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Qualidade de vida relacionada à saúde, antes e seis meses após a revascularização do miocárdio

Health-related quality of life before and six months after coronary artery bypass graft surgery

Calidad de vida relacionada con la salud antes y seis meses después de la revascularización miocárdica

Resumos

A cirurgia de revascularização do miocárdio (CRM) visa melhorar a qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS), aliviar sintomas e aumentar a sobrevida. Objetivou-se comparar a QVRS antes e seis meses após CRM e avaliar a sua relação com idade, sexo, escolaridade e estado civil. Estudo descritivo e longitudinal que utilizou o SF-36 para avaliar a QVRS. Entre os 54 sujeitos, 53,7% eram homens, 66,7% casados, com idade média de 57,3+9,7 anos e 5,7+4 anos de escolaridade. Após a CRM as médias dos domínios do SF-36 variaram de 62 a 74,2 sendo o intervalo anterior de 17,1 a 58,1. Homens apresentaram melhor avaliação da QVRS antes e após a CRM do que as mulheres, mas as diferenças foram estatisticamente significantes apenas para Estado geral de saúde e Dor. Não se constatou associação entre QVRS, escolaridade e estado civil. Concluiu-se que a CRM melhorou a QVRS dos participantes.

Qualidade de vida; Cirurgia torácica; Revascularização miocárdica


Coronary artery bypass grafting (CABG) surgery aims at offering a better health-related quality of life (HRQL), relieving symptoms and increasing survival .The objectives were to compare HRQL before CABG and six months after it and to evaluate its relation concerning participants' age, sex, schooling and marital status. Descriptive and longitudinal study, which used the SF-36 to evaluate HRQL. Among the 54 subjects, 53,7% were men, 66,7% of them were married, their average age was of 57,3+9,7 and their schooling of 5,7+4. After CABG, the scores of the domains of the SF-36 varied from 62 to 74,2 being the previous interval from 17,1 to 58,1. Men showed a better evaluation towards HRQL before and after CABG than women, but the differences were only statistically significant for General Health and Bodily pain. No association between HRQL, schooling and marital status was stated. In conclusion, the CABG improved participants' HRQL.

Quality of life; Thoracic surgery; Myocardial revascularization


La cirugía de revascularización del miocardio (CRVM) busca ofrecer una mejor calidad de vida relacionada con la salud (CVRS), aliviar los síntomas de angina y aumentar la sobrevida. Los objetivos foi comparar la CVRS antes y seis meses después de la CRVM y evaluar su relación con la edad, sexo, escolaridad y estado civil. Estudio descriptivo y longitudinal, que utilizó el SF-36 para evaluar la CVRS. Entre los 54 participantes, 53,7% eran hombres, 66,7% casados, con edad media de 57,3+9,7 años y 5,7+4 años de escolaridad. Después de la CRVM las medias de los dominios del SF-36 variaron de 62 a 74,2 siendo el intervalo anterior de 17,1 a 58,1. Hombres presentaron mejor evaluación de CVRS antes e después de la CRVM que las mujeres, entretanto las diferencias fueron estadísticamente significativas sólo para Estado General de salud y Dolor. No se encontró asociación entre CVRS, escolaridad y estado civil. Las conclusión es que la CRVM mejoró la CVRS de los participantes.

Calidad de vida; Cirugía torácica; Revascularización miocárdica


ARTIGO ORIGINAL

Qualidade de vida relacionada à saúde, antes e seis meses após a revascularização do miocárdio

Calidad de vida relacionada con la salud antes y seis meses después de la revascularización miocárdica

Health-related quality of life before and six months after coronary artery bypass graft surgery

Cristiane Franca Lisboa GoisI; Rosana Aparecida Spadoti DantasII; Fernanda Gaspar TorratiIII

IDoutora em Enfermagem Fundamental pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (EERP-USP), Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil

IIDoutora em Enfermagem Fundamental, Professora Associada da EERP-USP, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil

IIIMestre em Enfermagem Fundamental pela EERP-USP, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil

Endereço da autora Endereço da autora: Rosana Aparecida Spadoti Dantas Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da USP Departamento de Enfermagem Geral e Especializada Av. Bandeirantes, 3900 14040-030, Ribeirão Preto, SP E-mail: rsdantas@eerp.usp.br

RESUMO

A cirurgia de revascularização do miocárdio (CRM) visa melhorar a qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS), aliviar sintomas e aumentar a sobrevida. Objetivou-se comparar a QVRS antes e seis meses após CRM e avaliar a sua relação com idade, sexo, escolaridade e estado civil. Estudo descritivo e longitudinal que utilizou o SF-36 para avaliar a QVRS. Entre os 54 sujeitos, 53,7% eram homens, 66,7% casados, com idade média de 57,3+9,7 anos e 5,7+4 anos de escolaridade. Após a CRM as médias dos domínios do SF-36 variaram de 62 a 74,2 sendo o intervalo anterior de 17,1 a 58,1. Homens apresentaram melhor avaliação da QVRS antes e após a CRM do que as mulheres, mas as diferenças foram estatisticamente significantes apenas para Estado geral de saúde e Dor. Não se constatou associação entre QVRS, escolaridade e estado civil. Concluiu-se que a CRM melhorou a QVRS dos participantes.

Descritores: Qualidade de vida. Cirurgia torácica. Revascularização miocárdica.

RESUMEN

La cirugía de revascularización del miocardio (CRVM) busca ofrecer una mejor calidad de vida relacionada con la salud (CVRS), aliviar los síntomas de angina y aumentar la sobrevida. Los objetivos foi comparar la CVRS antes y seis meses después de la CRVM y evaluar su relación con la edad, sexo, escolaridad y estado civil. Estudio descriptivo y longitudinal, que utilizó el SF-36 para evaluar la CVRS. Entre los 54 participantes, 53,7% eran hombres, 66,7% casados, con edad media de 57,3+9,7 años y 5,7+4 años de escolaridad. Después de la CRVM las medias de los dominios del SF-36 variaron de 62 a 74,2 siendo el intervalo anterior de 17,1 a 58,1. Hombres presentaron mejor evaluación de CVRS antes e después de la CRVM que las mujeres, entretanto las diferencias fueron estadísticamente significativas sólo para Estado General de salud y Dolor. No se encontró asociación entre CVRS, escolaridad y estado civil. Las conclusión es que la CRVM mejoró la CVRS de los participantes.

Descriptores: Calidad de vida. Cirugía torácica. Revascularización miocárdica.

ABSTRACT

Coronary artery bypass grafting (CABG) surgery aims at offering a better health-related quality of life (HRQL), relieving symptoms and increasing survival .The objectives were to compare HRQL before CABG and six months after it and to evaluate its relation concerning participants' age, sex, schooling and marital status. Descriptive and longitudinal study, which used the SF-36 to evaluate HRQL. Among the 54 subjects, 53,7% were men, 66,7% of them were married, their average age was of 57,3+9,7 and their schooling of 5,7+4. After CABG, the scores of the domains of the SF-36 varied from 62 to 74,2 being the previous interval from 17,1 to 58,1. Men showed a better evaluation towards HRQL before and after CABG than women, but the differences were only statistically significant for General Health and Bodily pain. No association between HRQL, schooling and marital status was stated. In conclusion, the CABG improved participants' HRQL.

Descriptors: Quality of life. Thoracic surgery. Myocardial revascularization.

