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AVALIAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: TRAJETÓRIA DA PRODUÇÃO ACADÊMICA EM PERIÓDICOS (1932-2014)

ASSESSMENT IN PHYSICAL EDUCATION: ACADEMIC PRODUCTION IN JOURNALS (1932-2014)

EVALUACIÓN EN EDUCACIÓN FÍSICA ESCOLAR: TRAYECTORIA DE LA PRODUCCIÓN ACADÉMICA EN PERIÓDICOS (1932-2014)

Resumo

Tem por objetivo compreender como se constitui o debate no campo científico brasileiro sobre avaliação do processo ensino-aprendizagem em periódicos da área publicados entre 1932 e 2014. Revisa 14 periódicos da área e encontra 56 artigos. Com base em indicadores bibliométricos, estabelece três eixos de análise: distribuição dos artigos por ano de publicação; por periódico; por procedência autoral; por autor. Os resultados apontam para um aumento na produção sobre o tema nos últimos quatro anos, em comparação com a década anterior, entretanto, ainda há lacunas com referência a textos que abordem o ensino infantil e o ensino médio.

Palavras-chave
Educação Física; Avaliação; Atividades científicas e tecnológicas

Abstract

This study looks into the debate in Brazil’s science field about assessment of teaching and learning in Physical Education journals published between 1932 and 2014. It reviewed 14 journals and found 56 articles. Based on bibliometric indicators, it established three lines of analysis: distribution of the articles according to year of publication; journal; author’s place of work; authors. The results point to an increase in production on the topic in the last four years compared to the previous decade. However, there are still gaps in terms of texts addressing childhood education and secondary education.

Keywords
Physical Education; Assessment; Scientific and technological activities

Resumen

Busca comprender cómo se constituye el debate en el campo científico brasileño sobre la evaluación del proceso de enseñanza y aprendizaje en periódicos del área publicados entre 1932 y 2014. Revisa 14 periódicos de ese campo y encuentra 56 artículos. Sobre la base de indicadores bibliométricos, establece tres ejes de análisis: distribución de los artículos por año de publicación; por periódico; por origen autoral; por autor. Los resultados indican un aumento de la producción sobre el tema en los últimos cuatro años en comparación con la década anterior. Sin embargo, todavía existen lagunas referentes a textos que aborden la educación infantil y la escuela secundaria.

Palabras clave
Educación Física; Evaluación; Actividades científicas y tecnológicas

1 INTRODUÇÃO

O interesse da comunidade acadêmica em publicar em periódicos tem se apresentado nas últimas décadas de forma crescente, tanto no Brasil como no exterior. Com isso, as pesquisas da Educação e da Educação Física têm adotado os periódicos como fonte e/ou objeto de estudo. Na Educação Física ocorreu aumento desse tipo de trabalho com enfoque na avaliação, principalmente a partir de 2000, conforme os estudos de Santos (2002SANTOS, Wagner dos. Avaliação na educação física escolar: análise de periódicos do século XX. 2002. 138 f. Monografia (Licenciatura em Educação Física) - Centro de Educação Física e Desportos, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2002.), Santos, Ferreira Neto e Locatelli (2003)SANTOS, Wagner dos;FERREIRA NETO, Amarílio; LOCATELLI, Andrea Brandão. O debate em periódico sobre avaliação na educação física escolar: percurso e perspectiva. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, 13., 2003, Caxambu. Anais... Caxambu, 2003. Disponível em:<Disponível em:http://proteoria.org/modules/publisher/item.php?itemid=133 >. Acesso em: 20 fev. 2016.
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, Lopez-Pastor et al. (2013)LÓPEZ-PASTOR,Víctor Manuel et al.Alternative assessment in physical education: a review of international literature. Sport, Education and Society, v. 18, n. 1, p. 57-76, 2013., Melo et al. (2014MELO, Luciene Farias et al.Produção de conhecimento em prática avaliativa do professor de educação física escolar: análise das escolhas metodológicas. Pensar a Prática, v. 17, n. 1, p. 1-294, jan./mar. 2014.) e Novaes, Ferreira e Mello (2014NOVAES, Renato Cavalcanti; FERREIRA, Marcos Santos; MELLO, João Gabriel de. As dimensões da avaliação na educação física escolar: uma análise da produção do conhecimento. Motrivivência, v. 26, n. 42, p. 146-160, 2014.).

Ao realizar o mapeamento da produção em periódicos nacionais no período de 1930 a 2000, Santos (2002SANTOS, Wagner dos. Avaliação na educação física escolar: análise de periódicos do século XX. 2002. 138 f. Monografia (Licenciatura em Educação Física) - Centro de Educação Física e Desportos, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2002.) e Santos, Ferreira Neto e Locatelli (2003)SANTOS, Wagner dos;FERREIRA NETO, Amarílio; LOCATELLI, Andrea Brandão. O debate em periódico sobre avaliação na educação física escolar: percurso e perspectiva. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, 13., 2003, Caxambu. Anais... Caxambu, 2003. Disponível em:<Disponível em:http://proteoria.org/modules/publisher/item.php?itemid=133 >. Acesso em: 20 fev. 2016.
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apresentam o debate sobre avaliação na Educação Física em uma pesquisa bibliográfica, utilizando como fonte o Catálogo de periódicos de Educação Física e Esporte: 1930-2000 (FERREIRA NETO et al., 2002FERREIRA NETO, Amarílio et al.Catálogo de periódicos de educação física e esportes (1930- 2000). Vitória: Proteoria, 2002.). Encontraram 33 artigos distribuídos em 11 periódicos, propondo uma organização dessas pesquisas em três categorias: quatro que assumem como referência a avaliação normativa; 14, a avaliação criterial e outros 15 artigos classificados como avaliação emancipatória.

