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Processo assistencial às mulheres com morbidade materna grave: um estudo misto

RESUMO

Objetivo:

Descrever as características maternas e obstétricas associadas à morbidade materna grave e os fatores do processo assistencial envolvidos nesses desfechos graves segundo enfermeiras e médicos.

Método:

Estudo misto sequencial em maternidade terciária no município do Rio de Janeiro, a partir de registros da assistência e entrevistas com esses profissionais, de fevereiro a julho de 2019. Aplicaram-se teste qui-quadrado, razão de prevalência e análise de conteúdo temática.

Resultados:

Em 66 (100%) mulheres, a pré-eclâmpsia grave (77,3%) foi mais prevalente e ocorreram 12 (18,2%) casos de near miss e um óbito materno. A hemorragia pós-parto (RP= 3,21; IC 95% 1,22-8,41) e realização de transfusões sanguíneas (RP= 3,60; IC 95% 1,81-7,16) contribuíram nos desfechos graves. Há deficiências no sistema de saúde, acesso à saúde reprodutiva e qualidade da assistência.

Conclusão:

Melhorias no acesso à saúde e qualidade do processo assistencial são imperiosas para reduzir os desfechos maternos graves.

Palavras-chave:
Complicações na gravidez; Morbidade; Qualidade da assistência à saúde

ABSTRACT

Objective:

To describe the maternal and obstetric characteristics associated with severe maternal morbidity, and the factors of the assistance process involved in the severe outcomes according to nurses and doctors.

Method:

Sequential mixed study at the tertiary maternity in the city of Rio de Janeiro, based on care records and interviews with these professionals, from February to July 2019. Chi-square test, prevalence ratio and thematic content analysis were applied.

Results:

In 66 (100%) women with SMM, severe preeclampsia (77.3%) was more prevalent and there were 12 (18.2%) cases of near miss and one maternal death. Postpartum hemorrhage (PR = 3.21; 95% CI 1.22-8.41) and blood transfusions (PR = 3.60; 95% CI 1.81-7.16) contributed to severe outcomes. There are deficiencies in the health system, access to reproductive health and quality of care.

Conclusion:

Improvements in access to health and quality of the care process are imperative to reduce severe maternal outcomes.

Keywords:
Pregnancy complications; Morbidity; Quality of health care

RESUMEN

Objetivo:

Describir las características maternas y obstétricas asociadas a la morbilidad materna severa y los factores del proceso asistencial involucrados en estos resultados graves según enfermeras y médicos.

Método:

Investigación secuencial mixta en una maternidad terciaria de la municipalidad de Río de Janeiro, a partir de los registros de atención y entrevistas con estos profesionales, de febrero a julio de 2019. Se aplicó prueba de chi-cuadrado, razón de prevalencia y análisis de contenido temático.

Resultados:

En 66 (100%) mujeres, la preeclampsia grave (77,3%) fue más prevalente y hubo 12 (18,2%) casos de near miss y una muerte materna. La hemorragia posparto (RP = 3,21; IC del 95%: 1,22 a 8,41) y las transfusiones de sangre (RP = 3,60; IC del 95%: 1,81 a 7,16) contribuyeron en los resultados graves. Existen deficiencias en el sistema de salud, el acceso a la salud reproductiva y la calidad de la atención.

Conclusión:

Mejoras en el acceso a la salud y calidad del proceso asistencial son imperativas para reducir los resultados maternos graves.

Palabras clave:
Complicaciones del embarazo; Morbilidad; Calidad de la atención de salud

INTRODUÇÃO

Os desfechos maternos graves estão relacionados com três demoras ou atrasos da mulher em acessar e receber cuidados de saúde. O primeiro atraso é influenciado pela dificuldade na tomada de decisão, bem como por fatores socioculturais e de oportunidade. O segundo envolve a distância até a unidade de saúde mais próxima, tempo de viagem, disponibilidade e custo de transporte. Já no terceiro, há fatores que afetam o recebimento de cuidado eficaz quando a mulher chega em uma unidade de saúde: escassez de suprimentos, equipamentos e pessoal treinado; competência e disponibilidade de pessoal e qualidade do atendimento. Esse modelo teórico das três demoras (three delays model) destina-se à avaliação das circunstâncias em torno de uma morte materna11. Mgawadere F, Unkels R, Kazembe A, van den Broek N. Factors associated with maternal mortality in Malawi: application of the three delays model. BMC Pregnancy Childbirth. 2017;17(1):219. doi: https://doi.org/10.1186/s12884-017-1406-5
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-22. Pacagnella RC, Cecatti JG, Parpinelli MA, Sousa MH, Haddad SM, Costa ML, et al. Delays in receiving obstetric care and poor maternal outcomes: results from a national multicentre cross-sectional study. BMC Pregnancy Childbirth. 2014;14:159. doi: https://doi.org/10.1186/1471-2393-14-159
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.

Destaca-se que o estudo da morbidade materna grave (MMG) é considerado valioso para a identificação das possíveis falhas na assistência prestada nos serviços de saúde e orientação das ações de redução destes desfechos graves33. Lima THB, Amorim MM, Buainain Kassar S, Katz L. Maternal near miss determinants at a maternity hospital for high-risk pregnancy in northeastern Brazil: a prospective study. BMC Pregnancy Childbirth. 2019;19(1):271. doi: https://doi.org/10.1186/s12884-019-2381-9
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-44. Rosendo TM, Roncalli AG. Near miss materno e iniquidades em saúde: análise de determinantes contextuais no Rio Grande do Norte, Brasil. Ciênc Saúde Colet. 2016;21(1):191-201. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232015211.20802014
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. A MMG é definida como qualquer condição potencialmente ameaçadora à vida da mulher durante a gravidez, parto e puerpério, que pode causar a sua morte ou deixá-la escapar da morte por pouco. Essa última condição, na qual a mulher sobrevive, é classificada como near miss materno (NMM)55. World Health Organization. Evaluating the quality of care for severe pregnancy complications - The WHO near-miss approach for maternal health[Internet]. Geneva: WHO; 2011 [cited 2021 Mar 5]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/44692/9789241502221_eng.pdf;jsessionid=79A12B5B52EAE7B7D067820ADE185362?sequence=1
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As grávidas que desenvolvem condição potencialmente ameaçadora à vida tendem a enfrentar barreiras na continuidade do cuidado e no sistema de referência da rede de atenção à saúde, cujos pontos críticos são entraves para o atendimento pré-natal e originam a peregrinação pelos serviços de saúde; a dificuldade de obter cuidados em tempo hábil e a demora no encaminhamento para o serviço de referência66. Andrade MS, Vieira EM. Itinerários terapêuticos de mulheres com morbidade materna grave. Cad Saúde Pública. 2018;34(7):e00091917. doi: https://doi.org/10.1590/0102-311X00091917
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Tendo em vista os problemas nessa assistência e seu potencial impacto negativo na saúde materna, a seguinte questão foi proposta: Quais as características maternas e obstétricas e os fatores do processo assistencial relacionados com os desfechos de MMG?