INTRODUÇÃO

Dentre as doenças cardiovasculares, a doença arterial coronariana (DAC) representa a causa mais comum de isquemia do músculo cardíaco e pode manifestar-se de diferentes formas, variando de uma angina do peito até o infarto agudo do miocárdio(1). Como tratamento, a cirurgia de revascularização do miocárdio (CRM) é indicada para pacientes com angina não controlada com o tratamento clínico e para pacientes com elevado grau de obstrução de artérias principais, significando risco de vida(2). A CRM visa melhorar a qualidade de vida dos pacientes, aliviar os sintomas da angina, restabelecer a capacidade física, além de aumentar a sobrevida, sobretudo dos pacientes de maior risco(3).

Qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS) é o termo que tem sido utilizado quando se pretende enfocar aqueles aspectos da qualidade de vida que são influenciados pela doença e/ou tratamento(4). A avaliação da QVRS de indivíduos com condições crônicas tem sido objeto de investigação na área da saúde, sendo considerada como importante indicador dos resultados terapêuticos em diferentes situações clínicas. A partir da avaliação dos mecanismos que incidem de forma negativa na QVRS, é possível o planejamento de intervenções psicossociais que levem a um maior bem-estar(5).

Um dos instrumentos de avaliação da QVRS mais usado entre indivíduos após CRM é o Medical Outcomes Study 36 – item Short-Form (SF-36)(6), seja em estudos internacionais(7,8), quanto nacionais(9,10).

De modo geral, tem sido observado que a QVRS melhora em todos os oito componentes avaliados pelo SF-36 considerando desde seis meses(7,10-12) até mais tempo após a cirurgia(10,13). Embora, alguns autores também tenham observado deterioração da QVRS no que se refere aos componentes Saúde mental e Aspectos sociais, seis meses após a CRM(8). Segundo os autores, uma possível explicação pode estar no fato de que os pacientes apresentam uma expectativa maior sobre os resultados da cirurgia e da recuperação após o tratamento(8).

Em estudo realizado no Brasil, com pacientes submetidos à CRM, os componentes do SF-36 que se apresentaram mais comprometidos no pré-operatório foram Aspectos físicos, Capacidade funcional e Aspectos emocionais, enquanto que após a cirurgia houve melhora em todos os componentes do instrumento, ou seja, na QVRS dos pacientes(10).

Alguns autores têm explorado as relações entre as variáveis que podem influenciar a QVRS dos pacientes submetidos à CRM, tais como: o sexo(10,12,14); a idade e a escolaridade(9,15).

Até o momento, poucos são os estudos nacionais que avaliaram a QVRS em populações de pacientes cardíacos cirúrgicos(9,10). Considerando que a DAC é multifatorial e interfere na saúde do indivíduo em várias dimensões, e que a CRM é um tratamento invasivo que visa oferecer uma melhor QVRS, mensurá-la antes e após a intervenção, pode contribuir para a avaliação do resultado dessa terapêutica.

Assim, os objetivos deste estudo foram comparar a QVRS antes e seis meses após CRM e avaliar a sua relação com idade, sexo, escolaridade e estado civil dos participantes.

CASUÍSTICA E MÉTODO

Delineamento, sujeitos e local do estudo

Estudo descritivo e correlacional, tipo longitudinal, desenvolvido nas dependências do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP) da Universidade de São Paulo (USP), junto às unidades de internação (primeira fase da coleta, correspondente à avaliação pré-operatória), e no ambulatório da Divisão de Cardiologia (segunda fase da coleta, correspondente à avaliação seis meses após a cirurgia cardíaca). Quando os participantes não compareceram aos retornos agendados, foram realizadas visitas aos seus domicílios para a finalização da coleta. Participou do estudo uma amostra consecutiva composta por 54 sujeitos que atenderam aos seguintes critérios: ser submetido pela primeira vez à CRM; ser maior de 21 anos, ter um tempo de internação pré-operatório menor do que 28 dias e apresentar condições clínicas (físicas e psicológicas) para responder às questões feitas pelas pesquisadoras. O tempo máximo de internação pré-operatório foi estipulado, uma vez que as questões que compõem o SF-36, instrumento utilizado para mensurar a QVRS, abordam aspectos da saúde física e emocional referentes às últimas quatro semanas. Pacientes internados há 29 dias ou mais não estariam desenvolvendo as atividades mensuráveis pelo instrumento e, por isso, não foram inseridos no estudo.

