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Percepções da puérpera de alto risco acerca do ambiente hospitalar à luz de Florence Nightingale

Resumos

Objetivo:

compreender as percepções das puérperas de alto risco acerca do ambiente hospitalar sob a luz de Florence Nightingale. O puerpério de alto risco é caracterizado pelo período em que a mulher no pós-parto tem seu recém-nascido internado na unidade neonatal e necessita acompanhá-lo, vivendo momentos de transformações.

Métodos:

estudo narrativo com abordagem qualitativa, sustentado em Florence Nightingale, realizado em uma instituição pública do sul do Brasil, de janeiro a março de 2010. Sete puérperas acima de 18 anos com recém-nascido internado na unidade neonatal foram sujeitos da pesquisa.

Resultados:

as narrativas contextualizadas no hospital, ambiente de cuidado em que vivenciaram essa fase particular de suas vidas, denotam a busca de laços e apoio entre as puérperas de alto risco.

Conclusões:

o desafio de conviver em ambiente desconhecido por tempo indeterminado, confiando seu filho aos profissionais enquanto está longe dos demais familiares, destaca as necessidades de cuidados de enfermagem nessa fase.

Período pós-parto; Cuidados de enfermagem; Unidades de terapia intensiva neonatal; Meio ambiente


Objective:

to understand the perceptions of high-risk puerperal women about the hospital environment based on Florence Nightingale's theory. High-risk postpartum period is the period of time when post-partum women care for their babies in the neonatal ICU, and experience high stress levels.

Methods:

it is a qualitative study with narrative approach based on Florence Nightingale's theory, conducted at a public institution in southern Brazil, from January to March 2010. Seven mothers over 18 years with newborns admitted to the neonatal ICU were the research subjects.

Results:

the contextualization of their narratives, the caring environment in which they experienced this particular stage in their lives, indicates that high-risk puerperal women seek ties and support.

Conclusions:

the challenge of spending an indefinite period of time in a strange environment, away from home, with their babies under the care of health professionals, while apart from their relatives, highlights the need for nursing care during this stage.

Postpartum period; Nursing care; Intensive care units, neonatal; Environment


Objetivo:

comprender las percepciones de las puérperas de alto riesgo sobre el ambiente del hospital a la luz de Florence Nightingale. El puerperio de alto riesgo es cuando la mujer tiene su bebé internado en la unidad neonatal en el posparto, acompañándolo y viviendo momentos de aprensión.

Métodos:

estudio narrativo con enfoque cualitativo, basado en Florence Nightingale, realizado en una institución pública del sur de Brasil, de enero a marzo 2010. Siete puérperas mayores de 18 años con los recién nacidos ingresados en la unidad neonatal fueron los sujetos de investigación.

Resultados:

las narrativas contextualizadas en el hospital, ambiente del cuidado en el que experimentó esta etapa particular de su vida, destacan como positiva la búsqueda por lazos y apoyo entre esas puérperas.

Conclusiones:

el desafío de convivir en un ambiente desconocido por tiempo indeterminado, confiando su hijo a los profesionales mientras están lejos de sus familiares, lo que apunta para las necesidades de cuidados de enfermería en este periodo.

Periodo posparto; Atención de enfermería; Unidades de cuidado intensivo neonatal; Ambiente


INTRODUÇÃO

A puérpera torna-se acompanhante na Unidade Neonatal durante a hospitalização do recém-nascido, entretanto, esta mulher necessita de um cuidado específico, pois vivencia o processo restaurador do pós-parto. Ao perceber a importância deste momento na vida e saúde da mulher, este estudo o destaca, denominando-o Puerpério de Alto Risco. Ao vivenciá-lo no hospital, a mulher se encontra distante de seus familiares, cabendo à equipe de enfermagem prestar um cuidado em que o ambiente se torne confortável e propício para sua recuperação.

