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Análise de uma sequência didática para o ensino de língua alemã na educação infantil

Analysis of a didactic sequence for German language teaching in Kindergarten

Resumo

Embora a linguagem oral seja fundamental em nossas vidas, pois é por intermédio dela que expressamos nossos sentimentos, pensamentos, desejos, experiências e construímos conhecimento, pouco se fala sobre ela na educação infantil. Nesse sentido, amparados na teoria dos gêneros textuais, na perspectiva do interacionismo sociodiscursivo (ISD) (Bronckart 2012; Schneuwly/ Dolz 2013), elaboramos uma sequência didática (SD) com base em dois contos de animais. Por meio dessa proposta intervencionista buscamos aprimorar a ordem do ensino e aprendizagem em um contexto escolar composto por crianças de faixa etária entre 03 e 04 anos de idade, os quais estão inseridos na rede particular de ensino. Para este artigo intentamos descrever e avaliar as configurações da SD elaborada, bem como analisar a presença de capacidades de linguagem. Além disso, apresentaremos resultados parciais das produções orais dos alunos. Ao analisarmos a SD, verificamos a predominância das capacidades de significação (15%) e das capacidades linguístico-discursivas (12,5%). Além disso, constatamos que a SD provê atividades para as produções orais das crianças, tendo em vista que os dois contos escolhidos e as atividades os envolvem emocionalmente, psicologicamente, bem como cognitivamente. Além de recontar a história, os alunos passaram a utilizar o vocabulário e até determinadas expressões em seu cotidiano.

Palavras-chave
sequência didática; educação infantil; língua alemã; interacionismo sociodiscursivo

Abstract

Though oral language is essential in our lives, since through it we express our feelings, thoughts, desires, experiences and build knowledge, little has been said about it in early childhood education. In this way, grounded on text genre theory, from the socio-discursive interactionist perspective (Bronckart 2012; Schneuwly/ Dolz 2013), we developed a didactic sequence (DS) based on two animal tales. Through this interventionist proposal, we concentrate on improving teaching and learning in a private kindergarten in which the participants are 3 to 4 year-old children. For this article we aim at describing and evaluating the configuration of the DS as well as analyzing it in terms of language capacities. In addition, we present partial results of the children's oral productions. Analyzing the DS, we found a prevalence of significance capacities (15%) and the linguistic-discursive capacities (12.5%). Our results show that the DS provides activities for children's oral production, considering that the two chosen stories and the activities involve them emotionally, psychologically and cognitively. In addition to retell the story, students began using the vocabulary and even certain expressions in their daily lives.

Key-words:
didatic sequence; childhood education; German language; sociodiscursive interactionism

Zusammenfassung

Obwohl die mündliche Kommunikation wichtig in unserem Leben ist, denn durch sie drücken wir unsere Gefühle, Gedanken, Wünsche, Erfahrungen und Wissen aus, wird darüber noch wenig im Kindergarten gesprochen. Deshalb wurde eine didaktische Unterrichtssequenz (DS) auf der Basis von zwei Tiermärchen entwickelt. Diese DS wurde von der Theorie der Textgenres gestützt aus der Perspektive des sozio-diskursiven Interaktionismus (SDI) (Bronckart 2012/ Schneuwly/ Dolz 2013). Durch diesen interventionistischen Vorschlag möchten wir das Lehren und Lernen einer Kindergartengruppe (Kinder zwischen 03 und 04 Jahren) von einer Privatschule verbessern. In dem vorliegenden Artikel möchten wir eine DS beschreiben und diskutieren, sowie die Sprachfähigkeiten analysieren. Darüber hinaus präsentieren wir Teilergebnisse der mündlichen Kommunikation der Schüler. Als wir die DS analysierten, entdeckten wir eine Dominanz der Sinnfähigkeiten (15%) und der sprachlich-diskursiven Fähigkeiten (12,5%). Außerdem fanden wir, dass die DS zur mündlichen Leistung der Kinder beitrug, wenn man bedenkt, dass beide ausgewählten Geschichten und Aktivitäten sie emotional, psychologisch und kognitiv fordeten. Außer der Nacherzählung der Geschichte benutzten die Schüler den Wortschatz und sogar bestimmte Ausdrücke in ihrem Alltag weiter.

Stichwörter
Unterichtsequenz; Kindergarten; deutsche Sprache; sozio-diskursiver Interaktionismus

Introdução

Este artigo é um recorte de uma dissertação em andamento,1 1 Mestrado em Letras, pela Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO). a qual possui como objetivo geral compreender qual é a contribuição dos contos de animais 2 2 Conforme Simonsen (1987: 8), o termo contos de animais "reserva-se [...] para os relatos em que os papéis principais, herói e adversários, são representados por animais enquanto tais". Trata-se de um relato curto, que possui uma fórmula inicial (Era uma vez, Um dia) e segue a sequência narrativa (Situação inicial; Complicação; Ações desencadeadas; Resolução e Situação final). Suas caraterísticas principais são a oposição dos seres domésticos e selvagens, presença de marcadores temporais, discurso direto, adjetivos, além de locuções para a apresentação de personagens e ambientes. para o ensino da Língua Alemã (LA) para crianças. Escolhemos essa temática em virtude da proposta do mestrado que visa a interface entre língua e literatura. Além disso, levamos em conta nossa experiência na Educação Infantil (EI), bem como a escassez de materiais didáticos para esse nível de ensino.

Em 2014, após a aprovação do nosso projeto pelo COMEP3 3 Projeto aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO), em 01/07/2014, sob o número CAAE 32786014.0.0000.0106. , da realização de observações e da elaboração do modelo didático (MD)4 4 De acordo com de Pietro et al. (1996/1997: 108, tradução nossa), trata-se de "um objeto descritivo e operacional, construído para apreender o fenômeno complexo da aprendizagem de um gênero". , foi produzida uma sequência didática (SD) para viabilizar a ação de linguagem (re)contação dos contos de animais (CA). Esse material foi aplicado nos meses de novembro/ dezembro e, posteriormente, analisado.

Para este artigo, pretendemos descrever e avaliar as configurações da SD elaborada. Para tanto, partimos do princípio de que os elementos de organização externa (as capacidades de linguagem utilizadas na SD) servem de base para a organização interna (os objetivos da SD) (Cristovão; Stutz 2011Cristovão, Vera Lúcia Lopes; Stutz, Lidia. Sequências Didáticas: semelhanças e especificidades no contexto francófono como L1 e no contexto brasileiro como LE. In: Szundy, Paula Tatiana Corrérra; Araújo, Júlio César; Nicolaides, Christine Siqueira; Silva, Kleber Aparecido da (org). Linguística Aplicada e sociedade: ensino e aprendizagem de línguas no contexto brasileiro. São Paulo, Pontes, 2011, v. 1, p. 17-40.). Além disso, pretendemos analisar as quatro capacidades de linguagem (CL)5 5 A definição de capacidades de linguagem será apresentada na seção 2.3. presentes na sequência didática, bem como apresentar resultados parciais6 6 São parciais, pois nossa pesquisa ainda está em andamento, portanto não podemos apresentar dados conclusivos. das produções orais dos alunos ao recontarem os contos nas aulas de alemão.

Para tanto, ancoramo-nos nos pressupostos teóricos do interacionismo sociodiscursivo, doravante (ISD) (Bronckart 2012Bronckart, Jean-Paul. Atividade de linguagem, textos e discursos. Por um interacionismo sóciodiscursivo. Trad. Anna Rachel Machado e Péricles Cunha. São Paulo: Educ, 2012.), que prevê a análise da linguagem na teoria de gêneros textuais, os quais, ao serem transpostos para o ensino, tornam-se um instrumento (Schneuwly; Dolz 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.)7 7 Em seu texto Gêneros e tipos de discurso: considerações psicológicas e ontogenéticas, SCHNEUWLY (2004) explica que essa noção de instrumento provém de Marx/ Engels (1845-1846/1969), para os quais os instrumentos materiais de produção condizem com o desenvolvimento das capacidades individuais. e, nos conceitos de modelo didático (MD), transposição didática (TD), SD e CL. Para realizar as análises da referida SD, tomamos por base as CL (Dolz; Schneuwly 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.; Cristovão; Stutz 2011Cristovão, Vera Lúcia Lopes; Stutz, Lidia. Sequências Didáticas: semelhanças e especificidades no contexto francófono como L1 e no contexto brasileiro como LE. In: Szundy, Paula Tatiana Corrérra; Araújo, Júlio César; Nicolaides, Christine Siqueira; Silva, Kleber Aparecido da (org). Linguística Aplicada e sociedade: ensino e aprendizagem de línguas no contexto brasileiro. São Paulo, Pontes, 2011, v. 1, p. 17-40.), bem como os critérios para elaboração e avaliação de SDs (Cristovão et. al. 2010Cristovão, Vera Lúcia Lopes; Stutz, Lidia. Sequências Didáticas: semelhanças e especificidades no contexto francófono como L1 e no contexto brasileiro como LE. In: Szundy, Paula Tatiana Corrérra; Araújo, Júlio César; Nicolaides, Christine Siqueira; Silva, Kleber Aparecido da (org). Linguística Aplicada e sociedade: ensino e aprendizagem de línguas no contexto brasileiro. São Paulo, Pontes, 2011, v. 1, p. 17-40.). Em relação à oralidade, amparamo-nos especialmente em Vygotsky (2001Vygotsky, Lev Semenovitch. Pensamento e Linguagem. Ed. Ridendo Castigat Mores, 2001. http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/vigo.html . Acesso em: 12 out. 2014.
http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/vigo...
), no catálogo de línguas do Ministério da Educação, Ciência e Cultura da Áustria (2005)Áustria, Ministério da Educação, Ciência e Cultura: Land Vorarlberg. Sprachliche Frühförderung im Kindergarten für vorwiegend Kinder mit nicht deutscher Erstsprache (Sprachticket), 2005. http://www.vorarlberg.at/pdf/sprachkatalog.pdf . Acesso em: 18 dez. 2014.
http://www.vorarlberg.at/pdf/sprachkatal...
, no Referencial Curricular Nacional de Educação Infantil (Brasil 1998aBrasil. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação. Referencial curricular nacional para a educação infantil. Brasília, SEF, 1998a, v.3, p. 117-157.), no Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas (Conselho da Europa 2001Conselho da Europa. Quadro Europeu Comum de Referência para Línguas. Porto, Asa Editores, 2001.) e nos Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil 1998b_____. Parâmetros Curriculares Nacionais: Terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental: língua portuguesa. Brasília, MEC/SEF, 1998b.).

