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Qualidade de vida, condições de saúde e estilo de vida de policiais civis

RESUMO

Objetivo:

Avaliar a relação entre qualidade de vida, condições de saúde e estilo de vida em policiais civis de Porto Alegre/RS.

Método:

Estudo transversal com 237 policiais que responderam um questionário com informações sociolaborais, estilo de vida, condições de saúde e o instrumento World Health Quality of Life-bref. Os dados foram coletados em 2018 e submetidos à análise estatística.

Resultados:

O Domínio Geral da qualidade de vida apresentou maiores médias para não hipertensos (p=0,002), sem alterações cardiovasculares (p=0,001), não tabagistas (p=0,003), não consumidores de bebida alcoólica (p=0,036), exercem atividade física (p<0,001), mantém alimentação saudável (p<0,001), não usam medicamentos (p=0,028), com tempo para descanso (p=0,049). Correlacionou-se com sono, peso, circunferência abdominal e de quadril (p<0,01).

Conclusão:

Doenças crônicas, uso de medicamentos e estilo de vida não saudável relacionaram-se com piora na qualidade de vida.

Palavras-chave:
Saúde do trabalhador; Enfermagem; Polícia; Qualidade de vida; Estilo de vida

ABSTRACT

Objectives:

Evaluate the relation between quality of life, health conditions and life style of Civil Police Officers in Porto Alegre/RS.

Method:

Transversal study with 237 police officers that answered a questionnaire containing socio-occupational information, life style, health conditions and the instrument World Health Quality of Life (WHOQOL-bref). The data was collected in 2018 and submitted to statistical analysis.

Results:

Broad domain of quality of life showed higher rates in non-hypertensive subjects (p=0,002), without cardiovascular alterations (p=0,001), non-smokers (p=0,003), no alcohol ingestion (p=0,036), regular physical activity (p<0,001), healthy eating (p<0,001), no use of medication (p=0,028), able to have time to rest (p=0,049). Correlated with sleeping, weight, abdominal and hip circumference (p<0.01).

Conclusion:

Chronic diseases, use of medication and unhealthy lifestyle are related to worsening health-related quality of life.

Keywords:
Occupational health; Nursing; Police; Quality of life; Life style

RESUMEN

Objetivo:

Evaluar la relación entre calidad de vida, condiciones de salud y estilo de vida entre policías civiles de Porto Alegre/RS.

Método:

Estudio transversal con 237 policías que respondieron un cuestionario con datos inherentes a información sociolaboral, estilo de vida, condiciones de salud y el instrumento World Health Quality of Life-bref. La recolección de datos se realizó en 2018 y los mismos fueron sometidos a análisis estadísticos.

Resultados:

El dominio general de la calidad de vida presentó mejores resultados en los siguientes casos: no hipertensos (p=0,002), sin alteraciones cardiovasculares (p=0,001), no tabaquistas (p=0,003), no consumidores de bebidas alcohólicas (p=0,036), realización de actividades físicas (p<0,001), consumo de alimentos saludables (p<0,001), no utilización de medicamentos (p=0,028), disposición de tiempo de descanso (p=0,049). Se relacionó con los siguientes factores: sueño, peso, circunferencia abdominal y de cadera (p<0,01).

Conclusión:

Las enfermedades crónicas, el uso de medicamentos y el estilo de vida no saludable se relacionan con el empeoramiento de la calidad de vida.

Palabras clave:
Salud laboral; Enfermería; Policía; Calidad de vida; Estilo de vida

INTRODUÇÃO

O trabalho policial, em todo o mundo, é caracterizado pela exposição ao estresse e ao risco de morte11. Galatzer-Levy IR, Steenkamp MM, Brown AD, Qian M, Inslicht S, Henn-Haase C, et al. Cortisol response to an experimental stress paradigm prospectively predicts long-term distress and resilience trajectories in response to active police service. J Psychiatr Res. 2014;56:36-42. doi: https://doi.org/10.1016/j.jpsychires.2014.04.020
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-22. Alexopoulos EC, Palatsidi V, Tigani X, Darviri C. Exploring stress levels, job satisfaction, and quality of life in a sample of police officers in Greece. Saf Health Work. 2014;5(4):210-5. doi: https://doi.org/10.1016/j.shaw.2014.07.004
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. Dessa forma, a atividade policial requer que o profissional atue no confronto contra a conduta irregular ou criminosa da sociedade, arriscando a própria vida em prol da defesa da vida do outro³3. Lipp MEN, Costa KRSN, Nunes VO. [Stress, quality of life, and occupational stressors among police officers: frequent symptoms]. Rev Psicol Organ Trab. 2017;17(1):46-53. Portuguese. doi: https://doi.org/10.17652/rpot/2017.1.12490
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.

A função dos policiais não se resume apenas ao serviço diário, implica também constante estado de alerta³3. Lipp MEN, Costa KRSN, Nunes VO. [Stress, quality of life, and occupational stressors among police officers: frequent symptoms]. Rev Psicol Organ Trab. 2017;17(1):46-53. Portuguese. doi: https://doi.org/10.17652/rpot/2017.1.12490
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, representando um estilo de vida centrado no trabalho44. Habersaat SA, Geiger AM, Abdellaoui S, Wolf JM. Health in police officers: role of risk factor clusters and police divisions. Soc Sci Med. 2015;143:213-22. doi: https://doi:10.1016/j.socscimed.2015.08.043
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. Dessa forma, esse contexto pode ser um fator de risco à saúde desses trabalhadores, de modo que a qualidade de vida, as condições de saúde e o estilo de vida possam ser afetados negativamente.