Conforme o Ministério da Saúde é considerado puerpério de alto risco "as situações nas quais a saúde da mulher apresenta complicações por doenças preexistentes ou intercorrências [...] no puerpério, geradas tanto por fatores orgânicos quanto por fatores socioeconômicos e demográficos desfavoráveis"(11. Ministério da Saúde (BR). Portaria 1020 de 29 de maio de 2013. Institui as diretrizes para a organização da Atenção à Saúde na Gestação de Alto Risco e define os critérios para a implantação e habilitação dos serviços de referência à Atenção à Saúde na Gestação de Alto Risco, incluída a Casa de Gestante, Bebê e Puérpera (CGBP), em conformidade com a Rede Cegonha. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil. 2013 maio 31;150(103 Seção 1):72-5.). O conceito deste estudo propõe ampliar o olhar à puérpera de alto risco, pois "uma mulher, mesmo não tendo vivenciado uma gestação de alto risco, pode vir a vivenciar um Puerpério de Alto Risco, caso suas necessidades de cuidado não sejam atendidas"(22. Kunzler IM. O cuidado às mulheres no puerpério de alto-risco: aplicando o modelo de cuidado de Carraro fundamentado em Florence Nightingale [dissertação]. Florianópolis (SC): Universidade Federal de Santa Catarina; 2006.). Desta forma, neste estudo, o puerpério de alto risco consiste no período pós-parto que ocorre concomitante a internação neonatal do recém-nascido e que podem influenciar o poder vital da mulher neste processo restaurador inerente ao puerpério.

No puerpério de alto risco a alta materna é um momento crítico. Esta representa uma situação de dor pela separação do filho que ainda precisa permanecer internado, e o sonho de voltar para a casa com este idealizado e saudável, é novamente adiado(33. Oliveira K, Veronez M, Higarashi IH, Corrêa DAM. Vivências de familiares no processo de nascimento e internação de seus filhos em UTI neonatal. Esc Anna Nery. 2013;17(1):46-53.). Percebe-se que a enfermagem, como parte da equipe de saúde no hospital, vem atuando de forma limitada em suas ações de cuidado direto às puérperas(44. Corrêa ACP, Arruda TM, Mandú ENT, Teixeira RC, Arantes RB. Humanização da assistência à puérpera: concepções de profissionais de enfermagem de um hospital público. Cienc Cuid Saúde. 2011;9(4):728-35.).

O hospital, especificamente a unidade neonatal, é um ambiente propício ao estresse e à ansiedade, ocorre então a necessidade de humanização do cuidado de enfermagem junto a mães, pais e suas famílias, através de uma comunicação eficaz, capaz de gerar um vínculo de confiança(55. Salimena AMM, de Paiva Oliveira C, Buzatti JR, Moreira AMF, Amorim TV. A comunicação entre enfermeiros e pais de recém-nascidos em unidade de terapia intensiva neonatal. HU Rev. 2013;38(1):79-83.). O profissional de saúde deve se mostrar presente e auxiliar a mulher a encontrar seu lugar em meio a este novo ambiente, facilitando o processo de adaptação(66. Rocha SS, Olivindo DDF, Sá CN, Fonseca LF. Percepção da enfermagem em relação às mães no cuidado de recém-nascidos na unidade de terapia intensiva neonatal. Enferm Foco. 2013;4(1):45-8.).

Utilizou-se o referencial teórico de Florence Nightingale para explorar o marco conceitual que definiu os metaparadigmas de enfermagem, dentre eles o ambiente. O ambiente interno do ser humano está relacionado aos aspectos psicológicos, o que pode ser afetado pelo ambiente externo, presentes na iluminação, aquecimento, ruídos, odores, entre outros. O descuidado da enfermagem em relação ao ambiente externo, afeta o ambiente interno do paciente, o que está diretamente ligado à piora de seu quadro de saúde, impactando em seu poder vital. Assim como refletia no impacto das emoções, desgastes emocionais frente ao estresse da doença e da internação, na recuperação do paciente, devendo a enfermagem atentar-se a estes aspectos(77. Nightingale F. Notas sobre enfermagem: o que é e o que não é. São Paulo: Cortez; 1989.).

O hospital é um ambiente que pode causar estranheza à puérpera de alto risco, torná-lo mais acolhedor faz parte do cuidado da enfermagem. Receber este cuidado pode influenciar no fortalecimento do seu poder vital, porém, quando a mulher se torna apenas a acompanhante do recém-nascido sendo esquecidas suas necessidades de cuidado, seu poder vital e seu processo restaurador são abalados.

