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Der Name des Mannes: a nomeação ficcional e a decadência familiar em “Os Buddenbrook” e “Os Maias”

The name of the man: the fictional nomination and family decadence in “The Buddenbrooks” and “The Maias”

Resumo

A temática da decadência em “Os Buddenbrook”: decadência duma família” é explícita: materializa-se enquanto subtítulo da obra literária. Em “Os Maias”, repete-se a estrutura essencial do título anterior, focalizando-se um nome de família. Sabe-se, entretanto, de antemão, que o enredo contemplado pelo romance de Thomas Mann perpassará por episódios cujo desfecho está no desnodar decadente das gerações da família Buddenbrook, o que, ainda que não explícito, repete-se na obra de Eça de Queirós. Para concretizar de forma estética a temática pretendida, ambos os autores focalizam cada geração das famílias ficcionais, desnudando dialeticamente pensamentos e papeis sociais. Desse desnudamento, um traço se mostra compartilhado por quase todas as personalidades: a preocupação para com a perpetuação do nome da família; fardo que pressagia a total extinção de ambos os antropônimos. A fim de demonstrar a relação da nomeação com a temática da decadência familiar, este artigo propõe um diálogo entre a Literatura Comparada e a Antroponomástica Ficcional - estudo dos nomes ficcionais - e situa o processo da despersonalização subjetiva do nome de família para a concretização do ápice da decadência: o desparto social do nome.

Palavras-chave:
Os Buddenbrook: decadência duma família; Os Maias; Onomástica Literária; Antroponomástica ficcional; Temática da decadência

Abstract

The theme of decay in “The Buddenbrooks: decline of a family” is explicit: it materializes as a subtitle of the literary work. In “The Maias”, an essential structure of the previous title is repeated, focusing on a family name. It is known, however, beforehand, that the plot contemplated by the novel by Thomas Mann will run through episodes whose outcome lies in the decaying decay of the generations of the Buddenbrook family, which, although not explicit, is repeated in the work of Eça de Queirós. In order to achieve the desired aesthetic theme, the two authors focus on the generation of fictional families, stripping down social thoughts and roles. Of this stripping, a trait is shown to be shared by almost all personalities: a concern with the perpetuation of the family name; a burden that presages the total extinction of both anthroponyms. In order to demonstrate the relationship of the nomination with the decay thematic, this article proposes a dialogue between Comparative Literature and Fictional Anthroponomics - study of fictional names - and the status of the process of depersonalization composed of the family name to the top of the decay: the social not give birth of the name.

Keywords:
The Buddenbrooks: decline of a family; The Maias; Literary onomastic; Fictional anthroponomics; Thematic of decay

1 Considerações Iniciais

Nomear é uma ação sociolinguística e cultural milenar que advém dos primórdios das civilizações, fazendo-se presente epigraficamente desde os povos sumérios até os contemporâneos. A motivação para nomear pessoas sempre apresentara razões variadíssimas (Guérios 197316 GUÉRIOS João Farani Mansur. Dicionário Etimológico de nomes e sobrenomes. São Paulo, Ave Maria, 1973.) que, ainda hoje, quando possível de serem retomadas, demonstram a extrapolação da função de identificação comum à gênese referencial do nome próprio de pessoas (doravante antropônimo). Enquanto ato performativo (Austin 19893 AUSTIN John Langshaw. Other Minds. Philosophical Papers. "Outras Mentes". Os Pensadores . Traduzido por Marcelo Guimarães da Silva Lima. São Paulo, Nova Cultural, 21-47, 1989.), que instaura um homo sapiens socialmente, individualmente e até mesmo o delimita no seio familiar, a nomeação social dialoga com a nomeação ficcional, em que se delineia um homo fictus, mostrando-se esta também motivada, porém acrescida semanticamente da mediação de ironias, sumarizações e até mesmo alegorias sociais. Essas construções, por sua vez, agem em prol não só da caracterização das personagens, mas também, de forma ampla, da concretização de temáticas e estéticas ficcionais, propondo mimeses ou distanciamentos com relação à nomeação social.

A nomeação ficcional em “Os Buddenbrook”, de Thomas Mann e “Os Maias”, de Eça de Queirós, faz-se exemplo fundamental do diálogo entre a relação da nomeação das personagens e a função do nome próprio em sociedade, no que tange às relações subjetivas dos laços hereditários pela propagação do nome de família. Ademais, os próprios arranjos de nomes de ambas as obras materializam as temáticas propostas pelo enredo - no caso, a decadência familiar - fazendo-se elaboração estética de ordem literária funcional-conotativa relevante para a materialização do desnodar decadente de ambas as famílias focalizadas pelas obras.

Reflexões associadas ao nome próprio e à sua forma linguística e função social cabem à ciência Onomástica (Vasconcelos ([1887] 193145 VASCONCELOS José Leite de. Opúsculos. Onomatologia. Coimbra, Imprensa da Universidade, 1931.; Guérios 197316 GUÉRIOS João Farani Mansur. Dicionário Etimológico de nomes e sobrenomes. São Paulo, Ave Maria, 1973.), responsável pelo estudo desse léxico específico - tanto enquanto signo (lema), quanto sua formação, função e recepção em sociedade. A tal focalização epistêmica, subdivide-se, ainda, o estudo de antropônimos (nomes próprios de pessoas), pela Antroponomástica; e de topônimos (nomes próprios de lugares), pela Toponomástica, mediados por corpus variados que circulam socialmente por textos não ficcionais e ficcionais. O detalhamento quanto à elaboração do antropônimo ficcional, que se faz objetivo desta investigação, colabora, não só para associação do arranjo literário de nomes próprios de personagens à concretização da temática da decadência familiar, mas também para a aproximação dos estudos de base antroponomástico-ficcional à Literatura Comparada, devido ao viés literário comparativo a que se propõe.

Pesquisadores como Seide (201639 SEIDE Márcia Sipavicius. Métodos de pesquisa em Antroponomástica. In: Domínios de Lingu@gem, v. 10, n. 3, 2016., 201940 SEIDE Márcia Sipavicius. Deslocamentos identitários e nomeação no romance Circle of Amber. Caderno Seminal Digital, v. 32, n. 32, 2019.), Eckert e Röhrig (201612 ECKERT Kleber, ROHRIG Maiquel. Antroponímia ficcional: o caso de Ubirajara, de José de Alencar. Revista GTLex, v. 2, n. 1, 170-189, 2016., 201813 ECKERT Kleber, ROHRIG Maiquel. Onomástica literária em Graciliano Ramos: os nomes dos personagens de Vidas Secas e de São Bernardo. Revista de Estudos da Linguagem. 26 (3), 2018, 1277-1294.); Pedrassani, Eckert e Rörig (202031 PEDRASSANI Julia Sonaglio, ECKERT Kleber, ROHRIG Maiquel. Onomástica literária. In: Revista GTLex, v. 3, n. 2, 294-312, 2020.) e Camargo (20187 CAMARGO Amanda Kristensen de. Nomes próprios no romance contemporâneo O Berro do Cordeiro em nova York: um estudo onomástico exploratório. Dissertação de Mestrado . PPGL/UNIOESTE, Cascavel, 2018., 20208 CAMARGO Amanda Kristensen de. Onomástica Ficcional. Revista GTLex, v. 3, n. 1, 1-13, 2020.) têm materializado estudos de perspectiva antroponímico-ficcional no Brasil, contribuindo para a possibilidade de se teorizar questões linguísticas e literárias acerca das funções dos nomes ficcionais em corpus variados, relacionando determinada lógica onomínica a estéticas específicas, alargando as classificações funcionais pretendidas por Debus (200211 DEBUS Friedrich. Namen in literarischen Werken. (Er-)Findung - Form - Funktion, Stuttgart, 2002.), autor alemão precursor da Onomástica Literária. O escopo deste artigo compartilha, portanto, do desejo dos teóricos brasileiros mencionados: difundir a Onomástica Ficcional em língua portuguesa; dá-se, entretanto, de forma singular, visibilidade ao diálogo entre a obra de origem alemã “Os Buddenbrook: decadência duma família”, de Thomas Mann ([1901] 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.), e a obra de origem portuguesa Os Maias, de Eça de Queirós (200932 QUEIRÓS Eça de. Os Maias . São Paulo, Escala, 2009 [1888]. [1888]). A seleção de nosso corpus literário comparado relaciona-se não só ao fato de ambas as obras mostrarem-se onominicamente férteis para nosso estudo, como já brevemente apontado, mas, principalmente, por permitirem um diálogo estético entre as literaturas portuguesa e alemã, uma vez que se percebem traços comuns da decadência familiar presentes em Os Buddenbrook, também materializados em Os Maias.

Em sua revisão de literatura, Boura (20054 BOURA Ana Isabel Gouveia. Espaço e decadência no romance Buddenbrooks de Thomas Mann. Tese de doutorado . FLUP/UP, Porto, 2005.) reúne mais de 200 estudos sobre a obra Buddenbrook24 MANN Thomas. Buddenbrooks: Verfall einer Familie. Frankfurt am Main, S Fischer Verlag, 1945. e seu autor Thomas Mann abrangendo estudos literários e linguísticos em língua alemã e em língua inglesa em suas reflexões acadêmicas. Contudo, para a língua e a cultura brasileira, são breves as considerações de teor especificamente antroponímico acerca da obra, bem como de fenômenos antroponímicos relacionados a especificidades da tradução, sendo necessário enveredar por esses campos teóricos. A revisão de literatura de Boura (20054 BOURA Ana Isabel Gouveia. Espaço e decadência no romance Buddenbrooks de Thomas Mann. Tese de doutorado . FLUP/UP, Porto, 2005.) e o teor específico de seu trabalho demonstram que os estudos em língua portuguesa sobre Os Buddenbrook (1975) relacionam, principalmente, o espaço enquanto agente da materialização da estética da decadência, o que também se percebe com relação à obra de Eça de Queirós (200932 QUEIRÓS Eça de. Os Maias . São Paulo, Escala, 2009 [1888].).

