Prática profissional do enfermeiro e influências sobre a sensibilidade moral

RESUMO

Objetivo:

Compreender a prática profissional do enfermeiro e suas influências para o desenvolvimento da sensibilidade moral.

Métodos:

Estudo qualitativo, descritivo, realizado entre novembro de 2015 e fevereiro de 2016, em unidades de internação da clínica médica, de dois hospitais de grande porte, localizados em Belo Horizonte, Minas Gerais. Participaram 14 enfermeiros. A coleta de dados ocorreu por meio de entrevistas, guiadas por roteiros semiestruturados. Os dados foram submetidos à análise de conteúdo.

Resultados:

Emergiram duas categorias: Prática profissional do enfermeiro: bens internos e externos e; Sensibilidade moral e a interface com a prática profissional de enfermeiros. O desenvolvimento da Sensibilidade moral dos enfermeiros, sofre influência de fatores relacionados à prática profissional, como as relações interpessoais, a educação ética e as atividades de gestão.

Considerações finais:

Na prática profissional, a Sensibilidade moral é parte integrante do processo de tomada de decisão ética nos serviços, sendo essencial para o cuidado de qualidade.

Palavras-chave:
Ética em enfermagem; Moral; Prática profissional

ABSTRACT

Objective:

To understand the professional practice of nurses and their influence on the development of moral sensibility.

Methods:

A qualitative and descriptive study, conducted between November 2015 and February 2016 in the hospitalization units of the medical clinic of two large hospitals located in Belo Horizonte, Minas Gerais. 14 nurses participated. Data collection was done through interviews, guided by semi-structured scripts. The data were submitted to content analysis.

Results:

Two categories emerged: Professional practice of the nurse: internal and external goods and Moral sensitivity and the interface with the professional practice of nurses. The development of the moral sensitivity of nurses is influenced by factors related to professional practice, such as interpersonal relations, ethical education and management activities.

Final considerations:

In the professional practice, moral sensibility is an integral part of the ethical decision-making process in services, being essential for quality care.

Keywords:
Ethics; nursing; Morale; Professional practice

RESUMEN

Objetivo:

Comprender la práctica profesional de la enfermera y su influencia en el desarrollo de la Sensibilidad moral.

Métodos:

Estudio cualitativo y descriptivo realizado entre noviembre de 2015 y febrero de 2016 en unidades de internación de la clínica médica de dos hospitales de gran porte, ubicados en Belo Horizonte, Minas Gerais. Participaron 14 enfermeras. La recolección de datos se efectuó por medio de entrevistas, guiadas por guiones semiestructurados. Los datos se sometieron a análisis de contenido.

Resultados:

Surgieron dos categorías: Práctica profesional de la enfermera: bienes internos y externos y Sensibilidad moral y la interfaz con la práctica profesional de las enfermeras. El desarrollo de la sensibilidad moral de las enfermeras sufre la influencia de factores relacionados con la práctica profesional, como las relaciones interpersonales, la educación ética y las actividades de gestión.

Consideraciones finales:

En la práctica profesional, la Sensibilidad moral es parte integrante del proceso de toma de decisiones éticas en los servicios, siendo esencial para un cuidado de calidad.

Palabras clave:
Ética en enfermería; Moral; Práctica profesional

INTRODUÇÃO

A prática profissional é uma atividade social, baseada em princípios de cooperação entre sujeitos que assumem papéis diferenciados. A essa prática são incorporados os saberes éticos, entendidos como orientadores para uma vida justa, os quais se alicerçam na moral, por meio de reflexões de atividades sociais que adquirem sentidos no âmbito individual e coletivo1. Em relação à enfermagem, compreender a sua prática significa ultrapassar as dimensões técnico-operativas, decorrentes da aplicação direta do saber biotecnológico.

Nesta perspectiva, lançou-se o olhar sobre as singularidades da prática de enfermeiros que atuam em unidades de internação da clínica médica. As unidades de internação se caracterizam como setores dinâmicos, multiprofissionais, com diversidade de casos e destinados a múltiplos atendimentos. Tais fatores, contribuem para o desencadeamento de problemas éticos no trabalho, com consequências para a equipe e para os usuários.

