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Tipologia de cuidados de enfermagem segundo clientes hospitalizados: encontro das dimensões técnico-científica e expressiva

Typology of nursing care according to hospitalized clients: scientific-technical and expressive dimensions

Tipología de la atención de enfermería según clientes hospitalizados: encuentro de las dimensiones técnico-científica y expresiva

Resumos

Pesquisa qualitativo-descritiva, realizada em um hospital universitário do Rio de Janeiro, entre agosto de 2007 a dezembro de 2008. Objetivou-se descrever os cuidados de enfermagem, caracterizando-os a partir das concepções de 26 clientes hospitalizados, sujeitos da pesquisa. Conjugou-se a técnica de criatividade e sensibilidade "Almanaque" com a entrevista na produção de dados, seguida de análise de conteúdo temática da qual emergiu a categoria "Dimensões do cuidado de enfermagem na ótica dos sujeitos: técnico-científica e expressiva". Os resultados apontaram que estas dimensões devem se manifestar de forma articulada, sendo o cuidado concebido como integral e construído na relação com o outro. Os sujeitos valorizam e defendem a aliança entre tais dimensões, e esperam que a enfermeira possa integrá-las nas ações de cuidado. O conhecimento acerca das concepções de clientes sobre os cuidados no hospital colabora na promoção de ambiente que favoreça sua restauração através da efetividade do cuidado, gerada nessa relação.

Cuidados de enfermagem; Assistência hospitalar; Humanização da assistência


This qualitative-descriptive study was carried out in a school hospital in Rio de Janeiro, Brazil, from August 2007 to December 2008. Nursing care was described and characterized based on the perceptions of 26 hospitalized patients. Data collection was carried out through interviews and the "Almanac" creative and sensitivity technique, followed by thematic content analysis from which the following category emerged: "Nursing care dimensions from the subjects' perspectives: scientific-technical and expressive". The results show that these dimensions should be manifested in a coordinated way and integral care should be designed and constructed in the relationship with the other. The participants value and defend an alliance between these dimensions and expect nurses to integrate them into care actions. Knowledge about the patients' perceptions concerning hospital care collaborates to the promotion of the environment and favors its restoration through effective care generated in this relationship.

Nursing care; Hospital care; Humanization of assistance


Esta investigación cualitativa y descriptiva objetivó describir los cuidados de enfermería caracterizados a partir de concepciones de 26 clientes hospitalizados. Fue realizada en un hospital universitario del Rio de Janeiro, Brasil, entre agosto de 2007 y diciembre de 2008. La técnica de creatividad y sensibilidad "Almanaque" y entrevista fueron utilizadas para producción de los datos, los cuales fueron analizados por análisis de contenido temático. La categoría "Dimensiones del cuidado de enfermería bajo la óptica de los sujetos: técnico-científica y expresiva". Los resultados mostraron que estas dimensiones deben manifestarse de forma coordinada, con cuidado integral y construido en la relación con el otro. Los sujetos valorizan y defienden la alianza entre tales dimensiones, y esperan que la enfermera pueda integrarlas en las acciones de cuidado. Conocer las concepciones de clientes sobre los cuidados en el hospital colabora para promover un ambiente que favorezca su restauración a través de la efectividad del cuidado.

Atención de enfermería; Atención hospitalaria; Humanización de la atención


ARTIGO ORIGINAL

Tipologia de cuidados de enfermagem segundo clientes hospitalizados: encontro das dimensões técnico-científica e expressivaa a Excerto do relatório final de Iniciação Científica e Trabalho de Conclusão do Curso de Enfermagem apresentado em 2008 à Escola de Enfermagem Anna Nery (EEAN) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, Brasil.

