INTRODUÇÃO
O ritmo acelerado das transformações organizacionais, sociais e jurídicas tem influenciado no processo de saúde/adoecimento do trabalhador1. A exposição prolongada a estressores ambientais e situacionais resulta no estresse ocupacional, que por sua vez contribui com o aumento da exaustão emocional e da despersonalização, assim como com a baixa realização profissional2.
São estressores comuns no ambiente laboral: jornada de trabalho exaustiva, baixa remuneração, conflitos com colegas, complexidade dos procedimentos, falta de recursos pessoais e materiais2-5.
Enfermeiros de unidade de terapia intensiva sofrem influência contínua de diversos estressores encontrados no ambiente laboral. Devido ao trabalho exaustivo e tenso, esses profissionais estão mais propensos a desenvolver o estresse ocupacional4, que com o tempo pode desencadear a síndrome de burnout, assim como outros transtornos mentais6. O burnout e o estresse são os temas mais abordados por pesquisadores da área de saúde mental no trabalhador1.
Tem sido relatado que o burnout entre os enfermeiros é mais elevado do que em outros profissionais da saúde7, uma vez que eles experimentam situações estressantes constantes no trabalho, além de atuarem em contato direto com os pacientes críticos que têm prognósticos diferentes e graus de sofrimento diversos8.
O termo burnout, em inglês significa “queimar-se” ou “consumir-se. Esta doença é caracterizada por sintomas específicos (irritabilidade, dores musculares, falta de apetite, esgotamento físico e mental) e por ser subdividida em três dimensões: exaustão emocional, despersonalização e realização profissional9.
Na segunda década do século XXI os pesquisadores aprofundaram as investigações na tentativa de compreender a existência de associação entre a ocorrência do burnout e os possíveis fatores preditores1,4-5, o que motivou a realização da pesquisa. A questão norteadora desse estudo foi analisar se em um ambiente de trabalho de unidade de terapia intensiva existem fatores que possam ser considerados como preditores da síndrome de burnout em enfermeiros. Ao lado dessas características, o estudo buscou identificar qual a prevalência do burnout nesses indivíduos, detalhando as três dimensões.
A justificativa para a realização desse estudo baseia-se na necessidade de analisar a existência de fatores preditores do burnout em enfermeiros de terapia intensiva, para conhecer a relação entre o trabalho dos enfermeiros e a síndrome de burnout. Os resultados encontrados podem subsidiar importantes pontos de reflexão sobre como promover à saúde no trabalho e a elaboração de programas de saúde ocupacional na instituição onde foi realizada esta pesquisa, para prevenir e detectar essas doenças nos enfermeiros de unidade de terapia intensiva.
O estudo teve como objetivo identificar a prevalência e analisar a existência de fatores preditores da síndrome de burnout em enfermeiros de unidade de terapia intensiva.
MÉTODOS
Estudo quantitativo, descritivo e transversal, realizado em um único hospital universitário de grande porte da cidade de São Paulo (SP), Brasil. O hospital atende a todas as especialidades médicas, com vocação para procedimentos de alta complexidade. Sua representatividade para os gestores da Grande São Paulo o torna uma referência municipal e estadual, além de atender a pacientes de outros estados.
A amostra foi definida utilizando a modalidade de amostragem não probabilística por conveniência, os sujeitos foram selecionados de acordo com a presença durante o período em que ocorreu a coleta dos dados, sendo o número total da amostra de 91 participantes. Os critérios de inclusão foram: ser enfermeiro assistencial, atuar em unidade de terapia intensiva ou nos setores de retaguarda das unidades de terapia intensiva (pronto-socorro, hemodiálise e tratamento de queimados). Não foram adotados critérios de exclusão.
Estiveram envolvidas no estudo as seguintes unidades de terapia intensiva: neurocirurgia, pneumologia, pediatria, neonatal, cirurgia cardíaca, clínica médica, cardíaca, tratamento de queimados, convênio e geral. Também participaram do estudo os enfermeiros que atuavam em um setor fechado do pronto-socorro, na hemodiálise e tratamento de queimados, essas unidades especializadas atendem a pacientes críticos e funcionam como retaguarda das unidades de terapia intensiva por prestarem assistência de alta complexidade, além de que as situações de urgência e emergência apresentam similaridade com as situações que ocorrem em unidade de terapia intensiva.
