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Representações sociais sobre terapia comunitária integrativa construídas por idosos

Representaciones sociales acerca de la terapia comunitaria integradora construida por ancianos

RESUMO

Objetivo

Conhecer as representações sociais dos idosos concernentes à terapia comunitária integrativa (TCI).

Método

Estudo exploratório, realizado com 273 idosos de um município no nordeste do Brasil, em 2014, tendo por base a teoria das representações sociais e a aplicação do teste de associação livre de palavras por meio do termo indutor “terapia comunitária integrativa”. Os dados foram processados pelo software EVOC e examinados pela abordagem estrutural das representações sociais, realizando-se uma análise de similitude, bem como o confronto com a literatura.

Resultados

A organização e o significado das representações de terapia comunitária integrativa ocorreram, principalmente, através do elemento central: Grupo.

Conclusão

A análise permitiu inferir que a TCI constitui uma rede de apoio para idosos, na qual se verificam um sentimento de pertencimento a um grupo e o empoderamento dos participantes através de sua participação nas rodas.

Terapêutica; Idoso; Saúde mental

RESUMEN

Objetivo

Conocer las representaciones sociales de los ancianos acerca de la Terapia Comunitaria Integradora (TCI).

Método

Estudio exploratorio, con 273 ancianos de una ciudad en el nordeste de Brasil, en 2014, basado en la teoría de las representaciones sociales y la aplicación de la prueba de asociación libre de palabras, por medio del término inductor “terapia comunitaria integradora”. Los datos fueron procesados por el software EVOC y examinados por el enfoque estructural de las representaciones sociales, poniendo de relieve un análisis similar, así como la confrontación con la literatura.

Resultados

La organización y el significado de las representaciones de la TCI se producen a través, sobre todo del elemento central: Grupo.

Conclusión

El análisis permite inferir la función TCI como una red de apoyo para la tercera edad, reflejada en el sentimiento de pertenencia a un grupo. Por último, refleja el empoderamiento de los ancianos mediante la participación en las ruedas de TCI.

Terapéutica; Anciano; Salud mental

ABSTRACT

Objective

To elicit the social representations of the elderly regarding integrative community therapy (ICT).

Method

This is an exploratory study conducted with 273 elderly people in a municipality of northeastern Brazil, in 2014. It is based on the theory of social representations and the free-association test for the inductor term “integrative community therapy”. The data were processed using EVOC software and examined with the structural approach of social representations, followed by a similarity analysis and confrontation with literature.

Results

The organisation and meaning of the representations of ICT chiefly occurred through the core element: Group.

Conclusion

The analysis revealed that the ICT is a support network for the elderly, where they feel they belong to a group and feel empowered through participation in the sessions.

Therapeutics; Aged; Mental health

INTRODUÇÃO

Pela localização estratégica da atenção básica, porta de entrada preferencial do Sistema Único de Saúde (SUS), é comum que os profissionais se encontrem a todo o momento com pacientes em situação de sofrimento psíquico. Apesar de uma política bem estruturada, ainda se observa, no entanto, a fragilidade desse nível de atenção, no sentido de oferecer propostas de intervenções para usuários em situação de sofrimento emocional.

Fazem-se necessárias a incorporação ou o aprimoramento de competências de cuidado em saúde mental na prática diária dos profissionais, de modo que suas intervenções sejam capazes de considerar a subjetividade, a singularidade e a visão de mundo do usuário no processo de cuidado integral à saúde(11. Carvalho MAP, Ferreira Filha MO, Miranda FAN, Dias MD. Contribuições da terapia comunitária integrativa para usuários dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS): do isolamento à sociabilidade libertadora. Cad Saúde Pública. 2013 [citado 2015 jan 10];29(10):2028-38. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/csp/v29n10/a19v29n10.pdf.
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). Como exemplo dessas intervenções em grupo, podemos destacar uma modalidade terapêutica, a terapia comunitária integrativa (TCI), que consiste na criação de um espaço de partilha de experiências de vida e de sofrimento em que os participantes, formando um círculo, sentam-se lado a lado e falam sobre suas dores, seus sofrimentos, além de buscarem acolhimento para expressão dos seus sentimentos(22. Ferreira Filha MO, Lazarte R, Dias MD. Terapia comunitária integrativa: uma construção coletiva do conhecimento. João Pessoa: Ed. UFPB; 2013.).

