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Fatores associados a cesáreas em um hospital universitário de alta complexidade do sul do Brasil

Factores asociados a cesáreas en un hospital universitario de alta complejidad en el sur de Brasil

RESUMO

Objetivo

Identificar os fatores associados a cesáreas em um hospital universitário de alta complexidade do sul do Brasil.

Métodos

Estudo transversal, desenvolvido na Unidade de Internação Obstétrica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Os dados foram obtidos por meio de questionário com 361 puérperas e prontuários materno e neonatal, de fevereiro a abril de 2013. Para análise, utilizou-se Razão de Prevalência mediante a Regressão de Poisson Univariável.

Resultados

A prevalência de cesárea foi de 31%. A categoria de internação, dilatação, características do colo, apresentação fetal e dinâmica uterina, no momento da admissão, estiveram estatisticamente associadas à realização de cesárea; não ter cesárea prévia e turno da meia-noite às 6h foram fatores de proteção.

Conclusões

A prevalência de cesárea está acima do recomendado pela Organização Mundial da Saúde, mas é semelhante a taxas de outros hospitais universitários, o que indica a necessidade de proposição de ações para melhoria desse indicador.

Cesárea; Saúde da mulher; Obstetrícia

RESUMEN

Objetivo

Identificar los factores asociados a cesáreas en un hospital universitario de alta complejidad en el sur de Brasil.

Métodos

Estudio transversal desarrollado en la Unidad de Internación Obstétrica del Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Datos obtenidos por medio de cuestionarios con 361 puérperas y prontuarios maternos y neonatales, de febrero a abril de 2013. Para el análisis, se utilizó la Razón de Prevalencia mediante la Regresión de Poisson Univariable.

Resultados

La prevalencia de cesáreas fue del 31%. La categoría de internación, dilatación, características del cuello de útero, presentación fetal y dinámica uterina, en el momento de la admisión, estuvieron estadísticamente asociadas a la realización de cesárea; no tener cesárea previa y turnos desde la medianoche a las 6 de la mañana fueron factores de protección.

Conclusiones

La prevalencia de cesáreas está por encima de lo recomendado por la Organización Mundial de la Salud, pero las tasas son similares a las de otros hospitales universitarios, lo que indica la necesidad de propuestas para la mejora de ese indicador.

Cesárea; Salud de la mujer; Obstetricia

ABSTRACT

Objective

To identify the factors associated with cesarean sections in a high complexity university hospital in southern Brazil.

Methods

Cross-sectional study carried out at the Obstetric Hospital Unit of the Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Data were gathered from questionnaires carried out with 361 puerperal women and maternal and neonatal records, from February to April 2013. For the analysis, Prevalence Ratio through Univariate Poisson Regression was used.

Results

The prevalence of cesarean sections was 31%. The category of hospitalization, cervix dilation and its characteristics, fetal presentation, and uterine dynamics, at the time of admission, were statistically related to cesarean sections; not having a previous cesarean section and night shift (from midnight to 6AM) were protective factors.

Conclusions

The prevalence of cesarean sections is above the rate recommended by the World Health Organization, but it is similar to rates found in other university hospitals, thus pointing out the need for the proposition of actions aimed at improving this indicator.

Cesarean section; Women’s health; Obstetrics

INTRODUÇÃO

A qualificação da atenção materno infantil, com a implementação de práticas baseadas em evidências científicas, são fundamentais para a redução das taxas de mortalidade materna e perinatal. Uma medida efetiva para a redução dessas taxas é a cesárea, que em condições ideais, é segura e com baixa frequência de complicações graves. Contudo, é importante salientar que as evidências científicas não sugerem benefícios da cesárea em mulheres que não precisam realmente dela(11. Comissão Nacional de Incorporação Tecnologias no SUS (BR). Diretrizes de atenção a gestante: a operação cesariana. Brasília: Ministério da Saúde; 2015 [citado 2016 jun 01]. Disponível em: http://conitec.gov.br/images/Consultas/Relatorios/2015/Relatorio_PCDTCesariana_CP.pdf.
http://conitec.gov.br/images/Consultas/R...
).

A taxa de cesárea, por sua incidência e pelas controvérsias em torno de seus propósitos e consequências, é considerada um problema de saúde pública, e, em vista disso, tem sido objeto de interesse para pesquisas(22. Riscado LC, Jannotti CB, Barbosa RHS. Deciding the route of delivery in Brazil: themes and trends in public health production. Texto Contexto Enferm. 2016;25(1):e3570014.).