Especificamente sobre as abordagens de questões antroponímicas, Boura (20054 BOURA Ana Isabel Gouveia. Espaço e decadência no romance Buddenbrooks de Thomas Mann. Tese de doutorado . FLUP/UP, Porto, 2005.: 59) teoriza sobre a escolha do título Buddenbrooks, o que contribui para a divulgação em língua portuguesa sobre detalhes relevantes quanto a essa escolha, como a simbologia de “procedência baixo-alemã e o pendor burguês do termo” (Boura 20054 BOURA Ana Isabel Gouveia. Espaço e decadência no romance Buddenbrooks de Thomas Mann. Tese de doutorado . FLUP/UP, Porto, 2005.: 59). Já dentre as considerações em língua alemã e língua inglesa sobre a obra são perceptíveis tanto especulações acerca do teor biográfico do romance e possíveis homônimos - que datam de 1964 com Schröter38 SCHROTER Klaus. Thomas Mann in Selbstzeugnissen und Bilddokumenten, Reinbek bei. Hamburg, Rowohlt, 1964. - quanto preocupações factualmente antroponímicas com relação às principais motivações antroponímicas de Mann - não apenas quanto ao sobrenome, mas também sobre os prenomes - presentes em trabalhos relevantes como os de Kayser (197518 KAYSER Herr Christoph. Some Observations on Thomas Mann's Use of Names in "Buddenbrooks". Literary Onomastics Studies: 2, Article 9, 1975.).

Sobre a obra de Queirós e o nome de família que lhe dá título, Souza (201141 SOUZA José Carlos Siqueira de. O romance-ensaio em Eça de Queirós: estudo crítico sobre A ilustre casa de Ramires e As cidades e as serras. Tese de Doutorado . FFLCH-USP. São Paulo, 2011.) - autor português - busca reconstruí-lo semanticamente, propondo que há relação do nome com a variante linguística britânica maya, enquanto representação das relações de aparências comuns à sociedade lisboeta. Em língua inglesa, o trabalho de Viera ([1992] 2013) de mesmo foco semântico faz breve menção ao título da obra traduzida “The Maias” (1965), propondo que este se refira ao povo pré-colombiano “Mayanpeople” em uma relação colônia - metrópole (Vieira 201346 VIEIRA Estela. Interiors and Narrative. The Spatial Poetics of Machado de Assis, Eça de Queirós, and Leopoldo Alas. Maryland, Bucknell University Pres, 2013.: 187) de Portugal com os demais países europeus. Porém, apesar das ricas e possíveis propostas semântico-alegóricas decadentistas ambos estudos não abarcam o viés etimológico do nome de família Maia, e tampouco relaciona-o à decadência de especificidade familiar.

Quanto à perspectiva etimológica do nome, esta transparece brevemente nas considerações de Kind (201819 KIND Anette. Eça de Queirós auf der "Insel der Seligen": das Werk des portugiesischen Romanciers im Ostberliner Aufbau-Verlag. Tese de Doutorado . FLUP/UP, 2018.), quando, em sua tese de doutorado, a autora alemã frisa, quanto à Die Maias (1983), a ficcionalização “aristocrática” da família (Kind 201819 KIND Anette. Eça de Queirós auf der "Insel der Seligen": das Werk des portugiesischen Romanciers im Ostberliner Aufbau-Verlag. Tese de Doutorado . FLUP/UP, 2018.:119), porém, novamente, não se propõe uma análise literária que ilustre a relação dessa etimologia com a temática da decadência familiar.

O paradigma de trabalhos apresentado, relacionado a análises de teor teórico-literário, denota a incipiente presença da vertente crítica dos estudos antroponomástico-ficcionais em língua portuguesa para considerações quanto às obras, e total ausência quanto à relação dos respectivos arranjos de nomes ficcionais em Mann e Eça à estética da decadência familiar, ainda que haja iniciativas de pesquisas de caráter especificamente antroponímico principalmente em língua alemã e língua inglesa. Logo, propondo uma descolonização de fronteiras teórico-idiomáticas em prol de diálogos linguísticos e literários transnacionais, comuns à Literatura Comparada - enquanto estudo das relações literárias e estéticas além de fronteiras nacionais (Remak 197135 REMAK Henry Heymann Herman. Comparative Literature, its definition and function. In: STALLKNECHT, Newton P.; FRENZ, Hortz (ed.). Comparative Literature: Method and Perspective. Illinois, Southern Illinois University Press, 1971.) - esta investigação procura em sua interdisciplinaridade própria à ciência Onomástica (Seide 201639 SEIDE Márcia Sipavicius. Métodos de pesquisa em Antroponomástica. In: Domínios de Lingu@gem, v. 10, n. 3, 2016.) e também Literária - descrever como o arranjo de nomes próprios (doravante arranjo onomínico) - pressagiador da decadência - orquestra-se nos romances “Os Maias” e Os Buddenbrook.

Os títulos das obras, enquanto centros regentes, focalizam a nomeação de gerações, personalizam-nas subjetiva e linguisticamente como coletivo sólido e trazem evidências de lealdade para depois rompê-las em episódios narrativos nos quais se concretiza o que chamamos de despersonalização do nome de família. Esse fenômeno de ordem psicossocial e antroponímica culmina, por sua vez, na não propagação social do nome, que aqui se denomina “desparto social do nome”. Para a concretização de ambos fenômenos de ordem macro-onomínica, relacionados ao nome de família, faz-se preciso, entretanto, compreender o funcionamento do arranjo de prenomes ficcionais proposto pelos autores, uma vez que, enquanto fenômenos micro-onomínicos, dialogam harmonicamente com a desconstrução subjetiva do nome de família (Van Langendonck 200744 LANGENDONCK Willy Van. Theory and Typology of Proper Names. Berlin, Mouton de Gruyter, 2007.) e pressagiam o desaparecimento de ambas as linhagens descritas nos romances.

A fim de demonstrar a convergência entre a nomeação e a decadência familiar em ambas as obras, propõe-se, inicialmente, a focalização quanto à etimologia dos nomes de família centralizados ficcionalmente, relacionando-a ao status social de ambas as famílias. Posteriormente, aplica-se aos arranjos de nomes próprios dos romances a teoria de que os nomes ficcionais são “miméticos e conotativos por natureza” (Camargo 20187 CAMARGO Amanda Kristensen de. Nomes próprios no romance contemporâneo O Berro do Cordeiro em nova York: um estudo onomástico exploratório. Dissertação de Mestrado . PPGL/UNIOESTE, Cascavel, 2018.: 110) a fim de ilustrar os principais fenômenos antroponímicos (Kayser 197518 KAYSER Herr Christoph. Some Observations on Thomas Mann's Use of Names in "Buddenbrooks". Literary Onomastics Studies: 2, Article 9, 1975.) interligando-os - cada qual com suas especificidades - aos indícios estéticos da decadência cumulativos no desparto social do nome de família, fenômeno resultante dos fatos socio-onomínicos - descritos abaixo.

2 O desparto social do nome de família em “Os Buddenbrook” e “Os Maias”

A percepção da focalização de uma decadência coletiva, durante a leitura de “Os Buddenbrook” e “Os Maias”, antecipa-se ao enredo pelo título: um nome secundário (Van Langendonck 200744 LANGENDONCK Willy Van. Theory and Typology of Proper Names. Berlin, Mouton de Gruyter, 2007.) e coletivo que contempla diversos sujeitos e, com a devida ressalva, sujeitos diversos, unidos por laços sanguíneos e por crenças coletivas de deveres hereditários, como a propagação da tradição, cuja concretização sócio-histórica está no ecoar civil dos nomes de família.

Para se compreender a focalização familiar dos sobrenomes Buddenbrook e Maia, faz-se necessária, primeiramente, a percepção de que este último é um nome de família aristocrático (Kind 201819 KIND Anette. Eça de Queirós auf der "Insel der Seligen": das Werk des portugiesischen Romanciers im Ostberliner Aufbau-Verlag. Tese de Doutorado . FLUP/UP, 2018.) socialmente utilizado. De acordo com Guérios (197316 GUÉRIOS João Farani Mansur. Dicionário Etimológico de nomes e sobrenomes. São Paulo, Ave Maria, 1973.: 159)

MAIA, sobr. port. Geogr.., primit..Amaia, e, com a prepos. De, de Amaia se faz da Maia. Do lat. Maia, n. da deusa da vegetação? - “Os Maias” procedem de D. Mem Gonçalves de Maya, que foi o primeiro que tomou este apelido da terra de Maya, que ganhou aos Mouros, pai de D. Sueiro Mendes o Bom da Maya, descendente por varonia de el-rei D. Ramiro II, de Leão.

A definição acima explicita que a origem do nome de família português Maia se relaciona à nobreza. Essa explanação denota, ainda, a relação geográfica do nome, perceptível durante o modo de nomear as personagens, na menção “prenome + da + nome de família”: Afonso da Maia; Carlos da Maia, construção antroponímica em que se valoriza a partícula de devido ao seu “[...] caráter de fidalguia que os nobres atribuíam [relacionado à] designação do local do nascimento, residência ou procedência, e principalmente por designar posse de senhorios”, fenômeno descrito por Guérios (197316 GUÉRIOS João Farani Mansur. Dicionário Etimológico de nomes e sobrenomes. São Paulo, Ave Maria, 1973.: 41).

O viés etimológico do nome de família aristocrata também é perceptível no romance “Os Buddenbrook” quando ocorre a nomeação da personagem aristocrata Armgard von Schilling, na qual a partícula von conota origem aristocrática antitética ao nome de família Buddenbrooks:

Que felicidade essa, de chamar-se Von Schilling! Os seus próprios pais possuíam a mais bonita das antigas casas da cidade, e o avós era gente distinta, mas chamavam-se simplesmente “Buddenbrook” e “Kröger”, o que era, sem dúvida, uma lástima. A neta do elegante Lebrecht Kröger ardia de admiração pela nobreza de Armgard. Clandestinamente pensava, às vezes, que esse “Von” soberbo ficaria muito melhor junto ao nome dela (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.:77).

