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Caracterização de populações de Ralstonia solanacearum Smith em tabaco (Nicotiana tabacum L.) no Brasil

Characterization of Ralstonia solanacearum Smith populations in tobacco (Nicotiana tabacum L.) from Brazil

Resumos

Ralstonia solanacearum, agente causal da murcha bacteriana em diversas famílias de plantas, entre elas as solanáceas, causa grandes prejuízos na cultura do tabaco, se não manejada. Por se tratar de espécie complexa, esta bactéria é classificada de diversas formas. A mais recente divide a espécie em três níveis taxonômicos: filotipo, sequevar e clone. Devido à ausência de estudos sobre as populações de R. solanacearum na cultura do tabaco, este trabalho teve como objetivo caracterizar 120 isolados oriundos de solos e plantas de tabaco com murcha bacteriana, coletados em 13 municípios do Paraná, 24 de Santa Catarina, 13 do Rio Grande do Sul, um da Paraíba e dois de Pernambuco, em biovar, filotipo e por diversidade genética através das sequências repetitivas BOX, ERIC e REP (rep-PCR). Os resultados indicaram que todos os isolados estudados pertencem à biovar 1 e filotipo II. Embora tenha sido constatada homogeneidade quanto à biovar e ao filotipo, os resultados da rep-PCR permitiram a divisão dos isolados em seis grupos (A, B, C, D, E e F), a partir de 61% de similaridade, independente da origem geográfica, tipo de amostra, época de coleta e cultivar. Os grupos A e B foram os que tiveram maior número de representantes, 47 e 20 linhagens clonais, respectivamente. O conhecimento da variabilidade populacional de R. solanacearum, assim como da virulência dos diferentes isolados, pode auxiliar no sucesso de programas de melhoramento genético e de manejo integrado da doença.

biovar; filotipo; murcha bacteriana; rep-PCR


Ralstonia solanacearum, causal agent of bacterial wilt on different hosts, including members of Solanaceae, causes severe losses in tobacco crop, if not managed. It is a complex species and classified in several ways. Lately, the species was divided into three taxonomic levels: phylotype, sequevar and clone. Due to the lack of studies on populations of R. solanacearum in tobacco, this research aimed to characterize 120 isolates from soil and wilted tobacco plants, from 13 counties from Paraná, 24 from Santa Catarina, 13 from Rio Grande do Sul, one from Paraíba and two from Pernambuco, by biovar, phylotype, and by using repetitive polymerase chain reaction (rep-PCR) element (BOX, ERIC and REP) primers. The results indicated that all isolates belong to the biovar 1 and phylotype II. Although there was homogeneity regarding biovar and phylotype, the results of rep-PCR allowed the formation of six groups (A, B, C, D, E and F) from 61% of similarity, regardless of sample type, geographical origin, collecting date or cultivar. Groups A and B were those that had the greatest number of isolates, 47 and 20 clonal lines, respectively. Knowledge regarding R. solanacearum population variability as well as the virulence of different isolates may help in the success of breeding programs and integrated disease management.

bacterial wilt; biovar; phylotype; rep-PCR


RESEARCH ARTICLE ARTIGO

Fernanda Carvalho VianaI; Irving Joseph BergerI; Valmir DuarteII

IPesquisa e Tecnologia de Fumo, Souza Cruz S.A., 92430-230, Cachoeirinha, RS, Brasil

IIDepartamento de Fitossanidade, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 91540-000, Porto Alegre, RS, Brasil