No período de 2000 a 2010, os índices de cesáreas no Brasil, mostram tendência ascendente em todas as regiões do país(33. Rattner D, Moura, EC. Nascimentos no Brasil: associação do tipo de parto com variáveis temporais e sociodemográficas. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2016;16(1):39-47.). Em 2013, a taxa de cesárea no Brasil foi 56,6% e no Rio Grande do Sul essa taxa foi ainda maior, 62,6%(44. Ministério da Saúde (BR). Datasus [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; c2016 [citado 2016 jun 01]. Nascidos vivos: Brasil; [aprox. 3 telas]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sinasc/cnv/nvuf.def.
http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi....
).

Altas taxas de cesárea representam um grande desafio para a política de saúde tendo em vista que sua realização indiscriminada envolve riscos desnecessários tanto para a mãe quanto para a criança, além de custos adicionais para o sistema de saúde(55. Objetivos de Desenvolvimento do Milênio: relatório nacional de acompanhamento. Brasília: IPEA; 2014 [citado 2016 jun 01]. Disponível em: http://www.agenda2030.com.br/biblioteca/140523_relatorioodm.pdf.
http://www.agenda2030.com.br/biblioteca/...
). A cesárea não deve ser banalizada, pois para a mulher aumenta o risco de complicações, tais como hemorragia pós-parto, assim como a mortalidade, e para o recém-nascido, maior necessidade de suporte ventilatório ao nascer e de tratamento intensivo(66. Leal MC. Estar grávida no Brasil. Cad Saúde Pública. 2012;28(8):1420-1.).

Uma revisão sistemática que analisou a associação entre taxa de cesárea e resultados maternos, neonatais e infantis mostra que percentuais de até 10-15% de cesáreas estão associadas a uma diminuição nas taxas de mortalidade materna e neonatal(77. Betran AP, Torloni MR, Zhang J, Ye J, Mikolajczyk R, Deneux-Tharaux C, et al. What is the optimal rate of caesarean section at population level? a systematic review of ecologic studies. Reprod Health. 2015;12:57.), por outro lado essas taxas não apresentaram diminuição em razão do aumento das cesáreas(88. Osava RH, Silva FMB, Tuesta EF, Oliveira SMJV, Amaral MCE. Caracterização das cesáreas em centro de parto normal. Rev Saúde Pública. 2011;45(6):1036-43.,-99. Pallasmaa N, Alanen A, Ekblad U, Vahlberg T, Koivisto M, Raudaskoski T, et al. Variation in cesarean section rates is not related to maternal and neonatal outcomes. Acta Obstet Gynecol Scand. 2013;92(10):1168-74.).

É importante empenhar-se para a mudança do modelo de atenção obstétrica, visando a redução de intervenções que, na maioria das vezes, não são necessárias, como por exemplo, as cesáreas(33. Rattner D, Moura, EC. Nascimentos no Brasil: associação do tipo de parto com variáveis temporais e sociodemográficas. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2016;16(1):39-47.). Assim, pressupõe-se que a prática de atenção intervencionista, atualmente realizada por alguns profissionais de saúde, tenha relação com a elevada taxa de cesárea no Brasil.

As taxas de cesárea continuarão em ascensão se não forem implantadas ações e estratégias de redução que considerem as características socioculturais, demográficas e obstétricas das mulheres, a formação e atuação profissional e a estrutura dos serviços de saúde, e para explicação do fenômeno, são necessárias novas pesquisas(10). Corroborando, autores salientam que a busca por fatores que justifiquem o aumento dos índices de cesárea, são essenciais para que soluções possam ser pensadas(1111. Sakae TM, Freitas PF, D’Orsi E. Fatores associados a taxas de cesárea em hospital universitário. Rev Saúde Pública. 2009;43(3):472-80.).

Diante da problemática apresentada e da escassez de pesquisas atuais, há indícios da existência de lacunas no conhecimento produzido sobre esta temática, especialmente em instituição de ensino de alta complexidade. Além disso, o estado do Rio Grande do Sul apresenta taxas de cesárea superior ao Brasil como um todo, o que justifica o desenvolvimento de pesquisas que poderão contribuir para melhor compreensão desta situação, de forma a oportunizar a proposição de novas estratégias capazes de reduzir as altas taxas desse procedimento.

