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Motivos referidos pelos indivíduos que não estavam em lista de espera para o transplante renal

RESUMO

Objetivo:

Descrever os motivos referidos pelos indivíduos em hemodiálise que não estavam cadastrados em lista de espera para o transplante renal.

Métodos:

Estudo transversal realizado no Rio Grande do Sul, Brasil em seis serviços de terapia de substituição renal com 214 indivíduos em hemodiálise que referiram os motivos de não estarem cadastrados em lista de espera para o transplante renal. A coleta de dados foi realizada por meio de questionário entre março de 2016 e março de 2017. Para a análise estatística descritiva e do teste de independência, utilizou-se o software Stata.

Resultados:

Os principais motivos referidos pelos 214 indivíduos que não estavam cadastrados em lista de espera para o transplante renal foram: a falta de informação dos indivíduos, não desejar estar em lista, o impedimento por multimorbidade e a idade.

Conclusões:

A falta de informação apresentou associação com as variáveis baixa escolaridade, sexo masculino, ≤ 5 anos de tempo de diagnóstico e ≤ 5 anos em terapia de substituição renal. O motivo não desejar estar em lista esteve associado com as variáveis não saber ler e idade.

Palavras-chave:
Transplante de rim; Listas de espera; Diálise

ABSTRACT

Objective:

To describe the reasons reported by individuals in hemodialysis that were not registered on kidney transplantation waiting lists.

Methods:

Cross-sectional study conducted in six renal replacement therapy services in Rio Grande do Sul, Brazil with 214 individuals undergoing hemodialysis who reported the reasons for not being registered on kidney transplantation waiting lists. The data collection was carried out through a questionnaire from March 2016 to March 2017. The Stata software was used to the statistical analysis and independence test.

Results:

The main reasons reported by the 214 individuals who were not registered on kidney transplantation waiting lists were due to the lack of information of the individuals, not wanting to be on list, due to morbidities and age.

Conclusions:

The lack of information was associated with the variables low education, male, ≤ 5 years of time since diagnosis and ≤ 5 years in renal replacement therapy. The reason for not wanting to be on the list was associated with the variables illiteracy and age.

Keywords:
Kidney transplantation; Waiting lists; Dialysis

RESUMEN

Objetivo:

Describir las razones informadas por personas en hemodiálisis que no estaban registradas en lista de espera para trasplante renal.

Métodos:

Estudio transversal realizado en Rio Grande do Sul, Brasil en seis servicios de terapia sustitutiva renal con 214 individuos en hemodiálisis que informaron los motivos de no estar registrados en listade espera para trasplante renal. La recolección de datos se realizó mediante un cuestionario entre marzo de 2016 y marzo de 2017. Para el análisis estadístico descriptivo y test de independencia se utilizó el software Stata.

Resultados:

Las principales razones reportadas por las 214 personas que no estaban inscritas en listade espera para trasplante renal fueron la falta de información de las personas, no querer estar en lista, impedimento por multimorbilidad y edad.

Conclusiones:

La falta de información se asoció con las variables baja escolaridad, género masculino, ≤ 5 años de tiempo desde el diagnóstico y ≤ 5 años en terapia de reemplazo renal. El motivo de no querer estar en la lista estuvo asociado a las variables no saber leer y edad.

Palabras clave:
Trasplante de riñón; Listas de espera; Diálisis

INTRODUÇÃO

A Doença Renal Crônica (DRC) está associada a altos riscos de mortalidade, baixa qualidade de vida e excessivos custos ao sistema de saúde11. Chan CT, Blankestijn PJ, Dember LM, Gallieni M, Harris DCH, Lok CE, et al. Dialysis initiation, modality choice, access, and prescription: conclusions from a Kidney Disease: Improving Global Outcomes (KDIGO) controversies conference. Kidney Int. 2019;96(1):37-47. doi: http://doi.org/10.1016/j.kint.2019.01.017.
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-22. Chadban SJ, Ahn C, Axelrod DA, Foster BJ, Kasiske BL, Kher V, Kumar D, et al. KDIGO clinical practice guideline on the evaluation and management of candidates for kidney transplantation. Transplantation. 2020;104(4):S11-S103.doi: http://doi.org/10.1097/TP.0000000000003136.
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. Estima-se que a mortalidade global por DRC poderá chegar a 5 milhões ao ano, tornando-se a quinta principal causa de morte no mundo até 2040 e está fortemente ligada a doenças cardiovasculares e diabetes33. GBD 2019 Diseases and Injuries Collaborators. Global burden of 369 diseases and injuries in 204 countries and territories, 1990-2019: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2019. Lancet. 2020;396(10258):1204-22. doi: http://doi.org/10.1016/S0140-6736(20)30925-9.
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. Embora a maioria dos indivíduos com DRC em estágio final se submetam à diálise, o transplante renal é reconhecido como a melhor opção de terapia, visto que apresenta melhora dos resultados clínicos e da qualidade de vida44. Neves PDMM, Sesso RCC, Thomé FS, Lugon JR, Nascimento MM. Brazilian Dialysis Census: analysis of data from the 2009-2018 decade. Braz J Nephrol. 2020;42(2):191-200. doi: http://doi.org/10.1590/2175-8239-jbn-2019-0234.
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-77. Pruthi R, Robb LM, Oniscu GC, Tomson C, Bradley A, Forsythe JL, et al. Inequity in access to transplantation in the united kingdom. Clin JAm Soc Nephrol. 2020;15(6):830-42. doi: http://doi.org/10.2215/CJN.11460919.
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.

