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“NÃO É SÓ EXERCÍCIO FÍSICO”: O TRABALHO DE PROFISSIONAIS DE EDUCAÇÃO FÍSICA NA PROMOÇÃO DA SAÚDE

“NO ES SOLO EJERCICIO FÍSICO”: EL TRABAJO DE LOS PROFESIONALES DE EDUCACIÓN FÍSICA EN LA PROMOCIÓN DE LA SALUD

Resumo

O estudo buscou identificar e analisar o trabalho de profissionais de Educação Física com adultos e idosos na promoção da saúde, para além da prevenção de doenças. Baseada na teoria da salutogênese, a pesquisa utilizou o método qualitativo da teoria fundamentada nos dados proposto por Charmaz (2009)CHARMAZ, Kathy. A construção da teoria fundamentada: guia prático para análise qualitativa. Porto Alegre: Artmed, 2009. e o método de trabalho de campo condensado (STENHOUSE, 1978STENHOUSE, Laurence. Case study and case records: towards a contemporary history of education. British Educational Research Journal, v. 4, n. 2, p. 21-39, 1978. Disponível em: https://berajournals.onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1080/0141192780040202. Acesso em: 10 nov. 2021.
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) em quatro programas públicos de promoção da saúde. Participaram do estudo quatro profissionais de Educação Física, três coordenadoras de centros de saúde e 34 adultos e idosos. Os dados foram produzidos através de entrevistas e observação não participante. A análise indutiva dos dados identificou quatro práticas representativas do trabalho dos profissionais: um olhar para as pessoas, relações de cuidado, desenvolvimento de recursos de saúde e a valorização do protagonismo comunitário. Em conclusão, os modos de trabalho dos profissionais de Educação Física demonstraram um caráter salutogênico, sugerindo possibilidades de superação do modelo biomédico.

Palavras-chave:
Saúde Pública; Atenção Primária à; Saúde; Técnicas de Exercício e de Movimento; Senso de Coerência.

Resumen

El estudio buscó identificar y analizar el trabajo de profesionales de Educación Física con adultos y ancianos en la promoción de la salud, más allá de la prevención de enfermedades. Basada en la teoría de la salutogénesis, la investigación utilizó el método cualitativo de la teoría fundamentada en datos propuesto por Charmaz (2009)CHARMAZ, Kathy. A construção da teoria fundamentada: guia prático para análise qualitativa. Porto Alegre: Artmed, 2009. y el método de trabajo de campo condensado (STENHOUSE, 1978STENHOUSE, Laurence. Case study and case records: towards a contemporary history of education. British Educational Research Journal, v. 4, n. 2, p. 21-39, 1978. Disponível em: https://berajournals.onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1080/0141192780040202. Acesso em: 10 nov. 2021.
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) en cuatro programas públicos de promoción de la salud. En el estudio participaron cuatro profesionales de Educación Física, tres coordinadoras de centros de salud y 34 adultos y ancianos. Los datos se obtuvieron a través de entrevistas y observación no participante. El análisis inductivo de los datos identificó cuatro prácticas representativas del trabajo de los profesionales: mirada hacia las personas, relaciones de cuidado, desarrollo de recursos de salud y la apreciación del protagonismo comunitario. En conclusión, los métodos de trabajo de los profesionales de la Educación Física demostraron un carácter salutogénico, sugiriendo posibilidades de superación del modelo biomédico.

Palabras clave:
Salud Pública; Atención Primaria de Salud; Técnicas de Ejercicio y Movimientos; Sentido de Coherencia.

Abstract

The study sought to identify and analyse the work of Physical Education professionals with adults and elderly people in health promotion, beyond disease prevention. Based on the theory of salutogenesis, the research project employed the qualitative method of grounded theory proposed by Charmaz (2009)CHARMAZ, Kathy. A construção da teoria fundamentada: guia prático para análise qualitativa. Porto Alegre: Artmed, 2009. and condensed fieldwork (STENHOUSE, 1978STENHOUSE, Laurence. Case study and case records: towards a contemporary history of education. British Educational Research Journal, v. 4, n. 2, p. 21-39, 1978. Disponível em: https://berajournals.onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1080/0141192780040202. Acesso em: 10 nov. 2021.
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) in four public health promotion programs. Participants included four Physical Education professionals, three health centre coordinators and 34 adults and elderly people. Data were produced through interviews and non-participant observation. Inductive analysis of data identified four practices that are representative of the professionals’ work: seeing people as subjects, caring relationships, development of health resources, and encouraging community protagonism. In conclusion, the ways of working of the Physical Education professionals demonstrated a salutogenic character, suggesting possibilities for overcoming the dominance of the biomedical model.

Keywords:
Public Health; Primary Health Care; Exercise Movement Techniques; Sense of Coherence.

1 INTRODUÇÃO1 1 O artigo é um desdobramento da tese de doutorado de FERREIRA, Heidi Jancer. Health and physical education professionals' salutogenic and pedagogical practices for working with disadvantaged older adults. Universidade Estadual Paulista (UNESP) - Campus de Rio Claro, 2019.

A atuação de profissionais de Educação Física (PEF) em programas públicos de promoção da saúde se expandiu nas últimas duas décadas (OLIVEIRA; WACHS, 2018OLIVEIRA, Braulio Nogueira; WACHS, Felipe. Educação Física e atenção primária à saúde: apropriações acerca do apoio matricial. Movimento, v. 24, n. 1, p. 173-186, jan./mar. 2018. Disponível em: http://dx.doi.org/10.22456/1982-8918.69965. Acesso em: 2 dez. 2021.
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). As políticas públicas de saúde estabeleceram as práticas corporais e atividade física (PCAF)2 2 Neste estudo, conforme Carvalho (2016), adotamos os termos “práticas corporais e atividades físicas” de maneira complementar, visando considerar os múltiplos sentidos atribuídos pelos sujeitos e coletividades às manifestações do movimento humano em seus aspectos culturais, lúdicos, sociais, históricos, físicos e biológicos. como ações prioritárias e viabilizaram a inserção dos PEF no Sistema Único de Saúde (SUS) por meio de estratégias como o Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica - NASF-AB (BRASIL, 2013aBRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 256, de 11 de março de 2013. Estabelece novas regras para o cadastramento das equipes que farão parte dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) Sistema de Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (SCNES). Diário Oficial da União, Brasília-DF, Seção 1, p. 43, 14 mar., 2013a.) e o Programa Academia da Saúde (BRASIL, 2014BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 24, de 14 de janeiro de 2014. Redefine o cadastramento do Programa Academia da Saúde no Sistema de Cadastro Nacional de estabelecimentos de Saúde (SCNES). Diário Oficial da União, Brasília-DF, v.10, Seção I, p. 39, 15 jan., 2014.).

A emergência de novas possibilidades de atuação dos PEF se deu em um contexto de debates acerca da necessidade de reconstrução das práticas de saúde, visando à ampliação dos saberes e fazeres em saúde com a valorização de conhecimentos das Ciências Humanas e Sociais, como os conceitos de humanização e cuidado (AYRES, 2004AYRES, José Ricardo de Carvalho Mesquita. Cuidado e reconstrução das práticas de saúde. Interface-Comunicação, Saúde, Educação, v. 8, p. 73-92, fev. 2004. Disponível em: https://www.scielosp.org/article/icse/2004.v8n14/73-92/ Acesso em: 17 nov. 2021.
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).

