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Violência doméstica contra crianças e adolescentes: olhares sobre a rede de apoio

La violencia doméstica contra los niños y los adolescentes: perspectivas de la red de apoyo

RESUMO

Objetivo

Conhecer e analisar as redes de apoio a famílias envolvidas na violência contra crianças e adolescentes pela perspectiva de profissionais da atenção básica à saúde e de familiares em um município do interior do Estado de São Paulo, Brasil.

Métodos

Pesquisa qualitativa, do tipo social estratégica, delineada pelo Paradigma da Complexidade. A coleta de dados foi realizada com 41 profissionais e 15 familiares por meio de Mapas da Rede Institucional ou Pessoal e entrevistas semiestruturadas. A análise se deu por meio da organização das informações, formação de quadros referenciais e categorização.

Resultados

Desvelou-se a categoria “Tecendo a rede” com vivências familiares e dos profissionais centradas numa lógica de fragmentação do cuidado.

Considerações finais

Desvela-se a urgente necessidade da construção e/ou efetivação de políticas públicas direcionadas às famílias com o empoderamento do núcleo familiar e comunitário, bem como da realização de estudos com abordagens que respeitem a multidimensionalidade do fenômeno.

Adolescente; Criança; Violência doméstica; Família; Apoio social; Enfermagem

RESUMEN

Objetivo

Analizar las redes de apoyo a los familiares involucrados en la violencia contra los niños y los adolescentes en el municipio del interior del Estado de São Paulo.

Métodos

Investigación cualitativa, del tipo social estratégico, delineada por el Paradigma de la Complejidad. La recolección de datos fue realizada con 41 profesionales y 15 familiares a través de Mapas de la Red Institucional o Personal y entrevistas semiestructuradas. El análisis se dio por medio de la organización de las informaciones; Formación de cuadros referenciales y categorización.

Resultados

Se desveló la categoría “Tejiendo la red”, con vivencias familiares y de los profesionales centradas en una lógica de fragmentación del cuidado.

Consideraciones finales

Se desvela la urgente necesidad de la construcción y/o efectividad de políticas públicas dirigidas a las familias, con el empoderamiento del núcleo familiar y comunitario, así como por la realización de estudios con la multidimensionalidad del fenómeno.

Adolescente; Niño; Familia; Violencia doméstica; Apoyo social; Enfermería

ABSTRACT

Objective

To identify and analyze the social support network of families involved in violence against children and adolescents, from the perspective of health professionals and families in a municipality of the state of São Paulo, Brazil.

Methods

This was a qualitative strategic social study, anchored in the paradigm of complexity. Data were collected from 41 health professionals and 15 families using institutional or personal network maps, and semi-structured interviews. Analysis was conducted by organizing the data, constructing theoretical frameworks, and categorizing resulting information.

Results

The category “weaving the network” was unveiled, with family experiences and professionals focused on a logic of fragmentation of care.

Final considerations

The creation and implementation of public policy are urgently needed to address the needs of this population, by empowering families and communities and developing research that respects the multidimensional nature of the phenomenon.

Adolescent; Child; Family; Domestic violence; Social support; Nursing

INTRODUÇÃO

A violência se apresenta como importante problema de saúde pública, sendo responsável por mais de 1 milhão de mortes por ano, em nível mundial. Na população de 15 a 44 anos, a violência é a quarta causa de mortalidade no mundo. Estes números representam apenas os casos fatais, sendo que milhares de pessoas no mundo são vítimas diariamente de violências não fatais11. Word Health Organization (CH). Violence prevention: the evidence. Geneva: World Health Organization; 2010..

Entende-se a violência como o uso intencional da força ou do poder físico, real ou em ameaça, contra uma pessoa, grupo ou comunidade, que resulte ou tenha grande possibilidade de resultar em injúria, morte, dano psicológico, privação ou alteração de desenvolvimento22. Violence Prevention Alliance [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2014- Definition and typology of violence; [cited 2015 mar 20]; [about 2 p.]. Available from: http://www.who.int/violenceprevention/approach/definition/en/.
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. Crianças e adolescentes estão entre as principais vítimas de violências; no mundo, cerca de 227 crianças e adolescentes, considerando a faixa etária de 0 a 19 anos segundo a OMS, morrem diariamente como resultado de violência interpessoal. Geralmente, esta violência ocorre em um espaço de relações de confiança, responsabilidade ou poder – o espaço doméstico11. Word Health Organization (CH). Violence prevention: the evidence. Geneva: World Health Organization; 2010.-22. Violence Prevention Alliance [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2014- Definition and typology of violence; [cited 2015 mar 20]; [about 2 p.]. Available from: http://www.who.int/violenceprevention/approach/definition/en/.
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A OMS utiliza o modelo ecológico para compreensão e abordagem da violência, considerando-a como um problema multifatorial, na interação de quatro níveis – individual, relacional, comunitário e social22. Violence Prevention Alliance [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2014- Definition and typology of violence; [cited 2015 mar 20]; [about 2 p.]. Available from: http://www.who.int/violenceprevention/approach/definition/en/.
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. Assim, orienta o olhar ao contexto onde as pessoas estão inseridas, e não isoladas dele.

