milk and Bacillus 10(8) cfu/mL had less disease during 2004/2005, with disease index (DI)=0.36, compared to DI of 0.43 for compost tea. In 2005/2006, values of DI in treatments with milk, Bacillus 10(7) cfu/mL and compost tea were 0.51, 0.53, and 0.53, respectively. The values of DI in plants sprayed with Trichoderma were 0.47 and 0.58, respectively for 2004/2005 and 2005/2006.

Guignardia citricarpa; citrus black spot; alternative control; biological control; compost tea


RESEARCH ARTICLE ARTIGO

Controle da pinta preta dos frutos cítricos em cultivo orgânico com agentes de biocontrole e produtos alternativos

Biocontrol and alternative products for managing citrus black spot in organic cropping systems

Eduardo Roberto A. BernardoI; Wagner BettiolII

IDepartamento de Proteção de Plantas, Faculdade de Ciências Agronômicas, Universidade Estadual Paulista - UNESP, 18610-307, Botucatu, SP, Brasil

IIEmbrapa Meio Ambiente, 13820-000, Jaguariúna, SP, Brasil

RESUMO

Bacillus subtilis, Trichoderma harzianum e leite foram avaliados no controle da pinta preta de laranja 'Pêra' orgânica, nas safras 2004/2005 e 2005/2006. Os tratamentos estudados foram: Bacillus (107 e 108 ufc/mL), meio de cultura para fermentação de Bacillus, Trichoderma (106 conídios/mL), leite (5%) e testemunha (biofertilizante a 3%). Os produtos, exceto biofertilizante (pulverizado mensalmente), foram pulverizados 28, 56, 84, 112, 140 e 168 dias depois da primeira pulverização (08/12/2004 e 09/12/2005, respectivamente). A severidade da doença foi avaliada utilizando escala de notas de 1 a 6 em 50 frutos/repetição. Na safra 2004/2005, as plantas pulverizadas com leite e Bacillus (108 ufc/mL) apresentaram maior número de frutos com nota 1 (26,3 e 19,4%, respectivamente) e menor com notas de 3 a 6 (29,8 e 35,6%, respectivamente). Na safra 2005/2006, o maior número de frutos com nota 1 (7,4 e 3,7%) e o menor na faixa de 3 a 6 (64,4 e 71,0%) foram observados nas plantas pulverizadas com leite e Bacillus (107 ufc/mL), respectivamente. O índice de doença (ID), na safra 2004/2005, foi de 0,36 para os tratamentos com leite e Bacillus 108 ufc/mL, e de 0,43 para o tratamento com biofertilizante. Em 2005/2006, os IDs foram 0,51; 0,53 e 0,53 para os tratamentos leite, Bacillus 107 ufc/mL e biofertilizante, respectivamente. As plantas tratadas com Trichoderma apresentaram IDs de 0,47 e 0,58 nas safras 2004/2005 e 2005/2006, respectivamente.

Palavras-chave: Guignardia citricarpa, mancha preta dos frutos cítricos, controle alternativo, controle biológico, chá de composto.

ABSTRACT

Bacillus subtilis, Trichoderma harzianum, and milk were evaluated in 2004/2005 and 2005/2006 cropping seasons to control citrus black spot in organic systems. The treatments studied were: Bacillus (107 and 108 cfu/mL), media for the fermentation of Bacillus, Trichoderma (106 conidia/mL), milk (5%) and check (compost tea 3%). The products, except compost tea (sprayed monthly), were sprayed at scheduled intervals (28, 56, 84, 112, 140, and 168 days) starting on December 8th, 2004 and December 9th, 2005. Disease severity was evaluated by a six-category scale in 50 fruits. In 2004/2005, plants sprayed with milk and Bacillus (108 cfu/mL) did not differ from each other. These treatments presented an increase in the percentage of fruits in class 1 (26.3% and 19.4%, respectively), and a decrease in the percentage of fruits in class 3-6 (29.9% and 35.6%, respectively). In 2005/2006, spraying milk and Bacillus (107 cfu/mL) resulted in the highest percentage of fruits in class 1 (7.4 and 3.7%, respectively) and the lowest percentage of fruits in class 3-6 (64.4 and 71.0%, respectively). Plants treated with milk and Bacillus 108 cfu/mL had less disease during 2004/2005, with disease index (DI)=0.36, compared to DI of 0.43 for compost tea. In 2005/2006, values of DI in treatments with milk, Bacillus 107 cfu/mL and compost tea were 0.51, 0.53, and 0.53, respectively. The values of DI in plants sprayed with Trichoderma were 0.47 and 0.58, respectively for 2004/2005 and 2005/2006.

