Acessibilidade / Reportar erro

Visibilidade do transporte intra-hospitalar em unidade de terapia intensiva: estudo descritivo

Visibilidad del transporte intrahospitalario en unidad de terapia intensiva: estudio descriptivo

RESUMO

Objetivo

Verificar a percepção dos profissionais de enfermagem sobre a segurança do paciente durante o transporte intra-hospitalar do paciente internado em unidade de terapia intensiva.

Método

Estudo descritivo, qualitativo, com participação de 21 profissionais de enfermagem que atuavam em unidade de terapia intensiva de um hospital público na região sul do Brasil. Os dados foram obtidos por meio de entrevistas semiestruturadas em novembro de 2012 e analisados através da análise de conteúdo de Minayo.

Resultados

Foram evidenciadas três categorias: responsabilidade do profissional de saúde no transporte intra-hospitalar; situação de risco para o paciente no transporte intra-hospitalar; qualidade em estrutura para o transporte intra-hospitalar, revelando preocupação dos profissionais em realizar um transporte seguro.

Conclusão

Os profissionais de enfermagem têm conhecimento sobre a segurança do paciente durante o transporte intra-hospitalar, porém, há a necessidade de protocolos institucionais e de capacitações para o manejo desta prática, com a finalidade de reduzir ocorrências de eventos adversos.

Transporte de pacientes; Unidades de terapia intensiva; Enfermagem

RESUMEN

Objetivo

Verificar la percepción de los profesionales de enfermería sobre la seguridad del paciente internado en unidad de terapia intensiva durante el transporte intrahospitalario.

Método

Estudio descriptivo, cualitativo, con participación de 21 profesionales de enfermería que actuaban en unidad de terapia intensiva de un hospital público en la región sur de Brasil. Los datos fueron obtenidos por medio de entrevistas semiestructuradas en noviembre de 2012 y analizados a través del análisis de contenido de Minayo.

Resultados

Fueron evidenciadas tres categorías: responsabilidad del profesional de salud en el transporte intrahospitalario; situación de riesgo para el paciente en el transporte intrahospitalario; calidad en estructura para el transporte intrahospitalario, revelando la preocupación de los profesionales en realizar un transporte seguro.

Conclusión

Los profesionales de enfermería tienen conocimiento sobre la seguridad del paciente durante el transporte intrahospitalario, pero son necesarios protocolos institucionales y capacitaciones para el manejo de esta práctica con la finalidad de reducir ocurrencias de eventos adversos.

Transporte de pacientes; Unidades de terapia intensiva; Enfermería

ABSTRACT

Objective

To verify the perception of the nursing staff about patient´s safety during the intrahospital transport of patients in an intensive care unit.

Method

Qualitative, descriptive study with the participation of 21 nursing professionals who worked at the intensive care unit of a public hospital in the southern region of Brazil. The data were collected using semi-structured interviews, in November 2012, and analysed using Minayo’s content analysis.

Results

The results led to three main categories: responsibility of the health professional in intra-hospital transport; risk situation for the patient in intra-hospital transport; quality in the structure for intra-hospital transport, revealing the concern of professionals in providing safe transport.

Conclusion

Although the nursing professionals are aware of the patient safety during intra-hospital transport, there is a need for institutional protocols and training on this practice to reduce the incidence of adverse events.

Transport of patients; Intensive care units; Nursing

INTRODUÇÃO

A Unidade de Terapia Intensiva (UTI) é um setor de alta complexidade cuja modernização em técnicas e equipamentos possibilitam prestar uma assistência especializada e individualizada aos pacientes em estado grave(11. Rodriguez AH, Bub MBC, Perão OF, Zandonadi G, Rodriguez MJH. Características epidemiológicas e causas de óbitos em pacientes internados em terapia intensiva. Rev Bras Enferm. 2016 mar-abr;69(2):229-34.).

Algumas doenças requerem intervenções para tratamento ou para elucidação diagnóstica, que não podem ser realizadas a beira leito e exigem, portanto, a realização do transporte intra-hospitalar (TIH). Neste sentido, o TIH é um desafio para os profissionais de saúde por oferecer cuidados adicionais, dentre eles a utilização de tecnologias não disponíveis na UTI, cuja decisão deve ser sustentada pela avaliação entre os benefícios e os riscos(22. Kue R, Brown P, Ness C, Scheulen J. Adverse clinical events during intrahospital transport by a specialized team: a preliminary report. Am J Crit Care. 2011 Mar;20(2):153-62.).

