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Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e o compromisso social das pesquisas de Enfermagem

No ano 2000, a Organização das Nações Unidas (ONU) reuniu representantes de 191 países, chefes de Estado e de governo, na reunião "Cúpula do Milênio da ONU". Nas discussões foram traçados oito "Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM)" pactuados até 2015. Reflexo da crescente preocupação com a sustentabilidade do planeta e com os graves problemas que afetavam a humanidade, a comunidade internacional estabeleceu objetivos dirigidos a áreas prioritárias para melhorar as condições de saúde, de educação, bem como eliminar a extrema pobreza nas nações. Os oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio são: 1 - Acabar com a fome e miséria; 2 - Educação básica de qualidade para todos; 3 - Igualdade entre sexos e valorização da mulher; 4 - Reduzir a mortalidade infantil; 5 - Melhorar a saúde das gestantes; 6 - Combate a aids, malária e outras doenças; 7 - Qualidade de vida e respeito ao meio ambiente e 8 - Todo mundo trabalhando pelo desenvolvimento.

O compromisso global com os ODM's exige uma atitude de cooperação internacional e, localmente, entre o setor público e privado. A operacionalidade destes objetivos deve se dar por meio de políticas públicas, de reflexões e ações solidárias entre as profissões, integrando setores, em especial o setor da saúde. Assim, os oito objetivos, que se reforçam e se sustentam mutuamente, representam necessidades humanas básicas e visam à garantia aos direitos fundamentais( 1Jiménez LCV, Prada JRR. Los objetivos de desarrollo del milenio (ODM) de las naciones unidas: ¿en dónde estamos y para dónde vamos? fuente de inspiración para priorizar las labores desde la academia. Rev Lasallista Investig. 2011;8(1):126-35. ).

Destaca-se, neste início do ano de 2015, que o Brasil avançou muito com relação ao cumprimento dos ODM's. O desempenho brasileiro deu-se em função da participação social e de uma série de políticas públicas sociais e de saúde, colocadas em curso nos últimos anos, e que trouxeram impactos positivos sobre os mesmos. Há bons indicadores, no entanto ainda há muitos desafios a serem vencidos( 2ODM Brasil [Internet]. Brasília: Presidência da República; c2009-15 [citado 2015 jan. 07]. Disponível em: http://www.odmbrasil.gov.br
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). Para promover a saúde e o bem-estar à população brasileira se reconhece a importância do alcance desses objetivos( 3Laurenti R. Objetivos de desenvolvimento do milênio. Rev Assoc Med Bras. 2005;51(1):3-4. ).

O cumprimento dos ODM's e o investimento de pesquisadores nos temas que envolvem o desenvolvimento mundial, seja na dimensão econômica, social e ambiental, permitem à sociedade civil, setor saúde e Estado empenhar-se na melhoria da qualidade de vida de todos os segmentos sociais e geográficos do país. Sinaliza-se a necessidade de pesquisas que efetivamente gerem conhecimento útil para os atores sociais e o Estado para, assim, alcançar resultados importantes para a sociedade, conferindo uma visão atualizada e integrada do contexto de vida e de saúde das populações( 1Jiménez LCV, Prada JRR. Los objetivos de desarrollo del milenio (ODM) de las naciones unidas: ¿en dónde estamos y para dónde vamos? fuente de inspiración para priorizar las labores desde la academia. Rev Lasallista Investig. 2011;8(1):126-35. ).

Aproxima-se, no ano em curso, o fim do horizonte temporal definido pela ONU para o cumprimento dos ODM's, e a comunidade internacional encontra-se envolvida no processo de avaliação dos progressos, bem como de definição de uma agenda global para o desenvolvimento no período pós-2015. O mundo sofreu evoluções importantes desde o estabelecimento dos ODM's em 2000 e, para ter impacto positivo, a nova agenda terá necessariamente de refletir estas mudanças. Cabe ressaltar que, promissoramente, identifica-se um consenso alargado sobre vários aspectos de base, como a centralidade das pessoas e dos direitos humanos nos processos de desenvolvimento, bem como o imperativo de responder às crescentes desigualdades nas suas variadas dimensões( 4Ferreira PM. A agenda pós-2015 para o desenvolvimento: da redução da pobreza ao desenvolvimento inclusivo? [Internet]. Lisboa: Instituto Marquês de Valle Flôr; 2013 [citado 2015 fev. 5]. Disponível em: www.imvf.org/ficheiros/IMVFPolicyPaper_pos2015.pdf
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).

Essas questões também são pertinentes ao cotidiano do processo de trabalho da Enfermagem, que vem assumindo compromissos e responsabilidades para o desenvolvimento sustentável das populações em todo o mundo. O Conselho Internacional de Enfermeiros, a federação de associações de Enfermagem de mais de 130 países, tem incentivado seus membros a aumentar a contribuição dos enfermeiros para o cumprimento dos ODM's relacionados com a saúde( 5Conselho Internacional de Enfermeiros (CH). Combater a desigualdade: objetivos de desenvolvimento do milénio 8,7,6,5,4,3,2,1 [Internet]. Genebra; 2013[acesso em 2015 fev. 5]. Disponível em: www.ordemenfermeiros.pt/publicacoes/documents/kit_die_2013.pdf
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). É inegável que a participação da Enfermagem, a maior força de trabalho na área da saúde, tem sido vital para o alcance desses objetivos no contexto internacional.