Contudo, a crescente atuação dos PEF no campo da saúde também impôs desafios para a área. Dentre eles, destacam-se as limitações da formação com a falta de articulação com os serviços de saúde e o predomínio de uma abordagem biológica nos modos de pensar/fazer centrada no controle de fatores de risco para doenças, protocolos e prescrições (BARBONI; CARVALHO; SOUZA, 2021BARBONI, Viviana Graziela de Almeida Vasconcelos; CARVALHO, Yara Maria; SOUZA, Vagner Herculano. A formação em saúde coletiva nos currículos de educação física: um retrato atual. Movimento, v. 27, p.e27065, jan./dez. 2021. DOI: https://doi.org/10.22456/1982-8918.113041. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/Movimento/article/view/113041. Acesso em: 01 dez. 2021.
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; OLIVEIRA; GOMES, 2019OLIVEIRA, Victor José Machado; GOMES, Ivan Marcelo. O tema da saúde na formação inicial em educação física em uma universidade pública: reflexividade, agência e estrutura. Movimento, v. 25, p. 25077, 2019. DOI: 10.22456/1982-8918.87359. Disponível em: https://www.seer.ufrgs.br/Movimento/article/view/87359. Acesso em: 30 nov. 2021.
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; NEVES; ASSUMPÇÃO, 2017NEVES, Ricardo Lira de Rezende; ASSUMPÇÃO, Luis Otávio Teles. Formação e intervenção profissional em saúde pública: percepções de profissionais de Educação Física. Movimento, v. 23, n. 1, p. 201-212, jan./mar. 2017. DOI: 10.22456/1982-8918.65321. Disponível em: https://www.seer.ufrgs.br/Movimento/article/view/65321. Acesso em: 30 nov. 2021.
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; SANTIAGO; PEDROSA; FERRAZ, 2016SANTIAGO, Maria Luci Esteves; PEDROSA, José Ivo Santos; FERRAZ, Alex Soares Marreiros. A formação em saúde à luz do projeto pedagógico e das diretrizes curriculares da Educação Física. Movimento, v. 22, n. 2, p. 443-457, abr./jun. 2016. DOI: 10.22456/1982-8918.57988. Disponível em: https://www.seer.ufrgs.br/Movimento/article/view/57988. Acesso em: 30 nov. 2021.
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).

Em vista disso e em consonância com as reflexões de Carvalho (2016)CARVALHO, Fabio Fortunato Brasil. Práticas corporais e atividades físicas na atenção básica do sistema único de saúde: ir além da prevenção das doenças crônicas não transmissíveis é necessário. Movimento, v. 22, n. 2, p. 647-658, abr./jun. 2016. DOI: https://doi.org/10.22456/1982-8918.58174. Disponível em: https://www.seer.ufrgs.br/Movimento/article/view/58174. Acesso em: 29 nov. 2021.
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, faz-se necessário superar a lógica predominante da prevenção de doenças (sem desconsiderar a relevância destas ações) e ampliar as possibilidades de modos de trabalho da Educação Física na promoção da saúde a partir das suas potencialidades de articulação entre fatores sociais, afetivos, culturais, econômicos e políticos, para além dos biológicos.

Neste sentido, o objetivo deste estudo foi identificar e analisar as práticas desenvolvidas por PEF no trabalho com as PCAF para adultos e idosos em programas públicos de promoção da saúde. A pesquisa foi guiada por duas questões problematizadoras: como tem sido desenvolvido o trabalho em promoção da saúde com as PCAF? Como este trabalho contribui para a saúde dos participantes? No percurso investigativo, adotamos a salutogênese como lente teórica para fundamentar a análise sobre o trabalho em promoção da saúde.

2 A PERSPECTIVA TEÓRICA DA SALUTOGÊNESE

A teoria da salutogênese foi proposta por Aaron Antonovsky (1979ANTONOVSKY, Aaron. Health, stress and coping. London: Jossey-Bass, 1979.; 1996ANTONOVSKY, Aaron. The salutogenic model as a theory to guide health promotion. Health Promotion International, v. 11, n. 1, p. 11-18, mar. 1996. Disponível em: https://salutogenesi.org/images/PDF/The_salutogenic_model_as_a_theory_to_guide_health_promotion.pdf. Acesso em: 25 nov. 2021.
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) visando compreender como se dá a produção de saúde na vida das pessoas mesmo diante de condições adversas. Para o autor, o modelo de saúde dominante da patogênese (centrado na doença) apresentava limitações para a promoção da saúde, o que suscitava a necessidade de um modelo alternativo. Na busca por um outro modo de pensar sobre saúde, Antonovsky (1979)ANTONOVSKY, Aaron. Health, stress and coping. London: Jossey-Bass, 1979. sugeriu uma mudança no enfoque dado ao tema, passando a questionar “quais são as origens da saúde?” e “como as pessoas se mantêm saudáveis?”. Deste modo, a salutogênese oferece uma perspectiva alternativa e positiva para compreender e orientar o trabalho em promoção da saúde em diversas áreas, incluindo a Educação Física.

De acordo com a teoria, as pessoas se movem ao longo de um continuum de saúde por meio de um processo dinâmico e constante de tornar-se. O processo de mover-se dos sujeitos ao longo desse continuum é influenciado por dimensões individuais e sociais. No âmbito individual, as pessoas são impulsionadas pelo “sentido de coerência” que apresentam (trata-se de um conceito referente a uma disposição e capacidade individual para lidar com as situações vividas); e, pelo contexto de vida ou “rio da vida”, referindo-se às condições socioculturais, econômicas e ambientais em que os sujeitos estão inseridos (ANTONOVSKY, 1996ANTONOVSKY, Aaron. The salutogenic model as a theory to guide health promotion. Health Promotion International, v. 11, n. 1, p. 11-18, mar. 1996. Disponível em: https://salutogenesi.org/images/PDF/The_salutogenic_model_as_a_theory_to_guide_health_promotion.pdf. Acesso em: 25 nov. 2021.
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).

O “rio da vida”, em suas múltiplas dimensões (históricas, econômicas, socioculturais e ambientais), proporciona um complexo de fatores estressores e situações desafiadoras ao cultivo da vida (por exemplo: desemprego, um processo de adoecimento, a perda de um familiar). Por outro lado, oferece também “recursos de saúde” (MCCUAIG; QUENNERSTEDT, 2018MCCUAIG, Louise; QUENNERSTEDT, Mikail. Health by stealth - exploring the sociocultural dimensions of salutogenesis for sport, health and physical education research. Sport, Education and Society, v. 23, n. 2, p. 111-122, 2018. DOI: 10.1080/13573322.2016.1151779. Disponível em: https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/13573322.2016.1151779. Acesso em: 10 nov. 2021.
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) enquanto fatores salutares que favorecem a produção e conservação da saúde.

Estes recursos (originalmente denominados de “generalized resistance resources”; ANTONOVSKY, 1979ANTONOVSKY, Aaron. Health, stress and coping. London: Jossey-Bass, 1979.), consistem em características e/ou capacidades individuais e coletivas de diversos tipos: material (aporte financeiro, acesso a bens/serviços); social (redes de apoio, arranjos comunitários); emocional (identidade, percepção de si); intelectual (educação, acesso à informação); biológico (características individuais); cultural (religião, arte); dentre outros. Dentro do seu contexto e condições de vida, os sujeitos acessam e desenvolvem, em maior ou menor grau, um conjunto de recursos de saúde. Diante de situações desafiadoras, os sujeitos mobilizam os recursos que têm à sua disposição. Ao serem mobilizados, os recursos de saúde proporcionam experiências que se caracterizam pelos níveis de consistência, equilíbrio (ou balanceamento das demandas impostas) e participação (autonomia na tomada de decisões nas situações vividas). Por sua vez, essas experiências consistentes, equilibradas e autônomas moldam o sentido de coerência dos sujeitos e coletividades, levando a processos de produção de saúde. Neste estudo, consideramos como exemplos dessas experiências aquelas promovidas no âmbito dos programas públicos de promoção da saúde com as PCAF.