O ambiente organizacional, o uso inadequado ou a falta de tecnologia utilizada para o TIH no que se refere a aparelhos (bombas de infusão contínua, maca de transporte, monitores e dispositivos para o controle de sinais vitais e de gases sanguíneos) e a falta de comunicação entre os profissionais favorecem a ocorrência de erros e incidentes causando Eventos Adversos (EA) que agravam a situação clínica do paciente transportado(33. Almeida ACG, Neves ALD, Souza CLB, Garcia JH, Lopes JL, Barros ALBL. Intra-hospital transport of critically ill adult patients: complications related to staff, equipment and physiological factors. Acta Paul Enferm. 2012;25(3):471-6.-44. Alamanou DG, Fotos NV, Brokalaki H. Interruption of therapy during intrahospital transport of non-icu patients. Health Sci J. 2013 Apr-Jun;7(2):177-87.).

Um estudo com 441 TIH de pacientes internados em UTI e encaminhados para exames diagnósticos ou procedimentos terapêuticos, com o objetivo de investigar a incidência de EA identificou a ocorrência de 79,8% complicações, dentre os quais estavam 7,9% relacionados a equipamentos e equipe e 79,4% relacionados ao paciente(55. Jia L, Wang H, Gao Y, Liu H, Yu K. High incidence of adverse events during intra-hospital transport of critically ill patients and new related risk factors: a prospective, multicenter study in China. Crit Care. 2016 Jan;20(12):319-22.). Em outro estudo com 262 TIH, que teve o objetivo de identificar os EA que ocorrem durante o TIH de pacientes graves e determinar seus fatores de risco, foram observados 45,8% EA. Destaca-se que dos 45,8% EA, 26% estavam relacionados ao paciente. Houve predominância da queda de saturação em 8,8% e instabilidade hemodinâmica em 5%(66. Parmentier-Decrucq, Poissy J, Favory R, Neseir S, Onimus T, Guerry MJ, et al. Adverse events during intrahospital transport of critically ill patients: incidence and risk factors. Ann Intensive Care. 2013 Apr;3(1):10.).

Sendo assim, antes de realizar o TIH, a avaliação das condições clínicas do paciente que será transportado e dos equipamentos disponíveis é necessária e oportunizará o planejamento adequado do TIH ao prover equipe qualificada e equipamentos que garantam a segurança do paciente. Além disso, essa avaliação assegura a menor possibilidade de ocorrência de erros, incidentes e EA durante o TIH(77. Brunsveld-Reinders AH, Arbous MS, Kuiper SG, de Jonge E. A comprehensive method to develop a checklist to increase safety of intra-hospital transport of critically ill patients. Crit Care. 2015 May;19:214.).

No hospital da região sul do Brasil em que foi realizado o presente estudo existe no mínimo dois profissionais para acompanhar o deslocamento de ida, permanência e volta para UTI; os materiais e equipamentos para monitorar o TIH, nem sempre estão em condições adequadas de funcionamento; constata-se a falta de capacitação para os profissionais e a falta de padronização das etapas do TIH por procedimentos operacionais padrão. Agrava-se esta situação pelo fato de que os estudos se voltam para os fatores de risco relacionados ao TIH, transferindo para segundo plano a atuação dos profissionais de saúde nesta atividade(55. Jia L, Wang H, Gao Y, Liu H, Yu K. High incidence of adverse events during intra-hospital transport of critically ill patients and new related risk factors: a prospective, multicenter study in China. Crit Care. 2016 Jan;20(12):319-22.-66. Parmentier-Decrucq, Poissy J, Favory R, Neseir S, Onimus T, Guerry MJ, et al. Adverse events during intrahospital transport of critically ill patients: incidence and risk factors. Ann Intensive Care. 2013 Apr;3(1):10.).