Frente a essas considerações, o objetivo do presente estudo foi identificar os fatores associados a cesáreas em um hospital universitário de alta complexidade do sul do Brasil.

MÉTODO

Este artigo foi extraído de uma pesquisa de conclusão de curso de graduação intitulada “Cesarianas de um hospital universitário: fatores associados”(1212. Saraiva, JM. Cesarianas de um hospital universitário: fatores associados [monografia]. Porto Alegre (RS): Escola de Enfermagem, Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2013.). Trata-se de um estudo quantitativo de corte transversal desenvolvido na Unidade de Internação Obstétrica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA). A instituição é um hospital universitário, referência em saúde para atendimentos de alta complexidade e gestações de alto risco.

Para o cálculo do tamanho amostral, foi considerado o total de partos no HCPA em 2011 e a taxa de cesárea, com uma margem de erro absoluta de 5% e nível de confiança de 95%, sendo necessárias no mínimo 359 puérperas. No entanto, compuseram a amostra 361 puérperas, que se enquadraram nos seguintes critérios de inclusão: nascimentos ocorridos na Unidade de Centro Obstétrico (UCO) do HCPA e que tiveram parto via vaginal ou cesárea (eletiva ou de urgência) e excluídas as que não estiveram em condições psicológicas de responder as questões, os casos de óbito fetal, fetos com peso inferior a 500 gramas e/ou com idade gestacional (IG) inferior a 22 semanas.

Os dados foram obtidos por meio de questionário estruturado (dados sobre a caracterização das mulheres, história obstétrica, dados da admissão hospitalar e dados do trabalho de parto) e de registros de prontuários físico e eletrônico materno e do neonato.

As entrevistas foram realizadas diariamente, 24 horas após o parto, por pesquisadoras vinculadas à pesquisa. A coleta de dados dos prontuários foi finalizada quando efetivada a alta hospitalar materna e neonatal. O período de coleta de dados foi de fevereiro a abril de 2013.

Como variável dependente foi considerado a cesárea e como variáveis independentes a idade, cor da pele autorreferida, escolaridade, situação marital, renda familiar, categoria de internação, história obstétrica (número de consulta pré-natal, número de gestações, paridade, cesárea prévia, intercorrência obstétrica e/ou clínica na gravidez atual), dados da admissão hospitalar (idade gestacional, dilatação, característica do colo, apresentação, condição da bolsa das águas, característica do líquido amniótico e dinâmica uterina) e variáveis do trabalho de parto (uso de ocitocina e/ou misoprostol, amniotomia e turno em que ocorreu o parto).

Foi realizada estatística analítica, utilizando-se a Razão de Prevalência através da Regressão de Poisson Univariável com variâncias robustas. Estabeleceu-se o nível de 5% de significância estatística. As análises foram realizadas no software SPSS, versão 18.

A pesquisa foi submetida e aprovada pela Comissão de Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (nº 23998) e pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HCPA (Parecer nº 120466, de 31 de janeiro de 2013), conforme legislação brasileira para pesquisas com seres humanos. Foi apresentado, à Instituição, o Termo de Responsabilidade para Utilização de Dados Institucionais.

Todas as mulheres que concordaram em participar da pesquisa assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e no caso de menores de 18 anos, esse foi assinado pelo responsável.

RESULTADOS

Das 361 mulheres que compuseram a amostra, 31% realizaram cesárea. Na análise da associação entre variáveis sociodemográficas e realização de cesárea observou-se que somente na categoria de internação houve significância estatística. Na internação por convênio/particular, a cesárea foi 2,43 vezes mais prevalente quando comparada a internação pelo Sistema Único de Saúde (SUS) (Tabela 1).

Tabela 1
– Razões de prevalência para cesárea segundo as variáveis sociodemográficas maternas. Porto Alegre, RS. 2013

Referente às razões de prevalência para cesárea segundo as variáveis obstétricas (Tabela 2) constatou-se que não ter cesárea prévia mostrou-se um fator protetor, visto que foi 80% menos prevalente, dado estatisticamente significante. As demais variáveis analisadas não apresentaram significância.

Tabela 2
– Razões de prevalência para cesárea segundo as variáveis da história obstétrica. Porto Alegre, RS. 2013

As variáveis dilatação, característica do colo, apresentação e a dinâmica uterina mostraram resultados significativos (Tabela 3).