RESUMO

Ralstonia solanacearum, agente causal da murcha bacteriana em diversas famílias de plantas, entre elas as solanáceas, causa grandes prejuízos na cultura do tabaco, se não manejada. Por se tratar de espécie complexa, esta bactéria é classificada de diversas formas. A mais recente divide a espécie em três níveis taxonômicos: filotipo, sequevar e clone. Devido à ausência de estudos sobre as populações de R. solanacearum na cultura do tabaco, este trabalho teve como objetivo caracterizar 120 isolados oriundos de solos e plantas de tabaco com murcha bacteriana, coletados em 13 municípios do Paraná, 24 de Santa Catarina, 13 do Rio Grande do Sul, um da Paraíba e dois de Pernambuco, em biovar, filotipo e por diversidade genética através das sequências repetitivas BOX, ERIC e REP (rep-PCR). Os resultados indicaram que todos os isolados estudados pertencem à biovar 1 e filotipo II. Embora tenha sido constatada homogeneidade quanto à biovar e ao filotipo, os resultados da rep-PCR permitiram a divisão dos isolados em seis grupos (A, B, C, D, E e F), a partir de 61% de similaridade, independente da origem geográfica, tipo de amostra, época de coleta e cultivar. Os grupos A e B foram os que tiveram maior número de representantes, 47 e 20 linhagens clonais, respectivamente. O conhecimento da variabilidade populacional de R. solanacearum, assim como da virulência dos diferentes isolados, pode auxiliar no sucesso de programas de melhoramento genético e de manejo integrado da doença.

Palavras-chave: biovar, filotipo, murcha bacteriana, rep-PCR.

ABSTRACT

Ralstonia solanacearum, causal agent of bacterial wilt on different hosts, including members of Solanaceae, causes severe losses in tobacco crop, if not managed. It is a complex species and classified in several ways. Lately, the species was divided into three taxonomic levels: phylotype, sequevar and clone. Due to the lack of studies on populations of R. solanacearum in tobacco, this research aimed to characterize 120 isolates from soil and wilted tobacco plants, from 13 counties from Paraná, 24 from Santa Catarina, 13 from Rio Grande do Sul, one from Paraíba and two from Pernambuco, by biovar, phylotype, and by using repetitive polymerase chain reaction (rep-PCR) element (BOX, ERIC and REP) primers. The results indicated that all isolates belong to the biovar 1 and phylotype II. Although there was homogeneity regarding biovar and phylotype, the results of rep-PCR allowed the formation of six groups (A, B, C, D, E and F) from 61% of similarity, regardless of sample type, geographical origin, collecting date or cultivar. Groups A and B were those that had the greatest number of isolates, 47 and 20 clonal lines, respectively. Knowledge regarding R. solanacearum population variability as well as the virulence of different isolates may help in the success of breeding programs and integrated disease management.

Key words: bacterial wilt, biovar, phylotype, rep-PCR.

INTRODUÇÃO

A cultura do tabaco (Nicotiana tabacum L.) é uma das atividades agrícolas de maior importância econômica e social no Brasil. Dados da AFUBRA (2010) mostram que a cultura é predominante na região Sul, contribui com 96% da produção de tabaco no país, está presente em 730 municípios, envolve 186 mil famílias de pequenos agricultores no Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Trata-se de uma das culturas mais rentáveis para o pequeno agricultor. O Brasil é o maior exportador de tabaco desde 1993 e o segundo maior produtor, perdendo a primeira posição para a China. Na safra 2008/2009, a produtividade alcançou 744 mil toneladas oriundas de 374 mil ha, empregando direta e indiretamente mais de 2,5 milhões de pessoas, sendo 1,1 milhão no meio rural. As propriedades, com 16,1 ha em média, utilizam o equivalente a 15% da área para o plantio de tabaco, sendo a cultura responsável por 65% da renda das famílias. O lucro gerado pela cultura na última safra foi de R$ 4,3 bilhões, 13% maior que na safra 2007/2008 (Afubra, 2010).

Apesar do aumento dos volumes de produção ao longo dos anos, muitas lavouras de tabaco são perdidas em decorrência de doenças, principalmente a murcha bacteriana, causada por Ralstonia solanacearum Smith (Yabuuchi et al., 1995). Não existem no Brasil dados de perdas causadas pela doença em tabaco, porém em alguns municípios da Carolina do Sul (EUA) aproximadamente 95% das lavouras apresentaram a doença em 1998, comprometendo a safra em 7%. No mesmo ano, as perdas econômicas na Carolina do Norte e Carolina do Sul foram estimadas em 40 milhões de dólares. Perdas médias de 10 a 30% de produtividade em tabaco também foram estimadas na Austrália (Elphinstone, 2005).