Tipología de la atención de enfermería según clientes hospitalizados: encuentro de las dimensiones técnico-científica y expresiva

Typology of nursing care according to hospitalized clients: scientific-technical and expressive dimensions

Paula Alvarenga de Figueiredo MartinsI; Denise da Conceição SilvaII; Neide Aparecida Titonelli AlvimIII

IEnfermeira, Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Pesquisa em Enfermagem da EEAN/UFRJ, membro do Núcleo de Pesquisa de Fundamentos do Cuidado de Enfermagem (Nuclearte), Rio de Janeiro, Brasil

IIMestre em Enfermagem pela EEAN/UFRJ, membro do Nuclearte, Rio de Janeiro, Brasil

IIIDoutora em Enfermagem, Diretora e Professora Associada da EEAN/UFRJ, membro do Nuclearte, Rio de Janeiro, Brasil

Endereço da autora Endereço da autora: Paula Alvarenga de Figueiredo Martins Rua Dr. Silvio Bastos Tavares, 348, bloco 120, ap. 304 Condomínio Residencial Recanto das Palmeiras, Parque Rodoviário 28051-250, Campos dos Goytacazes, RJ E-mail: eaepaula@yahoo.com.br

RESUMO

Pesquisa qualitativo-descritiva, realizada em um hospital universitário do Rio de Janeiro, entre agosto de 2007 a dezembro de 2008. Objetivou-se descrever os cuidados de enfermagem, caracterizando-os a partir das concepções de 26 clientes hospitalizados, sujeitos da pesquisa. Conjugou-se a técnica de criatividade e sensibilidade "Almanaque" com a entrevista na produção de dados, seguida de análise de conteúdo temática da qual emergiu a categoria "Dimensões do cuidado de enfermagem na ótica dos sujeitos: técnico-científica e expressiva". Os resultados apontaram que estas dimensões devem se manifestar de forma articulada, sendo o cuidado concebido como integral e construído na relação com o outro. Os sujeitos valorizam e defendem a aliança entre tais dimensões, e esperam que a enfermeira possa integrá-las nas ações de cuidado. O conhecimento acerca das concepções de clientes sobre os cuidados no hospital colabora na promoção de ambiente que favoreça sua restauração através da efetividade do cuidado, gerada nessa relação.

Descritores: Cuidados de enfermagem. Assistência hospitalar. Humanização da assistência.

RESUMEN

Esta investigación cualitativa y descriptiva objetivó describir los cuidados de enfermería caracterizados a partir de concepciones de 26 clientes hospitalizados. Fue realizada en un hospital universitario del Rio de Janeiro, Brasil, entre agosto de 2007 y diciembre de 2008. La técnica de creatividad y sensibilidad "Almanaque" y entrevista fueron utilizadas para producción de los datos, los cuales fueron analizados por análisis de contenido temático. La categoría "Dimensiones del cuidado de enfermería bajo la óptica de los sujetos: técnico-científica y expresiva". Los resultados mostraron que estas dimensiones deben manifestarse de forma coordinada, con cuidado integral y construido en la relación con el otro. Los sujetos valorizan y defienden la alianza entre tales dimensiones, y esperan que la enfermera pueda integrarlas en las acciones de cuidado. Conocer las concepciones de clientes sobre los cuidados en el hospital colabora para promover un ambiente que favorezca su restauración a través de la efectividad del cuidado.

Descriptores: Atención de enfermería. Atención hospitalaria. Humanización de la atención.

ABSTRACT

This qualitative-descriptive study was carried out in a school hospital in Rio de Janeiro, Brazil, from August 2007 to December 2008. Nursing care was described and characterized based on the perceptions of 26 hospitalized patients. Data collection was carried out through interviews and the "Almanac" creative and sensitivity technique, followed by thematic content analysis from which the following category emerged: "Nursing care dimensions from the subjects' perspectives: scientific-technical and expressive". The results show that these dimensions should be manifested in a coordinated way and integral care should be designed and constructed in the relationship with the other. The participants value and defend an alliance between these dimensions and expect nurses to integrate them into care actions. Knowledge about the patients' perceptions concerning hospital care collaborates to the promotion of the environment and favors its restoration through effective care generated in this relationship.

Descriptors: Nursing care. Hospital care. Humanization of assistance.