Desta forma, é importante lançar mão de subsídios, buscando a partir da mobilização do ambiente externo influenciar positivamente o ambiente interno da mulher(77. Nightingale F. Notas sobre enfermagem: o que é e o que não é. São Paulo: Cortez; 1989.). Pensar na puérpera de alto risco e proporcionar um local acolhedor dentro do hospital, em que ela possa descansar e se recuperar ao mesmo tempo em que cuida de seu recém-nascido internado, configuram o cuidado de enfermagem e da equipe multidisciplinar, auxiliando em seu processo restaurador.

Ao perceber a relação do ambiente hospitalar com o puerpério de alto risco quando este influencia no processo restaurador em que a mulher está vivenciando, destaca-se a importância da interação entre a enfermagem e a puérpera de alto risco, estabelecendo um ambiente de cuidado que auxilie neste momento delicado da internação neonatal. Tais reflexões convieram como incentivo ao desenvolvimento deste estudo, com a seguinte questão norteadora: Como a puérpera de alto risco percebe o ambiente hospitalar durante a internação neonatal do recém-nascido? Este estudo objetiva compreender as percepções das puérperas de alto risco acerca do ambiente hospitalar sob a luz de Florence Nightingale.

MÉTODO

Estudo narrativo com abordagem qualitativa(88. Jovchelovitch S, Bauer MW. Entrevista narrativa. In: Bauer MW, Gaskell G, organizadores. Pesquisa qualitativa com texto e imagem: um manual prático. 9ª ed. Petrópolis: Vozes; 2011. p. 90-113.), realizado em uma instituição pública que atende 100% ao Sistema Único de Saúde (SUS), da Região Sul do Brasil, no período de janeiro a março de 2010, derivado de uma tese de doutorado em enfermagem(99. Frello AT. Puerpério de alto risco e cuidado de enfermagem: influência no poder vital das mulheres [tese]. Florianópolis (SC): Universidade Federal de Santa Catarina; 2013.).

O cenário deste estudo constitui-se no "alojamento materno", o qual refere-se a um quarto composto por quatro leitos e um banheiro, destinado a acolher mães que estão com seus filhos internados na unidade de neonatologia. Este espaço situa-se no andar da maternidade do hospital estudado junto à Unidade Neonatal e outros setores de Serviço Materno-Infantil.

Foram sujeitos da pesquisa sete puérperas que atenderam aos critérios de inclusão: ter acima de 18 anos e estar com recém-nascido na Unidade Neonatal e aos critérios de exclusão: menor de 18 anos e o recém-nascido não estar internado na Unidade Neonatal. Os dados foram coletados por meio da entrevista narrativa, gravadas e, então, transcritas. As questões geradoras foram: "Conte-me a sua história desde o parto até o momento e como se sentiu durante o trabalho de parto e parto; Como percebe o cuidado de enfermagem com você?" A coleta de dados ocorreu em uma sala reservada próxima a UTI Neonatal e encerrou-se por meio de termos e palavras repetidas nas narrativas das puérperas(88. Jovchelovitch S, Bauer MW. Entrevista narrativa. In: Bauer MW, Gaskell G, organizadores. Pesquisa qualitativa com texto e imagem: um manual prático. 9ª ed. Petrópolis: Vozes; 2011. p. 90-113.).

A entrevista narrativa, aquela que permite contar histórias, foi o método de coleta de dados; seguiu os passos: "Preparação; Iniciação; Narração Central; Fase de perguntas e Fala Conclusiva"(88. Jovchelovitch S, Bauer MW. Entrevista narrativa. In: Bauer MW, Gaskell G, organizadores. Pesquisa qualitativa com texto e imagem: um manual prático. 9ª ed. Petrópolis: Vozes; 2011. p. 90-113.).