Logo, o nome de família Buddenbrook, idealizado por Mann (197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.), simboliza uma família de origem burguesa - em ascensão econômica - e, ainda que prestigiada localmente, não aristocrática. Ademais, o nome é uma idealização puramente literária, cuja grafia se inspirara mimeticamente no nome burguês Buttenbrock (Carstensen 19869 CARSTENSEN Richard. Kommentar zu Thomas Manns 'Buddenbrooks' Lübeck, Werkstätten-Verlag, 1986.: 10; Koopmann 199521 KOOPMANN Helmut. Thomas Mann. Buddenbrooks, Frankfurt/M., Diesterweg, 1995.: 44). Além da antítese de nomes burgueses e aristocráticos proposta pelo enredo, o autor também defende seu procedimento estético para localizar os Buddenbrooks como família burguesa: “Mein Jugendroman heißt ‚Buddenbrooks‘, nicht ‚Die Buddenbrooks‘. Ich würde den Artikel nur einem adeligen Namen, keinem bürgerlichen gegeben haben” (Mann 199526 MANN Thomas. Thomas Mann - Heinrich Mann. Briefwechsel 1900-1949. hrsg. von Hans Wysling, Frankfurt am Main, Fischer Taschenbuch Verlag, 1995.).

A ausência do artigo die - comum à pluralização em língua alemã - e relacionada, socialmente, a nomes de origem nobre (como em Die Poggenpuhls), em Buddenbrooks , é a diferença primordial não só entre os nomes de família que referenciam as obras aqui pesquisadas, mas também à própria focalização familiar. Em “Os Maias”, tem-se a descrição da decadência de uma família de origens aristocráticas, porém, situada em um contexto luso-burguês cujo enredo, inclusive, alegoriza a decadência da família à decadência ético-social da sociedade lisboeta, apresentando o tédio, o ócio e adultério - comum à burguesia lisboeta - como resquícios comportamentais aristocráticos vividos diariamente por Carlos Eduardo, terceira geração da família Maia e médico de formação, que se abstém de atender em seu escritório luxuoso por falta de pacientes: “[...] Carlos realmente não tinha tempo para o escritório” (Queirós 200932 QUEIRÓS Eça de. Os Maias . São Paulo, Escala, 2009 [1888].: 95).

Em “Os Buddenbrook” - título traduzido para a Língua Portuguesa - por sua vez, há a descrição de uma família burguesa cujos bens econômicos relacionam-se ao protagonismo da firma Johann Buddenbrook. O status aristocrático, por seu turno, mostra-se desejado pelas gerações de várias maneiras: desde a insistência em utilizar títulos nobres, a desvalorização do sobrenome Buddenbrook em detrimento de sobrenomes aristocráticos como Von Schilling (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 77) até o casamento da personagem Thomas com Gerda, personagem descrita como sendo uma “menina distinta” (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 66); “de natureza de artista; uma criatura singular, misteriosa e encantadora” (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.:270) “[...] e um “partido milionário” (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.:258).

Ambas as obras, apesar de suas particularidades quanto à focalização familiar, iniciam-se pela descrição das famílias socialmente prestigiadas e de como suas simbologias de poder estendem-se desde as vestimentas até a moradia. A narrativa, em “Os Buddenbrook”, tem origem com um marco: toda a família Buddenbrook e Kröger está unida a fim de inaugurar o casarão no qual os Buddenbrooks - no ápice de sua ascensão - viveriam.

Durante a reunião, concentram-se, além de figuras representativas das instituições locais e intelectuais, a primeira, a segunda e a terceira geração Buddenbrook: Thomas, Christian e Tony (terceira geração), filhos de Jean Buddenbrook e Elisabeth Kröger Buddenbrook (segunda geração) e netos de Johann Buddenbrook e Antoniette Buddenbrook (primeira geração), ainda são crianças, porém já apresentam traços comportamentais, descritos pelo avô, Johann Buddenbrook, que comprometeriam o desejo da primeira e segunda geração de propagação do nome de família.

Quando Christian, “cabeça de vento” (Mann 1972: 12) demonstra, já na fase adulta, não ter interesse pelos negócios da família, cabe a Thomas Buddenrbook o fardo moral de continuar os negócios da firma Buddenbrook. Este, por sua vez, passa a maior parte de sua vida adulta lutando contra suas próprias vontades em prol de salvaguardar o nome da família, assim como haveria de ser com Antonie, sua irmã. Thomas, por exemplo, ao longo do enredo, apaixona-se por Rosa, uma florista sem qualquer status social; ao longo dos anos, a personagem masculina desfaz o relacionamento para se casar com Gerda, estrangeira milionária, musicista - já mencionada anteriormente pelos ares aristocráticos - e com ela tem um filho - frágil quarta geração contemplada unicamente por Hanno - que apesar dos esforços de sua “tia Tony” para ser a figura representativa do grande futuro dos Buddenbrooks, morre ainda criança.

Tony, por sua vez, acreditava ter caráter elevado com relação aos seus semelhantes e, na infância, possuía aos olhos do avô “tendência demasiado forte para a ociosidade e a desordem” (Mann 1972: 10) acaba, na fase adulta, divorciada de dois casamentos infelizes, o primeiro, com vistas a orgulhar a família e permitir a continuação da firma é selado com Grünlich, um charlatão; e o segundo, em busca de uma companhia já na velhice se realiza com Permanender, mas acaba por conta de uma traição do marido com uma empregada, humilhando publicamente, ainda mais, a figura de Tony e o nome da família.

Contudo, antes que o narrador descrevesse o crescimento dos filhos de Jean Buddenbrook, no momento de reunião inicial da narrativa, acima descrito, ocorre o primeiro presságio - de ordem não relacionada à nomeação (não onomínica): a narração da decadência de uma firma amiga dos Buddenbrook ocorrida “nos últimos vinte anos” (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.:18). Em “Os Maias” , por sua vez, no ponto inicial da narrativa já também se ilustra o primeiro presságio da decadência familiar: o casarão da família - Ramalhete - que persistira a três gerações da família Maia - Afonso da Maia, enquanto patriarca, Pedro da Maia, seu filho e Carlos Eduardo da Maia, neto de Afonso e filho de Pedro - está em ruínas, conotando mau agouro; porém, após a reforma proposta por Carlos e paga pelas heranças aristocráticas do avô, Afonso da Maia, o local passa a conotar prestígio na sociedade lisboeta. Com as visitas recebidas, o patriarca Afonso evita menção ao suicídio trágico de Pedro, motivado pela traição e fuga de Maria Monforte com sua neta, Maria Eduarda - e o Ramalhete passa a ser ponto de encontro de grande parte da sociedade e, principalmente, a ser palco das discussões ociosas entre Carlos Eduardo da Maia e João da Ega: bonvivant ateu e autor incipiente que defende ideias sociopolíticas revolucionárias.

Ao final do enredo, em “Os Maias” , após o infarto de Afonso da Maia pela descoberta do reencontro e da relação incestuosa de seus netos separados na infância (Maria Eduarda e Carlos Eduardo), o Ramalhete volta ao seu estado inicial: está em ruínas; em “Os Buddenbrook”, devido à condição financeira preocupante da firma, o casarão é vendido por Thomas Buddenbrook, conotando desprestígio social; logo, em ambos os romances somos apresentados a uma ordem cíclica, comum ao mito (Eliade 199414 ELIADE Mircea. Mito e realidade. Tradução de Polla Civelli. São Paulo, Perspectiva, 1994.) representativa da decadência de status social, a qual Hoevel (201017 HOEVEL Carlos. Mann's Buddenbrooks, Adorno's &Horkheimer's Odysseus and the Tragedy of Business Leadership. In: GHÈSQUIERE, Rita; IMS, Knut Johannessen. Heroes and anti-heroes - European literatura and the ethics of leadership. Garant, 2010.) chama de decadência econômica. Por outro lado, atrelada a essa perspectiva da decadência há o contexto expressivo do findar de gerações, denominado por Boura (20054 BOURA Ana Isabel Gouveia. Espaço e decadência no romance Buddenbrooks de Thomas Mann. Tese de doutorado . FLUP/UP, Porto, 2005.) de decadência biológica, sobre o qual nos cabe fazer algumas considerações.

Em “Os Buddenbrook” (1975), Hanno Buddenbrook, conforme já mencionado enquanto quarta geração da família, fruto do casamento de Thomas com Gerda, morre muito cedo, o que o impede de ter filhos e propagar o nome e a genética da família; nesta personagem concentra-se a ideia de decadência biológica, apresentada por Boura (20054 BOURA Ana Isabel Gouveia. Espaço e decadência no romance Buddenbrooks de Thomas Mann. Tese de doutorado . FLUP/UP, Porto, 2005.), uma vez que Hanno representa a “degenerescência fisiológica” (Souza 201542 SOUZA Gustavo Ramos de. A fortuna crítica de Thomas Mann no Brasil. Carpeaux e Rosenfeld. Em Tese, v. 21, n. 1, 2015.) de uma criatura artista com responsabilidades burguesas. Por outro lado, Antonie, irmã de Thomas, ambos pertencentes à terceira geração, tem uma filha - Erika Weinschenk - com aproximadamente 30 anos (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 661) e que, apesar de ter se casado com Hugo Weinschinck, personagem corrupto cujo fim é a prisão, não conota, na narrativa, total impossibilidade biológica de propagação genética, uma vez que, biologicamente, ainda se apresenta apta a ter filhos.