Tabela 3
– Razões de prevalência para cesárea segundo as variáveis da admissão hospitalar. Porto Alegre, RS. 2013

Em relação à dilatação, a cesárea foi mais prevalente entre as que foram admitidas com colo impérvio ou com menos de três centímetros de dilatação, sendo que 82,1% e 50,6%, respectivamente, submeteram-se à cesárea. Assim, a cesárea foi 4,6 vezes mais prevalente naquelas que apresentaram colo impérvio na admissão, e 2,5 vezes mais nas com dilatação inferior a três centímetros quando comparada aqueles com dilatação superior a esta.

Relativo à característica do colo, verificou-se que a cesárea foi mais prevalente nas admitidas com colo grosso (5,83 vezes prevalente a ocorrência de cesárea quando comparado às com o colo fino).

Referente à apresentação, verificou-se que foi realizada cesárea em todos os casos de apresentação pélvica, com uma prevalência de 3,58 vezes em relação àqueles em apresentação cefálica.

Quanto à dinâmica uterina, na ausência desta constatou-se que a cesárea foi 1,53 vezes mais prevalente.

Na análise das variáveis do trabalho de parto (Tabela 4), verificou-se que o turno do parto foi à única variável relacionada com a realização de cesárea. A ocorrência de cesárea no horário da meia-noite até 6h59min foi aproximadamente 70% menos prevalente, dessa forma, destaca-se esse turno como um fator protetor quando comparado aos demais turnos.

Tabela 4
– Razões de prevalência para cesárea segundo as variáveis do trabalho de parto. Porto Alegre, RS. 2013

DISCUSSÃO

A taxa de cesárea, evidenciada nesse estudo, está acima do percentual associado à redução das taxas de mortalidade materna e neonatal, que é de até 10-15%(77. Betran AP, Torloni MR, Zhang J, Ye J, Mikolajczyk R, Deneux-Tharaux C, et al. What is the optimal rate of caesarean section at population level? a systematic review of ecologic studies. Reprod Health. 2015;12:57.). Esse indicador apresenta uma grande variação entre as pesquisas. Estudos brasileiros realizados em instituições de saúde universitárias, realizado em Florianópolis(1111. Sakae TM, Freitas PF, D’Orsi E. Fatores associados a taxas de cesárea em hospital universitário. Rev Saúde Pública. 2009;43(3):472-80.) e em cidade do interior do estado de São Paulo(1313. Sanches NC, Mamede FV, Vivancos RBZ. Perfil das mulheres submetidas à cesareana e assistência obstétrica na maternidade pública em Ribeirão Preto. Texto Contexto Enferm. 2012;21(2):418-26.), assinalam taxa de cesárea de 23% e 32,6% respectivamente, sendo esta última semelhante a obtida na presente investigação. Por outro lado, em um Centro de Parto Normal, que atende parturientes de baixo risco, a taxa de cesárea foi ainda menor (14,9%)(88. Osava RH, Silva FMB, Tuesta EF, Oliveira SMJV, Amaral MCE. Caracterização das cesáreas em centro de parto normal. Rev Saúde Pública. 2011;45(6):1036-43.). Observou-se maior prevalência de cesárea em hospitais de alta complexidade (35,4%), com estudantes de medicina (39,2%), e menor naqueles em que só havia estudantes de enfermagem/parteiras (26,7%)(1414. Pádua KS, Osis MJD, Faúndes A, Barbosa AH, Moraes Filho OB. Fatores associados à realização de cesárea em hospitais brasileiros. Rev Saúde Pública. 2010;44(1):70-9.).

Possivelmente as diferenças no modelo de atenção ao parto são fatores que interferem nas taxas de cesárea das diferentes instituições. Tal fato pode ainda ser creditado à diferença cultural e socioeconômica das mulheres. Pode-se inferir que a taxa de cesárea é um indicador do modelo medicalizado e intervencionista na atenção ao parto.

Além disso, as taxas de cesárea podem ser influenciadas de acordo com a categoria de internação, na qual se verificam taxas elevadas em mulheres internadas por convênio/particular quando comparadas àquelas internadas pelo SUS(1515. Gama SGN, Viellas EF, Schilithz AOC, Theme Filha MM, Carvalho ML, Gomes KRO, et al. Fatores associados à cesárea entre primíparas adolescentes no Brasil, 2011-2012. Cad Saúde Pública. 2014;30(Supl.1):279-86.).