No cenário da Atenção Básica em Saúde (ABS), a TCI foi oficialmente incorporada em 2008, com a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC). Posteriormente, em 2013, a TCI foi recomendada pela Política Nacional de Saúde Mental como uma intervenção psicossocial avançada que visa à ampliação do cuidado nessa área, uma vez que aqueles que dele necessitam foram apontados como pertencentes a grupos em situação de vulnerabilidade social.

Nesse sentido, os estudos sobre a aplicabilidade e as repercussões da TCI com idosos revelaram a sua eficácia como estratégia de cuidado para com este grupo. Isso se deu, em especial, porque os idosos foram apontados como os usuários mais assíduos às rodas de TCI, seguidos das pessoas acometidas com transtornos mentais e de usuários de substâncias psicoativas que participam de rodas nos Centro de Atenção Psicossocial. Os achados também revelaram que a TCI constitui uma estratégia de enfrentamento de desafios vivenciados no cotidiano dos idosos que frequentam os encontros, possibilitando uma significativa melhoria da autoestima e a construção de uma teia de solidariedade na comunidade(33. Cordeiro RC, Azevedo EB, Braga LAV, Silva JJS, Silva PMC, Ferreira Filha MO. Inclusão de pessoas em situação de sofrimento psíquico através da terapia comunitária integrativa. Rev Enferm UFPE On line. 2013 [citado 2015 jan 10];7(11):6317-21. Disponível em: http://www.revista.ufpe.br/revistaenfermagem/index.php/revista/article/download/3794/7662.
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4. Rocha IA, Sá ANP, Braga LAV, Ferreira Filha MO, Dias MD. Terapia comunitária integrativa: situações de sofrimento emocional e estratégias de enfrentamento apresentadas por usuários. Rev Gaúcha Enferm. 2013 [citado 2015 jan 10];34(2):155-62. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v34n3/a20v34n3.pdf.
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-55. Moura SGM, Ferreira Filha MO, Carvalho MAP. Evolução histórica da abordagem em saúde mental no Brasil: da reforma psiquiátrica aos dias atuais. Rev Enferm UFPE On line. 2012 [citado 2015 jan 10];6(3):657-64. Disponível em: http://www.revista.ufpe.br/revistaenfermagem/index.php/revista/article/view/2172/pdf_1032.
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).

Grupo mais frequente nas rodas de TCI(22. Ferreira Filha MO, Lazarte R, Dias MD. Terapia comunitária integrativa: uma construção coletiva do conhecimento. João Pessoa: Ed. UFPB; 2013.), como ressaltado, optou-se por trabalhar com idosos neste estudo, diante da necessidade de que gestores do SUS e formuladores de políticas públicas para a pessoa idosa conheçam tal intervenção. Afinal, tal conhecimento pode fortalecer decisões de inclusão da TCI em espaços de convivência e de reformulação daqueles já existentes, através da oferta de tecnologias de baixo custo para grandes grupos populacionais e com excelentes níveis de resolubilidade.

Isto posto, cumpre salientar que o presente estudo se focou na questão de quais são as representações sociais de idosos referentes à terapia comunitária integrativa. Nesse sentido, o estudo tem sua relevância na contribuição para a atualização de profissionais de saúde e da comunidade acadêmica no que tange à saúde mental comunitária. Reitera-se, especialmente, que a TCI ocupa papel de destaque nas pesquisas nacionais. Porém, a maioria dos estudos(22. Ferreira Filha MO, Lazarte R, Dias MD. Terapia comunitária integrativa: uma construção coletiva do conhecimento. João Pessoa: Ed. UFPB; 2013.