Assim, o sentido de coerência pode ser considerado o conceito-chave da teoria da salutogênese. Tal conceito refere-se à capacidade e disposição das pessoas para ver a vida como compreensível, gerenciável e significativa. O sentido de coerência indica uma capacidade para lidar com situações adversas que afetam os modos de viver, influenciando positivamente a saúde. Segundo Antonosky (1979), o sentido de coerência envolve três componentes: compreensão (comprehensibility), gestão (manageability) e significado (meaningfulness)3 3 Cabe destacar que existem divergências na tradução dos conceitos da teoria da salutogênese da Língua Inglesa para a Portuguesa (vide Saboga-Nunes, 2017). Para a tradução dos componentes do sentido de coerência nos baseamos no estudo de validação e adaptação transcultural de Scalco (2016). . A “compreensão” indica que a pessoa possui uma capacidade cognitiva, informações e conhecimento para compreender seu mundo e modos de viver, incluindo os desafios, problemas e processos de adoecimento. Por “gestão”, Antonovsky (1996)ANTONOVSKY, Aaron. The salutogenic model as a theory to guide health promotion. Health Promotion International, v. 11, n. 1, p. 11-18, mar. 1996. Disponível em: https://salutogenesi.org/images/PDF/The_salutogenic_model_as_a_theory_to_guide_health_promotion.pdf. Acesso em: 25 nov. 2021.
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considera a capacidade de identificar e mobilizar os recursos de saúde que existem à disposição da pessoa para lidar com uma dada situação. E, o “significado” refere-se à motivação e capacidade de se envolver com o processo de resolução e gerenciamento das situações de vida. Esses três componentes se inter-relacionam e indicam como as pessoas reconhecem/compreendem as situações vividas e se sentem motivadas a lidar com elas, mobilizando os recursos que têm à sua disposição para se manterem saudáveis.

A avaliação e análise do sentido de coerência de indivíduos e grupos tem sido o principal foco de estudos fundamentados no referencial da salutogênese (MITTELMARK; BAUER, 2017MITTELMARK, Maurice; BAUER, Georg. The meanings of Salutogenesis. In: MITTELMARK, Maurice; SAGY, Shifra; ERIKSSON, Monica; BAUER, Georg; PELIKAN, Jürgen; LINDSTRÖM, Bengt; ESPNES, Geir Arild (ed.). The Handbook of Salutogenesis. New York: Springer, 2017. p. 7-13.). Ao longo do desenvolvimento da teoria, Antonovsky (1987) elaborou a escala do sentido de coerência (The Orientation to Life Questionnaire) com 29 itens que avaliam os três componentes de compreensão, gestão e significado. O instrumento possibilita a mensuração do sentido de coerência, tendo sido traduzido e validado em diversos países, incluindo o Brasil (SCALCO, 2016SCALCO, Giovana Pereira da Cunha. Avaliação da versão brasileira em português da escala de senso de coerência: adaptação transcultural e propriedades psicométricas. 2016. 90f. Tese (Doutorado em Odontologia) - Faculdade de Odontologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2016.). Contudo, cabe ressaltar que as potencialidades da teoria da salutogênese não se resumem à quantificação do sentido de coerência, como tem sido largamente empregado na literatura (MITTELMARK; BAUER, 2017MITTELMARK, Maurice; BAUER, Georg. The meanings of Salutogenesis. In: MITTELMARK, Maurice; SAGY, Shifra; ERIKSSON, Monica; BAUER, Georg; PELIKAN, Jürgen; LINDSTRÖM, Bengt; ESPNES, Geir Arild (ed.). The Handbook of Salutogenesis. New York: Springer, 2017. p. 7-13.). Em um sentido mais amplo, a salutogênese também se apresenta enquanto uma orientação teórica para fundamentar estudos qualitativos e práticas em promoção da saúde.

3 DECISÕES METODOLÓGICAS

O estudo, do tipo qualitativo, empregou o método da Teoria Fundamentada nos Dados - TFD. Este método envolve um processo sistemático de ciclos sucessivos de produção e análise indutiva de dados empíricos para o desenvolvimento de explicações teóricas sobre o fenômeno de estudo (CHARMAZ, 2009CHARMAZ, Kathy. A construção da teoria fundamentada: guia prático para análise qualitativa. Porto Alegre: Artmed, 2009.). À medida que os primeiros dados são gerados, o pesquisador produz uma análise do material antes de realizar um novo ciclo de coleta. A geração de dados adicionais leva em conta a análise anterior, culminando em um processo cumulativo de produção e análise de dados. Portanto, trata-se de um método que orienta tanto a fase de geração de dados como as de processo de análise e construção teórica (CHARMAZ, 2009CHARMAZ, Kathy. A construção da teoria fundamentada: guia prático para análise qualitativa. Porto Alegre: Artmed, 2009.). O foco da TFD é compreender as perspectivas e experiências dos sujeitos envolvidos em um dado contexto, buscando a elaboração de uma explicação teórica para a situação investigada (SANTOS et al., 2016SANTOS, Jose Luis Guedes; ERDMANN, Alacoque Lorenzini; SOUSA, Francisca Georgina Macedo; LANZONI, Gabriela Marcelino de Melo; MELO, Ana Lúcia Schaefer Ferreira; LEITE, Josete Luzia. Perspectivas metodológicas para o uso da teoria fundamentada nos dados na pesquisa em enfermagem e saúde. Escola Anna Nery - Revista de Enfermagem, v. 20, n. 3, e20160056, p. 1-8, 2016. DOI: 10.5935/1414-8145.20160056. Disponível em: https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=127745807001. Acesso em: 3 mai. 2022.
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).

O método tem sido crescentemente empregado no campo da saúde, particularmente nas áreas de Enfermagem, Ciências Sociais e Psicologia (CRESWELL, 2007CRESWELL, J. W. Qualitative inquiry and research design: choosing among five approaches. 2nd. ed. London: Sage Publications, 2007.; SANTOS et al., 2016SANTOS, Jose Luis Guedes; ERDMANN, Alacoque Lorenzini; SOUSA, Francisca Georgina Macedo; LANZONI, Gabriela Marcelino de Melo; MELO, Ana Lúcia Schaefer Ferreira; LEITE, Josete Luzia. Perspectivas metodológicas para o uso da teoria fundamentada nos dados na pesquisa em enfermagem e saúde. Escola Anna Nery - Revista de Enfermagem, v. 20, n. 3, e20160056, p. 1-8, 2016. DOI: 10.5935/1414-8145.20160056. Disponível em: https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=127745807001. Acesso em: 3 mai. 2022.
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). Ao possibilitar uma compreensão e teorização sobre as experiências dos sujeitos/coletividades e as suas interações com os profissionais e serviços, a TFD torna-se relevante para estudos da saúde principalmente no que tange às possibilidades de contribuições para a qualificação das práticas e trabalho em saúde (SANTOS et al., 2016SANTOS, Jose Luis Guedes; ERDMANN, Alacoque Lorenzini; SOUSA, Francisca Georgina Macedo; LANZONI, Gabriela Marcelino de Melo; MELO, Ana Lúcia Schaefer Ferreira; LEITE, Josete Luzia. Perspectivas metodológicas para o uso da teoria fundamentada nos dados na pesquisa em enfermagem e saúde. Escola Anna Nery - Revista de Enfermagem, v. 20, n. 3, e20160056, p. 1-8, 2016. DOI: 10.5935/1414-8145.20160056. Disponível em: https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=127745807001. Acesso em: 3 mai. 2022.
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).

A pesquisa foi realizada seguindo procedimentos éticos, com aprovação pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho.