O tratamento e análise dos dados foram baseadas em Fritz Schütze, que, além de apresentar a proposta da entrevista narrativa, aponta seis fases para a sistematização dos dados(88. Jovchelovitch S, Bauer MW. Entrevista narrativa. In: Bauer MW, Gaskell G, organizadores. Pesquisa qualitativa com texto e imagem: um manual prático. 9ª ed. Petrópolis: Vozes; 2011. p. 90-113.). São estas: 1ª fase: Transcrição detalhada do material verbal. 2ª fase: Divisão do texto em material indexado (tem referência concreta a "quem fez o quê, quando, onde e por quê") e não-indexado (expressam valores, juízos e toda forma de sabedoria de vida). 3ª fase: Uso dos componentes indexados do texto para analisar o ordenamento dos acontecimentos para cada indivíduo, ou seja, as trajetórias. 4ª fase: As dimensões não-indexadas do texto são investigadas como "análise do conhecimento". 5ª fase: Agrupamento e comparação entre as trajetórias individuais. 6ª fase: Comparação de casos dentro do contexto com a identificação das trajetórias individuais semelhanças são estabelecidas para a determinação das trajetórias coletivas(88. Jovchelovitch S, Bauer MW. Entrevista narrativa. In: Bauer MW, Gaskell G, organizadores. Pesquisa qualitativa com texto e imagem: um manual prático. 9ª ed. Petrópolis: Vozes; 2011. p. 90-113.,1010. Schütze F. Die Technik des narrativen interviews in interaktionsfeldstudien: dargestellt an einem projekt zur erforschung von kommunalen machtstrukturen. Bielefeld: Universität Bielefeld, Facultät für Sociologie; 1977. [manuscrito]).

Em relação aos aspectos éticos, antes do início do estudo foram obtidos o consentimento formal da instituição participante e a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), sob nº 1132/2010. Todas as participantes foram esclarecidas sobre a pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Para preservação da identidade dos sujeitos, utilizou-se a letra P de puérpera, seguida de números de um a sete.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A análise deste manuscrito foi desenvolvida a partir da fase de análise das trajetórias individuais e coletivas.

As mulheres deste estudo, ao depararem-se com a internação neonatal, sofreram impacto em suas vidas, mas procuraram enfrentá-lo, apesar das dificuldades relatadas. Lidar com a prematuridade de um filho influenciou as puérperas de alto risco, despertando a preocupação com o futuro. Para P3, observar a expressão de dor do recém-nascido na unidade neonatal fez com que ela tivesse sentimentos negativos:

No segundo dia dava pra ver que ela estava com expressão de dor, eu sentia que ela estava com dor, eu fiquei bem triste naquele segundo dia, e ela não parava, estava agitada, ela se mexia muito, se debatia. [...] ai eu fiquei com medo nesse segundo dia que ela não fosse aguentar [...]. (P3)

A puérpera de alto risco necessita da orientação da enfermagem sobre o ambiente da unidade neonatal, os tratamentos realizados e as reações do recém-nascido transformando o desconhecido em familiar com o objetivo de diminuir a ansiedade frente a hospitalização.

Quando o recém-nascido é separado dos pais causa impacto e dor, principalmente, para a mãe que proveu tanto carinho durante toda a gestação, fazendo com que ela vivenciasse momentos de dificuldades diante da situação de risco do recém-nascido(1111. Sá RC, Costa LMFP, Sá FE. Vivência materna com filhos prematuros em uma unidade de tratamento intensivo neonatal. Rev Bras Promoç Saúde. 2012;25(2):2583-9.). Compreende-se que um dos aspectos mais estressantes na internação neonatal para a mulher está relacionado ao sentimento de impotência ao perceber a dor do recém-nascido(1212. Woodward LJ, Bora S, Clark CAC, Montgomery-Hönger A, Pritchard VE, Spencer C, et al. Very preterm birth: maternal experiences of the neonatal intensive care environment. J Perinatol. 2014;34(7):555-61.-1313. Lasiuk GC, Comeau T, Newburn-Cook C. Unexpected: an interpretive description of parental traumas' associated with preterm birth. BMC Pregnancy Childbirth. 2013; 13(Suppl 1):S13.). Estas experiências traumáticas podem interferir negativamente na forma da puérpera em se relacionar com seu filho e na formação do vínculo(1414. Coppola G, Cassibba R. Mothers' social behaviours in the NICU during newborns' hospitalisation: an observational approach. J Reprod Infant Psychol. 2010 May;28(2):200-11.).