3. Cordeiro RC, Azevedo EB, Braga LAV, Silva JJS, Silva PMC, Ferreira Filha MO. Inclusão de pessoas em situação de sofrimento psíquico através da terapia comunitária integrativa. Rev Enferm UFPE On line. 2013 [citado 2015 jan 10];7(11):6317-21. Disponível em: http://www.revista.ufpe.br/revistaenfermagem/index.php/revista/article/download/3794/7662.
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4. Rocha IA, Sá ANP, Braga LAV, Ferreira Filha MO, Dias MD. Terapia comunitária integrativa: situações de sofrimento emocional e estratégias de enfrentamento apresentadas por usuários. Rev Gaúcha Enferm. 2013 [citado 2015 jan 10];34(2):155-62. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v34n3/a20v34n3.pdf.
http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v34n3/a20...
-55. Moura SGM, Ferreira Filha MO, Carvalho MAP. Evolução histórica da abordagem em saúde mental no Brasil: da reforma psiquiátrica aos dias atuais. Rev Enferm UFPE On line. 2012 [citado 2015 jan 10];6(3):657-64. Disponível em: http://www.revista.ufpe.br/revistaenfermagem/index.php/revista/article/view/2172/pdf_1032.
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) tem sua investigação pautada em outros aportes teóricos, sendo ainda inédita a aplicabilidade da teoria das representações sociais. A pesquisa é originária da dissertação intitulada “Estrutura das Representações Sociais construídas por idosos e profissionais de saúde sobre a Terapia Comunitária Integrativa”.

MÉTODO

Trata-se de um estudo exploratório ancorado na abordagem estrutural da teoria das representações sociais (TRS), a qual envolve, como critério, a existência de um objeto – aquilo que está sendo investigado – e a existência de um sujeito – aquele que representa esse objeto investigado(66. Moscovici S. Representações sociais: investigações em psicologia social. 8. ed. Petrópolis: Vozes; 2011.). No caso do presente estudo, o sujeito consiste no idoso, e o objeto, na terapia comunitária integrativa.

A população do estudo contemplou idosos de ambos os sexos, residentes nos bairros Grotão e Comunidade Maria de Nazaré, localizados na zona sul do município João Pessoa, Paraíba, Brasil. A amostra consistiu em 263 idosos. Os critérios de inclusão foram: ter idade igual ou superior a 60 anos e residir no setor censitário há mais de 6 meses. Por sua vez, os critérios de exclusão foram: idosos que não fossem frequentadores regulares das rodas de TCI.

O processo de amostragem foi probabilístico, por conglomerado de duplo estágio. O setor censitário foi considerado como a unidade primária de amostragem, com probabilidade proporcional ao tamanho do setor, identificado segundo o censo demográfico do ano 2000 (600 setores em João Pessoa). A rua correspondeu à unidade sorteada num segundo estágio. Tal procedimento manteve a autoponderação da amostra final de pessoas ≥ 60 anos residentes na área urbana do respectivo município. Decidiu-se por uma amostra de 263 idosos, a qual garantiu um erro máximo de 6,3%, com 95% de probabilidade. Para chegar-se ao valor de n=240, sortearam-se 20 setores censitários entre os 617 existentes. Isto resultou em frações amostrais idênticas para todos os indivíduos.

A coleta de dados, realizada no período de agosto a dezembro de 2011, ocorreu através da aplicação do teste de associação livre de palavras (TALP) – utilizado para apreensão de informações norteadoras da estrutura das representações sociais (RSs) – e do questionário com dados sobre o perfil sociodemográfico. Solicitou-se aos sujeitos que falassem cinco palavras ou expressões que lhes ocorriam imediatamente, em relação ao termo indutor “terapia comunitária integrativa”. Em seguida, a palavra mais importante citada era destacada no instrumento com um asterisco (*). Não houve viés de compreensão por parte do TALP no que concerne à questão indutora.

A análise das variáveis sociodemográficas envolveu descrição estatística (frequência relativa, média e mediana), com auxílio do programa informático Statistical Package for Social Sciences – SPSS 16.1. Os dados empíricos coletados foram categorizados e organizados num banco de dados, formando o corpus que foi analisado com o auxílio do software Ensemble de Programmes Permettant L’analyse des Evocations – EVOC, cuja função é calcular e informar a frequência simples (f) de ocorrência de cada palavra, além da média ponderada em função da ordem de evocação (OME), bem como a média das ordens médias ponderadas do conjunto dos termos evocados (OME). Nessa investigação, o ponto de corte utilizado foi uma frequência acima do valor 14.