A coleta dos dados ocorreu em julho de 2014, tendo sido realizada pelo pesquisador responsável nos setores de atuação dos participantes. Foram entregues dois instrumentos para os participantes responderem antes do início do horário de trabalho e recolhidos após o término do plantão. Os instrumentos utilizados foram: um formulário de coleta de dados sociodemográficos e o Maslach Burnout Inventory (MBI) em sua versão Human Services Survey (HSS).
O formulário de coleta de dados sociodemográficos é composto por perguntas de múltipla escolha e abertas, abrangendo: sexo, idade, setor, estado civil, filhos, turno, carga horária, tempo em unidade de terapia intensiva, número de pacientes atendidos por dia, duração das férias, prática de atividade física e participação em capacitações no hospital.
O MBI-HSS, voltado para os profissionais da saúde, em sua versão traduzida e adaptada por Benevides-Pereira, foi utilizado com a finalidade de identificar o porcentual de funcionários com a síndrome de burnout10.
Foram utilizados como pontos de corte os valores de referência do Grupo de Estudos e Pesquisas Sobre Estresse e Síndrome de Burnout: exaustão emocional (baixo: zero a 15; médio: 16 a 25; e alto: 26 a 54); despersonalização (baixo: zero a 2; médio: 3 a 8; e alto: 9 a 30) e realização profissional (baixo: zero a 33; médio: 34 a 42; e alto: 43 a 48)11. Constata-se a síndrome de burnout pela combinação de alta exaustão emocional, alta despersonalização e baixa realização profissional9.
Os resultados foram expressos por meio das técnicas de estatística descritiva: média, coeficiente de variação, desvio padrão e de percentuais para as variáveis categóricas. Utilizou-se o coeficiente do alfa de Cronbach, para verificar a consistência interna de cada dimensão e do escore total do MBI-HSS. Para verificar a associação entre a ocorrência do burnout e as variáveis categóricas foram aplicados o teste Qui-Quadrado de Pearson ou o teste Exato de Fisher, quando a condição para uso do teste Qui-Quadrado não foi verificada. A força da associação entre as variáveis foi avaliada por meio do OR (Odds Ratio) ou Razão de Chances (RC) com o respectivo Intervalo de Confiança (IC).
A margem de erro utilizada nas decisões dos testes estatísticos foi de 5% (p < 0,05) e os intervalos com 95% de confiança. O programa estatístico para digitação e obtenção dos cálculos estatísticos foi o Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) na versão 21.
Após a autorização do hospital, o projeto foi encaminhado para avaliação ao Comitê de Ética em Pesquisa, sendo aprovado sob o Parecer CEP nº 332.462. Os instrumentos foram aplicados após os participantes assinarem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). A pesquisa é oriunda de uma dissertação de mestrado11 que atendeu às normas nacionais e internacionais de ética em pesquisa envolvendo seres humanos.
RESULTADOS
De acordo com os critérios de inclusão estabelecidos, o número total da amostra deste estudo foi de 91 enfermeiros assistenciais. Desses, 81 (89,0%) eram mulheres, 57 (62,6%) eram solteiros, 65 (71,4%) referiram não ter filhos. A idade variou entre 22 e 59 anos, com média de 30,82 anos e desvio padrão de 6,42. A distribuição da faixa etária foi semelhante, 46 (50,5%) indivíduos tinham entre 30 e 59 anos e 45 (49,5%) tinham entre 22 e 29 anos. O setor com maior porcentagem de enfermeiros foi a unidade de terapia intensiva geral, com 18,7%. O vínculo empregatício predominante foi o celetista, com 78 (85,7%) enfermeiros. Com relação ao turno, a maior porcentagem foi dos enfermeiros do noturno, com 34,0%. Ressalta-se que a maior parte não possuía outro trabalho (93,4%), eles tinham carga horária semanal entre 30 e 40 horas (53,8%), a duração das últimas férias foi de 30 dias (78,3%), tinham mais de 5 anos em terapia intensiva (41,8%), atendiam menos que 10 pacientes por dia (80,2%) e participavam de capacitações no hospital (57,1%).
De acordo com os resultados do MBI, dos 91 enfermeiros que participaram do estudo, 78 (85,7%) não apresentaram a síndrome de burnout e 13 (14,3%) apresentaram.
A Tabela 1 mostra a porcentagem dos indivíduos com alta exaustão emocional, alta despersonalização e baixa realização profissional, respectivamente: 47,2%, 34,1% e 34,1%. A confiabilidade do instrumento foi avaliada por meio do coeficiente alfa de Cronbach, o MBI atingiu valor igual a 0,72, sendo considerado como confiável. O coeficiente da dimensão de exaustão emocional foi de 0,87, o da despersonalização foi de 0,64 e o da realização profissional, 0,79.