A amostra foi considerada por conveniência, pois os participantes foram abordados na ordem em que eram internados para CRM e atendiam aos critérios exigidos para a participação no estudo. Não foi realizado cálculo para o tamanho amostral uma vez que se trata de um estudo de caráter observacional cuja finalidade primária era de natureza exploratória e não confirmatória(16).

O desenvolvimento do estudo ocorreu em conformidade ao preconizado pela Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde(17). O projeto foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa do HCFMRP (ofício no 8157/2006) e os participantes aceitaram participar do estudo mediante a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido.

Coleta dos dados

A coleta dos dados foi realizada pelas pesquisadoras por meio de entrevistas individuais e consulta ao prontuário dos participantes. Foi utilizado um instrumento de caracterização sociodemográfica e clínica. Os dados para a caracterização sociodemográfica foram a data do nascimento (posterior cálculo da idade), sexo, estado civil (casado/vivendo em união consensual e solteiro/viúvo/separado), escolaridade (em anos) e situação profissional (desempenho de atividades remuneradas: sim ou não). Os dados clínicos foram coletados dos prontuários dos participantes sendo eles: data da internação, uso de psicofármacos antes e durante a internação, presença de tratamentos anteriores para a DAC (medicamentoso ou angioplastia transluminal percutânea), presença de comorbidades e manifestação clínica da DAC (diagnóstico de infarto agudo e/ou angina pectoris).

Para a avaliação da QVRS foi utilizada a versão adaptada para o português(18) do instrumento genérico Medical Outcomes Study 36 - item Short-Form (SF-36)(6). É um questionário multidimensional formado por 36 itens englobados por oito componentes: Capacidade funcional (com 10 itens), Aspectos físicos (4 itens), Dor (2 itens), Estado geral de saúde (5 itens), Vitalidade (4 itens), Aspectos sociais (2 itens), Aspectos emocionais (3 itens) e Saúde mental (5 itens) e mais uma questão para a avaliação comparativa do estado geral de saúde atual e a de um ano atrás. O instrumento aborda as últimas quatro semanas e avalia tanto os aspectos negativos (doença/enfermidade) quanto os positivos (bem-estar) do sujeito. Para a avaliação dos resultados, as respostas aos seus itens são computadas em seus respectivos componentes(18), e esses valores são normatizados em uma escala de zero a 100. Menores valores refletem uma percepção de saúde precária e dor (pior avaliação da QVRS), enquanto altos valores refletem uma percepção de boa saúde, ausência de déficits funcionais e de dor (melhor avaliação da QVRS)(6,18).

Análise dos dados

Os dados foram processados e analisados usando o programa Statistical Package for Social Science (SPSS), versão 15.0. Foram comparados os valores da QVRS antes e seis meses após a cirurgia (teste de Wilcoxon) e segundo o sexo e o estado civil (teste de Mann-Whitney). O teste de correlação de Spearman foi realizado para avaliar as correlações entre a medida de QVRS, a idade e o tempo de escolaridade dos sujeitos(19). A consistência interna dos itens do SF-36 na amostra estudada foi verificada pelo alfa de Cronbach. O nível de significância adotado foi de 0,05.

RESULTADOS

Na primeira fase do estudo, foram entrevistados 60 pacientes dos quais três foram a óbito e três se recusaram a continuar participando da pesquisa. Assim, 54 participantes foram avaliados antes e seis meses após a cirurgia. A caracterização sociodemográfica e clínica se encontra na Tabela 1.

Entre os 16 (30%) pacientes que apresentaram alguma complicação no pós-operatório, cinco sofreram o infarto do miocárdio e quatro desenvolveram infecção hospitalar, sendo essas as complicações mais observadas.