Lopez-Pastor et al. (2013)LÓPEZ-PASTOR,Víctor Manuel et al.Alternative assessment in physical education: a review of international literature. Sport, Education and Society, v. 18, n. 1, p. 57-76, 2013. fazem uma revisão em livros e artigos na literatura internacional especializada na área da Educação Física, no período de 1988 a 2011. Os autores apresentam uma análise fundamentada em cinco categorias, levando em consideração os tipos de avaliação. São elas: formativa; avaliação orientada na/para aprendizagem; autêntica; integrada; alternativa. Concluem afirmando que a Educação Física tem produzido um avanço na avaliação alternativa voltada para a aprendizagem dos alunos, porém ainda existem muitas dificuldades para sua utilização na escola.

Por sua vez, Melo et al. (2014MELO, Luciene Farias et al.Produção de conhecimento em prática avaliativa do professor de educação física escolar: análise das escolhas metodológicas. Pensar a Prática, v. 17, n. 1, p. 1-294, jan./mar. 2014.) investigam a produção de conhecimentos sobre a prática avaliativa de professores de Educação Física na Educação Básica publicada em artigos nas décadas de 1990 a 2010. Os autores encontram 18 artigos evidenciando que os estudos sobre prática avaliativa apresentam um processo tímido de evolução na abordagem de pesquisa qualitativa, principalmente no que se refere à complexidade dos processos de avaliação nas aulas de Educação Física Escolar. Já Novaes, Ferreira e Mello (2014NOVAES, Renato Cavalcanti; FERREIRA, Marcos Santos; MELLO, João Gabriel de. As dimensões da avaliação na educação física escolar: uma análise da produção do conhecimento. Motrivivência, v. 26, n. 42, p. 146-160, 2014.) caracterizam a produção científica sobre avaliação na Educação Física Escolar e analisam seu conteúdo no que diz respeito às dimensões cognitiva, motora e atitudinal. A revisão abrange nove periódicos da Educação Física brasileira no período de 1980 a 2010, tendo sido localizados 15 artigos.

Diante do cenário apresentado, faremos, neste artigo, uma releitura do levantamento realizado por Santos (2002SANTOS, Wagner dos. Avaliação na educação física escolar: análise de periódicos do século XX. 2002. 138 f. Monografia (Licenciatura em Educação Física) - Centro de Educação Física e Desportos, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2002.), dando continuidade ao processo e ampliando o mapeamento até o ano de 2014. Olharemos para as questões por ele abordadas, como a distribuição dos artigos segundo os periódicos e os anos de publicação. Ampliaremos as suas discussões com novas questões, especificamente sobre a procedência autoral dos artigos, relação de autoria entre orientadores e orientandos e distribuição por temas. Dessa maneira, objetivamos compreender como se constitui o debate no campo científico (BOURDIEU, 1989BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Ática, 1989.) brasileiro sobre avaliação do processo ensino-aprendizagem em periódicos da área. Para isso, dedicaremos atenção ao modo como os pesquisadores, em sua trajetória profissional, e seus grupos de pesquisa, vão estrategicamente (CERTEAU, 2002CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: 1. artes de fazer. 15. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.) delineando, no jogo convencional do universo científico (BOURDIEU, 1989BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Ática, 1989.), o campo da avaliação educacional.

Este trabalho contribui para uma visão abrangente dessa área de estudo no Brasil, na medida em que estabelece uma periodização de nove décadas - enquanto os demais mapeamentos pesquisam 30 anos - e ainda toma como fonte 14 periódicos da Educação Física.

2 METODOLOGIA

Assumimos como fonte os estudos publicados em periódicos por ser esta uma das melhores formas de se compreender a multiplicidade do campo, entendendo-o como espaço de divulgação e produção científica. O periódico, como destaca Davis (1990DAVIS, Natalie Zemon. O retorno de Martin Guerre. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990., p. 159), não deve ser compreendido apenas como uma fonte de informações, de ideias, de imagens, mas, acima de tudo, como um mensageiro de relações, o qual possui como “[...] característica mais marcante [...] [o] papel de formador de opinião”. Considerado núcleo informativo (CATANI; SOUZA, 1999CATANI, Denice Barbara; SOUSA, Cynthia Pereira de. O catálogo da imprensa periódica educacional paulista (1890-1996): um instrumento de pesquisa. In: ______. (Org.). Imprensa periódica educacional paulista (1890-1996): catálogo. São Paulo: Plêiade, 1999. p. 9-30.), o periódico servirá como fonte bibliográfica para discutirmos sobre o tema avaliação do ensino-aprendizagem1 1 Entendemos a avaliação do ensino e da aprendizagem como uma ação interna realizada no contexto escolar, constituindo-se em um processo complexo integrante das práticas pedagógicas, envolvendo diferentes sujeitos. Além disso, “[...] Ela não ocorre num vazio conceitual, mas está dimensionada por um modelo teórico de sociedade, de homem, de educação e, consequentemente, de ensino e de aprendizagem, expresso na teoria e na prática pedagógica” (CALDEIRA, 2000, p. 122). na constituição do campo científico brasileiro.

Para tanto, fundamentamos a pesquisa nos indicadores bibliométricos (MUGNAINI; CARVALHO; CAMPANATTI-OSTIZ, 2006MUGNAINI, Rogério; CARVALHO, Telma de; CAMPANATTI-OSTIZ, Heliane. Indicadores de produção científica: uma discussão conceitual. In: POBLACIÓN, Dinah Aguiar; WITTER, Geraldina Porto; SILVA, José Fernando Modesto da (Org.). Comunicação e produção científica: contexto, indicadores, avaliação. São Paulo: Angellara, 2006. p. 313-340.). São eles: distribuição dos artigos pelo ano de publicação e sua relação com o periódico, por procedência autoral, por relação de autoria entre orientadores e orientandos e por temas abordados nos artigos. O uso desses indicadores nos permite quantificar a produção científica sobre o tema avaliação, possibilitando, ainda, compreender a constituição do campo científico (BOURDIEU, 1983BOURDIEU, Pierre. Sociologia. Rio de Janeiro: Ática , 1983.).

