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Percepção do usuário no autocuidado de úlcera em membros inferiores

Percepción del usuario en el autocuidado de úlcera en miembros inferiores

Resumo

OBJETIVO

Conhecer a percepção do usuário no autocuidado de úlcera em membros inferiores.

MÉTODO

Estudo qualitativo, exploratório e descritivo, realizado com 10 usuários atendidos no Programa de Assistência Complementar de um Ambulatório de Feridas de Canoas (RS). A coleta dos dados deu-se entre outubro a novembro de 2016, por meio de informações contidas nos prontuários dos usuários e de entrevista semiestruturada.

RESULTADOS

A discussão dos resultados deu-se mediante a Análise Temática de Conteúdo, constituindo três categorias temáticas: autocuidado e o convívio com a úlcera, déficit de autocuidado e apoio ao usuário com úlcera e autocuidado e a rede de atenção no cuidado da úlcera, fundamentadas na Teoria de Enfermagem de Déficit de Autocuidado.

CONCLUSÕES

O autocuidado resulta do diálogo entre usuário/enfermeiro/profissionais da saúde e do vínculo por eles estabelecido para um cuidado compartilhado, sendo o apoio de familiares e da rede de serviços um facilitador ou limitador do cuidado.

Palavras-chave:
Autocuidado; Serviços de saúde; Cuidados de enfermagem; Teoria de enfermagem; Ferimentos e lesões.

Resumen

OBJETIVO

Conocer la percepción del usuario en el autocuidado de úlcera en miembros inferiores.

MÉTODO

Estudio cualitativo, exploratorio y descriptivo con 10 pacientes del Programa de Asistencia Complementaria de un Ambulatorio de Heridas de Canoas (RS). Los datos fueron recolectados entre octubre y noviembre de 2016, en los registros médicos y por medio de entrevistas semiestructuradas.

RESULTADOS

La discusión de los resultados se dio mediante el Análisis Temático de Contenido, constituyendo tres categorías: autocuidado y la convivencia con la úlcera, déficit de autocuidado y apoyo al usuario con úlcera y autocuidado y la red de atención en el cuidado de la úlcera, fundamentadas en la Teoría de Enfermería de Déficit de Autocuidado.

CONCLUSIONES:

El autocuidado resulta del diálogo entre usuario/enfermero/profesionales de la salud y del vínculo por ellos establecido para un cuidado compartido, siendo el apoyo de familiares y de la red de servicios un facilitador o limitador del cuidado.

Palabras clave:
Autocuidado; Servicios de salud; Atención de enfermería; Teoría de enfermería; Heridas y lesiones.

Abstract

OBJECTIVE

To know the perception of users on self-care of ulcers in the lower limbs.

METHOD

This is a qualitative, exploratory, and descriptive study conducted with 10 users registered in the complementary programme of a wound care clinic in Canoas, RS, Brazil. Data were collected using information from the medical records of the users and semi-structured interviews conducted between October and November 2016.

RESULTS

The results were discussed according to thematic content analysis with three thematic categories: self-care and living with the ulcer, self-care deficit and supporting users with ulcer, and self-care and the ulcer care network, based on the Nursing Self-Care Deficit Theory.

CONCLUSIONS

Self-care is the result of dialogue between the user/nurse/health workers and the link they establish when they share care. The support of family members and the service can facilitate or limit care.

Keywords:
Self care; Health services; Nursing care; Nursing theory; Wounds and injuries.

INTRODUÇÃO

As úlceras de membros inferiores constituem um grave problema social e de saúde coletiva de âmbito mundial, acometem o usuário surgindo espontaneamente ou de forma acidental, geralmente evoluindo para uma lesão crônica, sendo acompanhadas por outros agravos passíveis de prevenção. Lesão crônica é aquela que não cicatrizou espontaneamente em três meses e que, na maioria das vezes, apresenta processos infecciosos, caracterizando-se como lesão complexa quando associada com patologias sistêmicas que prejudicam o processo de cicatrização11 Silva JC. Gestión de cuidado de las personas con úlcera venosa: una revisión integrativa. Rev Cult Cuid. 2016 [citado 2017 may 15]; 20(46):157-64. Disponible en: Disponible en: https://rua.ua.es/dspace/bitstream/10045/61781/1/CultCuid_46_15.pdf .
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No Brasil, entre as úlceras de membros inferiores, a úlcera venosa é a mais prevalente, constituindo 70% a 90% das úlceras, seguidas por 10% de úlceras arteriais. As úlceras crônicas são classificadas em venosas, arteriais, mistas e neurotróficas, estando associadas com a insuficiência venosa crônica, a insuficiência arte rial, a neuropatia, o linfedema, a artrite reu matoide, os traumas, a osteomielite crônica, a anemia falciforme, as vasculites e os tumores cutâneos22 Liberato SMD, Souza AJG, Costa IKF, Torres GV, Vitor AF, Lira ALBC. Nursing in the management of pain in people with venous ulcer: integrative review. J Res: Fundam Care. online. 2016 [cited 2016 Dec 15];8(2):4109-20. Available from: Available from: http://www.seer.unirio.br/index.php/cuidadofundamental/article/view/3251/pdf_1843 .
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.