INTRODUÇÃO

O cuidado é a essência da enfermagem, sendo característica fundamental à preservação da dignidade humana. O cuidado transpessoal manifesta-se no encontro das pessoas que estão envolvidas no ato de cuidar, ou seja, na reciprocidade entre a enfermeira e o cliente que dele resulta. Assim, está relacionado com a interação entre seres humanos através da intersubjetividade, permitindo um encontro real e autêntico entre quem cuida e é cuidado, transcendendo o mundo meramente físico e material, fazendo contato com o emocional e o subjetivo da pessoa. Daí o entendimento de que o cuidado, além de relacional, uma vez que envolve o encontro pessoa-pessoa, é também singular, pois se constrói tendo em vista o alcance das necessidades e desejos do cliente(1). Princípios próprios da relação humana, como a compaixão, a expressão de afeto, a atenção, o zelo, a demonstração de respeito e a tolerância, qualificam o cuidado e, junto com o aporte técnico e tecnológico necessários ao atendimento do cliente, torna o diferencial entre este e o descuidado.

Qualquer pessoa que passa por um processo de hospitalização vivencia situação estressante e muitas vezes de sofrimento. Por um lado, o acelerado avanço técnico-científico no contexto da saúde tem resultado em alguns momentos em uma valorização excessiva desses aspectos em detrimento do respeito e de outras questões que permeiam as relações humanas. Por outro lado, têm-se as limitações impostas pelas características do ambiente hospitalar como ambiente impessoal e frio, local de tristeza, dor e sofrimento, associados à ideologia que prima pela manutenção da hegemonia capitalista e do modelo biomédico nesse espaço.

Não obstante a esses obstáculos, pensamos ser possível prestar um cuidado humanizado no ambiente hospitalar, desde que concebamos o cliente como um ser pleno e total, dotado de características bio-psico-socio-espirituais únicas e indissociáveis. Para isso, é preciso respeitar a condição de sujeito do cliente, por sua vez, possuidor de crenças, valores, atitudes e comportamentos que marcam sua condição de ser ao mesmo tempo único e social. Este aspecto revela a importância do estudo sobre os cuidados de enfermagem na concepção de clientes hospitalizados, sendo este o objeto do presente estudo, excerto do relatório final de Iniciação Científica e Trabalho de Conclusão de Curso(2). O objetivo foi descrever os cuidados de enfermagem na ótica de clientes hospitalizados, caracterizando-os a partir das concepções dos mesmos.

A pesquisa fundamenta-se na concepção de cuidado humano, segundo a qual este se compõe de tentativas intersubjetivas e transpessoais para proteger, melhorar e preservar a humanidade auxiliando uma pessoa a encontrar sentido na doença, sofrimento, dor e existência, e para ajudar o outro a alcançar autoconhecimento, autocontrole e autocura. Além deste conceito, o estudo ancora-se na classificação de cuidados técnico-procedimentais e expressivos(1).

MÉTODO

Pesquisa qualitativa-descritiva, realizada em um hospital universitário localizado na cidade do Rio de Janeiro. O lócus do estudo foram as unidades de internação de clínica médica, nefrologia e ortopedia. Os sujeitos constituíram-se de 26 clientes hospitalizados.

Em atendimento ao disposto na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde(3), a pesquisa teve seu projeto aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição que serviu de cenário do estudo, protocolo nº 269/06. Após devidamente esclarecidos sobre os seus objetivos e sua forma de participação nela, os sujeitos assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, tendo sido identificados com a letra alfabética C (cliente), seguida da ordem da geração dos dados: C1 a C26. As pesquisadoras foram identificadas com a letra P.

Utilizamos a triangulação de técnicas, conjugando a técnica de criatividade e sensibilidade (TCS) "Almanaque" com a entrevista semi-estruturada. Esta técnica consiste na expressão da subjetividade a partir da introspecção que o recorte e colagem de gravuras de diversas naturezas proporcionam aos sujeitos da pesquisa. No uso da TCS os sujeitos realizam produções artísticas que são norteadas pela temática central de discussão, neste estudo, versou sobre cuidados de enfermagem no hospital.

O local de produção de dados foi o próprio cenário da pesquisa. A entrevista ocorrida no entremeio do diálogo existente durante o desenvolvimento do Almanaque, direcionada também pela temática central, teve como perguntas geradoras: que cuidados de enfermagem são desenvolvidos com o (a) senhor (a)? O que o (a) senhor (a) pensa a respeito desses cuidados?