De acordo com Bourdieu (1983BOURDIEU, Pierre. Sociologia. Rio de Janeiro: Ática , 1983., 1989), um campo científico se define pelos objetos de disputas e dos interesses específicos referentes a esses objetos. Isso significa que analisar como vem se constituindo o conjunto de produções acadêmicas sobre avaliação nos leva a identificar as vozes autorizadas e com autoridade que possuem capacidade técnica e poder social para intervir e falar em nome de um determinado grupo.

Para procedermos a essa análise, consultamos2 2 A última consulta foi em 24 de fevereiro de 2016. o Currículo Lattes dos autores que publicaram no mínimo dois artigos sobre avaliação, levando em consideração as seguintes informações: as suas instituições, os seus grupos de pesquisas, projetos de pesquisas relacionados com o tema, orientação de trabalhos (iniciação científica, mestrado e doutorado) e produções bibliográficas (artigos completos publicados em periódicos, artigos aceitos para publicação, livros e capítulos de livro). Com base nesses dados, compreenderemos como os pesquisadores têm se dedicado ao tema, em sua trajetória profissional.

Para a seleção das fontes, estabelecemos como ponto partida o ano de 1932 devido ao surgimento dos primeiros periódicos da área, e o ano de 2014 como recorte final por corresponder ao início do presente estudo. Consideramos os trabalhos que demonstravam em seu título uma preocupação central com a avaliação, entretanto, mapeamos apenas os relacionados com a avaliação do ensino-aprendizagem e que se configuram como textos completos, excluindo os resumos. A pesquisa utilizou como descritores as palavras “avaliação”, “avaliar” e “prática avaliativa”. Após a seleção dos artigos, todos foram lidos na íntegra.

Utilizamos como fonte os mesmos periódicos em que Santos (2002SANTOS, Wagner dos. Avaliação na educação física escolar: análise de periódicos do século XX. 2002. 138 f. Monografia (Licenciatura em Educação Física) - Centro de Educação Física e Desportos, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2002.) encontrou textos sobre avaliação da aprendizagem: Revista de Educação Física/UEM (REF/UEM), Revista Brasileira de Ciências do Esporte (RBCE), Revista Brasileira de Ciência e Movimento (RBCM), Pensar a Prática (RPP), Movimento (RMOV), Motrivivência (RMTVV), Revista ARTUS (RA), Revista da Fundação de Esporte e Turismo (RFET), Kinesis (RK), Revista Brasileira de Educação Física e Desporto (RBEFD), Motus Corporis (RMC), Comunidade Esportiva (RCE), Revista Esporte e Educação (REE). Ampliamos ainda essas fontes com a inclusão da Motriz (RMOT), devido ao fato de ter publicações sobre o tema a partir do ano de 2009.

3 DISTRIBUIÇÃO DOS ARTIGOS POR ANO DE PUBLICAÇÃO

Foram mapeados 56 artigos, distribuídos em 14 periódicos. Apesar de a periodização, os primeiros estudos encontrados são datados de 1976, conforme o Gráfico 1:

Gráfico 1
Distribuição na escala temporal

O debate sobre avaliação no Brasil, na área da Educação, ganhou destaque a partir da década de 1970, sob forte influência norte-americana, e corresponde ao mesmo período em que encontramos os primeiros estudos na Educação Física, publicados na RBEFD (KOLLING, 1976KOLLING, Aloysio. Emprego das medidas estatísticas básicas na avaliação da educação física e do desporto. Revista Brasileira de Educação Física e Desportos , v. 8, n. 30, p. 58-65, abr./jun. 1976.; FLEGNER, 1976FLEGNER, Attila Jozsef. Critérios de avaliação escolar em educação física de 11 anos em diante. Revista Brasileira de Educação Física e Desportos, v.8, n. 30, p. 66-80, abr./jun. 1976.). Essa revista veicula cinco pesquisas sobre avaliação, sendo duas em 1976, uma em 1978 e 1979.Há também um artigo na REE (1977).

Segundo Saul (2001SAUL, Ana Maria. Incursionando pela teoria da avaliação educacional. In: ______. Avaliação emancipatória: desafios à teoria e à prática de avaliação e reformulação de currículo. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2001. p. 25-52.), na Educação, esse movimento se deve a dois fatores: de um lado, o trânsito de professores brasileiros que fizeram seus cursos de pós-graduação nos Estados Unidos; de outro, os acordos internacionais, como o Programa de Assistência Brasileiro-Americana ao Ensino Elementar, na década de 1960, que oferecia formação aos educadores brasileiros, a fim de garantir a execução de uma proposta pedagógica, assumindo os moldes norte‐americanos.

Outros aspectos que influenciaram esse intercâmbio entre as produções foram a participação de autores brasileiros em congressos internacionais e a realização desses congressos no Brasil. Na Finlândia, em 1976, ocorreu o Congresso Internacional da Federation Internationale d’Educação Physique,3 3 Segundo Paulo Gama Filho, no Editorial da RA, n. 9/11 (1981), o Congresso recebeu cerca de 600 participantes, tendo 22 conferências e 49 comunicações científicas. com o tema “Avaliação no campo da Educação Física”, na Universidade de Jyvaskyla. Segundo Tubino (1981TUBINO, Manoel José Gomes. Aspectos evolutivos da avaliação em educação física. Artus , n. 9/11, p. 15-17, 1981. Número especial.), esse congresso teve como principal destaque os cientistas finlandeses Liisa Heinila e Risto Telama. Foi nesse evento, segundo o autor, que o Brasil apresentou seu primeiro trabalho sobre avaliação em Educação Física. No caso, o estudo intitulado “Avaliação do Ensino do Futebol em Escolas Superiores de Educação Física” foi produzido por ele em parceria com Alfredo Gomes Faria Júnior.