A guisa dessas considerações, o cuidado ao usuário com úlcera em membros inferiores constitui um grande desafio para a Enfermagem33 Oliveira FP, Oliveira BGRB, Santana RF, Silva BP, Candida JSC. Nursing interventions and outcomes classifications in patients with wounds: cross-mapping. Rev Gaúcha Enferm. 2016 [cited 2016 Oct 25]; 37(2):e55033. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/rgenf/v37n2/en_0102-6933-rgenf-1983-144720160255033.pdf .
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Neste estudo44 Garcia AB. Perfil dos usuários com úlceras de membros inferiores atendidos no ambulatório de feridas do município de Canoas, RS, Brasil: subsídios para ações de enfermagem [monografia]. Porto Alegre (RS): Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2016., o corpus empírico fundamenta-se na Teoria de Enfermagem de Déficit de Autocuidado, constituída por três construtos teóricos − autocuidado, déficit de autocuidado e sistema de enfermagem55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985.. Esta Teoria traz subsídios ao cuidado por estar fundamentalmente apoiada na premissa segundo a qual todos possuem potencial, em diferentes graus, para cuidar de si mesmo e dos que estão sob sua responsabilidade. Dessa forma, no estudo contextualiza-se o autocuidado ao descrever e explicar a capacidade do usuário com úlcera em cuidar de si, desempenhando atividades em benefício próprio e conseguir empenhar-se na continuação do cumprimento dessas atividades, a fim de manter a vida, a saúde e o próprio bem-estar. Nessa concepção, o enfermeiro avalia a capacidade de autocuidado e as demandas terapêuticas do usuário. O déficit de autocuidado, que constitui a essência da Teoria, resulta da relação entre a demanda terapêutica de autocuidado e as ações de autocuidado efetivamente desenvolvidas, ou seja, a demanda de autocuidado é superior à capacidade do usuário em se autocuidar, podendo se beneficiar com o cuidado de enfermagem ao apresentar incapacidade para o autocuidado originado pela lesão. Nesse contexto, o enfermeiro identifica o déficit e intervém empregando ações educativas reconhecendo-as em sua essência e valor, visando ao comprometimento do usuário com esforços práticos no atendimento às demandas terapêuticas de sua lesão de modo empático e resolutivo. Já o sistema de enfermagem é delineado pelo enfermeiro e baseia-se nas necessidades de autocuidado do usuário e sua capacidade para desempenhar as atividades do cuidado. Se houver um déficit entre o que o usuário pode fazer e o que precisa ser feito para manter o cuidado da lesão, o enfermeiro será necessário para auxiliar o usuário em suas necessidades de saúde. No caso dos usuários com úlcera em membros inferiores, entende-se que estes conseguem executar ou podem aprender a executar medidas de autocuidado terapêutico, adequando necessidades e atividades de autocuidado.

Na perspectiva do autocuidado, é importante destacar que cada pessoa é única55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985., com características próprias culturais e sociais que refletem a sua singularidade no enfrentamento da lesão66 Chibante CLP, Santo FHE, Santos TD, Porto IS, Daher DV, Brito WAP. Knowledge and practices in care focused on individuals with wounds. Esc Anna Nery. 2017 [cited 2017 Feb 27];21(2):e2017003. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v21n2/en_1414-8145-ean-21-02-e20170036.pdf .
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. Justifica-se a realização deste estudo por contextualizar o autocuidado e a necessidade do usuário em praticá-lo, inter-relacionando os significados autocuidado, déficit de autocuidado e sistema de enfermagem no cuidado da pele. Isto se torna útil para uma compreensão mais acurada pelos profissionais envolvidos com a rede de serviços para o desenvolvimento de estratégias determinantes que possam qualificar o autocuidado do usuário com úlcera, especialmente o enfermeiro, para dessa forma dar conta desse grave problema social e de saúde coletiva que assola populações no âmbito mundial.

Considerando o panorama exposto, foi questão norteadora do estudo: como se dá a prática do autocuidado pelo usuário com úlcera em membros inferiores? Dessa forma, delineou-se a pesquisa, que teve como objetivo conhecer a percepção do usuário no autocuidado de úlcera em membros inferiores.

MÉTODO

Trata-se de um estudo qualitativo, exploratório e descritivo77 Minayo MCS, Deslandes SF, Gomes R, organizadores. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 29. ed. Petrópolis: Vozes; 2010., realizado com usuários do Programa de Assistência Complementar de um Ambulatório de Feridas de Canoas (RS). A escolha dessa instituição deveu-se ao fato de ser um campo de trabalho de uma das pesquisadoras, e também por tratar-se de serviço especializado no atendimento da pele. A capacidade para atendimentos do Ambulatório é de 80 usuários, devendo comparecer ao atendimento semanalmente. O Ambulatório conta com uma equipe multidisciplinar composta por três enfermeiras, três técnicos de enfermagem, dois médicos cirurgiões vasculares, um médico dermatologista, dois psicólogos e uma nutricionista.

Para participar do Programa de Assistência Complementar, o usuário deve ser encaminhado ao Ambulatório de Feridas por um médico especialista, conforme a proposta de territorialização local. No entanto, antes de ser referenciado ao Ambulatório de Feridas, o usuário costuma já ter transitado por diversos pontos de atenção, como a unidade básica de saúde perto do domicílio em que reside ou em serviços de pronto-atendimento. Nesses serviços, o usuário é orientado pela equipe médica e de enfermagem sobre os cuidados que deve ter com a úlcera. Somente depois de identificada a extensão da lesão e caso haja necessidade de um acompanhamento especializado, o usuário será encaminhado para o Ambulatório de Feridas. Outra possibilidade de acesso do usuário ao Ambulatório é a contrarreferência hospitalar em casos de necessidade de realização de curativos complexos, o que, na maioria das vezes, ocorre pós-amputação de membros.

Vale destacar que no Ambulatório há agenda específica para atendimento pelo enfermeiro em consulta de enfermagem. Nesse sentido, as atividades relacionadas ao Processo de Enfermagem88 Soares MI, Resck ZMR, Terra FS, Camelo SHH. Systematization of nursing care: challenges and features to nurses in the care management. Esc Anna Nery. 2015 [cited 2016 Oct 10];19(1):47-53. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v19n1/en_1414-8145-ean-19-01-0047.pdf .
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, no local de pesquisa, direcionam a ação do enfermeiro e lhe permitem determinar o déficit de autocuidado e os papéis do usuário ou do enfermeiro para satisfazer as exigências de autocuidado com a lesão.