Diante deste contexto, tem-se como questão de pesquisa qual a percepção dos profissionais de enfermagem sobre a segurança do paciente durante o transporte intra-hospitalar de um paciente internado em uma unidade de terapia intensiva. O objetivo foi verificar a percepção dos profissionais de enfermagem sobre a segurança do paciente durante o transporte intra-hospitalar de um paciente internado em uma unidade de terapia intensiva.

METODOLOGIA

Pesquisa descritiva, qualitativa, aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos com o parecer número 154.984 e Certificado de Apresentação para Apreciação Ética 07422012.1.00000121. A pesquisa foi realizada em uma instituição pública, de grande porte, que atende usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) localizada no sul do Brasil. Foram entrevistados 21 profissionais de enfermagem, entre eles cinco enfermeiros, 13 técnicos de enfermagem, um auxiliar de enfermagem e dois residentes de enfermagem, de uma UTI geral. O plano amostral foi por conveniência e atendeu os seguintes critérios para seleção: trabalhar na UTI por um mínimo de seis meses, ter participado de pelo menos um TIH, ter disponibilidade para a entrevista. Foram excluídos aqueles que estavam, por algum motivo, afastados do serviço no período da coleta de dados.

A coleta de dados ocorreu por meio de entrevista com roteiro semiestruturado, realizada durante o mês de novembro de 2012 pelas pesquisadoras e concluída com a saturação dos dados. Foram realizadas em uma sala apropriada da UTI, individualmente, com data e hora combinado anteriormente, conforme a disponibilidade do participante. As perguntas abordaram a ocorrência de incidentes e EA durante o TIH; facilidades e dificuldades para o TIH; o enfrentamento de um incidente durante o TIH e o comportamento dos profissionais com relação ao TIH. As entrevistas foram gravadas, transcritas, e cada participante leu a transcrição de sua entrevista e validou o seu conteúdo. A análise foi a de conteúdo de Minayo(88. Minayo MCS. O Desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14. ed. São Paulo: Hucitec; 2014.) seguindo as etapas de: pré-análise (retomada do objetivo da pesquisa e elaboração de indicadores que orientaram a interpretação final); exploração do material (codificação com recortes do texto em unidades de registro, seguido pela escolha de regras de contagem com a classificação e agregação dos dados, formando as categorias) e o tratamento dos resultados obtidos e interpretação (interpretação dos dados já categorizados de acordo com o embasamento teórico). Destaca-se que cada participante recebeu e assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O anonimato dos participantes foi garantido com a utilização de siglas seguidas de um algarismo sequencial (ENF1, TEC ENF 1, AUX ENF1, RES ENF1).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Entre os 21 participantes do estudo cinco eram enfermeiros, 13 eram técnicos de enfermagem, um auxiliar de enfermagem e dois residentes de enfermagem. De acordo com a idade dos participantes, 13 tinham entre 31 a 40 anos, seis entre 21 a 30 anos e dois entre 51 a 60 anos. A maioria dos entrevistados era do sexo feminino. Conforme o tempo de atuação profissional, oito participantes tinham entre 11 a 15 anos de profissão, três entre 6 a 10 anos, três entre 16 a 20 anos, três com menos de 1 ano, dois entre 1 a 5 anos e dois com mais de 25 anos. A maioria dos participantes possuía curso de graduação. Todos os participantes já haviam realizado pelo menos um transporte de paciente grave. A análise e a interpretação dos dados possibilitaram a construção de três categorias: responsabilidade do profissional de saúde no TIH, situação de risco para o paciente no TIH, qualidade em estrutura para o TIH.

Responsabilidade do profissional de saúde no transporte intra-hospitalar

A responsabilidade do profissional no TIH volta-se para a prevenção de incidentes e EA. Os profissionais entrevistados compartilham experiências e conhecimentos técnicos científicos que contribuem para a prevenção de incidentes e EA, mostrando a preocupação em realizar o TIH seguro desde a saída do paciente do setor de origem até seu retorno.