O mesmo ocorre em “Os Maias”, uma vez que Carlos Eduardo da Maia ainda está vivo, mesmo que desiludido quanto ao matrimônio e com tendências extraconjugais, como em seu estado inicial, em que mantém relações com a comprometida Condessa Gouvarinhos. Maria Eduarda Trelarim, por seu turno, apesar do sobrenome recebido pela contração de seu último casamento, não deixa de ser uma Maia, irmã de Carlos Eduardo da Maia, e de ter uma filha - Rosa - bisneta biológica de Afonso da Maia; ocorre que o parentesco das últimas se esconde socialmente pelos nomes de família adquiridos ao longo das relações matrimoniais e civis. Portanto, o fenômeno acima explicitado vai além da decadência biológica (Boura 20054 BOURA Ana Isabel Gouveia. Espaço e decadência no romance Buddenbrooks de Thomas Mann. Tese de doutorado . FLUP/UP, Porto, 2005.), já que não se trata de total impossibilidade de um coletivo familiar propagar-se geneticamente, mas sim da impossibilidade da propagação social do nome.

Logo, em relação dialógica com os fenômenos onomímico-civis, compreende-se da narrativa ficcional que o nome de família não se propagará: as personagens ficcionais femininas recebem, primeiramente, os sobrenomes dos pais e, posteriormente, dos maridos, o que fica claro com a evolução das personagens Tony Buddenbrook - Tony Grünlich, Tony Premanender - e Maria Eduarda Mac-Gren - Maria Eduarda Gomes - Maria Eduarda Trelarim. Esse fenômenoonomínico-social de recebimento do sobrenome após contração matrimonial se ramifica na nomeação das filhas das personagens, que recebem o nome dos pais; logo, o que realmente pode ser percebido pelo enredo não dialoga com a decadência biológica coletiva, com uma possível deformação genética, mas com o apagamento do nome de família, o que, baseadas em Rabinovich, chamamos de desparto social do nome. Para a autora (201134 RABINOVICH, Elaine Pedreira et. al. Nomes de família: nomeação, pertencimento, identidade. Salvador, USCAL - FABEP, 2011.: 8),

[...] o nome pode ser visto como um parto social, pois: nomear é gerar uma segunda vez na medida que o nome atribuído ao bebê o insere em uma ordem social: o registro civil, onde a criança inicia a sua existência legal e social. Pelo nome instaura-se uma tripla inscrição: a pessoa em relação à sociedade, a pessoa em relação à família e a pessoa em relação a si própria.

Assim, levando em consideração que o ato de nomear pode ser comparado com um parto social (Rabinovich 201134 RABINOVICH, Elaine Pedreira et. al. Nomes de família: nomeação, pertencimento, identidade. Salvador, USCAL - FABEP, 2011.) uma vez que a nomeação concebe linguisticamente o indivíduo em sociedade e conota sua relação familiar e sua subjetividade, também é verdadeira a possibilidade, ainda que antitética, da convivência entre a nulidade desta inscrição social e a permanência obscurecida da presença de laços hereditários; contexto que leva ao apagamento social de ordem não genética de um nome de família, ao qual chamamos de “desparto social do nome de família”.

Esse fenômeno de ordem macro-onomínica se constrói em ambos os romances aqui mencionados, ao longo de um rompimento subjetivo do grupo familiar (Ariès 19972 ARIÈS Philippe. Gerações. Enciclopédia Einaundi, vida/morte, tradições/gerações. Lisboa, Imprensa Nacional, 1997.) Buddenbrookiano e Maia, seja ludicamente por vontade, em Thomas, seja factualmente por vontade em Maria Monforte e Carlos Eduardo, seja factualmente por necessidade em Maria Trelarim. Tal rompimento subjetivo se torna perceptível quando já não há sentimento “missionário” de necessária propagação de um coletivo; essa questão de teor abstrato, porém, concretiza-se literariamente mediante a despersonalização do nome de família, pela qual se negam os laços hereditários, havendo o prevalecimento do sujeito em sua individualidade.

O fenômeno de despersonalização do nome de família pode ser detalhado nas obras quando a diferenciação, enquanto individualidade do sujeito ficcional, sobressai-se com relação ao coletivo e à lealdade familiar (Boszormenyi-Nagy; Spark 19835 BOSZORMENYI-NAGY Ivan, SPARK Geraldine M. Le altadês invisibles. Buenos Aires, Amorrortu, 1983.), como em Thomas Buddenbrook, em sua pulsão de morte, Maria Eduarda pela negação social ao nome Maia, Maria Monforte no momento da escolha do prenome de Carlos Eduardo da Maia, bem como na consumação ciente de incesto por parte de Carlos Eduardo e negação deste ao matrimônio, fenômenos posteriormente descritos respectivamente no subcapítulo 3, O duplo onomínico em “Os Buddenbrook” como implícito da decadência e 4 Homonímia como presságio da decadência em “Os Maias” .

Esses ápices narrativos da decadência familiar têm sua consequência, por seu turno, no desparto social do nome de família, já citado enquanto não propagação explícita de descendências, uma vez que estas foram socio-historicamente anuladas, gerando uma “ausência de nome [...], deformação que torna um acontecimento [socio-historicamente] inacessível (Rabant, 199333 RABANT Claude. Inventar lo real. Buenos Aires, Nueva Visión, 1993: s.p). Para se concretizar tal apagamento social do nome de família, questões de ordem micro-onomínicas agem, dentre as quais estão a materialização do duplo, em “Os Buddenbrook”, e da homonímia como presságio, em “Os Maias”.

3 O duplo onomínico e existencial em “Os Buddenbrook” como implícito da decadência

Comecemos pela lógica alfabética: uma primeira leitura de “Os Buddenbrook” contribui para a percepção de que a maioria dos antropônimos ficcionais materializados por Mann propõe uma relação referencial simbólica, promovendo combinações onomínicas não usuais em língua alemã e puramente literárias como em pastor Wunderlich (milagroso), Sessemi Weichbrodt (pão mole) e até fonético-sumarizadoras, como Mr. Brecht, dentista cuja função de extrair acaba representada pelo seu nome onomatopédico. Tais códigos que conotam ironias, sumarizações, entre outras funções simbólicas exercem, pois, não tão somente a função referencial (de identificação), mas aderem a esta funcionalidades caricatas e conotativas. Para Camargo (20187 CAMARGO Amanda Kristensen de. Nomes próprios no romance contemporâneo O Berro do Cordeiro em nova York: um estudo onomástico exploratório. Dissertação de Mestrado . PPGL/UNIOESTE, Cascavel, 2018.: 105-106),

O onoma [é] muito conotativo [...] se a etimologia e uso de hipocorísticos aliados ao discurso promoverem sumarização comportamental, ironia, antítese, alegoria, entre outras funções simbólicas e até gramaticais, como a personificação, configurando sua conotação. Pode, ainda, haver um alto nível conotativo sem que seja necessária a função etimológica, caso de nomes [...] que, inseridos no nível do discurso com etimologias irrelevantes, promovem a conotação por meio de um processo de alegorização do nome.

Logo, ainda que uma minoria de nomes: “Overdieck, Döhlmann, Kröger, Kistenmaker, Hagenstrom e Möllendorpf” (Kayser 197518 KAYSER Herr Christoph. Some Observations on Thomas Mann's Use of Names in "Buddenbrooks". Literary Onomastics Studies: 2, Article 9, 1975.: 120) adira à lógica verossimilhante e geográfica da região hanseática, sendo também muito mimética (Camargo 20187 CAMARGO Amanda Kristensen de. Nomes próprios no romance contemporâneo O Berro do Cordeiro em nova York: um estudo onomástico exploratório. Dissertação de Mestrado . PPGL/UNIOESTE, Cascavel, 2018.), tais antropônimos ficcionais fazem-se dialogicamente simbólicos - com relação ao uso de hipocorísticos, títulos e posição socioeconômica - para com as referências ficcionais que representam; isso significa mencionar que as combinações antroponímicas ficcionais em “Os Buddenbrook” trazem críticas implícitas e ápices poéticos expressos pelo código onomínico, fazendo-se, possível, pois, mensurar, de forma geral, o arranjo onomínico de Mann (197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.) como muito conotativo e alternadamente mimético (Camargo 20187 CAMARGO Amanda Kristensen de. Nomes próprios no romance contemporâneo O Berro do Cordeiro em nova York: um estudo onomástico exploratório. Dissertação de Mestrado . PPGL/UNIOESTE, Cascavel, 2018.).

Em contrapartida, os prenomes Christian, Thomas, Klara e Antonie, pertencentes à terceira geração Buddenbrook - símbolo do início da decadência - são construídos a partir de fenômenos onomínicos pouco transparentes. Percebe-se, inicialmente, que os étimos Christian e Thomas têm maior uso na língua francesa; o primeiro, por seu significado cristão (Guérios 197316 GUÉRIOS João Farani Mansur. Dicionário Etimológico de nomes e sobrenomes. São Paulo, Ave Maria, 1973.: 86; Oliver 201030 OLIVER Nelson. Todos os nomes do mundo. Rio de Janeiro, Best Bolso, 2010.: 103) viabiliza uma conotação irônica de possível sumarização de valores cristãos, contrastantes ao seu comportamento rebelde-protestante. O segundo onoma, Thomas, chama menos atenção pela etimologia - “gêmeo” (Guérios 197316 GUÉRIOS João Farani Mansur. Dicionário Etimológico de nomes e sobrenomes. São Paulo, Ave Maria, 1973.: 207; Oliver 201030 OLIVER Nelson. Todos os nomes do mundo. Rio de Janeiro, Best Bolso, 2010.:279) que pelo próprio signo, o qual se repete em seu criador - Thomas Mann.

É com Thomas Buddenbrook que a estética do duplo se instaura, corroborando o fenômeno de despersonalização do nome de família. Esse duplo se ramifica em duas materializações: a primeira, de ordem psicológica, nos desejos internos e ações externas antagônicas da personagem (quid pro quo) e a segunda, de ordem onomínica, na homonímia da personagem com o autor. Nos prenomes idênticos mistura-se o primeiro duplo de ordem psicológico: autor e personagem compartilham uma existência bipartida: há um esforço de Mann em “superar a sua natureza, impregnada [de] romantismo [...]” (Rosenfeld 199437 ROSENFELD Anatol, Thomas Mann. São Paulo, Perspectiva, 1994.: 23) intenção que se expressa na criação literária, principalmente no quid pro quo íntimo de Thomas, a partir do qual se contrapõem valores burgueses e artísticos constantemente.