É importante ressaltar a preocupação de Nightingale com os desgastes emocionais relacionados ao estresse da doença e da internação, os quais podem impactar negativamente no poder vital(77. Nightingale F. Notas sobre enfermagem: o que é e o que não é. São Paulo: Cortez; 1989.).

Acompanhar a internação de seu filho recém-nascido e passar longo tempo distante de sua casa e do restante da sua família causam sentimentos conflitantes nas mulheres entrevistadas:

[...] é bem difícil, bem estressante, porque a vontade não é de ficar, é de pegar a neném e fugir, ir pra casa. (P2)

Daí de imediato a enfermeira já falou pra mim: "ó tem o [Alojamento Materno], se não tiver vaga a gente vai procurar a mãe canguru ou qualquer outro lugar que dê para colocar você", bem tranquilo o que deixa a gente confortável também, meu Deus do céu, eu não deixaria meu filho, mas nem que tivesse que fazer plantão do lado de fora do hospital, dormir sentada nas cadeiras eu dormiria. Isso é uma coisa que conforta saber que posso ficar o tempo todo pertinho dele, me deixa bem tranquila. (P1)

A mulher necessita se afastar dos demais membros da família para permanecer no alojamento materno durante a hospitalização do filho e, por isso, experimenta sentimentos ambíguos. Por um lado, decide permanecer no alojamento materno, por outro, anseia voltar para casa e retomar a rotina(1515. Dittz ES, Mota JAC, Sena RR. O cotidiano no alojamento materno, das mães de crianças internadas em uma unidade de terapia intensiva neonatal. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2008 jan./mar.;8(1):75-81.). Florence percebia o ser humano como possuidor de um poder vital influenciável por aspectos como: ventilação, ruídos, iluminação, limpeza, aeração. Mas, ela vai além do ambiente físico ao preocupar-se com a qualidade do cuidado realizado ao ser humano, apontando suas necessidades psicossociais, pois a Enfermagem, ao cuidar desse ser humano precisa mantê-lo "nas melhores condições possíveis a fim de que a natureza possa atuar sobre ele"(7:146). Desta forma o cuidado necessário à puérpera envolve prover um local para estadia durante a hospitalização, dar suporte ao sofrimento relacionado à situação clínica do seu filho e à distância da família, entre outros conforme a necessidade de cada mulher.

As puérperas de alto risco demonstraram nas narrativas que o cuidado da equipe de enfermagem com o recém-nascido lhes trouxe sentimentos positivos, transformando-se em momentos de cuidado e conforto que fortaleceram seu Poder Vital:

Meu Deus do céu me deixa bem tranquila, bem feliz, eu sei que se eu tiver que me ausentar daqui por umas horas eu sei que vai estar bem cuidado. Então me conforta saber que ele está bem. (P1)

São tudo bem gente boa, bem atenciosas, cuidam bem dos recém-nascidos [...] são tudo bem atenciosas cuidam bem das crianças. Tanto na limpeza como na alimentação, bem zelosas. (P2)

No caso da puérpera de alto risco, saber que seu filho está sendo bem cuidado trata-se de um cuidado indireto à mãe a partir da relação de confiança estabelecida com a enfermagem. Nightingale afirmava que "(...) há experiência universal sobre a enorme importância da boa assistência de enfermagem na determinação das consequências da doença"(7:15).

A internação de um filho em uma Unidade Neonatal é uma experiência delicada e desafiadora para as mães e as relações estabelecidas com a equipe de enfermagem influenciam na vivência da mulher junto ao seu recém-nascido(1616. Frello AT, Carraro TE. Enfermagem e a relação com as mães de neonatos em unidade de terapia intensiva neonatal. Rev Bras Enferm. 2012;65(3):514-21.). Percebe-se que a confiança das mães no cuidado prestado pela equipe de enfermagem produz a satisfação em relação ao cuidado com o recém-nascido(1717. Schmidt K, Mello F, Rosseto E, Souza S. Avaliação da assistência de enfermagem em unidade neonatal na perspectiva dos pais. Cogitare Enferm. 2010;15(3):446-60.).