3.1 CONTEXTO E PARTICIPANTES DO ESTUDO

A pesquisa foi desenvolvida em quatro programas públicos de promoção da saúde, localizados nas regiões Sul e Sudeste do Brasil. Os programas contemplavam a oferta de PCAF de forma regular para adultos e idosos, sob a orientação de PEF.

Os programas foram selecionados de acordo com a estratégia de amostragem teórica (CHARMAZ, 2009CHARMAZ, Kathy. A construção da teoria fundamentada: guia prático para análise qualitativa. Porto Alegre: Artmed, 2009.), considerando a relevância para o estudo e partindo da perspectiva da salutogênese e de uma concepção ampliada de saúde (FREITAS; CARVALHO; MENDES, 2013FREITAS, Fabiana Fernandes; CARVALHO, Yara Maria; MENDES, Valéria Monteiro. Educação física e saúde: aproximações com a "Clínica Ampliada". Revista Brasileira de Ciências do Esporte, v. 35, n. 3, p. 639-656, 2013.). Portanto, foram incluídos programas que demonstraram desenvolver abordagens de promoção da saúde em perspectiva ampliada, reconhecendo as múltiplas dimensões relacionadas com a saúde (FREITAS; CARVALHO; MENDES, 2013FREITAS, Fabiana Fernandes; CARVALHO, Yara Maria; MENDES, Valéria Monteiro. Educação física e saúde: aproximações com a "Clínica Ampliada". Revista Brasileira de Ciências do Esporte, v. 35, n. 3, p. 639-656, 2013.) e extrapolando o escopo da prevenção de doenças e das práticas orientadas restritamente por uma racionalidade biomédica (AYRES, 2004AYRES, José Ricardo de Carvalho Mesquita. Cuidado e reconstrução das práticas de saúde. Interface-Comunicação, Saúde, Educação, v. 8, p. 73-92, fev. 2004. Disponível em: https://www.scielosp.org/article/icse/2004.v8n14/73-92/ Acesso em: 17 nov. 2021.
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). Os programas foram identificados por meio de buscas exploratórias em bases virtuais de experiências em saúde como “Comunidade de Práticas - Rede Humaniza SUS”4 4 Disponível em: https://redehumanizasus.net/category/relato-de-experiencias-1/ e “Observatório Saúde em Movimento - Universidade Federal do Rio Grande do Sul”5 5 Disponível em: https://www.ufrgs.br/saudeemmovimento/ , e a partir de relatórios de experiências publicados em anais de congressos.

A seguir, apresentamos uma descrição dos quatro programas participantes do estudo (Quadro 1).

Quadro 1
Descrição dos programas públicos de promoção da saúde participantes do estudo.

Inseridos no contexto dos quatro programas, os participantes da pesquisa6 6 Criamos nomes fictícios para manter o anonimato dos participantes. abrangeram três grupos: a) Quatro PEF - três mulheres e um homem, com idade média de 37 anos e tempo de experiência profissional médio igual a seis anos; b) Três7 7 A coordenação do P4 era desempenhada pelo próprio PEF. coordenadoras de centro de saúde (CCS) - com formação em Enfermagem e idade média igual a 40 anos; c) 34 usuários dos serviços - três homens e 31 mulheres, com faixa etária entre 30 e 80 anos.

3.2 PRODUÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

A produção dos dados foi realizada através de trabalho de campo condensado (STENHOUSE, 1978STENHOUSE, Laurence. Case study and case records: towards a contemporary history of education. British Educational Research Journal, v. 4, n. 2, p. 21-39, 1978. Disponível em: https://berajournals.onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1080/0141192780040202. Acesso em: 10 nov. 2021.
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). Este método reúne elementos da pesquisa etnográfica e do estudo de caso, se caracterizando pela investigação de diferentes casos em campo durante um período reduzido. O trabalho de campo foi realizado durante três dias em cada um dos quatro programas e envolveu a condução de 25 entrevistas semiestruturadas com os três grupos de participantes (PEF - 13; CCS-3; usuários - 9) e 34 observações do tipo não participante das atividades regulares dos programas. As entrevistas com os(as) PEF abordaram os objetivos e métodos de trabalho, tipos de atividades realizadas, recursos, estratégias de avaliação das ações, perfil da comunidade, histórico do programa e resultados percebidos. Com as CCS, as entrevistas buscaram compreender os impactos do trabalho desenvolvido para a promoção da saúde da comunidade. Já as entrevistas com os usuários englobaram perguntas sobre as experiências com as PCAF e percepções deles acerca das contribuições para a saúde. Todas as entrevistas foram gravadas em áudio, transcritas e posteriormente validadas pelos(as) participantes.

A análise dos dados foi realizada por meio do método das comparações constantes (CHARMAZ, 2009CHARMAZ, Kathy. A construção da teoria fundamentada: guia prático para análise qualitativa. Porto Alegre: Artmed, 2009.). Os dados foram comparados sistematicamente com o intuito de identificar semelhanças e diferenças, em relação aos três grupos de participantes, às fontes (entrevistas e observações) e aos quatro programas. O processo analítico envolveu uma série de etapas: a) organização do conjunto de dados e leituras sucessivas do material; b) codificação inicial; c) codificação axial, com comparações adicionais entre os dados e códigos iniciais; d) codificação seletiva, com o refinamento dos temas. Nesta última fase, os temas foram interpretados a partir da teoria da salutogênese (ANTONOVSKY, 1979ANTONOVSKY, Aaron. Health, stress and coping. London: Jossey-Bass, 1979.).

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados indicaram que os(as) PEF desenvolveram um conjunto de práticas consistentes com a salutogênese (ANTONOVSKY, 1979ANTONOVSKY, Aaron. Health, stress and coping. London: Jossey-Bass, 1979.). As práticas identificadas são apresentadas em quatro temas: a) um olhar para as pessoas; b) relações de cuidado; c) desenvolvimento de recursos de saúde; d) valorização do protagonismo comunitário.

4.1 UM OLHAR PARA AS PESSOAS

Este tema indica que o trabalho dos(as) PEF com as PCAF foi orientado por uma visão ampliada e humanizada de saúde. A abordagem com os(as) participantes dos programas superou a perspectiva biomédica e assumiu um modo de olhar para eles(as) como sujeitos com histórias de vida permeadas por condições socioeconômicas, culturais, relações familiares, interesses e necessidades, incluindo os processos de adoecimento. Cabe destacar que, neste modo de olhar salutogênico, as doenças perdem a centralidade que geralmente têm na lógica patogênica, mas isso não significa dizer que são ignoradas (ANTONOSKY, 1979).

A perspectiva holística como base filosófica para o trabalho em promoção da saúde ficou evidente nos pressupostos assumidos pelos(as) PEF, tal como apresentado por Barbara:

O ser humano é um todo. Ele é emoção, ele é aquilo tudo o que ele traz com ele. Não é só o físico [...] A partir do momento que tu começas a olhar o outro com um olhar diferente, não só a doença e seu corpo, mas o ser humano com toda a história que ele tem e as vivências [...] tu não vês só como um ser humano que tem diabetes, lesão no joelho. Mas ela é a Dona Maria que é viúva ou ela é a que nunca teve namorado, ou vive com as irmãs e tem todo aquele contexto. Tu começas a ver toda uma forma de lidar com aquela pessoa sem ser só o joelho, a glicose e o sobrepeso. (Barbara, PEF-P2)

Na visão de Barbara, o trabalho em promoção da saúde transcende a dimensão biológica quando o profissional amplia o olhar e busca apreender as subjetividades que constituem os modos de viver das pessoas. A PEF acrescenta que: “Se tu não vês como o território funciona, as pessoas que estão inseridas ali, como elas vivem, o que fazem, o que necessitam e precisam, quais são as demandas... tu acabas ficando naquele mundinho e não cria nada”. Portanto, ter esse “olhar diferente” para as pessoas e comunidades constitui um elemento crucial para desenvolver novos modos de trabalho em promoção da saúde que possam ser transformadores.