[...] É algo que a gente faz habitualmente. É diário o transporte de pacientes para exames. Existe uma preocupação extra não só da equipe de enfermagem, mas sempre do transporte. Tu podes perceber, vai o enfermeiro, o técnico, o fisioterapeuta e o médico porque é algo que mobiliza realmente a equipe [...]. (RENF1)

Não dá para dizer que o transporte é totalmente seguro, mas também não dá para dizer que a gente não faz de forma segura. É seguro em termos de que tem uma equipe comprometida, capaz. A gente tem material adequado para transportar, a gente faz também os contatos prévios para que o paciente não fique aguardando muito tempo, então isso gera segurança [...]. (ENF2)

Eu acho que existe uma preocupação e é mobilizada uma equipe inteira. Vai o médico, vai o fisioterapeuta, vai um técnico e vai um enfermeiro acompanhando esse paciente. Durante o transporte a gente fica de olho na saturação, nos batimentos. [...]. Durante o trajeto acho que é mais crítico, gera mais tensão. (TEC ENF4)

Tem preocupação sim em relação à segurança. As quedas, a parte respiratória, a própria assistência nesse transporte. Dependendo do doente, tem a presença do médico, de um enfermeiro, e o técnico. Procura sempre levar a maleta de transporte com medicações e aparelhos se precisar fazer algo a mais [...]. (TEC ENF10)

Os resultados deste estudo mostraram que em qualquer uma das etapas do TIH (preparo, durante e pós-transporte, os profissionais de enfermagem o reconhecem como uma atividade de risco por identificar que a saída do paciente da UTI para realização de exames ou procedimentos o expõe a potenciais instabilidades que resultam em intercorrências inesperadas, requerendo pronta intervenção. Dessa forma, cada etapa do TIH deve ser conhecida por toda equipe que participa do transporte, para que cada integrante desenvolva sua atribuição.

Todo paciente grave deve ser transportado com o acompanhamento contínuo, no mínimo, de um médico e de um enfermeiro, ambos com habilidade comprovada para o atendimento de urgência e emergência(99. Ministério da Saúde (BR), Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução nº 7. Dispõe sobre os requisitos mínimos para o funcionamento de unidades de terapia intensiva e dá outras providências. Brasília; 2010 [citado 2016 mar 03]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2010/res0007_24_02_2010.html.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
). Esse número, entretanto, pode aumentar de acordo com a avaliação prévia da condição clínica do paciente que será transportado(1010. Fanara B, Manzon C, Barbot O, Desmettre T, Capellier G. Recomendations for the intra-hospital transport of critically ill patients. Crit Care. 2010;14(3):R87.). Salienta-se que a equipe de profissionais que irá realizar o TIH deve possuir uma coordenação e cada integrante ter funções e responsabilidades definidas, de maneira que o grupo esteja preparado para o atendimento das intercorrências.

Além da equipe de enfermagem, do fisioterapeuta e do médico, o provisionamento de recursos materiais é identificado como essencial, pois são os materiais que sustentam a ação do profissional diante de instabilidades durante o trajeto(66. Parmentier-Decrucq, Poissy J, Favory R, Neseir S, Onimus T, Guerry MJ, et al. Adverse events during intrahospital transport of critically ill patients: incidence and risk factors. Ann Intensive Care. 2013 Apr;3(1):10.). É necessário, portanto, estruturar o transporte com um planejamento adequado, a participação de pessoal qualificado em cuidados críticos e a seleção de equipamentos próprios para a monitorização e suporte durante o deslocamento. Estes cuidados, certamente diminuem a probabilidade de insucesso e complicações durante o transporte.

A avaliação do paciente, considerando a estabilidade hemodinâmica e ponderando os riscos e benefícios, permite à equipe uma tomada de decisão adequada e reduz a possibilidade de ocorrências que podem surgir ao longo do trajeto(77. Brunsveld-Reinders AH, Arbous MS, Kuiper SG, de Jonge E. A comprehensive method to develop a checklist to increase safety of intra-hospital transport of critically ill patients. Crit Care. 2015 May;19:214.). Neste sentido, cada profissional tem a responsabilidade de garantir um cuidado seguro e todos os profissionais envolvidos no TIH precisam estar capacitados para gerenciar os incidentes e EA durante o TIH, sejam de origem clínica, técnica ou estrutural(1010. Fanara B, Manzon C, Barbot O, Desmettre T, Capellier G. Recomendations for the intra-hospital transport of critically ill patients. Crit Care. 2010;14(3):R87.-1111. Pedreira LC, Santos IM, Farias MA, Sampaio ES, Barros CSMA, Coeho ACC. Nurses’ knowledge of intra-hospital transport of critical patients. Rev Enferm UERJ. 2014 Jul/Aug; 22(4):533-9.).

