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Práticas de monitoramento na gestão municipal em saúde e sua interface com a enfermagem

Prácticas de monitoría en la gestión principal de salud y su interfaz con la enfermería

RESUMO

Objetivo

Analisar as práticas de monitoramento desenvolvidas pelos municípios e as interfaces com a prática da Enfermagem.

Métodos

Estudo exploratório descritivo com abordagem qualitativa, realizado nos seis municípios da Região de Saúde 10 do Rio Grande do Sul. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas junto a seis gestores de saúde e um assessor, com análise de conteúdo.

Resultados

As categorias finais que emergiram dos resultados foram “Práticas de monitoramento na gestão municipal em saúde” e “Dificuldades de implantação do monitoramento pelos gestores”.

Conclusões

Os gestores apontaram potencialidades e fragilidades nas práticas de monitoramento municipal de saúde. A incorporação deste processo é primordial à prática dos profissionais, especialmente da enfermagem, promovendo um incremento no uso de novas ferramentas que propiciam a inovação para subsidiar a tomada de decisão.

Monitoramento; Regionalização; Enfermagem em saúde pública; Saúde pública

RESUMEN

Objetivo

Analizar las prácticas de monitoreo desarrolladas por los municipios y las interfaces con las prácticas de enfermería.

Métodos

Estudio exploratorio descriptivo con un enfoque cualitativo realizado en los 6 municipios de la Región de Salud 10 de Rio Grande del Sur. Fueron realizadas entrevistas semiestructuradas junto a seis gestores de salud y un asesor, con análisis de contenido.

Resultados

Las categorías finales que surgieron a partir de los resultados fueron “Prácticas de monitoreo en la gestión principal de salud” y “Dificultades de aplicación de monitoreo por los gestores”.

Conclusiones

Los gestores señalaron fortalezas y debilidades en las prácticas de monitoreo de salud municipales. La incorporación de ese proceso es primordial para la práctica de los profesionales, especialmente los de enfermería, promoviendo un incremento en el uso de nuevas herramientas que propician la innovación para subsidiar la toma de decisión.

Monitoreo; Regionalización; Enfermería en salud pública; Salud pública

ABSTRACT

Objective

To analyse the healthcare monitoring practices of the local government and its interfaces with nursing.

Methods

This is a descriptive, exploratory, and qualitative study conducted in six municipalities in the 10th health region of the state of Rio Grande do Sul. Data were collected through semi-structured interviews with six healthcare managers and one adviser, and subjected to content analysis.

Results

The results led to the final categories, “Monitoring practices in municipal healthcare management” and “Difficulties of managers in implementing monitoring”.

Conclusion

The managers pointed out potentialities and weaknesses in the monitoring practices of municipal healthcare. This process is critical for the practice of healthcare workers, especially nurses, since it encourages the use of new tools and innovations that support decision making.

Monitoring; Regional health planning; Public health nursing; Public health

INTRODUÇÃO

O Planejamento e a Gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) estão relacionados a elementos fundamentais como monitoramento, avaliação e integração do sistema de saúde, estes elementos produzem efeitos em âmbito organizacional mais amplo, como os sistemas de gestão, e em âmbito mais exíguo, como na própria organização dos serviços de saúde11. Conselho Nacional de Secretários de Saúde (BR). A gestão do SUS. Brasília (DF); 2015.-22. Grimm SCA, Tanaka OY. Painel de monitoramento municipal: bases para a construção de um instrumento de gestão dos serviços de saúde. Epidemiol Serv Saúde. 2016;25(3):585-94.. A integração do SUS se faz necessária em decorrência do processo de descentralização intergovernamental do SUS, que trouxe para a gestão governamental das três esferas de governo novas competências e responsabilidades sobre a forma como o direito à saúde é salvaguardado em âmbito da União, estados e municípios33. Miranda AS, Carvalho ALB, Cavalcante CGCS. Subsídios sobre práticas de monitoramento e avaliação sobre gestão governamental em secretarias municipais de saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2012;17(4):913-20..

A construção histórica da garantia do acesso aos serviços de saúde para a população brasileira aponta que, a gestão do sistema de saúde depende de diferentes atores e de uma diversidade de cenários que compõem amplas possibilidades de atuação e de inserção de profissionais que se atenham a serem mediadores entre as políticas públicas e a população44. Lotta GS, Farias GS, Ribeiro ER. Sistema integrado de monitoramento, execução e controle (SIMEC): usos e impactos na cultura administrativa no município de São Bernardo do Campo. Temas Admin Pública. 2014;9(2):1-19.. Neste sentido, o enfermeiro é um dos atores que tem sua inserção cada vez mais ampliada no âmbito da gestão pública55. Ribeiro ABA, Reis RP, Bezerra DG. Gestão em saúde pública: um enfoque no papel do enfermeiro. Rev Bras Ciênc Saúde. 2015;19(3):247-52., assim debruçar-se sobre a construção de conhecimentos acerca das práticas de monitoramento e avaliação em âmbito municipal se tornam cada vez mais úteis e necessárias ao trabalho cotidiano em saúde deste profissional e da equipe em que está inserido.

Além disso, está-se vivendo a atual conjectura organizacional do SUS, a qual demanda processos inovadores que atendam às exigências normativas em relação ao planejamento, principalmente no que tange o Decreto nº 7.508 de 28 de junho de 2011. Este Decreto, em virtude de suas proposições, exige que o planejamento em saúde seja ascendente, integrado e regionalizado, sendo necessárias políticas de saúde compatíveis com os recursos financeiros disponíveis e, respaldadas por planos de saúde11. Conselho Nacional de Secretários de Saúde (BR). A gestão do SUS. Brasília (DF); 2015., ou seja, o mais ajustado possível com as demandas e necessidades locais, aquelas que emanam do cotidiano do trabalho. Os Municípios têm a responsabilidade declarada normativamente de atuar em prol da gestão do sistema de saúde no que se refere: planejar, organizar e avaliar serviços de saúde locais; gerenciar as unidades públicas de saúde; executar serviços de vigilância epidemiológica e sanitária, de alimentação e nutrição, de saneamento básico e de saúde do trabalhador; implementar a política de insumos e equipamentos em saúde; controlar e fiscalizar os procedimentos dos serviços privados de saúde66. Ministério da Saúde (BR). Manual de planejamento no SUS. Brasília (DF); 2015..