Ainda sobre esse outro modo de olhar em saúde que permite ver as pessoas para além das doenças, Barbara indica que:

Tem muito a ver com essa questão da humanização [...] Saber que não é só passar exercício, não é só montar treino ou organizar uma aula. Mas um PEF que também trabalha com o lado emocional das pessoas. Porque no momento que trabalhar essa relação com as pessoas, não vai tratar só o físico [...] A gente vê que todo mundo sabe o que é humanização, mas às vezes isso não acontece, parece que fica na teoria (Barbara, PEF-P2).

Assim, a superação de uma perspectiva reducionista na promoção da saúde requer a mobilização de práticas humanizadoras. Apesar de as diretrizes da Política Nacional de Humanização (BRASIL, 2013bBRASIL. Ministério da Saúde. Política Nacional de Humanização. Brasília: Ministério da Saúde, 2013b. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_humanizacao_pnh_folheto.pdf. Acesso em: 10 nov. 2021.
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) endossarem tais práticas, elas ainda encontram resistência para implantação. Um caso ilustrativo é o estudo de Warmling e colaboradores (2018) que revelou como o cotidiano do trabalho em saúde com mulheres na gestação permanece fortemente guiado pelo paradigma biomédico, impondo dificuldades para práticas humanizadoras.

Em contraposição, na presente pesquisa, os dados apontaram para um trabalho comprometido com a humanização. Por exemplo, uma prática adotada foi a desconstrução de rótulos que identificavam grupos pelo nome de enfermidades que os membros tinham em comum. Na formação de grupos, Susana (PEF-P3) foi contrária ao agrupamento por doenças: “Nada de hipertensos, diabéticos ou depressivos. Eu não queria discriminar ninguém [...] A minha ideia era tentar abranger o máximo de pessoas que eu conseguia, não separar eles por patologia”. Similarmente, Sara (CCS-P2) buscou abandonar esse tipo de identificação: “Quando eu cheguei, eles chamavam de grupo de hipertensos e diabéticos. Primeiro que eu tirei o nome. Chamei de grupo de saúde e a gente começou a compartilhar experiências, fazer outras coisas”. Essa mudança dos nomes já sugere um outro modo de olhar para as pessoas para além das doenças.

Ao descontruir rótulos que projetavam fragilidades e reducionismos sobre os corpos dos sujeitos, os(as) PEF possibilitaram a eles a reconstrução de identidades que reconheciam as suas potencialidades. Por exemplo, no P2, um grupo de mulheres passou a se identificar como as “Divas do SUS” desde que se envolveram em um processo emancipatório mediado por rodas de conversas e apresentações de dança, o que contribuiu para melhorias na autopercepção e autoestima.

Neste sentido, este estudo sugere que uma das possibilidades para “enriquecer os horizontes” (AYRES, 2004AYRES, José Ricardo de Carvalho Mesquita. Cuidado e reconstrução das práticas de saúde. Interface-Comunicação, Saúde, Educação, v. 8, p. 73-92, fev. 2004. Disponível em: https://www.scielosp.org/article/icse/2004.v8n14/73-92/ Acesso em: 17 nov. 2021.
https://www.scielosp.org/article/icse/20...
) no trabalho em promoção da saúde está relacionada com a valorização das subjetividades/coletividades e a criação de oportunidades para que as pessoas possam reconstruir e negociar as próprias identidades, de forma que se reconheçam e se fortaleçam nelas. Para tal, torna-se essencial ter um olhar atento e sensível às singularidades das pessoas, alinhando-se à perspectiva salutogênica.

4.2 RELAÇÕES DE CUIDADO

Com um trabalho centrado nas pessoas, os(as) PEF desenvolveram práticas voltadas para a construção de relações de cuidado. Segundo Ayres (2004)AYRES, José Ricardo de Carvalho Mesquita. Cuidado e reconstrução das práticas de saúde. Interface-Comunicação, Saúde, Educação, v. 8, p. 73-92, fev. 2004. Disponível em: https://www.scielosp.org/article/icse/2004.v8n14/73-92/ Acesso em: 17 nov. 2021.
https://www.scielosp.org/article/icse/20...
, o conceito de cuidado designa uma “compreensão filosófica e uma atitude prática” (p.74) que se dá na interação entre sujeitos e na mediação de saberes voltados para a produção de saúde e bem-estar. O cuidado tem uma natureza relacional e envolve duas partes principais: a identificação das necessidades do outro através da escuta e reflexão; e a resposta ao que foi identificado por meio de ações que são essenciais para manter as relações de cuidado (NODDINGS, 2012NODDINGS, Nel. The caring relation in teaching. Oxford Review of Education, v.38, n. 6, p. 771-781, dec. 2012. DOI: 10.1080/03054985.2012.745047. Disponível em: https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/03054985.2012.745047. Acesso em: 30 nov. 2021.
https://www.tandfonline.com/doi/full/10....
).

Neste estudo, as práticas dos(as) PEF se constituíram principalmente por atitudes e comportamentos direcionados para o acolhimento e a criação de vínculos, tais como a demonstração de respeito e interesse genuíno pelas necessidades e interesses em saúde dos sujeitos/coletividades, a escuta atenta e a mobilização de ações em resposta às demandas apresentadas. Para Michele, as práticas de acolhimento são cruciais no trabalho em promoção da saúde:

Normalmente, a população nunca vem dizendo ‘eu estou deprimida’ ou ‘estou sofrendo violência e estou querendo me matar’. Ela vem para nós sempre com algum sintoma. E às vezes aquele sintoma é muito de o profissional estar fazendo um bom acolhimento. Porque aquele sintoma que ela está vindo toda semana, a gente analisando, clinicamente, ela não tem nada. É uma pessoa que por trás tem alguma situação (Michele, CCS-P3).

Segundo a Política Nacional de Humanização, acolher implica “reconhecer o que o outro traz como legítima e singular necessidade de saúde” e deve permear a relação entre profissionais, usuários e serviços em saúde (BRASIL, 2013bBRASIL. Ministério da Saúde. Política Nacional de Humanização. Brasília: Ministério da Saúde, 2013b. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_humanizacao_pnh_folheto.pdf. Acesso em: 10 nov. 2021.
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...
, p.7). Além de contribuir para a identificação de situações que não são expostas pelos sujeitos e para o planejamento de abordagens multiprofissionais adequadas, o acolhimento assume um papel importante ao satisfazer a necessidade das pessoas de serem ouvidas. A esse respeito, Sara (CCS-P2) expôs que: “A gente procura criar esse canal de abertura com a comunidade, sobretudo com as pessoas idosas, porque a gente sabe que se a gente não escutar, outra pessoa não vai escutar, falta um pouco isso dentro dessas famílias”. Portanto, no trabalho com pessoas idosas, as práticas de escuta desenvolvidas pelos(as) PEF tornam-se particularmente relevantes.