A pesquisa objetivou descrever as características maternas e obstétricas associadas à morbidade materna grave e os fatores do processo assistencial envolvidos nesses desfechos graves segundo enfermeiras e médicos.

MÉTODOS

Trata-se de estudo misto, do tipo sequencial explanatório, conduzido em maternidade pública do nível terciário de atenção à saúde, vinculada a um hospital de ensino e localizada no município do Rio de Janeiro.

A escolha desta maternidade ocorreu devido à instituição ser referência para gestantes de risco, complementar à rede de atenção à saúde estadual e municipal do Rio de Janeiro e ser campo de formação da enfermagem e medicina.

O desenho misto sequencial explanatório se caracteriza pela coleta dos dados quantitativos seguida pelos qualitativos, o que possibilita a integração dos resultados objetivos acerca dos fatores associados com o desfecho materno grave com as descobertas qualitativas sobre o processo assistencial envolvido nesse desfecho e, assim, ampliar a compreensão do fenômeno estudado77. Ivankova N, Wingo N. Applying mixed methods in action research: methodological potentials and advantages. Am Behav Sci. 2018;62(7): 978-97. doi: https://doi.org/10.1177/0002764218772673
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Fase quantitativa

Estudo seccional, realizado a partir dos registros dos atendimentos às mulheres com gravidez de risco internadas na unidade de cuidados especializados (UCE) da maternidade, com quatro leitos destinados ao monitoramento das mulheres com patologia gestacional ou intercorrência obstétrica grave.

Em 2017, verificaram-se 354 nascimentos nesta maternidade e a maioria foi por cesariana (61,2%), segundo as informações sobre nascidos vivos (NV) do Sistema Único de Saúde (SUS). Nesse ano, 446 grávidas ou puérperas foram atendidas no setor de emergência da maternidade e 107 delas foram internadas na UCE, conforme os dados da instituição.

Os critérios de inclusão no estudo foram: os registros da assistência às mulheres com gestação de risco e internadas por MMG em unidade da atenção terciária. Excluíram-se os registros dos atendimentos decorrentes de condições graves não relacionadas com o período gravídico.

A coleta de dados desta fase do estudo misto ocorreu de fevereiro a março de 2019. Aplicou-se formulário estruturado para extrair os dados de interesse referentes aos atendimentos do ano de 2017, sendo este instrumento construído com base na ficha de identificação de condições ameaçadoras à vida e desfechos maternos graves proposta pela Organização Mundial da Saúde (OMS)55. World Health Organization. Evaluating the quality of care for severe pregnancy complications - The WHO near-miss approach for maternal health[Internet]. Geneva: WHO; 2011 [cited 2021 Mar 5]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/44692/9789241502221_eng.pdf;jsessionid=79A12B5B52EAE7B7D067820ADE185362?sequence=1
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Cabe esclarecer que este recorte temporal do estudo foi estabelecido mediante à disponibilidade de acesso e consulta dos documentos em papel que compõem os prontuários correspondentes aos doze meses de atendimento na UCE, de janeiro a dezembro de 2017, no setor de arquivo do hospital de ensino.

Incialmente, procedeu-se à busca dos prontuários neste setor de arquivo, sendo que 17 prontuários não foram localizados. Os dados de registro dos 90 prontuários encontrados foram extraídos conforme o formulário estruturado, aplicando-se os critérios de seleção do estudo. Selecionaram-se 66 prontuários de gestantes e puérperas com MMG, constituindo a amostra do estudo. Os dados de registro de 24 prontuários foram excluídos por não atenderem a estes critérios.

As variáveis do estudo são: complicações obstétricas graves (hemorragia pós-parto grave; pré-eclâmpsia grave; eclâmpsia; sepse ou infecção sistêmica grave e rotura uterina); intervenções críticas (transfusão sanguínea; embolização da artéria uterina; cirurgia abdominal de emergência, exceto cesariana, e admissão em Unidade de Terapia Intensiva [UTI]); disfunções orgânicas (cardiovascular; respiratória; renal; hematológica; hepática; neurológica e uterina) e outras variáveis maternas (faixa etária, cor da pele, idade gestacional e escolaridade). O número total de consultas de pré-natal nem sempre estava disponível nos registros analisados, optando-se pela exclusão dessa variável por conta do subregistro.

O desfecho materno grave, MMG e NMM, foi estudado como uma única variável em virtude do tamanho da amostra. Iniciou-se a análise em planilha do software Excel da Microsoft Office®, versão 2013, para identificação dos casos de NMM segundo os critérios da OMS55. World Health Organization. Evaluating the quality of care for severe pregnancy complications - The WHO near-miss approach for maternal health[Internet]. Geneva: WHO; 2011 [cited 2021 Mar 5]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/44692/9789241502221_eng.pdf;jsessionid=79A12B5B52EAE7B7D067820ADE185362?sequence=1
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, complementados pelos elaborados por Mantel88. Mantel GD, Buchmann E, Rees H, Pattinson RC. Severe acute maternal morbidity: a pilot study of a definition for a near-miss. Br J Obstet Gynaecol. 1998;105(9):985-90. doi: https://doi.org/10.1111/j.1471-0528.1998.tb10262.x
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e Geller99. Geller SE, Rosenberg D, Cox S, Brown M, Simonson L, Kilpatrick S. A scoring system identified near-miss maternal morbidity during pregnancy. J Clin Epidemiol. 2004;57(7):716-20. doi: https://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2004.01.003
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. Os parâmetros da OMS são considerados padrão-ouro na identificação de condições potencialmente ameaçadoras à vida e que conduzem ao NMM, enquanto os de Mantel88. Mantel GD, Buchmann E, Rees H, Pattinson RC. Severe acute maternal morbidity: a pilot study of a definition for a near-miss. Br J Obstet Gynaecol. 1998;105(9):985-90. doi: https://doi.org/10.1111/j.1471-0528.1998.tb10262.x
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baseiam-se na definição de MMG como qualquer disfunção orgânica grave por causa obstétrica primária. Os critérios de Geller99. Geller SE, Rosenberg D, Cox S, Brown M, Simonson L, Kilpatrick S. A scoring system identified near-miss maternal morbidity during pregnancy. J Clin Epidemiol. 2004;57(7):716-20. doi: https://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2004.01.003
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têm abordagem múltipla e permitem obter um escore para identificação dos casos de NMM em unidades obstétricas de maior complexidade, que são reconhecidos quando se obtêm 8 ou mais de um total máximo de 15 pontos.