A pesquisa mencionada foi realizada em uma escola particular do interior do Paraná, localizada em uma região de descendentes germânicos,8 8 No século XVIII, antigo Império Austro-Húngaro, povos provenientes de diferentes províncias do Reino Alemão imigraram para uma região às margens do rio Danúbio. Por conta de sua língua, o suábio (Schwäbisch), esse povo foi identificado como os súabios do Danúbio (Donauschwaben). Na segunda guerra, a Alemanha foi derrotada e os Donauschwaben foram expulsos dos territórios, agora pertencentes à Iugoslávia. Foi então que, por conta da Cáritas Suíça e do governo Getúlio Vargas, 500 famílias de imigrantes se estabilizaram no Brasil (Elfes 1971). com um grupo composto por 15 crianças de 3 a 4 anos, das quais 20% são falantes de dialeto9 9 A primeira fase da pesquisa, realizada em julho e agosto de 2014, refere-se à observação do grupo com base em duas fichas (contexto e individual) e de um diário. É por intermédio da ficha de observação individual que constatamos a quantidade de alunos falantes de dialeto denominado suábio (Schwäbisch). . Para melhor compreensão do contexto e das diferentes partes que compõem este trabalho de análise de SD, dividimos o artigo em seis partes: a) introdução, aqui apresentada; b) fundamentação teórica que se ancora no interacionismo sociodiscursivo na escola, na SD, nas CL e na apreensão da oralidade; c) metodologia; d) descrição e análise da SD aplicada; e) análise das produções orais dos alunos ao recontarem os contos nas aulas de alemão e f) considerações finais.

1 Fundamentação teórica

1.1 O interacionismo sociodiscursivo na escola

O ISD é uma corrente da psicologia da linguagem desenvolvida a partir de 1980 por Bronckart e seus colaboradores de Genebra, a qual prevê a descrição de gêneros de texto para o ensino, visando a sua apropriação e consequente utilização. Essa orientação epistemológica provém do interacionismo social (IS) e seus principais objetivos são apontar o papel fundador da linguagem, assim como "o funcionamento discursivo/a atividade discursiva no desenvolvimento humano" (Lousada 2010Lousada, Eliane Gouvêa. A abordagem do interacionismo sociodiscursivo para a análise de textos. In: Carlos, Josely Teixeira; Cunha, Cleide Lúcia; Piris, Eduardo Lopes. (Org.). Abordagens metodológicas em estudos discursivos - II EPED. São Paulo, Paulistana, 2010, v. 1, s/p.: 1). Parte-se do pressuposto de que diariamente entramos em contato com os mais diversos gêneros, desde um e-mail a uma receita ou uma conferência. Muitas vezes, embora esses sejam desconhecidos ou esse processo seja inconsciente, acercamo-nos das suas regras e de suas propriedades (Machado 2009Machado, Anna Rachel; Cristovão, Vera Lúcia Lopes. Representações sobre o professor e seu trabalho em proposta institucional brasileira para a formação docente. In: Abreu-Tardelli, Lília Santos; Cristovão, Vera Lúcia Lopes. (orgs). Linguagem e educação: o trabalho do professor em uma nova perspectiva. Campinas, Mercado de Letras, 2009, v.1, p. 117-136.a). Dessa forma, acreditamos que quanto mais gêneros conhecermos, melhor saberemos nos expressar tanto na linguagem oral, quanto na escrita.

Nesse contexto também se insere a educação infantil (EI). A criança, desde pequena, antes mesmo de saber ler, entra em contato com os mais diversos gêneros, tanto escritos quanto orais. Os contos de animais, de fadas, maravilhosos, por exemplo, encantam, envolvem, aguçam a criatividade e são a porta de entrada para outros gêneros. No entanto, nem sempre esses são descritos, propostos e tematizados de maneira a contribuir significativamente para o ensino.

Os autores Schneuwly/ Dolz (2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.: 65) defendem que "a escola é tomada como autêntico lugar de comunicação e as situações escolares como ocasiões de produção/recepção de textos", ou seja, o trabalho com gêneros nesse ambiente deve levar em conta como eles realmente funcionam nas práticas de linguagem de referência. Essas, por sua vez, devem ser reproduzidas por intermédio da recriação de situações que possibilitem o aprendizado. Desse modo, é necessário pensar nos nossos objetivos de aprendizagem ao trabalhar com gêneros, que deixam de ser somente um instrumento de comunicação e passam a ser um objeto de ensino e aprendizagem (cf. Schneuwly 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.). ,

Para que possamos apreender as dimensões ensináveis do conhecimento mais científico no âmbito escolar, recorremos à TD. Esse termo surgiu em 1975, por intermédio do sociólogo Michel Verret (1975Verret, Michel. Le temps des études. Paris, Librairie Honoré Champion, 1975.: 140), para o qual "toda a prática de ensino de um objeto pressupõe, com efeito, a transformação previamente desse objeto em objeto de ensino"10 10 "Toute pratique d'enseignement d'un objet présuppose en effet la transformation préalable de son objet en objet d'enseignement." (Verret 1975: 140). . Já para Chevallard (1985Chevallard, Yves. La transposition didactique: du savoir savant au savoir enseigné. Grenoble: La Pensée Sauvage, 1985.: 6 apud Stutz 2012Stutz, Lidia. Sequências didáticas, socialização de diários e autoconfrontação: instrumentos para a formação inicial de professores de inglês. Tese de Doutorado. PPGEL/UEL, Londrina, 2012.: 93), trata-se da "passagem do saber como instrumento a ser posto em uso ao saber como um objeto a ensinar e a aprender". Ela pode ocorrer "no nível externo e interno. O nível externo é a transformação de um 'objeto a saber' para um 'objeto a ensinar' e o nível interno é a continuação da transformação do 'objeto a ensinar' para o 'objeto ensinado'" (Schneuwly 2009 apud Stutz 2012Stutz, Lidia. Sequências didáticas, socialização de diários e autoconfrontação: instrumentos para a formação inicial de professores de inglês. Tese de Doutorado. PPGEL/UEL, Londrina, 2012.: 93). Trata-se da transformação dos saberes científicos em escolares.

No entanto, essa transformação do conhecimento científico não se dá de forma automática. Para que isso seja possível, precisamos apreender as dimensões ensináveis dos gêneros a fim de transpô-las em conhecimento escolar, por intermédio de dois instrumentos: modelo didático e sequência didática.

1.2 A sequência didática

O desenvolvimento humano gerou novas capacidades, entre elas a linguagem. Para Vygotsky (2001Vygotsky, Lev Semenovitch. Pensamento e Linguagem. Ed. Ridendo Castigat Mores, 2001. http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/vigo.html . Acesso em: 12 out. 2014.
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), a linguagem age sobre nós, nossos comportamentos, nossas representações, constituindo assim nosso psiquismo individual e desenvolvendo, ao mesmo tempo, a partir da atividade coletiva, o social, origem de todo esse processo (cf. Bronckart 2012Bronckart, Jean-Paul. Atividade de linguagem, textos e discursos. Por um interacionismo sóciodiscursivo. Trad. Anna Rachel Machado e Péricles Cunha. São Paulo: Educ, 2012.).

Dessa forma, à medida que a sociedade progride, a exigência de que seus integrantes comuniquem-se de uma forma cada vez mais eficaz aumenta e se torna necessário ensinar o maior número de gêneros possíveis. Porém, para Abreu-Tardelli (2007Abreu-Tardelli, Lília Santos. Elaboração de sequências didáticas: ensino e aprendizagem de gêneros em língua inglesa. In: Damianovic, Maria Cristina (org.). Material didático: elaboração e avaliação. Taubaté: Cabral, 2007, p. 73-85.: 74-75), ensinar gêneros não é somente ensinar a comunicar. Para a autora, precisamos cada vez mais, "formar sujeitos agentes do mundo e no mundo, agentes que transformarão o mundo e serão transformados por eles". Mas quais são os instrumentos que possibilitam isso? O ISD preconiza a utilização e apropriação de gêneros textuais. Sua tese central é "que a ação constitui o resultado da apropriação, pelo organismo humano, das propriedades da atividade social mediada pela linguagem" (Bronckart 2012Bronckart, Jean-Paul. Atividade de linguagem, textos e discursos. Por um interacionismo sóciodiscursivo. Trad. Anna Rachel Machado e Péricles Cunha. São Paulo: Educ, 2012.: 42). Foi a partir desse conceito e da noção de TD de Chevallard (1985Chevallard, Yves. La transposition didactique: du savoir savant au savoir enseigné. Grenoble: La Pensée Sauvage, 1985.), que Dolz, Noverraz e Schneuwly (2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.) planejaram a construção do MD, o qual possibilita o levantamento das dimensões ensináveis do gênero e serve como um guia na elaboração da SD.

Conforme os autores (ibid.: 82), a SD é "um conjunto de atividades escolares organizadas, de maneira sistemática, em torno de um gênero textual oral ou escrito". Sua estrutura básica é composta por uma apresentação da situação, produção inicial, módulos e pela produção final. O esquema a seguir ilustra a estrutura citada:

Figura 1
Sequência didática

A apresentação inicial da situação é composta pela construção da "representação da situação de comunicação e da atividade de linguagem a ser executada" (Dolz/ Noverraz/ Schneuwly 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.: 84). A partir dessa definição, fica claro que criamos expectativas e motivamos os alunos ao lhes mostrarmos explicitamente o gênero a ser trabalhado, ao tratarmos a importância do conteúdo que será abordado e falarmos sobre a produção que será posteriormente exigida (oral ou escrita?), sobre o destinatário dessa produção (a quem se dirige?), bem como a forma que ela assumirá (áudio, vídeo, folheto, etc.) e quem participará dela (todos, parte da turma?).

Já a produção inicial consiste em diagnosticar as potencialidades, bem como as dificuldades de cada aluno, ou seja, o professor passa a considerar os pré-conhecimentos sobre o gênero e a pensar e planificar a sua futura prática. Os módulos visam a "trabalhar os problemas11 11 Os módulos possibilitam o trabalho com problemas de níveis diferentes, ou seja, um atendimento mais individualizado. que apareceram na primeira produção e de oferecer aos alunos os instrumentos necessários para superá-los" (Schneuwly/ Dolz/ Noverraz 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.: 87). É na produção final que o aluno põe em prática tudo aquilo que aprendeu durante a SD. É justamente nessa fase que percebemos se os objetivos da SD foram alcançados ou não e de que forma o trabalho ainda pode ser aprimorado. Trata-se do resultado do trabalho realizado desde a apresentação da situação.