Nas observações de campo foi possível verificar como os(as) participantes idosos(as) se aproximavam dos(as) PEF para conversar e contar alguma situação. Corroborando estas observações, Carlos relatou como os grupos demonstram uma necessidade de conversar:

Uma vez eu demorei meia hora para entrar na sala de materiais. Estava na mesa para pegar material, já estava conversando com uma, quando vê encerrou o assunto, dei dois passos para lá, veio outra, encerrou o assunto, dei dois passos, veio outra… Então, elas estavam na fila de espera para serem atendidas, sabe? […] Elas precisavam de alguém para desabafar. (Carlos, PEF-P4)

Uma das principais necessidades dos(as) participantes do programa era de caráter relacional, ou seja, eles(as) precisavam conversar, desabafar e serem ouvidos(as). A resposta de Carlos às necessidades dos(as) participantes foi a escuta: “O que eu faço é deixar falar e escutar. Isso eu sempre fiz desde o início. A questão é que elas usam isso aqui como uma válvula de escape”. Partindo da salutogênese (ANTONOVSKY, 1979ANTONOVSKY, Aaron. Health, stress and coping. London: Jossey-Bass, 1979.), as falas do PEF sugerem que os(as) usuários(as) percebem o programa e a figura dele como recursos para lidar com os problemas e necessidades que têm, extrapolando a ideia de que os sentidos atribuídos às PCAF sejam somente de natureza biológica e físico-motora.

No P3, Susana percebeu que a escuta promovida no contexto das PCAF abre possibilidades para as pessoas reconhecerem e lidarem com as suas emoções: “Às vezes eles vêm aqui e choram, às vezes eles choram em grupo”. Diante da necessidade de escuta e socialização dos(as) participantes, a PEF adotou como estratégia um tempo de conversa nas aulas: “Eu não inicio a aula com o exercício […] Sempre tento puxar alguma coisa de fala. Eu sempre pergunto várias coisas” (Susana, PEF-P3). O momento interativo ocorria principalmente no início das aulas e era estimulado por meio de perguntas que ela fazia aos(às) participantes sobre como estavam ou ainda para acompanhar situações específicas vivenciadas por eles(as): “Eu costumo me lembrar muito das coisas assim - ‘ah teve médico, como é que foi?’ Porque eu acho isso muito importante, deles saberem que alguém está olhando por eles” (Susana, PEF-P3). Assim, com a demonstração de interesse e atenção com a vida cotidiana e experiências subjetivas dos(as) usuários(as), as relações de cuidado foram sendo construídas.

Em paralelo aos resultados do estudo de Lima et al. (2020), uma participante indicou que o acolhimento promovido pela PEF representa um diferencial que contribui para a motivação e satisfação com o programa:

A professora sempre pergunta se a gente está bem ou se precisa de alguma coisa em relação à saúde. Eu acho que essa questão do acolhimento é muito bacana. Porque de exercício, a gente faz o que qualquer academia regular faria, que é essa parte funcional, os exercícios aeróbicos. Mas a parte do acolhimento é o que eu gosto bastante… de poder conversar com a professora, com as colegas, e ter acesso ao posto de saúde. Essa parte de fazer o exercício e estar dando risada, conversando, escutando um colega. Eu gostei bastante e eu nunca tinha tido contato com esse tipo de trabalho. Então, para mim o social foi o mais motivador (Jeniffer, 30, P3).

Assim, o trabalho desenvolvido no programa proporciona oportunidades para construção de relações, se distinguindo de abordagens tradicionais em atividade física. Similarmente, na visão de outra participante, o acolhimento realizado por meio de rodas de conversa no programa representa uma importante contribuição para a vida dela: “Nas sextas-feiras é uma maravilha. Teve uma época que me sentei aqui e comecei a chorar. Só delas conversarem, eu saí daqui e já tinha até esquecido o que eu estava passando. Então isso aí é fundamental” (Diana, 62, P2). De maneira significativa, a ferramenta da roda de conversa parece ter potencializado as relações de cuidado no contexto das PCAF.

Na perspectiva salutogênica, as experiências de construção de vínculos entre os sujeitos estão relacionadas à “proximidade emocional” (emotional closeness), um dos elementos constitutivos do sentido de coerência (IDAN; ERIKSSON; AL-YAGON, 2017IDAN, Orly; ERIKSSON, Monica; AL-YAGON, Michal. The salutogenic model: the role of generalized resistance resources. In: MITTELMARK, Maurice et al. (ed.). The handbook of Salutogenesis. New York: Springer, 2017. p. 57-70.). As experiências de “proximidade emocional” contribuem para a criação de redes de apoio social e, portanto, para a capacidade de enfrentamento dos sujeitos perante situações desafiadoras (IDAN; ERIKSSON; AL-YAGON, 2017IDAN, Orly; ERIKSSON, Monica; AL-YAGON, Michal. The salutogenic model: the role of generalized resistance resources. In: MITTELMARK, Maurice et al. (ed.). The handbook of Salutogenesis. New York: Springer, 2017. p. 57-70.).

Em geral, as práticas dos(as) PEF envolveram uma busca ativa em conhecer as pessoas (com suas histórias, experiências e demandas), escutar atentamente e estabelecer vínculos. Neste sentido, uma postura atenta e sensível contribuiu para que os(as) PEF identificassem e atendessem as necessidades dos(as) participantes, sobretudo aquelas de caráter socioafetivo. De tal modo que a construção de relações de cuidado e espaços acolhedores (BRASIL, 2013bBRASIL. Ministério da Saúde. Política Nacional de Humanização. Brasília: Ministério da Saúde, 2013b. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_humanizacao_pnh_folheto.pdf. Acesso em: 10 nov. 2021.
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) com as PCAF proporcionaram encontros entre sujeitos/coletividades, estimulando o desenvolvimento de capacidades e experiências que serviram como recursos de saúde.

4.3 DESENVOLVIMENTO DE RECURSOS DE SAÚDE

A terceira prática identificada no trabalho dos(as) PEF foi o desenvolvimento de recursos de saúde, ou seja, o estímulo à ampliação e diversificação de experiências, capacidades e conhecimentos que pudessem ser produtoras de saúde na vida dos participantes. Segundo a teoria da salutogênese, as pessoas produzem saúde através da mobilização dos recursos que estão disponíveis no contexto de vida delas (ANTONOVSKY, 1979ANTONOVSKY, Aaron. Health, stress and coping. London: Jossey-Bass, 1979.). Estes recursos proporcionam experiências de vida que auxiliam as pessoas a compreenderem e lidarem com fatores estressores, enfrentarem situações de adoecimento e sofrimento, assim como produzirem saúde e bem-estar.

Para se alcançar o desenvolvimento de recursos de saúde em diferentes dimensões além dos benefícios físicos das PCAF, é necessário que o trabalho em saúde tenha tal intencionalidade, o que foi demonstrado pelas falas dos(as) PEF: “[O objetivo] é a promoção da saúde. Tu promover possibilidades de as pessoas observarem a vida delas e estar buscando saúde” (Barbara, PEF-P2); “O que sempre quero alcançar é a questão da autonomia [...] porque as pessoas, quando elas não têm acesso ao conhecimento, elas acabam sendo muito dependentes de outra pessoa” (Ana, PEF-P1); “Primeiro, é trabalhar promoção da saúde e prevenção de doenças; segundo é trabalhar o físico, mental e social. E terceiro, acolhimento que também é fundamental […] Por isso que daí não foca só no físico” (Susana, PEF-P3). As falas indicam que as aspirações dos(as) PEF com as PCAF se direcionavam para diferentes modos de produzir saúde na vida das pessoas.

Deste modo, as contribuições das PCAF na vida dos(as) usuários(as) foi além da dimensão física e fisiológica, como a redução de peso corporal, melhoria das capacidades físicas e funcional, redução do uso de medicamentos e alívio de dores. De maneira significativa, o trabalho dos(as) PEF potencializou a produção de saúde na vida dos(as) participantes através de novos recursos dos tipos cognitivos, sociais e emocionais.