A bactéria possui ampla gama de hospedeiros, incluindo mais de 200 espécies botânicas (Hayward, 1991). Além disso, R. solanacearum é endêmica em regiões tropicais, subtropicais e temperadas, limitando o cultivo de diversas culturas (Genin & Boucher, 2002), pois pode permanecer no solo por vários anos (Denny, 2006).

Ralstonia solanacearum é considerada uma espécie complexa, por apresentar variabilidade fenotípica e genética dentro da própria espécie (Gillings & Fahy, 1994). A caracterização de isolados de R. solanacearum em raças (Buddenhagen et al., 1962) e biovares (Hayward, 1964) ainda é amplamente utilizada e adotada como padrão de rotina por diversos laboratórios. Recentemente, Fegan & Prior (2005) propuseram uma nova classificação baseada em quatro níveis taxonômicos: espécie, filotipo, sequevar e clone, a qual tem sido bastante aceita pela comunidade científica.

Estudos epidemiológicos e de caracterização têm sido realizados com as solanáceas no Brasil, principalmente com a batata no sul do Brasil (Silveira et al., 2005) e com o tomate na Amazônia (Coelho-Neto et al., 2004, Costa et al., 2007). Devido à complexidade do patógeno, diversas técnicas moleculares têm sido utilizadas para estudo da diversidade genética de populações de R. solanacearum, entre elas a PCR de sequências repetitivas (rep-PCR), compreendidas pelos elementos BOX, ERIC e REP (Jaunet & Wang, 1999; Kumar et al., 2004; Silveira et al., 2005; Costa et al., 2007; Ivey et al., 2007).

No Brasil, para a cultura do tabaco, ainda não existem dados sobre a diversidade populacional de R. solanacearum. Devido ao difícil controle da bactéria, práticas de manejo têm sido adotadas para controlar a doença, tais como época adequada de plantio, manejo do solo e introdução de cultivares tolerantes. Neste cenário, o presente trabalho teve como objetivo caracterizar isolados de R. solanacearum oriundos de plantas de tabaco ou solo de lavouras com histórico da doença na cultura, em biovar, filotipo e diversidade genética.

MATERIAL E MÉTODOS

Os ensaios foram realizados no Laboratório de Fitopatologia e Microbiologia (LFM) da Souza Cruz S.A., Cachoeirinha, RS.

Isolados de Ralstonia solanacearum

Cento e vinte isolados de R. solanacearum da coleção do LFM, obtidos de 1988 a 2010, provenientes de lavouras de tabaco do Paraná (PR), Santa Catarina (SC), Rio Grande do Sul (RS), Pernambuco (PE) e Paraíba (PB), de solos e de plantas com sintomas de murcha foram utilizados (Tabela 1). Os isolados de 1 a 23 são oriundos do PR, de 24 a 97 de SC, de 98 a 117 do RS, 118 e 119 de PE e o isolado 120 da PB. Um isolado de tomate, oriundo do RS, foi utilizado, assim como três linhagens-padrão adquiridas da coleção do Instituto Biológico: IBSBF66 (tomate/biovar 3), IBSBF133 (batata/biovar 2) e IBSBF350 (batata/biovar 1). Os isolados foram recuperados em meio de cultura SPA (20 g de sacarose, 5 g de peptona e 18 g de agar por litro de água destilada), contendo 0,005% de cloreto de 2,3,5 trifeniltetrazólio (TTC), a 28ºC por 48 h. Colônias fluidas e de centro avermelhado foram utilizadas nos testes posteriores.