Souza (201542 SOUZA Gustavo Ramos de. A fortuna crítica de Thomas Mann no Brasil. Carpeaux e Rosenfeld. Em Tese, v. 21, n. 1, 2015.: 121) entende que, para Mann, “[...] a evolução espiritual significa a degenerescência fisiológica” conotando, pois, a impossibilidade de uma personagem de origem burguesa dialogar sadiamente em sua personalidade qualquer traço artístico, o que dialoga com o entrelugar de Mann: artista burguês. Para Lukács 196823 LUKÁCS Georg. Ensaios sobre Literatura. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira,1968.: 198), quando Mann ascende literariamente, “o isolamento do artista moderno, da arte moderna [...] já é um fato realizado inteiramente na sociedade capitalista” alemã, logo há tão somente duas possibilidades sociais e, por extensão, ficcionais na obra de Mann:personagens socialmente aceitos e intimamente infelizes e os que vivem à margem - com predisposição para a arte, mas sem nela também encontrar seu Hoffstede.

Não obstante a homonímia criada pelo uso de prenomes idênticos entre autor Thomas Mann e a personagem Thomas Buddenbrook poder ser analisada como pistas toponímicas e caricatas de familiares de Mann e figuras reais da região alemã Lübeck, ela, antes de mais nada, documenta linguisticamente o viés autoficcional (Klinger 200820 KLINGER Diana. Escrita de si como performance. In: Revista Brasileira de Literatura Comparada, v. 10, n. 12, 11-31, 2008.) da obra do autor - que se repete em suas produções futuras: Der Zauberberg (1924) [A montanha mágica (1958)], Der Tod in Venedig (1912) [A morte em Veneza (1970)], entre outras. Assim, o “caráter teatralizado da construção da imagem do autor” (Klinger 200820 KLINGER Diana. Escrita de si como performance. In: Revista Brasileira de Literatura Comparada, v. 10, n. 12, 11-31, 2008.: 55) se explicita na homonímia e está implícito na construção do duplo íntimo - quid pro quo - da personagem Thomas Buddenbrook, percebida pela descrição psicológica do narrador onisciente:

Thomas Buddenbrook sentia-se indizivelmente cansado e descontente [...] sentia-se vazio; não via nenhum plano animador [...] o seu impulso trabalhador, que sempre diferia fundamentalmente da vontade de trabalho natural e durável dos seus antepassados, sendo coisa artificial, válvula dos nervos, entorpecente [...] todas essas coisas não o tinham abandonado; menos do que nunca, ele sabia dominá-las; haviam recrudescido, tornado suplício (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 539).

Conforme expõe o narrador, Thomas agia de maneira artificial, atuando socialmente (Goffman 2009) segundo um papel social que não se coadunava com sua essência. No início da narrativa, somos apresentados ao fato de que, na infância, Thomas “não tinha semelhante talento [de atuação]” (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 13) de Christian, porém, mediante o conflito interno da personagem somos levados à percepção de que sua vida adulta fora resumida em atuar. Todavia, nos dias e noites que precedem a morte de Thomas, o conflito interno entre as responsabilidades burguesas e as questões espirituais aguça-se e o acompanha até o exato momento da morte, quando a personagem se entrega a um “sentimento protestante (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 573)” buscando leituras filosóficas sobre vida e morte, mais especificamente, a obra de Schopenhauer: Die Welt als Wille und Vorstellung [O Mundo como Vontade e Representação]. Thomas se nutre da leitura, elevando-se espiritualmente e, posteriormente, envergonha-se: “[...] na manhã seguinte, acordando com uma levíssima sensação de embaraço por motivo das extravagâncias espirituais da noite passada, previa algo da irrealizabilidade desses belos projetos” (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 578).

Sob outra perspectiva, apesar desse arrependimento repentino e da percepção de que não poderia concretizar seus desejos espirituais, as leituras de Thomas instauram, para além do duplo: vida terrena e vida espiritual, o que chamamos de “despersonalização do nome de família”, fenômeno complexo que se dá, na obra de Mann, mediante o momento de pulsão de morte (Freud 200615 FREUD Sigmund Schlomo. Para além do princípio de prazer. In: HANNS, Luiz Alberto. (Org). Escritos sobre a psicologia do inconsciente (1915 - 1920). Tradução de Luiz Alberto Hanns (Org.). Rio de Janeiro, Imago, 2006 [1920]. [1920] ) de Thomas. Em êxtase sublimante de autocrítica violenta, a personagem ironiza a própria descendência, nega sua continuidade e, pela primeira vez, valoriza o indivíduo: eu em detrimento do outro, do todo familiar:

Esperei continuar a viver no meu filho? Numa personalidade mais medrosa, mais fraca, mais incerta ainda? Que engano tolo e infantil! Para que me serve um filho? Não preciso de filho!... Onde estarei eu depois de morto? Mas isto é tão lúcido e claro, tão maravilhosamente simples! Estarei em todos aqueles que já disseram “Eu”, que dizem ou dirão. (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 577, grifo nosso).

Fica explícito, mediante o trecho, que Thomas não consegue mais reconhecer sua própria linhagem consigo mesmo. Trata-se do duplo mais bem elaborado por Mann, mediante o qual, até mesmo gramaticalmente, propõe-se uma igualdade antitética, impossível. A (re)vivificação de si, mediante a valorização subjetiva (Beneviste 1991) do pronome pessoal “eu”, que linguisticamente reafirma a existência egocêntrica da personagem, gera a ruptura da relação com o outro, no caso, o descendente, seu filho Hanno, no qual Thomas, portanto, não haveria mais de existir. Assim, a negação da descendência e a quebra de expectativa de continuar a existir pela propagação do nome coletivo culminam na despersonalização do nome de família: na valorização do “eu” em detrimento de “nós” e, por fim, na quebra de laços onomínicos de lealdade: quebra-se a missão de salvaguardar o nome de família.

Há outra forma de concretizar onominicamente a estética de Mann relacionada ao duplo existencial ou psicológico, esta, por sua vez, não se relaciona à despersonalização do nome de família, mas, ainda em “Os Buddenbrook”, materializa, nas primeiras páginas da obra, as personalidades ambíguas das personagens da segunda geração, por meio de antropônimos de nacionalidade dupla. Tal condição bipartida, por sua vez, seria geneticamente herdada também pela terceira geração e magistralmente ilustrada no quid pro quo de Thomas. Quanto ao duplo onomínico de nacionalidades, afirma Kayser (197518 KAYSER Herr Christoph. Some Observations on Thomas Mann's Use of Names in "Buddenbrooks". Literary Onomastics Studies: 2, Article 9, 1975.: 124):

Their French first names, therefore, have to be understood as a sign of reverence for France, as a sign of cultural sophistication and openness to the world. Thus, the combination Jean Buddenbrook creates, is similar to the mystic “Coincidentia oppositorum," a union of two seemingly opposed entities, in this case of the French and German culture. Jean Buddenbrook is the embodiment of this union that transcends national boundaries and prejudices, and the two contrastive parts of his full name aptly reflect it.

Ao contrário do que assume Kayser enquanto um duplo que se dissolve em uma personalidade homogênea: “transgressora das diferenças culturais”; defendemo-lo com base no enredo, enquanto duplo de nomes que se concretiza em um viés alegórico de nações linguisticamente e culturalmente opostas, gerando personalidades íntimas contrastantes, configurando, mediante duplo de onomas, um duplo existencial. O primeiro Buddenbrook a quem somos apresentados e que se considera a primeira geração: Johann Buddenbrook (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 5) ou “velho Buddenbrook” ainda que conhecesse “um bom pedaço do mundo” [...] tinha tendência para traçar limites rigorosos” (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.:9). Seu prenome e nome de família de origem alemãs tornam-no - este sim - homogêneo. Tamanha sua homogeneidade que acabara por fazer a esposa - Antoinette Buddenbrook - dissipar muitos de seus traços franceses:

Era uma senhora corpulenta [...] de um modo estranho, no decorrer dos anos, suas feições tinham-se tornado parecidas com as do marido. Apenas o feitio e a mobilidade dos olhos escuros indicavam a linhagem semilatina: descendia, pelo avô, de uma família franco-suíça e nascera em Hamburgo (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 6).

Logo após tal constatação, somos apresentados às características do cônsul Buddenbrook: filho de Johann e Antoniette: Jean Buddenbrook - segunda geração a qual corresponde nossas considerações - que “Herdara do pai os olhos encovados, azuis e atentos, se bem que a sua expressão fosse algo sonhadora” (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 7). Percebe-se, portanto, o caráter híbrido da personagem, não só onomínico, mas também personalístico: entre o rigor do pai e a ludicidade da mãe, que se partilha sofrivelmente entre questões sociais e espirituais, duplo que se repetirá nas demais gerações.

Thomas, terceira geração, tinha “[...] os olhos e a forma do rosto do avô”; já Christian, seu irmão “se parecia com o pai de um modo quase ridículo” (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 13) descrições que perpetuam o duplo não só intrínseco à essência das personagens, mas que se sobressai nas relações familiares enquanto personalidades opostas, tais como de Christian e Thomas, na qual o primeiro tinha gosto pela arte e por preencher suas necessidades individuais, enquanto Thomas aniquilara-se a si mesmo em prol da família - até sua pulsão de morte - como assim também faria Tony - hipocorístico carinhoso de Antonie (Amaral 20111 AMARAL Eduardo Tadeu Roque. Contribuições para uma tipologia de antropônimos do português brasileiro. Alfa: revista de linguística, v. 55, n. 2, 63-82, 2011.) - ao se casar com Grünlich em prol da firma Buddenbrook.