Após a realização desse congresso, houve necessidade, por parte dos pesquisadores, de novas reuniões. Assim, a Universidade Gama Filho, pelo Departamento de Educação Física, promoveu o XIV Congresso Internacional Association Internationale des Écoles Supérieures d’Éducation Physique, com o tema “Avaliação do Ensino da Educação Física”, realizado em 1981.

É justamente nesse ano que se concentra a maior produção de artigos publicados sobre avaliação, que corresponde a nove (16%). Desses, oito são derivados de trabalhos apresentados nesse congresso e publicados na RA, tendo como autores: Risto Telama (Finlândia), Jurgen Dieckert (Alemanha), Louis Vandevelde (Bélgica), Emil Vuckotiv (Iugoslávia), José Maria Cagigal (Espanha), José Maurício Capinussú, Vera Lúcia Ferreira, Haimo Fensterseifer e Manoel Tubino (todos esses do Brasil).Na década de 1980, há ainda publicações na RA (1980, 1984 e 1985); RBEFD (1981); RCE (1985); RBCM (1987) e RFET (1989).

Congressos sobre o tema em intercâmbio com autores estrangeiros também ocorreram na Educação em 1984. Naquela ocasião, aconteceu a IV Reunião Científica do Programa de Pós-Graduação em Educação na UFES, sob a temática “Avaliação da Educação: Necessidades e Tendências”. Esse encontro gerou um livro, tendo como autor de três capítulos Robert Stake, da Universidade de Illinois.

O interesse da comunidade acadêmica pela avaliação foi um dos motivos que levou, em 1979, à inauguração de dois cursos de mestrado em Avaliação Educacional, um na UFRJ e o outro na UFES (FERREIRA, 1981FERREIRA, Vera Lúcia Costa. Aspectos atuais da avaliação educacional. Artus, n. 9/11, p. 25-27, 1981. Número especial.). Esses dados nos mostram que tanto a Educação como a Educação Física brasileira acompanham os debates realizados no cenário mundial. Em grande parte, esses debates refletem na realização dos congressos realizados na década de 1980, em ambas as áreas, vinculados aos programas de pós-graduação.

Outro fator que sinaliza esse interesse é a incorporação dos estudos de pesquisadores estrangeiros na produção acadêmica brasileira. Uma análise de nossas fontes evidencia que a influência de estrangeiros nas discussões sobre avaliação pode ser dividida em dois momentos. Um primeiro, que marcou a década de 1970, está relacionado com as pesquisas de Ralph W. Tyler, que teve sua obra Princípios básicos de currículo e ensino traduzida e divulgada no Brasil a partir de 1974. O mesmo ocorreu com trabalhos de alguns de seus seguidores, como Robert Mager, James Popham, Eva Baker e Hilda Taba, que tiveram suas obras traduzidas em português a partir de 1980.

Esses autores se baseiam na ideia da avaliação como mensuração. Por meio de instrumentos diversificados, utilizam testes padronizados para medir o desempenho, ou seja, a avaliação é vista como verificação da aprendizagem, definida a partir de objetivos. As reflexões desses autores são publicadas em periódicos da Educação Física, fontes deste estudo, como Kolling (1976KOLLING, Aloysio. Emprego das medidas estatísticas básicas na avaliação da educação física e do desporto. Revista Brasileira de Educação Física e Desportos , v. 8, n. 30, p. 58-65, abr./jun. 1976.) e Flegner (1976FLEGNER, Attila Jozsef. Critérios de avaliação escolar em educação física de 11 anos em diante. Revista Brasileira de Educação Física e Desportos, v.8, n. 30, p. 66-80, abr./jun. 1976.).

Um segundo momento que marcou a produção refere-se à presença de Lee Cronbach, Benjamin Bloom, Michael Scriven, Daniel Stufflebeam, Robert Stake e Robert Singer como autores de referência. Esses pesquisadores, segundo Saul (2001SAUL, Ana Maria. Incursionando pela teoria da avaliação educacional. In: ______. Avaliação emancipatória: desafios à teoria e à prática de avaliação e reformulação de currículo. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2001. p. 25-52.), progrediram rumo a uma proposta de avaliação numa abordagem qualitativa, evidenciada no cenário acadêmico brasileiro ao final da década de 1970.

Na Educação Física, os trabalhos dos anos de 1980 e início da década de 1990 passam a se fundamentar nesses estudos. No diálogo com eles, Telama (1981TELAMA, Risto. Significado pedagógico da avaliação em educação física. Artus , n. 9/11, p. 31-36, 1981. Número especial.) e Resende (1995RESENDE, Helder Guerra. Princípios gerais de ação didático-pedagógica para avaliação do ensino-aprendizagem em educação física escolar. Motus Corporis, v. 3, n. 4, p. 4-15, 1995.) avançam em relação às práticas avaliativas voltadas especificamente para os aspectos motores. Argumentam sobre a necessidade de a avaliação considerar a formação global do aluno, pois entendem que os testes padronizados não ofereciam as informações necessárias para se compreender os processos de ensino-aprendizagem.

Na década de 1990, o interesse pela temática na comunidade acadêmica permanece, como a realização de congressos, dentre os quais, o V Seminário de Educação Física Escolar, promovido pela USP em 1999, com o tema: “Avaliação em Educação Física Escolar”. Outro exemplo que demonstra o interesse é visto na RBCE: dos seis artigos sobre avaliação, cinco se concentram nessa década (um em 1993, 1995, 1999 e dois em 1997) e, no ano de 1995, a revista também dedica o editorial de n. 3 ao tema “Tempo de Avaliar”. A RK também publica um número maior de trabalhos nessa década: quatro (1991, 1992, 1997 e 1999), de um total de seis veiculados por ela.