Na parte cognitiva, os(as) usuários(as) identificaram a aquisição de conhecimentos relacionados à saúde, melhorias na memória e na capacidade de aprendizagem na vida adulta e idosa: “A professora puxa palestra da nutricionista, fisioterapeuta… daí, a gente aprende muita coisa, faz um conjunto completo” (Sheila, 55, P3); “A memória, para dormir, agilidade, o equilíbrio, melhorou bastante” (Joana, 62, P3); “Eu gosto de ouvir palestra. Eu gosto de aprender. Porque eu não tive essa oportunidade de aprender. Nem a leitura, nem a escola” (Nilza, 80, P1). Portanto, os(as) participantes encontraram oportunidades para se engajarem em processos educativos, especialmente sobre temas em saúde.

Segundo Antonovsky (1979)ANTONOVSKY, Aaron. Health, stress and coping. London: Jossey-Bass, 1979., o componente cognitivo está relacionado à capacidade de compreensão das pessoas (comprehensibility), o que consiste em um elemento fundamental para a percepção de si e do mundo, incluindo o reconhecimento das experiências singulares e coletivas, bem como das condições sócio-históricas que são determinantes para a saúde.

No domínio social, os recursos de saúde percebidos pelos(as) participantes estavam relacionados às experiências de novas amizades, interação, criação de vínculos, solidariedade, apoio social e divertimento: “É a convivência, o dia a dia com as pessoas. Eu era mais acanhado, ficava mais em casa, não saía. E agora então já soltou, melhorou a comunicação” (Paulo, 69, P3); “Achei que ia ser muito exigente, ter que perder peso. Daí a professora disse que não, que é para se enturmar […] A gente aprende a repartir, partilhar o que a gente tem de bom” (Joana, 62, P3); “Isso aqui para nós é uma família” (Lisa, 78, P1); “A gente faz almoço, faz janta, daí a gente faz mais amizade” (Sheila, 55, P3); “Não é só ir ali praticar o exercício. A gente conversa, a gente ri, a gente brinca” (Margareth, 46, P3). As falas sugerem que as PCAF apresentaram uma potencialidade para conectar pessoas e se configuraram em um espaço de encontro e formação de coletividades, corroborando os achados do estudo de Jesus, Sventnickas e Vieira (2019)JESUS, Janice Debastiani; SVENTNICKAS, Sofia Paiva; VIEIRA, Adriane. Grupo de promoção à saúde: ampliando o cuidado em saúde de usuários com dores musculoesqueléticas crônicas em serviços de atenção básica. Movimento, v. 25, p. 25074, 2019. DOI: https://doi.org/10.22456/1982-8918.91063 Disponível em: https://seer.ufrgs.br/Movimento/article/view/91063/54967. Acesso em: 30 nov. 2021.
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com usuários de serviços de saúde que atribuíram importância ao convívio social, cultivo de amizade e trocas de experiências. Neste sentido, Carvalho, Guerra e Loch (2020)CARVALHO, Fabio Fortunato Brasil; GUERRA, Paulo Henrique; LOCH, Mathias Roberto. Potencialidades e desafios das práticas corporais e atividades físicas no cuidado e promoção da saúde. Motrivivência, v. 32, n. 63, p. 01-18, jul./dez. 2020. DOI: 10.5007/2175-8042.2020e71546. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/motrivivencia/article/view/2175-8042.2020e71546/43847. Acesso em: 02 dez. 2021.
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destacam a relevância de se ampliar a visão sobre as PCAF como atividades prazerosas e satisfatórias em detrimento de uma força imperativa sobre os corpos dos sujeitos, como o “ter que perder peso”.

Na dimensão emocional, os(as) participantes reconheceram como experiências produtoras de saúde o prazer, os afetos, o humor, autoestima, vitalidade, propósito e regulação emocional: “Eu estou me sentindo outra pessoa. Me sinto viva de novo. Eu quero viver. Exercício é viver” (Carol, 55, P1); “Eu fui em outras academias, só que não me ajudou assim. Ajudou na parte física, né? Aqui a gente conversa, brinca, ri, e me ajudou bastante a melhorar a minha autoestima” (Vitória, 52, P2); “É o amor que a gente pega com as colegas. Elas te dão um abraço, um beijo, um sorriso, é aquela alegria” (Diana, 62, P2); “Aqui é uma hora de prazer” (Teresa, 54, P2); “É uma válvula de escape que a gente tem” (Emily, 57, P2); “Eu não gosto de faltar porque eu me sinto bem. Eu me sinto aliviada, me dá mais disposição, me dá mais coragem para continuar” (Lisa, 78, P1). Em geral, as falas das participantes coadunam com a visão de que as PCAF contribuem para a valorização da vida, o desenvolvimento humano e uma autopercepção positiva de saúde (CARVALHO; GUERRA; LOCH, 2020).

Como já mencionado, os modos de trabalho dos(as) PEF partiram de uma intencionalidade e envolveram a diversificação de estratégias e atividades com as PCAF. Como exemplo, duas participantes descreveram que a PEF desenvolvia atividades cognitivas:

MARGARETH: Não é só exercício físico que a professora trabalha com a gente. Trabalha mentalidade, concentração. Exercício para exercitar a mente, sabe?

MÁRCIA: Ela trabalha o equilíbrio e com isso a gente acaba trabalhando a mente, a cabeça, memória (Margareth, 46, P3; Márcia, 62, P3).

Corroborando as falas das participantes, as observações de campo confirmaram o uso de uma variedade de atividades lúdicas, como dinâmicas e brincadeiras de adivinhação. Além das atividades regulares, o trabalho dos(as) PEF também incluiu a realização de eventos comemorativos: “A gente comemora todas as datas. O legal é que assim, da mesma forma que eu faço disso um evento, tem gente que leva muito a sério e gosta muito. E tem gente que é uma aula normal” (Susana, PEF-P3). A organização de eventos e confraternizações consistiu em uma ação complementar de incentivo à integração e a formação de vínculos.

Em suma, a ampliação das possibilidades de trabalho com as PCAF com enfoque nas dimensões cognitiva, social e emocional, sem excluir a física, possibilitou o desenvolvimento de múltiplos recursos de saúde, potencializando as capacidades dos adultos e idosos para a produção de saúde e bem-estar.

4.4 VALORIZAÇÃO DO PROTAGONISMO COMUNITÁRIO

Os resultados indicaram que o trabalho dos(as) PEF encorajou os(as) usuários(as) não somente a tornarem-se fisicamente ativos(as), mas também a estabelecerem vínculos e um senso de comunidade, favorecendo o engajamento em ações coletivas e a formação de comunidades ativas mediadas no contexto das PCAF.

No P2, a PEF e as participantes formaram o grupo das “Divas do SUS” para conversar sobre tópicos que eram escolhidos por elas e geralmente estavam relacionados com problemas cotidianos, questões de gênero, interesses e experiências. Através da construção de um espaço acolhedor e dialógico, as mulheres foram estimuladas a se expressarem e refletirem sobre as experiências de ser mulher no contexto de vida delas, e a fazer propostas de ações para o grupo, assumindo o protagonismo das próprias práticas. Para Barbara (PEF-P2), a potência do grupo reside no fato de que: “É o conhecimento delas que elas vão trocando, conversando, se organizando. É aquela coisa de colocar o que elas vivenciam e dividir com as colegas, e não só o conhecimento de alguém formado, mas da vida delas”. Então, as rodas de conversa mediadas pela PEF possibilitaram a valorização dos conhecimentos e experiências das próprias mulheres, contribuindo para o reconhecimento delas enquanto sujeitos autônomos e corresponsáveis na produção de saúde (BRASIL, 2013bBRASIL. Ministério da Saúde. Política Nacional de Humanização. Brasília: Ministério da Saúde, 2013b. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_humanizacao_pnh_folheto.pdf. Acesso em: 10 nov. 2021.
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).