Como se percebe, pelo próprio enredo, Antonie em sua estética antroponímica dialoga com o nome e destino da avó Antoniette - o casamento enquanto negócio:

Esse matrimônio, para falarmos francamente, não fora propriamente o que se chama um casamento de amor. O pai lhe dera uma palmada no ombro, chamando-lhe a atenção para a filha do rico Sr. Kröger, que poderia levar um dote considerável para a firma. E ele, de todo o coração, concordou (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.:49)

O destino de Tony é selado quando a personagem consulta o livro genealógico familiar e retoma para si o compromisso de ter herdado o nome da avó e de ser uma Buddenbrook - garantir o futuro da firma casando-se com um partido aprovado pela família, ainda que não por Tony:

Que mais seria escrito, para o futuro, no espaço deixado junto ao nome que ela herdará da avó Antoniette? E qualquer coisa que se escrevesse seria lida por membros posteriores da família [...] Com o dedo indicador curvo, inclinando a cabeça ardente sobre o ombro, escreveu na sua letra desajeitada [...] “... Em 22 de setembro de 1845, ela contratou casamento com o Sr. Bendix Grünlich, comerciante de Hamburgo (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 143)

Além da clara percepção de o enredo reconstruir a hereditariedade do nome materializada na influência da pessoa que o traz, o que Guérios (197316 GUÉRIOS João Farani Mansur. Dicionário Etimológico de nomes e sobrenomes. São Paulo, Ave Maria, 1973.: 20) define como “Onomatomância” - [...] superstição de que o nome exerce ou poderá exercer influência na pessoa que o traz ou na sua vida (Guérios, 197316 GUÉRIOS João Farani Mansur. Dicionário Etimológico de nomes e sobrenomes. São Paulo, Ave Maria, 1973.: 20) - cabe ressaltar a reafirmação de laços onomínicos-hereditários de Tony: o esquecimento do self concretizado em uma união infeliz, reconstruída onominicamente, de acordo com Kayser (197518 KAYSER Herr Christoph. Some Observations on Thomas Mann's Use of Names in "Buddenbrooks". Literary Onomastics Studies: 2, Article 9, 1975.) por Mann (197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.):

[...] AG on Tony’s handkerchief reveals a deeper meaning, for it can also be read as the abbreviation of "Aktiengesellschaft”, meaning "business corporation”. In the context of the novel the AG indicates the business like character of this marriage which in reality was Bendix and Antonie Grunlich, Inc. The ironic double meaning of the AG monogram allows Thomas Mann to sum up the entire story of this ill-fated marriage in two letters. This is indeed an ingenious artistic achievement (Kayser 197518 KAYSER Herr Christoph. Some Observations on Thomas Mann's Use of Names in "Buddenbrooks". Literary Onomastics Studies: 2, Article 9, 1975.: 130). (Grifo nosso).

Da tradução alemã para o português, esse mecanismo onomínico-semântico se perde. Não se faz mais perceptível que o autor se utilizara de uma abreviação dos prenomes das personagens: AG para alegorizar a relação de Antonie e Grünilch com o signo linguístico: Aktiengesellschaft, cuja também abreviação significa corporação de negócios. Esse contexto demonstra que pistas e funções onomínicas podem se perder durante traduções, impossibilitando determinados tipos de equivalência, defendidos pela concepção universalista de língua (Minchin 201927 MINCHIN Carolina Ribeiro. Equivalência é tudo igual? Reconsideração da Equivalência de Koller à luz da tradução das cores e Buddenbrooks, de Thomas Mann. Dissertação de Mestrado . FFLCH-USP, São Paulo, 2019.).

Antonie é a personagem da terceira geração que mais demonstra preocupação para com a perpetuação d”Os Buddenbrook”s; inclusive quando sua irmã Klara “moça de beleza austera e singular [...] [e] apesar do considerável dote, seria difícil [de] casar” (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 254) sela um matrimônio sem filhos com pastor protestante Tiburtius, findando cedo sua vida ficcional antitética, Tony se inquieta, percebendo que, “[...] no próprio lar também ainda não havia a certeza da perpetuação do nome da família (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 322).

Além da preocupação explícita para com a perpetuação do nome, Antonie é a única personagem a receber um prenome familiar cujas raízes etimológicas se repetem (Guérios 197316 GUÉRIOS João Farani Mansur. Dicionário Etimológico de nomes e sobrenomes. São Paulo, Ave Maria, 1973.) na terceira geração, o que, ao ver da personagem, acentua seu dever hereditário-coletivo. É somente na quarta e última geração, que se retoma, de forma idêntica, um prenome: Johann, prenome do primeiro Buddenbrook a que temos acesso e pelo qual Jean Bruddebrook, na intimidade, era chamado. Apesar desse retorno à origem simbolizar, por parte de Thomas, a busca pelo gosto comercial do avô, e, para Tony, a possibilidade de “Os Buddenbrook” ainda não estarem “no kyrie-eleison e de “[...] haver um Johann outra vez” (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.:355) a fim de “conservar o brilho, a fama do nome paterno e dar a família nova prosperidade” (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 611), esse antropônimo ficcional propõe ironicamente o fim do ciclo dos Buddenbrooks. Essa proposta se explicita no momento que o pequeno Johann desenha um traço duplo abaixo de seu nome no livro genealógico da família, pensando que “[...] não vinha mais nada” (Mann 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.:461). Esse momento do enredo pressagia o apagamento do nome de família, assim como outrora selara o casamento infeliz de Tony.

A estética da decadência descrita em Mann, a materialização do arranjo onomínico, mediante fenômenos homonímicos e a constante do duplo, bem como a proposta de presságios também são comuns à estética em “Os Maias”; por outro lado, concretizam-se de forma heterogênea e dialogam, ainda, com a influência da tragédia clássica que, por sua vez, também contempla a tragédia moderna da decadência de uma família: o apagamento do sobrenome.

4 Homonímia como presságio da decadência em “Os Maias”

Dando continuidade à análise chegamos à focalização do arranjo onomínico da obra de Eça de Queirós. Relacionando-o, também, inicialmente, à proposta de aferição de onomas em continuum de Camargo (20187 CAMARGO Amanda Kristensen de. Nomes próprios no romance contemporâneo O Berro do Cordeiro em nova York: um estudo onomástico exploratório. Dissertação de Mestrado . PPGL/UNIOESTE, Cascavel, 2018.), percebe-se uma primeira singularidade com relação à nomeação descrita anteriormente: não há combinações onomínicas puramente literárias. A maioria dos nomes e sobrenomes são miméticos à lógica onomínica portuguesa oitocentista, fazendo-se, portanto, em sua maioria, um código pouco conotativo e muito mimético: “imitam a nomeação da sociedade” (Camargo 20187 CAMARGO Amanda Kristensen de. Nomes próprios no romance contemporâneo O Berro do Cordeiro em nova York: um estudo onomástico exploratório. Dissertação de Mestrado . PPGL/UNIOESTE, Cascavel, 2018.: 105).

Ainda assim, há exceções de onomas muito conotativos, que mesmo muito miméticos propõem alegorias representativas, como ocorre com o sobrenome de origem judia Cohen, que, ao referenciar a personagem cônsul Cohen: banqueiro e imbecil, endividado e pouco confiável parodia o status de descrédito do povo judeu àquela sociedade (Coutinho 201710 COUTINHO Paulo David dos Santos. Eça de Queirós e a questão judia. História das Ideias, v. 32, n. 2, 367-407, 2017.), o que aqui dialoga com a condição das personagens judias em “Os Buddenbrook”, simbolizando a condição antissemita de algumas personagens, como se faz perceptível na relação de Tony e Julinha, na qual a primeira hostiliza a segunda por seus traços étnicos não agradáveis que esteticamente se opõem aos traços arquitetônicos poderosos da mansão da última.

Porém, dentre a percepção de picos onomástico-conotativos (Camargo 20187 CAMARGO Amanda Kristensen de. Nomes próprios no romance contemporâneo O Berro do Cordeiro em nova York: um estudo onomástico exploratório. Dissertação de Mestrado . PPGL/UNIOESTE, Cascavel, 2018.: 109), o que mais chama a atenção, são os onomas conotativos que só se classificam como tal textualmente - assim como os pertencentes à quarta geração Buddenbrookiana. No romance de Eça, os onomas se repetem em duplos onomínicos de proximidade linguística: Afonso da Maia e Afonso de Albuquerque, Maria Eduarda e Carlos Eduardo e, por fim, João da Ega e seu criador-autor Eça de Queirós.

O fenômeno do duplo onomínico, por outro lado, em “Os Maias” não caracteriza personagens em conflito psicológico interno/externo, tampouco a ideia de impossibilidade existencial de duas instâncias heterogêneas - id e superego - contemplarem um mesmo casulo psicoespacial, como ocorre em “Os Buddenbrook” com Thomas Buddenbrook. No romance português há uma homogeneidade de comportamentos externamente decadentes, da qual Carlos Eduardo - anti-herói e personagem de ampla focalização narrativa - age de maneira antitética a seu avô - descrito como um herói clássico: Afonso da Maia - e materializa o apogeu da decadência: o incesto.

Assim como nessa corporificação da decadência familiar, as demais ações da personagem propõem sinais de causa e efeito que extrapolam a má conduta do id, sendo estas orquestradas por um regente maior - que não os deuses da tragédia clássica - mas agentes externos à ação e internos ao léxico literário: como a descrição dos locais e a nomeação - agentes do trágico e da decadência. Antes de nos atermos, porém, propriamente a descrição dos agentes onomínicos da decadência, destaca-se, como em “Os Buddenbrook”, a percepção do fenômeno da homonímia entre autor e personagem - em “Os Maias”, por sua vez, camuflada pela troca da consoante ç pela consoante g: em Eça e Ega (Lago 201022 LAGO Sylvio. Eça de Queirós. Ensaios e Estudos. São Paulo, Biblioteca24horas, 2010.). Essa similitude antroponomínica intensifica para a crítica a possibilidade de a persona do autor materializar-se em Ega, enquanto alter-ego (Lago 201022 LAGO Sylvio. Eça de Queirós. Ensaios e Estudos. São Paulo, Biblioteca24horas, 2010.).