A partir da década de 1990 e de toda a década de 2000, há a apropriação de autores brasileiros da área da Educação, como Jussara Hoffman, Cipriano Luckesi, Celso Vasconcelos, Ana Maria Saul e Maria Teresa Esteban. As pesquisas dialogam também com autores da Educação Física, como Alex Fensterseifer, Soares et al.,4 4 Referimo-nos ao livro Metodologia do ensino de Educação Física. Suraya Darido e Wagner dos Santos. Mapeamos também os seguintes artigos nos anos de 1990: RPP (um em 1998, dois em 1998/1999, um em 1999/2000);5 5 O ano de 1998/1999 refere-se ao v. 2 da Revista e o de 1999/2000 ao de v. 3. RMC (1995); REF/UEM (1996) e RMTVV (1998). Já nos anos 2000, selecionamos: RK (2001); REF/UEM (2003, 2006); RPP (2004); RMTVV (2007); RMOV (2007, 2009) e RMOT (2009).

A década de 2010 se caracteriza por textos que focalizam possibilidades concretas de práticas avaliativas e experiências pedagógicas de ensino. De 12 trabalhos publicados nesse período, três (25%) apresentam essa característica. Apesar de eles indicarem novas perspectivas epistemológicas de avaliação para sustentar práticas avaliativas que caminham em direção às abordagens culturais, fenomenológicas e cotidianistas, esse ainda continua sendo um desafio para a área nos próximos anos. A partir de 2010, os artigos encontram-se nos periódicos: RPP (um em 2012 e 2013, e dois em 2014); RMOV (2010, 2013); REF/UEM (2010); RMOT (2012); RBCE (2013); RBCM (2013); RMTVV (2014) e RK (2014).

4 PROCEDÊNCIA AUTORAL E A RELAÇÃO DE AUTORIA ENTRE ORIENTADORES E ORIENTANDOS: CONSTITUIÇÃO DE UM CAMPO

A análise da procedência autoral dos artigos assume um lugar central atualmente nos debates acadêmicos, devido à sua relação com a criação de grupos de pesquisa e à produção institucionalizada. Esse tipo de mapeamento nos leva a discutir sobre os pesquisadores que têm se debruçado sobre o tema ao longo da sua carreira, além de dar visibilidade aos seus grupos de pesquisa e as universidades. Do mesmo modo, os dados permitem-nos compreender o prestígio, o reconhecimento, a definição de posição social e de autoridade desses autores no campo científico (BOURDIEU, 1989BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Ática, 1989.).

Para a organização dos artigos, dividimos as publicações em duas categorias de circulação: produção individual e coletiva. Dos 56 trabalhos, 28 possuem autoria, representando 50% do total.

Ao relacionarmos a autoria das pesquisas com a sua distribuição ao longo dos anos, percebemos dois momentos distintos. De 1976 a 2000, foram publicados 36 textos. Dentre estes, 27 são de produção individual, correspondendo a 75% do total desse período. De 2001 em diante, apresenta-se uma relação inversa: dos 20 artigos em circulação, 19 caracterizam-se pela autoria coletiva, ou seja, 95% do total de artigos veiculados no período.

Esse aumento entre as produções conjuntas pode ser explicado devido à consolidação e à maior participação dos autores em grupos de pesquisa. Além desses fatores, há a influência dos programas de pós-graduação, que trazem, como um dos critérios para a implantação e avaliação dos cursos, a presença de professores com projetos de pesquisa que articulam: orientações de alunos da iniciação científica, mestrado e doutorado a produções em periódicos, livros e capítulos de livros.

Essas ações fortalecem a produção de uma política científica que valoriza a produção coletiva entre orientadores e orientandos. Os nossos dados reforçam esse argumento: dos 28 artigos em colaboração, 11 foram produzidos com orientandos da pós-graduação (mestrado e doutorado), sendo dois no final da década de 1990 e os demais a partir de 2001. É o caso de Gabriel Palafox e Dinah Vasconcelos; Marta Canfield e Rosiane Rombald; João Zinn e Luciane Etchepare; Juarez Nascimento e Evandra Mendes; Samuel de Souza Neto, Fábio Tomio Fuzzi e Larissa Benites; Osvaldo Ferraz e Luciene Mello; Vilma Nista-Piccolo e Luciene Mello; Marcílio Souza Júnior e Kadja Tenório; Pierre Gomes-da-Silva e Brígida Bezerra; Juarez Nascimento, Willian Salles, Gelcemar Farias e Ema Egerland; Maristela Souza e Vicente Calheiros.6 6 Embora esses artigos tenham sido produzidos em colaboração com outros autores, optamos por apresentar os pesquisadores que se constituem em orientadores e orientandos.

Com o intuito de darmos visibilidade ao mapeamento daqueles que tiveram mais de um artigo publicado sobre o tema, organizamos o Gráfico 2:

Gráfico 2
Distribuição por autor

Treze autores publicaram mais de um trabalho. Desses autores, Cláudio Reis, Manoel Tubino, Vera Lúcia Ferreira, Pedro Josuá e Risto Telama veicularam suas pesquisas de 1978 a 1998, os demais o fizeram na última década.

A análise do currículo dos autores, por meio da plataforma Lattes, indica que Claudio Reis, Alex Fensterseifer e Luciene Melo não apresentam, na atualidade, vinculação a grupos de pesquisa. Os dados presentes nos currículos também evidenciam que, apesar de os autores terem produzido mais de um artigo sobre avaliação na Educação Física, não são todos que de fato se dedicam a esse objeto como tema central de suas pesquisas. Manoel Tubino, por exemplo, publicou 112 artigos em periódicos, dos quais dois se configuram como fontes desta pesquisa, veiculados na década de 1980 (RA e RBEFD), e outro no The FIEP Bulletin; Vera Lucia Ferreira fez circular três artigos com o tema em questão em 1979 (RBEFD) e, em 1980 e 1981, ambos na RA. Produziu também um capítulo de livro e orientou duas dissertações. Recentemente seus estudos estão focados nos esportes e esportes de aventura.