No entanto, o trabalho com SDs não visa somente o aprimoramento da produção de textos orais ou escritos, mas que o aluno se torne apto a escolher sozinho o gênero adequado, pois dependendo da formação social e do contexto, um gênero pode ser "mais ou menos pertinente para determinada situação de ação" (Machado 2005Machado, Anna Rachel. A Perspectiva Interacionista Sociodiscursiva de Bronckart. In: Meurer, José Luis; Bonini, Adair; Motta-Roth, Désirée. (orgs.). Gêneros: teorias, métodos e debates. São Paulo: Parábola Editorial, 2005, p. 237-259.: 250). Conforme Bronckart (2010_____. Gêneros de textos, tipos de discurso e sequências. Por uma renovação do ensino da produção escrita. In: Letras, Santa Maria, v. 20, n. 40, 2010, p. 163-176. ), a SD só deveria ser construída após a elaboração do MD e contemplar, se possível, todas as CL. Na próxima seção explicaremos o que são essas capacidades e sua relevância para o nosso estudo.

Capacidades de linguagem

Ler, compreender e produzir textos demandam o ensino e a aprendizagem de capacidades específicas, as quais, por sua vez, constituem ações de linguagem que originam novos textos. A ação de linguagem foi definida pela primeira vez por Voloshinov (Bakhtin 2006: 127)12 12 A escola de Genebra assume a autoria de Voloshinov para a obra "Marxismo e Filosofia da Linguagem" (1979/1992), no entanto, a edição brasileira usada ainda cita Bakhtin. como "formas e os tipos de interação verbal em ligação com as condições concretas em que se realizam". Esse conceito foi repensado por Dolz, Pasquier e Bronckart (1993_____. Pasquier, Auguste; Bronckart, Jean-Paul. L'acquisition des discours: émergence d'une compétence ou apprentissage de capacités langagières diverses? In: Etudes de linguistique appliquée, n. 92, 1993, p. 23-37. : 28) para os quais se trata de "uma estrutura que conduz a produção, compreensão, interpretação e / ou memorização de um conjunto organizado de enunciados orais ou escrito (ou texto, no sentido geral que damos a esse termo)"13 13 No original: "une structure de conduits consistant à produire, comprendre, interprèter, et/ou mémoriser um ensemble organisé d' énoncés oraux ou écrits (ou texte, au sens general que nous donnerons à ce terme)" (BRONCKART 1993: 28). .

Já a noção de CL surgiu a partir de Dolz, Pasquier e Bronckart (1993_____. Pasquier, Auguste; Bronckart, Jean-Paul. L'acquisition des discours: émergence d'une compétence ou apprentissage de capacités langagières diverses? In: Etudes de linguistique appliquée, n. 92, 1993, p. 23-37. : 30), para os quais se trata de uma "aptidão necessária para a realização de um texto numa determinada situação de interação"14 14 No original: "aplitudes requises pour la réalisation d'un texte dans une situation d'interaction determinée" (Dolz/ Pasquier/ Bronckart 1993: 30). . Segundo Schneuwly e Dolz (2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.), elas são divididas em três níveis: capacidades de ação (CA), capacidades discursivas (CD) e capacidades linguístico-discursivas (CLD). Essas, por sua vez, foram complementadas mais tarde com as capacidades de significação (CS) defendidas por Cristovão e Stutz (2012Stutz, Lidia. Sequências didáticas, socialização de diários e autoconfrontação: instrumentos para a formação inicial de professores de inglês. Tese de Doutorado. PPGEL/UEL, Londrina, 2012.). Para Cristovão (2007: 12), os quatro níveis "possibilitam ao sujeito adaptar sua produção de linguagem ao contexto de produção, ou melhor, as representações do ambiente físico, do estatuto social dos participantes e do lugar social onde se passa a interação". Cada uma delas é composta por operações linguageiras específicas, que, porém, funcionam de uma forma articulada (cf. Cristovão/ Stutz 2011Cristovão, Vera Lúcia Lopes; Stutz, Lidia. Sequências Didáticas: semelhanças e especificidades no contexto francófono como L1 e no contexto brasileiro como LE. In: Szundy, Paula Tatiana Corrérra; Araújo, Júlio César; Nicolaides, Christine Siqueira; Silva, Kleber Aparecido da (org). Linguística Aplicada e sociedade: ensino e aprendizagem de línguas no contexto brasileiro. São Paulo, Pontes, 2011, v. 1, p. 17-40.).

As CA "possibilitam ao indivíduo construir sentido da situação imediata de produção de linguagem mediante representações e/ou conhecimentos dos elementos do contexto de produção e da mobilização de conteúdos" (Cristovão/Stutz 2011Cristovão, Vera Lúcia Lopes; Stutz, Lidia. Sequências Didáticas: semelhanças e especificidades no contexto francófono como L1 e no contexto brasileiro como LE. In: Szundy, Paula Tatiana Corrérra; Araújo, Júlio César; Nicolaides, Christine Siqueira; Silva, Kleber Aparecido da (org). Linguística Aplicada e sociedade: ensino e aprendizagem de línguas no contexto brasileiro. São Paulo, Pontes, 2011, v. 1, p. 17-40.: 20). Trata-se das representações do ambiente físico, do estatuto social dos participantes e do lugar social no qual se dá a interação. Suas operações consistem em atividades que levem o aluno a:

  • (1CA)   Realizar inferências sobre: quem escreve o texto, para quem ele é dirigido, sobre qual assunto, quando o texto foi produzido, onde foi produzido, para que objetivo;
  • (2CA)   Avaliar a adequação de um texto à situação na qual se processa a comunicação;
  • (3CA)   Levar em conta propriedades linguageiras na sua relação com aspectos sociais e/ou culturais;
  • (4CA)   Mobilizar conhecimentos de mundo para compreensão e/ou produção de um texto (Cristovão et al. 2010: 194).

As CD permitem ao aprendiz compreender a organização, arquitetura geral do gênero, como por exemplo, a planificação global do texto, os tipos de discurso, de sequências, etc. (Cristovão/ Stutz 2011Cristovão, Vera Lúcia Lopes; Stutz, Lidia. Sequências Didáticas: semelhanças e especificidades no contexto francófono como L1 e no contexto brasileiro como LE. In: Szundy, Paula Tatiana Corrérra; Araújo, Júlio César; Nicolaides, Christine Siqueira; Silva, Kleber Aparecido da (org). Linguística Aplicada e sociedade: ensino e aprendizagem de línguas no contexto brasileiro. São Paulo, Pontes, 2011, v. 1, p. 17-40.: 21). Suas operações são, conforme Cristovão et al. (2010: 194):

  • (1CD)   Reconhecer a organização do texto como layout, linguagem não verbal (fotos, gráficos, títulos, formato do texto, localização de informação especifica no texto) etc.
  • (2CD)   Mobilizar mundos discursivos para engendrar o planejamento geral do conteúdo temático;
  • (3CD)   Entender a função da organização do conteúdo naquele texto;
  • (4CD)   Perceber a diferença entre formas de organização diversas dos conteúdos mobilizados.

Consoante a Cristovão/ Stutz (2011Cristovão, Vera Lúcia Lopes; Stutz, Lidia. Sequências Didáticas: semelhanças e especificidades no contexto francófono como L1 e no contexto brasileiro como LE. In: Szundy, Paula Tatiana Corrérra; Araújo, Júlio César; Nicolaides, Christine Siqueira; Silva, Kleber Aparecido da (org). Linguística Aplicada e sociedade: ensino e aprendizagem de línguas no contexto brasileiro. São Paulo, Pontes, 2011, v. 1, p. 17-40.: 21), as CLD permitem ao aluno compreender "representações e/ou conhecimentos sobre mecanismos de textualizações e enunciativos responsáveis pela coerência temática e pragmática do texto", como, por exemplo, a conexão, coesão, pronúncia, prosódia, etc. Essas capacidades são desenvolvidas por atividades que levem o aluno a:

  • (1CLD)   Compreender os elementos que operam na construção de textos, parágrafos, orações;
  • (2CLD)   Dominar operações que contribuem para a coerência de um texto (organizadores, por exemplo);
  • (3CLD)   Dominar operações que colaboram para a coesão nominal de um texto (anáforas, por exemplo);
  • (4CLD)   Dominar operações que cooperam para a coesão verbal de um texto (tempo verbal, por exemplo);
  • (5CLD)   Expandir vocabulário que permita melhor compreensão e produção de textos;
  • (6CLD)   Compreender e produzir unidades linguísticas adequadas à sintaxe, morfologia, fonética, fonologia e semântica da língua;
  • (7CLD)   Tomar consciência das (diferentes) vozes que constroem um texto;
  • (8CLD)   Perceber as escolhas lexicais para tratar de determinado conteúdo temático;
  • (9CLD)   Reconhecer a modalização (ou não) em um texto;
  • (10CLD)   Identificar a relação entre os enunciados, as frases e os parágrafos de um texto, entre outras muitas operações que poderiam ser citadas;
  • (11CLD)  Identificar as características do texto que podem fazer o autor parecer mais distante ou mais próximo do leitor.

As CS surgiram da "necessidade de fazer com que as informações mais imediatas do texto conduzam a atividade geral e se instalem na organização de operações psíquicas das significações mais amplas" ( Stutz 2012Stutz, Lidia. Sequências didáticas, socialização de diários e autoconfrontação: instrumentos para a formação inicial de professores de inglês. Tese de Doutorado. PPGEL/UEL, Londrina, 2012.: 122). As operações inerentes a elas são:

  • (1CS)  Compreender a relação entre textos e a forma de ser, pensar, agir e sentir de quem os produz;
  • (2CS)  Construir mapas semânticos;
  • (3CS)  Engajar-se em atividades de linguagem;
  • (4CS)  Compreender conjuntos de pré-construídos coletivos;
  • (5CS)  Relacionar os aspectos macro com sua realidade;
  • (6CS)  Compreender as imbricações entre atividades praxiológicas e de linguagem;
  • (7CS)  (Re) conhecer a sócio histórica do gênero;
  • (8CS)  Posicionar-se sobre relações textos-contextos.

A análise dessas capacidades é necessária para avaliar os conhecimentos prévios e as dificuldades dos alunos, a fim de propor atividades adequadas, com base nas capacidades e nas dificuldades durante os módulos da SD. É dessa forma que cremos poder aprimorar os conhecimentos de linguagem dos alunos. Mas como se dá a apreensão 15 15 Utilizamos a palavra apreensão ao invés de aquisição ou até outra terminologia, pois acreditamos, amparados em vygotsky (2002), que aprendemos a linguagem de uma forma ativa e não apenas a absorvemos. da oralidade das crianças de 3 a 4 anos? Quais são os elementos essenciais para o seu ensino? Responderemos essas perguntas na próxima seção.