Os relatos dos sujeitos foram gravados em meio digital, após autorização dos mesmos, sendo transcritos na íntegra. A partir dos relatórios gerados com os resultados da implementação das técnicas, os dados foram analisados de acordo com a proposta de análise de conteúdo temática(4). Empregou-se o critério de categorização temático na organização das idéias, fornecendo uma representação simplificada dos dados brutos obtidos em ambas as técnicas. Com tal objetivo utilizou-se a técnica de leitura flutuante para apreensão das idéias principais dos discursos dos sujeitos, sendo essas idéias agrupadas a partir de suas características comuns em unidades de registro, transformando os dados brutos em unidades de análise.

Deste processo de categorização temática, emergiu a categoria "Dimensões do cuidado de enfermagem na ótica dos sujeitos", e as subcategorias "Dimensão técnico-científica do cuidado de enfermagem" e "Dimensão expressiva do cuidado de enfermagem".

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Dimensões do cuidado de enfermagem na ótica dos sujeitos

Os cuidados de enfermagem caracterizados como instrumentais englobam todos aqueles que atendem às necessidades biofísicas do cliente, como a higiene e a terapêutica medicamentosa. Os cuidados expressivos inserem o aspecto psicossocial na relação de cuidado e inclui a dimensão do afeto ao cuidar, garantindo, deste modo, o seu caráter humanístico(1).

Vale ressaltar que, as concepções de cuidado dos sujeitos ratificaram os pressupostos teóricos da pesquisa(1) ao destacarem que as dimensões instrumentais e expressivas devem convergir nas ações do cuidado, ou seja, concebendo o cuidado como integral e construído na relação com o outro - o cliente, logo, dele dependendo o sucesso da ação do enfermeiro. Essas dimensões devem estar articuladas e expressas no cuidado de maneira interdependente, ambas norteadas por princípios éticos de responsabilidade, profissionalismo, zelo e respeito para com o cliente cuidado. Os sujeitos conceberam esses princípios como fundamentais para a realização de qualquer cuidado, tendo em vista, principalmente, que estamos "lidando com vidas":

[...] Tem que ter muita responsabilidade no que está fazendo! Está lidando com vidas! (C19).

[...] Então primeiramente, ela deve gostar do que vai fazer! Deve amar àquela profissão! Porque vai lidar com vida, com ser humano! Então tem que ter respeito! (C7).

Vale dizer que, embora entendendo as dimensões do cuidado de enfermagem, como convergentes e integradas, para efeito didático-ilustrativo, essas dimensões são apresentadas separadamente, de acordo com as suas características.

Dimensão técnico-científica do cuidado de enfermagem

Ao falarem sobre os cuidados de enfermagem, associando a produção artística que desenvolveram junto às entrevistas, os clientes os conceberam como cuidados que requerem preparo e conhecimento científico de quem os executa de modo a embasar suas ações. Suas falas remeteram à necessidade de o profissional ter conhecimento científico; manter-se atualizado; e ter agilidade e destreza de modo a adquirir segurança no fazer:

É! Pra lidar com os clientes! Conhecimento para poder cuidar! [...] É... Porque se a enfermeira não tiver conhecimento de nada, o que ela vai fazer? Não vai saber cuidar... (C8).

[...] Conhecimento que elas têm na matéria, que ela passa! A segurança na matéria! O trabalho que elas fazem é com segurança! Não ficam na incerteza do que vai fazer... Não! São seguras no que estão fazendo! [...] (C2).

A fala de C8 destaca a necessidade de enfermeira embasar suas ações no conhecimento científico e de manter-se atualizada, de modo a cuidar com competência. É oportuno considerar que, além do conhecimento científico há outros atributos inerentes à pessoa que cuida que podem assegurar uma prática de cuidar competente(5). Compartilhamos do entendimento de que o conhecimento advindo da ciência é uma ferramenta importante na construção do cuidado, contudo, há outros elementos que configuram o perfil do indivíduo competente, como a capacidade para inovar e criar associada a outras habilidades cognitivas e psicoafetivas. O discurso de C2 vai além ao referir que o conhecimento científico colabora com a aquisição de segurança no fazer, permitindo maior agilidade e destreza na execução do cuidado.

