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Carga de trabalho da enfermagem de terapia intensiva oncológica na pandemia da COVID-19: coorte retrospectiva

RESUMO

Objetivo:

Comparar a carga de trabalho da enfermagem em unidade de terapia intensiva oncológica, de acordo com a condição de infecção por COVID-19.

Método:

Estudo do tipo coorte retrospectiva. Utilizaram-se do Nursing Activies Score para mensuração da carga de trabalho e da análise documental para extração dos dados. Os prontuários foram divididos em um grupo de pacientes com COVID-19 e outro grupo de pacientes sem a infecção.

Resultados:

Os valores do Nursing Activies Score não foram diferentes, conforme as variáveis sociodemográficas, porém a média deste escore foi estatisticamente diferente a depender de o paciente apresentar ou não o diagnóstico de COVID-19, sendo superior naqueles que possuíam a doença.

Conclusão:

Comprovou-se que a carga de trabalho da enfermagem foi alta no contexto da unidade de terapia intensiva oncológica. No entanto, a COVID-19 aumentou ainda mais este escore, sendo o Nursing Activies Score importante ferramenta para dimensionar a equipe nesse contexto.

Palavras-chave:
Enfermagem oncológica; Infecções por coronavírus; Jornada de trabalho

ABSTRACT

Objective:

To compare the nursing workload in an oncology intensive care unit according to the condition of COVID-19 infection.

Method:

A retrospective cohort study. The Nursing Activities Score was used to measure the workload and document analysis for data extraction. The medical records were divided into a group of patients with COVID-19 and another group of patients without the infection.

Results:

The values of the Nursing Activities Score were not different depending on the sociodemographic variables, but the average of this score was statistically different depending on whether the patient had the diagnosis of COVID-19 or not, being higher in those who had the disease.

Conclusion:

It was proved that the nursing workload is high in the context of the oncology intensive care unit. However, COVID-19 increased this score even more, with the Nursing Activities Score being an important tool to size the team in this context.

Keywords:
Oncology nursing; Coronavirus infections; Work hours

RESUMEN

Objetivo:

Comparar la carga de trabajo de enfermería en una unidad de cuidados intensivos oncológicos según el estado de infección por COVID-19.

Método:

Estudio de cohorte retrospectivo. El Nursing Activities Score se utilizó para medir la carga de trabajo y el análisis de documentos para la extracción de datos. Las historias clínicas se dividieron en pacientes con COVID-19 y pacientes sin la infección.

Resultados:

Los valores del Nursing Activities Score no fueron diferentes en función de las variables sociodemográficas, pero el promedio de este puntaje fue estadísticamente diferente en función de si el paciente tenía COVID-19 o no, siendo mayor en aquellos que lo tenían.

Conclusión:

Se comprobó que la carga de trabajo de enfermería es elevada en la unidad de terapia intensiva oncológica. Sin embargo, el COVID-19 aumentó aún más este puntaje, siendo el Nursing Activities Score una herramienta importante para dimensionar el equipo en este contexto.

Palabras clave:
Enfermería oncológica; Infecciones por coronavirus; Horas de trabajo

INTRODUÇÃO

O câncer é o principal problema de saúde pública no mundo, principalmente nos países em desenvolvimento, e está entre as quatro principais causas de morte antes dos 70 anos de idade, em boa parte dos países. A incidência e a mortalidade por câncer vêm aumentando consideravelmente, seja pelo envelhecimento, pelo crescimento populacional, ou ainda pela mudança na distribuição e prevalência dos fatores de risco de câncer, especialmente aos associados ao desenvolvimento socioeconômico11. Ministério da Saúde (BR). Estimativa 2020: incidência de câncer no Brasil [Internet]. Rio de Janeiro, RJ: Instituto Nacional de Câncer; 2019 [cited 2020 Oct 10]. Available from: https://www.inca.gov.br/sites/ufu.sti.inca.local/files/media/document/estimativa-2020-incidencia-de-cancer-no-brasil.pdf .
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. No Brasil, de acordo com o Instituto Nacional do Câncer (INCA), estima-se que ocorrerão 625 mil casos novos de câncer para cada ano do triênio 2020-202211. Ministério da Saúde (BR). Estimativa 2020: incidência de câncer no Brasil [Internet]. Rio de Janeiro, RJ: Instituto Nacional de Câncer; 2019 [cited 2020 Oct 10]. Available from: https://www.inca.gov.br/sites/ufu.sti.inca.local/files/media/document/estimativa-2020-incidencia-de-cancer-no-brasil.pdf .
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.