As condições de saúde são definidas como circunstâncias na saúde da população que se apresentam de forma mais ou menos persistentes e que exigem respostas sociais, vindas dos profissionais de saúde, dos sistemas de atenção à saúde e das pessoas usuárias do serviço. Dentre essas condições, podemos citar a ocorrência de doenças crônicas não transmissíveis55. Mendes EV. O cuidado das condições crônicas na atenção primária à saúde: o imperativo da consolidação da estratégia da saúde da família. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde. 2012 [citado 2019 mar 14]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cuidado_condicoes_atencao_primaria_saude.pdf
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, como a Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) e o Diabetes Mellitus (DM). A HAS é considerada um adoecimento inerente à profissão de policial, visto que, a tensão vivenciada durante as jornadas de trabalho, associada a fatores de risco, influencia no desequilíbrio da função cardiovascular66. Minayo MC, Assis SG, Oliveira RVC. [The impact of professional activities on the physical and mental health of the civil and military police of Rio de Janeiro (RJ, Brazil)]. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(4):2199-209. Portuguese. doi: https://doi.org/10.1590/S1413-81232011000400019
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. Ademais, os profissionais com DM apresentam uma circunstância favorável para o desenvolvimento de HAS, principalmente pelo elevado índice de massa corporal que acomete essa categoria profissional77. Tesfave T, Shikur B, Shimels T, Firdu N. Prevalence and factors associated with diabetes mellitus and impaired fasting glucose level among members of federal police commission residing in Addis Ababa, Ethiopia. BMC Endocrine Disorders. 2016;16:68. doi: https://doi.org/10.1186/s12902-016-0150-6
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O desgaste físico, constituído por fatores como pesada carga de trabalho, poucas horas de sono/repouso, estresse psicológico e vulnerabilidade a riscos, pode provocar enfermidades relacionadas à natureza dos serviços prestados pelo policial77. Tesfave T, Shikur B, Shimels T, Firdu N. Prevalence and factors associated with diabetes mellitus and impaired fasting glucose level among members of federal police commission residing in Addis Ababa, Ethiopia. BMC Endocrine Disorders. 2016;16:68. doi: https://doi.org/10.1186/s12902-016-0150-6
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. Além disso, os acontecimentos vivenciados no turno de trabalho influenciam na percepção da qualidade de vida desses profissionais88. Silva FC, Hernandez SSS, Arancibia BAV, Castro TLS, Gutierres Filho PJB, Silva R. Health-related quality of life and related factors of military police officers. Health Qual Life Outcomes. 2014;12:60. doi: https://doi.org/10.1186/1477-7525-12-60
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e aumenta o risco de distúrbios cardiovasculares99. Elliot JL, Lal S. Blood pressure, sleep quality and fatigue in shift working police officers: effects of a twelve hour roster system on cardiovascular and sleep health. Int J Environ Res Public Health. 2016;13(2):172. doi: https://doi.org/10.3390/ijerph13020172
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A exposição a ameaças e a riscos no campo de atuação influencia de forma direta a qualidade de vida dos trabalhadores, a qual é definida como a percepção de inserção na vida, no contexto da cultura e dos sistemas de valores em relação aos seus objetivos, suas expectativas, seus padrões e suas preocupações88. Silva FC, Hernandez SSS, Arancibia BAV, Castro TLS, Gutierres Filho PJB, Silva R. Health-related quality of life and related factors of military police officers. Health Qual Life Outcomes. 2014;12:60. doi: https://doi.org/10.1186/1477-7525-12-60
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,1010. Organización Mundial de La Salud (CH). Promoción de la salud: glosario. Ginebra: OMS; 1998 [cited 2019 Jan 10]. Disponible en: https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/67246/WHO_HPR_HEP_98.1_spa.pdf;jsessionid=CDD92CD5AA7293EF988555E1B247519F?sequence=1
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, ao se considerar a possibilidade de um adoecimento físico ou psíquico relacionado ao cotidiano de trabalho22. Alexopoulos EC, Palatsidi V, Tigani X, Darviri C. Exploring stress levels, job satisfaction, and quality of life in a sample of police officers in Greece. Saf Health Work. 2014;5(4):210-5. doi: https://doi.org/10.1016/j.shaw.2014.07.004
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. Portanto, para o exercício das suas funções, o policial precisa estar preparado e fortalecido com relação aos aspectos físico e mental, com vistas a atender às novas e crescentes demandas da sociedade, implicando questões de segurança pública e apresentando grandes desafios ao combate da violência1111. Oliveira LCN, Quemelo PRV. Qualidade de vida de policiais militares. Arq Ciênc Saúde. 2014 [cited 2019 Mar 14];21(3):72-5. Available from: http://repositorio-racs.famerp.br/racs_ol/vol-21-3/IDZ-642-(21-3)-jul-Set-2014.pdf
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.