Por outro lado, também mapeamos autores que apresentam uma continuidade nas publicações sobre o tema. Alex Fensterseifer produziu sua dissertação, defendida em 1996 e intitulada “Avaliação da aprendizagem dos alunos do curso de graduação em Educação Física da UFSM”. Fensterseifer veiculou dois artigos na RK e dois na RBCE, todos em 1997, um em 1998 (RMTVV) e um em 2006 (REF/UEM). Desses, três foram publicados em autoria individual, dois em 1997 e um em 1998. O trabalho de 2006 desenvolveu-se em conjunto com Evandra Mendes, Juarez Nascimento, Markus Nahas e Joaquim de Jesus. O autor possui um livro publicado sobre avaliação em 1998.

Juarez Nascimento fez circular três artigos sobre avaliação, todos coletivos e com orientandos. Em seu currículo, apresenta um projeto de pesquisa específico referente ao tema, entre 2004 e 2005. Orientou uma dissertação, “Metamorfoses na avaliação em Educação Física: da formação inicial à prática pedagógica escolar”, de Evandra Mendes. O trabalho foi defendido em 2005 e se desdobrou no artigo publicado em 2007 (RMOV), em colaboração com José Carlos Mendes. Também com Evandra Mendes e outros autores, conforme análise do currículo de Alex Fensterseifer, fez circular um artigo sobre o tema em 2006 (REF/UEM) e um em 2013 (RBCM) com William Salles, Gelcemar Farias e Ema Egerland. Em 2008 e 2012 publicou dois capítulos de livro e ainda três artigos sobre avaliação no The FIEP Bulletin (2006, 2007, 2007), com Evandra Mendes.

Juarez Nascimento lidera o Núcleo de Pesquisa em Pedagogia do Esporte (Nuppe) e integra o Núcleo de Pesquisa em Atividade Física & Saúde (Nupaf), ambos da UFSC. Atualmente, o autor desenvolve projetos sobre desporto. Já Evandra Mendes integra o Grupo de Extensão e Pesquisa em Educação Física Escolar (Gepefe) da Unioeste e o Grupo de Pesquisa Gímnica - Formação, Intervenção e Escola da UEM.

Luciene de Melo, Osvaldo Ferraz e Vilma Nista-Piccolo produziram em conjunto em dois artigos (REF/UEM, 2010; RPP, 2014).Osvaldo Ferraz apresenta em seu currículo um projeto de pesquisa sobre a avaliação, realizado em 2008 e 2009. Atualmente, apesar de seus projetos não se remeterem à avaliação, o autor demonstra a sua preocupação com o tema ao descrever esses projetos. Orientou uma dissertação sobre o tema, “O Portfólio como possibilidade de intervenção pedagógica na Educação Física”, de Luciene de Melo. A pesquisa foi defendida em 2008 e derivou o artigo de 2010 (REF/UEM). Lidera o grupo de pesquisa em Educação Física Escolar e Esporte Educacional e integra o grupo Contextos Integrados de Educação Infantil, ambos da USP.

Vilma Nista-Piccolo possui em seu currículo três projetos de pesquisa que se relacionam com a temática: um projeto em 2010 e dois em 2011, todos em andamento. Orientou uma dissertação sobre o tema, além da tese de Luciene de Melo, “Tecendo tramas sobre avaliação da aprendizagem em aulas de Educação Física Escolar”, defendidas em 2011. A tese resultou em duas obras, ambas publicadas em 2014:um capítulo de livro e em um artigo na RPP que contou com a participação de Melo, Ferraz e Maria Luiza Miranda. Vilma Nista-Piccolo é líder do Grupo de Pesquisa Potencial da Uniso e integra o Grupo em Ginástica Lapegi da Unicamp.

Wagner dos Santos fez circular dois trabalhos em conjunto sobre avaliação, ambos com Francine Maximiano. O autor estuda a temática desde a graduação, produzindo uma monografia, fruto da iniciação científica, com o título “Avaliação na Educação Física Escolar: análise de periódicos do século XX”, defendida em 2002. A sua dissertação, “Avaliação na Educação Física Escolar: do mergulho à intervenção”, defendida em 2005, gerou a publicação de um livro. Em seu currículo, há quatro projetos de pesquisa, dos quais três focalizam a avaliação educacional. Possui dois capítulos de livro e dois artigos publicados sobre a temática: nos periódicos Educação em Revista (UFMG Impresso) e na RMOV, ambos em 2015.

Wagner dos Santos orientou quatro alunos de iniciação científica e dois de mestrado. Ambas as dissertações foram defendidas em 2015, dentre elas, “Avaliação dos processos de ensino e aprendizagem na formação inicial em Educação Física: implicações para a docência”, de Francine Maximiano. Com base nessa dissertação e em colaboração com outros autores, dois artigos foram aceitos para publicação: um na RMOV e outro na RMOT. Wagner dos Santos orienta dois alunos de iniciação científica, dois de mestrado e um de doutorado, com foco em avaliação. É um dos líderes do Instituto de Pesquisa em Educação e Educação Física (Proteoria) da UFES.

Francine Maximiano foi sua orientanda em duas Iniciações Científicas, em que estudou os temas “Avaliação na Educação Física Escolar nas séries finais do ensino fundamental: prescrições e apropriações”, em 2011, e “Autobiografias discentes: narrativas de experiências avaliativas vivenciadas nas aulas de Educação Física do ensino fundamental, médio e formação inicial”, em 2012. Os dois trabalhos de iniciação científica deram origem aos dois artigos mapeados neste texto (RBCE e RMOV).