Paralelo a esse cenário, observou-se, no final do ano de 2019, nova infecção respiratória, denominada Coronavirus Disease-2019 (COVID-19), causada pelo novo coronavírus, o Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus 2 (Síndrome Respiratória Aguda Grave de Coronavírus 2), conhecida como SARS-CoV-222. Soares SSS, Carvalho EC, Varella TCMML, Andrade KBS, Souza TDO, Souza NVDO. Brazilian nursing in the fight against the infodemic during the COVID-19 pandemic. Cogitare Enferm. 2020;25:e74676. doi: http://doi.org/10.5380/ce.v25i0.74676.
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. Essa infecção possui grande potencial de agravar o quadro clínico de pacientes com doenças crônicas, como o câncer, pois pacientes oncológicos estão entre os mais vulneráveis a doenças graves de infecções virais respiratórias33. Robilotti EV, Babady NE, Mead PA, Rolling T, Perez-Johnston R, Bernardes M, et al. Determinants of COVID-19 disease severity in patients with cancer. Nat Med. 2020;26(8):1218-23. doi: https://doi.org/10.1038/s41591-020-0979-0.
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.

A COVID-19 surgiu na China e rapidamente se espalhou pelo mundo, atingindo diversos países em todos os continentes, mudando radicalmente a rotina da sociedade, motivando cidades a decretarem estado de emergência e calamidade pública. Uma vez decretada pandemia pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em março de 2020, os serviços de saúde e os processos de trabalho foram afetados, impactando, inevitavelmente, na rotina dos profissionais, gerando novos fluxos e protocolos de cuidado22. Soares SSS, Carvalho EC, Varella TCMML, Andrade KBS, Souza TDO, Souza NVDO. Brazilian nursing in the fight against the infodemic during the COVID-19 pandemic. Cogitare Enferm. 2020;25:e74676. doi: http://doi.org/10.5380/ce.v25i0.74676.
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.

Dados da literatura apontam que pacientes com câncer, em tratamento ativo, apresentam maior risco de desenvolver eventos graves relacionados à COVID-19, sendo necessária internação em Unidade de Terapia Intensiva (UTI)33. Robilotti EV, Babady NE, Mead PA, Rolling T, Perez-Johnston R, Bernardes M, et al. Determinants of COVID-19 disease severity in patients with cancer. Nat Med. 2020;26(8):1218-23. doi: https://doi.org/10.1038/s41591-020-0979-0.
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. Com isso, a equipe de enfermagem deve se atentar para variedade de atividades, desde a monitorização de sinais vitais e gerenciamento cauteloso de drogas vasoativas até a atuação nas diversas intercorrências33. Robilotti EV, Babady NE, Mead PA, Rolling T, Perez-Johnston R, Bernardes M, et al. Determinants of COVID-19 disease severity in patients with cancer. Nat Med. 2020;26(8):1218-23. doi: https://doi.org/10.1038/s41591-020-0979-0.
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-44. Batassini E, Silveira JT, Cardoso PC, Castro DE, Hochegger T, Vieira DFVB, et al. Nursing activities score: what is the ideal periodicity for assessing workload? Acta Paul Enferm. 2019;32(2):162-8. doi: http://doi.org/10.1590/1982-0194201900023.
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.

No contexto do paciente crítico, estudos indicam a utilização do Nursing Activities Score (NAS) como ferramenta estratégica para mensurar a carga de trabalho da enfermagem e viabilizar a projeção do quantitativo de recursos humanos para o cuidado seguro dessa clientela55. Fuly PSC, Pires LMV, Souza CQS, Oliveira BGRB, Padilha KG. Nursing workload for cancer patients under palliative care. Rev Esc Enferm USP. 2016;50(5):792-9. doi: http://doi.org/10.1590/S0080-623420160000600012.
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. O NAS é um instrumento de medida de carga de trabalho, introduzido na prática da enfermagem de terapia intensiva no século XX, nos Estados Unidos da América (EUA), com objetivo de favorecer o dimensionamento ideal de profissionais para assistência aos pacientes críticos44. Batassini E, Silveira JT, Cardoso PC, Castro DE, Hochegger T, Vieira DFVB, et al. Nursing activities score: what is the ideal periodicity for assessing workload? Acta Paul Enferm. 2019;32(2):162-8. doi: http://doi.org/10.1590/1982-0194201900023.
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-55. Fuly PSC, Pires LMV, Souza CQS, Oliveira BGRB, Padilha KG. Nursing workload for cancer patients under palliative care. Rev Esc Enferm USP. 2016;50(5):792-9. doi: http://doi.org/10.1590/S0080-623420160000600012.
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. Foi desenvolvida a partir do Therapeutic Interventions Score System e, em 2003, traduzida e validada no Brasil55. Fuly PSC, Pires LMV, Souza CQS, Oliveira BGRB, Padilha KG. Nursing workload for cancer patients under palliative care. Rev Esc Enferm USP. 2016;50(5):792-9. doi: http://doi.org/10.1590/S0080-623420160000600012.
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.