O procedimento de Eça teatralizar-se hiperbolicamente em personagens específicas é comum em suas obras, como ocorre em Fradique Mendes, na obra Correspondência de Fradique Mendes (1946). Esse fenômeno explicita como em Mann - com relação ao duplo, o entre lugar, a luta do id para com o superego presentes em Thomas - uma relação estética autoficcional específica que, em Eça, concretiza-se ficcionalmente pela concepção às avessas do fenômeno de criação literária, em que se tem um autor-criador. A materialização dessa temática estética ocorre mediante a criação ficcional de autores, sejam de sucesso, como em Fradique; sejam incipientes e inacabados, como em Ega ou Carlos. Esse fenômeno diz muito sobre a função sociocrítica do autor, bem como contempla seu viés lúdico, permitindo a hipérbole caricatural de tais criaturas-autoras dialogarem em instância homonímias - caso de Ega - ou heterônimas - caso de Fradique - com seu criador-autor.

Por outro lado, em “Os Maias”, Ega enquanto criatura autora crítica almeja a realização de uma obra de título já escolhido Memórias de um Átomo que escandalizasse a sociedade burguesa e antes de acabada assim já o fazia:

O livro do Ega! Fora em Coimbra, nos dois últimos anos, que ele começara a falar do seu livro, contando o plano, soltando títulos de capítulos, citando pelos cafés frases de grande sonoridade. E entre os amigos do Ega discutia-se já o livro do Ega como devendo iniciar, pela forma e pela ideia, uma evolução literária. (Queirós 200932 QUEIRÓS Eça de. Os Maias . São Paulo, Escala, 2009 [1888].: 87)

Porém, haveria de ser uma obra inacabada, não publicada, dialogando com o ócio e acomodação da própria sociedade que a personagem critica, sumarizando-se também decadente:

- Tinha-me esquecido dizer-te, vou publicar o meu livro! - O quê? Está pronto? Exclamou Carlos, espantado. - Está esboçado, à brocha larga... [...] - Então, parece-te apresentável?... - Vais publicar? - Não, mas enfim.... - e ficou nesta reticência (Queirós 200932 QUEIRÓS Eça de. Os Maias . São Paulo, Escala, 2009 [1888].: 83; 99)

Carlos, também enquanto personagem decadente - devido ao adultério, ao incesto e ao fato de ter sido responsável pelo infarto do avô - também se compara a Ega enquanto um escritor decadente, uma vez que escrevia à Gazeta Médica, mas idealizava a realização de uma grande obra, e assim como Ega, não a concretiza:

Carlos já falava a sério da sua carreira. Escrevera, com laboriosos requintes de estilista, dois artigos para a Gazeta Médica, e pensava em fazer um livro de ideias gerais que se devia chamar Medicina Antiga e Moderna (Queirós 200932 QUEIRÓS Eça de. Os Maias . São Paulo, Escala, 2009 [1888].: 83)

Ambas as personagens se comportam como criaturas autoras decadentes que, inclusive, tinham planos de escrituras conjuntas:

[...] a criação de uma revista, que dirigisse o gosto, pesasse na política, regulasse a sociedade, fosse a força pensante de Lisboa... Era porém inútil lembrar ao Ega este belo plano. Abria um olho vago, respondia: - Ah, a revista... Sim, está claro, pensar nisso! Havemos de falar, eu aparecerei... Mas não aparecia (Queirós 200932 QUEIRÓS Eça de. Os Maias . São Paulo, Escala, 2009 [1888].: 96)

A ociosidade das personagens quanto ao trabalho e à produção dialoga com a própria crítica de Ega quanto à ociosidade de Portugal, “choldra ignóbil” (Queirós 200932 QUEIRÓS Eça de. Os Maias . São Paulo, Escala, 2009 [1888].: 67) onde “tudo vem nos caixotes pelo paquete” (Queirós 200932 QUEIRÓS Eça de. Os Maias . São Paulo, Escala, 2009 [1888].: 83) logo, a própria caracterização das personagens enquanto criaturas autoras incipientes é relevante para a temática de decadência de forma ampla e alegórica para com Portugal - para além da decadência do âmbito familiar, o que dialoga com a análise alegórica de Vieira (201346 VIEIRA Estela. Interiors and Narrative. The Spatial Poetics of Machado de Assis, Eça de Queirós, and Leopoldo Alas. Maryland, Bucknell University Pres, 2013.).

Quanto às demais nomeações enquanto agentes do trágico e decadente resta focalizar a primeira geração: Afonso da Maia é o primeiro Maia a qual o leitor é apresentado: “velho mais idoso que o século” (Queirós, 200932 QUEIRÓS Eça de. Os Maias . São Paulo, Escala, 2009 [1888].: 6) “[...] lembrava, como dizia Carlos, um varão esforçado das idades heroicas um D. Duarte de Menezes ou um Afonso de Albuquerque” (Queirós 200932 QUEIRÓS Eça de. Os Maias . São Paulo, Escala, 2009 [1888].: 10). As referências antroponímicas relacionadas a um conde africano e um imperador português confirmam a crença de Carlos com relação ao caráter superior do avô, relacionando-o, por sua vez, a tais personalidades. Com a homoníma de prenomes em “Afonso da Maia” e “Afonso de Albuquerque” dá-se origem à crença irracional de que o nome próprio “[...] poderá exercer influência na pessoa [ou personagem] que o traz” (Guérios 197316 GUÉRIOS João Farani Mansur. Dicionário Etimológico de nomes e sobrenomes. São Paulo, Ave Maria, 1973.: 20), que se perpetua na nomeação das personagens. Está-se, portanto, novamente diante da Onomatomância atrelada ao fenômeno da homonímia enquanto possibilidade de herança nobre e intelectual - também atestado em “Os Buddenbrook” com relação a Antonie.

Já o fenômeno de nomes semelhantes, como em Maria Eduarda e Carlos Eduardo pressagia os laços hereditários dos indivíduos. Ainda que Maria Eduarda Mac-Gren, assim apresentada no início da narrativa, não carregasse o nome de família Maia de Carlos, devido tê-lo recebido do pai falecido de Rosa, sua filha, e ser conhecida socialmente por madame Gomes - por ser acompanhante de Castro Gomes em Lisboa - o presságio da união incestuosa é concretizado enquanto “[...] similitude de nomes [que] quem sabe não pressagiava a concordância de seus destinos” (Queirós 200932 QUEIRÓS Eça de. Os Maias . São Paulo, Escala, 2009 [1888].: 10); ironia do narrador que evidencia o destino trágico de ambos.

Retoma-se a Onomomatomância, ainda neste viés irônico elaborado pelo narrador, na escolha de Maria Monforte - mãe da personagem Carlos Eduardo - pelo nome de seu filho. Motivada pelo desejo que aquele recém-nascido alcançasse um “destino de amores e façanhas” (Queirós, 200932 QUEIRÓS Eça de. Os Maias . São Paulo, Escala, 2009 [1888].: 30), Maria inspira-se em uma novela de cavalaria, cujo herói atingira tais objetivos. O momento da escolha do prenome de Carlos chancela a despersonalização do nome de família, pois Pedro da Maia, marido de Maria Monforte e pai da criança, tinha o desejo de chamá-la de Afonso, em homenagem ao avô - Afonso da Maia - o que é negado por Maria, configurando o desnodar hereditário, a não obrigação para com o coletivo e a despersonalização do nome de família, apesar de a criança ainda carregar o nome até sua morte.

A própria atitude de Carlos ao ter ciência da relação incestuosa com a irmã acentua a despersonalização do nome de família, uma vez que a personagem mantém consciente (Queirós 200932 QUEIRÓS Eça de. Os Maias . São Paulo, Escala, 2009 [1888].: 239) a relação incestuosa anteriormente inconsciente, comprovando sua decadência individual e rompimento ético para com a propagação genética, já que o incesto materializa, de outra maneira, a mesma degenerescência fisiológica perceptível na elaboração de Hanno, por Mann (197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.) enquanto sabedoria dionisíaca (Nietzsche 199229 NIETZSCHE Friedrich. O Nascimento da Tragédia. Tradução de J. Guinsburg. São Paulo, Companhia das Letras, 1992.) que, por outro lado, vai contra a natureza humana e aniquila a progressão genética saudável; por fim, a predisposição ao adultério da personagem conota a falta de compromisso desta com a propagação do nome de família, também o despersonalizando.

Maria Eduarda Mac-Gren, Maria Eduarda Gomes, Maria Eduarda Trelain em sua tripla referenciação quanto ao nome de família corrobora o fenômeno de despersonalização do nome de família quando, tendo ciência de sua origem - é uma Maia - não oficializa tal nome de família socialmente. Ao ser informado do casamento da irmã, Carlos se tranquiliza, uma vez que estaria apagada a tragédia do incesto pela contração de novo nome de família:

Um efeito de conclusão, de absoluto remate. É como se ela morresse, morrendo com ela todo o passado, e agora renascesse sob outra forma. Já não é Maria Eduarda. É Madame de Trelain, uma senhora francesa. Sob este nome, tudo o que houve fica sumido, enterrado a mil braças, findo para sempre, sem mesmo deixar memória... (Queirós 200932 QUEIRÓS Eça de. Os Maias . São Paulo, Escala, 2009 [1888].: 279-280)

Esta passagem do romance de Eça retoma a questão do silenciamento de um fato social e histórico (Rabant 199333 RABANT Claude. Inventar lo real. Buenos Aires, Nueva Visión, 1993), que se faz permissivo graças à nulidade de um nome, no caso em questão, de um nome próprio coletivo: o nome de família.