No Brasil, a situação não é diferente, sendo a hemodiálise a terapia de substituição renal (TSR) mais utilizada, abarcando cerca de 92% dos 133.464 indivíduos em diálise em 201844. Neves PDMM, Sesso RCC, Thomé FS, Lugon JR, Nascimento MM. Brazilian Dialysis Census: analysis of data from the 2009-2018 decade. Braz J Nephrol. 2020;42(2):191-200. doi: http://doi.org/10.1590/2175-8239-jbn-2019-0234.
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, dentre os quais 45% elegíveis para o transplante renal. Ademais, a cada ano estima-se o ingresso de 40 mil novos indivíduos em tratamento de diálise, projetando-se um contigente de 160 mil brasileiros em tratamento, em 2022. Enquanto que anualmente 28 mil indivíduos saem da diálise, sendo, 22 mil por óbitos e 6 mil por transplante renal. O tempo médio do paciente na diálise, à espera do transplante, é de seis anos88. Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares [Internet]. Ministro Marcos Pontes visita IPEN/CNEN com o objetivo de discutir projetos inovadores e estratégicos ao país. Brasília, DF: Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações; 2020 [cited 2020 Jan 16] Available from: Available from: https://www.ipen.br/portal_por/portal/interna.php?secao_id=38&campo=15092 .
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,99. Associação Brasileira de Transplante de Órgãos. Dados númericos da doação de órgãos e transplantes realizados por estado e instituição no período: janeiro/setembro 2021 [Internet]. São Paulo: Registro Brasileiro de Transplantes de Órgãos; 2021. [cited 2020 Jan 13]. Available from: Available from: https://site.abto.org.br/publicacao/xxvii-no-3/ .
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.

Cumpre mencionar que, no Brasil, o transplante renal é norteado por legislaçãoque determina que o Cadastro Técnico Único se dará na Central de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos pelo estabelecimento de saúde e/ou pela equipe responsável pelo seu atendimento1010. Ministério da Saúde (BR), Gabinete do Ministro. Portaria nº 2600, de 21 de outubro de 2009. Aprova o Regulamento Técnico do Sistema Nacional de Transplantes. Diário Oficial União. 2009 out 30 [cited 2022 Jan 13];148(208 Seção 1):77-118. Available from: Available from: https://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?data=30/10/2009&jornal=1&pagina=77&totalArquivos=264 .
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. O Sistema Nacional de Transplante, o responsável por todo o processo, é totalmente financiado pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Esse processo inclui duas etapas, a primeira é o cadastro nalista de espera e a segunda é constituída pela alocação de um órgão, sendo que até setembro de de 2021 haviam 26.413 brasileiros nessa lista99. Associação Brasileira de Transplante de Órgãos. Dados númericos da doação de órgãos e transplantes realizados por estado e instituição no período: janeiro/setembro 2021 [Internet]. São Paulo: Registro Brasileiro de Transplantes de Órgãos; 2021. [cited 2020 Jan 13]. Available from: Available from: https://site.abto.org.br/publicacao/xxvii-no-3/ .
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, o que representa 20% dos indivíduos em diálise.

Além disso, nota-se que há um elevado contingente de indivíduos elegíveis para lista de espera, mas que não se encontram cadastrados. Diversos fatores podem explicar esse comportamento, dentre eles existem variáveis demográficas, socioeconômicas e clínicas que influenciam o cadastro na lista de espera1111. Garcia-Garcia G, Tonelli M, Ibarra-Hernandez M, Chaves-Iñiguez JS, Oseguera-Vizcaino MC. Access to kidney transplantation in Mexico, 2007-2019: a call to end disparities in transplant care. BMC Nephrol. 2021;22(1):99. doi: http://doi.org/10.1186/s12882-021-02294-1.
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-1212. Baudelot C, Cailleé Y, Godechot O, Mercier S. Maladies rénales et inégalités sociales d’accès à la greffe en France. Population. 2016;71(1):23-51.doi: http://doi.org/10.3917/popu.1601.0023.
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. Sabe-se que a DRC está relacionada com fatores socialmente definidos como na população de baixo status socioeconômico, em vulnerabilidade social e minorias étnicas.Estes grupos carregam uma carga de doenças devido à coexistência de doenças transmissíveis e não transmissíveis, bem como a dificuldade de iniciar o tratamento em uma das TSR1313. Crews DC, Bello AK, Saadi G; World Kidney Day Steering Committee. Burden, access, and disparities in kidney disease [editorial comment]. Clin Kidney J. 2019;12(2):160-6. doi: http://doi.org/10.1093/ckj/sfy128.
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-1616. Pladys A, Morival C, Couchoud C, Jacquelinet C, Laurain E, Merle S, et al. Outcome-dependent geographic and individual variations in the access to renal transplantation in incident dialysed patients.Transpl Int. 2019;32(4):369-86. doi: http://doi.org/10.1111/tri.13376.
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.