Tabela 1 Distribuição dos enfermeiros segundo os níveis das dimensões, escore médio, desvio padrão, coeficiente de variação e alfa de Cronbach do Maslach Burnout Inventory (MBI). São Paulo (SP), Brasil, 2014
Dimensão | Nível | n(%) | Escore Médio | DP | CV | AC | AC (MBI) |
Exaustão | Alto | 43(47,2) | 25,82 | 10,68 | 0,41 | 0,87 | 0,72 |
Emocional | Médio | 31(34,1) | |||||
Baixo | 17(18,7) | ||||||
Despersonalização | Alto | 31(34,1) | 6,84 | 5,36 | 0,78 | 0,64 | |
Médio | 35(38,4) | ||||||
Baixo | 25(27,5) | ||||||
Realização | Alto | 19(20,9) | 36,21 | 6,92 | 0,19 | 0,79 | |
Profissional | Médio | 41(45,0) | |||||
Baixo | 31(34,1) |
FonteDados da pesquisa, 2014.
Nota:DP: despersonalização; CV: coeficiente de variação; AC: alfa de Cronbach; MBI: Maslach Burnout Inventory.
Dos resultados encontrados na Tabela 2, destaca-se que a porcentagem dos enfermeiros classificados com a síndrome de burnout foi mais elevada para a faixa etária dos indivíduos que tinham entre 22 e 29 anos (20,7%), nos participantes do sexo feminino (16%), nos solteiros (17,5%) e entre os enfermeiros que não tinham filhos (16,9%).
Tabela 2 Prevalência da síndrome de burnout segundo as variáveis sociodemográficas dos enfermeiros. São Paulo (SP), Brasil, 2014
Burnout | ||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Variável | Presente | Ausente | Total | p-value | OR (IC a 95%) | |||
n | % | n | % | n | % | |||
Faixa etária (anos) | ||||||||
22 a 29 | 9 | 20,0 | 36 | 80,0 | 45 | 100,0 | p1 = 0,123 | 2,63 (0,75 a 9,25) |
30 a 59 | 4 | 8,7 | 42 | 91,3 | 46 | 100,0 | 1,00 | |
Sexo | ||||||||
Masculino | - | - | 10 | 100,0 | 10 | 100,0 | p2 = 0,347 | ** |
Feminino | 13 | 16,0 | 68 | 84,0 | 81 | 100,0 | ||
Estado civil | ||||||||
Casado | 3 | 8,8 | 31 | 91,2 | 34 | 100,0 | p2) = 0,357 | 1,00 |
Solteiro | 10 | 17,5 | 47 | 82,5 | 57 | 100,0 | 2,20 (0,56 a 8,63) | |
Filhos | ||||||||
Sim | 2 | 7,7 | 24 | 92,3 | 26 | 100,0 | p2 = 0,335 | ** |
Não | 11 | 16,9 | 54 | 83,1 | 65 | 100,0 | ||
Grupo total | 13 | 14,3 | 78 | 85,7 | 91 | 100,0 |
Fonte:Dados da pesquisa, 2014. OR: Odds Ratio; IC: Intervalo de Confiança.
**Não foi possível determinar devido à ocorrência de frequências nulas e muito baixas.
1Através do teste Qui-Quadrado de Pearson.
2Através do teste Exato de Fisher.
De acordo com os resultados da Tabela 3, a maioria dos indivíduos que apresentava a síndrome de burnout não praticava atividade física (14,9%) e estava na faixa salarial de 10 ou mais salários mínimos (21,4%).
Tabela 3 Prevalência da síndrome de burnout segundo as variáveis sociodemográficas e hábitos de vida. São Paulo (SP), Brasil, 2014
Burnout | ||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Variável | Presente | Ausente | Total | p-value | OR (IC a 95) | |||
n | % | n | % | n | % | |||
Prática de atividade física | ||||||||
Sim | 6 | 13,6 | 38 | 86,4 | 44 | 100,0 | p1= 0,864 | 1,00 |
Não | 7 | 14,9 | 40 | 85,1 | 47 | 100,0 | 1,11 (0,34 a 3,60) | |
Grupo total | 13 | 14,3 | 78 | 85,7 | 91 | 100,0 | ||
Renda(3) | ||||||||
2 a 5 | 3 | 7,1 | 39 | 92,9 | 42 | 100,0 | p(2) = 0,234 | 1,00 |
6 a 9 | 5 | 18,5 | 22 | 81,5 | 27 | 100,0 | 2,95 (0,64 a 13,56) | |
10 ou mais | 3 | 21,4 | 11 | 78,6 | 14 | 100,0 | 3,55 (0,63 a 20,09) | |
Grupo total | 11 | 13,3 | 72 | 86,7 | 83 | 100,0 |
Fonte:Dados da pesquisa, 2014. OR: Odds Ratio; IC: Intervalo de Confiança.