Cuidados de higiene, conforto e nutrição emergiram como fundamentais para os sujeitos. Ajudar no banho de aspersão ou dar o banho no leito, trocar a fralda, escovar os dentes, cortar as unhas e fazer a barba contribuem com a promoção do conforto por eles desejado, tendo em conta que conforto "[...] é uma experiência pessoal subjetiva que inclui sensações de melhora, segurança/proteção, cuidado, comodidade, liberdade e integração que ocorre quando não existe ameaça imediata à vida e à integridade do ser e quando a pessoa experiencia cuidado (próprio ou profissional) que resulta em restabelecimento das suas forças e poder pessoal possibilitando-lhe enfrentar as situações de saúde-doença visando viver mais saudável"(6).

Ao referirem os cuidados quanto à alimentação, chamaram à atenção alguns elementos essenciais que os qualificam, como a sensibilidade de compreender o que o cliente deseja ou necessita, o discernimento e a observação. Uma série de aspectos inerentes à alimentação do cliente deve ser observada no intento de que os alimentos ingeridos possam cumprir suas finalidades nutricionais: se os clientes estão se alimentando devidamente em qualidade e quantidade, se o alimento está de acordo com as necessidades específicas dos clientes e, se o processo de mastigação está adequado, dentre outros aspectos. É necessário também que se identifique o grau de dependência do cliente no intuito de ajudá-lo nas suas necessidades.

Os cuidados relativos à administração de medicamentos foi outro destaque da fala dos sujeitos, tanto no que diz respeito ao procedimento em si, quanto ao horário das medicações:

O cuidado é ter cuidado na hora de fazer as coisas... Aplicar uma injeção! [...] E sobre o remédio, é dar no horário certo, direito (C3).

Saber ser profissional ao lidar com prazos e prescrições. [...] Então o corpo de enfermagem tem que cumprir os horários! (C14).

A administração de medicamentos é uma das funções assistenciais exercidas pela equipe de enfermagem em decorrência da prescrição médica. É implementada na maior parte das instituições de saúde brasileiras por técnicos e auxiliares de enfermagem sob a supervisão de enfermeiras(7). Embora não seja a responsável pela prescrição medicamentosa, a enfermeira deve conhecer as peculiaridades de todas as suas etapas, com a finalidade de prevenir erros que possam colocar em risco a vida do cliente, desde a indicação, ação, efeitos adversos das substâncias, a técnica de administração e as intervenções necessárias diante de alguma intercorrência. Isso inclui os cuidados necessários à manutenção dos horários na sua administração. Assim, a enfermeira deve proceder de maneira responsável e ética para evitar possíveis iatrogenias.

A verificação da pressão arterial e da temperatura corpórea também esteve presente nas enunciações discursivas dos clientes sobre o cuidado:

Ahh! Toda vez que eu preciso verificar a pressão, a temperatura... Vocês vêm e estendem a mão! [...] (C10).

As mãozinhas são aquelas que trabalham! Que medem a pressão [...] (C11).

Esses cuidados foram articulados à importância das mãos de quem presta o cuidado para a realização dos mesmos, ou seja, trata-se de cuidados técnicos aliados a expressividade da enfermeira. Chamou a atenção também na fala dos clientes o fato de estarem atentos aos cuidados relacionados à biossegurança:

[...] lavar sempre as mãos... [...] No caso das unhas, pra não passar bactérias... (C21).

Primeiro eu citei o recolhimento do lixo como se fosse a limpeza. Todo o recolhimento de lixo hospitalar. Porque qualquer coisinha que caia no chão, a enfermeira que tem que chamar a menina do serviço, né? Colocar o lixo nos seus devidos lugares... (C24).

Nessa figura aqui [referindo-se ao seu Almanaque], os enfermeiros têm que usar essa roupa para se cuidar... [...] Também a máscara deve ser usada [...] (C8).

A equipe de enfermagem está constantemente exposta a uma diversidade de materiais e lixos, especialmente os biológicos. Dada à vulnerabilidade dos profissionais de enfermagem a riscos ocupacionais, se deve adotar medidas adequadas de proteção individual e coletiva, como lavagem e antissepsia das mãos, uso de luva, máscara e jaleco; bem como o acondicionamento adequado de materiais utilizados e do lixo, a fim de não comprometer a biossegurança(8).