Estudos apontam33. GBD 2019 Diseases and Injuries Collaborators. Global burden of 369 diseases and injuries in 204 countries and territories, 1990-2019: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2019. Lancet. 2020;396(10258):1204-22. doi: http://doi.org/10.1016/S0140-6736(20)30925-9.
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-77. Pruthi R, Robb LM, Oniscu GC, Tomson C, Bradley A, Forsythe JL, et al. Inequity in access to transplantation in the united kingdom. Clin JAm Soc Nephrol. 2020;15(6):830-42. doi: http://doi.org/10.2215/CJN.11460919.
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que mesmo com a existência de um sistema de saúde universal é evidente a desigualdade no acesso a lista de espera para o transplante renal77. Pruthi R, Robb LM, Oniscu GC, Tomson C, Bradley A, Forsythe JL, et al. Inequity in access to transplantation in the united kingdom. Clin JAm Soc Nephrol. 2020;15(6):830-42. doi: http://doi.org/10.2215/CJN.11460919.
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, inclusive nas diferentes regiões de um país66. Majoni SW, Dole K, Hughes JT, Pain C. Review of current pathways to wait-listing for kidney transplantation for Aboriginal and Torres Strait Islander peoples with end-stage kidney disease in the Top End of Northern Australia. Aust Health Rev. 2020;45(2):185-93. doi: https://doi.org/10.1071/AH20011.
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-77. Pruthi R, Robb LM, Oniscu GC, Tomson C, Bradley A, Forsythe JL, et al. Inequity in access to transplantation in the united kingdom. Clin JAm Soc Nephrol. 2020;15(6):830-42. doi: http://doi.org/10.2215/CJN.11460919.
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,1111. Garcia-Garcia G, Tonelli M, Ibarra-Hernandez M, Chaves-Iñiguez JS, Oseguera-Vizcaino MC. Access to kidney transplantation in Mexico, 2007-2019: a call to end disparities in transplant care. BMC Nephrol. 2021;22(1):99. doi: http://doi.org/10.1186/s12882-021-02294-1.
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-1616. Pladys A, Morival C, Couchoud C, Jacquelinet C, Laurain E, Merle S, et al. Outcome-dependent geographic and individual variations in the access to renal transplantation in incident dialysed patients.Transpl Int. 2019;32(4):369-86. doi: http://doi.org/10.1111/tri.13376.
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. Logo, ressalta-se a necessidade de desenvolver estudos regionais no que tange aos motivos pelos quais os indivíduos não estão cadastrados em lista de espera para o transplante renal. Neste contexto, o que motivou o desenvolvimento desse estudo foi a importância elucidar os motivos referidos pelos indivíduos que não estão em lista de espera para o transplante renal na Metade Sul do Rio Grande do Sul.

Assim sendo, o presente estudoteve como objetivo descrever os motivos referidos pelos indivíduos em hemodiálise que não estavam cadastrados em lista de espera para o transplante.

MÉTODO

Trata-se de estudo transversal de amostragem não probabilística por conveniência oriundo da pesquisa “Atenção à saúde nos serviços de terapia renal substitutiva da Metade Sul do Rio Grande do Sul” e “Empoderamento e autonomia para pessoas dos serviços de terapia renal da Metade Sul do Rio Grande do Sul”.

A coleta de dados da pesquisa ocorreu entre março de 2016 e março de 2017 em seis serviços de terapia de substituição renal (STSR) localizados em cinco municípios (Pelotas, Rio Grande, Uruguaiana, Alegrete e São Lourenço do Sul) pertencentes à Metade Sul do Rio Grande do Sul, Brasil. Cabe destacar que nenhum destes STSR possuia um centro de transplante. Todos os indivíduos em hemodiálise são encaminhados aos centros transplantadores de outros municípios, principalmente, para a capital (Porto Alegre).

A amostragem não probabilística por conveniência foi composta por todos os indivíduos que estavam em tratamento hemodialítico nos seis STSR com idade ≥18 anos, apresentando capacidade cognitiva e comunicação verbal preservadas e legalmente aptos para estar em lista de espera. Foram excluídos os indivíduos que não faziam parte do STSR, como casos de diálise de urgência, em trânsito, em condição aguda ou hospitalização e sem condições cognitivas e de comunicação.

Previamente ao início da coleta de dados deste estudo, ocorreu a aplicação do teste- piloto. A aplicação do teste-piloto resultouem encontros com os pesquisadores e assessoria estatística, revisãoe alteração do questionário, padronização dos procedimentos de coleta e capacitação da equipe de coleta.Os dados do teste-piloto não compuseram o banco de dados.

As entrevistas ocorreram durante as sessões de hemodiálise com o uso de questionário aplicado por seis coletadores (bolsistas de graduação e pós-graduação em enfermagem) capacitados e as informações complementadas com análise do prontuário. O tempo médio de aplicação de cada questionário foi de 20 minutos. Foi assegurada a confidencialidade dos dados e privacidade dos participantes e estes aceitaram participar mediante a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido(TCLE).