Os dados desta pesquisa acenam para a continuidade dos autores que trabalham com o tema avaliação em sua correlação com o fortalecimento da produção científica da última década. Dos 13 autores que veicularam mais de um artigo, oito o fizeram na última década, sendo que Alex Fensterseifer é o único que circula individualmente, com dois artigos. Além disso, quatro publicam com seus orientandos que pesquisam especificamente o tema avaliação: da iniciação científica: Wagner dos Santos com Francine Maximiano; do mestrado: Juarez do Nascimento com Evandra Mendes; Osvaldo Ferraz com Luciene Melo; e do doutorado: Vilma Nista-Piccolo com Luciene Melo.

De modo geral, a produção intelectual desses autores se concentra nos principais periódicos brasileiros da área sociocultural e pedagógica,7 7 Uma análise da contribuição da revista Movimento para a subárea sociocultural e pedagógica da Educação Física brasileira pode ser vista em Carneiro et al. (2016). com destaque para RMOV, RBCE, REF/UEM, RBCM, RMTVV e RPP. A inserção de suas pesquisas nesses impressos evidencia, mesmo que indiciariamente via avaliação dos pares para sua publicação, o reconhecimento acadêmico conferido aos pesquisadores.

As diferentes maneiras com que a produção do conhecimento sobre a avaliação do ensino e da aprendizagem circula no campo científico, ou seja, em periódicos, livros e capítulos de livros, também está vinculada à trajetória de estudo dos autores com o tema, evidenciando a articulação entre projetos de pesquisa, orientações na pós-graduação, grupo de pesquisa e a sua publicação em diferentes meios de comunicação acadêmica. A própria estratégia de circulação da produção em diferentes fontes demonstra como os pesquisadores ampliam sua inserção na área e, com isso, aumentam a visibilidade de sua produção no campo científico. Essa ação fortalece a divulgação do conhecimento produzido, bem como possibilita o reconhecimento daqueles que vêm se dedicando ao estudo da avaliação na Educação Física.

Assim, a quantificação das produções, seus locais de publicação, a indicação de autoria e a trajetória dos pesquisadores mostram o modo como o campo científico sobre avaliação em Educação Física vem se constituindo no Brasil, evidenciando o nome daqueles que,com seu capital intelectual, desenvolvem prestígio científico para discutir, orientar e publicar sobre o tema.

5 TEMAS ABORDADOS PELOS ARTIGOS

Após aleitura dos 56 artigos, foi possível organizá-los em quatro categorias criadas a posteriori, conforme Quadro 1. Nele, apresentamos também suas subcategorias:

Quadro 1 -
Distribuição dos artigos por categorias de análise

Dos 18 artigos da categoria “Concepções e teorias sobre avaliação”, três se fundamentam na avaliação normativa, apresentando testes que quantificam e classificam os sujeitos em relação aos demais componentes de um grupo. Outros cinco trabalhos tratam da avaliação criterial, a partir da relação direta com os objetivos de ensino. Eles entendem a avaliação como verificação da aprendizagem de um aluno em relação aos critérios colocados previamente.

Mapeamos ainda oito estudos que não tomam como base a dicotomia norma/critério, mas se pautam em uma avaliação centrada no indivíduo em diferentes momentos do processo de ensino-aprendizagem, em que há a articulação com condicionantes sociais e econômicos. Assim, dois trabalhos entendem que a avaliação deve proporcionar um diagnóstico em um processo permanente. Outros cinco assumem a perspectiva da avaliação emancipatória que visa à libertação dos modelos classificatórios e de estagnação social. Temos, ainda, uma pesquisa que se referencia na avaliação libertadora, com base no pensamento de Paulo Freire.

Há dois textos nesta categoria que abordam a avaliação para produção de experiência, evidenciando os processos criativos dos alunos, a fim de entender as experiências vividas nas aulas e as apropriações feitas por eles.

Agrupamos 12 trabalhos na categoria “Avaliação da Educação Básica”, reunindo-os em três subcategorias, conforme o Quadro 2. Mapeamos trêsartigos que anunciam uma perspectiva de prática avaliativa, porém, se configuram como ensaios. Os outros novetextossão oriundos de pesquisas empíricas, ecinco deles analisam as representações, concepções e/ou opiniões da comunidade escolar sobre avaliação, caracterizando-se como estudos de denúncia sobre as práticas avaliativas realizadas na escola. Já os outros quatroartigos propõem/constroem possibilidades de práticas avaliativas para a Educação Física. Esse cenário demarca um deslocamento, nos últimos anos, da produção de estudos que visam à denúncia das práticas pedagógicas daqueles que buscam apresentar possibilidades de ensino no reconhecimento da Educação Física como componente curricular.

Os 12 textos que focalizaram a avaliação na Educação Básica possuem a seguinte distribuição quanto à etapa e nível de ensino: ensino fundamental e médio (1), ensino fundamental I (3) e ensino fundamental II (8). Esses achados mostram o silenciamento da produção acadêmica sobre avaliação do processo ensino-aprendizagem na educação infantil. Contudo, pesquisas que se dediquem à avaliação nesse contexto são necessárias, tendo em vista um aumento da inserção do profissional com formação em Educação Física nesta etapa de ensino.

Os 18 trabalhos que focalizaram a avaliação na formação inicial foram agrupados em duas subcategorias. Na primeira, as sete pesquisas discutem e avaliam o curso e/ou o currículo de formação dos professores. Já na segunda, os 11 estudos abordam as experiências com avaliação na formação inicial, tanto em disciplinas como em outros espaços formativos, especificamente na Educação Básica, fruto do Estágio Supervisionado.