Assim, frente à ampliação da oferta de serviços e recursos em saúde, à implementação de novas políticas em saúde e à ampliação de responsabilidades e condicionalidades aos entes federados, em especial aos municípios, o monitoramento se faz como um elemento fundamental para que se tenham substratos à realização do planejamento em saúde. Enquanto definição, o monitoramento pode ser pensado como formas de acompanhamento e supervisão da implementação de políticas, planos e projetos no campo da saúde, envolve a coleta, processamento e análise de informações em saúde, de modo a analisar se as ações em saúde estão sendo desenvolvidas de acordo com o planejamento e se estão tendo o resultado esperado77. Teixeira CF, organizadora. Planejamento em saúde: conceitos, métodos e experiências. Salvador: EDUFBA; 2010..

Nesta lógica, pode-se também entender por monitoramento o regular acompanhamento de metas e indicadores que estão vinculados a objetivos e diretrizes propostos pela política de saúde de um período determinado, bem como sua comparação com o que foi planejado66. Ministério da Saúde (BR). Manual de planejamento no SUS. Brasília (DF); 2015..

É uma prática de grande auxílio para a gestão pública visto que fornece dados de acordo com a realidade local, sendo estes indispensáveis para intervenções governamentais44. Lotta GS, Farias GS, Ribeiro ER. Sistema integrado de monitoramento, execução e controle (SIMEC): usos e impactos na cultura administrativa no município de São Bernardo do Campo. Temas Admin Pública. 2014;9(2):1-19.. Além disso, tem papel fundamental na democratização da informação sobre objetivos, metas e resultados alcançados pela gestão, assim como favorece a mobilização social88. Carvalho ALB, Souza MF, Shimizu HE, Senra IMVB, Oliveira KC. A gestão do SUS e as práticas de monitoramento e avaliação: possibilidades e desafios para a construção de uma agenda estratégica. Ciênc Saúde Coletiva. 2012;17(4):901-11.. Neste norte, pensa-se que esta seja uma atividade vinculada ao trabalho do profissional da enfermagem, visto que este se encontra em direta ligação com a realidade e o planejamento local para gerenciar as ações em saúde executadas nos serviços de saúde.

A prática de monitoramento em saúde está associada ao desenvolvimento e ao exercício de competências e atributos de gestão, tais como, direcionalidade, comando, condução, comunicação, regulação e execução de decisões governamentais; à formulação de políticas e programas; à tomada de decisões e planejamento de ações, programas e projetos; à avaliação da situação de saúde da população; à orientação dos processos de implantação, consolidação e reformulação das práticas de saúde; planejamento mais assertivo com relação aos recursos necessários; e o monitoramento da implementação das ações e o uso de recursos33. Miranda AS, Carvalho ALB, Cavalcante CGCS. Subsídios sobre práticas de monitoramento e avaliação sobre gestão governamental em secretarias municipais de saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2012;17(4):913-20.-44. Lotta GS, Farias GS, Ribeiro ER. Sistema integrado de monitoramento, execução e controle (SIMEC): usos e impactos na cultura administrativa no município de São Bernardo do Campo. Temas Admin Pública. 2014;9(2):1-19.,99. Felisberto E. Monitoramento e avaliação na atenção básica: novos horizontes. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2004;4(3):317-21.-1010. Sampaio J, Carvalho EMF, Pereira GFC, Mello FMB. Avaliação da capacidade de governo de uma secretaria estadual de saúde para o monitoramento e avaliação da atenção básica: lições relevantes. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(1):279-90.. Como desafios a serem superados restam a consolidação de uma cultura de avaliação e monitoramento que se perpetue do interior das organizações públicas de forma perene, sem que sejam descontinuadas em decorrência da troca de equipes de trabalho advindas da alternância política44. Lotta GS, Farias GS, Ribeiro ER. Sistema integrado de monitoramento, execução e controle (SIMEC): usos e impactos na cultura administrativa no município de São Bernardo do Campo. Temas Admin Pública. 2014;9(2):1-19.. Sendo considerada, como avaliação, a análise dos resultados oriundos do monitoramento em conjunto com os fatores associados, escolhidos pela forma de apreciação a ser realizada66. Ministério da Saúde (BR). Manual de planejamento no SUS. Brasília (DF); 2015..

Isto faz com que alguns processos de gestão sejam analisados no sentido de elaborar métodos que auxiliem os gestores a fortalecer as práticas de monitoramento e avaliação, de forma a qualificar a tomada de decisão88. Carvalho ALB, Souza MF, Shimizu HE, Senra IMVB, Oliveira KC. A gestão do SUS e as práticas de monitoramento e avaliação: possibilidades e desafios para a construção de uma agenda estratégica. Ciênc Saúde Coletiva. 2012;17(4):901-11.. Estudo aponta que há contribuição de métodos de consenso para a tomada de decisão tanto na prática clínica quanto no desenvolvimento de serviços de saúde1111. Jones J, Hunter D. Consensus methods for medical and health services research. BMJ. 1995;311(7001):376-80.. Desta forma, resultados já apresentados e testados poderiam auxiliar os gestores de saúde.

