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Viagens que Transformam a Condição Existencial: Narrativas e Representações em Filmes Protagonizados por Idosos

Viajes que Transforman la Condición Existencial: Narrativas y Representaciones en Películas Protagonizadas por Ancianos

Resumo

O turismo pode figurar como uma atividade catalisadora para mudanças positivas na vida dos idosos ao proporcionar possibilidades de socialização, fuga da rotina, conhecimento de novas realidades e culturas. O presente trabalho utiliza o cinema para investigar representações dos idosos e narrativas sobre processos de transformação em filmes com roteiros centrados em experiências de viagens. A análise de textos culturais tais como músicas, livros, propagandas, programas de televisão e filmes contribui para o entendimento de normas e padrões sociais existentes. Esse tipo de pesquisa ainda é pouco explorado no campo do turismo, mas sabe-se que o cinema se tornou uma arte universal capaz de revelar profundos e íntimos aspectos da sociedade através de suas narrativas e representações. Para análise de conteúdo foram selecionados quatro filmes que ligavam idosos, viagens e transformação: “Antes de Partir (2008)”, “O Exótico Hotel Marigold (2011)”, “Última Viagem a Vegas (2013)” e “Por Aqui e por Ali (2015)”. Posteriormente, foram construídas três categorias de análise: 1) motivação e escolha das experiências; 2) consumo; 3) envelhecimento e estigma. A discussão final está apoiada na lente da filosofia existencial para indicar nas narrativas dos filmes o papel transformador das viagens na vida dos idosos. As viagens são apresentadas como possibilidades de construir uma autenticidade existencial, pois são capazes de diluir sentimentos negativos tais como ansiedade, depressão e isolamento físico e psíquico.

Palavras-chave
Viagens transformadoras; Consumo; Idosos; Cinema; Filosofia existencial

RESUMEN

Turismo puede ser un catalizador de cambios positivos en la vida de los ancianos al proporcionar posibilidades de socialización, escapar de la rutina, conocimiento de nuevas realidades y culturas. El presente artículo utiliza películas para investigar representaciones de ancianos y narraciones sobre procesos de transformación en guiones centrados en experiencias de viaje. El análisis de textos culturales como músicas, libros, anuncios, programas de televisión y películas contribuye a la comprensión de las normas y estándares sociales existentes. Este tipo de investigación todavía se explora poco en el campo del turismo, pero se sabe que el cine se ha convertido en un arte universal capaz de revelar aspectos profundose íntimos de la sociedad a través de sus narrativas y representaciones. Para el análisis de contenido seleccionamos cuatro películas que vinculaban a los ancianos, los viajes y la transformación: “The Bucket List (2008)”, “The Best Exotic Marigold Hotel (2011)”, “Last Vegas (2013)” and “A Walk in the Woods (2015)”. Posteriormente, se construyeron tres categorías de análisis: 1) motivación y elección de experiencias; 2) consumo; 3) envejecimiento y estigma. La discusión final se basa en la lente de la filosofía existencial para indicar en las narraciones de la película el papel transformador de los viajes en la vida de los ancianos. El viaje se presenta como posibilidades para construir autenticidad existencial, ya que es capaz de diluir los sentimientos negativos como la ansiedad, la depresión y el aislamiento físico y psíquico.

Palabras clave
Viajes transformadores; Consumo; Ancianos; Cine; Filosofía existencial

Abstract

Tourism acts as a catalyst for positive changes in the elderly lives by providing possibilities for socialization, escape from routine, knowledge of new realities and cultures. This paper investigates aging representations and narratives of transformation processes in cinema screenplays focused on travel experiences. Analyzing cultural texts such as music, books, advertisements, television programs and films contributes to an understanding of standards and social norms. This kind of research is quite unexplored on the tourism studies, but it is a fact that cinema has become a universal art capable of revealing deep and intimate aspects of society through its narratives and representations. We have selected four films which links elderly, travel and transformation for content analysis: “The Bucket List (2008)”, “The Best Exotic Marigold Hotel (2011)”, “Last Vegas (2013)” and “A Walk in the Woods (2015)”. Right after, we built three categories of analysis: 1) motivation and choice of experiences; 2) consumption; 3) aging and stigma. The final discussion is based on existential philosophy to identify the transformative role of travelling on the elderly lives presented on the movies. Travelling is shown as possibilities to create existential authenticity, as it is capable of decrease negative feelings such as anxiety, depression and physical and psychic isolation.

Keywords
Transformative travels; Consumption; Elderly; Cinema; Existential philosophy

1 INTRODUÇÃO

O quadro populacional mundial aponta as maiores taxas de crescimento para indivíduos acima de 60 anos que podem ultrapassar 41 milhões de pessoas em 2030 (IBGE, 2015IBGE. (2015). Mudança Demográfica no Brasil no Início do Século XXI: subsídios para as projeções da população. Estudos & Análises: Informação demográfica e socioeconômica, 3.). Assim, apresenta-se fundamental a especialização de serviços, produtos, inovações de mercado e criação de políticas públicas que atendam esse público. Com esse novo cenário demográfico mundial, cresce ainda a preocupação com problemas como depressão, solidão e sentimentos de invalidez característico desse momento do ciclo vital, porém não exclusivo dessa faixa etária, tendo em vista o número cada vez maior de crianças e jovens que enfrentam esses males (United Nations, 2015United Nations (2015). World population prospects: the 2015 revision. Department of Economic and Social Affairs, Population Division. New York: United Nations.).

Embora não estivesse falando especificamente de idosos, Kottler (1997)Kottler, J. A. (1997). Travel that can change your life: how to create a transformative experience. San Francisco, CA: Jossey-Bass. observou que as experiências de viagens, ao proporcionarem novas perspectivas, desenvolvem resiliência e outras habilidades de enfrentamento, podem figurar como mediações eficazes em diversos problemas atrelados a rotina individual. Araújo (2000)Araújo, C. M. S. (2000). Turismo para a terceira idade: refletindo o futuro. Turismo-Visão e Ação, 3(7), 9-30. fala do turismo como um aliado na integração social dos idosos, pois oferece opções de interação, de trocas culturais, de diversão, além de trazer a possibilidade de novas amizades e assim diminuir a solidão. Segundo a autora, o turismo preenche o tempo livre contribuindo para a manutenção da saúde mental e física. Kottler (1997)Kottler, J. A. (1997). Travel that can change your life: how to create a transformative experience. San Francisco, CA: Jossey-Bass. e Araújo (2000)Araújo, C. M. S. (2000). Turismo para a terceira idade: refletindo o futuro. Turismo-Visão e Ação, 3(7), 9-30. sugerem que o consumo de experiências turísticas pode promover uma ação transformadora para os indivíduos que as realizam.

Mudanças nos relacionamentos, morte de pessoas próximas, questões familiares, problemas de saúde, carreira e desenvolvimento tecnológico possuem impactos diversos, que podem ser positivos ou negativos, na vida dos indivíduos. Esses eventos, inerentes a condição humana, podem proporcionar reflexões sobre a existência e a necessidade de transformação (Saunders, Laing & Weiler, 2013Saunders, R., Laing, J., & Weiler, B. (2013). Personal transformation through long-distance walking. In: Tourist experience and fulfilment: Insights from positive psychology, (pp. 141-160). Routledge.). De acordo com Coghlan e Weiler (2015)Coghlan, A., & Weiler, B. (2018). Examining transformative processes in volunteer tourism. Current Issues in Tourism, 21(5), 567-582. https://doi.org/10.1080/13683500.2015.1102209
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, a transformação é um processo individual em que há a compreensão crítica do velho “eu” e da construção de um novo autoconceito. Experiências transformadoras são eventos que além de desencadear respostas emocionais, proporcionam a auto exploração, servindo como desencadeadores de mudanças intrapessoais que contribuem para uma melhor qualidade de vida (Brown, 2013Brown, L. (2013). Tourism: A catalyst for existential authenticity. Annals of Tourism Research, 40, 176-190. https://doi.org/10.1016/j.annals.2012.08.004
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; Kirillova, Lehto & Cai, 2017aKirillova, K., Lehto, X., & Cai, L. (2017a). Tourism and existential transformation: an empirical investigation. Journal of Travel Research, 56(5), 638-650. https://doi.org/10.1177/0047287516650277
https://doi.org/10.1177/0047287516650277...
).

As viagens estão entre as experiências capazes de produzir reflexões, mudanças e transformações. Esse tema, viagens e transformações, tem sido discutido em diferentes contextos como, por exemplo, viagens de mochileiros (Noy, 2004Noy, C. (2004). This trip really changed me: Backpackers’ narratives of self-change. Annals of Tourism Research, 31(1), 78-102. https://doi.org/10.1016/j.annals.2003.08.004
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), viagens de peregrinação (Devereux & Carnegie, 2006Devereux, C., & Carnegie, E. (2006). Pilgrimage: Journeying beyond self. Tourism recreation research, 31(1), 47-56. https://doi.org/10.1080/02508281.2006.11081246
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), viagens com caminhadas de longa distância (Saunders et al., 2013Saunders, R., Laing, J., & Weiler, B. (2013). Personal transformation through long-distance walking. In: Tourist experience and fulfilment: Insights from positive psychology, (pp. 141-160). Routledge.), viagens de intercâmbio de estudantes em países estrangeiros (Brown, 2009Brown, L. (2009). The transformative power of the international sojourn: an ethnographic study of the international student experience. Annals of Tourism Research, 36 (3): 502–21. https://doi.org/10.1016/j.annals.2009.03.002
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) e ainda as transformações a partir de experiências de turismo sustentável (Pope, 2018Pope, E. (2018). Tourism and wellbeing: transforming people and places. International Journal of Spa and Wellness, 1(1), 69-81. https://doi.org/10.1080/24721735.2018.1438559
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) e do turismo voluntário (Pan, 2017Pan, T. J. (2017). Personal transformation through volunteer tourism: the evidence of Asian students. Journal of Hospitality & Tourism Research, 41(5), 609-634. https://doi.org/10.1177/1096348014538048
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; Almeida & Casotti, 2015Almeida, T. G., & Casotti, L. M. (2015). Turismo voluntário e o bem-estar do consumidor na pesquisa transformativa do consumo. Revista Ciências Administrativas, 21(2), 531-5553. https://doi.org/10.5020/2318-0722.2015.v21n2p531
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).