A análise estrutural dos dados levou em consideração a ordem de evocação e a frequência de evocação, possibilitando identificar, assim, os conteúdos da estrutura da representação no estudo. Posteriormente, as coocorrências das categorias encontradas foram avaliadas através da análise de similitude. Por fim, realizou-se a discussão embasada em estudos sobre a temática, a fim de destacar os aspectos cognitivos no que concerne às RSs dos sujeitos.

A investigação foi previamente aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Lauro Wanderley/UFPB, Protocolo CEP/HULW nº 261/09. Saliente-se que os sujeitos participaram voluntariamente da pesquisa. Todos preencheram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, atendendo à Resolução 466/2012 do Ministério da Saúde, Conselho Nacional de Saúde, Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, bem como as diretrizes e normas que regem pesquisas envolvendo seres humanos(77. Ministério da Saúde (BR). Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil. 2013 jun 13;150(112 Seção 1):59-62.).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os 263 idosos apresentaram como perfil idade entre 60 e 100 anos e média de idade de 70,08 anos. Eram, em sua maioria, do sexo feminino (73,07%), casados (52,9%) e católicos (72,1%). Possuíam renda familiar de 1 a 3 salários mínimos (40,4%) e baixo nível de escolaridade (até 5 anos de tempo na escola, 27,9%).

A partir da análise lexicográfica do corpus, emergiram 1.315 evocações, com 400 palavras diferentes, expondo a polissemia do termo indutor. Em seguida, foram calculadas as frequências médias (a saber, 39) e as ordens médias de evocação (a saber 3), nas quais o cruzamento de tais elementos e a análise combinada possibilitaram a construção do diagrama de quatro quadrantes, tal como representado no quadro 1 abaixo.

Quadro 1
– Visualização do Núcleo Central. Representações Sociais sobre Terapia Comunitária Integrativa construída por idosos: frequência e ordem média das evocações. João Pessoa – PB, 2011

Para a descrição dos resultados, adotou-se a abordagem estrutural das RS. Os termos que, ao mesmo tempo, atenderam aos critérios de evocação com maior frequência e aos primeiros lugares supostamente tiveram uma maior importância no esquema cognitivo do sujeito e se configuraram como hipótese de núcleo central da representação social(88. Abric JC. L’analyses structurale des repressentations sociales. In: Moscovici S, Buschini F. Les mèthods des sciences humaines. Paris: PUF; 2003. p. 375-92.).

Considerando-se a saliência como característica dos elementos centrais na comparação das frequências de evocação e de importância, verificou-se que a diferença era maior que 80% para os elementos Grupo e Problema, o que caracterizou a ampliação de sentido do núcleo central. A estrutura prototípica sugere que, através da TCI, os idosos puderam despertar o sentimento de pertencimento a um Grupo e a construção de laços de Amizade, elemento este da primeira periferia, mais próxima ao núcleo central.

Esse resultado indicou a relevância da realização de um estudo de saúde mental preventiva em que todos os elementos culturais e sociais da comunidade se voltassem para dar ênfase ao trabalho em grupo e à criação gradual da consciência social, suscitando ações terapêuticas notadamente transformadoras, apoiadas nas competências e na formação de uma teia de apoio(99. Piexak DR, Freitas PH, Backes DS, Moreschi C, Ferreira CLL, Souza MHT. Percepção de profissionais de saúde em relação ao cuidado a pessoas idosas institucionalizadas. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2012;15(2):201-8. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1809-98232012000200003.
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-1010. Azevedo EB, Ferreira Filha MO. Práticas inclusivas na rede de atenção à saúde mental: entre dificuldades e facilidades. Rev Ciênc Saúde. 2012 [citado 2015 jan 10];5(2):60-70. Disponível em: http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/faenfi/article/view/10657/8205.
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). Mais do que isso, cumpre ainda ressaltar, a TCI foi representada pelos sujeitos do estudo como um espaço de Ajuda. Ademais, considerando a metodologia dessa intervenção, na etapa de problematização, as pessoas compartilharam suas experiências e contaram suas estratégias de enfrentamento, ao passo que, no encerramento da roda, houve uma comunhão de sentimentos e a solidificação de uma rede de apoio.