1.4 Apreensão da oralidade

No Brasil, o ensino de gêneros escritos é privilegiado em relação aos orais (cf. Dolz/ Schneuwly/ Haller 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108. ; Schneuwly 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108. ; Stutz 2012Stutz, Lidia. Sequências didáticas, socialização de diários e autoconfrontação: instrumentos para a formação inicial de professores de inglês. Tese de Doutorado. PPGEL/UEL, Londrina, 2012. ; Leal/ Gois 2012Leal, Telma Ferraz; Gois, Siane. Apresentação. In: Leal, Telma Ferraz; Gois, Siane (org.). A oralidade na escola: a investigação do trabalho docente como foco de reflexão. Belo Horizonte, Autêntica, 2012, p. 7-12. ) e em alguns casos, estes últimos são utilizados somente como subterfúgio para o ensino dos primeiros. Ou seja, ocorre uma mera "oralização da escrita e não a tomada da palavra pelo sujeito, com o objetivo de lhe ensinar a se comunicar, trocar opiniões, apresentar suas ideias, defender seus pontos de vista, ter acesso às informações ou protestar" ( Goulart 2005Goulart, Claudia. As práticas orais na escola: o seminário como objeto de ensino. Dissertação de Mestrado. IEL/ UEC, Campinas, 2005.: 65). Parte-se do princípio de que nascemos aptos a falar e de que a oralidade é aprendida nas relações diárias, ou seja, que não necessitamos de um trabalho aprofundado para que isso ocorra (cf. Schneuwly 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108. ). Nesse caso, o que é ignorado é o fato de que a linguagem oral é complexa e de que existem diversas maneiras de nos expressarmos oralmente, todas elas ligadas às "diferentes esferas sociais de interação" ( Leal/ Gois 2012Leal, Telma Ferraz; Gois, Siane. Apresentação. In: Leal, Telma Ferraz; Gois, Siane (org.). A oralidade na escola: a investigação do trabalho docente como foco de reflexão. Belo Horizonte, Autêntica, 2012, p. 7-12. ). Esquece-se o fato de que nem mesmo o ato de aprender pode ser unificado, pois tudo depende do contexto na qual estamos inseridos.

Nesse sentido, Cordeiro (2009_____. Ensino da linguagem oral na educação infantil: o lugar dos gêneros textuais formais. In: Anais do V Simpósio Internacional de Estudos de Gêneros Textuais, Caxias do Sul, RS, 2009. ) pondera que o ensino do oral foi historicamente influenciado pelas mais diversas abordagens (p. ex. assistencialista, psicopedagógica, entre outras), que possuem uma visão própria de ensino e aprendizagem da linguagem oral na escola. O pressuposto de Cordeiro vem ao encontro das três concepções de linguagem descritas por Fuza/ Ohuschi/ Menegassi (2011). De acordo com os autores, na primeira concepção, a linguagem é vista como um sistema, um produto acabado, estável, inerte, uma expressão descontextualizada do pensamento. Dessa forma, o aluno torna-se responsável por não saber se expressar corretamente, tendo em vista que é ele que comete o erro ao não pensar da forma que deveria pensar. Preconiza-se o bem falar e escrever e se desprezam as variações linguísticas. Já na segunda concepção, a linguagem é vista como instrumento de comunicação. Cabe ao aluno decodificá-la e internalizar o que está fora dela, ou seja, seguir os modelos presentes na sociedade. A repetição torna-se algo relevante na aprendizagem e o texto é concebido como um pretexto para ensinar gramática. Variações linguísticas ainda são desprezadas.

Já a terceira, a qual embasa esse trabalho, é a concepção dialógica, que enfatiza a interação. A linguagem é concebida como um instrumento de troca de experiências e indissociável do social. O significado do texto (tanto oral como escrito) não está no meu pensamento e nem no pensamento do meu interlocutor, porém na interação entre ambos, e é nessa interação que ocorre a construção do texto. Essa concepção é descendente, pois inicia do macro (contexto social do gênero), para o micro (características dos gêneros), para somente no final abordar as marcas linguístico-enunciativas, sempre de maneira contextualizada.

Ainda em relação ao ensino da oralidade, quando o foco recai sobre a educação infantil (doravante EI) 16 16 Entendemos educação infantil como crianças de 0 a 6 anos. A partir dos 6 ela passa a estudar no ensino fundamental. , Jardim e Messa (2014) ponderam que "o oral, a cultura narrativa é reprimida na era da mídia digital e audiovisual e, portanto, aspectos básicos do desenvolvimento humano vão faltar" (Jardim; Messa 2014: 17) 17 17 Die (mündliche) Erzählkultur wird im Zeitalter der digitalen Medien und der audio-visuellen Angebote verdrängt und dadurch kommen elementare Aspekte der Entwicklung des Menschen abhanden (Jardim; Messa 2014: 17, tradução nossa) . Aspectos como a experimentação da língua de uma forma lúdica, o desenvolvimento de uma abordagem pessoal em relação ao alemão, o despertar de emoções, bem como a estimulação da criatividade e da imaginação são ignorados ao deixarmos de trabalhar com histórias infantis (Tonelli; Cordeiro 2015_____; Cordeiro, Glaís Sales. Refletir sobre as línguas para aprendê-las: uma perspectiva de ensino- aprendizagem de inglês por meio de um gênero textual para (na) educação infantil. Moara, n.42, 2014b, p. 45-63. ; Jardim; Messa 2014). Dessa forma, tendo em vista que "não existe 'o oral', mas 'os orais' sob múltiplas formas" ( Schneuwly 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.: 114), analisaremos documentos oficiais que regem o ensino, a fim de termos uma visão melhor do direcionamento dado para o ensino de gêneros orais nas escolas brasileiras. Neste artigo, falaremos sobre o 1) Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil - RCNEI ( Brasil 1998aBrasil. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação. Referencial curricular nacional para a educação infantil. Brasília, SEF, 1998a, v.3, p. 117-157. ), o 2) Catálogo de línguas do Ministério da Educação, Ciência e Cultura da Áustria (2005)Áustria, Ministério da Educação, Ciência e Cultura: Land Vorarlberg. Sprachliche Frühförderung im Kindergarten für vorwiegend Kinder mit nicht deutscher Erstsprache (Sprachticket), 2005. http://www.vorarlberg.at/pdf/sprachkatalog.pdf . Acesso em: 18 dez. 2014.
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, o 3) Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas (QECR) ( Conselho da Europa 2001Conselho da Europa. Quadro Europeu Comum de Referência para Línguas. Porto, Asa Editores, 2001. ) e 4) Parâmetros Curriculares Nacionais da Língua Portuguesa (PCN) ( Brasil 1998b_____. Parâmetros Curriculares Nacionais: Terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental: língua portuguesa. Brasília, MEC/SEF, 1998b. ). Escolhemos esses quatro documentos, pois o primeiro trata do ensino na EI, o segundo é um catálogo de línguas que orienta o trabalho oral dos professores com a língua alemã, o terceiro norteia a avaliação das línguas estrangeiras na Europa e o último embasa o trabalho nas escolas brasileiras. Além disso, teceremos relações entre os documentos citados e os autores da linha teórica em que nos ancoramos.

O RCNEI ( Brasil 1998aBrasil. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação. Referencial curricular nacional para a educação infantil. Brasília, SEF, 1998a, v.3, p. 117-157. ) apresenta a linguagem oral como parte essencial do cotidiano e da prática nas instituições de EI. Conforme esse documento, o trabalho com ela é necessário, pois contribui para a formação dos sujeitos, bem como para a interação, orientação das crianças, na construção do conhecimento e no desenvolvimento do pensamento (cf. Vygotsky 2001Vygotsky, Lev Semenovitch. Pensamento e Linguagem. Ed. Ridendo Castigat Mores, 2001. http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/vigo.html . Acesso em: 12 out. 2014.
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). Nesse contexto, aprender uma língua não significa estudar somente palavras isoladas. Para que a criança compreenda de fato o vocabulário aprendido, ele precisa ser ensinado, sempre ligado a um texto/ contexto. Quanto mais as crianças interagirem em diferentes situações,

[...] mais poderão desenvolver suas capacidades comunicativas de maneira significativa. [...] Pesquisas na área da linguagem tendem a reconhecer que o processo de letramento está associado tanto à construção do discurso oral como do discurso escrito ( Brasil 1998aBrasil. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação. Referencial curricular nacional para a educação infantil. Brasília, SEF, 1998a, v.3, p. 117-157.: 125).

Isso demonstra o quão importante é o contato das crianças com a linguagem oral, a escrita e, consequentemente, com a leitura. Trata-se de uma fase essencial do desenvolvimento, que pode fazer grande diferença no futuro. Na EI a criança "é confrontada nas múltiplas práticas de linguagem. Elas instrumentalizam a criança [...] e permitem-lhe agir eficazmente em novas situações (instrumento se torna instrumento de ação)" ( Schneuwly 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.: 27). A família, por sua vez, possui grande relevância nesse processo. As crianças que ouvem os pais lerem histórias, que vivenciam a escrita e a leitura, desenvolvem uma maior habilidade em lidar com questões da linguagem do que aquelas que não possuem esse contato (cf. Brasil 1998aBrasil. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação. Referencial curricular nacional para a educação infantil. Brasília, SEF, 1998a, v.3, p. 117-157. ). Isso significa que, quanto mais gêneros textuais elas conhecerem, melhor será sua capacidade de fala e, por conseguinte, de escrita e leitura.

A repetição (de estruturas, do vocabulário e até mesmo das histórias infantis) garante nessa fase (de 3 a 4 anos) a fixação de algumas estruturas, colaborando assim para que a criança não se sinta perdida e insegura. De acordo com Vygotsky (1991), esse ato vai além do simples repetir, que é uma atividade mecânica, memorização de sons e palavras. Ela deve estar sempre articulada "com a reflexão, o pensamento, a explicitação de seus atos, sentimentos, sensações e desejos" (Vygotsky 1991: 125). Assim, para que o aluno se conscientize do que está aprendendo, necessitamos de instrumentos, denominados pelo autor de instrumentos psicológicos. Logo, desenvolver os processos superiores consiste na relação de uma tríade (instrumento-processo psíquico-tarefa) que remete à reconstrução interna do que é exterior. Igualmente, a palavra tem uma função relevante no desenvolvimento da criança, pois se trata de um instrumento que corrobora na formação de conceitos (cf. Friedrich 2012). Do mesmo modo, a linguagem que "funciona como um meio [médium], [...] faz com que o processo de pensamento se realize; em suma, o pensamento se faz através dela" (Friedrich 2012: 96).