Hung e Lu (2016)Hung, K., & Lu, J. (2016). Active living in later life: An overview of aging studies in hospitality and tourism journals. International Journal of Hospitality Management, 53, 133-144. https://doi.org/10.1016/j.ijhm.2015.10.008
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uniram duas temáticas, envelhecimento e turismo, em uma pesquisa bibliométrica. Eles encontraram 16 artigos nos primeiros 15 anos analisados (1983-1998) e 36 artigos nos 15 anos seguintes (1999-2013). Os autores empreenderam uma análise de artigos publicados nos três principais periódicos de turismo e nos três principais periódicos de hospitalidade (Annals of Tourism Research, Journal of Travel Research, Tourism Management, Cornell Hospitality Quarterly, International Journal of Hospitality Management e Journal of Hospitality and Tourism Research). Eles observam que o total de artigos sobre envelhecimento localizados podem ser considerados escassos se comparados com investigações em relação ao fenômeno do envelhecimento em outros campos como gerontologia, psicologia, sociologia e medicina.

Dentre as temáticas identificadas pela bibliometria em estudos que contemplam idosos, foram destacadas: segmentação (Moschis, Curasi, & Bellenger, 2003Moschis, G., Curasi, C. F., & Bellenger, D. (2003). Restaurant-selection preferences of mature consumers. Cornell Hotel and Restaurant Administration Quarterly, 44(4), 51-60. https://doi.org/10.1016/S0010-8804(03)90258-8
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; Nimrod, 2008Nimrod, G. (2008). Retirement and tourism themes in retirees’ narratives. Annals of Tourism Research, 35(4), 859-878. https://doi.org/10.1016/j.annals.2008.06.001
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; Jang, Kim, & Yang, 2011Jang, S., Ham, S., & Hong, G. S. (2007). Food-away-from-home expenditure of senior households in the United States: A double-hurdle approach. Journal of Hospitality & Tourism Research, 31(2), 147-167. https://doi.org/10.1177/1096348006297287
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; Chen, Liu & Chang, 2013Chen, K. H., Liu, H. H., & Chang, F. H. (2013). Essential customer service factors and the segmentation of older visitors within wellness tourism based on hot springs hotels. International Journal of Hospitality Ma-nagement, 35, 122-132. https://doi.org/10.1016/j.ijhm.2013.05.013
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), fatores que influenciam a tomada de decisão (Baloglu & Shoemaker, 2001Baloglu, S., & Shoemaker, S. (2001). Prediction of senior travelers’ motorcoach use from demographic, psychological, and psychographic characteristics. Journal of Travel Research, 40(1), 12-18. https://doi.org/10.1177/004728750104000103
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; Fleischer & Pizam, 2002Fleischer, A., & Pizam, A. (2002). Tourism constraints among Israeli seniors. Annals of Tourism Research, 29(1), 106-123. https://doi.org/10.1016/S0160-7383(01)00026-3
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; Huang & Tsai, 2003Huang, L., & Tsai, H. T. (2003). The study of senior traveler behavior in Taiwan. Tourism management, 24(5), 561-574. https://doi.org/10.1016/S0261-5177(03)00008-6
https://doi.org/10.1016/S0261-5177(03)00...
; Jang, Ham & Hong, 2007Jang, S., Ham, S., & Hong, G. S. (2007). Food-away-from-home expenditure of senior households in the United States: A double-hurdle approach. Journal of Hospitality & Tourism Research, 31(2), 147-167. https://doi.org/10.1177/1096348006297287
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); comportamento do consumidor (Jang & Ham, 2009Jang, S. S., & Ham, S. (2009). A double-hurdle analysis of travel expenditure: baby boomer seniors versus older seniors. Tourism Management, 30(3), 372-380. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2008.08.005
https://doi.org/10.1016/j.tourman.2008.0...
; Hughes & Deutsch, 2010Hughes, H. L., & Deutsch, R. (2010). Holidays of older gay men: age or sexual orientation as decisive factors?. Tourism Management, 31(4), 454-463. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2009.04.012
https://doi.org/10.1016/j.tourman.2009.0...
); satisfação (Wuest, Tas & Emenheiser, 1996Wuest, B. E., Tas, R. F., & Emenheiser, D. A. (1996). What do mature travelers perceive as important hotel/motel customer services? Hospitality Research Journal, 20(2), 77-93. https://doi.org/10.1177/109634809602000206
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; Hsu, 2000Hsu, C. H. (2000). Determinants of mature travelers’ motorcoach tour satisfaction and brand loyalty. Journal of Hospitality & Tourism Research, 24(2), 223-238. https://doi.org/10.1177/109634800002400206
https://doi.org/10.1177/1096348000024002...
); motivação para viagem (Hsu, Cai & Wong, 2007Hsu, C. H., Cai, L. A., & Wong, K. K. (2007). A model of senior tourism motivations - Anecdotes from Beijing and Shanghai. Tourism management, 28(5), 1262-1273. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2006.09.015
https://doi.org/10.1016/j.tourman.2006.0...
; Viallon, 2012Viallon, P. (2012). Retired snowbirds. Annals of Tourism Research, 39(4), 2073-2091. https://doi.org/10.1016/j.annals.2012.06.001
https://doi.org/10.1016/j.annals.2012.06...
); restrições (Blazey, 1992Blazey, M. A. (1992). Travel and retirement status. Annals of Tourism Research, 19(4), 771-783. https://doi.org/10.1016/0160-7383(92)90066-X
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; Gladwell & Bedini, 2004Gladwell, N. J., & Bedini, L. A. (2004). In search of lost leisure: the impact of caregiving on leisure travel. Tourism Management, 25(6), 685-693. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2003.09.003
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), bem-estar e benefícios do turismo (Milman, Mitas, Yarnal, & Chick, 2012Milman, A. (1998). The impact of tourism and travel experience on senior travelers' psychological well-being. Journal of Travel Research, 37(2), 166-170. https://doi.org/10.1177/004728759803700208
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; Chen et al., 2013Chen, K. H., Liu, H. H., & Chang, F. H. (2013). Essential customer service factors and the segmentation of older visitors within wellness tourism based on hot springs hotels. International Journal of Hospitality Ma-nagement, 35, 122-132. https://doi.org/10.1016/j.ijhm.2013.05.013
https://doi.org/10.1016/j.ijhm.2013.05.0...
). Hung e Lu (2016)Hung, K., & Lu, J. (2016). Active living in later life: An overview of aging studies in hospitality and tourism journals. International Journal of Hospitality Management, 53, 133-144. https://doi.org/10.1016/j.ijhm.2015.10.008
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também analisaram as técnicas de coletas de dados e constataram que as pesquisas quantitativas são majoritárias nos estudos identificados. Eles defendem métodos qualitativos ou mistos para uma melhor compreensão sobre a relação entre envelhecimento e turismo.

A análise de textos culturais como livros, músicas, filmes, propagandas e programas de televisão pode auxiliar no entendimento das normas e padrões sociais existentes que norteiam as práticas de consumo (Hirschman & Stern, 1994Hirschman. E. C., & Stern, B. B. (1994). Women as Commodities: Prostitution as Depicted in the Blue Angel, Pretty Baby, and Pretty Woman. in NA - Advances in Consumer Research V. 21, eds. Chris T. Allen and Deborah Roedder John, Provo, UT: Association for Consumer Research, 576-581. https://doi.org/10.1080/00913367.1998.10673541
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). Na área de turismo foi possível identificar pesquisas recentes, tanto nacionais quanto internacionais, que analisaram diferentes textos culturais como folhetos promocionais (Moreira & Campos (2019)Moreira, M. G., & Campos, L. (2019). O ritual da interpelação ideológica no Turismo LGBT e a impossibilidade do desejo que se desloca. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, 13(2), 54-68. https://doi.org/10.7784/rbtur.v13i2.1542
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, brochuras de promoção turística brasileira distribuídas na França e na Alemanha (Silveira & Baptista, 2019Silveira, L. P., & Baptista, M. (2019). Cartografias imaginativas do Brasil nas brochuras turísticas alemãs e francesas: da exotização à mercantilização turística. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, 13(2), 69 – 92. https://doi.org/10.7784/rbtur.v13i2.1545
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), a influência de telenovelas brasileiras no turismo emissivo (Dutra, Faria & Miranda, 2015Dutra, L. F., Faria, D. M. C., & Miranda, I. P. (2015). Cultura e Relações Internacionais: a influência das telenovelas no turismo emissivo brasileiro. Revista Turismo em Análise, 26(2), 385-402. https://doi.org/10.11606/issn.1984-4867.v26i2p385-402
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), histórias fictícias como a do Conde Drácula para atrair turistas para a Transilvânia (Reijnders, 2011Reijnders, S. (2011). Stalking the count: dracula, fandom and tourism. Annals of Tourism Research, 38(1), 231-248. https://doi.org/10.1016/j.annals.2010.08.006
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) e livros lidos por turistas e de que forma essas leituras influenciam experiências de viagens (Lang & Frost, 2012Laing, J., & Frost, W. (2012). Books and travel: inspiration, quests and transformation. Bristol: Channel View. https://doi.org/10.21832/9781845413491
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). Localizamos também trabalhos que analisaram representações e narrativas que relacionam viagens e transformações pessoais em filmes (Frost, 2010Frost, W. (2010). Life changing experiences: film and tourists in the Australian outback. Annals of Tourism Research, 37(3), 707-726. https://doi.org/10.1016/j.annals.2010.01.001
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) e em livros escritos por mulheres sobre viagens à Itália (Laing & Frost, 2017Laing, J. H., & Frost, W. (2017). Journeys of well-being: Women's travel narratives of transformation and self-discovery in Italy. Tourism Management, 62, 110-119. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2017.04.004
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).