Pela análise de tendência temporal das taxas das vias de parto de acordo com a fonte de financiamento, verificou-se que as taxas de cesárea continuarão aumentando independente da fonte de financiamento a menos que sejam implantadas novas ações e estratégias de redução(1010. Paris GF, Monteschio LVC, Oliveira RR, Latorre MRDO, Pelloso SM, Mathias TAF. Tendência temporal da via de parto de acordo com a fonte de financiamento. Rev Bras Ginecol Obstet. 2014;36(12):548-54.).

Na avaliação das razões de prevalência para cesárea segundo as variáveis obstétricas constatou-se que não ter cesárea anterior foi um fator protetor, assim, ressalta-se a importância da não realização de cesáreas desnecessárias, uma vez que a existência de cesárea prévia acumula riscos de um novo parto cirúrgico.

Embora a literatura científica não defina “ter uma cesárea previa” como indicação absoluta para outra cesárea, estudos demonstram(88. Osava RH, Silva FMB, Tuesta EF, Oliveira SMJV, Amaral MCE. Caracterização das cesáreas em centro de parto normal. Rev Saúde Pública. 2011;45(6):1036-43.,1111. Sakae TM, Freitas PF, D’Orsi E. Fatores associados a taxas de cesárea em hospital universitário. Rev Saúde Pública. 2009;43(3):472-80.), que a prevalência de parto cirúrgico é maior em mulheres com essa característica.

As altas taxas de cesárea em mulheres que tiveram resolução da gestação anterior por via alta, mostram a cesárea prévia como significativa para a ocorrência de uma nova cesárea(1313. Sanches NC, Mamede FV, Vivancos RBZ. Perfil das mulheres submetidas à cesareana e assistência obstétrica na maternidade pública em Ribeirão Preto. Texto Contexto Enferm. 2012;21(2):418-26.,1616. Al Busaidi I, Al Farsi Y, Ganguly S, Gowri V. Obstetric and non-obstetric risk factors for cesarean section in Oman. Oman Med J. 2012;27(6):478-81.), podendo atingir uma prevalência de até cinco vezes maior(88. Osava RH, Silva FMB, Tuesta EF, Oliveira SMJV, Amaral MCE. Caracterização das cesáreas em centro de parto normal. Rev Saúde Pública. 2011;45(6):1036-43.,1111. Sakae TM, Freitas PF, D’Orsi E. Fatores associados a taxas de cesárea em hospital universitário. Rev Saúde Pública. 2009;43(3):472-80.,1414. Pádua KS, Osis MJD, Faúndes A, Barbosa AH, Moraes Filho OB. Fatores associados à realização de cesárea em hospitais brasileiros. Rev Saúde Pública. 2010;44(1):70-9.). Por outro lado, estudo(1717. Abdelazim IA, Elbiaa AAM, Al-Kadi M, Yehia AH, Nusair BMS, Faza MA. Maternal and obstetrical factors associated with a successful trial of vaginal birth after cesarean section. J Turk Ger Gynecol Assoc. 2014;15(4):245-9.) que inclui mulheres elegíveis para tentativa de parto após cesárea a taxa de nascimentos por parto normal foi maior quando comparada as cesáreas (72,1% e 27,8% respectivamente). Desta forma, destaca-se a possibilidade de realizar um parto vaginal em mulheres com cesárea prévia, uma vez que estudos apontam êxito diante desta situação.

A cesárea em primigestas deve ser realizada com indicação precisa. A prevenção de cesárea nessas mulheres é de suma importância para evitar os efeitos cumulativos da cesárea prévia, especialmente em mulheres com gestação de risco habitual e com trabalho de parto com boa evolução(13).

Na vigência de gestações de alto risco, o cuidado deve ser constante para que alterações possam ser identificadas e tratadas precocemente. Nesses casos deverá ocorrer uma vigilância rigorosa da vitalidade fetal que permitirá uma evolução segura para o parto normal(1818. Haddad SEM, Cecatti JG. Estratégias dirigidas aos profissionais para a redução das cesáreas desnecessárias no Brasil. Rev Bras Ginecol Obstet. 2011;33(5):252-62.). Desta forma, o fato de ser gestante de alto risco não é condição definidora para parto cirúrgico.