O apoio da equipe multiprofissional durante todo período de internação, trabalho de parto e puerpério foi destacado nas falas por estar presente nos momentos difíceis, apoiando quando necessitaram:

A gente teve bastante apoio da psicóloga ela conversava muito, as estagiárias também, sempre estavam no quarto e assim bastante apoio mesmo, até no dia da cesárea eu estava chorando bem preocupada aí a psicóloga falou muito como era uma cesariana porque até o momento não tinha passado por essa experiência, só tinha parto normal e muito medo por causa da pressão. (P4)

Mesmo eu estando só cuidando do meu bebê na UTI Neo, a psicóloga, a assistente social eu não tinha o remédio da pressão que é comprado, ela comprou pra mim, me ajudou muito, muito querida ela também (P7)

A mulher, enquanto ser humano que vivencia o puerpério de alto risco encontra-se em um limiar entre a saúde e a doença, já que o mesmo não indica a presença de doença. A puérpera vive um processo restaurador, pois se encontra em um momento delicado, durante o qual seu organismo está se recuperando das transformações instauradas ao longo do processo gravídico puerperal e também preocupa-se com o bebê na unidade neonatal, o que requer cuidados de enfermagem.

O apoio multiprofissional é importante em situação de internação neonatal, a fim de proporcionar atenção integral à família(1818. Lopes FN, Fialho FA, Dias IMAV, Almeida MB. A vivência do enfermeiro diante da privação materna em unidade de terapia intensiva neonatal. HU Rev. 2011;37(1):39-46.). O cuidar de forma humanizada tão premente durante todos os momentos desde o trabalho de parto, o parto e o puerpério para as mulheres neste cenário, envolve "o olhar holístico, o acolhimento, a relação de vínculo e a comunicação"(19:123).

Nightingale afirmava que: "O processo restaurador que a natureza instituiu, ao qual chamamos doença, tem sido retardado por falta de conhecimentos ou de atenção a um ou a todos esses fatores; instalam-se então a dor e o sofrimento, ou ocorre a interrupção de todo o processo"(7:14). O conhecimento sobre este processo e os fatores envolvidos como o ar puro, claridade, aquecimento, silêncio, limpeza e alimentação, deve ser compartilhada com a equipe de saúde para todos os profissionais utilizem meios que fortaleçam o poder vital do ser humano.

A convivência com as outras mães passando pela mesma situação que elas, o Puerpério de Alto Risco, é avaliada como positiva nas falas:

[...] já ser conhecidas das meninas que estava no meu quarto e foi para o [Alojamento Materno] também pegou aquela amizade aquele vínculo, uma sempre conversando com a outra, dando força, a rotina de ir lá tirar o leite, as horas passavam mais rapidinho. (P4)

Foi bom, foi bem legal pra mim, fiz amizades ali dentro, foi bem legal. (P6)

A permanência no alojamento materno faz a mulher identificar-se com o sofrimento da outra mãe, uma vez que compartilham a situação de hospitalização de seus filhos no período neonatal. Dessa forma, por conhecerem a dimensão do sofrimento vivido, criam uma rede de solidariedade e amizade, motivadas pelas necessidades e experiências em comum(1515. Dittz ES, Mota JAC, Sena RR. O cotidiano no alojamento materno, das mães de crianças internadas em uma unidade de terapia intensiva neonatal. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2008 jan./mar.;8(1):75-81.).

Nightingale destacava que o doente muitas vezes prefere conversar com outra pessoa hospitalizada que compreende seus pensamentos sem julgar(77. Nightingale F. Notas sobre enfermagem: o que é e o que não é. São Paulo: Cortez; 1989.). A puérpera de alto risco encontra eco de seus sentimentos e vivências em outras mães que estão na mesma situação que ela e encontra apoio mútuo em meio da hospitalização neonatal.