Os problemas éticos estão relacionados a aspectos ou implicações éticas, presentes na prática de profissionais da saúde e mobilizam a reflexão moral, fazendo com que o indivíduo questione a si mesmo e à situação vivenciada2. Tais problemas surgem nos momentos em que as regras instituídas e as ações rotinizadas tecnicamente, não correspondem aos ideais dos trabalhadores e quando ocorrem conflitos de valores pessoais e profissionais, entre os atores envolvidos3. A vivência de problemas éticos constitui um desafio para a atuação do enfermeiro, por demandar pensamento crítico, confiança e coragem, características essenciais para a tomada de decisão e para a sensibilidade moral4^-5.

Com vistas a alcançar o objetivo desta pesquisa, deu-se ênfase a sensibilidade moral, a qual se destaca por sua dinamicidade e pela dependência da experiência moral, vivenciada na prática profissional, por meio da relação com o outro e do reconhecimento de si6.

Para fins do presente estudo, a sensibilidade moral é entendida como o conjunto de atributos que possibilitam ao profissional tomar decisões éticas com inteligência e compaixão, face às necessidades físicas, emocionais e espirituais do paciente e as incertezas que envolvem o cuidado. Tais atributos contemplam habilidades, sensações, sentimentos e conhecimento moral, que permitem aos profissionais melhor atuação sobre os problemas éticos presentes em seu ambiente laboral7^-8.

Face ao exposto indaga-se: Como se dá a prática profissional do enfermeiro e como a referida prática influencia o desenvolvimento da sensibilidade moral?

A despeito da relevância da temática em foco, ainda são insipientes os estudos que se dediquem à sua abordagem junto a enfermeiros. Tornam-se, pois, relevantes, investigações que aprofundem o assunto favorecendo a prática ética e como estímulo ao desenvolvimento da sensibilidade moral dos enfermeiros.

Espera-se que os resultados do presente estudo possam instigar a busca pela construção de ambientes de trabalho que valorizem a prática profissional do enfermeiro, contribuindo para o desenvolvimento de sua sensibilidade moral. Considerando o exposto, objetivou-se: compreender a prática profissional do enfermeiro e suas influências para o desenvolvimento da sensibilidade moral.

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo descritivo de abordagem qualitativa, realizado em unidades de internação hospitalar de clínica médica, de dois hospitais públicos de grande porte e porte especial, que prestam atendimento exclusivo a pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), localizados em Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Os hospitais possuem papel relevante na assistência às urgências clínicas e cirúrgicas, prestando atendimento a paciente oriundos de diversos municípios da região metropolitana de Belo Horizonte. Quanto ao número e destinação dos leitos, um dos hospitais, no período da investigação, possuía 323 leitos gerais, dentre os quais 150 eram destinados às unidades de internação de clínica médica; o outro hospital dispunha de 901 leitos gerais, sendo 479 leitos de unidades de internação de clínica médica.

A amostragem foi não probabilística por conveniência. Todos os enfermeiros que atuavam nas unidades de internação da clínica médica no turno diurno foram convidados e aceitaram participar do estudo, perfazendo 14 enfermeiros. Como critério de inclusão, foi considerado o fato de o profissional atuar nas unidades de clínica médica, selecionadas para o estudo e ter disponibilidade para participar da entrevista. Como critérios de exclusão foram definidos estar em período de férias, afastado ou em licença.

A coleta de dados ocorreu entre os meses de novembro de 2015 e fevereiro de 2016, por meio de entrevistas gravadas, guiadas por roteiro semiestruturado, realizadas individualmente, no local de trabalho e em ambiente reservado. O tempo médio de duração das entrevistas foi de 17 minutos. As questões norteadoras foram: o que significa ser enfermeiro para você? Fale sobre a sua prática profissional no hospital. Fale sobre os problemas éticos que você vivencia no seu cotidiano de trabalho. Narre uma situação que envolva questões éticas no seu trabalho. Relate uma situação de trabalho na qual você optou por uma decisão contrária ao seu desejo/julgamento ético.