Um dos pilares teóricos dessa tecnologia de cuidado – o pensamento sistêmico – diz que os problemas podem ser entendidos e resolvidos quando são percebidos como partes integradas de uma rede complexa, com ramificações, que interligam as pessoas num todo(1111. Padilha CS, Oliveira WF. Terapia comunitária: prática relatada pelos profissionais da rede SUS de Santa Catarina, Brasil. Interface: Comunic Saude Educ. 2012 [citado 2015 jan 10];16(43):1069-83. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/icse/v16n43/aop4912.pdf.
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). Essa rede ganha força através da Comunicação, a qual constitui, inclusive, um dos pilares teóricos da TCI – a Pragmática da Comunicação de Watzlawick, isto é, a concepção de que todo comportamento tem valor de comunicação, tal como todo sintoma também o tem. Isso quer dizer que a consciência que se tem de si é fruto de uma relação de comunicação com o outro(1212. Foucault M. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. 9. ed. São Paulo: Martins Fontes; 2014. p. 129-30.).

Tal resultado retoma a noção de que, em toda cultura, entre o uso dos denominados códigos ordenadores e as reflexões sobre ordem, há a experiência nua da ordem, seus modos de ser e de propiciar relações(1313. Daniel F, Simões T, Monteiro R. Representações sociais do envelhecer no masculino e do envelhecer no feminino. Ex Aequo. 2012 [citado 2015 jan 10];(26):13-26. Disponível em: http://www.scielo.mec.pt/pdf/aeq/n26/n26a03.pdf.
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). Com efeito, tais achados confirmaram o importante papel das representações sociais para a instituição de realidades consensuais, no sentido de orientar as comunicações e condutas em face do novo.

Essa representação permitiu chegar à compreensão de que todos eram responsáveis por encontrar soluções para os Problemas, de que todos contribuíam para isso. Na roda de TCI, os participantes expuseram suas inquietações. Ali, o olhar para a comunidade revelou que os problemas e crises enfrentados tinham consequências de ordem biológica, social e psíquica.

De fato, situações desse tipo tendem a fomentar a busca por formas alternativas de lidar com os agravos vivenciados pela população, de modo que as rodas se mostram um espaço de promoção da corresponsabilidade do grupo pela busca de soluções e de superações dos problemas, a fim de resgatar nos indivíduos a Alegria perante a vida, a autoestima, a tomada de decisões e o compartilhamento das emoções(99. Piexak DR, Freitas PH, Backes DS, Moreschi C, Ferreira CLL, Souza MHT. Percepção de profissionais de saúde em relação ao cuidado a pessoas idosas institucionalizadas. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2012;15(2):201-8. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1809-98232012000200003.
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).

Cumpre destacar que, ao serem indagados sobre essa tecnologia de cuidado, os sujeitos ainda a representaram como uma das Atividades que fazem parte do rol das ações preventivas em saúde. O uso de tais recursos estimula o interesse pela participação nas rodas, bem como o resgate e fortalecimento de valores, saberes e competências individuais e comunitárias dos participantes(1313. Daniel F, Simões T, Monteiro R. Representações sociais do envelhecer no masculino e do envelhecer no feminino. Ex Aequo. 2012 [citado 2015 jan 10];(26):13-26. Disponível em: http://www.scielo.mec.pt/pdf/aeq/n26/n26a03.pdf.
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).

Neste trabalho, a verificação da hipótese de centralidade, por sua vez, foi realizada com a análise de similitude das relações estabelecidas pelos elementos e pelas coocorrências existentes entre essas categorias, o que tornou mais fácil a identificação dos processos de categorização e esquematização existentes(1414. Silva LM, Silva AO, Tura LFR, Moreira MASP, Rodrigues RAP, Marques MC. Representações sociais sobre qualidade de vida para idosos. Rev Gaúcha Enferm. 2012 [citado 2015 jan 10];33(1):109-15. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v33n1/a15v33n1.pdf.
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). A árvore de similitude pode ser visualizada na Figura 1.

Figura 1
– Árvore de similitude das RSs de Idosos. João Pessoa, PB, 2011

Conforme se vê na figura 1, no que concerne às representações de terapia comunitária integrativa, observa-se que a árvore máxima de similitude do corpus evocado pelos idosos revelou a existência de duas estrelas: a do elemento Grupo e a do elemento Amizade. A primeira estabelece relação com troca, desconhece, tratamento, convivência e problema. Vale notar ainda que 21 indivíduos apresentaram relação entre Grupo e Profissionais, ou seja, um índice de similitude mais significativo nesse grupo.