Determinação de biovar

Os isolados foram cultivados em meio de cultura Kelman (1954) a 28°C por 24 h. Posteriormente, 50 µL da suspensão de células de cada isolado (108 células/mL) foram transferidos para o meio basal para determinação de biovares (Schaad et al., 2001), contido em placas separadas 1% dos carboidratos celobiose, lactose ou maltose esterilizados em filtro de 0,2 µm e ainda 1% dos álcoois dulcitol, manitol ou sorbitol, previamente autoclavados a 110°C por 20 min. O meio basal sem os carboidratos foi utilizado como controle negativo. As placas foram incubadas a 28°C e as avaliações realizadas após 5, 7, 12 e 20 dias. A capacidade do isolado em utilizar a fonte de carbono foi considerada positiva quando a cor do meio mudou de verde-oliva para amarela. Linhagens-padrão da biovar 1, 2 e 3, adquiridas do Instituto Biológico, serviram de controle positivo. Todas as análises foram realizadas em triplicata.

Extração de DNA

O DNA dos isolados foi extraído por lise alcalina. Uma colônia típica de cada isolado foi cultivada em meio LB (10 g de triptona, 5 g de extrato de levedura e 10 g de NaCl por litro de água destilada, sendo o pH ajustado para 7,0 com NaOH 1 N) por 24 h a 28°C. Após o período de incubação, 1,5 mL da cultura foi transferido para um microtubo, que foi centrifugado a 5000 g por 3 min. O sobrenadante foi descartado e o procedimento anterior foi repetido. O sedimento foi ressuspendido em 100 µL de tampão TE (10 mM Tris-HCl, 1 mM EDTA, pH 8,0) 1 mM e agitado em vortex, acrescido, em seguida, de 100 µL do tampão de lise (0,2 N NaOH, 1% SDS). O microtubo foi agitado de três a quatro vezes por inversões suaves e, posteriormente, ficou em descanso por 5 min. Foram acrescentados 300 µL da solução de neutralização (acetato de amônio 7,5 M) e, em seguida, foi realizada a centrifugação a 12000 g por 5 min. Todo o sobrenadante foi transferido para um novo microtubo. Foram acrescentados dois volumes de etanol 95%, seguindo-se centrifugação a 12000 g por 15 min e sendo o sobrenadante descartado. Foi adicionado 1,0 mL de etanol 70% e centrifugado a 12000 g por 5 min. O sobrenadante foi novamente descartado e o DNA extraído foi seco ao ar por 2 h. O DNA foi solubilizado em tampão TE contendo RNAse (20 µg/mL) e mantido a -20°C.

Confirmação da identidade de Ralstonia solanacearum

O DNA dos isolados de R. solanacearum foi diluído 1:10 em água milli-Q esterilizada e submetido à PCR com os oligonucleotídeos iniciadores OLI1 (5' GGGGGTAGCTTGCTACCTGCC 3') e Y2 (5' CCCACTGCTGCCTCCCGTAGGAGT 3') (Seal et al., 1993). A reação foi realizada em um volume final de 20 µL (tampão (20 mM Tris pH 8,4; 50 mM KCl), 1 X; oligonucleotídeos 1,0 µM; MgCl2, 2,0 mM; dNTPs, 0,25 mM; Taq DNA polimerase, 1 U/reação (Invitrogen); DNA, 1,0 µL) em termociclador TECHNE (TC-312), nas seguintes condições: 94°C/2 min, 30 X (94°C/45 s, 68°C/20 s, 72°C/20 s), 72°C/10 min, tendo a água Milli-Q esterilizada como controle negativo. Os produtos da PCR foram separados em gel de agarose 1,5% (Invitrogen) com TBE 0,5 X contendo 10 µL de SYBR Safe (Invitrogen), submetidos à eletroforese a 4 V/cm por 2 h, visualizados sob luz ultravioleta e fotografado posteriormente.