Apesar de os parâmetros de Mantel88. Mantel GD, Buchmann E, Rees H, Pattinson RC. Severe acute maternal morbidity: a pilot study of a definition for a near-miss. Br J Obstet Gynaecol. 1998;105(9):985-90. doi: https://doi.org/10.1111/j.1471-0528.1998.tb10262.x
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e Geller99. Geller SE, Rosenberg D, Cox S, Brown M, Simonson L, Kilpatrick S. A scoring system identified near-miss maternal morbidity during pregnancy. J Clin Epidemiol. 2004;57(7):716-20. doi: https://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2004.01.003
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) mostrarem limitações, ambos apresentam boa especificidade e foram elaborados a partir de auditoria das anotações médicas e de forma retrospectiva1010. Monte AS, Teles LMR, Oriá MOB, Carvalho FHC, Brown H, Damasceno AKC. Comparison between near miss criteria in a maternal intensive care unit. Rev Esc Enferm USP. 2018;52:e03404. doi: https://doi.org/10.1590/S1980-220X2017038703404
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, como o desenho aplicado nesta fase do estudo.

A análise estatística ocorreu por meio do software IBM SPSS®, versão 20.0, sendo verificada a concordância entre os critérios de Mantel88. Mantel GD, Buchmann E, Rees H, Pattinson RC. Severe acute maternal morbidity: a pilot study of a definition for a near-miss. Br J Obstet Gynaecol. 1998;105(9):985-90. doi: https://doi.org/10.1111/j.1471-0528.1998.tb10262.x
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e de Geller99. Geller SE, Rosenberg D, Cox S, Brown M, Simonson L, Kilpatrick S. A scoring system identified near-miss maternal morbidity during pregnancy. J Clin Epidemiol. 2004;57(7):716-20. doi: https://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2004.01.003
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pelo índice de Kappa, alcançando 0,861. Posteriormente, aplicou-se o teste qui-quadrado (χ2), com nível de significância de p<0,05, para testar a associação entre as variáveis e o desfecho MMG/NMM.

Ao identificar as associações, procedeu-se ao teste post hoc de Bonferroni para comparações múltiplas e controlar o erro tipo I no teste χ2. Sequencialmente, verificou-se a força de associação entre as variáveis independentes com o desfecho pelos testes Phi (() e V de Cramer. Por fim, calculou-se a Razão de Prevalência (RP) para cada complicação obstétrica e intervenção crítica com intervalo de confiança de 95% (IC 95%) e valor de p<0,05 no teste χ2.

Fase qualitativa

Estudo de abordagem qualitativa, tipo descritivo e realizado com enfermeiras e médicos que atuam na UCE da mesma maternidade onde a primeira fase deste estudo misto foi conduzida.

Os critérios de inclusão foram: enfermeira(o) ou médica(o) responsável pelos cuidados das gestantes ou puérperas com MMG. Excluíram-se profissionais com menos de dois anos de trabalho na instituição e em processo de formação, como os residentes de medicina e enfermagem. Partiu-se da premissa de que o tipo de vínculo e o tempo de trabalho são necessários para que o profissional esteja familiarizado com o processo assistencial dessas mulheres.

Deste modo, buscou-se evitar a mescla na composição da amostra, entre profissionais do corpo clínico permanente da UCE e aqueles cuja permanência no setor é por um tempo limitado. O treinamento em serviço dos residentes ocorre, geralmente, por vinte quatro meses e é organizado em sistema de rodízio pelo ambulatório e enfermarias da maternidade terciária.

O grupo de profissionais de interesse ao estudo e atuantes na UCE era composto por 13 enfermeiras e 15 médicas por ocasião da coleta de dados. Os critérios de seleção foram aplicados e houve a exclusão de onze profissionais. Os selecionados a participar da pesquisa foram aqueles que integravam o corpo clínico permanente da UCE, sendo observada também a representação de, pelo menos, um profissional de cada categoria segundo os turnos diários de trabalho ou a escala de plantões. Não houve recusa dos profissionais selecionados em conceder a entrevista.

A coleta dos dados qualitativos se deu no período de abril a julho de 2019, sendo antecedida pela divulgação dos propósitos do estudo às equipes de enfermeiras e médicos. As treze entrevistas individuais com sete enfermeiras e seis médicas foram gravadas em mídia digital, com apoio de um roteiro dividido em duas partes. A primeira parte buscou a caracterização dos participantes e a segunda constou de perguntas sobre o processo assistencial das mulheres com MMG. Esse roteiro foi testado previamente com quatro voluntários das mesmas categorias profissionais e suas entrevistas descartadas, não tendo sido necessário alterar nenhuma das perguntas. Esses profissionais que integraram o teste piloto do roteiro de entrevista não fizeram parte do momento da seleção dos participantes para o estudo.

As entrevistas foram analisadas por meio da técnica de análise de conteúdo temática1111. Ferreira AMD, Oliveira JLC, Souza VS, Camillo NRS, Medeiros M, Marcon SS, et al. Roteiro adaptado de análise de conteúdo - modalidade temática: relato de experiência. J Nurs Health. 2020;10(1):e20101001. doi: https://doi.org/10.15210/jonah.v10i1.14534
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, sendo constituída pela pré-análise, quando há transcrição e leitura flutuante dos depoimentos, seguida da exploração do material, conduzida no software Excel da Microsoft Office®, visando o agrupamento das unidades de significação por equivalência semântica e a verificação das frequências das unidades de registro (UR), adotando-se codificação coerente com a tipificação e natureza dos fatores do processo assistencial relacionados com a ocorrência da MMG. Essa fase foi supervisionada por dois pesquisadores da equipe, não participantes da coleta de dados, culminando na construção das categorias temáticas ou temas e seus respectivos subtemas. Por fim, realizou-se o tratamento dos resultados por meio da inferência e interpretação baseada em estudos sobre a temática e o modelo das três demoras.