Observa-se nas falas dos participantes a ênfase para a segurança do paciente durante o TIH demonstrando algum conhecimento mesmo sem protocolos institucionais que norteiem essa prática.

Situação de risco para o paciente no transporte intra-hospitalar

O TIH tem-se apresentado como um procedimento de risco que favorece a ocorrência de incidentes e EA as quais são decorrentes de falhas ligadas aos equipamentos, à equipe e às alterações fisiológicas que podem deteriorar ainda mais o quadro clínico do paciente(1212. Ministério da Saúde (BR). Fundação Osvaldo Cruz, Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Documento de referência para o Programa Nacional de Segurança do Paciente. Brasília: Ministério da Saúde; 2014 [citado jun 29]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/documento_referencia_programa_nacional_seguranca.pdf.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
-1313. Droogh JM, Smit M, Hut J, Zijlistra JG. Inter-hospital transport of critically ill patients; expect surprises. Crit Care. 2012;16(1):R26.).

A maior intercorrência aqui acontece quando acaba o oxigênio. Se acabar o oxigênio, nós profissionais, realmente ficamos de mãos atadas. Eu não estava no transporte, mas aconteceu no meu turno de trabalho, de o elevador travar e o paciente ficar sem oxigênio porque acabou demorando bastante o procedimento. [...] (ENF2)

[...] Na troca do respirador ainda dentro do box, o respirador de transporte não estava ciclando bem, aí tivemos que voltar para o respirador que estava no box para ajustar o outro. Mas não foi no transporte, foi na mudança, mas já estava no preparo, estava na organização do paciente. (TEC ENF3)

As falas retratam efeitos indesejáveis ao paciente decorrentes de incidentes e EA que ocorreram durante o TIH, independente da situação que o gerou (condição clínica do paciente; problemas com equipamentos; com a equipe e/ou de questões organizacionais) e revelam que durante o TIH a gravidade das complicações pode instabilizar ainda mais a condição clínica do paciente.

As falhas mais comuns com os equipamentos estão relacionadas à bateria de ventilador de transporte, ao oxímetro portátil, a bomba de infusão contínua, ao término do oxigênio. As falhas relacionadas à equipe envolvem a perda ou a tração de dispositivos, a falha na comunicação entre as equipes acarretando em maior exposição do paciente principalmente por estar fora do setor de origem. Dessa forma, um planejamento adequado durante a fase de preparo do paciente e a comunicação efetiva entre setores é necessária para diminuir o tempo de realização do procedimento e de TIH(44. Alamanou DG, Fotos NV, Brokalaki H. Interruption of therapy during intrahospital transport of non-icu patients. Health Sci J. 2013 Apr-Jun;7(2):177-87.,1414. Harish MM, Siddiqui SS, Prabu NR, Chaudhari HK, Divatia JV, Kulkarni AP. Benefits of and untoward events during intrahospital transport of pediatric intensive care unit patients. Indian J Crit Care Med. 2017 Jan;21(1):46-8.).

[...] O paciente era muito grave precisava muito fazer uma tomografia e saindo do elevador, já no corredor acabou evoluindo para uma parada cardíaca [...], a equipe fez reanimação cardíaca e voltamos não para a UTI, mas para a sala de emergência onde era o lugar mais próximo para dar suporte maior para esse paciente [...] depois que ele estava bem estabilizado é que retornou para a UTI, nós não esperávamos que ele iria parar, mas ele era um paciente grave. (TEC ENF2)

Hoje foi um exemplo na verdade. A saturação começou a cair, tiveram que tirar o ventilador e ambuzar o paciente. Já houve queda de saturação do paciente e isso já aconteceu várias vezes. Eu me lembro de um caso de chegar ao elevador e a saturação começou a cair e ter que retornar com o paciente à UTI. [...] (TEC ENF8)

As alterações mais temidas são as fisiológicas, dentre as quais estão às cardiocirculatórias e respiratórias, que são as mais citadas por repercutirem diretamente na condição clínica do paciente, sendo que a alteração dos sinais vitais pode indicar alguma disfunção orgânica. O acompanhamento durante o TIH requer o mesmo rigor de monitorização das funções fisiológicas prestado na UTI até o retorno e, portanto, o paciente deve ser observado continuamente durante todo o TIH(1111. Pedreira LC, Santos IM, Farias MA, Sampaio ES, Barros CSMA, Coeho ACC. Nurses’ knowledge of intra-hospital transport of critical patients. Rev Enferm UERJ. 2014 Jul/Aug; 22(4):533-9.).