Neste sentido, sabe-se que, processos de reestruturação colocam em evidência a situação vivenciada por municípios e estados na qual enfrentam dificuldades referentes à ausência de um projeto de governo, que tem direta repercussão na direcionalidade da gestão, na disponibilidade de profissionais e na sua qualificação1010. Sampaio J, Carvalho EMF, Pereira GFC, Mello FMB. Avaliação da capacidade de governo de uma secretaria estadual de saúde para o monitoramento e avaliação da atenção básica: lições relevantes. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(1):279-90..

A ausência do Estado, no sentido de oferecer aporte técnico e operacional de forma incisiva aos municípios e estados, fragiliza a tríade União-Estado-Município, distanciando o projeto de construção do SUS a partir do compartilhamento de responsabilidades entre os entes federados. Visto esta problemática, há a necessidade do fortalecimento e desenvolvimento das ações de monitoramento como subsidiárias ou intrínsecas ao planejamento e à gestão99. Felisberto E. Monitoramento e avaliação na atenção básica: novos horizontes. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2004;4(3):317-21.-1010. Sampaio J, Carvalho EMF, Pereira GFC, Mello FMB. Avaliação da capacidade de governo de uma secretaria estadual de saúde para o monitoramento e avaliação da atenção básica: lições relevantes. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(1):279-90..

Na perspectiva do cenário da gestão em saúde, a enfermagem se insere no âmbito do planejamento, monitoramento e avaliação em diferentes níveis do sistema. O enfermeiro, na prática assistencial, tanto hospitalar quanto ambulatorial e de atenção primária em saúde, utiliza-se destas ferramentas de gestão para auxiliar na tomada de decisão nos serviços de saúde. No âmbito da gestão distrital, municipal, regional ou estadual, o profissional de enfermagem pode ocupar cargos técnicos ou de gestão que permitam a consolidação da tomada de decisão a partir do uso das ferramentas supracitadas. O processo de avaliação das ações em saúde promove a inserção do enfermeiro na gestão do sistema de saúde, pois sua formação, centrada no cuidado, potencializa uma postura de gestão diferenciada, com possibilidade de posições decisórias e ser propositor de políticas de saúde. Por outro lado, a inserção em “níveis decisórios nos espaços de gestão” ainda necessita ser construída e consolidada1212. Chaves LDP, Tanaka OYO enfermeiro e a avaliação na gestão de Sistemas de Saúde. Rev Esc Enferm USP. 2012;46(5):1274-8..

Ainda, ressalta-se que, este é um tema de relevância para a prática de enfermagem voltada para as inovações em saúde, considerando o contexto atual das práticas em saúde, também em função das próprias diretrizes curriculares nacionais que incentivam a formação crítica e reflexiva deste, despertando os profissionais para o desenvolvimento de um perfil sintonizado e convergente com a gestão dos serviços de saúde1313. Andrade LDF, Souza SO, Medeiros HA, Pinto MB, Santos NCCB, Lima EAR. Avaliação das disciplinas que desenvolvem o tema gestão em serviços de saúde e enfermagem. Ciênc Cuid Saúde. 2016;15(2):275-81., tanto no âmbito dos serviços em saúde, quanto da gestão pública do Sistema de Saúde, tanto em nível municipal, quanto mais amplos.

Neste contexto, salienta-se a expressiva participação do enfermeiro na construção dos instrumentos para o planejamento no SUS, especialmente na gestão municipal. Esses instrumentos – o plano de saúde, as respectivas programações anuais e os relatórios de gestão (anual e quadrimestral) – interligam-se sequencialmente, compondo um processo cíclico de planejamento para operacionalização integrada, solidária e sistêmica do SUS66. Ministério da Saúde (BR). Manual de planejamento no SUS. Brasília (DF); 2015., promovendo o planejamento, o monitoramento e a avaliação no sistema, por consequência, possibilitando a tomada de decisão em saúde. Visto a importância das práticas de monitoramento em saúde para os sistemas organizacionais e os obstáculos enfrentados para ser implantado de maneira eficaz, faz-se necessário que se realizem estudos para analisar a problemática e visibilizar as ações desempenhadas pelos gestores. Para tanto, tem-se por questão norteadora desta análise: De que forma o monitoramento é executado pelos Municípios e qual a sua interface com a enfermagem? Tendo em vista isto, o presente artigo tem como objetivo analisar as práticas de monitoramento desenvolvidas pelos municípios e as interfaces com a prática da enfermagem.

PERCURSO METODOLÓGICO

O presente artigo está inserido na pesquisa intitulada “Doenças crônicas não transmissíveis e o planejamento em saúde: os desafios da região metropolitana Porto Alegre-RS”, financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio Grande do Sul (Fapergs) em parceria com o Ministério da Saúde (MS), com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) do Brasil e a Secretaria de Estado da Saúde do Rio Grande do Sul/SES-RS no âmbito do Programa de Pesquisa para o SUS: gestão compartilhada em saúde, sob chamada Fapergs/MS/CNPq/SESRS n. 002/2013.

Estudo exploratório descritivo com abordagem qualitativa1414. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 12. ed. São Paulo: Hucitec; 2010., realizado junto a seis gestores de saúde dos municípios em estudo e um assessor que, a pedido de um dos gestores, também foi entrevistado por representar a assessoria de planejamento do município. Salienta-se que o critério de inclusão era ser secretário de saúde ou assessor dos municípios da região de saúde em estudo. Foi realizado na Região de Saúde 10 do estado do Rio Grande do Sul, sendo esta composta por seis municípios: Alvorada, Cachoeirinha, Glorinha, Gravataí, Porto Alegre e Viamão. A escolha da região de saúde ocorreu devido à inserção da metrópole Porto Alegre e de outros quatro municípios de grande porte, respondendo à problemática na região metropolitana.