Para preservar o anonimato, as participantes receberam codificação pela categoria profissional e ordem de concessão das entrevistas, a exemplo de Enfermeira E1, Médica E2, Enfermeira E3, assim por diante. As legislações para pesquisas com seres humanos foram respeitadas em todas as fases deste estudo, sendo aprovado em Comitê de Ética em Pesquisa.

RESULTADOS

Entre as 66 (100%) mulheres com MMG, a maioria encontrava-se com 26 a 35 anos de idade (74,2%) e possuía a cor da pele parda (39,4%) ou preta (33,3%), nível educacional correspondente ao ensino médio (74,2%) e gravidez no último trimestre (86,4%). As gestantes (95,5%) predominaram em relação às puérperas (4,5%).

Considerando as gestantes, duas (3%) apresentaram gravidez ectópica e sete (10,6%) tiveram o aborto como desfecho da gravidez, sendo um aborto terapêutico na 17a semana de gestação. Nas demais, a cesariana foi o principal desfecho do parto (71,2%), seguida do parto normal (15,1%) e parto instrumental com fórceps (6%). Em uma grávida, o parto foi gemelar com um nascimento por via vaginal e outro por cesariana. Nenhuma dessas características maternas apresentou resultado estatisticamente significativo.

Na amostra estudada, identificaram-se 12 (18,2%) mulheres com NMM, o que corresponde à razão de NMM de 34/1.000 NV, em referência aos 354 nascimentos na instituição em 2017. Verificou-se uma (1,51%) morte materna no puerpério decorrente de eclâmpsia grave e síndrome de HELLP, o que representa a razão 12:1 de eventos de NMM por morte materna. O resumo de dados das mulheres com MMG/NMM pode ser visualizado na Tabela 1.

Tabela 1-
Resumo dos dados das mulheres com morbidade grave segundo os critérios utilizados no estudo. Maternidade pública terciária (n=66). Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, 2017

As complicações graves prevalentes foram a pré-eclâmpsia grave (77,3%), hemorragia pós-parto (18,2%) e sepse (10,6%), com associação estatística significativa para o desfecho MMG/NMM pelo teste χ2. Contudo, a força de associação pelos testes V de Cramer e Phi foi fraca para pré-eclâmpsia grave, hemorragia pós-parto e sepse, e moderada para outras complicações graves relacionadas com procedimentos cirúrgicos.

Quanto às intervenções críticas frequentes, a transfusão sanguínea (27,3%), admissão em UTI (15,2%) e cirurgia abdominal de emergência (10,6%) também foram estatisticamente significantes pelo teste χ2. A força de associação foi moderada para admissão em UTI e fraca para transfusão sanguínea e cirurgia abdominal de emergência.

A probabilidade de desfecho materno grave tende aumentar com a ocorrência de hemorragia pós-parto (RP= 3,21; IC 95% 1,22 - 8,41) e transfusões sanguíneas (RP= 3,60; IC 95% 1,81 - 7,16). Esse desfecho foi menos provável na pré-eclâmpsia grave (RP= 0,38; IC 95% 0,17 - 0,85) e quando ocorreram outras complicações graves decorrentes de intervenções cirúrgicas (RP= 0,58; IC 95% 0,36 - 0,94). As variáveis sepse, admissão em UTI e cirurgia abdominal de emergência foram estatisticamente significativas pelo teste χ2, mas o intervalo de confiança apresentou elevada amplitude e ocasionou imprecisão quanto aos seus efeitos no desfecho. Esses dados podem ser visualizados na Tabela 2.

Tabela 2-
Complicações obstétricas graves e intervenções críticas nas mulheres com morbidade grave e near miss materno. Maternidade pública terciária. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, 2017

Em consideração à fase qualitativa deste estudo misto, participaram sete enfermeiras e seis médicas, sendo 11 delas do sexo feminino e dois de sexo masculino. Em face dessa distribuição por sexo, esses profissionais são aqui designados pelo gênero feminino.

As participantes são especializadas na área de obstetrícia, com exceção de uma enfermeira especialista em saúde mental; têm idade média de 44 anos, com predomínio daquelas (10) com 40 a 49 anos de idade; e tempo médio de 17 anos de trabalho na maternidade, com variação de 5 a 25 anos. Todas são servidoras públicas, integram a equipe staff da instituição e exercem preceptoria de acadêmicos e residentes de medicina e enfermagem.

A análise de conteúdo temática possibilitou a construção do tema “Fatores do processo assistencial associados com a morbidade materna grave”, que contempla quatro subtemas que estão apresentados no Quadro 1.

Quadro 1-
Tema e subtemas do estudo segundo o percentual das respectivas unidades de registro. (n=187)

As deficiências no sistema de saúde emergiram nas falas das enfermeiras e médicas como um dos fatores envolvidos na MMG e abrangem as condições operacionais inadequadas da rede pública de saúde diante da deficiência de recursos financeiros e materiais, das precárias condições de trabalho dos profissionais e da limitada integração e coordenação dos serviços. As participantes descreveram um cenário de crise nesse sistema de saúde, que desencadeia demoras no atendimento das gestantes de risco, como expressam os depoimentos:

O que eu percebo é uma falha na comunicação da rede, que tem serviços primários, secundários, terciários, e há uma falta de integração na rede, de comunicação e seguimento do cuidado [...]. Eu acho que a desarticulação dessa rede é o que mais chama atenção. (Enfermeira E9)

Eu acho [que] a rede [de saúde] é totalmente inadequada... não consegue funcionar adequadamente por questões políticas, econômicas e burocráticas. O estado [do Rio de Janeiro] entrou em crise e o município também [...] os profissionais não recebem seus salários, e aí temos uma situação completamente inadequada [...]. (Enfermeira E4)

Eu acho que o crítico hoje é realmente essa situação da saúde com tudo o que estamos vivendo, essa questão de recursos escassos mesmo, escassez de funcionários, muitas unidades fechando, e aí tem aquelas que ficam sobrecarregadas. Há essa questão do SISREG [Sistema Nacional de Regulação] e você fica dependendo dele para referenciar para os especialistas. Então, acho que isso também dificulta um pouco. (Enfermeira E10)

Para as participantes, a baixa qualidade da assistência primária e hospitalar foi outro fator do processo assistencial relacionado com a MMG, pois relatam inadequações na assistência pré-natal e ao parto, como o alto rodízio de profissionais nos serviços, uso de intervenções desnecessárias e condutas inapropriadas, que causam atrasos no recebimento e prejudicam a qualidade dos cuidados especializados e de emergência.