O tempo médio transcorrido entre a internação e a primeira entrevista foi de 10 dias (variando de zero a 28 dias) e entre a primeira e segunda entrevista foi de 5,6 meses (entre cinco e seis meses após a cirurgia).

Considerando que a avaliação da QVRS depende da percepção do paciente e que essa pode ser alterada pelo uso de psicofármacos, testou-se se o uso desses medicamentos, no pré-operatório, poderia trazer diferenças nas avaliações da QVRS pelos pacientes. Entre os 54 participantes, apenas 15 (27,8%) estavam sendo medicados. O teste de Mann-Whitney constatou diferença estatisticamente significante para a medida de QVRS apenas nos componentes Dor e Aspectos sociais, embora maiores valores tenham sido observados no grupo que não fazia uso de psicofármacos. Diante desse resultado decidiu-se pela avaliação da QVRS considerando o grupo de 54 sujeitos, independente do uso de psicofármacos.

No que se refere à consistência interna do SF-36 na amostra estudada constatou-se que os valores dos alfas de Cronbach, obtidos na primeira entrevista, variaram de 0,56 (Estado geral de saúde) a 0,88 (Aspectos físicos), e na segunda entrevista de 0,73 (Aspectos sociais) a 0,93 (Aspectos físicos).

Com relação à avaliação da QVRS dos pacientes, observou-se que, no pré-operatório, quatro componentes do SF-36 apresentaram valores medianos inferiores a 50, os quais correspondem a metade do escore máximo para cada componente que é 100, demonstrando assim maior comprometimento nos componentes: Aspectos físicos, Aspectos emocionais, Capacidade funcional e Dor. Seis meses após o tratamento cirúrgico da doença coronariana, constatou-se melhora estatisticamente significante na avaliação dos oito componentes do SF-36. Os componentes Aspectos físicos e Aspectos emocionais foram os que apresentaram melhor avaliação entre os demais (Tabela 2).

Considerando as relações entre as medidas de QVRS, antes e depois da CRM, e as variáveis idade, sexo, escolaridade e estado civil, os resultados obtidos estão descritos na Tabela 3, a seguir.

Com relação à idade, observou-se que antes da cirurgia, as correlações entre a idade e os componentes do SF-36 apresentaram valores e sentidos diversos. Correlações moderadas foram constatadas somente com os domínios Estado Geral de Saúde (r=0,353; p<0,05) e Aspectos emocionais (r=0,302; p<0,05). Seis meses após a cirurgia, todas as correlações eram positivas. Correlações forte e moderada foram observadas, respectivamente, entre idade e Estado Geral de Saúde (r=0,576; p<0,05) e Saúde Mental (r=0,435; p<0,05) (Tabela 3). Não se constatou correlações entre a escolaridade (em anos) dos pacientes com os componentes do SF-36, tanto antes quanto seis meses após a cirurgia (r<0,30 para todas as correlações).

Na avaliação das medidas de QVRS e o sexo dos participantes, os homens apresentaram melhor avaliação da QVRS no pré-operatório com valores medianos que variaram de zero (Aspectos físicos) a 75 (Aspectos sociais) enquanto para as mulheres as medianas variaram entre zero (Aspectos físicos) e 55 (Vitalidade). Os valores foram maiores para os homens nos componentes Aspectos sociais, Estado geral de saúde, Saúde mental e Capacidade funcional e valores iguais para os demais componentes. Seis meses após a CRM os homens apresentaram melhor avaliação em quase todos os componentes, com exceção para Aspectos emocionais, cujas medianas foram iguais para ambos os sexos. Cabe ressaltar que, embora no pré-operatório essa diferença tenha sido estatisticamente significante apenas para o Estado geral de saúde, seis meses após a cirurgia, a diferença entre os participantes, segundo o sexo, passou a ser estatisticamente significante também para o componente Dor (Tabela 4).