Foram realizadas entrevistas semiestruturadas junto aos participantes da pesquisa entre o segundo semestre de 2014 e o primeiro semestre de 2015. Os questionamentos realizados tratavam das estratégias de trabalho adotadas pelo município quanto ao monitoramento e avaliação em saúde, assim como a participação das equipes neste processo. Posteriormente à geração dos dados, as entrevistas foram transcritas para a realização da análise de conteúdo1414. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 12. ed. São Paulo: Hucitec; 2010.. Para a categorização temática foi utilizado apoio do software NVivo 9 e utilizaram-se suas três etapas: pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados obtidos e interpretação1414. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 12. ed. São Paulo: Hucitec; 2010.. Os entrevistados receberam a seguinte codificação: EG – entrevistas com gestores e EAP – entrevista com assessor de planejamento.

As considerações bioéticas foram respeitadas quanto ao acesso e análise de dados, conforme resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012, do Conselho Nacional de Saúde1515. Ministério da Saúde (BR), Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil. 2013 jun 13;150(112 Seção 1):59-62.. Os entrevistados receberam e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, em duas vias, para confirmar o aceite de participação no estudo, assim como a garantia do anonimato. Aprovada pela Comissão de Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), pelos Comitês de Ética da UFRGS e da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre, sob pareceres números, 708.357/2014 e 885.916/2014, respectivamente.

RESULTADOS

As categorias temáticas finais que emergiram dos resultados foram: “Práticas de monitoramento na gestão municipal em saúde” e “Dificuldades de implantação do monitoramento pelos gestores”.

Práticas de monitoramento na gestão municipal em saúde

O monitoramento e a avaliação em saúde são desenvolvidos, pelos municípios, a partir dos indicadores do Sistema Integrado de Monitoramento Execução e Controle (SISPACTO) e do Plano Municipal de Saúde. Foi mencionado por alguns gestores que quem monitora os indicadores também organiza a Programação Anual de Saúde e realiza os relatórios – quadrimestrais e anual – para avaliar se os objetivos do planejamento foram alcançados e repactuá-los.

Uma pessoa que trabalha todo o processo de acompanhamento com as equipes, ela monta a programação anual, trabalha em cima do Plano Municipal de Saúde, depois avalia quadrimensalmente, está fazendo essa discussão tanto dos indicadores do SISPACTO quanto da elaboração e pactuação da programação anual, se reúne com as equipes que são afins, discute os processos, vêm os itens que não se alcançaram, vê por que e define o que tem que se fazer para alcançar (EG4).

O Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ) foi apontado, por um dos gestores, como um instrumento que motivou as equipes a alcançar metas no planejamento e, por consequência, minimizar a resistência de alguns profissionais.

A lógica do PMAQ ajudou muito isso para nós na Atenção Básica, a gente estabeleceu um prêmio para o trabalhador, um incentivo para o trabalhador (EAP1).

Cabe à gestão melhorar as condições de trabalho e infraestrutura e cabe a vocês [...] melhorar a qualidade dos serviços que vocês prestam, ou seja, é uma autocobrança (EG4).

Um dos gestores entrevistados mencionou que o uso do recurso do referido programa é repassado conforme critérios adotados pela gestão municipal, intercalando a distribuição entre os trabalhadores e a gestão.

Para cada equipe recebe classificação percentual, se for insatisfatório não recebe, se for regular recebe 20% do incentivo mensal todo mês, se for bom recebe 60% do incentivo e se for ótimo recebe 100% do incentivo. [...] A gente estabeleceu que, no primeiro ano de aplicação de cada equipe, então se eu criar uma equipe agora ela já cai na regra, 30% desse recurso é distribuído entre os trabalhadores e 70% fica para a gestão compor a estrutura, no segundo e terceiro ano 50% dos trabalhadores e 50% da gestão e a lógica é que, a partir do quarto ano 70% fique com o trabalhador e 30% para manutenção da unidade (EAP1).

Durante as entrevistas foi mencionado o quão práticas e exitosas se tornam as ações de monitoramento e, por consequência, o planejamento local ao se obter a adesão de um sistema informatizado.

Sim nos temos a CAD, epidemiologia, e a central de regulação. Junto com a direção técnica nós temos feito essas avaliações e temos acompanhado. [...] eu avaliei a finalização de 2013. Poucos foram os itens que não atendemos aos indicadores estabelecidos pelo Ministério da Saúde (EG1).

Ainda não conseguimos implantar, porque na realidade aqui eles têm os dados, estão informatizados, porque quem opera o pronto atendimento é a Fundação [...]. Então eles têm um sistema informatizado até porque eles precisam. E nas minhas unidades eu não tenho nada informatizado. Teria que ser tudo manual. E aí ou tu prioriza o atendimento a população ou tu prioriza o preenchimento de papel (EG6).

Segundo alguns gestores, para se alcançar bons resultados, os indicadores devem possuir parâmetros para analisar como a unidade modelo e as equipes ali presentes se enquadram no processo. O Núcleo Municipal de Educação em Saúde Coletiva (NUMESC) começa a ser eixo central da gestão para organizar os parâmetros dos indicadores e projetar ideias e soluções para os desafios encontrados na gestão.

Para que o NUMESC fosse o eixo central, para fazer o diagnóstico das necessidades, das capacitações, formações, e tudo aquilo que viesse para cá, de proposta de universidade, fosse analisada pelo NUMESC, para ver se isso está ao encontro com nosso objeto (EG2).

Mas, em alguns municípios, as ações programáticas são inexistentes, o que provoca a não execução e formulação do planejamento próprio do serviço de saúde ou realizado de forma inadequada. Os Municípios têm de recorrer a outros órgãos, como o da Vigilância Sanitária para realizar ações efetivas de monitoramento.