Hoje em dia, essas pacientes têm um acesso fácil para o pré-natal, só que a qualidade do pré-natal, de uma certa maneira, não está boa no Rio de Janeiro, porque há uma alta rotatividade de profissionais geralmente. Eu falo de enfermeiros e médicos que fazem pré-natal e, com isso, você tem uma fragilidade na assistência. De uma maneira geral, no parto são as intervenções desnecessárias [...]. Outro fator, a cesariana aumenta o risco de morbidade e de infecção, por aí vai. (Médica E13)

[...] quando a gestante tem acesso, já está com idade gestacional mais avançada por não ter sido detectado o risco precocemente [...]. E chega aqui já naquele estado de agravamento e vai direito para a UCE, piora e vai para a UTI. Então, às vezes, [...] ela chega de um serviço que o profissional não tem muita experiência no atendimento do alto risco, e aí vai agravando. (Enfermeira E3)

As profissionais entrevistadas acreditam que a inadequada capacitação profissional também colabora para o desfecho MMG, por envolver deficiências no conhecimento e nas habilidades do profissional em reconhecer o risco e realizar intervenções e manejos de emergência para as gestantes de risco.

Tem muitas equipes de profissionais de saúde de medicina preventiva, mas que não têm o conhecimento. Se eles tivessem um treinamento adequado, poderiam identificar melhor quais são as pacientes de risco e encaminhá-las para um serviço secundário ou terciário [...], ter pelo menos um treinamento para o reconhecimento desse risco vai melhorar e impactar ainda mais na qualidade em relação ao pré-natal. (Médica E8)

Há falta de assistência adequada ao parto porque na emergência obstétrica você tem que corrigir rapidamente. Aquelas primeiras horas são super importantes. Acho que há falta de qualificação dos profissionais principalmente. A maior parte das mortes maternas poderiam ser evitadas com bom acompanhamento médico. Eu acho que o principal fator é esse. (Médica E6)

A baixa condição socioeconômica materna foi destacada pelas participantes como contribuinte para a ocorrência da MMG em face de as dificuldades de locomoção, recursos e suporte social e intrafamiliar das gestantes restringirem o acesso aos cuidados de saúde e a continuidade do processo assistencial.

Muitas mulheres moram longe da cidade do Rio de Janeiro e têm essa dificuldade de locomoção, que também é dificultada mais ainda pelos problemas financeiros e com quem deixar os seus filhos. (Enfermeira E1)

Elas [gestantes] são muito mais vulneráveis. No pré-natal, muitas vezes, a questão é que elas são referenciadas para [assistência de] alto risco e é longe do domicílio. Elas têm problemas sociais graves. Então, [...] elas não têm condições financeiras de comparecer [na unidade pré-natal de risco]. Então, temos muitas internações sociais para tentar realmente resolver o que no nível ambulatorial não se consegue. (Médica E11)

A dificuldade de acesso à saúde reprodutiva emergiu nas falas das participantes e engloba situações que contribuem para a ocorrência da MMG, relacionadas com as barreiras à prevenção da gravidez não planejada e o aborto inseguro, peregrinação das gestantes pelos serviços e deficiência na disponibilidade e regulação dos leitos de UTI materna no sistema de saúde.

Na minha opinião, o principal fator é a gravidez não planejada [...] porque aqui no Brasil temos um número alto de aborto não previsto em lei. [...] Em muitos casos, é um fator importante. Então, isso está no planejamento familiar, da gravidez não programada e na educação do povo de uma maneira geral. (Médica E12)

[...] essa questão da peregrinação das pacientes que sabemos que existe [...], porque, às vezes, não conseguem ter acesso à rede [de saúde] ou começar o pré-natal, depois migram para outra unidade de saúde e ficam meio que perdidas ou, às vezes, aguardam uma transferência para o hospital. (Enfermeira E10)

Leito de UTI é um grande problema no país como um todo. Já ocorreram situações da gente precisar e não conseguir. Aí, tem que pedir via regulação de vagas. Em outros momentos, conseguimos aqui mesmo. Então, o fato de ter UTI aqui [no hospital de ensino] não quer dizer que vamos conseguir a vaga no momento que precisamos. (Médica E11)

DISCUSSÃO

As complicações obstétricas diagnosticadas tardiamente e tratadas de forma inadequada resultam em situações perigosas e ameaçadoras à vida das mulheres, sobretudo em contexto de pobreza, inequidade social e deficiências na rede de atenção à saúde. A desigualdade social impacta no estado de saúde da população em geral, mas tem afeta particularmente as mulheres devido às iniquidades associadas ao gênero que, por vezes, se sobrepõem às desigualdades raciais, e ambas têm efeitos negativos e sinérgicos no acesso e nos resultados de saúde11. Mgawadere F, Unkels R, Kazembe A, van den Broek N. Factors associated with maternal mortality in Malawi: application of the three delays model. BMC Pregnancy Childbirth. 2017;17(1):219. doi: https://doi.org/10.1186/s12884-017-1406-5
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-55. World Health Organization. Evaluating the quality of care for severe pregnancy complications - The WHO near-miss approach for maternal health[Internet]. Geneva: WHO; 2011 [cited 2021 Mar 5]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/44692/9789241502221_eng.pdf;jsessionid=79A12B5B52EAE7B7D067820ADE185362?sequence=1
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.