Não foram localizados estudos que unissem em sua temática idosos, viagens e transformações. O presente estudo explora essa união analisando filmes que trazem idosos como protagonistas em contextos de experiências de viagem onde experimentam processos de transformação. Para alcançar esse objetivo, quatro filmes foram detalhadamente analisados a partir de uma seleção inicial de 181 filmes localizados em torno de temática mais geral envolvendo idosos. A análise de conteúdo foi inspirada no trabalho de Hirschman, Scott e Wells (1998)Hirschman, E. C., Scott, L., & Wells, W. B. (1998). A model of product discourse: linking consumer practice to cultural texts. Journal of Advertising, 27(1), 33-50. e a construção das categorias de análise foi desenvolvida conforme orientação de Bardin (2016)Bardin, L. (2016). Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70..

A lente da filosofia existencial foi utilizada para discutir e compreender o processo de transformação que envolveu os personagens idosos em suas viagens nas narrativas cinematográficas. O fenômeno das experiências de turismo transformadoras já foi estudado (Brown, 2013Brown, L. (2013). Tourism: A catalyst for existential authenticity. Annals of Tourism Research, 40, 176-190. https://doi.org/10.1016/j.annals.2012.08.004
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; Kirillova et al., 2017aKirillova, K., Lehto, X., & Cai, L. (2017a). Tourism and existential transformation: an empirical investigation. Journal of Travel Research, 56(5), 638-650. https://doi.org/10.1177/0047287516650277
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), mas não foram localizados trabalhos que tenham se dedicado a compreender o processo de transformação de indivíduos da terceira idade em experiências de viagens. Esse estudo, que utiliza textos construídos a partir da cultura é um convite para que outros trabalhos empíricos investiguem idosos, suas viagens e o processo de transformação vivido por eles.

2 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS IDOSOS: “VELHO É SEMPRE O OUTRO”

A representação de pessoas mais velhas possui um papel importante na construção da imagem e de um modelo cultural apropriado ao crescimento dos idosos nas sociedades (Caradec, 2016Caradec, V. (2016). Da terceira Idade à Idade Avançada: a Conquista da Velhice. In: Goldenberg, M. (org.). Velho é Lindo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. (pp. 11 – 38).). A partir do momento em que o número de idosos aumenta na população, estereótipos negativos construídos resultam em discriminação (Bytheway, 2005Bytheway, B. (2005). Ageism and age categorization. Journal of social Issues, 61(2), 361-374. https://doi.org/10.1111/j.1540-4560.2005.00410.x
https://doi.org/10.1111/j.1540-4560.2005...
). Os filmes e os programas de televisão, por terem tempo limitado para contar uma história, se utilizam de estereótipos para retratarem personagens e reforçam representações estigmatizadas dos velhos (Signorielli, 2001Signorielli, N. (2001). Aging on television: the picture in the nineties. Generations, 25(3), 34-38.).

A filósofa Simone de Beauvoir (1970/1990)Beauvoir, S. (1970/1990). A velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira., uma das precursoras em se dedicar a falar da velhice e a questionar imagens sociais relacionadas a esse tema em diferentes lugares, fala de como nesse momento da vida a sociedade reivindica que idosos sejam modelo de virtudes e que possuam serenidade, mas, ao mesmo tempo, condena a manifestação da sexualidade e de sentimentos e desejos tais como amor e ciúme por parte dos velhos. Ela fala de forma aberta do repúdio, do escândalo e da violência sofrida pelos velhos. Simone de Beauvoir expõe em seu livro diversas representações negativas do velho como delirante e caduco. Ela fala da dificuldade dos indivíduos se auto perceberem como velhos, ou seja, velhos são os outros, ou a velhice é percebida no outro. O indivíduo não se reconhece como velho e o que se estabelece “é uma relação dialética entre meu ser para outrem – tal como ele se define objetivamente – e a consciência que tomo de mim mesma através dele” (Beauvoir, 1970/1990Beauvoir, S. (1970/1990). A velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. p. 348).

Gatling (2013)Gatling, M. C. (2013). Representations of age and ageing in comedy film. Dissertation (Doctoral) - James Cook University)., décadas depois de Simone de Beauvoir, observa as representações negativas e fora da realidade do envelhecimento em textos culturais em geral. A autora, que investigou representações da velhice em filmes de comédia, fala que os personagens mais velhos aparecem com menos frequência que os mais jovens e quando se trata de personagens femininas a representatividade diminui ainda mais. Gatling (2013)Gatling, M. C. (2013). Representations of age and ageing in comedy film. Dissertation (Doctoral) - James Cook University). também observa como pessoas mais velhas são frequentemente retratadas de forma exagerada em filmes de comédia como, por exemplo, com problemas de audição, de incontingência urinária ou ridicularizadas a partir de situações relacionados com a sexualidade pois, segundo a autora, há uma incongruência na associação de pessoas mais velhas com atividades sexuais.

Outros pesquisadores observaram a escassez de papéis fortes no cinema para atrizes acima de 50 anos, levando-as a recorrerem a procedimentos cirúrgicos estéticos com o intuito de prolongarem sua vida profissional (Chivers, 2011Chivers, S. (2011). The silvering screen: old age and disability in cinema. University of Toronto Press. https://doi.org/10.3138/9781442686045
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). Alguns estudos buscaram compreender os estereótipos mais frequentes de pessoas mais velhas que apareciam em diferentes textos culturais, sejam eles positivos ou negativos (Gatling, 2013Gatling, M. C. (2013). Representations of age and ageing in comedy film. Dissertation (Doctoral) - James Cook University).; Hummert & Levy, 2002Hummert, M. & Levy, B. (2002). Developments in research on age stereotyping. The Gerontologist, (42), 338.; Magoffin, 2007Magoffin, D. L. (2007). Stereotyped seniors: the portrayal of older characters in teen movies from 1980-2006. Master of Arts, Brigham Young University.). Gatling (2013)Gatling, M. C. (2013). Representations of age and ageing in comedy film. Dissertation (Doctoral) - James Cook University). sintetizou os estereótipos negativos, que podem ser divididos em quatro grupos, e os positivos que podem ser divididos em três grupos.

  • Negativos:

    1. Rabugentos – gananciosos, queixosos, inflexíveis e intrometidos;

    2. Desanimados – solitários, negligenciados, tristes, cansados e frágeis;

    3. Severamente Prejudicados – senis, com pensamentos e movimentos lentos, não praticam sexo, doentes e fracos;

    4. Reclusos – quietos, tímidos, dependentes e esquecidos.

  • Positivos:

    1. Melhor Idade – saudáveis, ativos, aventureiros e viajantes;

    2. Avô Perfeito – inteligentes, amorosos e familiares;

    3. Conservadores – patriotas, religiosos, rígidos, orgulhosos e ricos.

O estudo da antropóloga Guita Debert (2003)Debert, G. G. (2003). O velho na propaganda. Cadernos Pagu, (21), 133-155. https://doi.org/10.1590/S0104-83332003000200007
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, traz uma análise das representações dos idosos na publicidade brasileira nos anos de 1970 a 1990. A autora identificou que a velhice foi representada de três maneiras distintas nesse período. Até a década de 1970, predominavam os estereótipos negativos, destacando-se imagens associadas a passividade, arrogância, dependência ou perda de habilidades. De forma antagônica à primeira, a partir dos anos de 1980, se fortaleceram representações da velhice em que coloca o idoso em posição de poder, riqueza, prestígio e beleza. A pesquisa também identificou imagens dos idosos ligadas a transgressões de padrões sociais até então estabelecidos ao tratar questões relacionadas ao uso de novas tecnologias, sexualidade e vida familiar associados a novos significados como contestação, rebeldia e hedonismo nesse momento do ciclo de vida.

A antropóloga brasileira Miriam Goldenberg, uma das referências em pesquisas sobre envelhecimento, trata dessas questões na realidade brasileira. Com a chegada da velhice e da decadência do corpo, as mulheres experimentam uma fase de faltas e perdas uma vez que o corpo da mulher é também seu capital. Ela inicia seu trabalho com fala de Gilberto Freire: “as brasileiras não ficam velhas, ficam loiras” (Goldenberg, 2006Goldenberg, M. (2006). O corpo como capital: para compreender a cultura brasileira. Arquivos em movimento, 2(2), 115-123., p. 116). Partindo disso, com o intuito de romper padrões de estudos predominantes, a autora trabalha a velhice sob uma perspectiva positiva, se afastando de abordagens que tratem desse momento do ciclo vital de forma estigmatizada e estereotipada. A pesquisadora inicia um movimento de estudos incentivando o olhar otimista do envelhecimento cunhando expressões como “velho é lindo” e a “bela velhice” inspirada em Simone de Beauvoir (Goldenberg, 2013Goldenberg, M. (2013). A bela velhice. Editora Record.; 2016Goldenberg, M. (2016). Velho é lindo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.). Ela destaca que pessoas que envelhecem mantendo seus projetos existenciais não ficam velhas. A continuidade de atividades lúdicas e prazerosas como dança e canto e a busca por prazer e felicidade propicia a transgressão de tabus e normas existente. Assim, surge uma nova categoria, os ageless ou “sem idades”, pessoas livres e visíveis na sociedade (Goldenberg, 2011Goldenberg, M. (2011). Corpo, envelhecimento e felicidade na cultura brasileira. Contemporânea, 9(2).).