De acordo com o catálogo de línguas do Ministério da Educação, Ciência e Cultura da Áustria (2005Áustria, Ministério da Educação, Ciência e Cultura: Land Vorarlberg. Sprachliche Frühförderung im Kindergarten für vorwiegend Kinder mit nicht deutscher Erstsprache (Sprachticket), 2005. http://www.vorarlberg.at/pdf/sprachkatalog.pdf . Acesso em: 18 dez. 2014.
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: 4, tradução nossa), "crianças falam com o corpo inteiro. Gestos e expressões faciais são internacionais - a fome, a alegria, a dor são claramente comunicadas" 18 18 No original: "Kinder sprechen mit ihrem ganzen Körper. Gestik und Mimik sind international - Hunger, Freude, Schmerzwerden klar und eindeutig vermittelt" (Áustria 2005: 4). . Quando uma criança não consegue falar algo recorre aos gestos, expressões faciais, o que significa que ela compreende o que está em sua volta, porém ainda não sabe falar. Portanto, "a linguagem é muito mais do que o que acontece com a boca. A língua é a porta de entrada para o mundo. Todos os sentidos devem ser integrados na gravação, processamento e produção da linguagem" 19 19 No original: "Sprache ist viel mehr als das, was mit dem Mund geschieht. Sprache ist der Zugang zur Welt. Alle Sinne müssen bei der Aufnahme, der Verarbeitung und der Produktion der Sprache integriert werden" (Áustria 2005: 35) . ( Áustria 2005Áustria, Ministério da Educação, Ciência e Cultura: Land Vorarlberg. Sprachliche Frühförderung im Kindergarten für vorwiegend Kinder mit nicht deutscher Erstsprache (Sprachticket), 2005. http://www.vorarlberg.at/pdf/sprachkatalog.pdf . Acesso em: 18 dez. 2014.
http://www.vorarlberg.at/pdf/sprachkatal...
: 35, nossa tradução). Segundo esses princípios, "aprender uma língua não é somente aprender palavras, mas também os seus significados culturais e, com eles, os modos pelos quais as pessoas do seu meio sociocultural entendem, interpretam e representam a realidade." ( Brasil 1998aBrasil. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação. Referencial curricular nacional para a educação infantil. Brasília, SEF, 1998a, v.3, p. 117-157.: 108). Essa visão corrobora com o pensamento de Dolz e Schneuwly (2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108. ), para os quais as práticas de linguagem são indissociáveis das práticas sociais. Também dialoga com a proposta de Dolz e Schneuwly (2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.: 134), Melo, Marcuschi e Cavalcante (2012Melo, Cristina Teixeira Vieira de; Marcuschi, Beth; Cavalcante, Marianne Bezerra. Esclarecendo o trabalho com a oralidade: uma proposta didática. In: Leal, Telma Ferraz; Gois, Siane (org.) A oralidade na escola: a investigação do trabalho docente como foco de reflexão. Belo Horizonte, Autêntica, 2012, p. 95-114.: 98) e Bastos/ Gomes (2012Bastos, Danielle da Mota; Gomes, Jaciara Josefa. E a língua falada se ensina? A lenda como objeto para o ensino da oralidade. In: Leal, Telma Ferraz; Gois, Siane (org.) A oralidade na escola: a investigação do trabalho docente como foco de reflexão. Belo Horizonte: Autêntica, 2012, p. 137-160.: 147-148) para os quais devemos levar em conta, no ensino dos gêneros orais, aspectos:

  • a) Extralinguísticos:  na prosódia devemos observar ritmo, entonação, intensidade, tom, inflexão, volume e qualidade da voz (na representação das personagens e das sensações);
  • b) Cinésicos:  em relação à expressão corporal/facial, devemos observar as mímicas, a postura durante a contação, os olhares, os gestos e as atitudes corporais, pois a comunicação não verbal pode substituir ou prejudicar a verbal, principalmente quando pensamos em língua estrangeira; [...].

Isso é muito importante quando pensamos nos contos de animais, pois se tratavam, originalmente, de narrativas orais destinadas a um público que não sabia ler, mas que dominava a arte de contar histórias (cf. Guimarães 2003Guimarães, Maria Flora. O conto popular. In: Brandão, Helena Nagamine. (Coord.). Gêneros do discurso na escola. São Paulo: Cortez, 2003, p. 85-117. ). Ou seja, versamos sobre um gênero intermediário entre o oral e o escrito, pois características dessa oralidade podem ser encontradas nesses textos até hoje (cf. Bastos; Gomes 2012Bastos, Danielle da Mota; Gomes, Jaciara Josefa. E a língua falada se ensina? A lenda como objeto para o ensino da oralidade. In: Leal, Telma Ferraz; Gois, Siane (org.) A oralidade na escola: a investigação do trabalho docente como foco de reflexão. Belo Horizonte: Autêntica, 2012, p. 137-160. ). Dessa forma, "uma atividade como a leitura em voz alta para o outro [...] encontra-se no cruzamento entre oral e escrita, visto que supõe uma interpretação oral, para uma audiência, de um texto escrito de autor" (cf. Dolz; Schneuwly 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.: 140). Trata-se da oralização do texto escrito, que é permeada por elementos extralinguísticos, paratextuais, cinésicos, dos quais todo contador se vale para trazer vida a uma história.

Já de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais da Língua Portuguesa (PCN), ao ingressar na escola, os alunos já possuem "competência discursiva e linguística para se comunicar em interações que envolvem relações sociais de seu dia a dia" ( Brasil 1998b_____. Parâmetros Curriculares Nacionais: Terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental: língua portuguesa. Brasília, MEC/SEF, 1998b.: 24). Porém, conforme o documento, a família não pode ser a única responsabilizada pela educação oral, pois estaríamos reduzindo a oralidade à linguagem espontânea, esquecendo-se das modalidades de fala pública, por exemplo. Esse pressuposto vem ao encontro dos argumentos de Schneuwly (2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108. ), que prevê que existem poucas semelhanças entre uma fala pública, uma entrevista de emprego e uma conversa cotidiana, por exemplo. De acordo com o autor, não sabemos quando entraremos em contato com os gêneros orais formais e é por conta disso que a escola possui um papel fundamental. Realizar ações sistemáticas de ensino para a apreensão desses gêneros é essencial na transformação da vida desses alunos, uma vez que o domínio sobre os gêneros é exigido pela sociedade.

Outro documento importante é o QECR ( Conselho da Europa 2001Conselho da Europa. Quadro Europeu Comum de Referência para Línguas. Porto, Asa Editores, 2001. ), que não preconiza a transformação do aluno em "falante nativo ideal":

Em vez disso, a finalidade passa a ser o desenvolvimento de um repertório linguístico no qual têm lugar todas as capacidades linguísticas. Isto implica, evidentemente, que a oferta das línguas em instituições de ensino deva ser diversificada e que os estudantes possam ter oportunidade de desenvolver uma competência plurilíngue ( Conselho da Europa 2001Conselho da Europa. Quadro Europeu Comum de Referência para Línguas. Porto, Asa Editores, 2001.: 22).

O QECR ( Conselho da Europa 2001Conselho da Europa. Quadro Europeu Comum de Referência para Línguas. Porto, Asa Editores, 2001. ) descreve os níveis de proficiência que poderão ser alcançados pelos estudantes. Para tanto, ele apresenta uma grade de avaliação da compreensão e interação oral e escrita (A1 - Iniciação, A2 - Elementar, B1 - Nível Limiar, B2 - Vantagem, C1 - Autonomia e C2 - Mestria). Todos esses níveis e os requisitos para alcançá-los são descritos no documento. Entretanto, o guia também reconhece que as condições externas físicas, sociais e de limitações de tempo influenciam na aprendizagem e nos resultados. O documento também trata da importância dos elementos paralinguísticos, como gestos, expressões faciais, postura, contato visual, corporal, proximidade e dos extralinguísticos, como as interjeições "pst", para pedir silêncio, o "ai" para expressar dor. Além disso, aponta a relevância dos traços prosódicos, como a qualidade, o tom, o volume da voz, bem como a duração do que está sendo falado, pois é por intermédio desses artifícios que podemos frisar ou então omitir informações. As concepções paratextuais também são importantes nos textos escritos.

Defensores da inclusão do trabalho com os gêneros orais na escola, Dolz; Schneuwly e Haller (2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108. ), Dolz; Schneuwly (2013)_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108. e Costa (2006Costa, Débora Amorim Gomes da. Livros didáticos de Língua Portuguesa: propostas didáticas para o ensino da linguagem oral. Dissertação de Mestrado. PPGE/UFP, Recife, Pernambuco, 2006. ) asseveram que, embora a oralidade assuma posição relevante nesses documentos oficiais, ainda não possui exemplos de como ela deve ser trabalhada na prática. Assim, aos professores que atuam nesse contexto, muitas vezes não veem com nitidez de que gênero se trata, como abordá-lo ou até mesmo desconhecem formas de avaliá-lo ( Àvila; Nascimento; Gois 2013Ávila, Ewerton; Nascimento, Gláucia; Gois, Siane. Ensino de oralidade: revistando documentos oficiais e conversando com professores. In: Leal, Telma Ferraz; Gois, Siane (org.). A oralidade na escola: a investigação do trabalho docente como foco de reflexão. Belo Horizonte: Autêntica, 2012, p. 37-56. ) e, portanto, acabam recorrendo somente à leitura e à escrita. De acordo com Goulart (2005Goulart, Claudia. As práticas orais na escola: o seminário como objeto de ensino. Dissertação de Mestrado. IEL/ UEC, Campinas, 2005.: 32), é necessária a "expansão de um ensino mais centrado nos usos da linguagem por meio da inserção do aluno em contextos significativos de fala e de escrita, ressaltando a importância do trabalho com os gêneros orais". Portanto, se desejamos que nosso trabalho com gêneros orais na EI seja efetivo, devemos aproximá-lo da realidade dos pequenos e pensar em formar cidadãos seguros em se comunicar em qualquer situação, tendo em vista que "o gênero não é mais instrumento de comunicação somente, mas é, ao mesmo tempo, objeto de ensino aprendizagem" (Schneuwly; Dolz 2013: 43).

Conforme Azevedo (2012Azevedo, Josilete Alves Moreira de. Ensino de língua portuguesa: da formação do professor à sala de aula. Tese de doutorado. PPgEL/UFRN, Natal, 2012.: 112), "ensinar a oralidade não significa trabalhar a capacidade de falar, mas auxiliar no desenvolvimento do domínio de usos discursivos que serão aplicados na prática de linguagem que ocorre na vida social". Para que a criança seja capaz de produzir oralmente, ela necessita mobilizar todas as CL presentes nos textos orais e escritos ao mesmo tempo. Isso quer dizer que ela precisa:

  • (CA)  - Adaptar sua linguagem ao contexto de produção (cf. Schneuwly/ Dolz 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108. ), bem como compreender os mundos físico e sociossubjetivo do gênero (cf. Bronckart 2012Bronckart, Jean-Paul. Atividade de linguagem, textos e discursos. Por um interacionismo sóciodiscursivo. Trad. Anna Rachel Machado e Péricles Cunha. São Paulo: Educ, 2012. );
  • (CD)  - Compreender e organizar o conteúdo do gênero, como por exemplo, os tipos de discurso e as sequências (cf. Schneuwly; Dolz 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108. );
  • (CLD)  - Compreender e utilizar os recursos da língua, como por exemplo, a coesão, o vocabulário, etc (cf. Schneuwly; Dolz 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108. )
  • (CS)  - Construir sentido em relação às práticas sociais, as atividades de linguagem, práticas, relacionadas às "diferentes experiências humanas" (cf. Cristovão; Stutz 2011Cristovão, Vera Lúcia Lopes; Stutz, Lidia. Sequências Didáticas: semelhanças e especificidades no contexto francófono como L1 e no contexto brasileiro como LE. In: Szundy, Paula Tatiana Corrérra; Araújo, Júlio César; Nicolaides, Christine Siqueira; Silva, Kleber Aparecido da (org). Linguística Aplicada e sociedade: ensino e aprendizagem de línguas no contexto brasileiro. São Paulo, Pontes, 2011, v. 1, p. 17-40.: 22).