É provável que a redução das taxas de cesárea fosse maior se estratégias, como a segunda opinião antes da realização do procedimento, se concentrassem nas primigestas com gestação de risco habitual. Isso porque elas representam uma fração grande da população de gestantes e, se tiverem cesárea no primeiro parto, quase certamente terão também cesárea nas próximas gestações(1818. Haddad SEM, Cecatti JG. Estratégias dirigidas aos profissionais para a redução das cesáreas desnecessárias no Brasil. Rev Bras Ginecol Obstet. 2011;33(5):252-62.). No presente estudo, a maior prevalência de cesárea ocorreu entre as primigestas e não houve investigação em relação à classificação do risco gestacional, não sendo possível determinar a relação dessas variáveis.

Salienta-se que a cesárea, embora seja uma intervenção que salva vidas, é um procedimento que envolve riscos maternos e fetais quando realizada sem fatores que a justifiquem. A probabilidade de morbidades maternas, tais como histerectomia, transfusão, trombose venosa, aumenta à medida que a mulher é submetida a cesáreas subsequentes e, além disso, não há redução do risco de morbidade neonatal(1919. Miller ES, Hahn K, Grobman WA. Consequences of a primary elective cesarean delivery across the reproductive life. Obstet Gynecol. 2013;121(4):789-97.). A indicação de cesárea eletiva, para gestantes com idade gestacional inferior a 39 semanas, associa-se a maior morbidade neonatal e ao maior risco de cuidados neonatais intensivos(2020. Resende MC, Santos L, Silva IS. Neonatal morbidity in term newborns born by elective cesarean section. Acta Med Port. 2015;28(5):601-7.).

Quanto às variáveis da admissão, constata-se que a maior parte das gestantes admitidas com dilatação igual ou menor que três centímetros foram submetidas à cesárea. Estudos que relacionaram a dilatação cervical com o tipo de parto endossam os achados deste estudo(88. Osava RH, Silva FMB, Tuesta EF, Oliveira SMJV, Amaral MCE. Caracterização das cesáreas em centro de parto normal. Rev Saúde Pública. 2011;45(6):1036-43.,1111. Sakae TM, Freitas PF, D’Orsi E. Fatores associados a taxas de cesárea em hospital universitário. Rev Saúde Pública. 2009;43(3):472-80.,1717. Abdelazim IA, Elbiaa AAM, Al-Kadi M, Yehia AH, Nusair BMS, Faza MA. Maternal and obstetrical factors associated with a successful trial of vaginal birth after cesarean section. J Turk Ger Gynecol Assoc. 2014;15(4):245-9.,2121. Birara M, Gebrehiwot Y. Factors associated with success of vaginal birth after one cesarean section (VBCA) at three teaching hospitals in Addis Ababa, Ethiopia: a case control study. BMC Pregnancy Childbirth. 2013;13:31.). Assim, pode-se inferir que a internação precoce, antes da fase ativa do trabalho de parto, contribui para o maior uso de intervenções que podem culminar em cesárea. Entretanto, em algumas situações como, por exemplo, nos casos de amniorrexe prematura, é indicada a internação da gestante, mesmo que fora do trabalho de parto. Sendo assim, cabe ao profissional de saúde avaliar as condições gerais da gestante a fim de decidir o momento oportuno para sua internação, assegurando desta forma boas condições da vitalidade fetal e da gestante.

Referente à apresentação fetal, a pélvica, esteve relacionada a maior prevalência de cesárea, achado corroborado também em outras pesquisas (88. Osava RH, Silva FMB, Tuesta EF, Oliveira SMJV, Amaral MCE. Caracterização das cesáreas em centro de parto normal. Rev Saúde Pública. 2011;45(6):1036-43.,1111. Sakae TM, Freitas PF, D’Orsi E. Fatores associados a taxas de cesárea em hospital universitário. Rev Saúde Pública. 2009;43(3):472-80.,1313. Sanches NC, Mamede FV, Vivancos RBZ. Perfil das mulheres submetidas à cesareana e assistência obstétrica na maternidade pública em Ribeirão Preto. Texto Contexto Enferm. 2012;21(2):418-26.). Tendo em vista a redução da mortalidade perinatal e da morbidade neonatal recomenda-se a realização de cesárea para gestantes com fetos em apresentação pélvica(11. Comissão Nacional de Incorporação Tecnologias no SUS (BR). Diretrizes de atenção a gestante: a operação cesariana. Brasília: Ministério da Saúde; 2015 [citado 2016 jun 01]. Disponível em: http://conitec.gov.br/images/Consultas/Relatorios/2015/Relatorio_PCDTCesariana_CP.pdf.
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). Tal fato é observado no cotidiano das maternidades, nas quais os profissionais de saúde defendem a cesárea para resolução dessa situação, por vislumbrarem um parto vaginal complicado.