Nesta perspectiva, cabe à Enfermagem contribuir para o desenvolvimento de pesquisas, com abordagens diversificadas, que permitam analisar os avanços e identificar desafios a serem superados/enfrentados para se promover saúde, bem estar e paz das populações. Na mesma medida, os profissionais podem contribuir atuando como agentes multiplicadores do conhecimento e de ações, que minimizem/combatam as desigualdades sociais e de saúde e na promoção dos direitos humanos.

A Enfermagem brasileira, ao assumir seu compromisso enquanto prática humana e social, no cotidiano dos serviços de saúde e espaços sociais, luta para promover a diminuição das desigualdades que dificultam o acesso aos serviços e ao cuidado à saúde de qualidade. Desta forma, entende-se que as temáticas implicadas nos ODM's fazem parte da prática diária das/os enfermeiras/os e, consequentemente, refletem-se em sua produção científica. Espera-se que na educação/formação, na atenção/cuidado, na gestão e na pesquisa, as/os enfermeiras/os empreendam esforços para atender às populações vulneráveis e excluídas visando garantir a integralidade do cuidado( 6Mendes IAC. A saúde no Brasil e América Latina: as metas do milênio da ONU e o papel da enfermagem. Rev Latino-Am Enfermagem. 2004;12(6):845-50. ).

Frente a esse contexto, questiona-se: Como a Enfermagem brasileira tem contribuído para o cumprimento dos ODM's? Um breve levantamento das produções científicas na Revista Gaúcha de Enfermagem (RGE), no período de 2000 a 2014, relacionados direta e indiretamente com os ODM's, mostrou a existência 100 publicações. A busca foi operacionalizada a partir da leitura do título e resumo de todos os manuscritos publicados no período. Após, houve categorização dos selecionados conforme os oito ODM's.

A partir deste levantamento, constatou-se que houve um maior investimento em produções científicas relacionadas ao objetivo nº 6 - Combater a aids, a malária e outras doenças (n =31). No que diz respeito à saúde materna e infantil, contabilizou-se um total de 52 manuscritos, sendo que 29 estão relacionados ao objetivo nº 4 - Reduzir a mortalidade infantil e 23, ao nº 5 - Melhorar a saúde das gestantes.

Sobre os demais ODM's houve um número menor de publicações: nº 3 - Promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres (n=9), nº 7 - Garantir qualidade de vida e respeito ao meio ambiente (n=5) e nº 8 - Estabelecer parcerias para o desenvolvimento (n=3). Os objetivos nº 1 - Acabar com a fome e a miséria e nº 2 - Oferecer educação básica de qualidade para todos não foram contemplados em nenhuma publicação.

Constatou-se, nesta breve análise da produção científica divulgada pela RGE, a necessidade de um direcionamento de pesquisas em Enfermagem para colaboração na melhoria dos indicadores epidemiológicos e sociais dos ODM's. Revela-se, também, a necessidade de contemplar áreas temáticas pouco ou não exploradas, e que se constituem em lacunas de conhecimento em Enfermagem, como as estratégias de combate a fome e miséria e promoção da educação básica de qualidade.

A RGE, no sentido de contribuir para a divulgação do conhecimento na área da saúde, e considerando o compromisso social da Enfermagem na colaboração do cumprimento dos ODM's, acordados internacionalmente em 2000, e prestes a serem atualizados para os próximos 15 anos, está preparando uma Edição Especial temática com trabalhos que revelem as contribuições da Disciplina e de seus profissionais até o momento. Para tanto, convida pesquisadoras/es a submeterem trabalhos relacionados aos ODM's até o dia 30 de junho de 2015 para publicações no volume 36, no 4, de dezembro de 2015.

REFERENCES

  • 1
    Jiménez LCV, Prada JRR. Los objetivos de desarrollo del milenio (ODM) de las naciones unidas: ¿en dónde estamos y para dónde vamos? fuente de inspiración para priorizar las labores desde la academia. Rev Lasallista Investig. 2011;8(1):126-35.
  • 2
    ODM Brasil [Internet]. Brasília: Presidência da República; c2009-15 [citado 2015 jan. 07]. Disponível em: http://www.odmbrasil.gov.br
    » http://www.odmbrasil.gov.br
  • 3
    Laurenti R. Objetivos de desenvolvimento do milênio. Rev Assoc Med Bras. 2005;51(1):3-4.
  • 4
    Ferreira PM. A agenda pós-2015 para o desenvolvimento: da redução da pobreza ao desenvolvimento inclusivo? [Internet]. Lisboa: Instituto Marquês de Valle Flôr; 2013 [citado 2015 fev. 5]. Disponível em: www.imvf.org/ficheiros/IMVFPolicyPaper_pos2015.pdf
    » www.imvf.org/ficheiros/IMVFPolicyPaper_pos2015.pdf
  • 5
    Conselho Internacional de Enfermeiros (CH). Combater a desigualdade: objetivos de desenvolvimento do milénio 8,7,6,5,4,3,2,1 [Internet]. Genebra; 2013[acesso em 2015 fev. 5]. Disponível em: www.ordemenfermeiros.pt/publicacoes/documents/kit_die_2013.pdf
    » www.ordemenfermeiros.pt/publicacoes/documents/kit_die_2013.pdf
  • 6
    Mendes IAC. A saúde no Brasil e América Latina: as metas do milênio da ONU e o papel da enfermagem. Rev Latino-Am Enfermagem. 2004;12(6):845-50.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2015
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