Por sua vez, o elemento Amizade aparece articulado com alegria, diversão, viagem, desabafo, arte, reunião, experiência, conhecimento e convivência. Demonstra, também, maior relação com o elemento Viagem, indicando maior similitude entre os dois, devido ao fato de que 24 indivíduos estabeleceram relação entre os elementos Amizade e Viagem. Os resultados mostram que esses dois elementos, Grupo e Amizade, foram os que apresentaram maior poder de conexidade, uma característica do núcleo central das RS. Apesar de aparecer na primeira periferia, o elemento Amizade mostrou forte relação com os elementos centrais e, inclusive, comportamento semelhante, confirmando seu poder simbólico. Assim, em função da observância do critério de centralidade ou da conexidade, passam a ser nove os elementos centrais da representação.

Além disso, registrou-se a constatação de três círculos: um decorrente da conexão de grupo, profissionais, comunicação e tratamento; outro conectando grupo, tratamento, comunicação e desconhece; e, por fim, um círculo estabelecendo relação entre grupo, conhecimento, amizade e convivência. Quanto a isso, convém ressaltar que o maior índice de similitude (17) foi o estabelecido entre Grupo e Conhecimento. Ademais, vale notar que todos têm Grupo como elemento comum, confirmando seu poder simbólico.

A análise permite ainda inferir a característica de centralidade do elemento Grupo, o que evidencia ser a TCI uma rede de apoio para os idosos, refletida no sentimento de pertencimento a um grupo. Para esses sujeitos, o grupo desperta o conhecimento de si e do outro através da convivência, o que facilita o estabelecimento de relações de amizade. A partir da comunicação, aquilo que era desconhecido se revela no conjunto, e as pessoas obtêm ajuda dos profissionais, no caso os terapeutas comunitários.

Cabe ressaltar que a capacidade de ajuda não deve ser delegada somente ao terapeuta na roda de TCI, que nesse espaço é apenas um facilitador. É preciso que o grupo, de fato, seja copartícipe nesse processo, no qual todos ajudam e são ajudados – tanto o terapeuta quanto os participantes.

Nesse sentido, a participação de idosos em grupos de convivência consiste em aspecto positivo. A Terapia Comunitária Integrativa, como ferramenta utilizada nos referidos grupos, reafirma a relevância desses espaços como formas de empoderamento e de cidadania no cotidiano de seus participantes, uma vez que promove mecanismos individuais e coletivos para ações de intervenção na terceira idade(33. Cordeiro RC, Azevedo EB, Braga LAV, Silva JJS, Silva PMC, Ferreira Filha MO. Inclusão de pessoas em situação de sofrimento psíquico através da terapia comunitária integrativa. Rev Enferm UFPE On line. 2013 [citado 2015 jan 10];7(11):6317-21. Disponível em: http://www.revista.ufpe.br/revistaenfermagem/index.php/revista/article/download/3794/7662.
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,55. Moura SGM, Ferreira Filha MO, Carvalho MAP. Evolução histórica da abordagem em saúde mental no Brasil: da reforma psiquiátrica aos dias atuais. Rev Enferm UFPE On line. 2012 [citado 2015 jan 10];6(3):657-64. Disponível em: http://www.revista.ufpe.br/revistaenfermagem/index.php/revista/article/view/2172/pdf_1032.
http://www.revista.ufpe.br/revistaenferm...
,1515. Azevedo EB, Cordeiro RC, Costa LFP, Guerra CS, Ferreira Filha MO, Dias MD. Pesquisas brasileiras sobre terapia comunitária integrativa. Rev Bras Pesq Saúde. 2013 [citado 2015 jan 10];15(3):114-20. Disponível em: http://periodicos.ufes.br/RBPS/article/download/6333/4667.
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).