As narrativas das entrevistadas expressam que longe do restante da família vivenciaram um processo de restauração após o parto que somado ao estresse da internação do recém-nascido, ocasionaram um quadro desgastante a estas. A partir do cuidado de enfermagem, da equipe multiprofissional e o apoio das outras mulheres em situação semelhante, estas mulheres buscaram fortalecer-se em seu puerpério de alto risco.

O ambiente no qual a mulher que vivencia o puerpério de alto risco passa a maior parte do tempo é o hospital, ao acompanhar a internação de seu filho. Os ambientes em que a puérpera de alto risco transita e convive são o alojamento conjunto, o alojamento materno, a unidade neonatal e as dependências do método Canguru. O alojamento materno foi criado para facilitar e incentivar a presença da mãe junto ao filho, mesmo estando ele sob cuidados intensivos provendo a ela condições de repouso e alimentação(1515. Dittz ES, Mota JAC, Sena RR. O cotidiano no alojamento materno, das mães de crianças internadas em uma unidade de terapia intensiva neonatal. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2008 jan./mar.;8(1):75-81.). As dependências do método Mãe Canguru é um local em que se pratica uma estratégia de cuidado neonatal, a qual implica contato pele a pele precoce entre mãe e bebê(44. Corrêa ACP, Arruda TM, Mandú ENT, Teixeira RC, Arantes RB. Humanização da assistência à puérpera: concepções de profissionais de enfermagem de um hospital público. Cienc Cuid Saúde. 2011;9(4):728-35.).

As mulheres entrevistadas compartilharam suas narrativas discorrendo sobre seus sentimentos em relação a esse momento de suas vidas, desde a relação com a enfermagem, com as puérperas que passavam pela mesma experiência, sobre a condição do recém-nascido e como lidaram com a internação e separação da família; tudo isso contextualizado no hospital, ambiente de cuidado em que vivenciaram esta fase particular de suas vidas.

A forma de perceber a internação e evolução do recém-nascido influencia na concepção de ambiente para cada mulher. Para P6, cada melhora no quadro de seu filho é um passo para alta, representada pela transição entre as acomodações hospitalares:

Sair do quarto onde eu estava internada já foi um passo a frente, aí vim para o [alojamento materno] mais um, aí agora vim aqui pro Canguru mais um passo. (P6)

Para P5, o ambiente hospitalar é comparado a um confinamento devido ao longo período de internação na gestação, seguido do alojamento materno para acompanhar a internação do recém-nascido na Unidade Neonatal e, por último, o método Canguru:

Bate até uma depressão assim, já tem aquela coisa de hospital, ficar vinte e poucos dias internada no alojamento sem sair pra nada e tu ficar confinada de novo assim é complicado, ainda [...] mas dou graças a Deus que está acabando. (P5)

Enquanto para P7, o ambiente hospitalar se assemelha ao seu lar, para P2, é difícil ficar longe de sua casa:

[...] é como se estivesse em casa ali no [Alojamento Materno], mais segura. (P7)

Foi péssimo, a gente planeja tanta coisa, ter e depois ir pra casa, é bem estressante, fica com dois corações divididos lá em casa e aqui... E aqui a gente não se sente a vontade porque não é a casa da gente... é bem difícil. (P2)

Na fala de P3, o hospital foi um local importante para orientações sobre a amamentação:

E eu fiquei 4 dias no [Alojamento Materno] era mais fácil eu tirava leite, tive dificuldade no começo, mandaram eu tomar água, tomo muita água muito suco e o peito empedrou, doía muito, era difícil mas a [técnica de enfermagem] é muito atenciosa, jeitosa, no segundo dia peguei jeito, aprendi a tirar, estou tirando e guardando no lactário. (P3)

O ambiente hospitalar, traduzido como o alojamento materno, é identificado nas narrativas de P1 e P7 como um local que provê estrutura alimentar e física necessárias:

[...] está sendo ótimo o tratamento ali... tem geladeira tem ar condicionado, ontem deu calor o ar condicionado ligado, tem geladeirinha, dá pra trazer umas frutinhas alguma coisa pra colocar na geladeira, tem café da manhã, banho tem toalha tem tudo quer mais o quê? Quer um SPA também ali? Não, pra mim está ótimo. (P1)