Os dados foram transcritos na íntegra e, posteriormente, submetidos à análise de conteúdo, a qual consiste em um conjunto de técnicas que permitem ao pesquisador relacionar e conferir significados entre as estruturas linguísticas e psicológicas ou sociológicas. A referida análise incluiu as etapas de pré-análise, na qual ocorre a organização e leitura flutuante e exaustiva do material; exploração, fase em que se dá codificação e categorização dos dados; e tratamento dos resultados, a qual consiste na realização de inferências e interpretações dos dados pelo pesquisador9_.

A pesquisa foi aprovada pelo comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais, conforme o parecer n° 1.237.831 em 21 de setembro de 2015. Os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, de acordo com a resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde. Para garantir o anonimato, optou-se por identificar os depoimentos com a inicial da categoria (E), seguida do número estabelecido para cada entrevista.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os participantes do estudo eram do sexo feminino, com média de idade de 33,5 anos. Com relação à situação conjugal, 50% estavam solteiras, 35,8% casadas e 14,2% divorciadas. O tempo de formação variou entre 1 e 23 anos, sendo que 57,1% possuíam título de especialização. Quanto a carga horária 71,4 % trabalhavam de 8 a 10 horas por dia e 21,4% possuíam mais de um emprego.

Da análise dos dados emergiram as seguintes categorias analíticas: Prática profissional do enfermeiro: bens internos e externos e; Prática profissional do enfermeiro e a interface com a sensibilidade moral.

Prática profissional do enfermeiro: bens internos e externos.

A prática é a ação do homem sobre as coisas e consiste na aplicação do conhecimento em situações concretas, orientada para um fim determinado. No contexto das práticas profissionais buscam-se alcançar os bens internos e externos. Os bens internos propiciam sentido e legitimidade social às profissões, conferindo-lhes racionalidade. Já os bens externos são comuns à maior parte das atividades e não se prestam a especificá-las ou distingui-las10 .

Ao transpor o sentido da prática para o campo da enfermagem, assume-se que seu bem interno se traduza como o cuidado, com vistas a proporcionar melhorias para a saúde dos indivíduos11_.

Ser um profissional de enfermagem é saber cuidar, ser responsável por cuidar, e como a gente trabalha com equipe, você tem que ser uma pessoa responsável pelo ser humano em geral. (E1)

A prática, na enfermagem tem como objeto a saúde humana, buscando transformá-la, intencional e planejadamente, por intermédio de meios e instrumentos10. O alcance do bem interno demanda do enfermeiro a adoção de princípios, valores, competências técnicas e ética, de forma a criar um ambiente de trabalho permeado pela corresponsabilização e pelo acolhimento. Para isto, os profissionais precisam ter sensibilidade pelos pacientes assistidos, além de engajamento político na transformação de desigualdades12.

A preocupação em proporcionar um cuidado de qualidade foi expressa pelos participantes. Entretanto, foram destacados entraves que interferem na qualidade da assistência.

A carga de trabalho de qualquer instituição para o enfermeiro ela é grande, então às vezes a gente tenta fazer um trabalho de mais qualidade, mas em função de outras atribuições, por outros processos de enfermagem, acaba comprometendo a melhor assistência ao paciente. (E2)

Às vezes a gente não tem muito tempo para avaliar bem o paciente, para ouvir, para poder fazer uma anamnese, um exame físico, porque a gente fica muito na questão burocrática, na correria do dia a dia e acaba que fica um pouco de lado o outro lado da enfermagem. A rotina é cansativa, é corrida, muita coisa para poder fazer em pouco tempo. (E3)

Os desafios enfrentados pelos enfermeiros interferem na execução da atividade profissional e na qualidade de vida. Ademais, a sobrecarga laboral potencializa problemas de saúde e sentimentos de frustração13.