As variáveis para compor este artigo, assim como a forma de tratamento dos dados, foram determinadas com base em estudos sobre terapia de substituição renal recentes1616. Pladys A, Morival C, Couchoud C, Jacquelinet C, Laurain E, Merle S, et al. Outcome-dependent geographic and individual variations in the access to renal transplantation in incident dialysed patients.Transpl Int. 2019;32(4):369-86. doi: http://doi.org/10.1111/tri.13376.
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-1919. Farah SS, Alhaji MM, Ahmed D, Alam S, Johan NH, Zulkipli IN, et al. Barriers to kidney transplantation as a choice of renal replacement therapy. Transplant Proc. 2018;50(10):3165-71. doi: http://doi.org/10.1016/j.transproceed.2018.07.005.
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. Sendo selecionadas as variáveis idade (≥18-39, 40-59, 60-79, ≥ 80 anos); cor da pele(branca, preta, parda e amarela); renda familiar, correspondendo ao valor do salário mínimo brasileiro em 2016 (≤R$880,00; R$880,01-R$2640,00; ≥R$2640,01); estado civil (casado ou união estável, solteiro, separado/divorciado e viúvo); anos de estudo (0, 1-4, 5-9, 10-12, ≥ 13 anos); tempo desde o diagnóstico da doença renal crônica e tempo de início do tratamento foram divididos(≤ 60 meses ou ≥ 61 meses); as variáveis dicotômicas: saber ler, possuir multimorbidade, possuir gastos com a doença renal crônica, já ter realizado o transplante, internação hospitalar, estar inscrito na lista de espera, morar sozinho, possuir filhos, sexo e zona de residência. E os motivos referidos espontaneamente pelos indivíduos que não estavam em lista de espera para o transplante renal (não desejar estar em lista de espera, falta de informação do indivíduo, multimorbidade, medo, diagnóstico recente, desistiu, outros). Os motivos foram referidos pelos indivíduos (questão aberta) e posteriormente, agrupados e codificados. Assim, destaca-se que “não sabe sobre a possibilidade do transplante”, “(os profissionais) não falaram” e“esperando alguémfalar sobre o tratamento” foram agrupadas em falta de informação, e “nãodesejaestar em lista de espera”, “não quer estar na lista” e“não tem interesse em estar na lista” foram agrupadasem não desejar. O motivo outros se refereàs situações: não possui família, dificuldade de transitar na capital (local onde fica o centro de transplante), o filho está na lista, já realizou o transplante e não foi bem-sucedido e, é estrangeiro.

O armazenamento dos dados foi realizado no software Epi_data com dupla entrada dos dados e checagem de inconsistências e posteriormente transferido para o formato do Software Stata, versão 13. Realizou-se a análise estatística descritiva com distribuição de frequências relativas e absolutas. A relação entre as variáveis categóricas foi analisada utilizando o teste de independência (qui-quadrado de Pearson), considerando-se o intervalo de confiança de 95% e assumindo para significância estatística o valor de p≤0,05.

Os procedimentos adotados nesta pesquisa atenderam à Resolução número 466, de 12 de dezembro de 2012, do Conselho Nacional de Saúde. A pesquisa de origem recebeu a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa sob o parecer número 1.386385 com Certificado de Apresentação de Apreciação Ética CAAE 51678615300005316.

RESULTADOS

Dos 314 indivíduos em hemodiálise que atenderam os critérios de elegibilidade, 72,6% (n=228) não estavam cadastradosna lista de espera para o transplante renal. Destes 228 indivíduosforam excluídos 14 questionários que não informaram os motivos. Logo, este estudo descreve os motivos referidos pelos 214 indivíduos em hemodiálise que não estavamem lista de espera para o transplante renal.

A distribuição estratificada das variáveis socioeconômicase clínicas dos respondentes não cadastrados na lista espera para o transplante renal é de predomínio na faixa etária de 60 a 79 anos, do sexo masculino, com cor da pele autodeclarada branca e renda familiar ≤R$880,00 (salário mínimo em 2016). Quanto à residência, os indíviduos que não estavam cadastrados referiram coabitar com outras pessoas, ser residentes da área urbana, possuir filhos e estado civil divorciado. Ainda, os indíviduos não cadastrados, predominantemente, não sabem ler, não estudaram, não têm gastos com a doença, estão em terapia e tempo de diagnóstico ≤ 5 anos, não realizaram tranplante, não estiveram internados em unidade hospitalar e possuem morbidade. O menor tempo desde que os indivíduos foram diagnosticados com doença renal crônica e iniciaram o tratamento hemodialítico foi de um mês.

Observa-se na Tabela 1 a relação entre os motivos referidos e as características socioeconômicas e clínicas que apresentaram significância estatística no teste de independência foram: idade (p<0,001), sexo (p<0,001), saber ler (p<0,021) anos de estudo (p<0,010), tempo de diagnóstico (p<0,001) e tempo em terapia (p<0,003).

Tabela 1 -
Características socioeconômicas e clínicas e os motivos referidos pelos indivíduos em hemodiálise que não estavam cadastrados na lista de espera para o transplante renal (n=214). Rio Grande do Sul, Brasil, 2021

DISCUSSÃO

Este estudo se configura como pioneiro no Brasil ao descrever os motivos referidos pelos indivíduos em hemodiálise que não estavam em lista de espera para o transplante renal com método quantitativo. Tendo em vista que as taxas de indivíduos brasileiros com DRC em TSR aumentam anualmente é de suma importância identificar as variáveis que explicam os motivos de não cadastro em lista de espera para, assim, subsidiar a tomada de decisão que minimize tal comportamento.