3 CONSUMO DE EXPERIÊNCIA E ENVELHECIMENTO: A INVISIBILIDADE DO CONSUMIDOR MADURO

Conforme Holbrook e Hirschiman (1982)Holbrook, M. B., & Hirschman, E. C. (1982). The experiential aspects of consumption: Consumer fantasies, feelings, and fun. Journal of Consumer Research, 9(2), 132-140. https://doi.org/10.1086/208906
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, uma experiência é um acontecimento pessoal, muitas vezes carregada de significado emocional que acontece pela interação de estímulos provenientes do consumo de produtos ou serviços. Carù e Cova (2003)Carù, A., & Cova, B. (2003). Revisiting consumption experience: a more humble but complete view of the concept. Marketing Theory, 3(2), 267-286. https://doi.org/10.1177/14705931030032004
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analisam a trajetória dos estudos de consumo de experiência que se tornou um elemento-chave para entender o comportamento do consumidor. Aqui destacamos a importância do conceito de marketing de experiência para o turismo. Os autores explicam que a experiência surge a partir do crescimento do setor de serviços e a definem como um episódio subjetivo com ênfase nos sentidos e emoções vivenciadas no momento em que contribuem para a transformação e construção do indivíduo.

Embora o marketing de experiência guarde uma estreita conexão com a experiência do turismo, o campo do conhecimento preteriu estudos sobre o consumidor mais velho, focando em investigações sobre os mais jovens (Szmigin & Carrigan, 2001Szmigin, I., & Carrigan, M. (2001). Learning to love the older consumer. Journal of Consumer Behaviour: An International Research Review, 1(1), 22-34. https://doi.org/10.1002/cb.51
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). De acordo com Moschis (2003)Moschis, G. P. (2003). Marketing to older adults: an updated overview of present knowledge and practice. Journal of Consumer Marketing, 20(6), 516-525. https://doi.org/10.1108/07363760310499093
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, pesquisas que analisam os consumidores com idade acima de 50 anos ainda são insuficientes indicando a invisibilidade do consumidor maduro nas pesquisas acadêmicas da área.

Quando falamos do grupo de idosos, é possível verificar uma tendência de consumo do grupo terceira idade como voltada a experiências de lazer e viagens (ex. Patterson & Pegg, 2009Patterson, I., & Pegg, S. (2009). Marketing the leisure experience to baby boomers and older tourists. Journal of Hospitality Marketing & Management, 18(2-3), 254-272. https://doi.org/10.1080/19368620802594136
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), consumo de moda e independência financeira e familiar (ex. Birtwistle & Tsim, 2005Birtwistle, G., & Tsim, C. (2005). Consumer purchasing behaviour: an investigation of the UK mature women's clothing market. Journal of Consumer Behaviour: An International Research Review, 4(6), 453-464. https://doi.org/10.1002/cb.31
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; Myers & Lumbers, 2008Myers, H., & Lumbers, M. (2008). Understanding older shoppers: a phenomenological investigation. Journal of Consumer Marketing, 25(5), 294-301. https://doi.org/10.1108/07363760810890525
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) e uso da internet para decisão de compra (ex. Moura, Gosling, Christino, & Macedo, 2017Moura, A. C., Sevilha Gosling, M., Christino, J. M. M., & Macedo, S. B. (2017). Aceitação e uso da tecnologia para escolha de destinos turísticos por pessoas da terceira idade: um estudo usando a UTAUT2. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, 11(2), 239-269. https://doi.org/10.7784/rbtur.v11i2.1277
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). Esses exemplos vão em uma direção diferente dos estudos que sugerem associações negativas em relação ao consumo dos idosos indicando que eles perdem a capacidade de realizar suas próprias escolhas e autonomia de tomar decisões de consumo. Além disso, os idosos são vistos como incapazes de consumirem de forma independente, carecendo de assistência para atividades básicas de consumo como fazer compras, preparar refeições, usar telefone, sair de casa, tomar medicamentos fazer atividades domésticas e administrar dinheiro como mostra a pesquisa de Adams, Martinez e Vickerie (2010)Adams, P. F., Martinez, M. & Vickerie, J. (2010). Summary health statistics for the u.s. population: national health interview survey, 2009. Vital and Health Statistics Series 10, n. 248, Hyattsville, MD: National Center for Health Statistics..

De fato, os consumidores idosos estão incluídos no grupo daqueles considerados consumidores vulneráveis tais como os portadores de deficiência, crianças, analfabetos, minorias raciais e étnicas, pobres e imigrantes (Andreasen & Manning, 1990Andreasen, A. R., & Manning, J. (1990). The dissatisfaction and complaining behavior of vulnerable consumers. Journal of Consumer Satisfaction, Dissatisfaction and Complaining Behavior, 3(1), 12-20.). O conceito de vulnerabilidade está associado à falta de controle das transações de troca devido a suas características e experiências limitantes.

Conforme Jones e Middleton (2007)Jones, J. L., & Middleton, K. L. (2007). Ethical decision-making by consumers: the roles of product harm and consumer vulnerability. Journal of Business Ethics, 70(3), 247-264. https://doi.org/10.1007/s10551-006-9109-2
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, a vulnerabilidade não se configura como uma característica que o consumidor pode escolher. De acordo com Baker, Gentry e Rittenburg (2005)Baker, S. M., Gentry, J. W., & Rittenburg, T. L. (2005). Building understanding of the domain of consumer vulnerability. Journal of Macromarketing, 25(2), 128-139. https://doi.org/10.1177/0276146705280622
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, a vulnerabilidade acontece quando o indivíduo perde o controle da situação e a transação depende de fatores externos para que aconteça de maneira justa, se configurando como um estado de impotência por parte do consumidor proveniente do desequilíbrio do consumo das mensagens de marketing, dos produtos ou das transações de mercado.

No entanto, o estudo de Barnhart e Peñaloza (2012)Barnhart, M., & Peñaloza, L. (2012). Who are you calling old? Negotiating old age identity in the elderly consumption ensemble. Journal of Consumer Research, 39(6), 1133-1153. https://doi.org/10.1086/668536
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mostra que não necessariamente a velhice impacta no consumo individual. As autoras identificaram que ainda que o comportamento de consumo de pessoas mais velhas seja afetado pela influência de seu grupo de referência e que, nos casos de idosos dependentes, o consumo individual passa a ser grupal, o que se verifica é a negociação de suas identidades, uma vez que a família e prestadores de serviços impõem ao sujeito um posicionamento por eles definidos. O que se observa é que o desejo do idoso em praticar suas próprias escolhas de consumo permanece presente e que há um reforço para sua construção identitária.

Quando falamos da relação consumo e identidade (Ransome, 2005Ransome, P. (2005). Work, consumption and culture: affluence and social change in the twenty-first century. Sage.; Belk, 1988Belk, R. W. (1988). Possessions and the extended self. Journal of consumer research, 15(2), 139-168. https://doi.org/10.1086/209154
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) observamos que as viagens de turismo expressam tanto a identidade individual como a identidade de pertencer a um grupo. Como o consumo é tanto simbólico como material ou funcional, ele expressa o lugar do indivíduo no mundo, ou seja, o tipo de viagem pode expressar como o indivíduo se vê e como ele quer ser visto. Hall (2006)Hall, S. (2006). A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A nos fala do sujeito sociológico que constrói a sua identidade a partir da relação com outros sujeitos, a partir da relação do “eu” com a sociedade onde experiências turísticas podem ser vistas como elemento importante para composição de papeis sociais. Essas experiências podem apoiar a construção identitária, pois como observa Hall (2006)Hall, S. (2006). A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, a identidade tem origem na costura do indivíduo com a estrutura sócio-cultural e por isso está continuamente se formando e se transformando.

4 O ESTUDO

Tanto filmes como documentários podem ser ferramentas pedagógicas e de pesquisa eminentemente úteis na investigação de diferentes questões inclusive aquelas relacionadas a experiências de consumo. Os quatro filmes, textos originados da cultura, foram selecionados para compreender representações dos idosos no contexto de experiências de viagem que envolviam processos de transformação (Hirschiman et al.,1998Hirschman, E. C., Scott, L., & Wells, W. B. (1998). A model of product discourse: linking consumer practice to cultural texts. Journal of Advertising, 27(1), 33-50.; Tadajewski & Hamilton, 2014Tadajewski, M., & Hamilton, K. (2014). Waste, Art, and Social Change: Transformative Consumer Research Outside of the Academy?. Journal of Macromarketing, 34(1), 80-86. https://doi.org/10.1177/0276146713509631
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).

O antropólogo Grant McCracken (1988)McCracken, G. (1988). The long interview. v.13. Newbury, CA: Sage. https://doi.org/10.4135/9781412986229
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observa que ao ligar a cultura ao consumo, metodologias quantitativas negligenciam aspectos relevantes como significados e experiências associadas a vida humana. McCraken (1988) também fala do movimento dos significados que são influenciados pelos diversos textos construídos pela cultura e transmitidos através de mídias diversas como programas de televisão, propagandas, livros, música e filmes, que são o texto analisado nesse artigo. Esses textos culturais auxiliam no entendimento de ideologias, crenças, contextos, imaginários, padrões e normas que constituem e transformam a sociedade em que estão inseridos (Hirschman & Stern, 1994Hirschman. E. C., & Stern, B. B. (1994). Women as Commodities: Prostitution as Depicted in the Blue Angel, Pretty Baby, and Pretty Woman. in NA - Advances in Consumer Research V. 21, eds. Chris T. Allen and Deborah Roedder John, Provo, UT: Association for Consumer Research, 576-581. https://doi.org/10.1080/00913367.1998.10673541
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).