Os dados referentes à avaliação na formação inicial distanciam-se dos achados de Poltronieri e Calderón (2015POLTRONIERI, Heloísa; CALDERÓN, Adolfo Ignacio. Avaliação da aprendizagem na educação superior: a produção científica da revista Estudos em Avaliação Educacional em questão. Avaliação, v. 20, n. 2, p. 467-487, jul. 2015.), que também desenvolvem uma pesquisa de mapeamento na revista Estudos em Avaliação Educacional, no período de 1990 a 2010. Os autores evidenciam a ênfase na produção sobre avaliação na Educação Básica, correspondendo a 38% total de artigos encontrados, enquanto os estudos no Ensino Superior são responsáveis por 18%. Assim, Poltronieri e Calderón (2015) mostram que, no campo da Educação em geral, há uma tendência diferente do que foi encontrado em nossas fontes.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A produção sobre avaliação na Educação Física Escolar acompanha os debates do campo da Educação, de modo atento às demandas colocadas por essas áreas. Isso pode ser constatado pelo intenso diálogo da Educação Física com autores da avaliação em um contexto geral. Nesse ponto, ganha destaque o uso de autores estrangeiros como referência, sobretudo nos anos de 1970, para se assumir uma avaliação quantitativa com o intuito de medir o aprendizado. Sousa (2005)SOUSA, Sandra Zákia. 40 anos de contribuição a avaliação educacional. Estudos em Avaliação Educacional, v. 16, n. 31, p. 7-36, 2005. e Uler (2010ULER, Arnilde Marta. Avaliação de aprendizagem: um estudo sobre a produção acadêmica dos programas em Educação (USP/SP, PUC/SP, Unicamp). 2010. 238 f. Tese (Doutorado em Educação: currículo) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2010.) fortalecem esse argumento, na medida em que mostram a influência do pensamento norte-americano na produção acadêmica brasileira, em pesquisas da Educação produzidas a partir de 1970. Na Educação Física, mapeamos o uso de trabalhos produzidos em outros países, como Finlândia, Alemanha, Bélgica, Iugoslávia, Espanha, Estados Unidos da América, além da circulação em congressos de autores estrangeiros.

Os dados evidenciam, desde os primeiros estudos, uma preocupação em se discutir a avaliação na Educação Física pensando nas especificidades do ensino desse componente curricular. Nesse ponto, são várias as possibilidades de práticas. A diferença está na definição do que venha ser a Educação Física e qual é seu objeto de ensino. Contudo, é a partir da década de 2010 que percebemos a intensificação de pesquisas que visam apresentar possibilidades concretas de práticas avaliativas e/ou experiências pedagógicas de ensino no contexto escolar. Mesmo assim, é preciso aprofundarmos os estudos de natureza empírica, sobretudo de caráter longitudinal, com a finalidade de produzir perspectivas teóricas e problematizações que contribuam para qualificarmos as práticas avaliativas na escola.

Presenciamos na última década uma articulação da produção com a pós-graduação, sinalizando um alinhamento entre orientadores, orientandos, grupos de pesquisa e projetos de pesquisa. Esse quadro favorece a produção coletiva, bem como a continuidade de estudos nos últimos anos. É nesse modus operandi que os autores e grupos de pesquisa configuram o universo científico no campo da avaliação, contribuindo para sua qualificação e, com base em um referencial teórico, possibilitam uma leitura ampliada daquilo que se estuda no decorrer de suas trajetórias de pesquisa. Temos, neste cenário, pesquisadores que iniciaram seus estudos na iniciação científica, aprofundando-os no mestrado; outros, que desenvolveram seus estudos no mestrado e no doutorado. De modo geral, a inserção de professores na pós-graduação, que têm se dedicado à avaliação em sua trajetória de formação, pode favorecer a orientação de novos trabalhos e projetos de pesquisa sobre o tema, fortalecendo-o no universo do campo científico.

Acenamos para a importância de novos estudos que deem visibilidade à avaliação da aprendizagem, tendo como contexto outras etapas e modalidades de ensino, que abordem o ensino infantil e médio, a educação de jovens e adultos, a educação do campo e a educação indígena. Há ainda a necessidade de retomarmos uma agenda de investigação sobre avaliação na Educação Física em âmbito internacional, fortalecendo as parcerias e os intercâmbios com autores de outros países.

Destacamos a relevância da continuidade de trabalhos sobre a temática, já que a prática avaliativa nos permite analisar todas as ações realizadas no processo ensino-aprendizado, bem como projetar a contribuição da Educação Física na escola; o lugar por ela ocupado na educação escolarizada; o que se aprende com o que se ensina; os objetivos que constituem as práticas pedagógicas dos professores desse componente curricular; as apropriações realizadas pelos alunos na relação com o saber. As pesquisas sobre avaliação podem nos levar, inclusive, a discutir o próprio estatuto epistemológico que trata da Educação Física.

Financiamento

MCTI/CNPq, nº: 481424/2013-0, e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Espírito Santo.

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  • 1
    Entendemos a avaliação do ensino e da aprendizagem como uma ação interna realizada no contexto escolar, constituindo-se em um processo complexo integrante das práticas pedagógicas, envolvendo diferentes sujeitos. Além disso, “[...] Ela não ocorre num vazio conceitual, mas está dimensionada por um modelo teórico de sociedade, de homem, de educação e, consequentemente, de ensino e de aprendizagem, expresso na teoria e na prática pedagógica” (CALDEIRA, 2000, p. 122).
  • 2
    A última consulta foi em 24 de fevereiro de 2016.
  • 3
    Segundo Paulo Gama Filho, no Editorial da RA, n. 9/11 (1981), o Congresso recebeu cerca de 600 participantes, tendo 22 conferências e 49 comunicações científicas.
  • 4
    Referimo-nos ao livro Metodologia do ensino de Educação Física.
  • 5
    O ano de 1998/1999 refere-se ao v. 2 da Revista e o de 1999/2000 ao de v. 3.
  • 6
    Embora esses artigos tenham sido produzidos em colaboração com outros autores, optamos por apresentar os pesquisadores que se constituem em orientadores e orientandos.
  • 7
    Uma análise da contribuição da revista Movimento para a subárea sociocultural e pedagógica da Educação Física brasileira pode ser vista em Carneiro et al. (2016).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2018

Histórico

  • Recebido
    15 Mar 2016
  • Aceito
    28 Set 2016
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