Por fim, os resultados enfatizam, ainda, a relevância das práticas de cuidado em coletividade, a exemplo da TCI, a qual já ocupa espaço nas políticas nacionais, estaduais e municipais. Entre estas, destacamos a inserção da TCI nas ações da Política Nacional sobre Drogas, na Política Nacional de Atenção Básica e, em especial, na Estratégia Saúde da Família e na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares(1616. Buzeli CP, Costa ALRC, Ribeiro RDR. Promoção da saúde de estudantes universitários: contribuições da terapia comunitária. Rev Eletron Gestão Saúde. 2013 [citado 2015 jan 10];3(1):332-42. Disponível em: http://periodicos.unb.br/index.php/rgs/article/view/24300/17368.
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).

Na saúde mental, existe uma consonância entre a proposta da TCI e a pauta do movimento pela reforma psiquiátrica no país. Essa reforma defende que as pessoas em sofrimento emocional devem contar com recursos de saúde comunitários para sua reabilitação e inclusão social, em especial no que diz respeito aos idosos, numa perspectiva de autonomia e transformação social(33. Cordeiro RC, Azevedo EB, Braga LAV, Silva JJS, Silva PMC, Ferreira Filha MO. Inclusão de pessoas em situação de sofrimento psíquico através da terapia comunitária integrativa. Rev Enferm UFPE On line. 2013 [citado 2015 jan 10];7(11):6317-21. Disponível em: http://www.revista.ufpe.br/revistaenfermagem/index.php/revista/article/download/3794/7662.
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).

Em face disso, defende-se a expansão da TCI como ferramenta de cuidado para outras faixas etárias, a fim de obter tão bons resultados como os apontados nas concepções dos idosos, como no exemplo da utilização da TCI como prática de cuidado coletivo para estudantes universitários de enfermagem da Universidade Federal de Mato Grosso. A referida pesquisa identificou contribuições da TCI para a promoção da saúde dos estudantes por disponibilizar um espaço de expressão dos sentimentos e, com isso, favorecer a criação de redes solidárias entre eles(1616. Buzeli CP, Costa ALRC, Ribeiro RDR. Promoção da saúde de estudantes universitários: contribuições da terapia comunitária. Rev Eletron Gestão Saúde. 2013 [citado 2015 jan 10];3(1):332-42. Disponível em: http://periodicos.unb.br/index.php/rgs/article/view/24300/17368.
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).

CONCLUSÃO

Ao término das discussões acima, depreende-se que o estudo alcançou seu objetivo. Os resultados mostraram, através das representações sociais dos idosos, um conhecimento partilhado na sociedade acerca da TCI que poderá ser aplicado no cotidiano de suas vidas. Um estudo com este perfil pode indicar o que, efetivamente, é necessário mudar e o que é preciso reforçar.

No caso, chama a atenção dos profissionais e gestores da saúde pela relevância das atividades de promoção à saúde mental no grupo populacional em que se focou o estudo. Para tanto, propõe-se a formação de profissionais terapeutas comunitários aptos a dispensar aos idosos e à população a realização de rodas de TCI, tendo em vista que, de acordo com levantamento retrospectivo, não existia terapeuta nos bairros referidos no período da coleta. Assim, conhecer as RSs da TCI é uma conduta de fortalecimento dessa ferramenta de cuidado. Parece razoável supor que os conjuntos de elementos sugerem uma “teoria popular” do que seja a TCI, entendida desde a idealização de um saber acadêmico à ramificação de um saber artístico.

Cumpre reiterar que o presente estudo se destaca por trazer uma discussão ancorada na Teoria das Representações Sociais, um aporte teórico pouco utilizado nas pesquisas com a TCI como objeto de estudo. A abordagem estrutural ressaltou uma representação coesa e bem estruturada entre os elementos periféricos e centrais das RSs dos sujeitos. E foram garantidas a estabilidade e a flexibilidade tão necessárias à fluidez da representação.

Por outro lado, é preciso ressaltar que a investigação em questão apresenta limitações pelo fato de que somente idosos foram considerados, caracterizando um tipo de representação que poderia ser alterada caso tivessem sido abordadas todas as faixas etárias. Tal lacuna poderá ser explorada por estudos vindouros com outros sujeitos: adultos ou crianças, por exemplo.

REFERÊNCIAS

  • 1
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    14 Ago 2015
  • Aceito
    21 Mar 2017
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