É por conta da complexidade desse trabalho que recorremos à SD. Ela permite trabalharmos todas as dimensões do gênero e as capacidades de linguagem dos alunos, observando sempre sua realidade, bem como os seus conhecimentos prévios. Para Vygotsky (2001Vygotsky, Lev Semenovitch. Pensamento e Linguagem. Ed. Ridendo Castigat Mores, 2001. http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/vigo.html . Acesso em: 12 out. 2014.
http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/vigo...
), a criança aprende inicialmente os gêneros primários, para depois, com a aparição dos secundários, transformá-los. Desse modo, de nada adianta trabalharmos palavras isoladas almejando que o grupo produza de uma maneira efetiva oralmente. Assim, apostamos no trabalho com gêneros textuais e na análise das CL individuais e do grupo em questão.

2. Metodologia

2.1 A natureza da investigação

Esta pesquisa é considerada aplicada, de caráter intervencionista (pesquisa-ação), pois almeja a resolução de possíveis problemas do trabalho com o gênero conto de animais e a prática oral, bem como a transformação de atitudes e da linguagem das crianças por intermédio da prática (cf. Moresi 2003Moresi, Eduardo. Metodologia de Pesquisa. Brasília, 2003. http://ftp.unisc.br/portal/upload/com_arquivo/1370886616.pdf . Acesso em 16 jul. 2015.
http://ftp.unisc.br/portal/upload/com_ar...
). Nosso papel como pesquisadora não é somente coletar dados, mas interagir e intervir no ambiente pesquisado.

A SD foi elaborada para o Grupo 4, alunos de faixa etária entre 03 e 04 anos de idade, de uma escola particular do interior do Paraná. São ao todo 15 alunos, os quais aprendem alemão como língua estrangeira (LE)20 20 Falaremos sobre a escolha dessa nomenclatura no item 3.2. . Todas as turmas da Educação Infantil (grupo 3 ao 1º ano do Fundamental) são providas de 10h/ aula semanais de alemão. Os alunos pesquisados já tiveram até então, um ano de alemão como língua estrangeira (LE) no grupo 3 e 80% deles estão na fase vocabular. Os 20% que já sabem falar fluentemente, fazem-no misturando português e Schwäbisch (dialeto suábio) ao Hochdeutsch (alemão padrão). Em relação aos materiais utilizados em sala de aula, todos são elaborados pelas professoras e pouco se enfatiza o trabalho com textos.

Para a realização deste artigo, seguimos uma abordagem qualitativa com pequenas inserções da abordagem quantitativa (cf. Bortoni-Ricardo 2008Bortoni-Ricardo, Stella Maris. O professor pesquisador: introdução à pesquisa qualitativa. São Paulo: Parábola Editorial, 2008.). Buscamos analisar a estrutura, a presença das capacidades de linguagem, das operações de linguagem que constituem a SD. Além disso, faremos uma análise prévia das contribuições orais em língua alemã dos alunos.

Para tanto nos amparamos nos conceitos de CL (cf. Dolz; Schneuwly 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.; Cristovão; Stutz 2011Cristovão, Vera Lúcia Lopes; Stutz, Lidia. Sequências Didáticas: semelhanças e especificidades no contexto francófono como L1 e no contexto brasileiro como LE. In: Szundy, Paula Tatiana Corrérra; Araújo, Júlio César; Nicolaides, Christine Siqueira; Silva, Kleber Aparecido da (org). Linguística Aplicada e sociedade: ensino e aprendizagem de línguas no contexto brasileiro. São Paulo, Pontes, 2011, v. 1, p. 17-40.), bem como nos critérios para elaboração/avaliação de SDs (Cristovão et al. 2010). Em relação à oralidade, amparamo-nos especialmente em Vygotsky (2001Vygotsky, Lev Semenovitch. Pensamento e Linguagem. Ed. Ridendo Castigat Mores, 2001. http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/vigo.html . Acesso em: 12 out. 2014.
http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/vigo...
) e nos documentos apresentados anteriormente.

2.2 O contexto pesquisado

Para este artigo adotamos as nomenclaturas língua primeira (L1) e LE ao invés de língua materna (LM) por conta dos pressupostos de Dolz (Silva; Silva 2012 Silva, Alessandra Augusta Pereira;Silva, Carla Messias Ribeiro. A pesquisa, uma necessidade para os professores de língua. Entrevista com o prof. Dr. Joaquim Dolz. Revista NUPEM (Online), v. 4 (2), 2012, p. 11-22.), que buscou um termo que designasse melhor a língua em seu convívio social e não somente aliada à figura da mãe. Para que possamos compreender como se dá a linguagem nesse contexto multilíngue (Dalla Vecchia 2013Dalla vecchia, Adriana; Fraga, Letícia. Políticas, crenças e atitudes em contexto multilíngue. In: Revista Signótica, v. 25, 2014, p. 283-308.; Borges 2015Borges, Clarissa Leonhardt. Panorama do ensino de língua alemã para alunos da educação infantil na Região Metropolitana de Porto Alegre. Dissertação de Mestrado. PPGL /UFRGS, Porto Alegre, 2015.) explicaremos como o ensino ocorria e como ocorre atualmente.

Até 2007 o colégio oferecia alemão como língua primeira (L1), pois acreditava que a LE era a primeira língua de todos os alunos. No entanto, tratava-se de um contexto em que os alunos aprendiam com a família e a comunidade o dialeto (Schwäbisch) e somente mais tarde a língua portuguesa e o alemão padrão, ou seja, confundia-se LE com L1. Além disso, outro fator que influenciava nesse panorama era o número de crianças falantes do dialeto. Anteriormente, quase todos os alunos eram filhos de cooperados da cooperativa que é mantenedora do colégio. Entretanto, esse panorama mudou por conta da contratação de pessoas de fora das colônias para trabalharem na cooperativa. Os filhos desses funcionários, em sua maioria, não são falantes do alemão padrão e nem do dialeto da comunidade e a direção da escola passou a adotar a nomenclatura alemão como LE para que fosse possível atender a todos. No entanto, esse contexto multilíngue ainda exige desses alunos que saibam falar o alemão padrão, pois a cooperativa mantém o vínculo com a Alemanha, ao mesmo tempo em que muitas famílias, residentes nas colônias, ainda cultivam suas tradições e língua. Por esse motivo, referimo-nos neste artigo ao alemão padrão como LE, tendo em vista que tanto para os alunos falantes do dialeto quanto para os falantes do português, o alemão não é língua primeira (L1) e sim estrangeira (L2 ou L3).

3 Uma sequência didática em análise

Para a análise das atividades da SD, três instrumentos foram essenciais. O primeiro refere-se à estrutura da SD (cf. Dolz; Noverraz; Schneuwly 2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.), o segundo volta-se às capacidades de linguagem mobilizadas em cada atividade (cf. Cristovão; Stutz 2011Cristovão, Vera Lúcia Lopes; Stutz, Lidia. Sequências Didáticas: semelhanças e especificidades no contexto francófono como L1 e no contexto brasileiro como LE. In: Szundy, Paula Tatiana Corrérra; Araújo, Júlio César; Nicolaides, Christine Siqueira; Silva, Kleber Aparecido da (org). Linguística Aplicada e sociedade: ensino e aprendizagem de línguas no contexto brasileiro. São Paulo, Pontes, 2011, v. 1, p. 17-40.; Lanferdini; Cristovão 2011Cristovão, Vera Lúcia Lopes; Stutz, Lidia. Sequências Didáticas: semelhanças e especificidades no contexto francófono como L1 e no contexto brasileiro como LE. In: Szundy, Paula Tatiana Corrérra; Araújo, Júlio César; Nicolaides, Christine Siqueira; Silva, Kleber Aparecido da (org). Linguística Aplicada e sociedade: ensino e aprendizagem de línguas no contexto brasileiro. São Paulo, Pontes, 2011, v. 1, p. 17-40.) e o terceiro é destinado aos critérios para elaboração/avaliação de sequências didáticas (cf. Cristovão et al. 2010).

Nossa SD é composta por 40 atividades, organizadas em: a) Apresentação inicial b) Produção inicial; c) Módulo 1 até 4 e d) Produção final. A seguir, para que possamos ter uma visão geral do material elaborado, apresentamos uma Tabela com o plano global composto pela disciplina, grupo no qual atuamos, o gênero escolhido para o nosso trabalho, o número de encontros, o foco e o tema da SD, bem como os objetivos gerais do trabalho e específicos de cada módulo.

É a partir da apresentação do plano global que percebemos o direcionamento dado ao nosso trabalho. Na sequência iremos apresentar cada uma das fases do trabalho, tendo em mente os objetivos apresentados anteriormente.