Pesquisa que buscou avaliar o ambiente da prática profissional e os níveis de burnout entre os profissionais de enfermagem, de um hospital escola de São Paulo, evidenciou que a subescala, a autonomia e o controle são preditoras da exaustão emocional, da despersonalização e da diminuição da realização pessoal14. Outro estudo, identificou os valores que estruturam e orientam a enfermagem como prática social, revelando que falhas na organização dos serviços e no processo de produção de saúde, representavam obstáculos para a efetivação de referenciais éticos importantes para os cuidados de enfermagem12.

O presente estudo revelou que as condições inadequadas ao desenvolvimento do trabalho, subvertem a enfermagem como prática profissional, fazendo com que o propósito de atender às necessidades dos pacientes não seja alcançado. Nesta perspectiva, quando o bem interno não é alcançado, tem-se um ofício com ausência de sentido. No que tange o bem externo de uma profissão, este é obtido quando a prática profissional legitimada é levada a termo. Como bens externos, cita-se o dinheiro, o prestígio e o poder1.

Os depoimentos permitiram identificar que os bens externos possuem menor relevância para os enfermeiros, sendo menos valorizados do que os bens internos.

Quando você opta por ser enfermeiro você não pode pensar em dinheiro, em nada disso, status social está fazendo porque você gosta de ter um contato com o paciente [...] é você fazer por amor mesmo, porque você não é bem reconhecido, você depara diante de várias adversidades, obstáculos [...] quando não houver mais amor, não houver mais paixão, então larga, porque senão você começa a fazer as coisas de forma errada e o paciente não merece isso, porque o primeiro contato que o paciente tem [...] diário e é 24 horas é com o enfermeiro, o médico passa avalia, se precisar você chama, mas é o enfermeiro que tá ali do lado. (E4)

Pesquisa desenvolvida com profissionais de unidades de internação de um hospital geral, apresentou em posição de destaque, o alcance dos bens internos da enfermagem. As atividades assistenciais foram associadas ao sentimento de orgulho e de realização pessoal e consideradas importantes na promoção de reconhecimento e satisfação no trabalho13.

É importante destacar que os profissionais precisam almejar o alcance do bem interno e dos bens externos. Porém, nos momentos em que o trabalhador se dedica, unicamente, à conquista de bens externos, a profissão se desvirtua1.

Considera-se primordial que as instituições proporcionem aos enfermeiros condições de trabalho que cooperem para o alcance de uma prática profissional que integre bem interno e bem externo. Esta integração é considerada fundamental, por contribuir para o alcance da realização profissional e de uma atenção qualificada e resolutiva.

Prática profissional do enfermeiro e a interface com a sensibilidade moral

Como prática, a enfermagem está sujeita a transformações e à incorporação de reflexões e ações sobre novos temas e problemas, sendo orientada por princípios éticos ligados à manutenção ou restauração da dignidade nos diferentes âmbitos da vida. Desta forma, a prática do enfermeiro pode culminar em situações de tensão e de conflitos de valores éticos, tendo em vista as relações interpessoais8.

Neste estudo, os enfermeiros relataram a dificuldade em lidar com comentários inadequados de outros colegas e/ou profissionais na presença dos pacientes.

Alguns comentários errados talvez na frente de algum paciente, eu acho que isso é uma dificuldade que a gente tem que trabalhar junto à equipe. É um posicionamento diante desse paciente, é de como você aborda, de como você apresenta. (E2)

O ético, infelizmente na área da saúde, não digo que é nem nesse hospital, mas na área da saúde em geral, as pessoas falam do erro do outro, ninguém fala do seu erro. (E1)

Os obstáculos enfrentados pelos enfermeiros no relacionamento interpessoal, requerem o desenvolvimento da capacidade pessoal para lidar com dilemas éticos inerentes às relações. Para isto, torna-se indispensável o desenvolvimento da sensibilidade moral8.

A sensibilidade moral é premissa para a compreensão de problemas éticos que ocorrem nos serviços de saúde e para conduzir, de maneira apropriada, a resolução desses problemas8. Quanto maior a sensibilidade moral dos enfermeiros, mais ética é a sua prática profissional10.