De acordo com os resultados de pesquisa realizada pela Fiocruz, em 2021, a pandemia alterou de modo significativo a vida dos profissionais de saúde, gerando excesso de trabalho, com longas jornadas de trabalho e fortes sinais de esgotamento físico66. Leonel F. Pesquisa analisa o impacto da pandemia entre profissionais de saúde [Internet]. Rio de Janeiro, RJ: Fundação Oswaldo Cruz; 2021 [cited 2022 May 31]. Available from: https://portal.fiocruz.br/noticia/pesquisa-analisa-o-impacto-da-pandemia-entre-profissionais-de-saude .
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. Apesar disso, não foram observados estudos que mensurassem essa carga de trabalho excessiva ou que sugerissem dimensionamento adequado. No que tange ao cuidado do paciente oncológico crítico nesse cenário, observam-se lacunas a serem sanadas, tanto em relação à medida da carga de trabalho da enfermagem quanto ao dimensionamento necessário, com indicadores que traduzam essa realidade através de dados estatísticos. Estudos acerca da carga de trabalho de enfermagem direcionada ao paciente oncológico estão disponíveis na literatura77. Seiffert LS, Wolff LDG, Ferreira MMF, Cruz EDA, Silvestre AL. Indicators of effectiveness of nursing care in the dimension of patient safety. Rev Bras Enferm. 2020;73(3):e20180833. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0833.
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-88. Cunha DAO, Fuly PSC. Workload on oncology nursing. Rev Cubana Enfermer. 2017 [cited 2020 Oct 10];33(4):e1030. Available from: http://scielo.sld.cu/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0864-03192017000400015&lng=es&nrm=iso .
http://scielo.sld.cu/scielo.php?script=s...
. Entretanto, no contexto da pandemia da COVID-19, ainda, não foram evidenciados dados referentes a esse tema, o que o torna um campo ainda inexplorado.

Sob essa ótica, estudos que avaliem a aplicação do NAS no cotidiano da equipe de enfermagem da UTI oncológica, em meio à pandemia da COVID-19, tornam-se imprescindíveis, a fim de gerar informações que possam subsidiar a assistência de enfermagem, de acordo com as necessidades dessa clientela e da instituição. A fim de nortear melhorias na gestão do cuidado ao paciente oncológico acometido pela COVID-19, objetivou-se comparar a carga de trabalho da enfermagem em unidade de terapia intensiva oncológica, de acordo com a condição de infecção por COVID-19.

MÉTODO

A elaboração deste estudo foi realizada em conformidade às diretrizes do Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE), específico para estudos observacionais99. von Elm E, Altman DG, Egger M, Pocock SJ, Gotzsche PC, Vandenbroucke JP, et al. The Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) statement: guidelines for reporting observational studies. Int J Surg. 2014:12(12):1495-9. doi: http://doi.org/10.1016/S0140-6736(07)61602-X.
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.

Desenho do estudo

Trata-se de estudo observacional, analítico, do tipo coorte, retrospectivo. Utilizou-se da análise documental para extração dos dados. Em estudos de coorte retrospectivos, acompanha-se uma população ao longo do tempo para buscar possível associação entre exposição e desfecho e, no caso do estudo retrospectivo, colhe-se a informação pregressa do fator de exposição.

Local do estudo

O local de desenvolvimento da pesquisa foi a UTI de um hospital de referência nacional em oncologia, da rede pública federal, situado no Rio de Janeiro, RJ, Brasil, de médio porte, que atende a pacientes oncológicos das especialidades de ginecologia e câncer de tecido ósseo-conectivo. A referida UTI conta com seis leitos para internação de pacientes críticos das especialidades atendidas no hospital, sendo estruturado durante a pandemia com dois destes leitos para isolamento por COVID-19 e quatro para pacientes sem COVID-19.

Participantes

Foram elegíveis para análise os prontuários de pacientes oncológicos internados na UTI, no período entre março e julho de 2020, considerando para esse recorte temporal a data de 11 de março de 2020, início da pandemia conforme declaração pela OMS1010. Organização Pan-Americana de Saúde (BR). Folha informativa COVID-19: escritório da OPAS e da OMS no Brasil [Internet]. Brasília, DF: OPAS; 2020 [cited 2020 Oct 10]. Available from: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:covid19&Itemid=875#risco .
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. Este período se justifica por ser este um estudo que atende um dos objetivos do projeto de pesquisa intitulado: “Carga de trabalho da enfermagem no cuidado do paciente crítico oncológico”.