No presente estudo, as características maternas não apresentaram associação com o desfecho de gravidade estudado. Entretanto, os depoimentos das médicas e enfermeiras esclarecem o perfil das gestantes atendidas na UCE da maternidade e revelam que algumas mulheres têm baixo status socioeconômico, dificuldades em delegar os cuidados com os filhos para buscar ou dar seguimento ao atendimento, e limitações para o custeio do transporte até o serviço de saúde por residirem em locais distanciados da unidade de referência. Essas dificuldades estão relacionadas com a primeira e a segunda demora e sugerem barreiras na tomada de decisão da mulher para buscar o serviço e restrições no acesso à unidade de saúde. Portanto, as vulnerabilidades sociais e as barreiras de acesso aos serviços de saúde podem aumentar o risco de desfechos adversos11. Mgawadere F, Unkels R, Kazembe A, van den Broek N. Factors associated with maternal mortality in Malawi: application of the three delays model. BMC Pregnancy Childbirth. 2017;17(1):219. doi: https://doi.org/10.1186/s12884-017-1406-5
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,1212. Domingues RMSM, Dias MAB, Schilithz AOC, Leal MC. Factors associated with maternal near miss in childbirth and the postpartum period: findings from the birth in Brazil National Survey, 2011-2012. Reprod Health. 2016;13(Suppl 3):115. doi: https://doi.org/10.1186/s12978-016-0232-y
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O Brasil dispõe de cobertura pré-natal quase universal, acima de 98%, porém a dificuldade de realização do mínimo preconizado de seis consultas até o termo da gravidez aumenta o risco de NMM33. Lima THB, Amorim MM, Buainain Kassar S, Katz L. Maternal near miss determinants at a maternity hospital for high-risk pregnancy in northeastern Brazil: a prospective study. BMC Pregnancy Childbirth. 2019;19(1):271. doi: https://doi.org/10.1186/s12884-019-2381-9
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. Este risco de NMM é ampliado quando há peregrinação da grávida por dois ou mais hospitais para assistência ao parto1212. Domingues RMSM, Dias MAB, Schilithz AOC, Leal MC. Factors associated with maternal near miss in childbirth and the postpartum period: findings from the birth in Brazil National Survey, 2011-2012. Reprod Health. 2016;13(Suppl 3):115. doi: https://doi.org/10.1186/s12978-016-0232-y
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. O atraso no atendimento obstétrico causa desfechos maternos graves, sendo este observado em 53,9% das mulheres que tiveram MMG e vieram a óbito em 27 hospitais brasileiros. No grupo com NMM, a prevalência de atrasos foi acima de 68%22. Pacagnella RC, Cecatti JG, Parpinelli MA, Sousa MH, Haddad SM, Costa ML, et al. Delays in receiving obstetric care and poor maternal outcomes: results from a national multicentre cross-sectional study. BMC Pregnancy Childbirth. 2014;14:159. doi: https://doi.org/10.1186/1471-2393-14-159
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. As dificuldades no encaminhamento e na transferência das gestantes são as principais barreiras para a obtenção de cuidados de emergência22. Pacagnella RC, Cecatti JG, Parpinelli MA, Sousa MH, Haddad SM, Costa ML, et al. Delays in receiving obstetric care and poor maternal outcomes: results from a national multicentre cross-sectional study. BMC Pregnancy Childbirth. 2014;14:159. doi: https://doi.org/10.1186/1471-2393-14-159
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,1313. Monte AS, Mendes IC, Oriá MOB, Carvalho FHC, Brown H, Damasceno AKC. Near miss maternal: influencing factors and guidelines for reducing maternal morbidity and mortality. Rev Rene. 2018;19:e3182. doi: https://doi.org/10.15253/2175-6783.2018193182
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, como apontaram as enfermeiras e médicas participantes do estudo.

As demoras aumentam o risco de complicações associadas com MMG/NMM. Na amostra aqui estudada, observou-se que a pré-eclâmpsia grave foi a mais prevalente (77,3%), seguida da hemorragia pós-parto, eclâmpsia e sepse. As condições hipertensivas são mais frequentes nas mulheres com MMG no Brasil, correspondendo a 67% dos casos22. Pacagnella RC, Cecatti JG, Parpinelli MA, Sousa MH, Haddad SM, Costa ML, et al. Delays in receiving obstetric care and poor maternal outcomes: results from a national multicentre cross-sectional study. BMC Pregnancy Childbirth. 2014;14:159. doi: https://doi.org/10.1186/1471-2393-14-159
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,1313. Monte AS, Mendes IC, Oriá MOB, Carvalho FHC, Brown H, Damasceno AKC. Near miss maternal: influencing factors and guidelines for reducing maternal morbidity and mortality. Rev Rene. 2018;19:e3182. doi: https://doi.org/10.15253/2175-6783.2018193182
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. Em âmbito internacional, a hemorragia tende a predominar sobre os distúrbios hipertensivos da gravidez e a sepse11. Mgawadere F, Unkels R, Kazembe A, van den Broek N. Factors associated with maternal mortality in Malawi: application of the three delays model. BMC Pregnancy Childbirth. 2017;17(1):219. doi: https://doi.org/10.1186/s12884-017-1406-5
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,99. Geller SE, Rosenberg D, Cox S, Brown M, Simonson L, Kilpatrick S. A scoring system identified near-miss maternal morbidity during pregnancy. J Clin Epidemiol. 2004;57(7):716-20. doi: https://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2004.01.003
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,1313. Monte AS, Mendes IC, Oriá MOB, Carvalho FHC, Brown H, Damasceno AKC. Near miss maternal: influencing factors and guidelines for reducing maternal morbidity and mortality. Rev Rene. 2018;19:e3182. doi: https://doi.org/10.15253/2175-6783.2018193182
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.

Em consideração aos casos de NMM, revisão sistemática verificou que a hemorragia foi a causa mais relatada nos estudos, sendo um importante fator de risco para ocorrências graves1313. Monte AS, Mendes IC, Oriá MOB, Carvalho FHC, Brown H, Damasceno AKC. Near miss maternal: influencing factors and guidelines for reducing maternal morbidity and mortality. Rev Rene. 2018;19:e3182. doi: https://doi.org/10.15253/2175-6783.2018193182
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. Portanto, frente a uma complicação obstétrica, espera-se que a gestante receba cuidados adequados e oportunos para a prevenção dos desfechos negativos. Em contraste, quando a mulher está diante da terceira demora no atendimento de emergência, ela encontra oferta insuficiente de serviços e baixa qualidade assistencial11. Mgawadere F, Unkels R, Kazembe A, van den Broek N. Factors associated with maternal mortality in Malawi: application of the three delays model. BMC Pregnancy Childbirth. 2017;17(1):219. doi: https://doi.org/10.1186/s12884-017-1406-5
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-22. Pacagnella RC, Cecatti JG, Parpinelli MA, Sousa MH, Haddad SM, Costa ML, et al. Delays in receiving obstetric care and poor maternal outcomes: results from a national multicentre cross-sectional study. BMC Pregnancy Childbirth. 2014;14:159. doi: https://doi.org/10.1186/1471-2393-14-159
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.