Os dispositivos legais e a literatura vêm demonstrando que a organização do olhar/cuidado para fenômenos em rede possibilita melhor intervenção frente aos desafios à promoção da saúde e prevenção de agravos de crianças e adolescentes33. Becker ALMMM, Souza PH, Oliveira MM, Paraguay NLBB. Child protection network and the intersector implementation of the circle of security as alternatives to medication. Rev Paul Pediatr. 2014;32(3):247-81. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0103-0582201432316.
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-44. O’Hare B, Phiri A, Lang HJ, Friesen H, Kennedy N, Kawaza K, et al. Task sharing within a managed clinical network to improve child health in Malawi. Hum Res Health. 2015;13:60. doi: http://dx.doi.org/10.1186/s12960-015-0053-z.
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. Estas redes, sejam pessoais ou institucionais, configuram-se como o compartilhamento de poder, de recursos humanos e de materiais de um conjunto social, formal ou informal, de atores, de grupos e de instituições em um determinado território55. Ude W. Enfrentamento da violência sexual infantojuvenil e construção de redes sociais: produção de indicadores e possibilidades de intervenção. In: Cunha EP, Silva EM, Giovanetti MAC, organizadores. Enfrentamento à violência sexual infantojuvenil: expansão do PAIR em Minas Gerais. Belo Horizonte: UFMG; 2008. p. 30-60.-66. Mendes EV. As redes de atenção à saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2010;15(5):2297-2305. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232010000500005.
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. Destas redes podem emergir o apoio social emocional, instrumental e informativo. O apoio emocional se constitui por meio da conversa e do estabelecimento de relações afetivas entre as pessoas. O apoio instrumental se refere a ações ou a materiais oferecidos para ajudar em tarefas cotidianas. O apoio informativo se relaciona a orientações e informações disponibilizadas sobre recursos da comunidade77. Sousa AI, Silver LD, Griep RH. Social support among elderly women in a low income area in the municipality of Rio de Janeiro. Acta Paul Enferm. 2010;23(5):625-31. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-21002010000500007.
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Tal conceito dialoga com o Paradigma da Complexidade, tomando como referência Edgar Morin, um de seus principais autores, que será utilizado como subsídio para compreender tal objeto. Morin propõe o pensamento complexo para abordar aquilo que é “tecido junto”, o que implica considerar as partes distintas, e às vezes contraditórias, que se articulam na composição do fenômeno, inseridas num contexto, em perspectiva dialógica88. Morin E. Introdução ao pensamento complexo. 3. ed. Porto Alegre: Sulina; 2007..

A compreensão de objeto tão complexo como a rede de apoio nas suas dimensões social, emocional, instrumental e informativa, requer procedimentos metodológicos que permitam contextualizar a problemática da violência contra crianças e adolescentes e apreender o significado das ações que vem sendo realizadas pelos profissionais. Esses novos aspectos podem demandar novas estratégias metodológicas para compreensão da realidade estudada que, por sua vez, demandará um trânsito entre os saberes disciplinares e transdisciplinares, que permitam apontar ações e propostas coordenadas dos diferentes setores envolvidos com as questões da violência.

Destarte, percebe-se que a literatura ainda se mostra incipiente na abordagem multidimensional de fenômenos complexos como a violência doméstica contra crianças e adolescentes, o objetivo deste estudo conhecer e analisar as redes de cuidado a famílias envolvidas na violência contra crianças e adolescentes, na perspectiva de profissionais da Atenção Básica à Saúde (ABS) e familiares.

METODOLOGIA

Estudo de cunho qualitativo, configurando-se como pesquisa social estratégica, ancorada pelo Paradigma da Complexidade. Neste tipo de estudo, consideram-se as percepções, crenças, valores, sentimentos, geralmente em contexto especifico; a pesquisa social estratégico se destina a problemas concretos e focais, emergentes do social, buscando a compreensão e não resolução dos mesmos99. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 11. ed. São Paulo: Hucitec; 2014.. No Paradigma da Complexidade, as noções de compreensão e contextualização nortearam o processo teórico-metodológico, guardando aproximação com o tipo de pesquisa citado. A compreensão busca apreender o significado de um objeto ou acontecimento e suas relações com outros objetos ou acontecimentos, constituindo “feixes de relações, que por sua vez se entretecem, se articulam em teias, em redes, construídas socialmente e individualmente, e em permanente estado de atualização”. A contextualização consiste em estratégias que busquem a compreensão de determinado fenômeno inserido em um contexto, para que adquira significado, e não mais isolado dele88. Morin E. Introdução ao pensamento complexo. 3. ed. Porto Alegre: Sulina; 2007.

9. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 11. ed. São Paulo: Hucitec; 2014.
-1010. Pádua EMM. Complexidade e pesquisa qualitativa: aproximações. Série Acadêmica. 2015;(32):39-48.. Nessa perspectiva, podemos apreender as diferentes dimensões do objeto e, sobretudo, quais aproximações e/ou distanciamentos existem entre as dimensões que compõem o fenômeno a ser estudado.

O campo de estudo foi um município do interior do estado de São Paulo, Brasil, que ocupa uma área de 796 km22. Violence Prevention Alliance [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2014- Definition and typology of violence; [cited 2015 mar 20]; [about 2 p.]. Available from: http://www.who.int/violenceprevention/approach/definition/en/.
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e possui uma população de 1.144.862 habitantes. Os participantes do estudo foram 41 profissionais das unidades de ABS e 15 famílias envolvidas na violência contra crianças e adolescentes. Ressalta-se que a escolha pelas unidades de ABS se deu por se configurarem como centro de comunicação das Redes de Atenção à Saúde, e intermediarem as ações direcionadas ao cuidado da população, apresentando-se como um complexo e multidimensional sistema66. Mendes EV. As redes de atenção à saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2010;15(5):2297-2305. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232010000500005.
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Os dados foram construídos por meio de Mapas Mínimos da Rede Social Institucional Externa (Figura 1) junto aos profissionais de saúde; e por meio dos Mapas Mínimos da Rede Pessoal Social (Figura 2) junto aos familiares. Este primeiro mapa citado foi construído por Ude55. Ude W. Enfrentamento da violência sexual infantojuvenil e construção de redes sociais: produção de indicadores e possibilidades de intervenção. In: Cunha EP, Silva EM, Giovanetti MAC, organizadores. Enfrentamento à violência sexual infantojuvenil: expansão do PAIR em Minas Gerais. Belo Horizonte: UFMG; 2008. p. 30-60., tendo como referência o segundo mapa criado por Sluzki1111. Sluzki CE. A rede social na prática sistêmica: alternativas terapêuticas. São Paulo: Casa do Psicólogo; 1997., e identificam como estão constituídos os vínculos entre as instituições ou pessoas participantes e os grupos organizados na comunidade, formais ou informais, como também as distintas instituições governamentais e não-governamentais e setores, com o objetivo de procurar identificar recursos e lacunas existentes, com vistas a integrar, fortalecer e otimizar a rede social existente.

Figura 1
– Modelo do Mapa Mínimo da Rede Social Institucional Externa (adaptado de Ude, 2008)

Figura 2
– Modelo do Mapa Mínimo da Rede Pessoal Social (adaptado de Sluzki, 1997)

Ambos os mapas são representados por um círculo com quadrantes ao seu redor; no caso do mapa institucional, estes quadrantes são representados pela educação, saúde, área jurídica, segurança, religião, meio ambiente, trabalho, lazer, cultura, assistência social, famílias, entre outros setores sugeridos pelas unidades. Já no mapa pessoal, os quadrantes se relacionam aos campos de amizades, escola/trabalho, e relações comunitárias (religião, esporte, cinema, teatro, clubes, praças, entre outros). Além destes, há um quadrante que abarca a relação com serviços de saúde e de assistência social. Estes mapas (Figuras 1 e 2) permitem a compreensão da maneira que as relações se estabelecem. São delineadas por meio de linhas com traçados diferenciados, que representam graficamente os vínculos entre as famílias e as pessoas/instituições, podendo ser de três tipos: significativos – linhas cinzas em tom escuro; fragilizados – linhas cinzas em tom claro; e rompidos ou inexistentes – linhas pretas1111. Sluzki CE. A rede social na prática sistêmica: alternativas terapêuticas. São Paulo: Casa do Psicólogo; 1997..

Para a construção de ambos os mapas, primeiramente apresenta-se aos participantes os objetivos da pesquisa; posteriormente, apresenta-se o mapa e a forma de construção do mesmo, com as especificidades dos traçados. Ressalta-se a possibilidade de inclusão de instituições e/ou setores a partir da decisão dos participantes, e que a rede será construída a partir do vivenciado pelas pessoas, e não o idealizado55. Ude W. Enfrentamento da violência sexual infantojuvenil e construção de redes sociais: produção de indicadores e possibilidades de intervenção. In: Cunha EP, Silva EM, Giovanetti MAC, organizadores. Enfrentamento à violência sexual infantojuvenil: expansão do PAIR em Minas Gerais. Belo Horizonte: UFMG; 2008. p. 30-60.,1111. Sluzki CE. A rede social na prática sistêmica: alternativas terapêuticas. São Paulo: Casa do Psicólogo; 1997..