Para composição da amostra, os seguintes critérios de elegibilidade foram empregados: prontuários de pacientes com idade igual ou superior a 18 anos, internados na UTI durante o recorte temporal do estudo, independente do diagnóstico médico oncológico, que possuíam registro na planilha do NAS realizada no setor. Excluíram-se os prontuários que não estavam disponíveis no momento da coleta e os que ainda aguardavam o resultado do exame de Reverse Transcription Polymerase Chain Reaction (RT-PCR) para o diagnóstico de COVID-19. O teste RT-PCR é considerado padrão ouro para diagnóstico de COVID-19 e está disponível na instituição cenário deste estudo1111. Reis AAS, Santos RS. O padrão ouro no diagnóstico molecular na COVID19: o que sabemos sobre a soberania deste método? Braz J Hea Rev. 2020;3(3):5986-92. doi: https://doi.org/10.34119/bjhrv3n3-157.
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.

A amostra não probabilística, consecutiva, foi dividida em dois grupos: o primeiro com prontuários de pacientes oncológicos com resultado diagnóstico no exame de RT-PCR de COVID-19 negativo e o segundo com prontuários de pacientes oncológicos com resultado diagnóstico no RT-PCR de COVID-19 positivo.

Fonte de dados e mensuração

A coleta dos dados foi feita retrospectivamente e ocorreu por meio de consulta aos prontuários de pacientes oncológicos internados na unidade estudada. As informações foram coletadas por intermédio de instrumento contendo as variáveis sociodemográficas e clínicas extraídas dos prontuários dos pacientes selecionados para esta pesquisa. O cálculo da média do NAS ocorreu por consulta à planilha do NAS, preenchida por enfermeiros durante o período de internação. Essa escala é composta por 23 indicadores, distribuídos em 14 dimensões, as quais estratificam as ações de enfermagem nos planos da gerência, assistência e educação. O resultado do escore representa a porcentagem do tempo gasto com cada paciente1212. Cucolo DF, Perroca MG. The qualitative dimension of nursing workload: a measurement proposal. Rev Latino Am Enfermagem. 2019;27:e3238. doi: http://doi.org/10.1590/1518-8345.3274.3238.
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-1313. Nobre RAS, Rocha HMN, Santos FJ, Santos AD, Mendonça RG, Menezes AF. Aplicação Application of Nursing Activities Score (NAS) in different types of ICUs: an integrating review. Enferm Glob. 2019;18(56):485-528. doi: https://doi.org/10.6018/eglobal.18.4.362201.
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.

A carga de trabalho da enfermagem é calculada com base na soma da pontuação atribuída aos indicadores de cada uma das dimensões. O somatório dos pontos do NAS mede o percentual de tempo de enfermagem dedicado à assistência direta e indireta ao paciente, no período de 24 horas, e cada ponto corresponde a 14.4 minutos1212. Cucolo DF, Perroca MG. The qualitative dimension of nursing workload: a measurement proposal. Rev Latino Am Enfermagem. 2019;27:e3238. doi: http://doi.org/10.1590/1518-8345.3274.3238.
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-1313. Nobre RAS, Rocha HMN, Santos FJ, Santos AD, Mendonça RG, Menezes AF. Aplicação Application of Nursing Activities Score (NAS) in different types of ICUs: an integrating review. Enferm Glob. 2019;18(56):485-528. doi: https://doi.org/10.6018/eglobal.18.4.362201.
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. Desta forma, dois pontos do NAS equivalem, aproximadamente, à meia hora e ao tempo dispensado pela equipe de enfermagem na assistência direta de cada paciente, podendo, assim, alcançar 176,8%. Logo, se a pontuação for 100, interpreta-se que o paciente necessitou 100% do tempo de um profissional de enfermagem no cuidado, nas últimas 24 horas1313. Nobre RAS, Rocha HMN, Santos FJ, Santos AD, Mendonça RG, Menezes AF. Aplicação Application of Nursing Activities Score (NAS) in different types of ICUs: an integrating review. Enferm Glob. 2019;18(56):485-528. doi: https://doi.org/10.6018/eglobal.18.4.362201.
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.