Filotipagem

O DNA dos isolados foi submetido à PCR-multiplex de acordo com Fegan & Prior (2005) sem os oligonucleotídeos 759/760, universais para R. solanacearum, em um volume final de 20 µL (tampão (20 mM Tris pH 8,4; 50 mM KCl), 1 X; MgCl2, 1,5 mM; dNTPs, 0,25 mM; oligonucleotídeos (Tabela 2); Taq DNA polimerase, 2 U/reação (Invitrogen); DNA diluído 1:10, 1,0 µL), nas seguintes condições: 96°C/5 min, 30 X (94°C/15 s; 59°C/30 s; 72°C/30 s), 72°C/10 min, tendo a água Milli-Q esterilizada como controle negativo. Os produtos da PCR foram separados conforme descrito na confirmação de identidade de R. solanacearum.

Diversidade genética de Ralstonia solanacearum

A PCR para cada sequência repetitiva - BOX, ERIC e REP - utilizou os oligonucleotídeos descritos por Versalovic et al. (1994), em um volume final de 20 µL para cada sequência (tampão (20 mM Tris pH 8,4; 50 mM KCl), 1 X; MgCl2, 1,5 mM (ERIC e REP) e 2,0 mM (BOX); dNTPs, 0,25 mM; oligonucleotídeos, 50 pmol; Taq DNA polimerase, 2 U/reação (Invitrogen); e DNA diluído 1:10, 1,0 µL), nas seguintes condições: 95°C/7 min, 30 X (94°C/1 min; 53°C (BOX), 52°C (ERIC) e 44°C (REP)/1 min; 65°C/8 min), 65°C/16 min. A água Milli-Q esterilizada foi utilizada como controle negativo. Os produtos da PCR foram separados conforme descrição anterior, exceto o tempo de corrida, que foi de 4,5 h.

Análise filogenética

Os perfis resultantes da amplificação por rep-PCR foram analisados através das bandas formadas entre 300 e 1500 pb no gel de agarose, sendo estimadas visualmente. Matrizes de presença-ausência foram construídas baseadas nas bandas formadas e posteriormente analisadas pelo programa NTSYS, versão 2.1. Os coeficientes de similaridade para as combinações geradas foram determinados pelo coeficiente de similaridade de Dice (1945) usando o programa SIMQUAL e o agrupamento pelo método UPGMA (Unweight Pair Group Method with Arithmetic Average) para a construção do dendograma dos isolados.

RESULTADOS

Determinação de biovar

Independente da cultivar, tipo de amostra ou origem geográfica, os 120 isolados foram identificados como biovar 1. O isolado de tomate oriundo do RS, também foi caracterizado como biovar 1.

Filotipagem

Os 120 isolados de R. solanacearum, oriundos do PR, SC, RS, PE e PB, foram identificados como filotipo II, de origem americana (Figura 1). A banda de 372 pb, esperada para estirpes do filotipo II (Fegan & Prior, 2005), foi obtida por PCR-multiplex para todos os isolados de tabaco deste estudo, incluindo as estirpes IBSBF133, IBSBF350 e o isolado Tomate. Uma exceção foi observada para a estirpe IBSBF66, cujo produto foi uma banda de 144 pb, esperada para estirpes de origem asiática, filotipo I.


Diversidade genética de Ralstonia solanacearum

O DNA dos isolados de R. solanacearum foi amplificado por PCR utilizando os oligonucleotídeos iniciadores para as sequências repetitivas BOX, REP e ERIC, produzindo múltiplos produtos, com tamanhos variando de 300 a 1500 pb, e gerando diferentes perfis genéticos na população. Uma planilha binária foi construída utilizando os três elementos individualmente e conjuntamente para a construção de dendogramas, sendo: seis fragmentos de BOX (750, 800, 900, 1000 e 1100 pb), 10 de REP (500, 580, 720, 950, 970, 1050, 1150, 1250, 1350 e 1500 pb) e 10 de ERIC (300, 330, 350, 400, 450, 600, 900, 1000, 1050 e 1100 pb), totalizando 26 fragmentos informativos. Dendogramas individuais e em conjunto geraram padrões similares de variabilidade. Para facilitar a análise dos dados e a interpretação dos resultados, isolados com similaridade maior ou igual a 97% foram considerados linhagens clonais. As 74 linhagens clonais geradas foram representadas por um único isolado no dendograma conjunto - fragmentos informativos de BOX, REP e ERIC - com o número total de isolados representados entre parênteses, assim como as estirpes padrão e o isolado Tomate (Figura 2).