A avaliação do desenho dos dois mapas é realizada por meio dos seguintes critérios: tamanho (número de vínculos institucionais ou pessoais estabelecidos, sendo que a rede pode ser classificada como reduzida, mediana ou ampliada); densidade (qualidade dos vínculos observados no que tange às linhas do traçado – significativos, fragilizados, rompidos e/ou inexistentes); distribuição/composição (número de pessoas ou instituições situadas em cada quadrante, podendo a partir deste critério identificar fragilidades e potencialidades da rede); dispersão (distância geográfica entre as pessoas ou instituições participantes e as demais situadas nos mapas); homogênea ou heterogênea (diversidades e semelhanças de pessoas e /ou instituições presentes na rede)55. Ude W. Enfrentamento da violência sexual infantojuvenil e construção de redes sociais: produção de indicadores e possibilidades de intervenção. In: Cunha EP, Silva EM, Giovanetti MAC, organizadores. Enfrentamento à violência sexual infantojuvenil: expansão do PAIR em Minas Gerais. Belo Horizonte: UFMG; 2008. p. 30-60.,1111. Sluzki CE. A rede social na prática sistêmica: alternativas terapêuticas. São Paulo: Casa do Psicólogo; 1997..

As entrevistas semiestruturadas foram usadas como estratégias complementares a estas técnicas. O processo de seleção das unidades de ABS participantes iniciou-se em 14/01/2013, por meio de reuniões com os dirigentes dos Distritos de Saúde do município estudado. O município é dividido geograficamente em cinco distritos de saúde (Norte, Leste, Noroeste, Sudoeste e Sul); desta forma, optou-se pela coleta de dados em uma unidade de ABS de cada distrito. Após a definição, baseada na disponibilidade e organização da equipe local, a coleta de dados foi realizada no período de 24/04/13 a 17/12/13, com 41 profissionais. Os mapas e as entrevistas previamente agendadas foram realizadas com os profissionais, cuja seleção levou em consideração a heterogeneidade dos núcleos profissionais. As reuniões para construção dos mapas foram realizadas previamente à realização das entrevistas, pois nestes espaços os profissionais eram convidados a colaborar com as entrevistas. Todas as reuniões foram realizadas nas unidades de trabalho. O roteiro das entrevistas possuía duas questões abertas, que permitiram um olhar singular do participante sobre a temática, a saber: 1) Diante de um caso suspeito ou confirmado de VICCA, como se dá a atuação da equipe de saúde? 2) Quais as ações realizadas frente a estas situações? As entrevistas tiveram duração aproximada de 20 minutos, foram identificadas com a letra P, e numeradas de acordo com a sequência em que foram realizadas: P1, P2, P3, e assim sucessivamente. A categoria profissional dos participantes não foi destacada, exceto quando existiram informações específicas em que a diferenciação da categoria traria implicações para a análise. Através da análise processual dos dados, os pesquisadores perceberam que houve saturação dos dados após a décima entrevista e, a partir deste momento, finalizaram a inclusão de atores no estudo.

A coleta junto aos familiares foi realizada a partir do contato com uma Organização Não-Governamental (ONG), cofinanciada pela prefeitura do município estudado, que realiza intervenções às famílias envolvidas na violência contra crianças e adolescentes, encaminhadas pelo Conselho Tutelar ou Vara da Infância e Juventude do referido município. Os mapas e as entrevistas foram realizados sequencialmente com 15 familiares acompanhados pelo serviço, selecionadas a partir de discussão com equipe local, de acordo com maior disponibilidade para participação na coleta de dados. O período de coleta junto aos familiares se deu entre 10/07/2015 a 20/11/2015. As construções dos mapas e entrevistas foram realizadas no próprio serviço; na casa dos familiares durante visitas domiciliares da equipe; e no local de trabalho de um familiar, antes do expediente. As entrevistas tiveram duas questões abertas: Você recebeu alguma ajuda para enfrentar as dificuldades da vida? Como você enxerga isso?

As entrevistas tiveram duração aproximada de 15 minutos. A saturação dos dados se confirmou após a 15ª família. Os mapas e as entrevistas dos familiares foram identificadas com as letras F e numeradas de acordo com a sequência em que foram realizadas (F1, F2 e assim sucessivamente).

A gravação das entrevistas junto aos profissionais e famílias foi autorizada, sob garantia de anonimato. As gravações foram realizadas através do programa Easy Voicer, em aparelho com tecnologia MP5, sendo posteriormente transferidas para um microcomputador e transcritas na íntegra. Ressalta-se que a coleta de dados foi realizada previamente junto aos profissionais durante a realização de uma tese de doutorado de uma das autoras. Posteriormente, com a necessidade de complementação dos dados, foi realizada junto aos familiares. Entende-se que, apesar do período de tempo decorrido entre as coletas (aproximadamente dois anos), não se configura como um viés de coleta pois o objetivo do estudo não foi a comparação, e sim a compreensão multidimensional do fenômeno. Ademais, avaliou-se que este período de tempo não trouxe mudanças expressivas para o contexto municipal.