No Brasil, estima-se que 77,9% dos indivíduos em diálise não estão cadastrados na lista de espera44. Neves PDMM, Sesso RCC, Thomé FS, Lugon JR, Nascimento MM. Brazilian Dialysis Census: analysis of data from the 2009-2018 decade. Braz J Nephrol. 2020;42(2):191-200. doi: http://doi.org/10.1590/2175-8239-jbn-2019-0234.
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. Em face do exposto, aparentemente, há uma diferença pequena de indivíduos cadastrados em lista de espera quando comparado com os seis STSR localizados na Metade Sul do Rio Grande do Sul. Essa constatação corrobora com estudos internacionais que enfatizam que o registro em lista de espera varia entre regiões e, também, entre STSR66. Majoni SW, Dole K, Hughes JT, Pain C. Review of current pathways to wait-listing for kidney transplantation for Aboriginal and Torres Strait Islander peoples with end-stage kidney disease in the Top End of Northern Australia. Aust Health Rev. 2020;45(2):185-93. doi: https://doi.org/10.1071/AH20011.
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-77. Pruthi R, Robb LM, Oniscu GC, Tomson C, Bradley A, Forsythe JL, et al. Inequity in access to transplantation in the united kingdom. Clin JAm Soc Nephrol. 2020;15(6):830-42. doi: http://doi.org/10.2215/CJN.11460919.
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,1111. Garcia-Garcia G, Tonelli M, Ibarra-Hernandez M, Chaves-Iñiguez JS, Oseguera-Vizcaino MC. Access to kidney transplantation in Mexico, 2007-2019: a call to end disparities in transplant care. BMC Nephrol. 2021;22(1):99. doi: http://doi.org/10.1186/s12882-021-02294-1.
http://doi.org/10.1186/s12882-021-02294-...
,1616. Pladys A, Morival C, Couchoud C, Jacquelinet C, Laurain E, Merle S, et al. Outcome-dependent geographic and individual variations in the access to renal transplantation in incident dialysed patients.Transpl Int. 2019;32(4):369-86. doi: http://doi.org/10.1111/tri.13376.
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.

Nesse contexto,cabe destacar que o Cadastro Técnico Único se dá na Central de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos pelo estabelecimento de saúde e/ou pela equipe responsável pelo seu atendimento. Ainda, alternativamente, as equipes especializadas de transplante renal poderão delegar a inscrição de potenciais receptores e a atualização dos dados cadastrais no Cadastro Técnico Único às unidades de diálise sob sua supervisão. Para inscrição em lista de espera para transplante renal serão aceitos potenciais receptores com diagnóstico de insuficiência renal crônica, que estejam realizando alguma das modalidades de TSR, apresentem depuração da creatinina endógena menor que 10 ml/min/m2, idade <18 anos e com depuração da creatinina endógena < 15 mL/min/m2, e sejam diabéticos com depuração da creatinina endógena < 15 mL/min/m2(1010. Ministério da Saúde (BR), Gabinete do Ministro. Portaria nº 2600, de 21 de outubro de 2009. Aprova o Regulamento Técnico do Sistema Nacional de Transplantes. Diário Oficial União. 2009 out 30 [cited 2022 Jan 13];148(208 Seção 1):77-118. Available from: Available from: https://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?data=30/10/2009&jornal=1&pagina=77&totalArquivos=264 .
https://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/...
.No Brasil, estima-se que 45% dos indivíduos em terapia de substituição renal são elegíveis para o transplante88. Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares [Internet]. Ministro Marcos Pontes visita IPEN/CNEN com o objetivo de discutir projetos inovadores e estratégicos ao país. Brasília, DF: Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações; 2020 [cited 2020 Jan 16] Available from: Available from: https://www.ipen.br/portal_por/portal/interna.php?secao_id=38&campo=15092 .
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.

Por conseguinte, neste estudo, foram evidenciados os principais motivos referidos pelos indivíduos em hemodiálise por não estarem registrados em lista de espera, quais sejam: a falta de informação dos indivíduos, seguido de não desejar estar em lista, da presença de multimorbidade e da idade. Ainda da Tabela 1 se deprende que entre esses motivos referidos acima, a falta de informação apresenta associação estatisticamente significativa com as variáveis sociodemográficas e clínicas: baixa escolaridade, sexo masculino, ≤ 5 anos de tempo de diagnóstico e ≤ 5 anos em TSR. Por outro lado, o motivo não desejar estar em lista está associado com as variáveis não saber ler e idade (quanto mais idoso maior relação).