A seleção dos filmes partiu de uma triagem inicial de temáticas diversas que envolvessem personagens idosos. Essa busca utilizou as palavras-chaves: “idosos”, envelhecimento”, “terceira idade”, “velho”, turismo”, “viagem”, “lazer”, isoladamente e/ou combinadas, nos sites brasileiros “Portal do Envelhecimento” e “Adoro Cinema”. Além disso, também foram realizadas buscas no site americano Internet Movie Database (IMDB) com as palavras-chave: “elderly”, “older”, “aging”, “ageing”, “aged”, “retired”, “senior”, “third age”, “travel”, “leisure”, “tourism”. Essa primeira busca ocorreu no período de março a abril de 2017.

Foram localizados inicialmente 181 filmes. Posteriormente, foi realizada a análise da sinopse de cada filme com o objetivo de selecionar os que tratassem especificamente da experiência de idosos em viagem. Com esse segundo filtro foi possível chegar a 43 títulos que tiveram seus trailers analisados. Destes, sete filmes foram considerados relevantes para a análise, pois tinham como tema central idosos como protagonistas e viagens, além de terem tido lançamento nos últimos 10 anos. Os sete filmes foram assistidos na íntegra e três foram considerados fora do escopo do tema principal: “idosos” e “viagens transformadoras”. Os três filmes excluídos foram “UP – Altas Aventuras” (2009) era uma animação, o que dificultava a comparação com os demais. “O Exótico Hotel Marigold 2” (2015) não retratava o processo de transformação e sim a rotina do grupo de idosos que passou a morar na Índia. E “Um Fim de Semana em Paris” (2013) porque também não trazia o processo de transformação a partir da experiência de viagem. Finalmente foram selecionados quatro filmes como adequados ao tema: “Antes de Partir (2008)”, “O Exótico Hotel Marigold (2011)”, “Última Viagem a Vegas (2013)” e “Por Aqui e por Ali (2015), a tabela 1 contém uma sinopse dos filmes e informações sobre seus principais personagens.

Tabela 1
Filmes e Personagens analisados (elaboração própria)

Os quatro filmes possuem 15 personagens idosos principais (ver tabela 1) sendo quatro mulheres e 11 homens. Dos 11 homens, um personagem é homossexual e dois personagens são negros e representados por um mesmo ator (Morgan Freeman). Foram identificadas ainda quatro personagens idosas com papel secundário: mulheres que eram namoradas ou esposas dos personagens principais. A pouca diversidade de gênero e raça em personagens idosos já foi observada no estudo de Golpadas e Siebert (2018)Gopaldas, A., & Siebert, A. (2018). Women over 40, foreigners of color, and other missing persons in globalizing mediascapes: understanding marketing images as mirrors of intersectionality. Consumption Markets & Culture, 21(4), 323-346. https://doi.org/10.1080/10253866.2018.1462170
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sobre representações em propagandas. Eles observaram que idosos estão sub-representados na mídia e que estudos interseccionais de idade, gênero e raça mostram intersecções como mulheres mais velhas e minorias étnicas mais velhas de forma marginal em comparação com homens ou maiorias étnicas mais velhas, por exemplo (Gopaldas & Siebert, 2018Gopaldas, A., & Siebert, A. (2018). Women over 40, foreigners of color, and other missing persons in globalizing mediascapes: understanding marketing images as mirrors of intersectionality. Consumption Markets & Culture, 21(4), 323-346. https://doi.org/10.1080/10253866.2018.1462170
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).

Para análise do conteúdo dos filmes foi utilizado como inspiração o trabalho de Hirschman et al. (1998)Hirschman, E. C., Scott, L., & Wells, W. B. (1998). A model of product discourse: linking consumer practice to cultural texts. Journal of Advertising, 27(1), 33-50.. Primeiramente, selecionou-se as cenas em que os personagens idosos apareciam em situações consideradas relevantes para o estudo. Posteriormente, os diálogos foram analisados em conjunto com os contextos, os objetos e os cenários que faziam parte da cena. Todos os diálogos dos filmes foram transcritos de forma a facilitar a análise. Para a construção das categorias de análise foram seguidas as diretrizes e etapas sugeridas por Bardin (2016)Bardin, L. (2016). Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70.: 1) pré-análise, 2) exploração do material e 3) tratamento dos resultados, inferência e interpretação.

5 PRINCIPAIS ACHADOS

Inicialmente a análise foi pensada de forma a seguir o trabalho empírico de Kirillova et al. (2017a)Kirillova, K., Lehto, X., & Cai, L. (2017a). Tourism and existential transformation: an empirical investigation. Journal of Travel Research, 56(5), 638-650. https://doi.org/10.1177/0047287516650277
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sobre viagens transformadoras e que traz análise estruturada de acordo com os acontecimentos antes da viagem, durante a viagem e pós-viagem. No entanto, ao rever o conteúdo das narrativas dos filmes decidiu-se por analisar a partir de três principais categorias sendo que apenas uma foi dividida em três momentos que se assemelham à análise feita por Kirillova et al. (2017a)Kirillova, K., Lehto, X., & Cai, L. (2017a). Tourism and existential transformation: an empirical investigation. Journal of Travel Research, 56(5), 638-650. https://doi.org/10.1177/0047287516650277
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. A primeira categoria se refere às motivações apresentadas pelos personagens para empreender as viagens, bem como a escolha dos locais e tipo de experiência; a segunda categoria mostra consumos associados aos personagens em diferentes momentos: antes, durante e depois da viagem, e a terceira categoria de análise traz como os personagens e suas experiências se submetem ou enfrentam o estigma do envelhecimento.

5.1 Motivações e escolhas das experiências: “Na minha idade não posso fazer planos tão longos”

A primeira parte dos quatro filmes apresentou estrutura e características semelhantes. Todos apresentavam os personagens, suas peculiaridades, seus estilos e modos de vida, além das razões que os levaram a decidir a realizar a viagem. As motivações para a viagem foram variadas, o que pode sugerir serem os idosos um grupo heterogêneo, assim como defende Moschis (2003)Moschis, G., Curasi, C. F., & Bellenger, D. (2003). Restaurant-selection preferences of mature consumers. Cornell Hotel and Restaurant Administration Quarterly, 44(4), 51-60. https://doi.org/10.1016/S0010-8804(03)90258-8
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em seu estudo que destaca a diversidade do segmento de idosos.

Os filmes apresentam gatilhos comuns para que os idosos se sentissem motivados a viajar. Eles abordam a relação dos personagens com o envelhecimento e com a perspectiva próxima da morte para posicionar a viagem como possibilidade de ressignificação da vida. O diálogo entre Muriel (O Exótico Hotel Marigold) e o médico sobre esperar seis meses para realizar uma cirurgia no joelho é um exemplo sobre a percepção do tempo e da evidente proximidade da finitude: “na minha idade, não posso fazer planos tão longos. Nem sequer compro bananas verdes.”

Nos filmes, foi possível localizar diversas motivações para que os personagens decidissem viajar como listadas a seguir:

  1. Tentativa de reviver momentos do passado de juventude e resgatar sensações antigas e provar a capacidade de reviver experiências do passado ligados ao sentimento de nostalgia.

  2. Busca por laços sociais, alternativas de socialização e de possibilidades de envolvimento afetivo.

  3. Possibilidade de sair da rotina e fugir dos problemas cotidianos.

  4. Problemas financeiros e busca por lugares mais econômicos para viver. Busca de destino com o intuito de realizar tratamento de saúde em local com custos menores ou mais especializado que é chamado “turismo saúde”, foco do estudo de Connell (2006)Connell, J. (2006). Medical tourism: Sea, sun, sand and… surgery. Tourism management, 27(6), 1093-1100. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2005.11.005
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    .

  5. Busca de algo diferente ou aventureiro diante da iminência da própria morte ou morte de terceiros.

As motivações levaram os personagens para a viagem e para a escolha de diferentes destinos. No filme Por aqui e Por Ali, por exemplo, a esposa pergunta ao Bill – protagonista idoso – porque ele quer fazer a Trilha dos Apalaches e de que forma a escolha está ligada ao funeral do colega que acabam de voltar. Ele não sabe explicar, mas o diálogo sugere que o desejo despertado após a morte do amigo está ligado a uma busca por mudar algo na rotina característica de sua vida ou buscar algo diferente e aventureiro que pode estar atrelado a experiências passadas, uma vez que Bill fazia trilhas quando jovem. Outros exemplos são destinos ligados a uma oportunidade e a possibilidade reviver momentos passados, como ir ao casamento de um amigo no caso de A Última Viagem a Vegas ou a uma promoção atraente pelo preço baixo e um lugar diferente e excêntrico como O Exótico Hotel Marigold na Índia. O filme Antes de Partir mostra muitos lugares diferentes em uma viagem cuja motivação era cumprir uma lista de desejos antes de morrer.

5.2 Consumo nos diferentes momentos: “Acredite em mim, eu ainda posso”

A análise do consumo dos idosos nos diferentes momentos dos filmes auxilia a compreensão das transformações dos protagonistas a partir das viagens e experiências de lazer. De acordo com o antropólogo Grant McCracken (2007)McCracken, G. (2007). Cultura e consumo: uma explicação teórica da estrutura e do movimento do significado cultural dos bens de consumo. Revista de Administração de Empresas, 47(1), 99-115. https://doi.org/10.1590/S0034-75902007000100014
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o consumo possui uma relação direta com a cultura e os valores sociais em que se está inserido. Assim, o consumo contribui para a definição dos valores e da cultura dos indivíduos de uma sociedade atribuindo significados aos bens e serviços. As viagens possuem significados nos filmes, sendo, a partir delas, que os personagens iniciam mudanças em seus estilos de vida. As mudanças no consumo podem ser divididas em três momentos dos filmes: antes, durante e depois da viagem.