Keywords: Guignardia citricarpa, citrus black spot, alternative control, biological control, compost tea.

INTRODUÇÃO

A pinta preta dos citros, causada por Guignardia citricarpa Kiely, é responsável por consideráveis perdas em citros cultivados no estado de São Paulo. Causa a queda prematura dos frutos com severas reduções de produtividade. Os sintomas restringem-se ao flavedo, não alterando a qualidade dos frutos, sendo possível sua utilização na produção de suco concentrado (Aguilar-Vildoso et al., 2002). O controle da doença baseia-se na aplicação de fungicidas protetores, sistêmicos ou a mistura deles, associados a óleos minerais ou vegetais (Goes, 2002). Segundo Goes (1998), os melhores resultados são obtidos com intervalos de pulverizações de 50 ou 55 dias com a mistura de fungicidas sistêmicos e protetores, e de 28 dias utilizando somente fungicidas protetores. Entretanto, problemas relacionados ao uso de fungicidas, como o surgimento de isolados de G. citricarpa resistentes a carbendazim (Rodrigues et al., 2007), impactos negativos ao ambiente e restrições de ordem pública e econômica estimulam a busca de novas alternativas de controle de doenças, principalmente pela introdução de agentes de biocontrole e de produtos alternativos. Além disso, para o cultivo orgânico, cuja procura por produtos é crescente, os problemas com essa doença são grandes, havendo necessidade de desenvolvimento de produtos alternativos.

Dentre os microrganismos mais estudados para o controle biológico de doenças encontram-se espécies do gênero Trichoderma e Bacillus subtilis (Ehrenberg) Cohn (Bettiol et al., 1994, 2009; Kupper & Fernandes, 2002; Kupper et al. , 2003; Prasad et al., 2002). Outra opção econômica e de baixo impacto ambiental é o uso de extratos aquosos de matéria orgânica e biofertilizantes. Esses produtos possuem uma complexa e elevada comunidade microbiana, com presença de bactérias e fungos leveduriformes e filamentosos (McQuilken et al., 1994; Elad & Shtienberg, 1994; Yohalem et al., 1996; Tratch & Bettiol, 1997; Kupper et al., 2006). A principal vantagem desta técnica é o custo, pois o agricultor não depende da compra do material, mas sim do aproveitamento de material orgânico disponível na propriedade. O presente trabalho teve por objetivo avaliar o efeito de agentes de controle biológico e de produtos alternativos no controle da pinta preta dos citros em laranja 'Pêra' cultivada no sistema orgânico.

MATERIAL E MÉTODOS

Produtos alternativos

Os agentes de biocontrole foram obtidos da coleção de culturas da Embrapa Meio Ambiente. Para multiplicação de Bacillus subtilis (AP3), a partir de culturas puras mantidas em placas contendo nutriente-ágar (NA), colônias foram raspadas com alça e a suspensão obtida foi transferida para Erlenmeyer contendo 500 mL de Batata-Dextrose (BD). O Erlenmeyer foi mantido em agitação a 180 rpm/min e temperatura ambiente por 72 h. Decorrido esse período, 100 mL do caldo fermentado foram transferidos para outros Erlenmeyers contendo 400 mL de BD, que foram submetidos às mesmas condições descritas. Para a fermentação em maior escala, foi utilizado um fermentador com capacidade de 50 L com injeção de ar, contendo meio constituído de água, melaço de cana-de-açúcar (0,5% v/v), milhocina (0,5% v/v) e fosfato monobásico (0,3% p/v), autoclavado por 40 min a 1,5 atm. Ao meio foi transferida a suspensão da bactéria, anteriormente preparada, na proporção de 10% do volume e mantido sob aeração por 72 h para a fermentação.