Outras variáveis da admissão, como características do colo e dinâmica uterina, em estudos similares(1111. Sakae TM, Freitas PF, D’Orsi E. Fatores associados a taxas de cesárea em hospital universitário. Rev Saúde Pública. 2009;43(3):472-80.,1414. Pádua KS, Osis MJD, Faúndes A, Barbosa AH, Moraes Filho OB. Fatores associados à realização de cesárea em hospitais brasileiros. Rev Saúde Pública. 2010;44(1):70-9.), não foram consideradas de interesse para análise de associações com a ocorrência de cesárea. No entanto, essas características são relevantes para avaliação da evolução do trabalho de parto, para determinar as melhores condutas e para a tomada de decisão sobre o tipo de parto. A importância do estudo de tais variáveis ficou evidenciada na constatação da relação delas com a cesárea.

O turno do parto mostrou-se relacionado com a prevalência de cesárea, sendo o horário da meia-noite até 6h59min, fator protetor para ocorrência de cesárea. Esses dados são equivalentes aos encontrados em outro estudo, onde os nascimentos entre 19h e 23h59min tiveram menor associação com cesárea quando comparados com o horário diurno. Sendo que, em relação ao período da madrugada (0h até 6h59), essa associação é ainda menor, os resultados apontaram que a cesárea é cerca de 40% menos prevalente(88. Osava RH, Silva FMB, Tuesta EF, Oliveira SMJV, Amaral MCE. Caracterização das cesáreas em centro de parto normal. Rev Saúde Pública. 2011;45(6):1036-43.). Esses achados são endossados por estudo atual(33. Rattner D, Moura, EC. Nascimentos no Brasil: associação do tipo de parto com variáveis temporais e sociodemográficas. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2016;16(1):39-47.), onde os nascimentos por cesárea foram menos frequentes entre 18h e 5h.

Os achados desse estudo não foram capazes de esclarecer as razões para a ocorrência de menor número de cesáreas no período noturno, em especial na madrugada. Assim, considera-se a necessidade de realização de novas investigações capazes de elucidar esse fenômeno.

CONCLUSÃO

A prevalência de cesárea esta acima do recomendado pela OMS, mas semelhante a taxas de outros hospitais universitários, possivelmente em função de serem instituições de referência à alta complexidade e laboratórios de ensino.

A realização de cesárea esteve associada à categoria de internação (particular/convênio), dilatação menor que três centímetros, colo médio e grosso e dinâmica uterina ausente na admissão e a apresentação pélvica. Foram fatores de proteção à realização de cesárea, a mulher não ter cesárea anterior e turno do parto da meia noite às 6h59min.

O detalhamento das características e das condições obstétricas das mulheres submetidas à cesárea possibilita reflexão sobre a prática profissional, oportunizando a busca por uma assistência qualificada durante o trabalho de parto e parto. A tomada de decisão dos profissionais de saúde em cima de dados não fundamentados nas evidências cientificas pode ser equivocada gerando desta forma procedimentos desnecessários, expondo mulheres e recém-nascidos também a riscos desnecessários.

As altas taxas de cesáreas, devem ser combatidas, buscando-se, desse modo, uma atenção menos intervencionista, com enfoque nas práticas humanizadas. Devem ser respeitadas as diferenças entre as parturientes, assegurando seu bem-estar e possibilitando, como resultados, puérperas e bebês saudáveis.

Dessa forma, oportunizar o parto vaginal às mulheres com cesárea prévia pode ser uma forma de reduzir as altas taxas de cesáreas. Apenas ações conjuntas e consistentes de toda a equipe de saúde serão capazes de melhorar a assistência à mulher e ao bebê, reduzindo o número de cesáreas desnecessárias e, consequentemente, contribuindo para a redução das taxas de morbimortalidade materna e perinatal.

Destaca-se ainda, a aplicabilidade dos achados apresentados no presente artigo nas práticas de enfermagem, principalmente nas áreas da gestão e da assistência, visto que esses podem impactar e contribuir para o estabelecimento e implementação de ações de qualificação da atenção.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    31 Out 2016
  • Aceito
    28 Mar 2017
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