Com base nessas constatações, revela-se a necessidade de os serviços de saúde e seus profissionais informarem os indivíduos em hemodiálise e suas famílias da possibilidade de transplante. Visto que a falta de informação é o principal motivo referido pelos indivíduos pelos quais não estavam cadastrados em lista de espera e está presente em todas as características demográficas, socioeconômicas e clínicas. Esse achado pode refletir a fragilidade na formação dos profissionais de saúde, bem como no que diz respeito ao envolvimento na educação em saúde dos indivíduos e suas famílias1616. Pladys A, Morival C, Couchoud C, Jacquelinet C, Laurain E, Merle S, et al. Outcome-dependent geographic and individual variations in the access to renal transplantation in incident dialysed patients.Transpl Int. 2019;32(4):369-86. doi: http://doi.org/10.1111/tri.13376.
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A idade do indivíduo é considerada uma característica limitante, pois,é menos provável que o indivíduo idoso esteja disposto a submeter-se a um transplante, pois o procedimento oferece maior risco de morte devido às suas condições fisiológicas. Por outro lado, os indivíduos idosos estão menos propensos a estarem cadastrados em lista de espera para o transplante renal, mas com maior probabilidade de serem transplantados após estar em lista, possivelmente em decorrência da compatibilidade do doador1818. Zhang Y, Gerdtham UG, Rydell H, Jarl J. Socioeconomic inequalities in the kidney transplantation process: a registry-based study in Sweden. Transplant Direct. 2018;4(2):e346.doi: http://doi.org/10.1097/TXD.0000000000000764.
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-2020. Garcia-Garcia G, Jha V. Chronic kidney disease in disadvantaged populations [editorial]. Indian J Nephrol. 2015;25(2):65-9. doi: http://doi.org/10.4103/0971-4065.150078.
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. Muito embora, ainda, devem ser consideradas diferenças substanciais como a legislação e os diferentes sistemas de saúde dos países para ter acesso à lista de espera para o transplante1010. Ministério da Saúde (BR), Gabinete do Ministro. Portaria nº 2600, de 21 de outubro de 2009. Aprova o Regulamento Técnico do Sistema Nacional de Transplantes. Diário Oficial União. 2009 out 30 [cited 2022 Jan 13];148(208 Seção 1):77-118. Available from: Available from: https://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?data=30/10/2009&jornal=1&pagina=77&totalArquivos=264 .
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Para o sexo masculino, a falta de informação a respeito da possibilidade de transplante foi o principal motivo referido; por outro lado, para o sexo feminino parece haver baixa oscilação entre falta de informação, multimorbidades e não desejar estar em lista. Sabe-se que o sexo masculino possui uma abordagem mais passiva em relação ao cuidado e informações sobre sua saúde. Em contrapartida, entende-se que historicamente as mulheres, embora exerçam atividade profissional,a essas recai o papel social do cuidado dos filhos, do cônjuge e da manutenção da casa. Assim, o relacionamento conjugal pode ser um fator protetor no acesso à informação e no cuidado em saúde do homem.Além disso, com o evento do transplante as famílias sofrem a repercussão de todo o processo incluindo a perda de trabalho dos membros que exercem atividade ocupacional, bem como a evasão escolar dos filhos, o que impacta diretamente na rotina e organização familiar1212. Baudelot C, Cailleé Y, Godechot O, Mercier S. Maladies rénales et inégalités sociales d’accès à la greffe en France. Population. 2016;71(1):23-51.doi: http://doi.org/10.3917/popu.1601.0023.
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,2020. Garcia-Garcia G, Jha V. Chronic kidney disease in disadvantaged populations [editorial]. Indian J Nephrol. 2015;25(2):65-9. doi: http://doi.org/10.4103/0971-4065.150078.
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O motivo não desejar estar em lista, referido pelos indivíduos, foi destacado como o principal motivo por aqueles que não sabem ler e pelos que nunca estudaram, o que denota a relação com o analfabetismo. Logo, os indivíduos analfabetos ou analfabetos funcionais são frequentemente excluidos por não possuirem o domínio da leitura, escrita e cálculo, atividades essas que consideradas práticas imprescindíveis para a inserção do indivíduo no mundo moderno, comoas que se referem a preencher formulários e assinar documentos1414. Browne T, McPherson L, Retzloff S, Darius A, Wilk AS, Cruz A, Wright S, et al. Improving access to kidney transplantation: perspectives from dialysis and transplant staff in the Southeastern United States. Kidney Med. 2021;3(5):799-807.e1. doi: http://doi.org/10.1016/j.xkme.2021.04.017.
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. Assim, esses indivíduos podem estar sendo acometidos por desvantagem acumulativa e,em decorrência de sua dificuldade de comunicação e entendimento, não são informados da possibilidade de transplante e, também, por constrangimento não questionam.

Adicionalmente, o motivo não desejar estar em lista pode estar relacionado com o fator geográfico1111. Garcia-Garcia G, Tonelli M, Ibarra-Hernandez M, Chaves-Iñiguez JS, Oseguera-Vizcaino MC. Access to kidney transplantation in Mexico, 2007-2019: a call to end disparities in transplant care. BMC Nephrol. 2021;22(1):99. doi: http://doi.org/10.1186/s12882-021-02294-1.
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,1616. Pladys A, Morival C, Couchoud C, Jacquelinet C, Laurain E, Merle S, et al. Outcome-dependent geographic and individual variations in the access to renal transplantation in incident dialysed patients.Transpl Int. 2019;32(4):369-86. doi: http://doi.org/10.1111/tri.13376.
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, pois o deslocamento para o centro de transplante (localizado na capital do Estado) pode ser muito caro ou parcialmente coberto pelo Sistema Único de Saúde, além das dificuldades de transitar nos grandes centros como ler placas e utilizar meios de transporte.Cumpre também ressaltar que o SUS possui recursos finitos e os gastos diretos com a diálise superaram R$1,4 bilhão somente em 2020(8). Ademais, deve-se considerar que este valor não inclui os gastos pessoais e os efeitos sobre a incapacidade de trabalhar e a necessidade de acompanhamento familiar, o que eleva substancialmente o custo social.