Estudos internacionais11. Galatzer-Levy IR, Steenkamp MM, Brown AD, Qian M, Inslicht S, Henn-Haase C, et al. Cortisol response to an experimental stress paradigm prospectively predicts long-term distress and resilience trajectories in response to active police service. J Psychiatr Res. 2014;56:36-42. doi: https://doi.org/10.1016/j.jpsychires.2014.04.020
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-33. Lipp MEN, Costa KRSN, Nunes VO. [Stress, quality of life, and occupational stressors among police officers: frequent symptoms]. Rev Psicol Organ Trab. 2017;17(1):46-53. Portuguese. doi: https://doi.org/10.17652/rpot/2017.1.12490
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,77. Tesfave T, Shikur B, Shimels T, Firdu N. Prevalence and factors associated with diabetes mellitus and impaired fasting glucose level among members of federal police commission residing in Addis Ababa, Ethiopia. BMC Endocrine Disorders. 2016;16:68. doi: https://doi.org/10.1186/s12902-016-0150-6
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-88. Silva FC, Hernandez SSS, Arancibia BAV, Castro TLS, Gutierres Filho PJB, Silva R. Health-related quality of life and related factors of military police officers. Health Qual Life Outcomes. 2014;12:60. doi: https://doi.org/10.1186/1477-7525-12-60
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,1212. Alghamdi AS, Yahya MA, Alshammari GM, Osman MA. Prevalence of overweight and obesity among police officers in Riyadh City and risk factors for cardiovascular disease. Lipids Health Dis. 2017;16(1):79. doi: https://doi.org/10.1186/s12944-017-0467-9
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-1313. Braga FilhoRT, D'Oliveira Júnior A. Metabolic syndrome and military policemen's quality of life: an interdisciplinary comprehensive approach. Am J Mens Health. 2014;8(6):503-9. doi: https://doi.org/10.1177/1557988314526750
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sinalizam para a relevância de investigações acerca das alterações na saúde dos policiais, tendo em vista a importância desse grupo para a sociedade. As pesquisas versam principalmente sobre estresse e resiliência11. Galatzer-Levy IR, Steenkamp MM, Brown AD, Qian M, Inslicht S, Henn-Haase C, et al. Cortisol response to an experimental stress paradigm prospectively predicts long-term distress and resilience trajectories in response to active police service. J Psychiatr Res. 2014;56:36-42. doi: https://doi.org/10.1016/j.jpsychires.2014.04.020
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, estresse e qualidade de vida22. Alexopoulos EC, Palatsidi V, Tigani X, Darviri C. Exploring stress levels, job satisfaction, and quality of life in a sample of police officers in Greece. Saf Health Work. 2014;5(4):210-5. doi: https://doi.org/10.1016/j.shaw.2014.07.004
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-33. Lipp MEN, Costa KRSN, Nunes VO. [Stress, quality of life, and occupational stressors among police officers: frequent symptoms]. Rev Psicol Organ Trab. 2017;17(1):46-53. Portuguese. doi: https://doi.org/10.17652/rpot/2017.1.12490
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, Diabetes Mellitus77. Tesfave T, Shikur B, Shimels T, Firdu N. Prevalence and factors associated with diabetes mellitus and impaired fasting glucose level among members of federal police commission residing in Addis Ababa, Ethiopia. BMC Endocrine Disorders. 2016;16:68. doi: https://doi.org/10.1186/s12902-016-0150-6
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, alterações cardiovasculares88. Silva FC, Hernandez SSS, Arancibia BAV, Castro TLS, Gutierres Filho PJB, Silva R. Health-related quality of life and related factors of military police officers. Health Qual Life Outcomes. 2014;12:60. doi: https://doi.org/10.1186/1477-7525-12-60
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,1212. Alghamdi AS, Yahya MA, Alshammari GM, Osman MA. Prevalence of overweight and obesity among police officers in Riyadh City and risk factors for cardiovascular disease. Lipids Health Dis. 2017;16(1):79. doi: https://doi.org/10.1186/s12944-017-0467-9
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e síndrome metabólica e qualidade de vida1313. Braga FilhoRT, D'Oliveira Júnior A. Metabolic syndrome and military policemen's quality of life: an interdisciplinary comprehensive approach. Am J Mens Health. 2014;8(6):503-9. doi: https://doi.org/10.1177/1557988314526750
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. No entanto, poucos estudos nacionais66. Minayo MC, Assis SG, Oliveira RVC. [The impact of professional activities on the physical and mental health of the civil and military police of Rio de Janeiro (RJ, Brazil)]. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(4):2199-209. Portuguese. doi: https://doi.org/10.1590/S1413-81232011000400019
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,88. Silva FC, Hernandez SSS, Arancibia BAV, Castro TLS, Gutierres Filho PJB, Silva R. Health-related quality of life and related factors of military police officers. Health Qual Life Outcomes. 2014;12:60. doi: https://doi.org/10.1186/1477-7525-12-60
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,1111. Oliveira LCN, Quemelo PRV. Qualidade de vida de policiais militares. Arq Ciênc Saúde. 2014 [cited 2019 Mar 14];21(3):72-5. Available from: http://repositorio-racs.famerp.br/racs_ol/vol-21-3/IDZ-642-(21-3)-jul-Set-2014.pdf
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têm se voltado a essas problemáticas, principalmente no que tange às condições de saúde, de estilo de vida e de qualidade de vida, refletindo na existência de uma lacuna a ser respondida.