Como podemos ver nos objetivos descritos na Tabela 1, a apresentação inicial é pautada no pressuposto de que é necessário situar o aluno no assunto a ser trabalhado, bem como mobilizar os seus conhecimentos prévios. Para essa fase, escolhemos o conto de animais Die kleine Raupe Nimmersatt21 21 A pequena lagarta comilona, de Eric Carle. , que seria recontado na produção inicial (PI)22 22 Para a sequência selecionamos dois textos: Die kleine Raupe Nimmersatt e Das große Radieschen, que correspondem à temática proposta pela professora responsável pelas aulas de alemão. Limitamos o trabalho aos referidos textos por tratar-se de um grupo de crianças entre 3 e 4 anos, que ainda não tem a capacidade de reter muitas informações ao mesmo tempo. Além disso, dispomos de poucas horas/aula na realização das atividades em sala de aula. . Ao todo foram desenvolvidas sete atividades. A primeira consistia no reconhecimento da personagem principal. Para tanto, colamos imagens de lagartas no chão e nas paredes da sala de jogos. Ao entrar no ambiente, as crianças eram indagadas sobre o nome do animal que estavam vendo. Dessa forma, mobilizamos as capacidades 4CA e 5CLD referentes aos conhecimentos de mundo e à expansão do vocabulário para compreensão e/ou produção de um texto. A segunda atividade é sobre a capa do conto. Realizamos inferências sobre o que aconteceria na história (1CA) e mais uma vez, mobilizamos conhecimentos de mundo para a compreensão do texto (4CA). Na terceira atividade, todas as capacidades foram mobilizadas, pois para que o aluno compreenda o conto que está sendo contado, ampara-se no contexto de produção do texto (CA), no plano organizacional do texto (CD), no nível enunciativo (CLD) e nas atividades praxiológicas em interação com conteúdo temático (CS). Assim, para compreender ou recontar um texto, o aluno irá se ancorar em todas as capacidades de linguagem. Para que a compreensão do conto fosse possível, recorremos aos gestos, às expressões faciais, à entonação, às perguntas de orientação realizadas em português e alemão (Was passiert hier? O que a lagarta irá comer agora?), bem como às imagens do livro. Na quarta atividade, buscamos expandir o vocabulário dos alunos por intermédio de imagens referentes às comidas presentes no conto (5CLD). Recontamo-lo e pedimos para que os alunos levantassem a imagem correspondente ao trecho do livro (1CD). Trata-se de um jogo de palavra e imagem, que lhes possibilita tomar consciência das diferentes vozes que compõem o conto (7CLD), bem como reconhecer sua organização. Em seguida, na quinta atividade, os alunos colaram as imagens em uma lagarta de pano. Dessa forma, trabalhamos a sequência da narrativa, mobilizando assim os mundos discursivos (2CD), além de aprofundar o trabalho com o vocabulário (5CLD). A sexta atividade também visa ampliar e fixar o vocabulário (5CLD). Para tanto recorremos a um jogo de memória. Já a sétima e última atividade consistiu na recontação com ajuda da lagarta de pano, a fim de preparar os alunos para a produção inicial. Para facilitar a visualização da apresentação inicial, apresentamos a seguir as atividades, as capacidades e as operações de linguagem mobilizadas em forma de uma Tabela:

TABELA 1:
Plano global da SD23 23 Por tratar-se de uma SD que também serve de base para o professor, o plano global é composto por objetivos pessoais (Situar o aluno) e por objetivos a serem alcançados pelos alunos (Compreender a história).
Tabela 2:
Apresentação inicial

Percebemos, nessa fase, a predominância da CLD presente em 6 das 7 atividades da apresentação inicial. Acreditamos que isso ocorra por se tratar da introdução da temática e da apresentação do vocabulário, ainda desconhecido para a maioria dos alunos24 24 Obtemos essa informação a partir das observações, que foram realizadas em uma fase anterior a este artigo, ou seja, não poderemos trazer maiores detalhes em virtude da falta de espaço. . Outro motivo é a necessidade de trabalho com a língua, tendo em vista que a maioria desses alunos possui somente um ano de alemão. Além disso, trata-se de uma SD para língua estrangeira, que pelo nível de alemão dos alunos necessita inicialmente estar mais atrelada ao uso da língua do que à estrutura do gênero. Portanto, sem entender a língua o aluno não conseguiria compreender totalmente o conto a ser contado.

A dificuldade com a língua também pode ser detectada na PI, que possui como principais objetivos identificar os conhecimentos prévios e as dificuldades dos alunos. É por intermédio dela que podemos ter uma visão geral do que devemos trabalhar nos módulos. Na SD em questão, essa fase consiste em quatro atividades. Na primeira revisamos o vocabulário (5CLD) por intermédio das imagens presentes no conto (1CD). Na segunda, realizamos a recontação coletiva. Esse trabalho não poderia ser individual, pois demoraria muito para ser realizado, além de poder constranger as crianças que ainda estavam se adaptando à nossa presença. A partir do resultado dessa atividade planificamos os módulos da SD. Em seguida, na terceira atividade, com a ajuda de um mata-moscas e das imagens do conto, relacionamos os aspectos macro com a realidade dos alunos (5CS), bem como desenvolvemos o posicionamento dos alunos sobre relações textos-contextos (8CS), por intermédio da pergunta O que você gosta de comer? A última atividade consiste na introdução do conto que seria trabalhado nos quatro módulos da SD: Das große Radieschen25 25 Das große Radieschen (O grande rabanete) é um conto adaptado pela autora Jolanda Garcia a partir da obra Die Große Rübe (O grande nabo), dos irmãos Grimm. . Ao perguntar se a lagarta também come rabanetes, realizamos inferências (1CA) e mobilizamos conhecimento de mundo (4CA), assim como relacionamos aspectos macro com a realidade dos alunos (5CS). Na Tabela a seguir podemos ver as atividades e as capacidades de linguagem mobilizadas:

Tabela 3:
Produção inicial

Logo após a aplicação das atividades, analisamos as dificuldades encontradas durante a PI. Quanto à situação de produção para o desenvolvimento das CA, percebemos que alguns alunos não conhecem o conto de animais Die kleine Raupe Nimmersat (A pequena lagarta comilona) entretanto possuem contato com outros clássicos da literatura como Chapeuzinho Vermelho, Os Três Porquinhos, entre outros; os conhecimentos de mundo foram mobilizados para compreender o texto. Em relação às CD, os alunos conseguem reconhecer alguns elementos como a capa do livro, no entanto possuem dificuldades em denominar ou descrever em alemão os elementos que o constituem como imagem e até mesmo o layout. Nesse caso, as CD estão diretamente ligadas às CLD; em virtude do vocabulário restrito (CLD), os alunos não conseguem denominar os elementos principais inerentes à estrutura do texto (CD). Todas as capacidades, mas especialmente as CS, foram prejudicadas por conta das dificuldades de concentração do grupo que interferiram no engajamento dos alunos nas atividades de linguagem.

A partir das dificuldades anteriormente relatadas, elaboramos os módulos que vão ao encontro dos pressupostos de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.: 87). Ao todo são 26 atividades organizadas em quatro módulos: Módulo 1- seis atividades; Módulo 2: nove atividades; Módulo 3: sete atividades e Módulo 4: cinco atividades. Em virtude da falta de espaço para detalhar todos os quatro módulos, apresentaremos em seguida somente o primeiro.

Tabela 4:
Módulo 1

No Módulo 1 temos seis atividades, das quais uma mobiliza as CA, duas a CD, duas a CLD, quatro a CS e uma todas as capacidades. Na primeira atividade, planejamos pedir aos alunos que observassem imagens de rabanetes e pensassem acerca do cultivo e a colheita dessa raiz. Além disso, sobre uma mesa que fica no corredor da escola, foram expostos rabanetes in natura (plantados em uma bacia ou simplesmente deitados sobre a mesa para trabalhar a noção de dentro e fora da terra). Após a observação, realizamos inferências sobre que alimento se trata e como ele é plantado e colhido. Além disso, perguntamos se a lagarta da PI também gosta de comer rabanetes (1CA e 4CA). Resolvemos repetir essa pergunta, pois na PI os alunos não a responderam por não compreenderem a palavra rabanete em alemão. A partir dessas perguntas, relacionamos os aspectos do conto Das große Radieschen com a realidade dos alunos, o que resulta em uma melhor relação entre a prática e a linguagem (5CS e 6CS). Com essa primeira atividade buscamos compreender e produzir unidades linguísticas adequadas a essa situação (5CLD). Já a atividade 13 consiste no reconhecimento dos principais elementos da capa do livro, que são a imagem e o layout (1CD). Na atividade 14, apresentamos todas as personagens do conto por intermédio de um pequeno diálogo de apresentação (Olá! Eu sou o coelho. Adoro comer rabanetes). Trata-se de uma sensibilização para as vozes presentes no texto (7CLD), assim como o trabalho com o vocabulário principal do texto (Coelho, galo, guaxinim e camundongo). Por meio da pergunta "O que você gosta de comer?", os alunos também se posicionaram em relação ao texto e o contexto do texto (8CS). Já a atividade quinze foi dividida em antes, durante e depois da leitura do conto de animais Das große Radieschen. Antes da leitura realizamos as seguintes perguntas: O que acontece com o rabanete? Já durante a leitura, perguntamos: O que está acontecendo aqui? O que vai acontecer com o rabanete? Por que não está dando certo? Porque eles não conseguem tirar o rabanete? (Referindo-se à retirada do rabanete da terra). Depois da leitura perguntamos: Quem comeu o rabanete? O gato? A vaca? Quem é isso? Quem conseguiu? (Referindo-se às personagens). A partir dessas perguntas mobilizamos três operações de linguagem: (4CA). Por mobilizarmos conhecimentos de mundo; (1CA). Por realizarmos inferências e (7CLD). Por sensibilizarmos as crianças em relação às vozes que constroem o nosso texto. Atividades como a número 12 (cheirar, apalpar, experimentar o rabanete), 14 (teatro de fantoches), 16 (recontar o conto por intermédio de máscaras) são muito válidas, pois mobilizam mais de uma capacidade, bem como trabalham os diferentes sentidos da criança (tato, audição, visão, olfato e paladar). Consideramos que é relevante partir do princípio de que quanto mais sentidos envolvermos no ensino, mais crianças serão contempladas. Já os gestos que serão trabalhados na atividade 17 colaboram para a compreensão da prática de linguagem, bem como na expansão do vocabulário e dos principais tempos verbais do texto (zog, ließ sich nicht ziehen, warte, haben geschafft, aßen; puxou, não se deixou puxar, espere, conseguimos, comeram).

Para analisar a presença de todas as CL e operações de linguagem mobilizadas nas 40 atividades da SD apresentaremos, na sequência, um gráfico (de nossa autoria) com o resultado da contagem:

Gráfico 1:
Capacidades de linguagem

Os resultados apresentados mostram a predominância de capacidades agrupadas (65%), ou seja, em sua maioria as atividades mobilizam mais de uma CL. Esse agrupamento é relevante uma vez que a possibilidade de recontar o conto ancora-se em todas as capacidades de linguagem e não em capacidades isoladas. Além disso, agrupar as capacidades permite um trabalho mais efetivo com os conhecimentos prévios dos alunos.

Ao avaliar as CL de uma forma isolada, percebe-se uma predominância das CS (15%) e das CLD (12,5). As atividades voltadas para a mobilização de operações destinadas a ampliar as CS auxiliam no engajamento em atividades de linguagem, no posicionamento do aluno em relação aos textos, na compreensão e posicionamento em relação a sócio-história, aos pré-construídos coletivos e contexto dos textos. Já as atividades com ênfase nas CLD são relevantes para a construção de conhecimentos de vocabulário e gramática, que até então eram escassos, por se tratar de um grupo predominantemente composto por crianças não falantes do dialeto porque iniciou a língua alemã há um ano. Portanto, levamos em conta que a maioria dos alunos não conseguia produzir oralmente em alemão em virtude das dificuldades com a língua e decidimos trabalhar mais com este tipo de atividades.