Trichoderma harzianum Rifai, isolado T01BA, foi multiplicado em meio sólido (400 g de grãos de arroz e 170 mL de água) previamente autoclavado por 20 min a 120ºC e 1,2 atm em sacos de polipropileno (25 x 35 cm). Após o resfriamento, ao meio foi transferida uma suspensão com 1 x 104 conídios/mL com auxílio de seringa bovina. Após 7 a 10 dias de incubação a 25± 2ºC os sacos de polipropileno contendo o fungo foram acondicionados em câmara fria (3ºC) por até 120 dias.

O biofertilizante foi fornecido pela Microbiol Indústria e Comércio Ltda. (Limeira, SP) (pH=6,5; MO=0,52%; N=1,05%, C/N=<1; P=115 µg/L; K=362 µg/L; Ca=60 µg/L; Mg=75 µg/L; S=400 µg/L; Na=175 µg/L) e analisado quanto à comunidade microbiana. Para tanto, uma amostra foi coletada em garrafa PET esterilizada e mantida a 8±2 oC por 24 h. Da amostra foi retirada uma alíquota de 10 mL e realizada diluição em série em água destilada e esterilizada. As suspensões foram transferidas para placas contendo os meios NA, King B, Martin e amido-caseína-ágar para a quantificação de bactérias totais e Bacillus, Pseudomonas spp., fungos e actinobactérias, respectivamente. No caso específico de Bacillus, as amostras foram submetidas a tratamento térmico a 80ºC por 20 min em banho-maria, antes do plaqueamento.

Controle da pinta preta em cultivo orgânico com os produtos alternativos

O experimento foi conduzido durante as safras 2004/2005 e 2005/2006 em pomar de laranja 'Pêra' enxertada em limão cravo com 20 anos, localizado em Santa Eudóxia, SP, com histórico da pinta preta dos citros e cultivado desde o seu início no sistema orgânico. Para as avaliações, foram utilizadas as mesmas plantas em ambas as safras. Os produtos foram aplicados com pulverizador tratorizado, sendo o volume de calda calibrado para atingir o início do ponto de escorrimento (aproximadamente 12 L/planta). As árvores foram pulverizadas em intervalos de 28 dias, sendo o início em 08/12/2004, para a safra 2004/2005 e 09/12/2005, para a safra 2005/2006, exceto para o tratamento com biofertilizante, que foi mensal, pois é prática rotineira na propriedade e foi considerado o tratamento testemunha no estudo. As concentrações de B. subtilis foram 107 e 108 ufc/mL, a de T. harzianum foi de 106 conídios/mL e a de leite cru foi de 5%. Além desses, foi incluído um tratamento contendo o meio de cultivo utilizado para a fermentação de Bacillus (0,5% de milhocina, 0,5% de melaço e 0,3% de fosfato monobásico). O delineamento experimental foi o inteiramente casualizado com 15 repetições, sendo a parcela representada por uma planta.

As avaliações foram realizadas em 50 frutos coletados ao acaso em cada planta. Esses frutos foram pesados e submetidos à avaliação da severidade, utilizando-se a escala diagramática de Spósito et al. (2004) para mancha dura: 1 - 0,5%; 2- 1,7%; 3 - 5,0%; 4 - 11,5%; 5 - 22,5%; e 6 - 49,0% de área lesionada. Com esses dados foram calculados os índices de doença (ID) utilizando a fórmula (ID=Fv/nX, na qual F = número de frutos; v = nota; n = número total de frutos avaliados; X = número de classes de notas). Além disso, foi calculada a porcentagem de frutos classificados nas classes 1, 2 e de 3 a 6.