No presente estudo, os profissionais de enfermagem demonstraram possuir experiência pessoal com a ocorrência de EA durante o TIH relatando as situações de risco e condutas tomadas. Eles apontaram problemas ligados à condição do paciente, aos equipamentos e as questões organizacionais/estruturais. Estes problemas também são apresentados em um estudo envolvendo 184 TIH. Destes, 44,5% foram relacionados ao paciente envolvendo problemas de queda de saturação, agitação e instabilidade hemodinâmica e 39,6% relacionados a equipamentos/equipe(1515. Hajjej Z, Gharsallah H, Boussaidi I, Daiki M, Labbene I, Ferjani M. Risk of mishaps during intrahospital transport of critically ill patients. Tunis Med. 2015 Nov; 93(11):708-13.).

O desafio em reduzir os incidentes e EA durante o TIH é constante. Assim, faz-se necessária uma avaliação pré-transporte e pós-transporte e um planejamento cuidadoso quanto às condições do paciente, da equipe que o acompanha e a checagem dos equipamentos que garantam a monitorização e o suporte do paciente durante todo o percurso. A equipe deve estar preparada para atuar nas situações de emergência e de prover todos os materiais e acessórios necessários para o atendimento de possíveis EA durante o TIH. Um fator determinante para o sucesso do TIH está na capacitação da equipe envolvida neste cuidado(77. Brunsveld-Reinders AH, Arbous MS, Kuiper SG, de Jonge E. A comprehensive method to develop a checklist to increase safety of intra-hospital transport of critically ill patients. Crit Care. 2015 May;19:214.).

Qualidade em estrutura para o transporte intra-hospitalar

No cotidiano da rotina assistencial nem sempre o cuidado é prestado de forma totalmente segura, seja em decorrência da condição clínica do paciente, da organização do serviço ou pelas condições inadequadas de infraestrutura. No TIH, os aspectos organizacionais e, especialmente, estruturais também estão relacionados à ocorrência de incidentes e de EA.

O que talvez torna inseguro em garantir a segurança do paciente durante o TIH é a questão do ambiente em si. Nós temos um piso irregular, nós temos um elevador ruim no hospital. Acredito que essa questão estrutural ainda tenha que melhorar. Elevadores ruins que não funcionam, desnível no solo. A nossa maca não é adequada, não tem suporte de soro adequado. Nesta semana nós levamos um paciente para exame e ele reclamou que a maca pegou num desnível do elevador, a maca sacolejou, o paciente sentiu dor. (ENF1)

A estrutura física eu acho que interfere. Às vezes locais difíceis de passar com a cama, as macas às vezes pesadas demais comprometem a segurança do paciente. (TEC ENF3)

[...] O elevador é muito pequeno, às vezes não funciona, o local dos exames é muito longe, a distância do centro cirúrgico também é muito distante. Aqui tudo é distante da UTI [...]. (TEC ENF5)

Estudo com 459 TIH observou que 9,4% EA foram relacionados ao paciente, 1,1% aos aspectos organizacionais/estruturais e quatro 0,8% aos equipamentos. O estudo ainda destacou os problemas de comunicação como um dos principais fatores para a ocorrência de EA(1616. Meneguin S, Alegre PHC, Luppi CHB. Characterization of the intrahospital transport of critically ill patients. Acta Paul Enferm. 2014 Mar-Apr;27(2):115-9.). Neste sentido, ao transportar um paciente do seu setor de origem para outro ambiente pode acontecer de que o setor de destino não esteja adequadamente preparado para receber um paciente grave e assim gerar riscos potenciais. Por isso, a comunicação entre as equipes, é reconhecida como fator que pode evitar a ocorrência de incidentes e EA, sendo vital para reduzir o tempo de espera e o tempo de transporte(1616. Meneguin S, Alegre PHC, Luppi CHB. Characterization of the intrahospital transport of critically ill patients. Acta Paul Enferm. 2014 Mar-Apr;27(2):115-9.).