No início foi comum encontrar referências ao uso de medicamentos, às doenças, à tratamentos de saúde, bem como estados de tristeza, depressão e solidão. Os personagens, frequentemente, eram apresentados dentro de casa, com poucas cenas que mostrassem interações sociais e mesmo de consumo de bens materiais e serviços. As atividades diárias dos protagonistas são mostradas como rotineiras e o lazer caracterizado por atividades passivas e tranquilas como leitura, assistir televisão e jogar cartas.

Ainda no primeiro momento, os personagens idosos são mostrados como solitários como, por exemplo, quando aparecem em casa, deprimidos e com sentimento de nostalgia dos tempos passados. Um dos personagens – Norman – (O Exótico Hotel Marigold) busca preencher a solidão frequentando eventos de “encontros às cegas” (blind date) em busca de um relacionamento amoroso. O personagem mente sobre sua idade, mas é desmascarado e ignorado por uma mulher mais nova, mas Norman insiste em seu desafio e luta para se relacionar com a mulher mais jovem dizendo: “acredite em mim, eu ainda posso”.

No segundo momento, quando os personagens decidem viajar e iniciam suas viagens, transformações começam a aparecer nos personagens idosos que começam a viver novas experiências a partir de suas viagens. As viagens trazem aventuras e desafios e o consumo rotineiro e tranquilo dá lugar a experiências como pular de paraquedas, fazer tatuagem, andar de tuk tuk (meio de transporte popular na Índia), andar de motocicleta, pilotar carros de luxo em alta velocidade, ir a safaris, ir para discotecas e festas, fazer trilhas. O consumo de bebidas aparece com destaque nas cenas com esses novos lugares como cenário.

No terceiro e último momento, caracterizado pelas cenas que mostram o que acontece com os idosos após a experiência da viagem, temos personagens que modificam os padrões de consumo anteriores como exemplificados nas descrições a seguir:

Situação 1: Idoso aparece no início do filme com sintomas de depressão após a morte da esposa, sendo representado com pijamas e consumo de grande número de remédios. Passa aproximadamente um ano isolado dentro de casa evitando contato com pessoas e se limitando a assistir televisão. Durante a viagem, vivencia novas experiências a partir de sua nova realidade de viúvo e se abre a novas oportunidades. Ao final do filme, aparece feliz e com vitalidade em companhia da nova namorada e sua neta indo para um evento a céu aberto (Última Viagem a Vegas).

Situação 2: Personagem preconceituosa e racista leva uma diversidade de alimentos da Inglaterra em sua viagem para Índia. No decorrer do filme, seus preconceitos acabam se dissipando e ela passa a enxergar os indianos e sua comida com empatia. Ao final do filme, decide permanecer na Índia onde inicia trabalho como gerente do hotel em que está hospedada. (O Exótico Hotel Marigold).

Situação 3: Outro caso é uma personagem que passa a utilizar notebook em decorrência da viagem. A personagem foi dona de casa por toda a vida e dependente do marido em vários aspectos da vida. Após a morte do marido, decide viajar para Índia e registrar suas experiências em um blog pessoal. Para isso, ela que não possuía conhecimentos prévios de tecnologia, adquire um notebook e escreve publicações sobre seus sentimentos, situações e experiências vividas na sua nova etapa de vida (O Exótico Hotel Marigold).

A socialização e o consumo possuem uma estreita conexão como outros estudos já mostraram (Ekström, 2006Ekström, K. M. (2006). Consumer Socialization Revisited. Research in Consumer Behavior, 10, 71-98.; Moschis, 2007Moschis, G. P. (2007). Life course perspectives on consumer behavior. Journal of the Academy of Marketing Science, 35(2), 295-307. https://doi.org/10.1007/s11747-007-0027-3
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; Setton, 2011Setton, M. G. J. (2011). Teorias da socialização: um estudo sobre as relações entre indivíduo e sociedade. Educaçao e Pesquisa: Revista da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, 37(4), 711-724. https://doi.org/10.1590/S1517-97022011000400003
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). Os filmes mostram a criação de novos laços sociais durante a viagem. Sendo a socialização uma motivação inicial ou não, as narrativas sugerem que os novos laços sociais podem estimular idosos a viver novas experiências. Fazer uma trilha, pular de paraquedas, andar de montanha russa, festas noturnas, andar de moto fizeram parte do processo de transformação dos personagens e são um contraponto das atividades passivas mostradas no início dos filmes. Essas experiências aventureiras mostradas são opostas à imagem estigmatizada e ridicularizada do envelhecimento mostrada nos filmes e que também já foram analisadas em outros estudos (Robinson & Popovich, 2003Robinson, T., & Popovich, M. (2003). Older adults' perceptions of offensive senior stereotypes in magazine advertisements: results of a Q method analysis. Educational Gerontology, 29(6), 503-519. https://doi.org/10.1080/713844392
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; Cohen-Shalev & Marcus, 2007Cohen-Shalev, A., & Marcus, E. L. (2007). Golden years and silver screens: Cinematic representations of old age. Journal of Aging, Humanities and the Arts, 1(1-2), 85-96. https://doi.org/10.1080/19325610701411062
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; Gatling, 2013Gatling, M. C. (2013). Representations of age and ageing in comedy film. Dissertation (Doctoral) - James Cook University).). Essas experiencias podem ser significativas para o processo de transformação dos personagens durante o filme visto que atividades de consumo passivas são substituídas por atividade ativas.

5.3 Envelhecimento e Estigma: “Você tem razão, não sou criança, sou um homem adulto”

O estudo de Gatling (2013)Gatling, M. C. (2013). Representations of age and ageing in comedy film. Dissertation (Doctoral) - James Cook University). mostra como os filmes de comédia trazem idosos com estética e comportamentos para fazer rir. Os personagens dos filmes analisados são também apresentados com estética estigmatizada característica de idosos como, por exemplo, personagens que usam boina/boné, celular preso na cintura, tênis de modelos antigos. Podemos observar cenas que mostram comportamentos que podem acontecer com pessoas de qualquer idade, mas que são, com mais frequência, associados aos velhos, como dirigir carros de forma atabalhoada, levar tombos e derrubar objetos.

O estigma de acordo com Goffman (1963, p.13)Goffman, E. (1963). Estigma: notas sobre a manipulação da identidade manipulada. 1ª edição. é “um atributo profundamente depreciativo”, ou seja, confere-se ao indivíduo comportamentos e expectativas associados a falha, defeito ou desvantagem, sendo este reduzido a um ser anormal, estranho, diferente e menosprezado. Debert (2004, p.14)Debert, G. G. (1999). A reinvenção da velhice: socialização e processos de reprivatização do envelhecimento. São Paulo: Edusp. afirma que “a velhice é tratada como uma etapa da vida caracterizada pela decadência física e ausência de papéis sociais”. Em algumas cenas e passagens dos filmes, foi possível identificar um reforço ao estigma relacionado a velhice. Mesmo considerando que mudanças são inerentes às diferentes idades, o envelhecimento é mostrado de forma irônica, como uma etapa da vida decadente, com situações que sugerem limites dos personagens que quase não saem de casa e levam uma vida com rotinas rígidas como na cena com Bill (Por Aqui e Por Ali) descrita a seguir:

Bill telefona para amigos para convidá-los a viajar com ele e fazer a Trilha dos Apalaches. As respostas, ainda que com um tom engraçado, se referem a situações de impossibilidade devido ao envelhecimento associadas, por exemplo, a falta de saúde e mobilidade: “Bem que eu queria, mas troquei de medicação. Mal consigo me vestir...”; “Da próxima vez, me chame para algo divertido. Tipo uma colonoscopia!”; “Nesta vida, não!”; “Bill, você pode ver a trilha toda na internet em quatro minutos.” A incredulidade de um dos amigos diante do convite o fez duvidar que a voz da gravação que fazia o convite para a trilha não era verdadeira.

Outro aspecto limitante se refere ao posicionamento dos familiares em relação às viagens planejadas pelos protagonistas idosos. Nos quatro filmes as famílias não aceitam o fato dos idosos viajarem e eles são chamados de “loucos”. O filho de Evelyn (O Exótico Hotel Marigold) manifesta seu estranhamento com o fato dela viajar após a morte do marido; a esposa de Carter (Antes de Partir) não aceita que ele viaje com um amigo, a esposa e o filho de Bill (Por Aqui e Por Ali) tentam convence-lo a não viajar; Archie (A Última Viagem a Vegas) mente sobre a viagem que faz escondida do filho.

Durante e após as viagens, no entanto, os personagens trazem situações que fogem do estigma como, por exemplo, o envolvimento amoroso e sensualizado, o consumo de bebidas alcóolicas e diferentes experiências desafiadoras. Após a viagem, as mudanças ficam ainda mais claras e a representação negativa e às vezes ridicularizada dos personagens vai se modificando nas quatro histórias narradas nos filmes. As transformações mostradas são diversas e envolvem, por exemplo, aspectos estéticos e situações de maior socialização que mostram novas pessoas e cenários. O envelhecimento adquire assim características mais positivas e menos estigmatizadas.

A transformação pode ser exemplificada a partir da relação entre Archie e seu filho (Última Viagem a Vegas). Ele mente para o filho sobre sua viagem a Las Vegas, mas o filho instala um rastreador no celular do pai, vai até o destino e repreende o pai. O diálogo entre eles se inicia com uma inversão de papéis, ou seja, o filho repreendendo e “infantilizando” o pai: “Você não pode fazer esse tipo de coisa. Você não é mais criança.”. Mas a resposta do pai consegue mostrar que quer ser visto como “vivo”:

“Você tem razão. Não sou criança. Sou um homem adulto que foi a despedida de solteiro de um grande amigo. Para começar, eu não devia precisar mentir (...) não sou um velho debilitado. Há muita vida dentro de mim. E vou vivê-la fazendo as coisas que eu gosto. Uma delas é dançar e a outra é tomar um drink. Já dancei, e agora, se quiser me acompanhar, eu adoraria beber com meu filho.”