A população do estudo constituiu-se de 35 usuários com úlcera em membros inferiores atendidos no serviço. A amostra foi escolhida por conveniência e teve como critérios de inclusão: ser usuário do serviço maior de 18 anos, com úlcera em membros inferiores, de ambos os sexos; estar em acompanhamento de saúde no serviço; pertencer à área adscrita; e, encontrar-se presente no Ambulatório durante o período da coleta de dados. Foi critério de exclusão ser usuário cadastrado no Programa de Atendimento Domiciliar.

Aplicados os critérios de elegibilidade, a amostra resultou em 10 usuários com úlcera crônica em atendimento regular no serviço.

Os dados foram coletados no período de outubro a novembro de 2016, por meio de entrevista semiestruturada e registros de informações contidas em prontuário. Para a coleta dos dados primários, agendou-se entrevista com cada usuário, sendo utilizado um roteiro semiestruturado, previamente elaborado, que solicitava informações sobre os dados sociodemográficos dos usuários e respostas às perguntas: Para você, o que é importante para cuidar de sua úlcera? Com quem você conta, efetivamente, para cuidar de sua lesão? Para você, o que poderia ajudar no cuidado da úlcera? O que melhora a cicatrização da úlcera? E, o que ela piora? Sumarize a sua trajetória de cuidado pelos serviços de saúde.

As entrevistas foram realizadas no próprio Ambulatório, em um lugar reservado de modo a não expor os participantes da pesquisa, com duração de aproximadamente 50 minutos cada, sendo gravadas com a anuência dos usuários e transcritas na íntegra. Todos assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido em duas vias, permanecendo uma via com os pesquisadores e outra com os entrevistados. A coleta de dados findou-se quando se atingiu a exaustão do número de participantes.

A coleta dos dados secundários deu-se por meio de informações contidas nos prontuários, decorrentes de registros realizados pelo enfermeiro nas consultas de enfermagem realizadas, inclusive, com documentação fotográfica da evolução da cicatrização das lesões.

O referencial metodológico adotado para a discussão dos resultados foi a Análise Temática de Conteúdo77 Minayo MCS, Deslandes SF, Gomes R, organizadores. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 29. ed. Petrópolis: Vozes; 2010., conformada pelas etapas pré-análise, exploração do material ou codificação e interpretação dos resultados obtidos. A etapa da pré-análise compreendeu a leitura flutuante das respostas às questões abertas, requerendo o contato direto e intenso com o material coletado, respeitando-se alguns critérios de validade qualitativa, como a exaustividade, com esgotamento da totalidade do texto, a homogeneidade, com clara separação entre os temas a serem trabalhados, a exclusividade, pois um mesmo elemento só poderia estar em apenas uma categoria, a objetividade e a adequação ou pertinência, com adaptação aos objetivos do estudo. A exploração do material versou em um processo de redução do texto às palavras e expressões significativas, realizando-se a classificação e a agregação dos dados, escolhendo as categorias empíricas responsáveis pela especificação do tema. E, por fim, compôs-se o tratamento dos resultados obtidos, propondo inferências e interpretações, inter-relacionando-as com a Teoria de Enfermagem de Déficit de Autocuidado e também com outras pistas em torno de novas dimensões teóricas e interpretativas.

Para preservar o anonimato, a identificação dos participantes foi codificada com a letra E, de entrevistado, seguida da numeração 1 a 10, como segue: E1, E2, E3 [...].

Com relação aos aspectos éticos, seguiram-se as recomendações contidas na Resolução 466/12, do Conselho Nacional de Saúde99 Ministério da Saúde (BR). Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Brasília: 2012 [citado 2016 nov 30]. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/Reso466.pdf.
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, que apresenta as diretrizes e normas regulamentares de pesquisas envolvendo seres humanos. O presente artigo decorre da pesquisa “Organização do trabalho e integralidade nos serviços: novas tecnologias no cuidado ao usuário com lesão de pele na rede de atenção à saúde no estado do Rio Grande do Sul”, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFRGS, sob o número CAAE 56382316.2.0000.5347.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Participaram do estudo 10 usuários com predomínio do sexo masculino, baixa escolaridade, estando um na ativa, três em afastamento temporário do trabalho e seis aposentados. Suas idades variaram entre 32 e 70 anos. Seis eram casados, dois separados, um viúvo e outro solteiro. Foi relatada pelos usuários a ocorrência de dois casos de amputação por Pé Diabético. O tempo de acometimento da úlcera em membros inferiores informado foi de um ano a 13 anos, sendo o tempo de acompanhamento da lesão no Ambulatório de Feridas entre 8 meses a 2 anos.

Quanto ao histórico de acometimento da lesão, três usuários atribuíram a sua lesão à doença de base Diabetes Mellitus, tendo um informado estar acometido da lesão há menos de um ano, outro cerca de um ano e, o terceiro, há aproximadamente 10 anos. Os demais sete usuários apresentavam úlceras venosas, cujo tempo variou entre 1 a 13 anos de lesão.

A amputação de membros, em caso de pessoas com Pé Diabético, ocorre em 0,7% e 2,4% casos1010 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Manual do pé diabético: estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica. Brasília: Ministério da Saúde; 2016., um percentual significativo haja vista ser irreversível e acompanhado de implicações físicas, mentais e sociais extremas.

Quanto à trajetória assistencial dos usuários antes da vinda ao Ambulatório de Feridas, parte deles procurou o serviço já no estágio avançado da lesão, com passagens e trânsito por diferentes pontos da atenção ambulatorial, especializada ou hospitalar. No Ambulatório, a enfermagem passou a ser uma necessidade por os usuários encontrarem-se incapacitados ou limitados para prover o autocuidado55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985..