Esse cuidado deve existir entre setores para que o paciente não seja submetido à espera desnecessária e também para que a equipe que recebe o paciente tenha conhecimento das condições clínicas e prepare o local da melhor forma para recebê-lo.

Assim, observa-se que a organização e a estrutura de um serviço interferem e comprometem o alcance do resultado desejável. Por esta razão, a participação de gestores, dos profissionais que atuam diretamente na assistência é essencial para a determinação de estratégias por melhores resultados. O ambiente de trabalho tem forte influência sobre a prática do cuidado e consequente em garantir segurança a para o paciente(1717. Tomazoni A, Rocha PK, Ribeiro MB, Serapião LS, Souza S, Manzo BF. Perception of nursing and medical professionals on patient safety in neonatal intensive care units. Rev Gaúcha Enferm. 2017 Mar;38(1):e64996.).

Percebe-se que a estrutura física do hospital pesquisado apresenta alguns problemas relacionados ao encaminhamento de pacientes para realização de exames e ou procedimentos. Os profissionais apontam que as salas são pequenas, com pouco espaço para a transferência do leito para a maca, gerando riscos adicionais; problemas com elevadores que travam durante o deslocamento de um andar para o outro; a utilização de equipamentos antigos; a distância entre setores. Observa-se que as características estruturais, as quais envolvem a planta física e recursos institucionais, proporcionam riscos ao paciente.

Considerando os discursos do participantes, proteger os pacientes de incidentes e EA deve ser uma responsabilidade de todos os profissionais envolvidos direta ou indiretamente nessa atividade através da criação de fluxos de atendimento e capacitação da equipe(1111. Pedreira LC, Santos IM, Farias MA, Sampaio ES, Barros CSMA, Coeho ACC. Nurses’ knowledge of intra-hospital transport of critical patients. Rev Enferm UERJ. 2014 Jul/Aug; 22(4):533-9.).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo originou-se da dissertação de mestrado intitulada Incidentes e eventos adversos relacionados ao transporte intra-hospitalar de pacientes internados em unidade de terapia intensiva, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil(1818. Silva R. Incidentes e eventos adversos relacionados ao transporte intra-hospitalar de pacientes internados em unidade de terapia intensiva [dissertação]. Florianópolis (SC): Universidade Federal de Santa Catarina; 2013.).

Observou-se que a equipe de enfermagem da UTI do Hospital pesquisado percebe os riscos e as possíveis complicações as quais os pacientes estão expostos. Os depoimentos obtidos na realização da presente pesquisa convergem com os citados na literatura. São situações em que os riscos relacionados ao TIH e a falta de planejamento e atenção em qualquer uma das etapas do TIH pode resultar em incidentes e EA. A presença da equipe completa, a criação de protocolos institucionais que auxiliem e padronizem os cuidados relacionados a cada etapa do transporte, além das capacitações dos profissionais envolvidos favorecem uma prática mais segura. A pesquisa apresenta como limitação um número pequeno de participantes e o fato de ter sido realizada somente na UTI de um hospital público.