Para o ano agrícola 2005/2006 também foi avaliada a decomposição de folhas cítricas, que são a principal fonte de inóculo de G. citricarpa (Baldassari et al. , 2006). A avaliação da taxa de decomposição foi feita pela análise de perda de massa utilizando-se "litter bags", segundo metodologia de Fernandes et al. (2006), modificando-se o diâmetro da malha para 0,5 x 0,5 cm e dimensões de 60 x 40 cm. Em cada "litter bag" foram adicionadas 100 g de folhas cítricas verdes e maduras. Os "litter bags" foram distribuídos sob a projeção das copas de plantas adultas, simulando a queda natural do material formador da serapilheira. Os "litter bags", fixados ao solo com auxílio de grampos metálicos, foram instalados em 08/12/2005 e coletados aos 60, 120 e 180 dias. Após a coleta, o conteúdo dos "litter bags" foi seco em estufa de circulação de ar forçada (65±5°C) até atingir peso constante. Em laboratório o conteúdo foi examinado para retirada de partículas de solo e, posteriormente, sua massa foi determinada. A taxa de decomposição da serapilheira foi quantificada mediante avaliação de medida da perda de massa (Fernandes et al., 2006), com a seguinte fórmula: Massa remanescente (%) = (massa final/massa inicial) x 100. Os dados foram submetidos à análise de variância e as médias foram comparadas pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade, utilizando-se o programa SAS (2002). Análise de regressão foi utilizada para a decomposição de folhas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A comunidade microbiana encontrada nos biofertilizantes é variável e depende do processo (aeróbio ou anaeróbio) e do substrato utilizado na sua produção. O biofertilizante apresentou a carga microbiana composta principalmente por bactérias (3 x 106 ufc/mL), sendo na sua maioria Bacillus spp. (3,2 x 105 ufc/mL), Pseudomonas spp. (1,5 x 104 ufc/mL) e, em menor escala, actinobactérias (1,1 x 102 ufc/mL), que são organismos estudados para o controle biológico de diversas doenças de plantas (Janisiewicz & Jeffers, 1997; Sales Júnior et al., 2007). Os dados populacionais encontrados no biofertilizante diferem dos encontrados por Kupper et al. (2006), que comparando dois biofertilizantes, encontraram populações de bactérias totais da ordem de 1,29 x 105 ufc/mL e Bacillus spp. de 3,6 x 104 ufc/mL. A comunidade de fungos do biofertilizante foi de 5,5 x 105 ufc/mL.

Os valores de ID calculados para as safras 2004/2005 e 2005/2006 foram, respectivamente, para as plantas pulverizadas com B. subtilis 107 (0,40 e 0,53), B. subtilis 108 (0,36 e 0,57), T. harzianum (0,47 e 0,58), meio de cultura para fermentação de Bacillus (0,43 e 0,57), biofertilizante=testemunha (0,43 e 0,53) e o leite (0,36 e 0,51) (Figura 1AB). Considerando que Kupper et al. (2006) verificaram ID=0,217 para o controle da pinta preta nas árvores pulverizadas com oxicloreto de cobre + carbendazim + mancozeb pode-se considerar que os produtos testados foram pouco eficientes no controle da doença. Entretanto, deve ser considerado que não existe tratamento padrão para o controle da doença em cultivo orgânico. Para a safra 2004/2005, os tratamentos com Bacillus (108 ufc/mL) e leite (5%), apesar de não diferirem estatisticamente do tratamento com biofertilizante, utilizado como testemunha no estudo, apresentaram menor ID que o tratamento com T. harzianum (Figura 1). Por outro lado, na safra 2005/2006 apenas o tratamento com leite diferiu do com Trichoderma.


As plantas pulverizadas com leite e Bacillus (108 ufc/mL) apresentaram, na safra 2004/2005, as maiores porcentagens de frutos pertencentes à nota 1 (26,4 e 19,5%, respectivamente) e as menores porcentagens pertencentes às notas de 3 a 6 (29,8 e 35,6%, respectivamente). Por outro lado, o tratamento testemunha com biofertilizante apresentou 11,0 e 50,8%, respectivamente (Figura 2A), diferindo estatisticamente do tratamento com leite quando considerada a nota 1 e a faixa de notas de 3 a 6. Na safra 2005/2006, as plantas pulverizadas com leite ou Bacillus (107 ufc/mL) apresentaram as maiores porcentagens de frutos pertencentes à nota 1 (7,4 e 3,7%, respectivamente) e as menores porcentagem pertencentes às notas de 3 a 6 (64,4 e 71,0%, respectivamente) (Figura 2B). Nessa safra, o tratamento testemunha com biofertilizante apresentou 2,3 e 76,7% de frutos com notas 1 e de 3 a 6, respectivamente, diferindo estatisticamente do tratamento com leite quando considerada a nota 1. Nas duas safras, as plantas pulverizadas com Trichoderma apresentaram a menor porcentagem de frutos com a nota 1 e a maior com frutos nas classes de 3 a 6 (64,3 e 87,7%, respectivamente) (Figura 2B).