O estudo foi submetido à análise pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, e considerado aprovado em 14 de novembro de 2012, pelo protocolo CAAE 01726512.0.00005393, ofício 217/2012. Ainda, conforme a referida Resolução, foi solicitado aos participantes, o consentimento espontâneo, através da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Para a realização do estudo, além da aprovação municipal, também foi solicitada a autorização distrital e local dos serviços participantes.

Para a análise dos dados, considerou-se as seguintes etapas1010. Pádua EMM. Complexidade e pesquisa qualitativa: aproximações. Série Acadêmica. 2015;(32):39-48.: organização das informações coletadas, com a visão gráfica dos mapas e transcrição das entrevistas, e identificação e categorização dos aspectos mais relevantes e pertinentes ao objeto de estudo; organização de quadros referenciais com os principais pontos das respostas dos profissionais e dos familiares, de forma a se ter uma visão do conjunto das informações que possibilitasse categorizá-las; e construção de quadro que permite o estabelecimento de relações entre os dados, organizados em categorias, que abrangessem os aspectos relacionados ao fenômeno estudado por meio de expressões, concepções e/ou elementos. A análise especifica dos mapas foi realizada, entretanto foi estabelecida a articulação às entrevistas. Em seguida, estabeleceu-se o diálogo entre os dados empíricos e o paradigma da complexidade, bem como literatura cientifica e dispositivos legais. Neste trabalho, apresentaremos a categoria Tecendo a rede.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Caracterização dos participantes

Os profissionais do estudo foram: 17 agentes comunitários de saúde; 4 auxiliares de enfermagem; 4 enfermeiros; 1 terapeuta ocupacional; 4 médicos pediatras; 2 psicólogos; 1 médico psiquiatra; 2 médicos clínicos; 1 auxiliar de saúde bucal; 5 residentes em saúde multiprofissional. Seis profissionais participantes eram do sexo masculino e o restante, do sexo feminino. A maioria dos profissionais tinha entre 31 e 40 anos de idade, havia concluído curso técnico ou superior entre 1 e 5 anos, e trabalhava na UBS pesquisada também por este mesmo período.

Os familiares participantes foram um pai, uma avó e treze mães de crianças e adolescentes acompanhados pelo serviço em questão. Os participantes possuíam entre 18 a 56 anos.

Tecendo a rede

São apresentados a seguir dois mapas, um relacionado à rede social institucional e outro referente à rede social pessoal (Figuras 3 e 4, respectivamente) para melhor visualização desta elaboração.

Figura 3
– Mapa Mínimo da Rede Social Institucional Externa da Unidade 5. Campinas, 2014

Figura 4
– Mapa Mínimo da Rede Pessoal Social da Família 1. Campinas, 2015

Para melhor apreensão da análise dos mapas, realizaremos breve descrição daqueles apresentados acima, apesar de não ser viável a análise especifica de cada um dos mapas construídos neste estudo. O primeiro mapa relativo à Unidade 5 apresenta uma rede mediana e predomínio de vínculos fragilizados, possuindo apenas quatro vínculos significativos, sendo um deles a família. Assim, percebe-se uma rede pouco densa. A dispersão dos vínculos apresentou vínculos próximos ou regionais à unidade, que trata-se de uma política municipal. A proximidade geográfica neste caso não esteve implicada diretamente na significância do vínculo. Desvela-se uma rede homogênea, com predomínio de vínculos em três setores (saúde, educação, assistência social).

O mapa da Família 1 evidenciou uma rede reduzida, com apenas dois vínculos significativos. Também denota-se uma rede pouco densa. A rede apresenta poucas pessoas e instituições, demonstrando lacunas e fragilidades importantes. Os vínculos percebidos estavam próximos geograficamente às famílias, entretanto não teve grande impacto na qualidade dos vínculos. A família extensa contradiz este fato, pois conforme será discutido a seguir, a situação da distância geográfica entre os membros constituiu-se como um fator para rompimento das relações. Apresenta-se como uma rede homogênea pela pouca diversidade entre os vínculos nos quadrantes.

As unidades se localizavam em territórios distintos, mas possuíam particularidades. Duas unidades apresentaram rede mediana, sendo que as demais apresentaram rede reduzida, com poucos vínculos delimitados nos quadrantes. A densidade das redes das cinco unidades foi baixa, pois foram identificados muitos vínculos fragilizados ou rompidos, e poucos vínculos significativos. Em relação à distribuição e composição, observou-se a presença maior de instituições ligadas aos setores da assistência social e educação; e lacunas importantes evidenciadas pela ausência de vínculos institucionais nos outros setores.