Em contrapartida, os indivíduos que estudaram apresentaram a falta de informação em relação à possibilidade de estar incluído em lista de espera para o transplante renal como principal motivo. Neste caso, parece haver uma linearidade decrescente, ou seja, quanto mais elevado o tempo de estudo, mais informado o indivíduo parece estar. Com inferência a essa questão, destacam-se os estudos que analisaram o fato de que indivíduos com maior escolaridade são os mais bem informados, tanto em nefrologia como em outras patologias. Estes indivíduos são mais propensos a relatar ter sido bem ou muito bem informados sobre as duas categorias de transplantes (doador vivo ou falecido) e, principalmente, eles são mais propensos a buscar informações sobre as doenças e com os profissionais de saúde. Ademais, há evidências de que a baixa escolaridade contribui para uma maior incidência de patologias renais, transição mais frequente para doença renal em estágio terminal resultando no acesso reduzido ao cadastro em lista de espera para transplante renal1212. Baudelot C, Cailleé Y, Godechot O, Mercier S. Maladies rénales et inégalités sociales d’accès à la greffe en France. Population. 2016;71(1):23-51.doi: http://doi.org/10.3917/popu.1601.0023.
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,1616. Pladys A, Morival C, Couchoud C, Jacquelinet C, Laurain E, Merle S, et al. Outcome-dependent geographic and individual variations in the access to renal transplantation in incident dialysed patients.Transpl Int. 2019;32(4):369-86. doi: http://doi.org/10.1111/tri.13376.
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Tem-se, também, que os grupos que frequentaram a escola por um período maior de tempo podem se beneficiar, pois o mais alto nível de escolaridade é considerado um dos fatores protetores para o agravamento dos efeitos de problemas de saúde1616. Pladys A, Morival C, Couchoud C, Jacquelinet C, Laurain E, Merle S, et al. Outcome-dependent geographic and individual variations in the access to renal transplantation in incident dialysed patients.Transpl Int. 2019;32(4):369-86. doi: http://doi.org/10.1111/tri.13376.
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-2020. Garcia-Garcia G, Jha V. Chronic kidney disease in disadvantaged populations [editorial]. Indian J Nephrol. 2015;25(2):65-9. doi: http://doi.org/10.4103/0971-4065.150078.
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. Assim, no estágio mais avançado da DRC, quando a substituição renal se torna necessária, os grupos com nível mais alto de escolaridade se beneficiam do acesso à melhor terapia disponível, o transplante renal. Contudo, os grupos menos instruídos são acometidos por desvatagem acumulativa, pois não aderem igualmente às restrições alimentares e ao estilo de vida que podem acelerar o curso da DRC. Ademais, os indivíduos com nível mais baixo de escolaridade estão mais propensos a sofrer de diabetes, hipertensão, obesidade e subnutrição, patologias consideradas de risco para o dano renal e mais frequentes na população em vulnerabilidade socioeconômica1212. Baudelot C, Cailleé Y, Godechot O, Mercier S. Maladies rénales et inégalités sociales d’accès à la greffe en France. Population. 2016;71(1):23-51.doi: http://doi.org/10.3917/popu.1601.0023.
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,1818. Zhang Y, Gerdtham UG, Rydell H, Jarl J. Socioeconomic inequalities in the kidney transplantation process: a registry-based study in Sweden. Transplant Direct. 2018;4(2):e346.doi: http://doi.org/10.1097/TXD.0000000000000764.
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-2020. Garcia-Garcia G, Jha V. Chronic kidney disease in disadvantaged populations [editorial]. Indian J Nephrol. 2015;25(2):65-9. doi: http://doi.org/10.4103/0971-4065.150078.
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A falta de informação dos indivíduos em relação ao cadastro em lista de espera também foi o principal motivo para os indivíduos que informaram tanto para tempo de diagnóstico ≤ 5 anos da DRC quanto para tempo ≤ 5 anos desde o início da TSR. No entanto, para os indivíduos com ≥ 5 anos os motivos falta de informação, não desejar estar em lista e multimorbidade possuem baixa oscilação. O tempo para o acesso aos serviços primários de saúde para o diagnóstico de DRC não são adequados, principalmente em países em desenvolvimento, inclusive a densidade de profissionais de saúde como nefrologistas está deficitária1111. Garcia-Garcia G, Tonelli M, Ibarra-Hernandez M, Chaves-Iñiguez JS, Oseguera-Vizcaino MC. Access to kidney transplantation in Mexico, 2007-2019: a call to end disparities in transplant care. BMC Nephrol. 2021;22(1):99. doi: http://doi.org/10.1186/s12882-021-02294-1.
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-1313. Crews DC, Bello AK, Saadi G; World Kidney Day Steering Committee. Burden, access, and disparities in kidney disease [editorial comment]. Clin Kidney J. 2019;12(2):160-6. doi: http://doi.org/10.1093/ckj/sfy128.
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,1616. Pladys A, Morival C, Couchoud C, Jacquelinet C, Laurain E, Merle S, et al. Outcome-dependent geographic and individual variations in the access to renal transplantation in incident dialysed patients.Transpl Int. 2019;32(4):369-86. doi: http://doi.org/10.1111/tri.13376.
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,1717. Barth A, Szőllősi GJ, Nemes B. Factors affecting access to the kidney transplant waiting list in eastern hungary. Transplant Proc. 2021;53(5):1418-22. doi: http://doi.org/10.1016/j.transproceed.2021.01.044.
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. Por outro lado, o tempo desde o diagnóstico e o início do tratamento em relação ao acesso à lista de espera pode ser estratégico. Quando o intervalo é maior, o indivíduo tem mais tempo para aprender e questionar sobre as diferentes TSR disponíveis e escolher àquela que melhor se adapta à sua patologia e condição de vida1212. Baudelot C, Cailleé Y, Godechot O, Mercier S. Maladies rénales et inégalités sociales d’accès à la greffe en France. Population. 2016;71(1):23-51.doi: http://doi.org/10.3917/popu.1601.0023.
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No que tange à decisão do indivíduo e sua família de não desejar estar em lista de espera,esta deve ser respeitada, contudo, é fundamental que os indivíduos sejam bem informados sobre as possibilidades de TSR . Partindo desse pressuposto, os STSR devem investir em infraestutura dos serviços, formação dos profissionais de saúde e na educação permanente em serviço66. Majoni SW, Dole K, Hughes JT, Pain C. Review of current pathways to wait-listing for kidney transplantation for Aboriginal and Torres Strait Islander peoples with end-stage kidney disease in the Top End of Northern Australia. Aust Health Rev. 2020;45(2):185-93. doi: https://doi.org/10.1071/AH20011.
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,1616. Pladys A, Morival C, Couchoud C, Jacquelinet C, Laurain E, Merle S, et al. Outcome-dependent geographic and individual variations in the access to renal transplantation in incident dialysed patients.Transpl Int. 2019;32(4):369-86. doi: http://doi.org/10.1111/tri.13376.
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,2020. Garcia-Garcia G, Jha V. Chronic kidney disease in disadvantaged populations [editorial]. Indian J Nephrol. 2015;25(2):65-9. doi: http://doi.org/10.4103/0971-4065.150078.
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Diante dessa realidade, os profissionais de enfermagem dos STSR devem estar cientes dos motivos referidos pelos indivíduos em relação ao cadastro em lista de espera para o transplante renal. Assim, sugere-se aos profissionais o desenvolvimento de estratégias de educação em saúde com o propósito de informar e comunicar os indivíduos e suas famílias a respeito do transplante renal. Essas estratégias podem facilitar o acesso à informação para possibilitar a melhor tomada de decisão pelos indivíduos com a finalidade de superar os fatores que são passíveis de mudança.