Outros cuidados recorrentes nas falas dos sujeitos foram os relativos a situações de emergência nas quais requerem atenção redobrada com o cliente e ações que englobam agilidade e eficiência. Dentre os cuidados de emergência, a massagem foi o de maior destaque:

[...] aqui [referindo-se ao seu Almanaque] ele vai iniciar uma massagem no coração (C7).

Além desses cuidados procedimentais, a observação ou inspeção também teve lugar no discurso dos sujeitos. Trata-se de um cuidado propedêutico de essencial importância para a enfermagem, sendo componente chave de sua organização:

[...] E elas têm aquele cuidado com eles e durante o período ficam observando o curativo, os aparelhos. [...]. Estão sempre perguntando como que estou! (C2).

Quando o paciente chama... A enfermeira tem que vir, ver o que está acontecendo! [...] (C9).

Para realizarmos a inspeção é necessária a utilização do sentido da visão, não só em relação aos segmentos corporais, como também aos aparelhos conectados aos clientes e ao ambiente físico(9). Associada à observação está a habilidade na comunicação. Essa habilidade resulta em uma observação mais apurada, pois colabora com que os clientes expressem o que estão sentindo. Eles assumem desse modo posição de sujeitos ativos no processo de cuidar:

Tem que estar ao lado dele, sempre presente. Orientar como tem que ser direitinho! (C8).

Vocês orientam a gente a comer frutas e legumes. Evitar as comidas que fazem mal (C16).

[...] E o enfermeiro ajuda, vai explicando essas coisinhas! E o enfermeiro explica, mostra [...] (C17).

Denota-se nessas falas que a ação educativa da enfermeira não se restringe aos espaços extra-hospitalares. A prática de educação em saúde é uma função precípua da enfermeira, cuja finalidade é a de promover um cuidado capaz de influenciar o estado de saúde do cliente de maneira positiva, modificando juntamente com ele, hábitos que possam representar riscos à sua saúde.

Dimensão expressiva do cuidado de enfermagem

Para os clientes, os cuidados de enfermagem devem se expressar pela demonstração de carinho, atenção, zelo, amor, paciência. Segundo eles, esses elementos ajudam na recuperação do estado de saúde do cliente, por sua vez, aceleram a sua alta hospitalar:

Primeiramente a pessoa deve ter amor à profissão! Esse é um cuidado básico! [...] Porque vai lidar com vida, com ser humano! Então tem que ter respeito! (C7).

Em primeiro lugar, a gente tem que ter um bom coração e sentir muito amor pelo ser humano para poder tratar deles como eles tratam aqui, [...]. Tem todo o carinho, né? Senão não adianta ela [a enfermeira] se formar! Se não tiver amor pelo outro ser, não adianta, né? (C11).

[...]Esse é um grande cuidado da enfermeira! Nos tratar com carinho, com amor, com afeto (C24).

Na ótica de alguns clientes, o amor à profissão, ao ser humano e à prática de cuidar deve emergir como premissa básica nas ações de cuidado:

[...] Tem... Justamente o remédio, né? Remédio na hora certa... Também tem que ser feito com zelo e amor, é o mais importante! (C8).

Outras falas referentes aos Almanaques produzidos pelos sujeitos também revelaram sentimentos que imprimem expressividade no cuidar:

Primeiro eu coloquei [referindo-se ao seu Almanaque]: Muito amor pelos pacientes. É pelo carinho que as enfermeiras têm, pelo cuidado que elas têm na hora de tirar agulha da gente, perguntando as coisas... [...] (C1).

Então... Eu coloquei [no Almanaque] uma figura de afeto e carinho porque eu acho que ela representa os cuidados de enfermagem, né? [...] Tem que ter esse afeto, esse carinho pelo ser humano! (C5).

Cuidar abrange atenção, zelo e desvelo; é, pois, mais que um ato; uma atitude de ocupação, preocupação, de responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro(10). O cuidado fundamenta-se, portanto, em atitudes que revelam o amor para com o outro. Trata-se de uma relação que produz subjetividades expressas por diferentes sentimentos.