Com relação aos mapas dos familiares, as redes também foram reduzidas, com aproximadamente sete vínculos pessoais e institucionais. Os vínculos predominantemente foram fragilizados e inexistentes, denotando uma rede pouco densa e com apoio social limitado em vários aspectos:

Não, não tenho ninguém assim, com quem contar... (F 2)

O fato do que aconteceu na minha vida né [situação de violência], muitos acham que, discrimina né...(F 3)

Apesar dos apontamentos da literatura cientifica atual e diretrizes de órgãos de proteção à infância e adolescência oficiais, o cuidado em rede ainda representa um grande desafio principalmente por buscar superar o paradigma dominante, com uma lógica divisionista. Neste estudo, compreendeu-se que os profissionais e as famílias desvelaram vivências – de gestão, cuidado e pessoais – centradas nesta lógica de fragmentação.

No âmbito da assistência social, os profissionais mostraram desconhecimento da organização, incluindo alguns serviços em setores diferentes daquele a que realmente pertenciam:

Mas eu acho que também por não conhecer, eu particularmente não vejo resolutividade no trabalho... (P 5).

Então assim, essa política da assistência está muito confusa, né... (P 1).

O número de entidades privadas no setor da assistência social é significativamente maior que o de entidades estatais. Ressalta-se que os processos de trabalho diferem daqueles executados pelas entidades estatais, e sofrem alterações frequentes. Desta forma, a própria constituição dos serviços assistenciais acaba gerando fragilidades e lacunas para o entendimento da organização do setor.

Para os familiares, dialogicamente o vínculo junto à ONG, que se constitui como um serviço da assistência social, sempre foi significativo, sendo importante fonte de apoio social informativo, material e, em alguns momentos, afetivo:

[...] E assim não tem ninguém pra conversar, além das meninas da ONG… (F 7)

Para as famílias, percebe-se a necessidade de um serviço e um profissional como “referencial”, que coordene o cuidado e o acompanhe longitudinalmente. O setor educação deve se apresentar como um dos principais pilares para a proteção de crianças e adolescentes, tendo papel essencial na socialização desta população. Entretanto, de acordo com os profissionais, a articulação saúde-educação ainda não ocorre efetivamente:

A escola também não se responsabiliza pela questão da violência, eles transferem toda a situação, eles vem, te contam a história mais cabeluda possível e falam “ai estou com um problema”, entendeu? (P 1)

Para as famílias, o vínculo com a escola foi percebido como fragilizado, em especial pela falta de reciprocidade. Os familiares se referiram a um programa social de transferência de renda como a principal fonte de apoio instrumental; na premissa deste programa, se apresenta a obrigatoriedade da criança ou do adolescente ser acompanhado pela unidade de ABS e estar frequentando a escola.

Os profissionais de saúde identificaram as famílias e a comunidade, em especial os conselhos locais de saúde (organizações de controle social formadas por usuários, gestão e trabalhadores), como vínculos significativos com a unidade. Já os familiares denotaram um vínculo fragilizado junto à unidade de APS:

É sempre difícil, agendar consultas, tem que ir várias vezes (F 3).

Eles nunca podem atender, é difícil... (F 11)

A assistência social, a educação e a saúde, apesar do lugar legitimo para proteção à infância e adolescência, não podem ser os únicos serviços para este fim. A violência se constitui como um fenômeno complexo, e o olhar precisa ser direcionado às famílias. Ações culturais, de lazer, transporte, segurança, judiciário dentre tantos outros setores e equipamentos se fazem necessárias para que se alcance a proteção integral desta população. Recente estudo sobre a rede de proteção à violência sexual sob a ótica dos conselheiros tutelares reforçou a necessidade do cuidado articulado em rede, que ainda não ocorre, em nível local, municipal, nacional e internacional1212. Deslandes SF, Campos DS. A ótica dos conselheiros tutelares sobre a ação da rede para a garantia da proteção integral a crianças e adolescentes em situação de violência sexual. Ciênc Saúde Coletiva. 2015;20(7):2173-82. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232015207.13812014.
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Neste âmbito, os olhares precisam ser direcionados também às políticas públicas. A atuação e o enfrentamento de agravos contemporâneos em redes tem se apresentado como um novo processo em contraposição a abordagens tradicionais das políticas públicas, que são pautadas em ações fragmentadas, pontuais e compensatórias, gerando intervenções simplificadas e segmentadas, frente a fenômenos complexos55. Ude W. Enfrentamento da violência sexual infantojuvenil e construção de redes sociais: produção de indicadores e possibilidades de intervenção. In: Cunha EP, Silva EM, Giovanetti MAC, organizadores. Enfrentamento à violência sexual infantojuvenil: expansão do PAIR em Minas Gerais. Belo Horizonte: UFMG; 2008. p. 30-60.. Identificou-se em nosso estudo que as políticas públicas respondem às vulnerabilidades das famílias de forma fragmentada, apesar de alguns avanços.