Algumas limitações devem ser consideradas na interpretação dos resultados deste estudo. A primeira se refere à questão financeira do estudo impossibilitou o deslocamento da equipe para os STSR mais distantes e, com isso, o cálculo amostral foi suprimido, o que pode ter sido insuficiente como resultado para representar a Metade Sul do Rio Grande do Sul. Ademais, embora a equipe tenha sido capacitada para a coleta, outra limitação desse estudo pode ser relacionada com a compreensão dos questionamentos pelos participantes do estudo.

Os beneficios percebidos neste estudo estão ancorados na visível lacuna do conhecimento da temática. Assim, aponta-se à necessidade de desenvolver estudos nas demais regiões brasileiras, afim de esclarecer em profundidade as causas e efeitos dos fatores socioeconômicos e clínicos ante o cadastro em lista de espera para o transplante renal, bem como possibilitar a comparação entre as regiões. Por fim, com base nos resultados apresentados neste estudo, os STSR podem planejar e desenvolver intervenções dirigidas à educação em saúde e acesso à informação sobre a possibilidade de cadastro em lista de espera com vistas a melhorar a atenção à saúde da população com DRC em TSR.

CONCLUSÃO

Esse estudo descreveu os motivos referidos pelos indivíduos em hemodiálise que não estavam cadastrados em lista de espera para o transplante renal, evidenciando que entre os motivos de maior ocorrência estão: a falta de informação dos indivíduos, não desejar estar em lista e presença de multimorbidades. Dentre os motivos, a falta de informação foi a mais recorrente e apresentou associação estatisticamente significativa com as variáveis baixa escolaridade, sexo masculino, ≤ 5 anos de tempo de diagnóstico e ≤ 5 anos em TSR. Omotivo não desejar estar em lista esteve associado com as variáveis não saber ler e idade (idosos).

Agradecimentos:

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001. Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) processo nº442502/2014-1 e Bolsas de Produtividade em Pesquisa - PQ.

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Editor associado:

Graziella Badin Aliti

Editor-chefe:

João Lucas Campos de Oliveira

Disponibilidade de dados

Citações de dados

9. Associação Brasileira de Transplante de Órgãos. Dados númericos da doação de órgãos e transplantes realizados por estado e instituição no período: janeiro/setembro 2021 [Internet]. São Paulo: Registro Brasileiro de Transplantes de Órgãos; 2021. [cited 2020 Jan 13]. Available from: Available from: https://site.abto.org.br/publicacao/xxvii-no-3/

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    02 Jun 2021
  • Aceito
    23 Maio 2022
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