Neste sentido, estudos apontam que a sensibilidade moral do indivíduo, desenvolve-se de forma contínua, conforme a formação e as vivências da prática profissional15. Para tanto, faz-se necessária a percepção compreensiva e interativa sobre as questões sociais e da saúde, em consonância com a complexidade dessas áreas e as pluralidades da sociedade⁽¹²⁾. Nessa mesma ótica, pesquisa, ampliou o conceito de sensibilidade moral e compreendeu outras dimensões além da capacidade cognitiva, incluindo também sensações, sentimentos, conhecimento moral e habilidades1.

A sensibilidade moral pode ser desenvolvida quando o profissional se depara com um caso delicado que gera incertezas na prestação do cuidado. Abarca, pois, a capacidade de tomar decisões éticas com inteligência e compaixão face às necessidades físicas, emocionais e espirituais do paciente8.

Teve uma vez que a gente teve um detento e não sei como as meninas ficaram sabendo que esse paciente tinha matado a mulher, abusado da filha e eu tinha uma funcionária que já foi abusada uma vez. Então eu acho que ela enxergou naquele paciente a pessoa que fez isso com ela [...] ela não queria administrar medicação, não queria dar os cuidados. Eu entendi um pouco a situação dela, aí mudei a escala. Mas eu vi que toda a equipe modificou a forma de tratamento e por mais que eu conversei, eu vi que teve uma mudança independente do que aquele paciente fez, a gente tem que encará-lo como um ser que a gente tem que cuidar dele e eu tive que mudar toda a minha escala. Isso foi uma forma diferente de conduta. (E5)

A gente tem muito que respeitar a crença do paciente. Esses dias a gente teve uma paciente que era testemunha de Jeová, com uma anemia grave, mas lúcida, orientada. O médico a trouxe até o posto, explicou a situação, ela precisava passar por uma cirurgia e ela não queria. Chamou familiar. Foi assim, o comentário de um técnico: “É só dar a ela um remedinho para ela dormir e ela vai sair dessa”. Tipo assim, vai melhorar essa anemia. Ai, eu chamei esses funcionários e falei: “Olha, a gente jamais pode fazer isso”. A gente entra com o pessoal do jurídico que é quem orienta muito a gente sobre questão de religião. A gente jamais pode dar um remédio para dormir e administrar. Nada disso a gente pode fazer, porque é falta de ética e é a religião que ela segue. (E6)

Os depoimentos revelaram vivências de conflitos éticos, devido à tomada de decisões que permeiam a subjetividade dos profissionais e o respeito aos direitos e à autonomia dos pacientes em relação ao cuidado prestado. Destaca-se a importância da formação profissional voltada para o desenvolvimento de competências que permitam aos enfermeiros mobilizar e articular saberes e valores em seu cotidiano de trabalho. A relação entre a ética, sensibilidade moral e competências são pouco discutidas nos diversos cenários de atuação do enfermeiro, não sendo exploradas as estratégias para ampliar ou desenvolver suas dimensões8^,16.

Vale ressaltar que em unidades de internação, as reflexões, possibilitadas pelas experiências, permitem aos enfermeiros o aprimoramento de habilidades que auxiliam no desenvolvimento da sensibilidade moral. Tal processo, ocorre de forma contínua e contempla a relação com outros profissionais, possibilitando a articulação entre aprendizado, conhecimento e consciência8^,17.

Isso eu acho muito importante, saber chamar atenção. Você não tem que diminuir ninguém, você tem que ser educado, chamar a atenção de um técnico de enfermagem, você chama numa sala e chama atenção dele separado, do meu coordenador comigo, eu acho que tem que ser da mesma forma. (E1)

Eu acho que cada um no ambiente de trabalho tem que ter um posicionamento profissional. Quem sabe enfrentar isso com tranquilidade e quando precisar abordar com quem seja, deve ser preservado, com privacidade, sabendo entender o outro e manter mesmo o clima de harmonia. (E2)

Além das influências das relações interpessoais e da educação ética, os enfermeiros consideraram as atividades de gestão como entraves para o desenvolvimento da sensibilidade moral, por distanciar o profissional do paciente.