Através da análise dos fragmentos obtidos por rep-PCR, os isolados foram separados em seis grupos: A, B, C, D, E e F, a partir de 61% de similaridade (Figura 2). Dois grandes grupos foram formados, A e B, sendo que o grupo A foi representado por 47 linhagens clonais e o grupo B representado por 20. O grupo E, composto pelos isolados 41, 117, 120 e IBSBF350, foi o que apresentou maior variação genotípica em relação aos demais grupos, com 52% de similaridade. Os dois isolados de tomate (Tomate e IBSBF66) não ficaram agrupados, ficando nos grupamentos C e F, respectivamente, resultado coerente com a natureza distinta de biovar e filotipo dos isolados em questão.

DISCUSSÃO

A ocorrência das biovares 1 e 3 de R. solanacearum em tabaco já havia sido relatada anteriormente no Rio Grande do Sul (RS) e na Bahia (BA), respectivamente (Duarte et al., 2003). A biovar 1 tem sido registrada com frequência na região Sul, em estudos na cultura da batata (Lopes et al., 1993; Silveira et al., 2005; Maciel et al., 2004). No Brasil, estudos já haviam revelado a predominância da biovar 1 em outras hospedeiras nas regiões Norte, Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste, onde predomina clima quente (Reifschneider & Takatsu, 1985). A biovar 1 tem inviabilizado cultivos irrigados de tomate e batata no Centro-Oeste (Elphinstone, 2005), assim como em viveiros clonais de eucalipto nos estados do Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais e Pará (Alfenas et al., 2006). Há registros na Amazônia das biovares 1 e 3 devastando cultivos de tomate (Coelho-Netto et al., 2003). A predominância da biovar 1 também foi verificada em jiló e berinjela. As biovares 3 e 2T também já foram relatadas em pimentas e tomate na Amazônia, porém com menor frequência. Em batata, 80 isolados originários dos municípios de São Lourenço do Sul e Pelotas foram caracterizados na sua totalidade como biovar 2 (Silveira et al., 2005). Embora esses municípios também sejam produtores de tabaco, a presença da biovar 2 não foi detectada entre os isolados oriundos de amostras de solo dessa região no presente trabalho.

A homogeneidade em relação à biovar entre os isolados de R. solanacearum de tabaco na Coréia também foi confirmada (todos da biovar 3) (Jeong et al., 2007). Na China, as biovares 3 e 4 foram identificadas em tabaco (Xu et al., 2009). Por outro lado, a biovar 1 é predominante em tabaco e tomate no sudeste dos EUA (Denny & Hayward, 2001).

Apesar de todos os isolados de tabaco estudados pertencerem à biovar 1, não significa que esses isolados sejam geneticamente iguais, conforme mostrado pelos resultados de rep-PCR ou tenham o mesmo padrão de virulência, o que poderá ser esclarecido em trabalhos futuros. A classificação em biovares ainda é utilizada como forma de caracterização de R. solanacearum, porém sistemas de classificação baseados na caracterização fenotípica têm se mostrado inconsistentes (Alvarez, 2005; Champoiseau, 2010).

A filotipagem proposta por Fegan & Prior (2005) caracteriza as estirpes de R. solanacearum quanto à origem geográfica de forma ampla, por continentes. Todos os isolados de tabaco foram pertencentes ao filotipo II, que agrupa estirpes das biovares 1, 2 e 2T. Embora não tenham sido encontradas estirpes do filotipo I entre os isolados estudados, o registro da ocorrência da biovar 3 em tabaco cultivado em Cruz das Almas, BA (Duarte et al., 2003) não exclui essa possibilidade, pois o filotipo I inclui todas as estirpes pertencentes às biovares 3, 4 e 5, isoladas primeiramente da Ásia (Fegan & Prior, 2005).