As viagens transformadoras narradas nos filmes brigam com o estigma do envelhecimento socialmente construído e representado em diversas imagens e falas dos quatro filmes como, por exemplo, a pergunta de Evelyn (O Exótico Hotel Marigold): “É nossa culpa achar que somos muito velhos para mudar?” Nesse momento do ciclo vital, as experiências identitárias, que anteriormente estavam predominantemente associadas ao trabalho, dão lugar a experiências identitárias pagas como as viagens de lazer transformadoras. Ransome (2005)Ransome, P. (2005). Work, consumption and culture: affluence and social change in the twenty-first century. Sage. descreve alguns tipos de consumo associados a identidades ocupacionais de escape do trabalho, como as viagens turísticas, que representam escapes dos personagens do estigma de passividade e de conformidade que acompanha o envelhecimento.

6 DISCUSSÃO FINAL

Idosos são vistos como um segmento lucrativo do mercado de entretenimento (Patterson, 2006Patterson, I. R. (2006). Growing older: tourism and leisure behaviour of older adults. Oxford: Cabi. https://doi.org/10.1079/9781845930653.0000
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; Glover & Prideaux, 2009Glover, P., & Prideaux, B. (2009). Implications of population ageing for the development of tourism products and destinations. Journal of Vacation Marketing, 15(1), 25-37. https://doi.org/10.1177/1356766708098169
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). Viagens como experiências transformadoras é um tema que possui uma grande avenida para ser estudado por diferentes áreas do conhecimento tais como comportamento do consumidor e turismo. No turismo, nossa inspiração veio dos estudos recentes (Kirillova et al. 2017aKirillova, K., Lehto, X., & Cai, L. (2017a). Tourism and existential transformation: an empirical investigation. Journal of Travel Research, 56(5), 638-650. https://doi.org/10.1177/0047287516650277
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; 2017bKirillova, K., Lehto, X., & Cai, L. (2017b). What triggers transformative tourism experiences?. Tourism Recreation Research, 42(4), 498-511. https://doi.org/10.1080/02508281.2017.1342349
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) que localizam nas experiências de viagens a possibilidade de mudanças positivas e duradouras na autenticidade existencial dos indivíduos. Embora a contribuição do turismo para o bem-estar do idoso não possa ser subestimada, sabe-se que idosos encontram dificuldades em suas experiências de lazer.

Patterson (2006)Patterson, I. R. (2006). Growing older: tourism and leisure behaviour of older adults. Oxford: Cabi. https://doi.org/10.1079/9781845930653.0000
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observou que estudos na área de turismo sugerem idosos como fisicamente capazes de viajar e de aproveitar atividades que são destinadas aos mais jovens, divulgando a crença de que viagens trazem a sensação de rejuvenescimento. Essa narrativa otimista exclui aqueles que não se encontram financeiramente, fisicamente ou mentalmente capazes de participar de viagens de lazer, o que tem dado origem a estudos que buscam retratar de forma mais crítica a realidade dos idosos como turistas, como o trabalho de Sedgley et al. (2017)Sedgley, D., Pritchard, A., Morgan, N., & Hanna, P. (2017). Tourism and autism: journeys of mixed emotions. Annals of Tourism Research, 66, 14-25. https://doi.org/10.1016/j.annals.2017.05.009
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que une turismo e gerontologia a partir de uma perspectiva crítica. Buscamos no ambiente ficcional viagens transformadoras e encontramos quatro filmes que trazem experiências predominantemente otimistas e positivas para os corajosos personagens idosos em busca de mudanças e aventuras. Hall (1997)Hall, S. (1997). The spectacle of the “Other”. In: Hall, S.; Evans, J.; Nixon, S. (Orgs.). Representation: cultural representations and signifying practices. Londres: Sage, 225-279. aborda a ideia da transcodificação de representações no cinema em que visa reverter estereótipos e neutralizar imagens negativas, “ou seja, tomar um significado existente e reapropriar-se dele para criar novos significados” (HALL, 1997Hall, S. (1997). The spectacle of the “Other”. In: Hall, S.; Evans, J.; Nixon, S. (Orgs.). Representation: cultural representations and signifying practices. Londres: Sage, 225-279.: 270). Os filmes analisados permitiram fazer interpretações que contribuem para reflexões sobre estereótipos e estigmas construídos, inclusive pelo cinema, e oferece a possibilidade de novos olhares para essa última e desafiadora etapa de ciclo vital.

O mercado de viagens de lazer oferece inúmeras variações de ofertas de entretenimento para uma grande diversidade de perfis de idosos, o que sugere muitas possibilidades de experiências transformadoras para serem estudadas. Algumas áreas de conhecimento, assim como também a indústria cinematográfica, passaram um longo tempo encantados com a juventude. Ainda que idosos ganhem relevância social e econômica, suas representações parecem ainda confusas nas diferentes mídias, o que pode sugerir não só a diversidade do segmento, mas também dificuldade das empresas em enxergarem os idosos e o lugar de cada vez mais destaque que ocupam na sociedade, nas cidades e nas viagens.

Trazemos a filosofia existencial (Heidegger, 1962Heidegger, M. (1962). Being and time. London: SCM Press.; Sartre, 1966Sartre, J.-P. (1966). Being and nothingness. New York: Washington Square Press.; May, 1977May, R. (1977). The meaning of anxiety. New York, NY: Norton.) para nos inspirar e apoiar na discussão final sobre essa pesquisa baseada em textos da cultura que falam da novidade associada à uma viagem que contempla novos lugares, que possibilita observar novas culturas e leva à participação de atividades fora da rotina, dando origem a uma liberdade que não pode ser atingida na vida cotidiana.

As experiências turísticas sugerem transformações pessoais e se conectam com a busca por autenticidade existencial. A situação existencial é considerada inerente a todos os seres humanos, independente de faixa etária, gênero ou classe social. O existencialismo vê o indivíduo como lançado no mundo da falta de sentido, de liberdade incondicional, alienação universal e morte final. Essa é uma visão filosófica chamada de condição existencial (Yalom, 1980Yalom, I. (1980). Existential psychotherapy. New York: Basic Books.) e que aparece nas experiências vividas pelos personagens que estão na fase final do ciclo vital nos filmes selecionados.

A condição existencial pode provocar a ansiedade existencial, que é a angústia em relação ao real significado da vida e da morte (Weems et al. 2004Weems, C. F., Costa, N. M., Dehon, C., & Berman, S. L. (2004). Paul Tillich's theory of existential anxiety: A preliminary conceptual and empirical examination. Anxiety, Stress & Coping, 17(4), 383-399. https://doi.org/10.1080/10615800412331318616
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), mais presente no final do ciclo de vida. Atrelado a ansiedade existencial, a autenticidade existencial é outro conceito trazido por essa lente filosófica (Wang, 1999Wang, N. (1999). Rethinking authenticity in tourism experience. Annals of Tourism Research, 26(2), 349–370. https://doi.org/10.1016/S0160-7383(98)00103-0
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). A autenticidade surge como um estado de ser quando existe uma busca por ser fiel aos próprios valores como indicam os personagens idosos ao empreenderem suas viagens.

Nos cenários dos filmes, a ansiedade existencial - “uma apreensão sobre o significado último da vida e da morte” - (Weems et al. 2004Weems, C. F., Costa, N. M., Dehon, C., & Berman, S. L. (2004). Paul Tillich's theory of existential anxiety: A preliminary conceptual and empirical examination. Anxiety, Stress & Coping, 17(4), 383-399. https://doi.org/10.1080/10615800412331318616
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, p.383), leva os idosos a enfrentar aspectos sombrios e caóticos da vida, bem como a certeza da morte e buscar em suas viagens a autenticidade existencial. Esse modo ideal de ser com origem na filosofia, pode ser alcançado quando o indivíduo se situa no mundo de acordo com seu sistema de valores pessoais, identifica níveis de liberdade e alienação e aceita a finitude de sua existência (Wang, 1999Wang, N. (1999). Rethinking authenticity in tourism experience. Annals of Tourism Research, 26(2), 349–370. https://doi.org/10.1016/S0160-7383(98)00103-0
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).

Os idosos representados no cinema enfrentam a ansiedade existencial em suas rotinas permeadas por dificuldades da vida, caos do cotidiano que os desafiam diariamente ou mesmo a certeza mais próxima da morte. Essas são condições propícias para identificar a autenticidade existencial. As viagens aparecem como a busca dos personagens por equilíbrio entre a ansiedade e a autenticidade existencial em suas vidas em sociedade. As viagens são uma alternativa para que os personagens idosos criem significados para sua existência, ainda que aceitem sua finitude. As viagens dos idosos representadas no cinema mostram uma alternativa para o encontro de equilíbrio dos personagens entre seus ideais de liberdade e alienação como contemplados pela filosofia existencial (Wang, 1999Wang, N. (1999). Rethinking authenticity in tourism experience. Annals of Tourism Research, 26(2), 349–370. https://doi.org/10.1016/S0160-7383(98)00103-0
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).