Neste mesmo sentido, Susana (PEF-P3) demonstrou valorizar a corresponsabilidade na construção de modos de viver saudáveis: “A academia não é minha, não é da prefeitura, não é do bairro. A gente é tudo um só. A gente conversa, se entende, todo mundo tem o direito de expor a sua opinião. Sempre deixei isso muito claro”. Como resultado de um ambiente inclusivo, algumas ações surgiram como iniciativas dos(as) próprios(as) participantes, tais como a criação de uma biblioteca comunitária e de um mural da solidariedade em que eles(as) se ajudavam. Um participante descreveu como funcionava o mural: “Se algum aluno precisa de alguma coisa, tem um quadro ali. E aquilo que a gente está precisando, bota ali. E a pessoa que tem em casa aquilo, que está sobrando, traz para aquele outro” (Jorge, 69, P3). O exemplo do mural da solidariedade evidencia o envolvimento dos(as) participantes com a construção de ações coletivas, fortalecendo o senso de comunidade.

Outro exemplo foi relatado por Carlos (PEF-P4) sobre uma iniciativa de criação de horta comunitária: “Estão com o intuito de fazer uma horta aqui atrás do ginásio e o grupo vai adotar. Uma aluna iniciou o processo, trouxe semente e já plantou coisa aqui. Então, o pessoal vai começar a cuidar do espaço aqui”. Ações como essa ilustram como os(as) participantes passaram a se apropriar dos espaços comunitários e a desenvolver a capacidade de mobilização de recursos (ANTONOVSKY, 1979ANTONOVSKY, Aaron. Health, stress and coping. London: Jossey-Bass, 1979.) para a produção de saúde e bem-estar coletivo.

Portanto, os(as) PEF atuaram como facilitadores na construção de coletividades, o que corrobora estudos como o de Lima et al. (2020), cujos resultados apontaram um papel central do PEF como mediador, educador e articulador de um grupo de convivência de idosos. O trabalho dos(as) PEF possibilitou a criação de oportunidades e espaços para o protagonismo comunitário (BRASIL, 2013bBRASIL. Ministério da Saúde. Política Nacional de Humanização. Brasília: Ministério da Saúde, 2013b. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_humanizacao_pnh_folheto.pdf. Acesso em: 10 nov. 2021.
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), incentivando a participação ativa dos(as) usuários(as) no desenvolvimento de recursos de saúde coletivos e potencializando a produção do cuidado. Estes achados apoiam a perspectiva de que as PCAF apresentam um potencial de operacionalização dos princípios da promoção da saúde, como a autonomia e protagonismo dos sujeitos (CARVALHO; GUERRA; LOCH, 2020).

5 CONCLUSÃO

Este estudo buscou identificar e analisar as práticas desenvolvidas por PEF no trabalho com as PCAF para adultos e idosos em programas públicos de promoção da saúde. As quatro práticas identificadas - um olhar para as pessoas, relações de cuidado, desenvolvimento de recursos de saúde e valorização do protagonismo comunitário - sugerem que os modos de trabalho dos(as) PEF superaram o modelo tradicional biomédico e assumiram um caráter salutogênico.

Os(as) PEF desenvolveram novas possibilidades com as PCAF em alinhamento com uma perspectiva salutogênica, ou seja, centradas no desenvolvimento de capacidades para a produção de saúde e bem-estar. As experiências constituídas com as PCAF apoiaram os(as) participantes no enfrentamento de adversidades, contribuindo para que percebessem a vida como compreensível, gerenciável e significativa, e por sua vez influenciando positivamente a saúde (ANTONOVSKY, 1979ANTONOVSKY, Aaron. Health, stress and coping. London: Jossey-Bass, 1979.).

Os achados deste estudo reforçam a existência de possibilidades promissoras para a atuação do PEF no âmbito da promoção da saúde. Os resultados evidenciaram que as PCAF podem se configurar como um espaço privilegiado para a produção de encontros entre sujeitos/coletividades e de outras experiências produtoras de saúde. O desenvolvimento de um trabalho em saúde comprometido com o cuidado, em seu sentido filosófico e prático (AYRES, 2004AYRES, José Ricardo de Carvalho Mesquita. Cuidado e reconstrução das práticas de saúde. Interface-Comunicação, Saúde, Educação, v. 8, p. 73-92, fev. 2004. Disponível em: https://www.scielosp.org/article/icse/2004.v8n14/73-92/ Acesso em: 17 nov. 2021.
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), permitiu que os(as) PEF fossem além da promoção de um estilo de vida ativo e prevenção de doenças, e contribuíssem de forma significativa para a humanização e construção de modos de viver saudáveis.

  • 1
    O artigo é um desdobramento da tese de doutorado de FERREIRA, Heidi Jancer. Health and physical education professionals' salutogenic and pedagogical practices for working with disadvantaged older adults. Universidade Estadual Paulista (UNESP) - Campus de Rio Claro, 2019.
  • 2
    Neste estudo, conforme Carvalho (2016)CARVALHO, Fabio Fortunato Brasil. Práticas corporais e atividades físicas na atenção básica do sistema único de saúde: ir além da prevenção das doenças crônicas não transmissíveis é necessário. Movimento, v. 22, n. 2, p. 647-658, abr./jun. 2016. DOI: https://doi.org/10.22456/1982-8918.58174. Disponível em: https://www.seer.ufrgs.br/Movimento/article/view/58174. Acesso em: 29 nov. 2021.
    https://doi.org/10.22456/1982-8918.58174...
    , adotamos os termos “práticas corporais e atividades físicas” de maneira complementar, visando considerar os múltiplos sentidos atribuídos pelos sujeitos e coletividades às manifestações do movimento humano em seus aspectos culturais, lúdicos, sociais, históricos, físicos e biológicos.
  • 3
    Cabe destacar que existem divergências na tradução dos conceitos da teoria da salutogênese da Língua Inglesa para a Portuguesa (vide Saboga-Nunes, 2017SABOGA-NUNES, Luis. Perspectives on Salutogenesis of Scholars Writing in Portuguese. In: MITTELMARK, Maurice; SAGY, Shifra; ERIKSSON, Monica; BAUER, Georg; PELIKAN, Jürgen; LINDSTRÖM, Bengt; ESPNES, Geir Arild (Eds.). The Handbook of Salutogenesis. New York: Springer, 2017. p.415-421.). Para a tradução dos componentes do sentido de coerência nos baseamos no estudo de validação e adaptação transcultural de Scalco (2016)SCALCO, Giovana Pereira da Cunha. Avaliação da versão brasileira em português da escala de senso de coerência: adaptação transcultural e propriedades psicométricas. 2016. 90f. Tese (Doutorado em Odontologia) - Faculdade de Odontologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2016..
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    Criamos nomes fictícios para manter o anonimato dos participantes.
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    A coordenação do P4 era desempenhada pelo próprio PEF.
  • FINANCIAMENTO
    O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001 e Bolsa/Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior/Processo nº 88881.131900/2016-01; Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais (IFSULDEMINAS); Processo nº 2019/05358-7, Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).

ÉTICA DE PESQUISA

A pesquisa seguiu os protocolos vigentes nas Resoluções 466/12 e 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde do Brasil e foi aprovado pelo Comitê de Ética de Pesquisa (CEP) da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Número na Plataforma Brasil CAAE: 52527616.1.0000.5465 Parecer: 3.573.017.

RESPONSABILIDADE EDITORIAL

Alex Branco Fraga *, Elisandro Schultz Wittizorecki *, Mauro Myskiw *, Raquel da Silveira *

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    07 Jan 2022
  • Aceito
    13 Maio 2022
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