A realização de estudos contemplando essa categoria profissional permite aclarar como as circunstâncias situacionais do trabalho afetam a saúde e a qualidade de vida do policial. Nessa perspectiva, questiona-se: existe relação entre qualidade de vida, condições de saúde e estilo de vida em policiais civis? Logo, este estudo tem como objetivo avaliar a relação entre qualidade de vida, condições de saúde e estilo de vida em policiais civis de Porto Alegre/RS.

MÉTODO

Estudo quantitativo transversal, desenvolvido junto aos 12 departamentos que compõem a Polícia Civil de Porto Alegre - RS. Os departamentos visam preservar a segurança pública da população, desenvolvendo atividades de resguardo e defesa, utilizando a tecnologia da informação para investigações, e especializado a grupos vulneráveis. A população do estudo era composta por 1600 policiais. O cálculo do tamanho amostral foi realizado por meio do software G*Power Versão 3.1.2 (2009), considerando níveis de poder estatístico de 95%, para um nível de significância de 5%, obtendo-se amostra de 237 policiais civis, distribuídos proporcionalmente entre os departamentos. Os parâmetros utilizados para o cálculo amostral foram baseados em outros estudos que utilizaram as mesmas variáveis preditoras e desfecho estudado22. Alexopoulos EC, Palatsidi V, Tigani X, Darviri C. Exploring stress levels, job satisfaction, and quality of life in a sample of police officers in Greece. Saf Health Work. 2014;5(4):210-5. doi: https://doi.org/10.1016/j.shaw.2014.07.004
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Para a amostragem, foram utilizados dois critérios, sendo um específico para as Delegacias de Polícia, em que se adotou a amostragem por conglomerados devido ao elevado número de delegacias, todas pertencentes ao mesmo departamento. O outro critério foi direcionado aos Departamentos de Polícia, cuja seleção foi aleatória, estratificada com sorteio aleatório sistemático, com base na listagem de trabalhadores ativos no período do estudo. Foram incluídos na amostra os sujeitos ativos, na faixa etária entre 18 e 65 anos, que estavam lotados na Polícia Civil de Porto Alegre/RS. Estabeleceu-se como critérios de exclusão da amostra os policiais que possuíam tempo de trabalho inferior a um ano na corporação, policiais que estavam afastados do trabalho e da função na polícia de Porto Alegre ou em licença por qualquer motivo no período de coleta dos dados.

A coleta de dados foi realizada no período de agosto de 2017 a julho de 2018, no próprio local de trabalho, por três estudantes de enfermagem e por um mestrando, os quais foram previamente treinados. O questionário contemplava informações sociolaborais, estilo de vida e condições de saúde, as quais foram construídas com base na literatura científica consultadas pelos pesquisadores. As características sociolaborais foram avaliadas pelas variáveis: sexo, idade, estado civil, escolaridade, tempo na função, atividade na polícia, cargo. As condições de saúde foram abordadas por meio de perguntas a respeito da presença de alterações cardiovasculares, HAS, DM, do uso de medicamentos e da percepção de alterações na saúde física após o ingresso na polícia civil, além da coleta de dados antropométricos, como peso, circunferência de abdômen e de quadril.

O peso foi aferido por uma balança digital, previamente calibrada e certificada pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO). A circunferência abdominal foi medida horizontalmente na altura da cicatriz umbilical, na distância média entre a última costela flutuante e a crista ilíaca, sem fazer pressão; e a circunferência do quadril foi aferida com a fita métrica posicionada na área de maior protuberância glútea, próximo à região do trocanter do fêmur.

Quanto ao estilo de vida, foram incluídas as variáveis horas de sono, tabagismo, consumo de bebida alcoólica, alimentação, realização e frequência de atividade física, tempo disponível para lazer e para descanso.

A qualidade de vida, variável de desfecho, foi avaliada por meio da utilização do instrumento World Health Quality of Life (WHOQOL-bref), desenvolvido pelo Grupo de Qualidade de Vida da Organização Mundial da Saúde e validado no Brasil1414. Fleck MPA, Louzada S, Xavier M, Chachamovich E, Vieira G, Santos L, et al. [Application of the Portuguese version of the abbreviated instrument of quality life WHOQOL-bref]. Rev Saúde Pública. 2000;34(2):178-83. Portuguese. doi: https://doi.org/10.1590/S0034-89102000000200012
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. O WHOQOL-bref possui 26 questões agrupadas em cinco domínios: Físico (DF), Psicológico (DP), Relações sociais (DRS), Meio ambiente (DMA) e Geral (DG), sendo caracterizadas como: Físico (dor, energia, sono, mobilidade, atividades da vida cotidiana, dependência de medicação/tratamentos, capacidade para o trabalho); Psicológico (sentimentos positivos/negativos, pensamentos, autoestima, imagem corporal, espiritualidade); Relações sociais (relações pessoais, apoio social e atividade sexual); Meio ambiente (segurança física, ambiente no lar, recursos financeiros, cuidados de saúde e sociais, oportunidades de adquirir informações e habilidades, recreação/lazer, ambiente físico e transporte); Geral (qualidade de vida global e percepções de saúde geral).