No contexto da pesquisa, foi relatado como instrumento de monitoramento dos municípios de maior porte populacional a utilização dos dados obtidos por meio da Vigilância Sanitária para a análise da situação em saúde. Este setor fornece informações para os órgãos executores das políticas públicas em saúde para estas então serem repensadas.

Quando a gente tiver estratégia vai conseguir ver melhor os indicadores. Hoje a gente trabalha com o que a gente acha que tem e com a Vigilância [...] não tem uma forma de ver, os nossos indicadores. Não criou esta porta ainda [...] (EG3).

Mas tentando botar a vigilância em saúde como grande compilador e fornecedor de ferramentas para que esses dados cheguem até a área técnica que vai repensar a política e distribuir a quem executa: básica, média e alta e urgência (EG5).

A partir da apresentação destes dados, a seguir é descrita a categoria que trata das dificuldades acerca do processo de implantação do monitoramento pelos municípios.

Dificuldades de implantação do monitoramento pelos gestores

As fontes de financiamento geram a necessidade de que os municípios se organizem minimamente em relação à utilização do recurso repassado. Nos relatos, houve o indicativo de que o Estado ofereceu o financiamento e responsabilizou os Municípios pelo planejamento em relação a sua utilização, mas sem haver a corresponsabilização entre as partes. Os municípios nesta situação estão implementando o planejamento de maneira individualizada.

[...] questão essa das fontes do financiamento eu te diria que isso acabou forçando com que os municípios passassem também a se planejar um pouco melhor. A partir do momento em que eu digo o seguinte: o problema agora não é mais fonte de financiamento, o problema agora é vocês se planejarem e poder organizar isso dentro de cada instância, em cada município, ou seja, nós estamos aqui ofertando os recursos, vocês agora voltem para casa, façam o seu dever de casa, se planejem, se organizem, por que cada demanda que surge para nós aqui, nós vamos avaliar e se houver condições disso nós vamos implementar, não dá mais para fugir dessa lógica de planejamento, não tem como [...] (EG4).

O planejamento em saúde realizado pelos municípios é transversalizado pelas prioridades impostas na implantação de novas políticas públicas neste campo. A partir disso, os municípios elegem as necessidades para atender e, posteriormente, as demandas menos latentes são incorporadas.

O município de [...] sempre lidou com muita dificuldade em relação a isso, nós sempre trabalhamos muito no apagar incêndio, no primeiro executar a política da maneira como ela se apresenta e depois tu resolver o problema, não (EG4).

Há um reconhecimento municipal do processo de planejamento e monitoramento, mas devido a problemas inesperados, a equipe direciona seu trabalho para atendê-los, o que resulta no distanciamento da concretização do planejamento e monitoramento efetivo.

E aí tu tem que estar monitorando e avaliando todo o tempo. E aí tu tem tanto incêndio para apagar que perde o tempo, perde o time de monitorar e avaliar (EG6).

Mesmo os Municípios defendendo e incentivando o planejamento em saúde, houve a associação de que, esta prática não é exercida, pois está relacionada a uma tradição dos serviços públicos de realizarem o planejamento apenas como uma obrigação institucional e prevista em lei. Por essa razão também, não há sentido em avaliar e monitorar um planejamento que não foi feito de acordo com a real necessidade. Dentre aqueles que se colocaram como executores do planejamento em saúde houve o relato de que há dificuldades em inseri-lo na cultura organizacional.

Nós que somos adeptos da política organizacional, das coisas bem planejadas, nos deparamos no dia-a-dia com algumas resistências, [...] mas nosso papel é justamente esse implementar modelo que venha facilitar depois qualquer mecanismo de controle do processo [...] (EG4).

Não parece ser da cultura da saúde, que eu vou trabalhar com planejamento. Talvez por uma questão de formação profissional, por carência de insight de gestão (EG5).

Desta forma, o monitoramento dos serviços apresenta-se ainda ineficaz, tendo em vista que, os profissionais – incluindo os de enfermagem – não valorizam a prática do planejamento no seu cotidiano de trabalho.

O profissional está tão debruçado sobre o seu processo de trabalho que ele acha que aquilo que ele está fazendo é perda de tempo (EG4).

Esse desinteresse dos profissionais na adesão ao planejamento e monitoramento em saúde foi associado a questões financeiras, em que os profissionais responsáveis por essas funções obtinham remuneração inferior se comparado a outras funções exercidas pelos profissionais da área.

O resgate de pessoas que consigam trabalhar com isso e que estejam dispostas a trabalhar [...] passa por uma questão de remuneração, quem trabalhava na gestão ganhava menos que quem trabalhava na assistência, hoje já ganha equilibrado [...]. Então tu começa a trazer pessoas para esse lado (EG5).

Emergiu a consideração de que, no sistema público de saúde o monitoramento das ações ainda é incipiente, a iniciativa privada dentro dos municípios apresenta aos secretários municipais a análise de dados de forma mais facilitada e incorporada à sua inserção, o que não acontece com os serviços públicos.

Tu tem que ter mecanismo, a parte do planejamento em que tu possa ir monitorando isso com mais frequência, com mais agilidade [...] Não pode ser diferente da iniciativa privada (EG4).

Outra questão apontada pelos gestores diz respeito à fragmentação do planejamento na própria secretaria de saúde, em que cada componente ou área é responsável por suas metas e, ao final, fica difícil de concretizar as metas anuais.

Porque às vezes determinado componente da secretaria, ele tem as suas metas, mas ele passou o ano inteiro trabalhando em outras coisas, metas que ele definiu dentro do seu setor. Daí chega o final do ano, bom agora eu tenho que responder essas metas anuais aqui. [...] O que tu vai colocar ali é mentiroso, e se não é mentiroso é próximo disso ou foi ajeitado para ficar aqui (EG4).