Eu acho que o enfermeiro ele tinha que focar mais na parte da assistência do paciente, você acaba ficando mais com a parte burocrática do que com o próprio paciente, você não tem muito tempo entendeu? De prestar aquela assistência qualificada, porque aqui é um enfermeiro para 49, então eu acho que no caso deveria ter um enfermeiro para a parte assistencial e outro para a parte burocrática, porque o enfermeiro que fica aqui ele fica mais voltado para a parte burocrática do que para a assistência. (E7)

Por eu ter muita coisa burocrática para cumprir, eu queria ter mais tempo, por exemplo, paciente meu que evolui com lesão eu queria ter um tempo para poder acompanhar melhor, mais de perto essa lesão. (E5)

Em consonância com os discursos dos participantes deste estudo, pesquisa realizada com enfermeiros de um pronto-socorro adulto de um hospital universitário, revelou o descontentamento dos profissionais sobre as suas condições de trabalho, com jornadas exaustivas de plantões. Além disso, foi destacada a sobrecarga de tarefas, levando-os a realizar o trabalho mecanicamente, por falta de tempo para avaliar as atividades desenvolvidas, comprometendo a assistência ao paciente18.

Pesquisa identificou, também, a discrepância entre os valores relevantes para o enfermeiro no âmbito da sua prática profissional e os valores que orientam o trabalho na instituição. Nesse âmbito, os enfermeiros se defrontam com problemas de ordem moral, por ter que realizar trabalhos burocráticos em detrimento do cuidado com o paciente19.

O desenvolvimento da sensibilidade moral demanda a relação com, pelo menos, uma outra pessoa, sendo que uma relação ética resulta da compreensão recíproca entre as partes20. Nesse sentido, percebe-se pelos relatos, que a sobrecarga de atividades, em destaque as demandas burocráticas, apresentam-se como fatores que interferem na sensibilidade moral dos profissionais, por dificultarem o contato enfermeiro-paciente.

Tendo em vista os resultados e a análise apresentada, destaca-se que a sensibilidade moral compreende a percepção das vulnerabilidades do paciente e, a consequente tomada de decisões éticas pelo enfermeiro em seu favor8. Quando a sensibilidade moral dos enfermeiros é reprimida, ocorre a descaracterização da prática, repercutindo negativamente no alcance do bem interno da profissão.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na prática profissional de enfermeiros, a sensibilidade moral é parte integrante do processo de tomada de decisão ética, sendo essencial para o cuidado de qualidade. Entretanto, os resultados deste estudo revelaram que fatores como as relações interpessoais, a educação ética e as atividades burocráticas interferem negativamente no desenvolvimento da sensibilidade moral dos enfermeiros.

Almeja-se que as reflexões apresentadas no presente estudo possam suscitar discussões com vistas à implementação de estratégias que favoreçam o desenvolvimento da sensibilidade moral do enfermeiro, bem como o alcance dos bens internos da profissão, de modo a contribuir para a prática qualificada e resolutiva.

Desse modo, os resultados podem contribuir para que os enfermeiros potencializem sua sensibilidade moral e exerçam uma prática cada vez mais ética, assim como alertar as instituições de ensino e de saúde a respeito da importância da criação de espaços capazes de fomentar a discussão de problemas éticos que podem afetar a qualidade do cuidado.

A realização deste estudo aponta para a necessidade de outras pesquisas, visando a compreensão da sensibilidade moral dos enfermeiros em diferentes contextos de práticas, permitindo gerar informações mais representativas sobre o fenômeno investigado.

Como limitações do estudo, menciona-se a realização das entrevistas apenas com enfermeiros que atuam no período diurno. Além disso, o contexto em que os participantes do estudo estão inseridos pode repercutir em suas percepções, impossibilitando que os resultados apresentados sejam generalizados para outros cenários.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  27 Abr 2020
• Data do Fascículo
  2020

Histórico

• Recebido
  04 Mar 2019
• Aceito
  16 Set 2019