Já em relação à configuração geral da SD também averiguamos a deficiência de atividades que contemplem o trabalho com as vozes (CLD), de exercícios que instrumentalizem o aluno para agir com a língua em determinada situação e de formá-lo como ator deste agir, assim como sentimos falta de mais atividades que deem conta da relação entre texto e realidade dos alunos. Além disso, examinamos a falta de um trabalho mais aprofundado com os elementos extralinguísticos e cinésicos, tão essenciais para a linguagem oral. Na próxima seção, falaremos dos resultados parciais no que concerne à oralidade.

4 E a oralidade?

Em relação à oralidade, constatamos que todas as crianças interagiram oralmente em alemão, embora ainda com dificuldades de formular frases ou fazê-lo sem a interferência do português ou do dialeto. Ao compararmos as contribuições na produção inicial com as da produção final, é visível o crescimento dos alunos, bem como a utilização da língua alvo. O objetivo de recontar o CA Das große Radieschen foi atingido, tendo em vista que 80% dos alunos conseguiram fazê-lo, mesmo que com o auxílio do professor.

Além disso, outro fato que chamou a nossa atenção é o imaginário que levou alguns alunos a inventarem uma nova língua, tendo em vista que o recontar é feito em uma língua estrangeira, ou seja, quando envolvida emocionalmente e amparada pela imaginação, a criança apropria-se dessa nova língua como se fosse sua.

Embora não fosse nosso objetivo, por intermédio dos relatos das professoras e de algumas gravações realizadas em sala, após o término da SD, constatamos que além de aprimorar o recontar de um conto, alguns alunos também reproduziram o vocabulário e as expressões presentes no conto e na sequência. Presenciamos frases proferidas após a aplicação da SD, como "Wir haben es geschafft!", referindo-se à vitória das meninas em um jogo de memória, e "Rot wie das Radieschen!", referindo-se a uma bola vermelha de natal, confeccionada pela turma, o que demonstra a apreensão da linguagem. Se esses alunos não tivessem compreendido essas palavras, expressões ou até mesmo frases, não conseguiriam tecer tais relações. Para um trabalho futuro, pretendemos relacionar as capacidades presentes na PI com as capacidades presentes na SD e as mobilizadas na PF, a fim de averiguar o crescimento dos alunos a partir do nosso trabalho.

Considerações finais

A análise da SD produzida nos permitiu uma melhor compreensão das dificuldades que enfrentamos durante o processo de transposição didática. Trata-se, em nossa opinião, de um estudo válido, pois sempre encontraremos falhas e pensamos em melhorias quando se trata de uma pesquisa de cunho intervencionista. Essa noção de melhoria, progressão, é positiva tanto para o professor, quanto para o aluno e a escola, os quais se beneficiam disso. Em relação à configuração da SD, percebemos que ela está dentro dos pressupostos de Dolz e Schneuwly (2013_____. Dolz, Joaquim; Noverraz, Michèle. Seqüências didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: Schneuwly, Bernard; Dolz, Joaquim (org) Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e Org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, Mercado de Letras, 3ª ed., 2013, p. 81-108.), porque é composta por 40 atividades organizadas em: a) Apresentação inicial b) Produção inicial; c) Módulo 1 até 4 e d) Produção final.

No que tange às capacidades de linguagem pudemos constatar que elas foram trabalhadas, em sua maioria de forma articulada (65%), tendo em vista que precisamos sempre partir do que o aluno já sabe. Isso promove segurança, especialmente quando falamos de crianças da faixa etária pesquisada (3 a 4 anos). Ao avaliar as CL de uma forma isolada, percebe-se uma predominância das CS (15%) e das CLD (12,5). No que concerne à configuração geral da SD averiguamos também a deficiência de atividades que contemplem o trabalho com as vozes (CLD), de exercícios que instrumentalizem o aluno para agir com a língua em determinada situação e de formá-lo como ator deste agir, assim como sentimos falta de mais atividades que deem conta da relação entre texto e realidade dos alunos. Além disso, examinamos a falta de um trabalho mais aprofundado com os elementos extralinguísticos e cinésicos, tão essenciais para a linguagem oral.

Ao que se refere às produções orais, trouxemos resultados parciais, tendo em vista que a nossa pesquisa ainda está em andamento. Esses resultados são positivos e instigadores, pois nos levam a perceber que o trabalho com gêneros na escola realmente pode desenvolver o tão almejado desenvolvimento da oralidade em língua estrangeira. Constatamos que 80% dos alunos atingiu o objetivo (recontar o conto), embora ainda seja com a ajuda do professor ou ainda ocorra uma mera transferência (estrutura da frase em português, com substituições do vocabulário/ partes da frase em alemão). Mesmo que o ensino de linguagem oral não seja tão difundido no Brasil, os resultados foram além do esperado. Alguns alunos produziram oralmente, fora do contexto da SD, de uma maneira efetiva e livre, o que nos leva a crer que eles de fato compreenderam o conto e de que é possível trabalhar a oralidade.

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  • Vygotsky, Lev Semenovitch. A formação social da mente. 6.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
  • 1
    Mestrado em Letras, pela Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO).
  • 2
    Conforme Simonsen (1987: 8), o termo contos de animais "reserva-se [...] para os relatos em que os papéis principais, herói e adversários, são representados por animais enquanto tais". Trata-se de um relato curto, que possui uma fórmula inicial (Era uma vez, Um dia) e segue a sequência narrativa (Situação inicial; Complicação; Ações desencadeadas; Resolução e Situação final). Suas caraterísticas principais são a oposição dos seres domésticos e selvagens, presença de marcadores temporais, discurso direto, adjetivos, além de locuções para a apresentação de personagens e ambientes.
  • 3
    Projeto aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO), em 01/07/2014, sob o número CAAE 32786014.0.0000.0106.
  • 4
    De acordo com de Pietro et al. (1996/1997: 108, tradução nossa), trata-se de "um objeto descritivo e operacional, construído para apreender o fenômeno complexo da aprendizagem de um gênero".
  • 5
    A definição de capacidades de linguagem será apresentada na seção 2.3.
  • 6
    São parciais, pois nossa pesquisa ainda está em andamento, portanto não podemos apresentar dados conclusivos.
  • 7
    Em seu texto Gêneros e tipos de discurso: considerações psicológicas e ontogenéticas, SCHNEUWLY (2004) explica que essa noção de instrumento provém de Marx/ Engels (1845-1846/1969), para os quais os instrumentos materiais de produção condizem com o desenvolvimento das capacidades individuais.
  • 8
    No século XVIII, antigo Império Austro-Húngaro, povos provenientes de diferentes províncias do Reino Alemão imigraram para uma região às margens do rio Danúbio. Por conta de sua língua, o suábio (Schwäbisch), esse povo foi identificado como os súabios do Danúbio (Donauschwaben). Na segunda guerra, a Alemanha foi derrotada e os Donauschwaben foram expulsos dos territórios, agora pertencentes à Iugoslávia. Foi então que, por conta da Cáritas Suíça e do governo Getúlio Vargas, 500 famílias de imigrantes se estabilizaram no Brasil (Elfes 1971).
  • 9
    A primeira fase da pesquisa, realizada em julho e agosto de 2014, refere-se à observação do grupo com base em duas fichas (contexto e individual) e de um diário. É por intermédio da ficha de observação individual que constatamos a quantidade de alunos falantes de dialeto denominado suábio (Schwäbisch).
  • 10
    "Toute pratique d'enseignement d'un objet présuppose en effet la transformation préalable de son objet en objet d'enseignement." (Verret 1975: 140).
  • 11
    Os módulos possibilitam o trabalho com problemas de níveis diferentes, ou seja, um atendimento mais individualizado.
  • 12
    A escola de Genebra assume a autoria de Voloshinov para a obra "Marxismo e Filosofia da Linguagem" (1979/1992), no entanto, a edição brasileira usada ainda cita Bakhtin.
  • 13
    No original: "une structure de conduits consistant à produire, comprendre, interprèter, et/ou mémoriser um ensemble organisé d' énoncés oraux ou écrits (ou texte, au sens general que nous donnerons à ce terme)" (BRONCKART 1993: 28).
  • 14
    No original: "aplitudes requises pour la réalisation d'un texte dans une situation d'interaction determinée" (Dolz/ Pasquier/ Bronckart 1993: 30).
  • 15
    Utilizamos a palavra apreensão ao invés de aquisição ou até outra terminologia, pois acreditamos, amparados em vygotsky (2002), que aprendemos a linguagem de uma forma ativa e não apenas a absorvemos.
  • 16
    Entendemos educação infantil como crianças de 0 a 6 anos. A partir dos 6 ela passa a estudar no ensino fundamental.
  • 17
    Die (mündliche) Erzählkultur wird im Zeitalter der digitalen Medien und der audio-visuellen Angebote verdrängt und dadurch kommen elementare Aspekte der Entwicklung des Menschen abhanden (Jardim; Messa 2014: 17, tradução nossa)
  • 18
    No original: "Kinder sprechen mit ihrem ganzen Körper. Gestik und Mimik sind international - Hunger, Freude, Schmerzwerden klar und eindeutig vermittelt" (Áustria 2005: 4).
  • 19
    No original: "Sprache ist viel mehr als das, was mit dem Mund geschieht. Sprache ist der Zugang zur Welt. Alle Sinne müssen bei der Aufnahme, der Verarbeitung und der Produktion der Sprache integriert werden" (Áustria 2005: 35) .
  • 20
    Falaremos sobre a escolha dessa nomenclatura no item 3.2.
  • 21
    A pequena lagarta comilona, de Eric Carle.
  • 22
    Para a sequência selecionamos dois textos: Die kleine Raupe Nimmersatt e Das große Radieschen, que correspondem à temática proposta pela professora responsável pelas aulas de alemão. Limitamos o trabalho aos referidos textos por tratar-se de um grupo de crianças entre 3 e 4 anos, que ainda não tem a capacidade de reter muitas informações ao mesmo tempo. Além disso, dispomos de poucas horas/aula na realização das atividades em sala de aula.
  • 23
    Por tratar-se de uma SD que também serve de base para o professor, o plano global é composto por objetivos pessoais (Situar o aluno) e por objetivos a serem alcançados pelos alunos (Compreender a história).
  • 24
    Obtemos essa informação a partir das observações, que foram realizadas em uma fase anterior a este artigo, ou seja, não poderemos trazer maiores detalhes em virtude da falta de espaço.
  • 25
    Das große Radieschen (O grande rabanete) é um conto adaptado pela autora Jolanda Garcia a partir da obra Die Große Rübe (O grande nabo), dos irmãos Grimm.
  • 26
    Quando não houver outra indicação, as Tabelas apresentadas são de nossa autoria.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Maio 2016

Histórico

  • Recebido
    10 Ago 2015
  • Aceito
    01 Mar 2016
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