Além dessa categorização, procedeu-se à análise descritiva dos dados demográficos e sociolaborais para caracterização dos participantes de pesquisa. Para os dados quantitativos, utilizou-se o software Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 20.0. O teste de normalidade de Shapiro-Wilk foi utilizado para verificar a distribuição das variáveis, além dos valores de assimetria e curtose. O teste t de Student foi utilizado para associação entre variáveis com distribuição simétrica; e, para as assimétricas, o Mann-Whitney. Para a associação entre as variáveis categóricas, empregou-se o teste Qui-Quadrado, ou Exato de Fisher, quando alguma célula apresenta frequência esperada menor do que cinco. Foram realizadas correlações bivariadas de Pearson (para variáveis simétricas) e de Spearman (para variáveis assimétricas). Foram consideradas como diferenças estatisticamente significativas os dados com “p” bicaudal menor que 0,05 ou com intervalo de confiança de 95%.

A pesquisa obteve aprovação no Comitê de Ética em Pesquisa CAAE 65391717.1.0000.5347 e atendeu às prerrogativas éticas envolvendo seres humanos, conforme Lei 466 de 2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Os participantes do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido, confirmando a participação voluntária, o resguardo do anonimato e o sigilo das informações.

RESULTADOS

Os dados sociodemográficos e laborais estão descritos na tabela 1.

Tabela 1 -
Caracterização dos Policiais Civis segundo os dados sociodemográficos. Porto Alegre, 2018

Sobre o estilo de vida dos policiais, o consumo de cigarro não era uma prática adotada com frequência, 8% (n=19) referiram uso cotidiano. Entretanto, com relação ao consumo de bebidas alcoólicas, mais da metade (54,4%, n=129) informou consumí-las. Em relação ao tempo para descanso e lazer, o maior percentual de policiais (59,5%, n=141) informaram apresentar tempo suficiente para efetuar essas práticas. Os trabalhadores apresentaram mediana de 7(6-8) horas de sono. Quanto à prática regular de atividade física, 67,9% (n=161) realizavam-na pelo menos uma vez na semana e 73,8% (n=175) referiram adotar alimentação saudável.

Sobre as condições de saúde, a prevalência de doenças crônicas não transmissíveis, como a Hipertensão Arterial Sistêmica e Diabete mellitus, com base em diagnóstico médico autorreferido, foi de 16% (n=38) e de 2,5% (n=6), respectivamente. Sobre o uso de medicamentos, 65,8% dos policiais informou não fazer uso para tratar condições de saúde em geral. Quanto à busca por tratamentos de saúde, observou-se o percentual de 20% para aqueles que estão interessados em avaliações de rotina. Em relação a medidas antropométricas, o peso registrou mediana de 72 (61-85) quilogramas, as circunferências abdominais, 86 (75-96), e a circunferência do quadril, 103 (98-108).

No que tange às alterações físicas percebidas após o ingresso na polícia civil, 41,35% (n=98) dos profissionais manifestaram alteração no seu estado de saúde, de maneira que 23,5% (n=23) destes apresentavam HAS (p=0,009) e 14,3%, alterações cardiovasculares (p=0,001). Dentre os profissionais que manifestaram alterações cardiovasculares (7,2%, n=17), 52,9% apresentavam HAS (p<0,001). A variável alimentação pouco saudável, o uso de medicamentos contínuos e as alterações físicas apresentaram diferença estatisticamente significativa, quando associados à HAS (p<0,05), e não significativa com o DM (p>0,05). Entre os policiais que referiram se alimentar de maneira pouco saudável (n=16), 25,8% apresentaram HAS (p=0,015). Quanto ao uso de medicamentos contínuos, 37% dos policiais apresentavam HAS (p<0,001) e 7,4% DM (p=0,001). As outras variáveis em questão não demonstraram associação significativa com a HAS e o DM (p>0,05).

A Tabela 2 representa a distribuição das variáveis condições de saúde em geral e hábitos de vida dos trabalhadores da polícia civil com os domínios da qualidade de vida WHOQOL.

Tabela 2 -
Distribuição dos domínios da qualidade de vida WHOQOL-bref segundo variáveis condições de saúde em geral dos trabalhadores da polícia civil, Porto Alegre/RS, 2018

A Tabela 3 apresenta a distribuição das variáveis hábitos de vida dos trabalhadores da polícia civil com os domínios da qualidade de vida WHOQOL.

Tabela 3 -
Distribuição dos domínios da qualidade de vida WHOQOL-bref segundo variáveis hábitos de vida dos trabalhadores da polícia civil, Porto Alegre/RS, 2018

Os policiais que exerciam atividade física regular apresentaram maiores médias no Domínio Físico (DF), no Domínio Psicológico (DP) e no Domínio Meio Ambiente (DMA); aqueles que se alimentavam de maneira saudável apresentaram maiores médias no Domínio Físico (DF) e no Domínio Psicológico (DP) do WHOQOL-bref (p<0,05). O DP ainda apresentou maiores médias para os policiais que exerciam atividade de lazer (p=0,004). Houve correlação entre a variável sono e o DF (r=0,230; p=0,002) e o DMA (r=0,146; p=0,025).