Embora esse estudo analise representações e os estudos de Kirillova et al. (2017aKirillova, K., Lehto, X., & Cai, L. (2017a). Tourism and existential transformation: an empirical investigation. Journal of Travel Research, 56(5), 638-650. https://doi.org/10.1177/0047287516650277
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; 2017b)Kirillova, K., Lehto, X., & Cai, L. (2017b). What triggers transformative tourism experiences?. Tourism Recreation Research, 42(4), 498-511. https://doi.org/10.1080/02508281.2017.1342349
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investiguem experiências turísticas reais transformadoras, fazemos aqui uma comparação de forma a produzir insights que auxiliem estudos futuros no uso da lente da filosofia existencial para compreender transformações ocorridas a partir de experiências de viagem com idosos. Os estudos de viagens transformadoras de KIrillova et al. (2017a; 2017b.) encontraram, por exemplo, que eventos que desencadeiam a transformação tendem a acontecer no final da viagem, evocam emoções intensas, que deve haver um episódio desencadeador para que a transformação aconteça, que a transformação do eu não é um fator de motivação para a viagens transformadoras, que o potencial transformador está em eventos fortuitos e que turistas não fazem reflexões sobre questões existenciais durante a viagem. As narrativas dos filmes, no entanto, mostram a transformação como um processo que possui reflexões, eventos, lugares e tempos específicos para cada história e personagem. Seria o momento do ciclo vital uma característica que traz especificidades para as viagens transformadoras?

Os filmes mostram discussões e preocupações que se relacionam com questões existenciais físicas, intelectuais e espirituais como liberdade, alienação, mortalidade, significado da vida. As viagens contribuem para que tenham consciência da ansiedade existencial, ao mesmo tempo em que possibilitam o resgate da autenticidade existencial. As viagens tornam os personagens mais conscientes das limitações do ambiente rotineiro típico da vida de um idoso e que de certa forma se subordinavam.

Para os personagens de “O Exótico Hotel Marigold” a exposição a um modo alternativo de existência na Índia, local culturalmente diferente do habitual, proporcionou a percepção de que viver um novo estilo de vida, diferente dos ambientes rotineiros dos locais de origem, apresentou-se mais adequado às aspirações do momento de suas vidas. Uma melhor compreensão da existência por meio do autoconhecimento, que o distanciamento ajudou a construir, trouxe a percepção de uma vida mais adequada na Índia para alguns personagens. Durante a viagem eles decidem permanecer na Índia, uma vez que, os valores culturais e sociais estavam melhores alinhados com as descobertas recentes sobre novas possibilidades de existência. A história contada sobre o grupo de idosos sugere que experiências de viagem podem ser capazes de solidificar modos alternativos de existência não mais reconhecidos em seus locais de origem proporcionando um estilo de vida mais autêntico.

Ao decidirem realizar a viagem, os personagens foram obrigados a reconciliar suas ideias e desejos de vivenciar essas experiências com as expectativas sociais associadas a representações estigmatizadas. Alguns personagens foram ridicularizados ou mal compreendidos por familiares, amigos e prestadores de serviços. Tais situações fizeram com que os personagens passassem a refletir sobre o fundamento de sua existência, bem como sobre a liberdade de serem quem gostariam de ser.

Na última parte dos filmes em que há o retorno da viagem, foi possível perceber transformações individuais dos personagens. Ao voltarem à realidade e às atividades rotineiras os personagens passam a ser mais respeitados e melhores aceitos pelas pessoas de sua rede de relacionamento. Eles trazem associações positivas como vitalidade e alegria e mostram uma mudança, se comparamos com o início dos filmes, nas relações e papéis sociais tais como: retorno ao trabalho, relações amorosas, socialização, papel ativo dentro do arranjo familiar. Ao retornarem transformados para o ambiente rotineiro, os personagens idosos não mostram interesse em se adequar às expectativas impostas pela sociedade e sim parecem ter adquirido mais individualidade. Mesmo no filme “Antes de Partir”, em que os personagens morrem no final, é possível identificar um período de pós-viagem de reencontro com a família, com a rotina e de enfrentamento da morte que seria inevitável em curto prazo em decorrência da doença que estavam sujeitos. No entanto, podemos identificar que houve uma resignificação da morte e de suas próprias existências.

Durante as viagens, os personagens idosos refletem sobre a existência e sobre suas identidades. Foi possível identificar reflexões sobre mortalidade e finitude da vida, além do não reconhecimento de sua atual posição social e autoimagem como velhos. No diálogo entre Madge e o grupo de amigos em “O Exótico Hotel Marigold”, após a morte de um dos idosos companheiro de viagem, anotamos um exemplo de reflexão: “Quando alguém morre, você pensa na própria vida. E eu não quero envelhecer. Não quero que me tratem com condescendência. Para tornar-me marginalizada e ignorada pela sociedade. Não quero ser o primeiro refém a ser liberado do avião.” As viagens dos idosos são mostradas como possibilidade de fazerem revisões, reinterpretações e reformulações sobre si próprios e sobre a vida nesse momento do ciclo vital.

Hall (2006)Hall, S. (2006). A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A apresenta o sujeito pós-moderno como isento de uma identidade parcial ou totalmente imaculada ou inata. Dessa maneira, o indivíduo possui várias identidades e não deve mais ser representado de forma única, mas por meio dos diversos ângulos e fragmentos que o constitui, formando “identidades temporárias” levando em consideração diferentes aspectos do sujeito como o cultural, o social e o biológico. Podemos obeservar isso nos personagens dos filmes a partir do momento que a busca por um novo sentido para vida, propicia o surgimento de uma nova identidade condizente com as atuais aspirações dos personagens, mas que podem mudar dependendo de novas necessidades e de novos anseios que eventualmente podem surgir. A diversidade do público idoso também foi representada pelos personagens na medida em que cada um possuia diferentes formas de representação nos filmes.

O cinema como prática social reconhece sujeitos que se materializam como representações simbólicas. Conforme Hall (2016)Hall, S. (2016). Cultura e representação. PUC-Rio: Apicuri., essa construção social é o que confere sentido e significado. Os idosos são representados no cinema muitas vezes estereotipados e estigmatizados. As novas formas de representações desses sujeitos identificados nos filmes possibilitou a reflexão sobre novos signos do envelhecimento. Como os significados não são fixos como nos lembra Hall (2016)Hall, S. (2016). Cultura e representação. PUC-Rio: Apicuri., as novas representações trazidas no cinema para os idosos que buscam viagens transformadoras trazem mais um discurso e imagens contundentes para ressignificar essa etapa da vida.

Os filmes mostram reflexões existenciais junto com as viagens transformadoras, mas não é esse mesmo um dos papeis do cinema? Provocar reflexões. De acordo com Uhrig (2005)Uhrig, S. C. (2005). Cinema is good for you: the effects of cinema attendance on self-reported anxiety or depression and ‘happines. 14, University of Essex. ISER Working Paper Series., o cinema tem um profundo impacto na sociedade, pois suas narrativas e representações possuem uma forma de arte única, caraceterizando-se como uma extensão do mundo e uma maneira de respresentá-lo. Assim como as viagens transformadoras, o cinema também traz felicidade, além de ser capaz de combater a ansiedade e a depressão.

A lente da filosofia existencial possibilitou a reflexão sobre as três categorias de análise identificadas. Apesar de cada personagem ter uma motivação pessoal para empreender a viagem e para a escolha das experiências, observamos que estas foram realizadas pelo incômodo provocado pela ansiedade existencial e pela busca por experiências autênticas e pela resignificação da vida. Em relação ao consumo, foi possível identificar mudanças nas formas de consumir no início, no meio e no final dos filmes. O que verificamos foi uma transformação na forma de consumo mais alinhada com o posicionamento dos personagens diante dos novos estilos de vida proporcionados pela experiência de viagem. A transformação alcançada pelo encontro de, um modo de vida mais autêntico propiciou para os personagens a quebra de estereótipos e estigmas que de, alguma maneira retiravam deles a liberdade de ser quem realmente eram ou quem gostariam de ser promovendo novas formas de representações de si.

Esse estudo parte de viagens transformadoras de idosos para selecionar os quatro filmes analisados dentre aqueles disponíveis em circuito comercial. No entanto, sugerimos que outras mídias sejam investigadas, tais como as diversas séries de streaming e novelas de TV, de forma a compreender significados e ressignificados do envelhecimento que possam influenciar experiências turísticas e/ou localizar outras transformações dos idosos no contexto do turismo.

Cabe destacar que no momento de seleção dos filmes que estariam dentro do escopo de pesquisa, identificamos que nem todas as abordagens em relação ao envelhecimento possuem o mesmo olhar. Embora a mídia de massa traga várias perspectivas sobre o envelhecimento, os filmes que tratam sobre viagens e turismo possuem um aspecto otimista e de oposição a alguns estigmas em relação a velhice e justamente por esse motivo foram escolhidos. Os quatro filmes trouxeram situações que apresentavam personagens inicialmente estigmatizados e que durante e após a viagem passam por um processo de transformação quebrando estereótipos e estigmas. No entando, esses filmes representam apenas uma parcela do universo de possíveis abordagens de investigação.

As viagens dos personagens proporcionaram alegrias, momentos de socialização, trocas culturais, fuga da rotina e ressignificação da existência. Mas o filme, assim como a vida, tem o seu desfecho, o que limita sua narrativa a um espaço de tempo. Pouco é mostrado sobre o que acontece depois das viagens, o que nos permite sinalizar essa limitação das representações do retorno como uma oportunidade para que investigações empíricas futuras. Esperamos que a análise desses filmes fique como um convite para a continuação em busca de mais contribuições para compreendermos viagens transformadoras de idosos. O que acontece na volta dessas experiências em suas “condições existenciais”?

AGRADECIMENTOS

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.

  • Como citar: Abreu, R. G.; Casotti, L. M. (2020). Viagens que Transformam a Condição Existencial: Narrativas e Representações em Filmes Protagonizados por Idosos. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, São Paulo, 14 (3), p. 14-31, set/dez. http://dx.doi.org/10.7784/rbtur.v14i3.1833

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Out 2020
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2020

Histórico

  • Recebido
    31 Ago 2019
  • Aceito
    16 Fev 2020
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