DISCUSSÃO

Os resultados da pesquisa apontam que o processo de planejamento em saúde, nos municípios em estudo, ainda está em fase de incorporação na rotina organizacional e, o monitoramento não é implementado de forma equitativa pelos mesmos, o que se traduz na forma como a Região de Saúde se organiza como um todo, distanciando a realidade do processo normativo idealizado pelo Decreto 7.508 de 28 de junho de 201111. Conselho Nacional de Secretários de Saúde (BR). A gestão do SUS. Brasília (DF); 2015.. Em consequência, estes processos que deveriam se retroalimentar, ainda demandam apoio institucional para que sejam implementados, inclusive no nível local em que a enfermagem tem papel fundamental em sua consolidação. Estudos envolvendo esta temática apontam que, a prática do monitoramento ainda exige incentivo para que seja desencadeada22. Grimm SCA, Tanaka OY. Painel de monitoramento municipal: bases para a construção de um instrumento de gestão dos serviços de saúde. Epidemiol Serv Saúde. 2016;25(3):585-94., especialmente porque aprofunda o conhecimento dos profissionais sobre eventos e situações que produzem efeitos diretamente para a prática diária das ações em saúde, como doenças mais prevalentes, condições de vida e de saúde da população.

Práticas de monitoramento na gestão municipal em saúde

Em relação aos instrumentos utilizados localmente, os municípios fundamentam a avaliação em saúde, especialmente, por meio dos indicadores do Sistema Integrado de Monitoramento Execução e Controle (SISPACTO) e de seus Planos Municipais de Saúde. Os relatórios de gestão também são citados dentre eles.

Visando a melhoria do sistema, os municípios buscam alternativas para solucionar o problema relacionado ao monitoramento. Os mesmos citam programas de incentivo e espaços de gestão, como o Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ) e a Vigilância em Saúde, como apoiadores para adesão e qualificação do monitoramento e planejamento. Em um dos municípios, foi citado que, devido ao incentivo financeiro do PMAQ, os profissionais foram motivados a realizar o monitoramento, minimizando a resistência existente em relação ao desenvolvimento desta ação. Foi uníssona a postura dos Municípios em relação ao fato de que a Vigilância em Saúde atua como uma importante ferramenta na avaliação dos indicadores e, segundo os gestores, são estes que embasam a formulação das políticas públicas em saúde nos municípios.

Outra possibilidade de fomentar a prática do monitoramento e planejamento em saúde é a educação permanente dos profissionais, visando à implantação do Núcleo Municipal de Educação em Saúde Coletiva (NUMESC) – espaço com bastante vinculação do profissional enfermeiro – para organizar os parâmetros dos indicadores e projetar ideias e soluções para os desafios encontrados na gestão. Esta ação aponta para possibilidades de práticas de gestão mais participativas sendo implantadas na Região. Autores1616. Maerschner RL, Bastos ENE, Gomes AMA, Jorge MSB, Diniz SAN. Apoio institucional – reordenamento dos processos de trabalho: sementes lançadas para uma gestão indutora de reflexões. Interface Comun Saúde Educ. 2014;18(1):1089-98. relatam que ao ocorrer a inclusão da educação permanente há impactos favoráveis aos atores envolvidos e melhorias na qualidade dos processos de saúde, com projetos de intervenção para mudança da realidade local. Isto em muito se deve por oportunizar o exercício da autonomia para a resolução dos problemas em todos os níveis de gestão, promovendo a discussão das diretrizes da política de saúde para sua apropriação e execução consciente, reforçando ou não o que se deseja atingir.

Os gestores ainda idealizam melhorias, e para isso ocorrer, os entrevistados dos municípios de grande porte, listaram dois modelos que seriam os ideais e que, ao serem implantados, a avaliação dos dados seria realizada de forma mais facilitada e efetiva. Os modelos seriam os utilizados pela iniciativa privada que se encontra vigente e, a adesão de um sistema informatizado, como nos Prontos-Atendimentos, para formar uma rede de informações.

Os sistemas informatizados realmente podem ser uma solução para as dificuldades de implantar práticas de monitoramento, visto que são estratégias importantes para qualificar a formulação e execução de políticas, principalmente no que tange o fluxo de informações e a realização de procedimentos orçamentários. Outro ponto pertinente é que, quando se têm estratégias de monitoramento implantadas, torna-se mais fácil alcançar o reconhecimento de particularidades e demandas que são próprios de cada campo específico, visando a obtenção de melhores resultados44. Lotta GS, Farias GS, Ribeiro ER. Sistema integrado de monitoramento, execução e controle (SIMEC): usos e impactos na cultura administrativa no município de São Bernardo do Campo. Temas Admin Pública. 2014;9(2):1-19.. Também, esta é uma estratégia que permite a descentralização das decisões e a desagregação dos dados à Unidade Básica de Saúde (UBS), considerada a menor unidade de prestação de serviços de saúde22. Grimm SCA, Tanaka OY. Painel de monitoramento municipal: bases para a construção de um instrumento de gestão dos serviços de saúde. Epidemiol Serv Saúde. 2016;25(3):585-94.. Neste sentido, a informatização e sistematização das informações a partir de metas, indicadores e modos de avaliação compartilhados possam ser alternativas para consolidar o processo de monitoramento e avaliação nos municípios de uma maneira mais simplificada, efetiva e econômica.

Além disso, outro modelo que tem apresentado bons frutos é a instituição das equipes de monitoramento da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre. Esta é uma estratégia pensada no âmbito da Política Nacional de Gestão Estratégica e Participativa no SUS – ParticipaSUS. A Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre criou então, em 2011, o ConsolidaSUS que se propôs a realizar “a descentralização da gestão participativa, o planejamento, o monitoramento e a avaliação em saúde da SMS”, ampliando o conhecimento dos territórios e os indicadores de saúde locais. Isso qualifica a construção de metas prioritárias e promove o empoderamento de atores para a tomada de decisão em saúde1717. Silva VC, Rocha EJO, organizadoras. ConsolidaSUS: equipes de monitoramento. Porto Alegre: Secretaria Municipal de Saúde; 2013..