1Através do teste Qui-Quadrado de Pearson.
2Através do teste Exato de Fisher.
3Oito pesquisados não informaram a renda.
Conforme mostra a Tabela 4, dos seis indivíduos que tinham outro emprego, dois (33,3%) estavam com a síndrome de burnout, a maioria dos que apresentavam a doença (14,3%) trabalhava entre 30 e 40 horas por semana, tinha entre 2 e 3 anos de experiência em unidade de terapia intensiva (30,8%), atendia menos de 10 pacientes por dia (13,7%) e não participava das capacitações no hospital (17,9%).
Das variáveis estudadas, a duração das férias foi a única que apresentou associação significativa com a ocorrência do burnout (p=0,034, OR=3,92 com intervalo que exclui o valor de 1). Em que os enfermeiros que tiveram as últimas férias com duração de até 25 dias tinham 3,92 vezes a chance de apresentarem a síndrome de burnout em relação aos enfermeiros que tiveram suas últimas férias com duração de 30 dias ou mais. É possível observar que a porcentagem dos participantes com a presença do burnout foi mais elevada entre os que tiveram as últimas férias com até 25 dias do que para os que tiveram férias com duração de 30 dias ou mais (30,0% x 9,9%).
Tabela 4 Prevalência da síndrome de burnout segundo as variáveis relacionadas à profissão, São Paulo (SP), Brasil, 2014
Burnout | ||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Variável | Presente | Ausente | Total | p-value | OR (IC a 95) | |||
n | % | n | % | n | % | |||
Turno | ||||||||
Manhã | 5 | 16,7 | 25 | 83,3 | 30 | 100,0 | p1 = 0,805 | 1,04 (0,27 a 4,03) |
Tarde | 3 | 10,0 | 27 | 90,0 | 30 | 100,0 | 0,58 (0,13 a 2,67) | |
Noite | 5 | 16,1 | 26 | 83,9 | 31 | 100,0 | 1,00 | |
Possui outro trabalho | ||||||||
Sim | 2 | 33,3 | 4 | 66,7 | 6 | 100,0 | p1 = 0,203 | ** |
Não | 11 | 12,9 | 74 | 87,1 | 85 | 100,0 | ||
Carga horária | ||||||||
< 30 horas | - | - | 7 | 100,0 | 7 | 100,0 | p1 = 0,270 | ** |
30 a 40 horas | 7 | 14,3 | 42 | 85,7 | 49 | 100,0 | ** | |
41 a 50 horas | 3 | 23,1 | 10 | 76,9 | 13 | 100,0 | ** | |
51 a 60 horas | 3 | 27,3 | 8 | 72,7 | 11 | 100,0 | ** | |
> 60 horas | - | - | 11 | 100,0 | 11 | 100,0 | ** | |
Duração das férias (dias) | ||||||||
Até 25 dias | 6 | 30,0 | 14 | 70,0 | 20 | 100,0 | p1 = 0,034* | 3,92 (1,14 a 13,46) |
30 ou mais | 7 | 9,9 | 64 | 90,1 | 71 | 100,0 | 1,00 | |
Tempo de atuação em unidade de terapia intensiva | ||||||||
6 meses a 1 ano | 1 | 7,1 | 13 | 92,9 | 14 | 100,0 | p1 = 0,202 | ** |
> 1 a 2 anos | 2 | 15,4 | 11 | 84,6 | 13 | 100,0 | ** | |
> 2 a 3 anos | 4 | 30,8 | 9 | 69,2 | 13 | 100,0 | ** | |
> 3 a 5 anos | 3 | 23,1 | 10 | 76,9 | 13 | 100,0 | ** | |
> 5 anos | 3 | 7,9 | 35 | 92,1 | 38 | 100,0 | ** | |
Pacientes atendidos por dia | ||||||||
Menos de 10 | 10 | 13,7 | 63 | 86,3 | 73 | 100,0 | p1 = 0,716 | 1,00 |
10 ou mais | 3 | 16,7 | 15 | 83,3 | 18 | 100,0 | 1,26 (0,31 a 5,15) | |
Participação em capacitações no hospital | ||||||||
Sim | 6 | 11,5 | 46 | 88,5 | 52 | 100,0 | p2 = 0,546 | 1,00 |
Não | 7 | 17,9 | 32 | 82,1 | 39 | 100,0 | 1,68 (0,52 a 5,46) | |
Grupo total | 13 | 14,3 | 78 | 85,7 | 91 | 100,0 |
Fonte:Dados da pesquisa, 2014. OR: Odds Ratio; IC: Intervalo de Confiança.