O atraso referente à baixa qualidade da assistência no nível terciário é proeminente nos desfechos maternos graves e as falhas do pessoal de saúde são o ponto-chave da inadequação dos cuidados maternos. Por outro lado, a terceira demora é multifatorial e contempla as deficiências do sistema de saúde, como déficit orçamentário; falta de suprimentos, insumos e pessoal; problemas de logística; baixa competência técnica dos profissionais, entre outros11. Mgawadere F, Unkels R, Kazembe A, van den Broek N. Factors associated with maternal mortality in Malawi: application of the three delays model. BMC Pregnancy Childbirth. 2017;17(1):219. doi: https://doi.org/10.1186/s12884-017-1406-5
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-22. Pacagnella RC, Cecatti JG, Parpinelli MA, Sousa MH, Haddad SM, Costa ML, et al. Delays in receiving obstetric care and poor maternal outcomes: results from a national multicentre cross-sectional study. BMC Pregnancy Childbirth. 2014;14:159. doi: https://doi.org/10.1186/1471-2393-14-159
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,1414. García-Tizón Larroca S, Amor Valera F, Ayuso Herrera E, Cueto Hernandez I, Cuñarro Lopes Y, De Leon-Luis J. Human development index of the maternal country of origin and its relationship with maternal near miss: a systematic review of the literature. BMC Pregnancy Childbirth. 2020;20(1):224. doi: https://doi.org/10.1186/s12884-020-02901-3
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. Alguns desses fatores foram apontados como influentes nas falhas do processo assistencial pelas médicas e enfermeiras.

Considerando esses fatores envolvidos na terceira demora, a clientela atendida na maternidade terciária parece ter sido particularmente afetada pelo contexto de crise do sistema de saúde local, segundo as profissionais entrevistadas. A política de austeridade fiscal tende a prejudicar o desempenho do sistema de saúde e causar retração na provisão de serviços, com queda de cobertura na atenção primária, produção ambulatorial, internações totais, número de leitos e cirurgias realizadas, assim como aumento do tempo de espera para ambulâncias, exames e consultas ambulatoriais1515. O'Dwyer G, Graever L, Britto FA, Menezes T, Konder MT. Financial crisis and healthcare: the case of the municipality of Rio de Janeiro, Brazil. Ciênc Saúde Colet. 2019;24(12):4555-68. doi: https://doi.org/10.1590/1413-812320182412.23212019
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.

Apesar da impossibilidade de comparar os dados aqui descritos com os resultados de estudos prospectivos e de base populacional, a razão de NMM de 34/1000 NV e a razão 12:1 de eventos de near miss por morte materna na instituição estudada têm correspondência com os indicadores encontrados em estudos oriundos de hospitais da região Nordeste do Brasil33. Lima THB, Amorim MM, Buainain Kassar S, Katz L. Maternal near miss determinants at a maternity hospital for high-risk pregnancy in northeastern Brazil: a prospective study. BMC Pregnancy Childbirth. 2019;19(1):271. doi: https://doi.org/10.1186/s12884-019-2381-9
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-44. Rosendo TM, Roncalli AG. Near miss materno e iniquidades em saúde: análise de determinantes contextuais no Rio Grande do Norte, Brasil. Ciênc Saúde Colet. 2016;21(1):191-201. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232015211.20802014
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. Contudo, esses indicadores são mais elevados que os observados em maternidades de referência no país22. Pacagnella RC, Cecatti JG, Parpinelli MA, Sousa MH, Haddad SM, Costa ML, et al. Delays in receiving obstetric care and poor maternal outcomes: results from a national multicentre cross-sectional study. BMC Pregnancy Childbirth. 2014;14:159. doi: https://doi.org/10.1186/1471-2393-14-159
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, sugerindo a possibilidade de o contexto de crise no sistema de saúde local exercer efeitos negativos no processo assistencial das gestantes e aumentar o risco de desfechos maternos graves, o que deve ser objeto de investigação.

O presente estudo misto elucida as demoras consequentes das deficiências do sistema de saúde, inclusive com a referência e regulação de vagas para leitos de UTI para as grávidas com MMG, como expuseram as profissionais entrevistadas. Em âmbito nacional, sabe-se que há limitações na oferta de leitos e profissionais especializados em UTI em relação às demandas de internações no país1616. Soares FM, Guida JP, Pacagnella RC, Souza JP, Parpinelli MA, Haddad SM, et al. Use of intensive care unit in women with severe maternal morbidity and maternal death: results from a national multicenter study. Rev Bras Ginecol Obstet. 2020;42(3):124-32. doi: https://doi.org/10.1055/s-0040-1708095
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, assim como fragilidades no sistema de regulação de vagas em alguns municípios pelas falhas nos critérios de encaminhamento dos pacientes, pouca disponibilidade de leitos, dificuldades no fluxo de informações entre a atenção primária e a regulação de vagas, entre outros entraves1717. Bastos LBR, Barbosa MA, Rosso CFW, Oliveira LMAC, Ferreira IP, Bastos DAS, et al. Practices and challenges on coordinating the Brazilian Unified Health System. Rev Saude Publica. 2020;54:25. doi: https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2020054001512
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. No entanto, as mulheres com MMG requerem cuidados mais complexos e, na vigência de disfunção e falência de órgãos, o tratamento em UTI pode representar a diferença entre sobrevivência e morte.