O corpus empírico resultante das entrevistas e os registros em prontuário levaram a identificar três categorias temáticas, conforme mostra o Quadro 1.

Quadro 1
Categorias e subcategorias temáticas

A seguir detalham-se os resultados apresentados no Quadro 1.

Autocuidado e o convívio com a úlcera

Ao considerar os participantes deste estudo, esses usuários apresentam necessidades específicas quanto ao autocuidado, todos têm úlceras em membros inferiores e alguns já possuem complicações, inclusive dois já foram submetidos à amputação.

Devido ao seu caráter incapacitante, as úlceras podem interferir diretamente na qualidade de vida do usuário11 Silva JC. Gestión de cuidado de las personas con úlcera venosa: una revisión integrativa. Rev Cult Cuid. 2016 [citado 2017 may 15]; 20(46):157-64. Disponible en: Disponible en: https://rua.ua.es/dspace/bitstream/10045/61781/1/CultCuid_46_15.pdf .
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, causando afastamento das atividades rotineiras e alterações no convívio social. Dessa forma, é importante que o usuário procure entender o significado das mudanças para adequar seus hábitos de vida e modos de viver. Essa realidade foi trazida:

Deixei meu serviço, minha casa, as coisas que eu fazia. Deixei tudo, deixei de ir aos aniversários [...]. Não dava vontade de fazer as coisas, nem de sair. A ferida era uma incomodação e eu não conseguia mais cuidar da minha casa. (E2)

A incapacidade que gera o acometimento da lesão é preocupante, uma vez que ela leva a diversas modificações e afeta a qualidade de vida1111 Silva MH, Jesus MCP, Merighi MAB, Oliveira DM. The self-care experience of women living with chronic venous leg ulcer. Rev Estima. 2016 [cited 2017 Apr 18];14(2):61-7. Available from: Available from: https://www.revistaestima.com.br/index.php/estima/article/view/378 .
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. A possibilidade do enfermeiro em aplicar a Teoria de Enfermagem de Déficit de Autocuidado55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985. em situações em que o autocuidado esteja deficiente é primordial para intervenções de enfermagem prioritárias e ajudar seu entendimento, na tentativa de um melhor cuidado se si na nova situação de vida.

Atividades rotineiras como fazer esportes, cuidar de animais de estimação ou mesmo realizar a própria higiene pessoal também foram referidas por estarem prejudicadas:

Deixei de jogar bola e me aposentei por causa da ferida. Não faço mais nada, fico lá deitado, com a perna para cima. Nem cuidar dos cachorros não dá mais, sei que não posso. (E3)

Esses dias eu estava cortando lenha e saltou uma lasca no meu pé, achei que só fosse machucar, [...] mas abriu uma ferida e tive que parar com tudo. (E4)

Os usuários já não realizam mais as mesmas atividades que realizavam há algum tempo, antes do acometimento da úlcera, e também não têm a mesma disposição para saírem de casa, requerendo ajuda para obter ou recuperar a responsabilidade e enfrentar as limitações sofridas em decorrência da úlcera no cotidiano. A orientação do usuário, nessas situações, requer fundamental atenção do enfermeiro ao autocuidado, pois se espera que ele seja responsável por si e pelo seu bem estar ao dar continuidade ao tratamento da lesão no domicílio55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985.. Sempre que um usuário é inábil ou se encontra limitado no suprimento de autocuidado eficaz continuado, a enfermeira poderá ajudá-lo durante a consulta de enfermagem, envolvendo-o no tratamento e promovendo o autocuidado.

Se tivesse vindo antes, já estaria curado... reportou ao déficit de autocuidado77 Minayo MCS, Deslandes SF, Gomes R, organizadores. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 29. ed. Petrópolis: Vozes; 2010.) a que estavam sujeitados os usuários, um alerta para a necessidade de intervenções de enfermagem com estratégias claras visando ao autocuidado. Foram relatos:

Fui botando pomadas e usei de tudo. Eu não entendo porque a minha ferida não fechava. Mas aqui, depois que a enfermeira pôs aquele curativo especial, comecei a melhorar. (E7)

Logo que me aposentei pela ferida, ela botou banha de porco com cinzas. Era ela que fazia o curativo. Ficou doendo uns três dias. Foi aí que abriu um buracão. (E3)

Estes depoimentos mostram o quanto esses usuários necessitavam de cuidados e não possuíam competências para cuidar da lesão. As influências culturais e populares, embora valiosas, podem tornar o usuário vulnerável, levando-o a boicotar o próprio tratamento ao invés de optar por fazer uso das orientações de autocuidado. Isso pode interferir na cicatrização da úlcera pelos inúmeros ativos não associados à terapêutica correta66 Chibante CLP, Santo FHE, Santos TD, Porto IS, Daher DV, Brito WAP. Knowledge and practices in care focused on individuals with wounds. Esc Anna Nery. 2017 [cited 2017 Feb 27];21(2):e2017003. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v21n2/en_1414-8145-ean-21-02-e20170036.pdf .
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, com necessidade de intervenções de enfermagem que promovam o usuário a tornar-se capaz de mudar o déficit de autocuidado55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985., mudando as práticas. Uma cobertura adequada e direcionada à epitelização da lesão age de forma rápida e, além de reduzir o período de epitelização da pele, traz qualidade de vida e segurança terapêutica ao usuário1111 Silva MH, Jesus MCP, Merighi MAB, Oliveira DM. The self-care experience of women living with chronic venous leg ulcer. Rev Estima. 2016 [cited 2017 Apr 18];14(2):61-7. Available from: Available from: https://www.revistaestima.com.br/index.php/estima/article/view/378 .
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Para os usuários, o tratamento que envolve o cuidado da úlcera crônica foi tido como algo complexo e de difícil acesso nos serviços em que procuraram por atendimento. No entanto, também foi referido que:

Quando fui encaminhado para o Ambulatório, o curativo feito pela enfermeira logo deu certo e melhorou a ferida. (E8)

Tomar como ponto de partida a indicação da melhor cobertura para o cuidado da úlcera e o conhecimento pelo enfermeiro das condições de autocuidado do usuário poderão auxiliar no entendimento do coletivo das questões que levaram o usuário a manter-se acometido pela lesão. Ter noção dos problemas sociais que incidem no cuidado da úlcera permitirá ao enfermeiro promover uma orientação direcionada, pactuada com o usuário e trazendo-o para o centro da atenção55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985..