Ao comparar as médias dos componentes do SF-36 em relação ao estado civil dos pacientes, só foi observada diferença estatisticamente significativa entre os grupos, no componente Dor (p=0,05), considerando o período pré-operatório. Pacientes solteiros, viúvos ou separados apresentaram maiores médias (59,4) quando comparados aos casados/vivendo em união estável (43,9). Entretanto, seis meses após a CRM não houve diferença na avaliação da QVRS entre os grupos.

DISCUSSÃO

O grupo estudado caracterizou-se por um baixo nível sócio econômico o que caracteriza a grande maioria dos pacientes atendidos em hospitais públicos conveniados com o Sistema Único de Saúde. A caracterização clínica é compatível com os demais estudos realizados com pacientes coronariopatas, sob tratamento cirúrgico, atendidos em hospitais brasileiros(9,10).

De acordo com os resultados obtidos os pacientes que fizeram parte do estudo apresentaram, no pré-operatório, dificuldades para realizar atividades profissionais e/ou domésticas em decorrência de sua saúde física (componente Aspectos físicos). Demonstraram que essas atividades estavam comprometidas por alterações emocionais (componente Aspectos emocionais). Em geral, eles apresentaram limitações para realizar atividades que exigiam maior esforço físico como correr, vestir-se, tomar banho (componente Capacidade funcional) e referiram algum grau de dor no corpo (componente Dor). Os resultados obtidos se assemelham aos apresentados por outro estudo realizado no Brasil com uma amostra de pacientes com características demográficas semelhantes as do presente (idade, prevalência do sexo masculino e grau de escolaridade), os componentes que se apresentaram mais comprometidos no pré-operatório de CRM foram: Aspectos físicos, Capacidade funcional e Aspectos emocionais(10). O componente Aspectos físicos foi o que se apresentou mais comprometido antes da cirurgia cardíaca, tanto no presente estudo quantos em outros analisados(7,8,10).

Seis meses após a cirurgia observou-se que os participantes apresentaram melhor avaliação da QVRS em todos os componentes, assim como na maioria dos estudos realizados com pacientes submetidos à cirurgia cardíaca(7,10-12,14). No presente estudo, os componentes que apresentaram maiores diferenças entre os valores médios das duas medidas foram Aspectos físicos e Capacidade funcional e os que mostraram menores diferenças foram Vitalidade e Saúde mental. Essa avaliação indicou que a melhora foi mais acentuada nos componentes físicos da QVRS e menos intensa nos componentes mentais. Tais resultados reforçam os efeitos que a CRM tem sobre a melhora da capacidade cardiovascular e, conseqüentemente, do desempenho físico dos pacientes. Com a melhora da perfusão decorrente da revascularização cirúrgica do miocárdio, há uma diminuição ou cessação da angina. No que se refere à saúde mental, a presença de alterações no estado de humor, tanto antes como depois do tratamento, pode prejudicar a QVRS dos pacientes.

Quando se analisou a presença de correlação entre a idade dos participantes e a percepção de QVRS, observou-se apenas uma correlação moderada, positiva e significativa, com os componentes Estado geral de saúde e Aspectos emocionais, no pré-operatório. Embora a correlação da idade com o componente Aspectos físicos tenha sido fraca e não estatisticamente significante, o sentido inverso dessa correlação parece reforçar o conhecimento clínico que associa o envelhecimento à diminuição de atividades que exigem melhor desempenho físico dos indivíduos.