O objetivo das equipes de monitoramento seria promover a definição de metas e indicadores no âmbito da gerência distrital, estabelecer ações e monitorá-las quadrimestral e anualmente, com a finalidade de qualificar a gestão e potencializar os resultados1717. Silva VC, Rocha EJO, organizadoras. ConsolidaSUS: equipes de monitoramento. Porto Alegre: Secretaria Municipal de Saúde; 2013.. Este modelo que pensa o monitoramento do local, ao distrital e municipal, conta com a participação de diversos atores da gestão nestes níveis, mas especialmente das equipes de atenção básica dos territórios, sendo consolidada a atuação de enfermeiros e técnicos de enfermagem. Pensa-se que esta representação dá espaço e voz, além de instrumentalizar os profissionais de enfermagem, ampliando sua inserção na gestão. Ao considerar o monitoramento e a avaliação como importantes componentes da gestão, pode-se inferir que a introdução do enfermeiro tem potencial de mudança nesta e na contribuição para tomada de decisão em saúde1212. Chaves LDP, Tanaka OYO enfermeiro e a avaliação na gestão de Sistemas de Saúde. Rev Esc Enferm USP. 2012;46(5):1274-8..

Dificuldades de implantação do monitoramento pelos gestores

Os municípios apontaram as práticas de monitoramento que vêm desenvolvendo localmente, no entanto estas práticas ainda apresentam dificuldades em sua implementação. Devido ao planejamento em saúde ser transversalizado pelas prioridades impostas na implantação de novas políticas públicas, que visam solucionar velhos problemas da situação de saúde da população, os municípios, por não possuírem o amparo e preparo adequado para realizar tal ação necessitam eleger prioridades para serem atendidas e, desta forma as demandas latentes são incorporadas posteriormente. Em estudo qualitativo realizado na região nordeste1010. Sampaio J, Carvalho EMF, Pereira GFC, Mello FMB. Avaliação da capacidade de governo de uma secretaria estadual de saúde para o monitoramento e avaliação da atenção básica: lições relevantes. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(1):279-90. evidencia-se que, devido ao monitoramento dos serviços não possuir um setor específico, acaba tendo de se unir à administração do local, o que provoca a desatenção e a postergação na ação de monitorar. O mesmo estudo afirma que, devido aos projetos de governo não serem construídos de maneira coletiva com a formulação de políticas estrategicamente planejadas, as ações acabam sendo desenvolvidas de acordo com as necessidades que surgem, denotando um perfil incrementalista às políticas públicas. Em decorrência disto, as UBSs não produzem ações prioritárias para a sua população1818. Almeida DB, Melo CMM. Avaliação da gestão na atenção básica nas dimensões da integralidade. Rev Baiana Saúde Pública. 2012;36(3):816-30., nem tampouco se utilizam desta ferramenta para a produção de saúde.

As evidências empíricas apontaram que, devido à ocorrência de problemas inesperados, as equipes em saúde acabam direcionando seu trabalho para resolvê-los, o que se torna um obstáculo para a incorporação de processos de monitoramento e de planejamento em saúde. Outro fator apontado pelos gestores como uma fragilidade para a implantação de um sistema de monitoramento e planejamento nos municípios seria o fato de que, é uma característica definidora dos serviços públicos a inexistência de uma cultura organizacional, que se utilize do planejamento como modus operandi de funcionamento.

Salienta-se que o enfermeiro é um dos principais responsáveis pelo planejamento e consolidação dos dados nas unidades de saúde, além de, em muitos casos, exercer o papel de coordenador da equipe. A prática demonstra que a referida inexistência de cultura organizacional no processo de monitoramento e avaliação e, por consequência a dificuldade em promover a mudança da prática, possa se dar devido ao excesso de trabalho das equipes e ao que a própria falta de planejamento proporciona, o cotidiano “apagar incêndio”.

A questão dos profissionais em saúde localmente não valorizarem a prática do planejamento em seu processo de trabalho, além da desvalorização sofrida pelos profissionais que atuam na gestão e, dificuldades de realizar planejamento local nas unidades de saúde, são preocupantes para o campo da gestão pública do sistema de saúde. Estes fatores foram encontrados de maneira sinérgica com outros estudos33. Miranda AS, Carvalho ALB, Cavalcante CGCS. Subsídios sobre práticas de monitoramento e avaliação sobre gestão governamental em secretarias municipais de saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2012;17(4):913-20.,1010. Sampaio J, Carvalho EMF, Pereira GFC, Mello FMB. Avaliação da capacidade de governo de uma secretaria estadual de saúde para o monitoramento e avaliação da atenção básica: lições relevantes. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(1):279-90.,1616. Maerschner RL, Bastos ENE, Gomes AMA, Jorge MSB, Diniz SAN. Apoio institucional – reordenamento dos processos de trabalho: sementes lançadas para uma gestão indutora de reflexões. Interface Comun Saúde Educ. 2014;18(1):1089-98.

17. Silva VC, Rocha EJO, organizadoras. ConsolidaSUS: equipes de monitoramento. Porto Alegre: Secretaria Municipal de Saúde; 2013.

18. Almeida DB, Melo CMM. Avaliação da gestão na atenção básica nas dimensões da integralidade. Rev Baiana Saúde Pública. 2012;36(3):816-30.
-1919. Puccini PT, Cornetta VK. Ocorrências em pronto-socorro: eventos sentinela para o monitoramento da atenção básica de saúde. Cad Saúde Pública. 2008;24(9):2032-42..