Os usuários referiram, ainda, o impacto que a dor trouxe para suas vidas e como isso incidiu em novos hábitos e rotinas de vida: a dor não me deixou viver mais..., sendo propulsora à procura por ajuda.

A dor não me deixou viver mais. É uma dor horrível, pois qualquer coisa que tu vai fazer, tu sente muita dor. Eu achava que o sofrimento ia ser pra sempre. Aí procurei por ajuda. (E7)

Não quero nunca mais sentir aquela dor, ela não me deixa fazer nada. Por isso venho sempre aqui e nunca falto. (E9)

A dor foi referida pelos usuários como uma sensação desagradável que desencadeia desconforto, passando por várias fases, de leve a muito forte, sendo apontada como um dos motivos mais importantes para não faltarem ao atendimento semanal programado no Ambulatório pela enfermagem, atribuindo-a ao posicionamento desconfortável do membro inferior em virtude da lesão e da presença do curativo. Os usuários destacaram também a irritabilidade e a diminuição da capacidade de concentração que a dor gera, tendo dificuldade em manejar ou tolerar a dor e a continuar com as suas atividades diárias. Diferentemente, os usuários com úlcera decorrente de Pé Diabético informaram não sentir dor. Este tipo de lesão tem origem neuropática1111 Silva MH, Jesus MCP, Merighi MAB, Oliveira DM. The self-care experience of women living with chronic venous leg ulcer. Rev Estima. 2016 [cited 2017 Apr 18];14(2):61-7. Available from: Available from: https://www.revistaestima.com.br/index.php/estima/article/view/378 .
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. Valorizar essas informações do usuário é condição essencial para a sua adesão ao tratamento e às ações de autocuidado. Como a dor gerou sentimentos de ansiedade e sofrimento, de desconforto, desmotivação e falta de apoio, inclusive levando ao isolamento social, isso poderia ter sido mais bem enfrentado pelo usuário se houvessem tido a possibilidade de compartilhar o que estava acontecendo com o enfermeiro55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985.,1111 Silva MH, Jesus MCP, Merighi MAB, Oliveira DM. The self-care experience of women living with chronic venous leg ulcer. Rev Estima. 2016 [cited 2017 Apr 18];14(2):61-7. Available from: Available from: https://www.revistaestima.com.br/index.php/estima/article/view/378 .
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. Juntos poderiam melhor avaliar as situações e encontrar a melhor conduta para o usuário enquanto atuante ativo no seu cuidado e em suas singularidades.

Déficit de autocuidado e o apoio ao usuário com úlcera

A atenção e o apoio ao usuário com úlcera movem uma série de relações que requerem atenção e constituem-se como zelo com a saúde mental e coletiva1212 Piropo TGN, Gomes FV, Azoubel R, Torres GV. Self care of patients with chronic venous ulcers in the home environment. Rev Saúde Com. 2012 [cited 2017 Apr 18];8(2):2-11. Available from: Available from: http://www.uesb.br/revista/rsc/ojs/index.php/rsc/article/view/165/197 .
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. Os resultados da pesquisa apontaram importantes aspectos do nicho interpessoal e o impacto que a úlcera em membros inferiores gera, por exemplo, nas relações familiares, muitas vezes interferindo no processo de reabilitação e cura da lesão e sobrevida. Mediante a existência de vínculo estável, o conviver e o estar próximo... tanto auxiliaram como inibiram o autocuidado.

Segue um relato de usuário sobre o convívio com a esposa:

Ela fica insistindo. Não adianta eu dizer para ela parar, e isso me agonia. Eu me cuido, e quando eu chego em casa, logo fico com a perna pra cima. [...] Mas, escondido, eu continuo fazendo o meu trabalho, não consigo parar, continuo pegando latinhas e já juntei mais de mil. Ela sabe e fica me lembrando de que não posso fazer isto. Ela é um fiscal da úlcera. (E8)

Esses detalhes do cotidiano e da fragilização dos vínculos comunitários e familiares repercutem na vida do usuário, tornando-o ainda mais vulnerável. O conviver ou o estar próximo a alguém com úlcera de membros inferiores faz refletir e pensar que esta condição vem acompanhada de uma série de alterações na vida, não apenas para quem tem a lesão, mas também para o familiar que, muitas vezes, não está preparado para ajudar no autocuidado e dar conta dos aspectos que envolvem situações limitadoras e que ensejam estabelecimento de trocas afetivas e efetivas66 Chibante CLP, Santo FHE, Santos TD, Porto IS, Daher DV, Brito WAP. Knowledge and practices in care focused on individuals with wounds. Esc Anna Nery. 2017 [cited 2017 Feb 27];21(2):e2017003. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v21n2/en_1414-8145-ean-21-02-e20170036.pdf .
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. Outro relato também detalhou a ajuda de um familiar:

No início, ela não me ajudava com o curativo. Mas quando eu piorei ela começou a me ajudar, inclusive lavando as faixas e estendendo elas. Hoje ela faz comida para mim, ela está me cuidando. [...] Ela viu que iria me perder. (E3)

Outro relato de usuário indígena trouxe a indignação por sua companheira não aceitá-lo mais para dormir na mesma cama, rechaçando-o em virtude do tratamento aplicado na úlcera, a Bota de Unna, sendo motivo para inúmeros atritos:

Sabe, a ferida da perna passou sujeira para a cama. Aí a minha companheira sentiu o cheiro e falou: tá ruim, tá ruim. [...]. Disse que deveria ser alguma coisa da bota, algum produto [...] Agora durmo no sofá, que fica na entrada da casa, lá fora, porque na cama, ela não deixa mais eu deitar. E isso acontece todo o dia. (E9)

Este mesmo usuário também revelou que não consegue realizar algumas tarefas, como a limpeza do pátio. E, em detrimento da não adaptação do corpo às mudanças impostas pela lesão, não é aceito na aldeia:

O que eu passo tem a ver com o machucado, elas falam mal de mim, elas não entendem que eu não consigo ajudar. É muito difícil conviver com essa ferida. (E9)

O modo como os indígenas se organizam aldeamente favorece a interação dos indivíduos nesses grupos. Enquanto uns cortam a lenha para fazer o fogo à noite, outros suprem a aldeia de alimentos, sempre conjuntamente. O suporte oferecido pela família, seja emocional ou funcional, tem um papel essencial para manter ou mesmo promover a saúde indígena1313 Borghi AC, Carreira L. Life and health conditions of elderly indigenous Kaingang. Esc Anna Nery . 2015 Sep [cited 2017 May 18];19(3):511-7. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v19n3/en_1414-8145-ean-19-03-0511.pdf .
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. Conhecer o modo como o usuário indígena se organiza na aldeia, como interage com outros índios e em família fornecerá subsídios à prática do enfermeiro, para que ele seja capaz de identificar condições nas quais há déficit na capacidade do usuário para cuidar-se55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985.. Neste exemplo reside uma grande dificuldade no que se refere à mudança de hábitos, pois estes fazem parte de uma construção social e são influenciados pelo meio em que o indígena vive, necessitando, assim, de investimentos incansáveis da enfermagem para a reversão deste quadro. Portanto, corrobora a Teoria de Enfermagem de Déficit de Autocuidado que a adesão ao autocuidado está vinculada ao papel educativo do enfermeiro junto ao usuário55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985.. E, para ajudar nas ações de enfermagem e responder às necessidades de cuidado, o enfermeiro poderia investir em educação aproximando usuário e indígenas do serviço para melhor desenvolver ações prioritárias e fortalecer vínculos como apoio a sua condição clínica e autocuidado.

Outras situações de déficit de autocuidado e apoio ao usuário com úlcera em membros inferiores foram expressas pela subjetividade que cada um trouxe nos depoimentos quanto ao autocuidado da lesão e trajetórias de cuidado, permitindo observar a adequação da relação entre capacidade e demanda de autocuidado desses usuários. Os motivos encontrados reforçam a necessidade de se trabalhar com intervenções de enfermagem que proporcionem condições de abordagem educativa individualizada.

Além disso, os usuários sinalizaram que não aderiam efetivamente ao tratamento da lesão e somente recorriam aos serviços da atenção básica, unidades de pronto atendimento, hospitais ou consultórios particulares quando havia piora da lesão ou para a retirada de materiais para realização de curativo, como ataduras, soro e gazes: eu pegava o material e fazia o curativo em casa... Cabe aqui lembrar que muitas vezes, apesar do conhecimento das informações sobre a lesão, alguns usuários continuaram com estilos de vida que dificultaram a terapêutica, mantendo o déficit de autocuidado55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985..

Eu pegava o material no postinho e fazia o curativo em casa. Não me perguntavam se eu sabia fazer e lá também não faziam ele. Eu ia fazendo de quatro em quatro dias, de três em três dias, colocava babosa, azeite, um pouco de açúcar. Aí, quando ia tirar, já tinha bicho mordendo. Os bichos entravam, eles eram mais fortes do que eu. (E3)

Este depoimento mostra, nas entrelinhas, os fatores que tendem a contribuir para o déficit de autocuidado, não apenas no que se refere ao empoderamento do usuário, mas também à negligência dos profissionais da saúde por não apresentarem competências para o autocuidado e dos serviços por manterem essa realidade. Nesse sentido, a estrutura social e os fatores ambientais têm grande influência no cuidado e na saúde do usuário com úlcera em membros inferiores, podendo determinar sua trajetória assistencial e influenciar seu acesso e utilização da rede de atenção1111 Silva MH, Jesus MCP, Merighi MAB, Oliveira DM. The self-care experience of women living with chronic venous leg ulcer. Rev Estima. 2016 [cited 2017 Apr 18];14(2):61-7. Available from: Available from: https://www.revistaestima.com.br/index.php/estima/article/view/378 .
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Autocuidado e a rede de atenção no cuidado da úlcera

A Teoria de Enfermagem de Déficit de Autocuidado55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985. focaliza no usuário a capacidade em tornar-se completamente ou parcialmente responsável pelo seu autocuidado. Para tal, é necessário o envolvimento de enfermeiros/profissionais da saúde no oferecimento de atividades promotoras do autocuidado para transformações sociais, as quais acontecem nos serviços na medida em que o diálogo com o usuário sucede de relações interpessoais e da ação comunicativa por meio de ajuda, acolhimento, respeito, confiança, cordialidade, interesse e sensibilidade com o outro55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985.-66 Chibante CLP, Santo FHE, Santos TD, Porto IS, Daher DV, Brito WAP. Knowledge and practices in care focused on individuals with wounds. Esc Anna Nery. 2017 [cited 2017 Feb 27];21(2):e2017003. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v21n2/en_1414-8145-ean-21-02-e20170036.pdf .
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Aqui me sinto acolhido... revelou aspectos importantes da Teoria quanto a qualificação dos serviços para a atenção em saúde e ao empoderamento do usuário naquelas questões em que o autocuidado esteve deficitário, dando destaque ao papel relevante dos profissionais de enfermagem na consolidação dos serviços de saúde e o reconhecimento da profissão quanto à importância das práticas educativas para uma atuação de forma cons ciente, responsável e com qualidade1414 Sena RR, Grillo MJC, Pereira LA, Belga SMMF, França BD, Freitas CP. Permanent education in healthcare services: educational activities developed in the state of Minas Gerais, Brazil. Rev Gaúcha Enferm . 2017;38(2):e64031. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2017.02.64031.
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Antes de chegarem ao Ambulatório de Feridas, parte dos usuários já havia transitado por diferentes pontos de atenção ou cuidavam de sua lesão em casa. O estabelecimento do vínculo com o enfermeiro/profissionais de saúde, até então desconhecidos para o usuário, foi primordial, exigindo uma relação de confiança inicial para um cuidado efetivo55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985.. Eis alguns depoimentos sobre a primeira consulta no Ambulatório de Feridas:

Quando cheguei, me deu esperança de sarar, eu me sinto bem aqui. (E2)

Quando eu entrei aqui e conversei com os profissionais, eu tive esperança. Uma luz clareou, uma porta se abriu. Eu vi que tinha uma solução. (E7)

Nunca tinham olhado a minha perna, nem na consulta particular. O médico não era ruim, só não resolvia [...] aqui é diferente, olham de perto, conversam comigo e me esclarecem. (E10)

Esses usuários trouxeram diferentes experiências que revelam o quanto encontravam-se despreparados para desenvolver o autocuidado.

Agora estou esperto. Aqui eu aprendi bastante. [...] Se alguém lá da vila se machuca, já falo para vir ao Ambulatório, pois os profissionais são muito bons. (E4)

A estreita relação que se estabeleceu a partir do momento em que o usuário percebeu que o profissional se interessou por ele, reconhecendo sua lesão em sua singularidade com conversas com conteúdo66 Chibante CLP, Santo FHE, Santos TD, Porto IS, Daher DV, Brito WAP. Knowledge and practices in care focused on individuals with wounds. Esc Anna Nery. 2017 [cited 2017 Feb 27];21(2):e2017003. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v21n2/en_1414-8145-ean-21-02-e20170036.pdf .
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, aponta a razão para receber informações, ter insights e aplicá-los em situações concretas de cuidado da sua lesão, com mudanças necessárias em relação aos hábitos e estilos de vidas que podiam auxiliar no cuidado da úlcera e no bem-estar. Assim sendo, os resultados confirmam que usuários satisfeitos tendem a aderir melhor à terapêutica prescrita e a fornecer informações importantes para quem cuida a partir da comunicação efe tiva e escuta qualificada1515 Santos MA, Sardinha AHL, Santos LN. User satisfaction with the care of nurses. Rev Gaúcha Enferm . 2017 Mar;38(1):e57506. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2017.01.57506.
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.

Agora eu cuido, pois no Ambulatório a enfermeira me falou... contribuiu para dar destaque à atuação enfermagem no autocuidado do usuário ao aproximar práticas, cultura e conhecimento às reais necessidades do usuário com lesão, o que foi estabelecido conjuntamente pelo enfermeiro e o usuário, pactuando prioridades de enfermagem para o cuidado. Isso fez do usuário um participante ativo no cuidado de sua lesão e mostrou que a escolha necessitava ser dele, de modo que o seu modo de vida, sua organização familiar, o que sabia sobre sua lesão e os saberes e práticas populares fossem consideradas com parcimônia para que não interferissem negativamente na cicatrização da úlcera66 Chibante CLP, Santo FHE, Santos TD, Porto IS, Daher DV, Brito WAP. Knowledge and practices in care focused on individuals with wounds. Esc Anna Nery. 2017 [cited 2017 Feb 27];21(2):e2017003. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v21n2/en_1414-8145-ean-21-02-e20170036.pdf .
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. O autocuidado é uma necessidade de todo o usuário. Quando o autocuidado não se mantém ocorre déficit de autocuidado55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985., ocasionando a piora da lesão. A repadronização de tais ações com conhecimento é fundamental para o bem-estar da pessoa com lesão e para o desenvolvimento de estratégias determinantes que possam qualificar o autocuidado do usuário do sistema de enfermagem na rede de serviços.

Nesse momento, o enfermeiro pode auxiliar o usuário com dificuldade de obter ou recuperar suas responsabilidades no cuidado da lesão, sendo importante a compreensão da realidade e a combinação de ações que considerem a cultura e as crenças locais com propriedade66 Chibante CLP, Santo FHE, Santos TD, Porto IS, Daher DV, Brito WAP. Knowledge and practices in care focused on individuals with wounds. Esc Anna Nery. 2017 [cited 2017 Feb 27];21(2):e2017003. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v21n2/en_1414-8145-ean-21-02-e20170036.pdf .
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. Para tanto, dialogar com o usuário sobre sua lesão, sobre o seu curativo e sobre as suas expectativas perante a terapêutica é importante para um estabelecimento de vínculo não fragilizado e fortalecer o autocuidado, discutindo com ele estratégias para o enfrentamento dos problemas vivenciados, de modo a se manter aderente ao cuidado1616 Silva MH, Jesus MCP, Oliveira DM, Merighi MAB. Unna’s boot: experience of care of people with venous ulcers. Rev Bras Enferm. 2017;70(2):349-56. doi: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0219.
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.