*Associação significativa ao nível de 5,0.
**Não foi possível determinar devido à ocorrência de frequências nulas ou muito baixas.
1Através do teste Exato de Fisher.
2Através do teste Qui-Quadrado de Pearson.
DISCUSSÃO
O estudo buscou investigar a prevalência e possíveis fatores sociodemográficos, hábitos de vida e relacionados ao trabalho que estão associados à ocorrência da síndrome de burnout. Os resultados mostraram que a prevalência de enfermeiros com a síndrome de burnout correspondeu a 14,3%, índice similar ao encontrado na literatura8,12.
Os participantes apresentaram altos níveis de exaustão emocional (47,2%) e de despersonalização (34,1%), assim como baixo nível de realização profissional (34,1%). Resultados que são semelhantes aos encontrados em estudos realizados com enfermeiros de emergência e unidade de terapia intensiva12-15.
Embora a maioria dos enfermeiros com a síndrome de burnout fosse do sexo feminino, solteiro e sem filhos16-18, não houve associação significativa entre a ocorrência do burnout e essas variáveis1,13,15. Porém um estudo internacional mostrou resultado contraditório, em que a variável sexo foi considerada como um fator preditor da síndrome4.
A predominância do sexo feminino está de acordo com o fato de que na área da saúde as mulheres são maioria, pois existe uma preferência na escolha de profissões relacionadas com as atividades de cuidar, além de que o exercício profissional da enfermagem é mais frequente entre elas16-17.
As mulheres têm maior vulnerabilidade ao burnout, uma vez que são mais propensas a se envolver com os problemas das pessoas a quem prestam serviço. Existe um forte predomínio do sexo feminino nessa categoria profissional, porém não se pode encobrir a influência das questões de gênero sobre o burnout17.
Quanto a idade a maioria dos estudos mostram que o burnout predomina nos enfermeiros mais jovens1,18 e que houve associação significativa4,18, resultado contraditório ao encontrado nessa pesquisa. Os profissionais jovens dessa categoria, ainda no início da carreira, são considerados inexperientes, porém estão buscando adquirir destreza com os procedimentos e experiência no manejo dos pacientes críticos de unidade de terapia intensiva diante das situações de urgência e emergência, contudo acabam ficando mais tensos sofrendo influência do estresse ocupacional, que ao longo dos anos pode facilitar a ocorrência do burnout1,18. Enquanto outra pesquisa mostrou que o burnout acomete os indivíduos mais velhos, entre 41 e 60 anos, uma vez que a idade é considerada um fator importante para o desenvolvimento de transtornos mentais devido a diminuição da capacidade de adaptação às condições de estresse no trabalho16.
A maioria dos enfermeiros que apresentava a síndrome de burnout não praticava atividade física e não houve associação significativa na literatura1, ratificando o resultado encontrado no presente estudo.
Os enfermeiros com burnout recebiam entre 10 ou mais salários mínimos, ou seja, eram profissionais bem remunerados16. Estudos nacionais mostram que não houve associação significativa1,15, acredita-se que isto ocorreu devido às características peculiares da amostra e a pequena quantidade de participantes, porém foi encontrado um resultado controverso em um estudo internacional que evidenciou associação significativa, mostrando que quanto menor a renda, maior a ocorrência do burnout, uma vez que o salário (recompensa) ainda é incompatível com o esforço empregado na efetivação das tarefas4-5.
O turno de trabalho foi considerado como um fator preditor do burnout, uma pesquisa internacional realizada com médicos residentes da Sociedade Americana de Cirurgiões Plásticos mostrou que os plantões noturnos são considerados como fator de risco significativo para o burnout, evidenciando associação significativa com esta variável5.