Os policiais que não manifestaram alteração na saúde física após o ingresso na polícia apresentaram maiores médias em todos os domínios do WHOQOL-bref (p<0,05). O Domínio Geral (DG) apresentou maiores médias para aqueles que não apresentavam HAS (p=0,002), não possuíam alterações cardiovasculares (p=0,001), não eram tabagistas (p=0,003), não consumiam bebida alcoólica (p=0,036), exerciam atividade física (p<0,001), alimentavam-se de maneira saudável (p<0,001), não faziam uso de medicamentos para o tratamento de condições de saúde não especificadas (p=0,028), possuíam tempo para descanso (p=0,049). Ainda, as variáveis sono (r=0,192; p=0,003), peso (r=-0,194; p=0,014), circunferência abdominal (r=-0,252; p<0,001) e de quadril (r=-0,173; p=0,009) se correlacionaram com o DG do WHOQOL-bref.

DISCUSSÃO

Este estudo possibilitou a obtenção de informações relevantes sobre os trabalhadores lotados na Polícia Civil de Porto Alegre/RS. Entre os achados, observou-se que a prevalência de HAS é de 16% na população do estudo. As análises efetuadas identificaram que a adoção de hábitos alimentares saudáveis e de práticas de exercício físico pelo menos uma vez na semana estão presentes no cotidiano dos policiais.

Estudo anterior realizado com trabalhadores da cidade do Rio de Janeiro, identificou a prevalência de 16,1% de HAS autorreferida, dado semelhante aos resultados desta pesquisa. Adicionalmente, a complicação entre os policiais foi associada ao elevado nível de massa corporal, à ingestão hipercalórica e hiperlipídica e ao estresse vivido no trabalho. Outro fator considerado decisivo para o adoecimento é o sedentarismo, levando ao comprometimento da energia, da vitalidade e da eficiência profissional66. Minayo MC, Assis SG, Oliveira RVC. [The impact of professional activities on the physical and mental health of the civil and military police of Rio de Janeiro (RJ, Brazil)]. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(4):2199-209. Portuguese. doi: https://doi.org/10.1590/S1413-81232011000400019
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Em estudo recente realizado na Arábia Saudita1212. Alghamdi AS, Yahya MA, Alshammari GM, Osman MA. Prevalence of overweight and obesity among police officers in Riyadh City and risk factors for cardiovascular disease. Lipids Health Dis. 2017;16(1):79. doi: https://doi.org/10.1186/s12944-017-0467-9
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, constatou-se valores de 33,3% de hipertensão arterial sistêmica para os trabalhadores com sobrepeso e 66,5% dos profissionais considerados obesos apresentaram a comorbidade crônica em questão, sendo que esses representavam 66,9% da amostra. Os autores consideraram que isso indica a existência de grande impacto do conjunto de situações vivenciadas no cotidiano de trabalho na saúde física dos policiais. Portanto, baixos níveis de atividade física e de consciência nutricional permeiam as práticas laborais da classe policial, o que pode estar repercutindo negativamente na saúde e na qualidade de vida desses profissionais.

Policiais trabalhadores de províncias orientais manifestaram comportamento propenso ao desenvolvimento de doenças coronarianas. Entre os profissionais identificados com sobrepeso e obesidade abdominal (circunferência da cintura maior ou igual a 85 cm), 44,7% e 63,4% apresentavam alterações de origem cardiovascular, respectivamente. Esses achados sugerem que os policiais apresentam características comportamentais que contribuem como fatores de risco para a HAS77. Tesfave T, Shikur B, Shimels T, Firdu N. Prevalence and factors associated with diabetes mellitus and impaired fasting glucose level among members of federal police commission residing in Addis Ababa, Ethiopia. BMC Endocrine Disorders. 2016;16:68. doi: https://doi.org/10.1186/s12902-016-0150-6
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: hábitos não saudáveis de alimentação, consumo de álcool e falta de atividade física. Nessa perspectiva, em dois outros estudos, um australiano e outro canadense, foram assinaladas alterações cardíacas significativas (p<0,05), relacionadas à pressão arterial sistólica, decorrentes do cotidiano laboral de policiais civis99. Elliot JL, Lal S. Blood pressure, sleep quality and fatigue in shift working police officers: effects of a twelve hour roster system on cardiovascular and sleep health. Int J Environ Res Public Health. 2016;13(2):172. doi: https://doi.org/10.3390/ijerph13020172
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,1515. Gendron P, Lajoie C, Laurencelle L, Trudeau F. Cardiovascular health profile among Quebec male and female police officers. Arch Environ Occup Health. 2019:74(6):331-40. doi: https://doi.org/10.1080/19338244.2018.1472063
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Os policiais identificados com hipertensão arterial sistêmica obtiveram menores médias no domínio físico da qualidade de vida. Ademais, o uso de álcool, bem como a manifestação de alterações cardiovasculares após o ingresso na polícia, associa-se a menores médias de qualidade de vida global.