Quanto às diferentes formas de demonstrar esses sentimentos, chamou-nos à atenção o seu caráter lúdico. A produção artística dos sujeitos acerca do que pensam sobre o cuidado de enfermagem no contexto hospitalar revelou que este pode manifestar-se através do sorriso, do toque afetivo, do olhar empático, da conversa atenciosa. Esses elementos, de conteúdo lúdico, proporcionam efeitos terapêuticos positivos no cliente. A expressividade estética por parte da equipe de enfermagem culmina em sensações de alegria, prazer e melhora de seu estado biopsicosocial(11). Proporciona assim, alterações benéficas que auxiliam na restauração da saúde e bem-estar do cliente hospitalizado:

O amor com que o profissional cuida da gente... Que chega, que pergunta, que vê a gente triste e vem conversar com a gente, que vem ver o porquê, conversar com carinho [...] (C1).

[...] quando a gente está no desespero, quase na morte, a gente procura alguém pra nos ajudar a nos consolar. Aí a gente chega no hospital, a gente vai procurar uma enfermeira pra gente conversar, pra desabafar com ela (C6).

[...] a enfermagem é quem auxilia na alimentação, dão atenção também conversando, ajudando no social e psicologicamente o paciente (C13).

O discurso de C1 deixa clara a concepção de que o amor é o elemento gerador de atitudes expressivas. C1 e C13 apresentam em suas falas respectivamente a noção de que, no ato do cuidado, o carinho e a atenção são possibilitados pela conversa. Nesse sentido, a conversa emerge como elemento lúdico do cuidado. O cuidado de enfermagem se configura como um artifício para podermos expressar o afeto que nos é inerente enquanto ser(12). Há várias expressões no discurso de C6 e C13 que representam essa idéia: "ajuda a nos consolar"; "a gente vai ter esperança"; "ajuda socialmente e psicologicamente o paciente".

A partir da relação estabelecida entre enfermeira-cliente através da expressão lúdica, houve o atendimento a algumas necessidades e desejos de C6 e C13 através da troca envolvente entre esses sujeitos. Vejamos nas falas a seguir o sorriso como forma de afetividade:

[...] O sorriso! A pessoa vem com um sorriso pra agradar, pra deixar o paciente mais alegre, mais feliz (C9).

[...] um profissional qualificado do qual um sorriso demonstra amor pelo o que faz e está sempre com um sorriso para com os pacientes e os demais colegas de trabalho [referindo-se à sua produção artística em que escreveu a frase "bom ambiente de trabalho"] (C12).

O sorriso é uma forma de comunicação com o outro que, através da sincronia dos músculos faciais manifesta sentimentos intrínsecos do ser. Para os clientes, a interação lúdica pelo sorriso é uma maneira de proporcionar ao indivíduo, co-partícipe do cuidado, mais alegria, felicidade e conforto. A Teoria do Cuidado Humano traz uma perspectiva ampliada do que seja conforto. Trata-se de um fator que atinge o ambiente externo e interno das pessoas. Para promovê-lo, é necessário um ambiente de cuidado onde se considerem os aspectos físico-mental-sociocultural e espiritual(1). O sorriso seria, portanto, segundo os clientes, uma forma de afetar o ambiente interno do indivíduo capaz de modificar o externo, gerando mudanças favoráveis à sua restauração. Sobre isso, vejamos o que revelou a produção dos Almanaques dos sujeitos:

[...] Essa mão também representa o toque, que deixa a gente mais animada! Dá um alívio na gente! Você enfrenta melhor a doença! (C11).

Isso! Porque aqui, até quando eu estou com dor, as enfermeiras "zoam" tanto que eu não sei se choro ou começo a rir! [risos] Eu acho legal! E quando eu estou muito triste, deprimida...Vocês vêm e estendem a mão de novo! Com brincadeiras, conversa, risadas...Assim! (C10).

[...] Aqui eles vêem que estou chateada... Já começam com piadinha, começo a rir... Aí já melhora tudo! Porque eu acho que enfermagem não é só você dar remédio (C10).

As brincadeiras são artifícios criativos utilizados pela enfermagem para provocar descontração nos clientes hospitalizados, tendo em vista que o hospital se caracteriza como um ambiente frio, impessoal, local de tristeza e sofrimento(13). Assim, a ação criativa e sensível da enfermeira transforma o ambiente do cuidar no hospital, possibilita o rompimento da seriedade exigida dos profissionais e viabiliza a restauração do cliente para um estado de bem-estar(11).