Um usuário com Pé Diabético há cerca de 10 anos e com inúmeras recidivas trouxe a informação de que na atenção básica tinha acesso a consultas médicas e aos curativos. No entanto, como fazia uso de bebidas alcoólicas, não associava tal hábito à estagnação de sua lesão. No entanto, a concretização das ações de referenciamento entre os diferentes pontos de atenção em saúde também se mostrou fragilizada, pois nesse trânsito entre os serviços da atenção básica, de pronto atendimento e hospitalar criaram-se lacunas no autocuidado, sendo que a descontinuidade estabelecida forçou o usuário a percorrer diferentes serviços da rede de atenção, talvez em virtude da não vinculação a um sistema de enfermagem77 Minayo MCS, Deslandes SF, Gomes R, organizadores. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 29. ed. Petrópolis: Vozes; 2010., gerando déficit no autocuidado pelo não atendimento às suas reais necessidades77 Minayo MCS, Deslandes SF, Gomes R, organizadores. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 29. ed. Petrópolis: Vozes; 2010.. Nesse entendimento de aproximação entre os pontos da rede, a Enfermagem tem um papel importante como interlocutora devido às dificuldades que os usuários têm em assumir o autocuidado para facilitar e qualificar o acesso aos pontos de atenção, independente do nível de complexidade da lesão ou da doença que acomete o usuário que procura o cuidado1010 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Manual do pé diabético: estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica. Brasília: Ministério da Saúde; 2016.. E mais, para potencializar a resolutividade no cuidado do usuário com úlcera de forma holística, a enfermeira poderia buscar apoio para promover o autocuidado com os gestores do município, visando à unicidade entre os pontos de atenção no atendimento dessa população.

Corrobora-se que, para um autocuidado efetivo, o saber científico precisa dialogar com o saber popular para que se possa compreender a origem dos significados com os quais o usuário dá sentido ao modo de se cuidar66 Chibante CLP, Santo FHE, Santos TD, Porto IS, Daher DV, Brito WAP. Knowledge and practices in care focused on individuals with wounds. Esc Anna Nery. 2017 [cited 2017 Feb 27];21(2):e2017003. Available from: Available from: http://www.scielo.br/pdf/ean/v21n2/en_1414-8145-ean-21-02-e20170036.pdf .
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. É importante que ele assuma o autocuidado a partir da orientação para poder escolher sobre o melhor para si, sendo determinante à corresponsabilidade na implementação do cuidado.

Agora eu cuido, pois a enfermeira me falou... contribuiu para o entendimento de que condições são necessárias para que mudanças ocorram. Observa-se que o apoio e a educação do enfermeiro foram fundamentais para suprir as demandas do autocuidado terapêutico, sendo importante saber quais orientações o usuário já recebeu e como se comporta em relação a elas, não para expor se estão certas ou erradas, mas para promover um processo educativo no qual o usuário torne-se sujeito ativo em seu tratamento, sendo capaz de reconhecer as ações que poderão auxiliar ou prejudicar o cuidado da lesão55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985.. Houveram importantes menções a respeito:

Isso é para a vida toda. (E4)

Ah, agora eu me cuido mais. Faço mais repouso, se eu não me cuidar, não vai adiantar. (E7)

O enfermeiro, tendo o seu trabalho visto sob a ótica do autocuidado55 Orem DE. Nursing: concepts of practice. St Louis: Mosby Year Book Inc.; 1985., adéqua as necessidades do usuário com lesão à sua realidade e incentiva-o a falar de suas dificuldades, levando-o a participar do cuidado na medida em que melhora a cicatrização e o estado da lesão, tornando-o copartícipe do cuidado, ou seja, o leva a satisfazer suas próprias exigências de autocuidado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Usuários com úlcera de membros inferiores reconheceram que a sua prática de autocuidado resultou do diálogo que mantiveram com o enfermeiro/profissionais da saúde e o vínculo com eles estabelecido para um cuidado compartilhado. Destacaram, igualmente, a importância que assumiu o seu comprometimento pessoal e a corresponsabilidade no cuidado da úlcera, sendo o apoio de familiares e a rede de serviços tida como facilitadores ou limitadores do autocuidado.

Chamou atenção, neste estudo, o déficit de autocuidado atribuído pelos usuários a distintas terapêuticas e atendimentos recebidos. Esses resultados representam um passo para avançar no atendimento dessa população, sinalizando para a necessidade de busca por intervenções educativas mais efetivas no que tange ao autocuidado e que colaborem para a autonomia do usuário, com implantação de práticas que valorizem o ato de cuidar mediante contribuições do enfermeiro/profissionais de saúde e sua relação com o cuidado, a fim de alcançar uma atenção em saúde compatível às suas necessidades.

Quanto ao espectro das limitações, uma diz respeito ao cenário da pesquisa que, sendo um Ambulatório de Feridas, caracterizou-se por um aporte técnico e organizacional peculiar e por contingentes de profissionais que favoreciam o cuidado da pele. Possivelmente, outros cenários da atenção básica ou hospitalar mereceriam uma análise específica, também em razão de suas peculiaridades quanto ao cuidado da lesão em sua singularidade.

Ressalta-se que os resultados do estudo contribuíram com conhecimento para o ensino, pesquisa, assistência e gestão e trouxeram visibilidade acadêmica ao autocuidado por descreverem e explicarem a prática do autocuidado do usuário em manter sua lesão e o seu bem-estar, auxiliando para que enfermeiros/profissionais da saúde possam melhor avaliar o contexto do cuidado ao usuário com úlcera. O estudo ainda destacou a possibilidade do enfermeiro em aplicar a Teoria de Enfermagem de Déficit de Autocuidado em situações em que o autocuidado esteja deficiente e, portanto, demande atenção em saúde no sentido de ampliar o arsenal de cuidados, vislumbrando maior autonomia ao usuário e uma inserção contextualizada de enfermeiros/profissionais da saúde, gestores e serviços no cuidado ao usuário com lesão. Inclusive, alertou que em alguns cenários da saúde as práticas visando ao autocuidado destoavam à capacidade de escolha do indivíduo, atrapalhando sua autonomia para o autocuidado e a cura da lesão.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Jul 2018
  • Data do Fascículo
    2018

Histórico

  • Recebido
    19 Maio 2017
  • Aceito
    19 Set 2017
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