Outro problema subjacente às condições obstétricas associadas com a MMG é o aborto, cujas repercussões foram mencionadas nos depoimentos das médicas e enfermeiras. Estima-se que cerca de 9% das internações hospitalares por aborto seja seguida de um evento de NMM e que aproximadamente 1,5% dos casos terminem em óbito1818. Calvert C, Owolabi OO, Yeung F, Pittrof R, Ganatra B, Tunçalp Ö, et al. The magnitude and severity of abortion-related morbidity in settings with limited access to abortion services: a systematic review and meta-regression. BMJ Glob Health. 2018;3(3):e000692. doi: https://doi.org/10.1136/bmjgh-2017-000692
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. Diante disso, ressalta-se a urgência da implementação de ações em saúde reprodutiva, com vistas à redução da MMG e das mortes relacionadas com a gravidez indesejada ou não planejada1919. Zanatta LF, Grein MI, Álvarez-Dardet C, Moraes SP, Brêtas JRS, Ruiz-Cantero MT, et al. Gender equality: why is Brazil moving backwards? Cad Saúde Pública. 2016;32(8):e00089616. doi: https://doi.org/10.1590/0102-311X00089616
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Apesar de o aborto ser relevante na morbimortalidade materna no país, há discursos e iniciativas pautadas em moralidades conservadoras e contrárias às políticas baseadas na equidade de gênero e direitos sexuais e reprodutivos, que podem colocar em risco os avanços alcançados nas últimas décadas e impor barreiras aos programas de prevenção da gravidez não planejada e abortamento inseguro, assim como às ações destinadas à garantia dos direitos das mulheres, inclusive ao aborto legal1919. Zanatta LF, Grein MI, Álvarez-Dardet C, Moraes SP, Brêtas JRS, Ruiz-Cantero MT, et al. Gender equality: why is Brazil moving backwards? Cad Saúde Pública. 2016;32(8):e00089616. doi: https://doi.org/10.1590/0102-311X00089616
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Além destes problemas estruturais e políticos na atenção à saúde, o estudo aqui descrito encontrou associação estatística significativa entre o desfecho estudado e as complicações obstétricas relacionadas com intervenções cirúrgicas, a exemplo daquelas consequentes de hematoma de parede, perfuração de alça de duodeno e deiscência de histerorrafia, denotando que os eventos adversos da assistência podem corroborar para desfechos negativos. Ao considerar que a maternidade terciária estudada integra um hospital de ensino, a ocorrência desses eventos demanda melhorias na segurança da assistência, capacitação da equipe e supervisão do pessoal de saúde em formação, como os médicos e enfermeiras residentes, a fim de reduzir danos resultantes dos procedimentos operatórios.

A qualidade da assistência hospitalar é um fator essencial para o êxito dos resultados de saúde. A inexperiência e a inadequada capacitação profissional contribuem para os desfechos de gravidade relacionados com a assistência materna de emergência11. Mgawadere F, Unkels R, Kazembe A, van den Broek N. Factors associated with maternal mortality in Malawi: application of the three delays model. BMC Pregnancy Childbirth. 2017;17(1):219. doi: https://doi.org/10.1186/s12884-017-1406-5
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-22. Pacagnella RC, Cecatti JG, Parpinelli MA, Sousa MH, Haddad SM, Costa ML, et al. Delays in receiving obstetric care and poor maternal outcomes: results from a national multicentre cross-sectional study. BMC Pregnancy Childbirth. 2014;14:159. doi: https://doi.org/10.1186/1471-2393-14-159
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. Os problemas de ordem profissional estão envolvidos em 40% das intercorrências obstétricas e corroboram a baixa qualidade da atenção hospitalar, como a falta de habilidade técnica; diagnósticos tardios; condutas inadequadas e baixa adesão aos protocolos assistenciais. A disponibilidade, as habilidades e as atitudes do pessoal de saúde são reconhecidas como as principais barreiras à adequação dos cuidados de emergência2020. Hussein J, Hirose A, Owolabi O, Imamura M, Kanguru L, Okonofua F. Maternal death and obstetric care audits in Nigeria: a systematic review of barriers and enabling factors in the provision of emergency care. Reprod Health. 2016;13:47. doi: https://doi.org/10.1186/s12978-016-0158-4
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.

Portanto, um conjunto de fatores maternos, da assistência e do sistema de saúde está envolvido nas três demoras e parece atuar de forma sinérgica nas inadequações do processo assistencial relativo à ocorrência de MMG e NMM, que aqui se revelaram como os atrasos derivados das baixas condições sociais maternas, barreiras no acesso ao serviço de saúde e as fragilidades na qualidade dos cuidados às gestantes no nível primário e hospitalar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A vida das mulheres grávidas deve ser uma prioridade da sociedade e das políticas públicas, assim como uma preocupação de todos os atores e segmentos envolvidos na área de saúde. Nesse sentido, recomendam-se esforços para a melhoria da rede de atenção à saúde; qualificação da atenção primária para diagnóstico e intervenção oportunos dos riscos maternos; melhoria das ações em saúde sexual e reprodutiva; ampliação e qualificação dos serviços de referência para gestantes de risco; aumento da oferta e garantia da internação em leitos de UTI; e capacitação profissional para assistência de emergência em obstetrícia.

Indica-se, também, a sensibilização de gestores, gerentes e profissionais de saúde, juntamente dos docentes e discentes da enfermagem e medicina, para serem ativos na busca de estratégias de redução das demoras nas oportunidades de assistência à saúde, e dedicarem esforços para o avanço na qualidade e segurança dos cuidados obstétricos e de emergência às gestantes com complicações associadas à MMG.

Por fim, salienta-se que os resultados aqui descritos devem ser contemplados com cautela e dentro dos limites impostos pelo desenho metodológico e pelas análises baseadas em registros de uma pequena amostra de mulheres com MMG e perspectivas de profissionais oriundos de um único serviço de referência. Apontam-se também os limites do estudo decorrentes da ausência dos dados quanto ao número de consultas pré-natal, o que impossibilitou verificar as possíveis associações com o desfecho MMG na amostra estudada.

Apesar destas limitações, o estudo misto foi capaz de lançar luz sobre os fatores que contribuem para a ocorrência dos desfechos maternos graves, bem como elucidar alguns desafios e pontos críticos do sistema de saúde, em confluência com o contexto vigente que busca restringir os direitos à saúde e reprodutivos das mulheres.

Agradecimento:

Agradecimento à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

REFERENCES

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Editado por

Editor associado:

Helga Geremias Gouveia

Editor-chefe:

Maria da Graça Oliveira Crossetti

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    08 Mar 2021
  • Aceito
    16 Nov 2021
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