Esta problemática tem provocado a ruptura ou a duplicidade de ações, e não revela toda a potencialidade institucional para o cuidado, além de não oferecer um cuidado integral às famílias, pois pressupõe-se que este pode ser alcançado pela articulação e integração interinstitucional e intersetorial. Desta forma, as famílias ficam submetidas a diversas ações atomizadas, muitas vezes levando à não interrupção do ciclo da violência. Grande parte das políticas sociais desconsideram o universo familiar e comunitário, ou o(s) território(s) em que as famílias vivem, inclusive com a consideração de contextos específicos, tendo o tráfico de drogas e o crime organizado como poder bastante legitimado1313. Carlos DM, Ferriani MGC. Family violence against children and adolescents in context: How the territories of care are imbricated in the picture. Rev Latino-Am Enfermagem. 2016;24:e2735. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.0593.2735.
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-1414. Serapioni M. O papel da família e das redes primárias na reestruturação das políticas sociais. Ciênc Saúde Coletiva. 2005;10(Suppl):243-53. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232005000500025.
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Para as famílias, os intercâmbios realizados foram afetivos junto aos demais familiares, e materiais relacionados aos amigos. Entretanto, percebeu-se uma atividade migratória intensa, dificultando a vinculação com a família extensa:

Nós não temos família aqui, entendeu, minha família toda está em Natal no Rio Grande do Norte e sempre na minha dificuldade eu ligo direto lá para a S. [profissional da ONG] porque ela a distância pra me ajudar, e quando elas não podem ajudar, elas indicam como é que eu devo resolver, ai de mim se não fosse elas ao meu lado para me orientar, elas me orientam. (F 10)

No sentido da dispersão, que se relaciona à distância geográfica entre as instituições e/ou pessoas, indicou que, para os profissionais, os vínculos significativos não se relacionaram diretamente com a proximidade geográfica. Os profissionais ressaltaram a existência de outras formas de se estabelecer a comunicação, em especial relacionadas à tecnologia, considerada como um importante fator para o funcionamento efetivo da rede. Já para os familiares, a distância geográfica se apresentou diretamente relacionada à maior fragilidade ou rompimento dos vínculos; denotaram dificuldades para acessarem alguns serviços pelas distâncias físicas.

Para as famílias e profissionais, as redes foram homogêneas, com a presença de instituições de um mesmo setor, em especial saúde, assistência social e educação; e ausências nos demais. Percebeu-se que a família apresenta pouca participação comunitária, não identificando grande aporte de serviços ou grupos de pertencimento.

Estas fragilidades e lacunas denotadas são geradoras e, simultaneamente, geradas por uma atenção fragmentada às famílias. O cuidado integral, longitudinal e coordenado ainda emerge como desafio; as famílias apresentam dificuldades para acesso eficaz aos serviços e estes não atuam em rede:

Porque não teve intervenção com a família enquanto a criança estava lá. A mãe ficou sendo atendida no Conselho, “ela tá boazinha então devolve”. Mas não houve de fato uma mudança na dinâmica da família... (P 2)

Fazer esse trabalho conjunto e não é a ideia de encaminhar para o outro, mas é a ideia de fazer parceria. Eu acho que é muito fraco ainda na rede, parceria... (P 3)

O paradigma da complexidade dialoga diretamente com a concepção de rede. De fato, ao considerar a contextualização como principal foco do princípio hologramático, o autor enfatiza as articulações todo/partes, simples/complexo, unidade/diversidade, que permitem considerar um objeto em seu contexto. No entanto, importante pontuar que a contextualização proposta por Morin não se apresenta como ‘justaposição’, como ‘acúmulo’ de informações, como ‘empilhamento’ de informações, mas como desvelamento das inúmeras relações que constituem e permitem se trabalhar em rede e perceber “as relações mútuas e as influências recíprocas entre partes e todo em um mundo complexo”88. Morin E. Introdução ao pensamento complexo. 3. ed. Porto Alegre: Sulina; 2007.

9. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 11. ed. São Paulo: Hucitec; 2014.

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http://dx.doi.org/10.1590/1413-812320152...

13. Carlos DM, Ferriani MGC. Family violence against children and adolescents in context: How the territories of care are imbricated in the picture. Rev Latino-Am Enfermagem. 2016;24:e2735. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.0593.2735.
http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.0593...

14. Serapioni M. O papel da família e das redes primárias na reestruturação das políticas sociais. Ciênc Saúde Coletiva. 2005;10(Suppl):243-53. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232005000500025.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232005...
-1515. Morin E. Ensinar a viver: manifesto para mudar a educação. Porto Alegre: Sulina; 2015.. Nesse sentido, o estudo mostrou a importância da ampla contextualização das múltiplas dimensões que envolvem a questão da violência, bem como a necessidade de se fortalecer as relações entre as diferentes dimensões do fenômeno – em particular as relações entre educação, assistência social e saúde – como real possibilidade de se organizarem ações mais integradas, ou seja, em rede.