No que tange ao toque como um cuidado expressivo, este possibilita troca de calor humano, o compartilhamento de mundos subjetivos distintos e singulares. O toque ameniza a dor, alivia os sentimentos negativos, culminando num melhor enfrentamento da doença; promove conforto físico e psicológico. É, portanto, um componente do cuidado, eficaz na interação enfermeira-cliente. Alia-se ao toque, a conversa e a escuta atentiva, concebida como uma maneira de demonstrar disponibilidade e interesse em ouvir e perceber o outro. A apreensão e compreensão de sentimentos expressos nessa relação enfermeira-cliente contribuem de forma significativa para escape e alívio de tensões, além de favorecer maior aproximação da enfermeira com o cliente hospitalizado.

Esses dados revelam que a afetividade no cuidado contribui de maneira ímpar no processo de restauração do cliente hospitalizado, consequentemente, favorece a um menor tempo de internação. Nessa perspectiva, "o cuidado prestado por enfermeiro resulta em atitude mental positiva, movimento em direção a recuperação e reabilitação, conforto físico, gratidão, reforço, dignidade e aceitação, confiança e satisfação"(14). Um exemplo que ilustra os efeitos positivos referenciados pelos sujeitos foi sua ação diante sentimentos de tristeza e melancolia, significados em suas falas, como depressão:

[...] Um sorriso amigo quando nós precisamos! Quantas vezes a gente está triste, está chateada e chega perto da enfermeira e explica... Elas procuram conversar e estar sempre sorrindo, pra ver se a gente passa por aquela depressão (C1).

[...] E a depressão, é porque elas conversam muito com os pacientes, porque se o paciente estiver depressivo, elas fazem por onde pra não ficar com depressão! (C2).

Os sujeitos destacaram a necessidade da conversa afetuosa entre enfermeira e cliente, como elemento norteador para o equilíbrio emocional. Ela é capaz de promover a aproximação entre enfermeira e cliente. Transmite afeto, solidariedade e disposição em ajudar o outro, demonstrando interesse da enfermeira pelos sentimentos do cliente. A conversa é, portanto, um cuidado de enfermagem que se expressa ludicamente, trazendo segurança e bem-estar ao cliente, promovendo integração e apoio ao cliente no enfrentamento do processo de hospitalização e da própria doença(11).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da concepção dos clientes hospitalizados sobre o cuidado de enfermagem no hospital, foi possível caracterizar os cuidados de enfermagem como técnico-científicos e expressivos(1). Esses cuidados foram concebidos como fundamentais pelos clientes, sujeitos da pesquisa, e devem estar articulados e se expressarem seguindo condutas éticas de responsabilidade, profissionalismo, zelo e respeito para com o cliente cuidado.

Quanto à valorização desses tipos de cuidado, ao falarem sobre o que pensavam acerca do cuidado de enfermagem, os clientes demonstraram seu entendimento quanto à aliança necessária entre a dimensão técnico-científica e a expressiva do cuidado; afinal, "uma complementa a outra"; sendo considerada como condições que permitem a efetividade no cuidar, acelerando, dessa forma, a alta hospitalar. Embora valorizem um e outro tipo de cuidado, com mais ou menos intensidade, na dependência da situação requerida, os clientes conceberam o cuidado de enfermagem valor tanto técnico-científico, quanto expressivo. Além disso, para que se sintam verdadeiramente cuidados, esperam que a enfermeira possa integrar ambos nas suas ações de cuidado. Seu conhecimento acerca das concepções dos clientes sobre o cuidado colabora na promoção de um ambiente que favoreça a sua restauração por meio da efetividade do cuidado, gerada nessa relação.

Recebido em: 14/09/2009

Aprovado em: 15/03/2010

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  • Endereço da autora:
    Paula Alvarenga de Figueiredo Martins
    Rua Dr. Silvio Bastos Tavares, 348, bloco 120, ap. 304
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    Excerto do relatório final de Iniciação Científica e Trabalho de Conclusão do Curso de Enfermagem apresentado em 2008 à Escola de Enfermagem Anna Nery (EEAN) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Out 2010
    • Data do Fascículo
      Mar 2010

    Histórico

    • Aceito
      15 Mar 2010
    • Recebido
      14 Set 2009
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