A maioria dos profissionais com burnout na presente pesquisa não possuía outro emprego, resultado contraditório ao pontuado pela literatura nacional, baseado no fato de que os profissionais com mais de um emprego acumulavam funções, conduzindo à percepção de que os recursos de que se dispõe são menores que o necessário para realizar as atividades. Este aspecto provoca a sensação de um desequilíbrio crônico em que o trabalho exige muito mais do que o indivíduo pode dar e ele recebe muito menos do que precisa17-19.
Os enfermeiros com carga horária de 30 horas semanais foram mais acometidos pelo burnout, resultado contraditório ao pontuado pela literatura nacional, uma vez que os enfermeiros com carga horária elevada devido ao duplo vínculo empregatício sofrem uma sobrecarga laboral, e este é um dos fatores que facilita o desenvolvimento do burnout19. Houve associação significativa entre a ocorrência do burnout e a carga horária4-5, resultado controverso ao encontrado nesse estudo.
Com relação à duração das férias e a ocorrência do burnout, o presente estudo mostrou que as férias com duração de até 25 dias podem ser consideradas como um fator facilitador da ocorrência da síndrome de burnout, resultado novo na literatura nacional uma vez que não foram encontrados estudos com esta variável em enfermeiros de terapia intensiva. O período de férias é importante para que o trabalhador tenha mais tempo para conviver com a família, realizar atividades de lazer, descansar, buscando restabelecer o equilíbrio emocional. Porém nessa instituição alguns profissionais da enfermagem parcelam as férias ou vendem uma parte para aumentar a renda, o que pode facilitar a ocorrência da síndrome de burnout nesses trabalhadores.
De acordo com a literatura nacional e internacional, o porcentual dos enfermeiros com burnout é mais elevado entre os que atuam entre dois a cinco anos na área13,17. Houve associação significativa entre a ocorrência do burnout e o tempo de atuação4, resultado controverso ao encontrado nesse estudo. Os profissionais com menos tempo de atuação apresentam maior nível de esgotamento, sentimentos e atitudes negativas relacionadas ao trabalho, associado com expectativas não concretizadas e dificuldade de vislumbrar maiores possibilidades de melhorias nas condições laborais1,13,17.
A maioria dos enfermeiros com burnout atendia menos de 10 pacientes por dia, porém não houve associação significativa com esta variável1. A síndrome de burnout atinge os profissionais que lidam com pessoas e necessitam de um intenso relacionamento interpessoal para realizar as suas atividades7-8, entretanto esses trabalhadores estão sobrecarregados e não tem recursos suficientes para um efetivo enfrentamento da demanda de serviços e acabam perdendo o sentido do seu trabalho.
Acredita-se que as características sociodemográficas ou pessoais, como: idade, sexo, estado civil e filhos, sejam facilitadoras ou inibidoras da ação dos agentes estressores11. Entretanto os considerados preditores do burnout são apenas facilitadores ou não do desenvolvimento da síndrome de burnout, esta por sua vez é desencadeada por um somatório de fatores sociodemográficos (idade, sexo, estado civil), principalmente os relacionados ao trabalho (tipo de ocupação, turno, sobrecarga) e os organizacionais (ambiente físico, recompensa, burocracia, segurança)1,4-5.
CONCLUSÕES
A prevalência de enfermeiros com a síndrome de burnout correspondeu a 14,3% da amostra. De acordo com os resultados obtidos, não houve associação significativa entre as variáveis estudadas e a ocorrência do burnout, exceto com relação à duração das férias, sendo a única que apresentou associação significativa.
As limitações desse estudo estão relacionadas ao número de participantes envolvidos que não permitiu generalizar os resultados. Além disso, o MBI-HSS não tem poder diagnóstico, ou seja, para a confirmação do burnout é necessário, preferencialmente, uma avaliação por um psiquiatra experiente. Entretanto os autores pretendem utilizar essa pesquisa como base para a elaboração de um programa de saúde ocupacional institucional, uma vez que com esses dados é possível compreender melhor os perfis de risco que levam ao burnout.
O estudo contribui com o conhecimento na área de saúde mental do trabalhador, uma vez que esta é a primeira pesquisa nacional com enfermeiros assistenciais de unidade de terapia intensiva que evidenciou associação significativa entre a duração das férias e a ocorrência do burnout. Pesquisas futuras devem examinar as diferentes relações entre essas variáveis e a ocorrência do burnout nos enfermeiros que trabalham em hospitais públicos e privados. Seria importante replicar esse estudo em unidades de terapia intensiva de outros estados, permitindo a comparação e melhorando a generalização dos resultados.