Estudos similares mostraram que a filotipagem foi importante para distinguir isolados oriundos de outras localidades em países como EUA e Irã. A biovar 3, pertencente ao filotipo I, foi identificada entre isolados de plantas ornamentais nos EUA. Comparando os isolados encontrados a outros já caracterizados, foi verificada a semelhança com um isolado de Martinica, na América Central. A ocorrência desse isolado nos EUA é rara e isso pode ser atribuído à entrada do patógeno através de hospedeiros assintomáticos (Norman et al., 2009). A ocorrência da biovar 2T, filotipo II em cultivos de batata fora do continente americano, foi relatada pela primeira vez no Irã (Nouri et al., 2009). Ainda não se sabe como esse isolado foi introduzido no país, uma vez que a batata-semente é importada da Alemanha e dos Países Baixos, locais onde não há relato desta biovar (Nouri et al., 2009).

No estudo da diversidade genética através da rep-PCR, o dendograma formado mostrou que não houve correlação entre os isolados estudados quanto à origem geográfica, tipo de amostra ou época de coleta com os agrupamentos formados. Resultado semelhante foi relatado por Costa et al. (2007), em que isolados de diversos hospedeiros na Amazônia foram estudados. Nesse relato, a análise de BOX-PCR foi empregada, revelando alto grau de polimorfismo entre os isolados divididos em cinco agrupamentos, porém sem correlação com o hospedeiro, biovar, ecossistema ou local de coleta. Os isolados caracterizados como biovar 1 estavam presentes em quatro dos cinco grupos formados, o que pode ser atribuído ao fato de a biovar 1 possuir maior gama de hospedeiros e ser mais competitiva no solo (Costa et al., 2007).

A rep-PCR tem sido empregada com sucesso em estudos de variabilidade genética de R. solanacearum, distinguindo isolados de diferentes origens geográficas, biovares e hospedeiras (Horita & Tsuchiya, 2000; Kumar et al., 2004; Horita et al., 2005; Silveira et al., 2005; Costa et al., 2007). Através das sequências BOX e ERIC foi possível distinguir as biovares 1 e 2 oriundas de batata no RS (Silveira et al., 2005). Isolados oriundos do Japão, Indonésia, Filipinas e Peru foram separados por origem através da rep-PCR (Horita et al., 2005). Isolados brasileiros também foram distinguidos de isolados da Indonésia, Costa Rica e Quênia através da REP-PCR (Martins, 2000).

O conhecimento da variabilidade populacional de R. solanacearum, assim como da virulência dos diferentes isolados, pode auxiliar o desenvolvimento de novas estratégias de controle da murcha bacteriana. Os resultados deste estudo mostraram variabilidade genética entre os isolados de R. solanacearum oriundos de tabaco ou áreas de produção da cultura. A virulência desses isolados deverá ser estudada para dar suporte à definição de próximos passos, tais como estratégias mais apropriadas para o melhoramento genético do hospedeiro e o desenvolvimento de cultivares resistentes.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à Souza Cruz S.A., por ter possibilitado a execução deste trabalho.

Recebido 27 Agosto 2010

Aceito 1 Março 2012

Autor para correspondência: Valmir Duarte, e-mail: valmir@ufrgs.br

TPP 169

Editor de Seção: Marcos A. Machado

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  • Caracterização de populações de Ralstonia solanacearum Smith em tabaco (Nicotiana tabacum L.) no Brasil

    Characterization of Ralstonia solanacearum Smith populations in tobacco (Nicotiana tabacum L.) from Brazil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Maio 2012
    • Data do Fascículo
      Abr 2012

    Histórico

    • Recebido
      27 Ago 2010
    • Aceito
      01 Mar 2012
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