Apesar dos IDs do tratamento com leite não terem sido reduzidos significativamente nas duas safras em relação ao tratamento testemunha com biofertilizante (Figura 1 A-B), os IDs foram inferiores aos demais tratamentos. Dessa forma, e considerando que no tratamento com leite houve um aumento significativo na porcentagem de frutos com nota 1, nas duas safras, em relação aos demais tratamentos (Figura 2 A-B), esse é o primeiro relato do efeito desse produto em um patossistema não envolvendo oídio, pois o leite é apenas recomendado para o controle de oídio (Bettiol et al., 1999). Assim, há necessidade da realização de mais estudos com esse produto alternativo, inclusive para entender o seu modo de ação. Se for confirmada a eficiência do leite, esse produto apresenta ampla possibilidade de uso, pois a região citrícola do estado também é produtora expressiva de leite. Aliado a isso, poderiam ser testados os subprodutos da indústria láctea. Ainda seria importante que o leite e o Bacillus fossem testados em conjunto visando ao manejo da doença em sistema orgânico.

O fato de T. harzianum não ter sido eficiente no controle da doença indica que o fungo, originado do solo, não se adaptou ao ambiente da parte aérea das plantas ou que o isolado avaliado não é eficiente para o patossistema testado. B. subtilis tem se mostrado eficiente no controle de vários patógenos que ocorrem no filoplano, inclusive com diversos produtos comerciais disponíveis no mercado mundial (Bettiol et al., 2009). Segundo Knudsen & Spurr Jr. (1986), a habilidade de bactérias formadoras de esporos permanecerem metabolicamente dormentes por longos períodos, aumenta sua sobrevivência na superfície foliar, possibilitando sua permanência em períodos secos, em temperaturas extremas e na deficiência temporária de nutrientes. Tal fato, provavelmente tenha colaborado para a eficiência de B. subtilis (108 ufc/mL) no controle da pinta preta na safra 2004/2005. Kupper et al. (2006) relatam que na África do Sul é comercializado um isolado de B. subtilis para o controle da pinta preta dos frutos cítricos, sendo esse o único relato de um produto biológico para o controle dessa doença. Além disso, Kupper et al. (2003) relataram que, em condições naturais, B. subtilis equiparou-se estatisticamente ao fungicida benomyl, proporcionando a menor porcentagem de flores com sintomas da queda prematura de frutos cítricos causada por Colletotrichum acutatum.

Em áreas de ocorrência da pinta preta, a decomposição das folhas cítricas caídas ao solo é de extrema importância, haja vista que dependendo da umidade, época do ano e do estádio de decomposição foliar, há liberação dos ascósporos, que é a principal fonte de inóculo do patógeno (Baldassari et al., 2006). Segundo Swift et al. (1979) e Aerts (1997), os três principais fatores que influenciam a decomposição, em ordem de importância, são as condições climáticas, composição química das folhas e os organismos presentes no solo, que são determinados pelo microclima. Neste trabalho, a taxa de decomposição manteve-se estável durante o período de avaliação, não sendo observadas diferenças estatísticas entre os tratamentos. Nos primeiros 60 dias, a degradação da massa foliar foi mais rápida, mantendo-se contínua até o final das avaliações (Figura 3).


A aplicação de leite e B. subtilis, apesar da eficiência de controle inferior às apresentadas para os fungicidas (Kupper et al., 2006), pode ser útil para o controle da pinta preta dos citros em sistema de produção orgânico. Para tanto, há necessidade de adequar principalmente à época de início, bem como a frequência das pulverizações, pois são produtos de contato e de baixa persistência no ambiente. Entretanto, existem evidências na literatura de potencial de uso de B. subtilis para plantas de ciclo longo e com doença que ocorre ao longo do período, como por exemplo, o controle da sigatoka-negra da bananeira e da antracnose em manga com um produto à base de B. subtilis (Edgecomb & Manker, 2008).

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq pela concessão de bolsa de estudo e bolsa de produtividade, respectivamente.

Recebido 17 Abril 2008

Versão Corrigida recebida em 24 Setembro 2009

Aceito 22 Fevereiro 2010

Autor para correspondência: Wagner Bettiol, e-mail: bettiol@cnpma.embrapa.br

Editor de Seção: Marciel J. Stadnik

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Abr 2010
  • Data do Fascículo
    Fev 2010

Histórico

  • Revisado
    24 Set 2009
  • Recebido
    17 Abr 2008
  • Aceito
    22 Jan 2010
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