Também, foram citados como fatores para a não efetivação do planejamento em saúde as fragilidades estruturais como, a fragmentação do planejamento realizado pela própria secretaria de saúde, que se mostrou relacionado ao fato de que os municípios realizam o planejamento em saúde de acordo com a fonte de financiamento que recebem, haja vista que, precisam se organizar minimamente para utilizar estes recursos, porém o Estado não se corresponsabiliza pelo planejamento em relação a sua utilização. A fragmentação dos processos de gestão implica na baixa eficiência, eficácia e efetividade da mesma, o que tem relação estreita, também, com o financiamento, haja vista que este é um elemento propulsor destas práticas, como apontado pelos entrevistados1818. Almeida DB, Melo CMM. Avaliação da gestão na atenção básica nas dimensões da integralidade. Rev Baiana Saúde Pública. 2012;36(3):816-30..

No cenário em estudo, os dados empíricos que mencionam as dificuldades dos municípios em executar o monitoramento e avaliação indicam que, localmente existem dificuldades de estipular indicadores que possam embasar a avaliação dos resultados alcançados com o processo de implementação de determinada política, plano, programa ou projeto. Este problema acaba ocasionando uma reação em cadeia, visto que os indicadores de resultados não são estipulados devido à ausência de materiais para embasarem a elaboração dos indicadores.

Os resultados das ações mais amplas nos municípios, estados e pela própria União tem efeitos no cotidiano da prática da enfermagem, assim analisar a situação atual em âmbito regional e local, como foi realizado por este estudo, oferece subsídios teóricos e práticos que podem fomentar a sensibilização do trabalho do enfermeiro. A transformação das práticas da enfermagem no âmbito da gestão das políticas públicas envolve elementos subjetivos relacionados à cultura de realização de ações de monitoramento e avaliação e elementos mais objetivos, como aqueles apontados nos resultados como a necessidade de haver apoio institucional para isso. No campo da saúde é reconhecido que, a implantação de práticas embasadas no monitoramento e avaliação depende de conhecimentos técnicos específicos e alinhamento conceitual22. Grimm SCA, Tanaka OY. Painel de monitoramento municipal: bases para a construção de um instrumento de gestão dos serviços de saúde. Epidemiol Serv Saúde. 2016;25(3):585-94.. Neste sentido, a enfermagem tem muito a contribuir, tendo em vista a formação do Enfermeiro voltada às ações em saúde nas unidades de gestão mais próximas das pessoas, como as assistenciais, e das organizacionais mais amplas, como os cargos de gestão municipal.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Inúmeras são as dificuldades encontradas nos serviços de saúde públicos para a implantação eficaz do planejamento, monitoramento e avaliação em saúde, inclusive quando se reporta o olhar à contribuição da enfermagem. Muitos dos gestores ao serem entrevistados não respondiam de maneira objetiva às questões referentes ao monitoramento. Em contrapartida, o planejamento em saúde parecia de grande entendimento entre eles, mesmo que este seja de difícil realização em alguns municípios.

De modo geral, as soluções levantadas pelos gestores para a qualificação do monitoramento tentam flexibilizar o setor público, mas o que se verifica é que nem todos têm condições técnicas e financeiras para tomarem por iniciativa própria esta responsabilidade. Em boa medida, é possível associar a segregação das esferas governamentais, que gera individualização no processo de gestão, faltando apoio dos outros níveis governamentais para com o município e a Região.

Mesmo obtendo todas essas questões, os gestores entrevistados dialogam sobre a importância do monitoramento e da avaliação no processo de planejamento municipais e regional em saúde. Neste sentido, potencialidades e fragilidades foram apontadas como possibilidades para a gestão. Pensa-se que potencializar os instrumentos de gestão já postos, como os planos, programações de saúde e relatórios de gestão, auxiliarão na construção de uma cultura de monitoramento no Sistema Único de Saúde, inclusive no âmbito local.

Cabe salientar a necessidade de integrar as equipes de saúde a este processo e destacar a associação dos resultados desta pesquisa ao fazer cotidiano da enfermagem e em sua relação com a equipe interdisciplinar. A incorporação do monitoramento e avaliação em saúde às suas práticas, nos diferentes cenários de inserção profissional, seja na assistência ou na gestão, promove um incremento no uso de novas ferramentas que propiciam a inovação para subsidiar a tomada de decisão, tanto no âmbito técnico quanto no político.

Ao retomar o objetivo do estudo, a discussão aqui apresentada sobre as práticas de monitoramento desenvolvidas pelos municípios e as interfaces com a prática da enfermagem demonstram o quanto a incorporação do monitoramento e da avaliação é primordial ao fazer deste campo profissional. Incluídos os diferentes cenários de sua inserção, tanto na assistência quanto na gestão, promovendo um incremento no uso de novas ferramentas que propiciam a inovação para subsidiar a tomada de decisão.

Como limitação do estudo, pode-se citar o fato de ser apresentado o olhar da gestão municipal. Sugerem-se novos estudos que analisem e discutam a percepção das equipes de saúde locais sobre o processo de monitoramento e avaliação, tendo em vista o papel que eles têm neste processo, especialmente porque são as equipes locais que geram os dados e informações dos indicadores em saúde por meio de suas atividades e ações cotidianas. Este estudo avança na produção de conhecimento sobre o tema ao aproximar o fazer da enfermagem com espaços de gestão que estão mais afastados organizacionalmente dos serviços de saúde, o que gera efeitos sobre a forma como os serviços de saúde se organizam de modo a se integrarem e comunicarem mais ou menos, de acordo com as características locais. Estes elementos são importantes para a construção de políticas públicas em saúde, tendo na produção científica importantes fontes de informações sobre a realidade empírica dos municípios.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    12 Dez 2016
  • Aceito
    28 Mar 2017
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