É muito bom, me tratam muito bem ali. Cafezinho, almoço, café da tarde, tudo muito bom. (P7)

Cada mulher entrevistada vivenciou a internação do filho na unidade neonatal durante o puerpério de alto risco com nuances particulares, já que se constituem em sujeitos únicos. Porém, ao analisar as narrativas e comparar os casos dentro do contexto do ambiente hospitalar, percebe-se que elas compartilham sentimentos e percepções como temor pela sua saúde e da criança, saudade da família e de sua casa, felicidade em poder estar próxima ao recém-nascido em todos os momentos e com a estrutura hospitalar à sua disposição.

Destaca-se a importância do cuidado com o ambiente externo, arejamento e aquecimento, condições sanitárias, iluminação e limpeza, assim como com o ambiente interno quando discorre sobre o efeito do corpo sobre a mente(77. Nightingale F. Notas sobre enfermagem: o que é e o que não é. São Paulo: Cortez; 1989.). Desenvolver uma cultura organizacional no ambiente hospitalar que apoia o relacionamento entre a mulher, sua família e o recém-nascido hospitalizado envolvendo a equipe de saúde é essencial para atender as necessidades físicas e emocionais destes seres humanos(2020. Flacking R, Lehtonen L, Thomson G, Axelin A, Ahlqvist S, Moran VH, et al. Closeness and separation in neonatal intensive care. Acta Pædiatrica. 2012;101(10):1032-7.).

A experiência do puerpério de alto risco tem impacto sob as vidas das mulheres, gerando sentimentos antagônicos. Atribuem ao ambiente hospitalar possibilidades de melhora, assim como a incerteza da alta; a evolução do alojamento conjunto, ao materno e ao método Canguru como um progresso, ou como um confinamento que lhe priva do contato com os demais membros de sua família e de retomar sua rotina anterior à gravidez.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Destaca-se que o ambiente de cuidado entendido neste estudo como o ambiente hospitalar em que a puérpera de alto risco vive esta fase, demonstrou-se como um espaço sem cuidado específico para esta mulher. É premente que se compreenda o processo restaurador vivenciado e sua influência no poder vital da puérpera de forma que os cuidados de enfermagem no puerpério de alto risco possam intervir neste ambiente e torná-lo cuidativo.

Quanto às limitações deste estudo, destaca-se a realização da pesquisa em um único hospital e das entrevistas em ambiente hospitalar, o que pode inibir a mulher em expressar suas opiniões por receio de influenciar no cuidado ao seu filho e a ela mesma.

A partir do referencial teórico de Florence Nightingale compreende-se que como ser humano complexo e único, possuidor de um poder vital, a mulher que vivencia o puerpério de alto risco encontra-se em um processo restaurador. Neste contexto, a enfermagem precisa voltar seu olhar à puérpera, considerando-a em sua singularidade e oferecer-lhe cuidados de enfermagem efetivos visando fortalecer seu poder vital. Ao ponderar que tanto o ambiente externo quanto o interno influenciam a composição de um ambiente de cuidado para a mulher, a enfermagem estará ampliando seus cuidados para todos os âmbitos que envolvem o puerpério de alto risco.

REFERENCES

  • 1
    Ministério da Saúde (BR). Portaria 1020 de 29 de maio de 2013. Institui as diretrizes para a organização da Atenção à Saúde na Gestação de Alto Risco e define os critérios para a implantação e habilitação dos serviços de referência à Atenção à Saúde na Gestação de Alto Risco, incluída a Casa de Gestante, Bebê e Puérpera (CGBP), em conformidade com a Rede Cegonha. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil. 2013 maio 31;150(103 Seção 1):72-5.
  • 2
    Kunzler IM. O cuidado às mulheres no puerpério de alto-risco: aplicando o modelo de cuidado de Carraro fundamentado em Florence Nightingale [dissertação]. Florianópolis (SC): Universidade Federal de Santa Catarina; 2006.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    17 Out 2014
  • Aceito
    30 Set 2015
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