Estudo realizado em território nacional constatou que policiais civis com hipertensão e demais fatores de risco para doença cardiovascular, incluindo alterações em exames laboratoriais e obesidade abdominal por avaliação da circunferência de cintura, manifestaram a adoção de um estilo de vida com repercussão negativa na qualidade de vida geral desses trabalhadores1313. Braga FilhoRT, D'Oliveira Júnior A. Metabolic syndrome and military policemen's quality of life: an interdisciplinary comprehensive approach. Am J Mens Health. 2014;8(6):503-9. doi: https://doi.org/10.1177/1557988314526750
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. Há também um estudo recente, realizado na Etiópia, a respeito do consumo de álcool e de tabaco na comunidade de policiais, o qual evidenciou prejuízo na qualidade de vida entre aqueles que se identificaram como fumantes diários (83%) e consumidores de álcool no cotidiano (24,6%)77. Tesfave T, Shikur B, Shimels T, Firdu N. Prevalence and factors associated with diabetes mellitus and impaired fasting glucose level among members of federal police commission residing in Addis Ababa, Ethiopia. BMC Endocrine Disorders. 2016;16:68. doi: https://doi.org/10.1186/s12902-016-0150-6
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Estudo realizado no Sul da China, com o objetivo avaliar a qualidade de vida relacionada à saúde de policiais, constatou menor qualidade de vida neste grupo quando comparado à população adulta em geral, e que ansiedade/depressão era o problema mais frequentemente relatado. Idade, consumo de álcool, atividade física, danos ocupacionais e sintomas de ansiedade/depressão influenciaram significativamente na diminuição da qualidade de vida1616. Wu X, Liu Q, Li Q, Tian Z, Tan H. Health-related quality of life and its determinants among criminal police officers. Int J Environ Res Public Health. 2019;16(8):1398. doi: https://doi.org/10.3390/ijerph16081398
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Com relação aos achados deste trabalho, evidenciou-se maiores médias de qualidade de vida entre os policiais que assinalaram ter tempo suficiente para realizarem atividades de lazer e de descanso e correlação positiva entre sono e qualidade de vida. A prática de atividade física e a adesão a hábitos saudáveis de alimentação resultaram em maiores médias em domínios da qualidade de vida. Já o uso de medicamento para o tratamento de condições de saúde não especificadas resultou em menores médias.

Corrobora com essa percepção uma pesquisa recente realizada no Irã, a qual identificou significância estatística entre qualidade de vida e melhores condições de sono, tendo em vista que a realização de práticas que viabilizam o descanso reduz a prevalência de distúrbios de sono e de má qualidade de vida entre os policiais1717. Roustaei N, Jamali H, Jamali RM, Nourshargh P, Jamali J. The association between quality of sleep and health-related quality of life in military and non-military women in Tehran, Iran. Oman Med J. 2017;32(2):124-30. doi: https://doi.org/10.5001/omj.2017.22
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. Assim sendo, as horas e a qualidade do sono do policial podem ser afetadas pela elevada demanda psíquica existente no trabalho, bem como o excesso de atividades diárias e o estado constante de sobreaviso: frequentemente, os policiais são chamados para atuarem em prisões de pessoas e em apreensões de mercadoria ilegais durante a madrugada.

No que diz respeito à baixa frequência de atividade física durante o momento que seria destinado ao lazer, associada a hábitos alimentares não saudáveis, um outro estudo brasileiro destacou que esses são fatores de risco relativos a uma baixa qualidade de vida relacionada à saúde88. Silva FC, Hernandez SSS, Arancibia BAV, Castro TLS, Gutierres Filho PJB, Silva R. Health-related quality of life and related factors of military police officers. Health Qual Life Outcomes. 2014;12:60. doi: https://doi.org/10.1186/1477-7525-12-60
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Sobre o uso de medicamentos, evidenciou-se, em estudo italiano1818. Barraco G, Pagano S, Lupoli G, Dolci A, Colagrosso B. Multitarget survey on the Finance Police personnel: assessment of the health condition. Ann Stomatol (Roma). 2014;V(4):123-7. doi: https://doi.org/10.11138/ads%2F2014.5.4.123
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, que o uso de terapias medicamentosas mantém boas condições de saúde e de qualidade de vida. Entretanto, outro estudo com uma população semelhante constatou que os policiais com maiores prejuízos na qualidade de vida fazem uso regular de medicamentos1919. Wagner LC, Stankievich RAP, Pedroso F. [Mental health and quality of life of civil police officers in the metropolitan region of Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brazil]. Rev Bras Med Trab. 2012 [cited 2018 Dec 02];10(2):64-71. Portuguese. Available from: http://www.rbmt.org.br/details/77/pt-BR/saude-mental-e-qualidade-de-vida-de-policiais-civis-da-regiao-metropolitana-de-porto-alegre
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. Logo, é preciso considerar que o uso de medicamentos pelos policiais civis desse estudo podem ser relacionados a controle de doenças que causam limitações físicas e psíquicas, e as quais podem influenciar em todos os domínios da qualidade de vida.

Os resultados finais deste estudo demonstraram que o peso se correlacionou inversamente com o domínio geral e com as circunferências abdominal e do quadril, apresentaram correlação negativa com o domínio geral da qualidade de vida. Esse resultado pode ser comparado com obtido por meio de um estudo norte-americano, em que profissionais com sobrepeso e obesidade abdominal, com valor de circunferência de cintura maior ou igual a 102 cm, apresentaram qualidade de vida inferior aos profissionais com peso e circunferência nos padrões de normalidade2020. Fekedulegn D, Burchfiel CM, Hartley TA, Andrew ME, Charles LE, Zara CAT, et al. Shiftwork and sickness absence among police officers: the BCOPS study. Chronobiol Int. 2015;30(7):930-41. doi: https://doi.org/10.3109/07420528.2013.790043
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. Nesta perspectiva, pesquisa brasileira obteve dados semelhantes ao determinar a relação entre circunferência de cintura/peso como um fator de risco associado à baixa qualidade de vida relacionada à saúde88. Silva FC, Hernandez SSS, Arancibia BAV, Castro TLS, Gutierres Filho PJB, Silva R. Health-related quality of life and related factors of military police officers. Health Qual Life Outcomes. 2014;12:60. doi: https://doi.org/10.1186/1477-7525-12-60
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. Evidenciou-se que quanto mais longa a atuação policial, mais elevado o IMC, podendo indicar que, quanto mais tempo os policiais dedicam ao seu trabalho, menor o cuidado com a saúde2121. Vancini RL, Lira CAB, Anceschi SA, Rosa AV, Lima-Leopoldo AP, Leopoldo AS, et al. Anxiety, depression symptoms, and physical activity levels of eutrophic and excess-weight Brazilian elite police officers: a preliminary study. Psychol Res Behav Manag. 2018;11:589-95. doi: https://doi.org/10.2147/PRBM.S186128
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.