O estudo trouxe como limitação, ter sido realizado em uma única instituição não expressando a realidade de outros serviços que vivem essa realidade. Os resultados apresentados podem servir de subsídios para outras instituições de saúde e auxiliar na elaboração de protocolos institucionais, capacitações, e demais estratégias que contribuam para evitar a ocorrência de EA e melhorar a qualidade do cuidado.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Rodriguez AH, Bub MBC, Perão OF, Zandonadi G, Rodriguez MJH. Características epidemiológicas e causas de óbitos em pacientes internados em terapia intensiva. Rev Bras Enferm. 2016 mar-abr;69(2):229-34.
  • 2
    Kue R, Brown P, Ness C, Scheulen J. Adverse clinical events during intrahospital transport by a specialized team: a preliminary report. Am J Crit Care. 2011 Mar;20(2):153-62.
  • 3
    Almeida ACG, Neves ALD, Souza CLB, Garcia JH, Lopes JL, Barros ALBL. Intra-hospital transport of critically ill adult patients: complications related to staff, equipment and physiological factors. Acta Paul Enferm. 2012;25(3):471-6.
  • 4
    Alamanou DG, Fotos NV, Brokalaki H. Interruption of therapy during intrahospital transport of non-icu patients. Health Sci J. 2013 Apr-Jun;7(2):177-87.
  • 5
    Jia L, Wang H, Gao Y, Liu H, Yu K. High incidence of adverse events during intra-hospital transport of critically ill patients and new related risk factors: a prospective, multicenter study in China. Crit Care. 2016 Jan;20(12):319-22.
  • 6
    Parmentier-Decrucq, Poissy J, Favory R, Neseir S, Onimus T, Guerry MJ, et al. Adverse events during intrahospital transport of critically ill patients: incidence and risk factors. Ann Intensive Care. 2013 Apr;3(1):10.
  • 7
    Brunsveld-Reinders AH, Arbous MS, Kuiper SG, de Jonge E. A comprehensive method to develop a checklist to increase safety of intra-hospital transport of critically ill patients. Crit Care. 2015 May;19:214.
  • 8
    Minayo MCS. O Desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14. ed. São Paulo: Hucitec; 2014.
  • 9
    Ministério da Saúde (BR), Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução nº 7. Dispõe sobre os requisitos mínimos para o funcionamento de unidades de terapia intensiva e dá outras providências. Brasília; 2010 [citado 2016 mar 03]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2010/res0007_24_02_2010.html
    » http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2010/res0007_24_02_2010.html
  • 10
    Fanara B, Manzon C, Barbot O, Desmettre T, Capellier G. Recomendations for the intra-hospital transport of critically ill patients. Crit Care. 2010;14(3):R87.
  • 11
    Pedreira LC, Santos IM, Farias MA, Sampaio ES, Barros CSMA, Coeho ACC. Nurses’ knowledge of intra-hospital transport of critical patients. Rev Enferm UERJ. 2014 Jul/Aug; 22(4):533-9.
  • 12
    Ministério da Saúde (BR). Fundação Osvaldo Cruz, Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Documento de referência para o Programa Nacional de Segurança do Paciente. Brasília: Ministério da Saúde; 2014 [citado jun 29]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/documento_referencia_programa_nacional_seguranca.pdf
    » http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/documento_referencia_programa_nacional_seguranca.pdf
  • 13
    Droogh JM, Smit M, Hut J, Zijlistra JG. Inter-hospital transport of critically ill patients; expect surprises. Crit Care. 2012;16(1):R26.
  • 14
    Harish MM, Siddiqui SS, Prabu NR, Chaudhari HK, Divatia JV, Kulkarni AP. Benefits of and untoward events during intrahospital transport of pediatric intensive care unit patients. Indian J Crit Care Med. 2017 Jan;21(1):46-8.
  • 15
    Hajjej Z, Gharsallah H, Boussaidi I, Daiki M, Labbene I, Ferjani M. Risk of mishaps during intrahospital transport of critically ill patients. Tunis Med. 2015 Nov; 93(11):708-13.
  • 16
    Meneguin S, Alegre PHC, Luppi CHB. Characterization of the intrahospital transport of critically ill patients. Acta Paul Enferm. 2014 Mar-Apr;27(2):115-9.
  • 17
    Tomazoni A, Rocha PK, Ribeiro MB, Serapião LS, Souza S, Manzo BF. Perception of nursing and medical professionals on patient safety in neonatal intensive care units. Rev Gaúcha Enferm. 2017 Mar;38(1):e64996.
  • 18
    Silva R. Incidentes e eventos adversos relacionados ao transporte intra-hospitalar de pacientes internados em unidade de terapia intensiva [dissertação]. Florianópolis (SC): Universidade Federal de Santa Catarina; 2013.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    12 Mar 2017
  • Aceito
    24 Maio 2017
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Escola de Enfermagem Rua São Manoel, 963 -Campus da Saúde , 90.620-110 - Porto Alegre - RS - Brasil, Fone: (55 51) 3308-5242 / Fax: (55 51) 3308-5436 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: revista@enf.ufrgs.br