Seis meses após a cirurgia a idade se correlacionou fortemente com o componente Estado geral de saúde indicando que pacientes com mais idade apresentaram melhora na percepção desse componente da QVRS. Correlação moderada foi observada entre idade e o componente Saúde mental, ou seja, pacientes mais idosos apresentaram menos sintomas de nervosismo, depressão e desânimo, percebendo-se mais tranqüilos e felizes. Todavia, a literatura ainda é inconclusiva sobre a relação idade e QVRS. Alguns autores têm constatado que os pacientes mais idosos, antes de serem submetidos à CRM, apresentaram melhor avaliação no componente sumário mental(15), enquanto outros observaram que pacientes acima de 75 anos apresentaram menor ganho na QVRS, tanto no componente sumário físico quanto no mental, quando comparados com pacientes mais jovens(13). A presença de queixa de angina, após um ano da cirurgia, pode estar relacionada à natureza da doença coronariana em pacientes mais idosos, além de desordens não cardíacas que podem interferir na percepção do estado de saúde entre eles(13).

Os resultados apresentados revelaram diferença na QVRS segundo o sexo dos participantes. Os homens apresentaram melhor avaliação da QVRS no pré-operatório do que as mulheres, com valores medianos maiores para os componentes Aspectos sociais, Estado geral de saúde, Saúde mental e Capacidade funcional. Seis meses após a CRM, eles apresentaram melhor avaliação em quase todos os componentes, com exceção para Aspectos emocionais. Esses resultados se assemelham aos apresentados por estudos que avaliaram QVRS seis meses após a cirurgia cardíaca(10,14). As mulheres apresentaram menores valores médios em sete dos oito domínios do SF-36, sendo essa diferença estatisticamente significante apenas para os componentes Vitalidade(10), Dor(10,14) e Aspectos emocionais(10,14).

Outro estudo realizado com pacientes submetidos à cirurgia cardíaca também constataram que as mulheres apresentaram menor ganho na QVRS em relação aos homens, avaliando apenas os dois componentes sumários do SF-36 (físico e mental), sendo as diferenças estatisticamente significantes para ambos os componentes(12). As mulheres podem apresentar menor ganho na avaliação da QVRS por vários motivos, entre eles, salientam-se os aspectos ligados à DAC (elas já se encontram em grau mais avançado da doença e, com isso, os resultados após a cirurgia são mais limitados do que nos homens)(12); a doença cardiovascular pode ter pior evolução entre as elas, maior prevalência de comorbidades (tais como osteoporose e depressão), serem as mulheres mais idosas que os homens. Entretanto, ressalta-se o fato de terem as mulheres maior facilidade de expressar a realidade na auto-avaliação, característica importante na avaliação de constructos subjetivos como a QVRS(10).

Com base nestes resultados considera-se importante que no planejamento da assistência aos pacientes submetido à CRM, a equipe de saúde, destacando-se os enfermeiros, observe com maior atenção os pacientes mais jovens e do sexo feminino tanto antes quanto no período de reabilitação da CRM.

CONCLUSÕES

Os participantes do estudo apresentaram melhor avaliação da QVRS seis meses após a CRM. Os componentes do SF-36 se correlacionaram positivamente com a idade dos pacientes, demonstrando que com o aumento da idade há melhora da QVRS. Os homens apresentaram melhor avaliação da QVRS quando comparados às mulheres do estudo. Não houve associação entre os componentes do SF-36 e a escolaridade e o estado civil dos pacientes seis meses após a cirurgia.

O presente estudo teve algumas limitações, como o pequeno tamanho da amostra e o fato dessa amostra só representar um parte da população (maior parte formada por participantes com o mais baixo nível sócio-econômico). Futuros estudos necessitam ser desenvolvidos com populações de pacientes coronariopatas submetidos à CRM em outros serviços de saúde, como os hospitais privados, a fim de que se possam ampliar o conhecimento sobre os efeitos da CRM sobre a QVRS de outros pacientes brasileiros.

Recebido em: 27/11/2009

Aprovado em: 21/12/2009

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  • Endereço da autora:
    Rosana Aparecida Spadoti Dantas
    Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da USP
    Departamento de Enfermagem Geral e Especializada
    Av. Bandeirantes, 3900
    14040-030, Ribeirão Preto, SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Out 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 2009

    Histórico

    • Recebido
      27 Nov 2009
    • Aceito
      21 Dez 2009
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