A adoção de políticas públicas, baseadas no trabalho em redes, vem crescendo desde 1990, buscando superar ou substituir um modelo de assistência burocrático e hierarquizado, por um modelo pautado em tessituras flexíveis, compartilhamento, e interdependência em compromissos e resultados66. Mendes EV. As redes de atenção à saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2010;15(5):2297-2305. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232010000500005.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232010...
. Daqui se pode inferir que o trabalho em redes traz a noção de vinculação nos mais variados contextos: familiar, institucional e comunitária. A atenção prestada às famílias, delineada pelas políticas sociais, vem sendo considerada como uma prática conservadora e pouco eficaz, pois está enraizada em uma cultura tutelar e estigmatizante, que não investe na autonomia do grupo familiar1414. Serapioni M. O papel da família e das redes primárias na reestruturação das políticas sociais. Ciênc Saúde Coletiva. 2005;10(Suppl):243-53. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232005000500025.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232005...
. Estudo que analisou a possibilidade de denúncia da violência por mulheres sobreviventes mediante o reconhecimento de sua rede social, identificou a fragilidade e ações pontuais principalmente pela saúde, bem como ausência de estratégias emancipadoras destas mulheres1616. Vieira LB, Souza IEO, Tocantins FR, Pina-Roche F. Support to women who denounce experiences of violence based on her social network. Rev Latino-Am Enfermagem. 2015;23(5):865-73. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0104-1169.0457.2625.
http://dx.doi.org/10.1590/0104-1169.0457...
.

Estudos recentes reforçam a importância da articulação de programas e setores para reduzir a vulnerabilidade de grupos populacionais, particularmente de crianças e adolescentes, e reconhecem suas habilidades, talentos e capacidade criativa para a (re)criação de diversas realidades1717. Leite JT, Beserra MA, Scatena L, Silva LMP, Ferriani MGC. Coping with domestic violence against children and adolescents from the perspective of primary care nurses. Rev Gaucha Enferm. 2016;37(2):e55796. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2016.02.55796.
http://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2016...
-1818. Monteiro EM, Neto WB, Lima LS, Aquino JM, Gontijo DT, Pereira BO. Culture circles in adolescent empowerment for the prevention of violence. Int J Adolesc Youth. 2015;20(2):167-84. doi: http://dx.doi.org/10.1080/02673843.2014.992028.
http://dx.doi.org/10.1080/02673843.2014....
. As ações de enfrentamento à violência devem ser associadas ao direito da população e da comunidade de participar das decisões no cuidado em saúde pública, com aproximações inclusivas e deliberativas, como júris cidadãos1919. Street J, Duszynski K, Krawczyk S, Braunack-Mayer A. The use of citizens’ juries in health policy decision-making: a systematic review. Soc Sci Med. 2014;109:1-9. doi: http://dx.doi.org/10.1016/j.socscimed.2014.03.005.
http://dx.doi.org/10.1016/j.socscimed.20...
-2020. Wiggins N. Popular education for health promotion and community empowerment: a review of the literature. Health Promot Int. 2012;27(3):356-71. doi: http://dx.doi.org/10.1093/heapro/dar046.
http://dx.doi.org/10.1093/heapro/dar046...
.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Retomando o objetivo inicial, o estudo denotou uma rede de apoio fragilizada e com lacunas importantes, tanto sob a ótica de profissionais da ABS, quanto das famílias envolvidas na violência contra crianças e adolescentes. Os mapas evidenciaram uma rede homogênea, de baixa densidade, pequena, e com poucos vínculos significativos. Os achados mostram a necessidade da construção e/ou efetivação de políticas públicas direcionadas a esta população, com o empoderamento do núcleo familiar e comunitário. Apresentam ainda, do ponto de vista teórico-metodológico: (1) a necessidade de se promover o desenvolvimento de um conhecimento capaz de compreender fenômenos multidimensionais, problemas que são, ao mesmo tempo, globais e locais, universais e singulares e, portanto, complexos; (2) que o Mapa Mínimo da Rede Social Institucional Externa e da Rede Familiar se mostrou uma estratégia multidimensional facilitadora da contextualização e compreensão de fenômeno tão complexo como o estudado.

A Saúde e a Enfermagem podem emergir como agentes potencializadores de debates nesta temática, indicando caminhos interdisciplinares e intersetoriais, buscando a transdisciplinaridade para o cuidado a famílias envolvidas em dinâmicas violentas. Novos estudos, em especial no âmbito de pesquisas participativas e de intervenção, podem sinalizar novos caminhos para o enfrentamento da problemática aqui tratada, bem como no âmbito da prevenção primaria e secundária.

Agradecimentos

à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP, Processo 2015/14668-9, pelo financiamento deste estudo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    19 Dez 2016
  • Aceito
    22 Maio 2017
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