Em face disso, observou-se em trabalhadores com HAS a existência de fatores de risco para problemas cardiovasculares e para alterações cardíacas relacionadas aos hábitos de vida diários, fatores estes que repercutem na qualidade de vida manifestada pelos policiais civis. Assim, corroborando com autores, são necessárias intervenções no local de trabalho dos policiais, incluindo recrutamento de funcionários, melhor organização laboral e promoção de recursos a fim de apoiar o bem-estar dos policiais1616. Wu X, Liu Q, Li Q, Tian Z, Tan H. Health-related quality of life and its determinants among criminal police officers. Int J Environ Res Public Health. 2019;16(8):1398. doi: https://doi.org/10.3390/ijerph16081398
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, bem como ações com foco na reformulação de políticas organizacionais e públicas voltadas para prevenção de riscos e doenças ocupacionais2222. Wolter C, Santa Maria A, Wörfel F, Gusy B, Lesener T, Kleiber D, et al. Job demands, job resources, and well-being in police officers: a resource-oriented approach. J Police Crim Psych. 2019;34(1):45-54. doi: https://doi.org/10.1007/s11896-018-9265-1
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CONCLUSÃO

Diante do exposto, é possível concluir que variáveis como a presença de HAS, de alterações cardiovasculares, tabagismo, consumo de álcool, alimentação pouco saudável, uso de medicamentos, tempo insuficiente para descanso e para lazer se correlacionam com menores médias nos domínios do WHOQOL-bref. Do mesmo modo, há correlação positiva para horas de sono e inversa entre peso, circunferência abdominal e de quadril com os domínios de qualidade de vida, indicando relação entre condições de saúde, estilo de vida e qualidade de vida dos policiais.

Constatou-se que, na percepção dos policiais civis, ocorreram alterações no seu estado de saúde em geral após o ingresso na profissão. As maiores médias do WHOQOL-bref foram vistas em policiais que possuem alimentação saudável, que não são tabagistas, que não fazem consumo de bebidas alcoólicas e que realizam atividade física regularmente, além de haver correlação direta entre horas de sono e os domínios de qualidade de vida. Logo, os trabalhadores com estilo de vida saudável apresentam melhores médias nos Domínios Físico, Meio Ambiente e Geral, representando qualidade de vida superior ao grupo oposto.

Diante das considerações aqui apresentadas, a respeito de uma temática ainda pouco explorada, torna-se perceptível que os resultados oferecem contribuição ao ensino, à assistência e à pesquisa no campo da saúde, especialmente na área da saúde do trabalhador. Logo, destaca-se a importância do desenvolvimento de ações de enfermagem, com ênfase na atenção integral à saúde dos policiais, com vistas à promoção e proteção de sua saúde, com a finalidade de ajudá-los na recuperação e prevenção a danos relacionados ao tempo de serviço.

Desse modo, o núcleo de saúde responsável pelo suporte aos policiais pode se estruturar de acordo com as demandas e com as necessidades apresentadas pelos indivíduos, a fim de organizar um planejamento eficiente, com garantia de segurança e de respeito aos direitos do policial no exercício de suas funções, uma forma de consolidar uma dinâmica de trabalho em prol de um estilo de vida mais saudável.

Abordar de maneira enfática as condições laborais do profissional da segurança pública pode contribuir para a reestruturação de políticas públicas de atenção aos problemas identificados e de sua prevenção, uma vez que a temática saúde do trabalhador no âmbito do exercício laboral de agentes de segurança pública permite observar como as condições de trabalho acometem a saúde e a qualidade de vida dos policiais civis.

A limitação do estudo está relacionada ao delineamento transversal, em que todas as medições são realizadas em um único momento sem período de seguimento. Além disso, a utilização de instrumento confeccionado com perguntas autorreferidas sobre os hábitos de vida e saúde dos policiais pode ser um aspecto limitante, ao se considerar que profissionais com comorbidades poderiam desconhecer tal condição pela baixa procura por atendimento de saúde. Diante disso, ressalta-se a importância de novos estudos sobre a temática, tendo em vista que a relação entre as variáveis apresentadas é pouco observada na literatura atual.

Agradecimentos

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio financeiro. Processo nº 436261/2018-9.

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Editado por

Editor associado:

Wiliam Wegner

Editor-chefe:

Maria da Graça Oliveira Crossetti

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    28 Abr 2019
  • Aceito
    18 Dez 2019
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