Não há, pois, livro genealógico, enquanto força centrípeta de presságios da decadência presente em “Os Buddenbook”, em “Os Maias”, porém ecoam-se presságios que também se associam a fenômenos onomínicos. Presentes desde a lógica de nomes compostos dos irmãos que se tornam amantes inicialmente por ignorância: Maria Eduarda, Carlos Eduardo, até de prenomes homônimos indicativos de linhagem nobre e reflexo comportamental, como ocorre em Afonso de Albuquerque e Afonso da Maia, a homonímia em “Os Maias” se configura enquanto presságio do trágico, como a ideia de predestino - em sua mais clássica concepção, na qual forças externas agem sobre o comportamento já decadente das personagens.

5 Considerações Finais

Os fenômenos antroponímicos detalhados anteriormente dos quais se sobressaem a homonímia como materialização de duplos são concretizadores da decadência em ambas as narrativas - configurando ironia e pessimismos necessários para representar o viés heterogêneo autoficcional de ambos os autores: Em Mann, o desiquilíbrio distendido entre o homem (espírito) e seu papel burguês (Souza 201542 SOUZA Gustavo Ramos de. A fortuna crítica de Thomas Mann no Brasil. Carpeaux e Rosenfeld. Em Tese, v. 21, n. 1, 2015.), e, em Eça, a criatura autora, ambígua e decadente.

Ademais, representando a estética da decadência de forma quase simétrica, ambas as narrativas utilizam-se do presságio e da influência genético-comportamental para representar a relação conflituosa das gerações mais recentes com seus antepassados e a tragédia da não propagação do nome de família, porém, a presença clássica da tragédia em “Os Maias” faz-se explícita pelo incesto, obscurecendo a verdadeira tragédia socio-moderna: a não continuidade do nome de família, ilustrada pelo mascaramento onomínico da personagem Madame Trelain e pelo implícito isolamento afetivo de Carlos Eduardo da Maia.

Em “Os Buddenbrook”, a tragédia moderna da não continuidade se sobressai, encontrando em Thomas um conflito existencial culminante na despersonalização do nome de família; logo, na negação lúdica para a continuidade do nome de família, possibilidade única presente no pequeno e último Johann, Hanno - apelido sumarizador da sua verdadeira essência doce e contrastante ao seu nome oficial. Hanno centraliza o ápice dos conflitos existenciais familiares anteriores e se faz terreno simbólico para representação do desequilíbrio de uma descendência sempre formada por duplos onomínicos e genéticos antitéticos, desfazendo-se em uma quarta e última geração - pressagiada pela assinatura fatídica de Hanno na lista onomástico-cronológica da família - enquanto representação da relação insuportável entre arte e burguesia.

Ambos os enredos dialogam, pois, em seus devidos desfechos, com o fenômeno onomínico a que chamamos de desparto social do nome de família, o qual, agindo em prol do apagamento do nome de família e obscurecimento social de relações hereditárias reflete um silenciamento de tragédias familiares.

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  • 3
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  • 4
    . Rodrigues (200836 RODRIGUES Menaldo Augusto da Silva. A representação do tempo no romance "Der Zauberberg" de Thomas Mann. Dissertação de Mestrado . FFLCH/USP. São Paulo, 2008.) em sua dissertação focaliza suas considerações acerca da função do tempo - rompendo com a focalização do espaço - na obra de Mann Der Zauberberg [A Montanha Mágica] em que são realizadas pequenas considerações de mesmo teor com relação à obra Buddenbrooks.
  • 5
    . A publicação tardia da obra está relacionada ao momento político em que a Alemanha oriental vivia: o regime comunista (KIND 201819 KIND Anette. Eça de Queirós auf der "Insel der Seligen": das Werk des portugiesischen Romanciers im Ostberliner Aufbau-Verlag. Tese de Doutorado . FLUP/UP, 2018.).
  • 6
    . “Meu novo romance se chama Buddenbrooks e não Die Buddenbrooks. Eu daria apenas o artigo [die] a um nome nobre, não a um nome burguês” (tradução nossa).
  • 7
    . Título do romance de Fontane, publicado em 1896, que tem como foco a descrição crítica de uma família alemã nobre.
  • 8
    . Os Kröger eram uma família bastante abastada financeiramente. Elizabeth Kröger foi a escolhida para selar matrimônio com Jean Buddenbrook, seguindo conselhos do pai Johann Buddenbrook, uma vez que a família traria um excelente dote para a firma.
  • 9
    . Após dois anos desta reunião, nasceria Klara Buddenbrook, também representante da terceira geração que, na fase adulta, não gera filhos.
  • 10
    . Tradicionalmente, na Alemanha, a família tem um sobrenome comum, que é geralmente o sobrenome do marido. O Código Civil de 1900, parágrafo 1355, determinava: "A mulher adota o sobrenome do marido". Após breves alterações durante a República de Weimar (1918-1933), e mediante a reforma do direito matrimonial, em 1976, apenas em 1991 houve, de fato, uma alteração no código civil que permitia o nome da mulher ser adotado como nome comum da família (STROSCHEIN s.d43 STROSCHEIN Dirk. 1991: Direito iguais de sobrenome na Alemanha. DW, s.d. https://www.dw.com/pt-br/1991-direitos-iguais-de-sobrenome-na-alemanha/a-466251. (30/03/2020).
    https://www.dw.com/pt-br/1991-direitos-i...
    ). Em Portugal, por sua vez, “[...] do século XIX o costume de as mulheres adoptarem o apelido do marido, o que, ao contrário do que afirmou Leite de Vasconcelos, não tinha antes expressão significativa, embora se pudesse verificar”. (Monteiro 200828 MONTEIRO Nuno Gonçalo. Os nomes de família em Portugal: uma perspectiva histórica. In: Etnográfica, v. 12, n. 1, 45-58, 2008.: s.p).
  • 11
    . “O simples nome desse homem lembrava de maneira horripilante aquele ruído que se produz na maxila quando, torcendo, puxando e levantando, se arrancam as raízes de um dente” (MANN 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 451).
  • 12
    . Semelhança de prenomes.
  • 13
    . Hoffstade é um antropônimo da obra de Mann, literariamente criado para sumarizar “o poeta da cidade” (MANN 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.:11) que encontra seu lugar local.
  • 14
    . Além das tabelas onomásticas de Schröter (196438 SCHROTER Klaus. Thomas Mann in Selbstzeugnissen und Bilddokumenten, Reinbek bei. Hamburg, Rowohlt, 1964.: 7) quanto à possibilidade da relação entre entes ficcionais e reais em Buddenbrooks, Miskolci (2003) retoma contemporaneamente questões de ordem autoficcional quando aproxima, por exemplo, a personagem Gerda de Julia, esposa de Thomas Mann.
  • 15
    . Expressão latina: tomar uma coisa por outra.
  • 16
    . A representação biológica e social da impossibilidade sadia de valores artísticos e burgueses enquanto materialização da narrativa autoficcional se dá também com Hanno, criança burguesa com tendências musicistas de frágil saúde, que deixa de existir ainda na infância.
  • 17
    . Seus primeiros nomes franceses, portanto, devem ser entendidos como um sinal de reverência pela França, como um sinal de sofisticação cultural e abertura ao mundo. Assim, a combinação criada por Jean Buddenbrook é semelhante à mística "Coincidentia oppositorum", uma união de duas entidades aparentemente opostas, neste caso da cultura francesa e alemã. Jean Buddenbrook é a personificação dessa união que transcende as fronteiras nacionais e preconceitos, e as duas partes contrastantes de seu nome completo refletem isso. Tradução nossa.
  • 18
    . Livro em Os Buddenbrook em que há descrições de fatos do cotidiano familiar, desejos compartilhados e assinaturas de indivíduos da família Buddenbrook.
  • 19
    . Para Freud (1920), o Self (eu), é o conjunto psíquico (id, ego e superego) que se torna nossa essência, nossa individualidade.
  • 20
    . AG no lenço de Tony revela um significado mais profundo, pois também pode ser lido como a abreviação de "Aktiengesellschaft", que significa "corporação comercial". No contexto do romance, a AG indica o caráter comercial desse casamento, que na realidade era Bendix e Antonie Grunlich, Inc. O duplo significado irônico do monograma da AG permite que Thomas Mann resuma toda a história desse infeliz casamento em duas letras. Esta é realmente uma realização artística engenhosa. (Tradução nossa).
  • 21
    . De acordo com essa teoria, haveria a possibilidade de uma tradução absolutamente equivalente entre línguas.
  • 22
    . Nome que se faz antitético a partir do enredo. Origem por motivação religiosa: “Santa Clara” (MANN 197525 MANN Thomas. Os Buddenbrook: decadência duma família. São Paulo, Círculo do Livro, 1975.: 46) contrasta com o casamento protestante de Klara.
  • 23
    . O traço duplo em um livro genealógico indica o fim da genealogia.
  • 24
    . Não há a intenção, neste trabalho, de associar o comportamento antissemita de algumas personagens em “Os Buddenbrook” e “Os Maias” às devidas percepções positivas ou negativas de seus respectivos autores quanto ao povo judeu; apenas há o objetivo de descrever a representação coletiva do povo judeu enquanto reflexo de um sobrenome sumarizador.
  • 25
    . O fenômeno de heteronímia se configura como “a criação de um nome ficcional que se relaciona a um indivíduo com referências e biografia ficcionais” (CAMARGO 2018a7 CAMARGO Amanda Kristensen de. Nomes próprios no romance contemporâneo O Berro do Cordeiro em nova York: um estudo onomástico exploratório. Dissertação de Mestrado . PPGL/UNIOESTE, Cascavel, 2018.: 205), caso de Fradique.
  • 26
    . Periódico relevante presente na sociedade lisboeta oitocentista.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Fev 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2021

Histórico

  • Recebido
    22 Maio 2020
  • Aceito
    06 Jul 2020
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