No local do estudo, a mensuração do NAS é realizada pelo enfermeiro plantonista, em todos os pacientes, uma vez a cada 24h, durante o tempo de permanência do paciente na UTI. Trata-se de planilha informatizada, inserida em pasta na rede institucional, a fim de facilitar o preenchimento diário por enfermeiros e o cálculo dos indicadores. Para o presente estudo, o NAS médio mensal foi calculado com o somatório dos escores diários do NAS do paciente divididos pelo número de dias de internação na UTI.

Viés

Com o propósito de minimizar possíveis vieses, os dados foram digitados por duas pessoas de forma independente e, posteriormente, comparados para detecção de erros.

Tamanho amostral

Neste estudo, em função da amostragem por conveniência, não se realizou cálculo amostral.

Variáveis

Elegeram-se variáveis independentes relacionadas às características sociodemográficas e clínicas. As variáveis numéricas foram: média do NAS, idade, número de filhos e tempo de permanência na UTI; e categóricas: sexo, escolaridade, estado civil, tipo de tumor, clínica, motivo de internação, procedência e infecção por COVID-19.

Considerou-se como variável de desfecho a média do NAS, durante o período de internação e o diagnóstico de COVID-19 como variável indicadora para estratificação dos grupos.

Calcularam-se as distribuições brutas e percentuais ou medidas de posição e de dispersão para as variáveis quantitativas sociodemográficas e clínicas. A distribuição normal do Escore NAS, considerada a variável de desfecho primário, foi verificada por meio do teste Shapiro-Wilk.

Análise estatística

Os dados foram transcritos para um banco de dados e a versão final destes foi transportada para o software Stata, versão 16.0, em que as análises foram realizadas. Os testes Qui-quadrado e exato de Fisher foram selecionados para verificar associação entre variáveis sociodemográficas e clínicas e diagnóstico de COVID-19 entre os participantes do estudo. Ao ponderar as variáveis sociodemográficas e clínicas estudadas, as diferenças de médias do Escore NAS foram investigadas pelos testes t de Student ou análise de variância (ANOVA) a um fator, sendo a seleção condicionada ao número de categorias. Estimou-se o modelo de regressão linear múltipla, adotando como variável dependente o Escore NAS, e as variáveis sociodemográficas e clínicas como independentes, respeitando a temporalidade entre variáveis explicativas e desfecho. A seleção de variáveis ocorreu pelo método backward. O nível de significância adotado na análise foi de 5%. Os resultados estão apresentados em tabelas e gráfico.

Aspectos éticos

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em abril de 2018 (parecer no. 2.824.910, emenda no. 4.539.267 e Certificado de Apresentação de Apreciação Ética no. 93474518.6.0000.5274).

RESULTADOS

Identificaram-se 97 prontuários de pacientes internados na UTI no período de março a julho 2020. Após aplicação dos critérios de inclusão estabelecidos, 69 foram selecionados e distribuídos em dois grupos: o grupo de pacientes oncológicos com COVID-19, com 26 pacientes; e o grupo de pacientes sem COVID-19, com 43 pacientes.

A idade teve média de 60,5 (±16,2) anos, o tempo médio de internação foi 6,3 (±6,41) dias, houve predominância do sexo feminino. A prevalência de COVID-19 na amostra estudada foi de 37,68%. As comorbidades predominantes nos participantes foram, respectivamente: hipertensão arterial, diabetes mellitus e obesidade. A maior parcela possuía duas comorbidades. A ocorrência de COVID-19 não se mostrou associada às características sociodemográficas e clínicas investigadas (Tabela 1).

Tabela 1 -
Caracterização sociodemográfica e clínica e associação com diagnóstico de COVID-19 dos pacientes incluídos no estudo (n=69). Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, 2020

A média do Escore NAS foi de 92,99 (±30,58) na amostra geral. O escore médio se mostrou superior a este corte em participantes do sexo masculino e acima de 60 anos, além daqueles que viviam sem companheiro e possuíam nenhum ou mais de quatro filhos. Apesar disso, os escores NAS não se mostraram estatisticamente diferentes, a depender de sexo, da faixa etária, da escolaridade, do estado civil e número de filhos (Tabela 2).

Tabela 2 -
Distribuição do Escore NAS por variáveis sociodemográficas (n=69). Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, 2020

A média do Escore NAS foi estatisticamente diferente (p=0,001) e superior entre os pacientes com COVID-19. Os escores também diferiram conforme o motivo de internação, se o paciente estava em tratamento clínico, a quantidade de comorbidades e o desfecho do caso na internação hospitalar.

Tabela 3 -
Distribuição do Escore NAS por variáveis clínicas (n=69). Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, 2020

Entre os pacientes que receberam alta hospitalar, a mediana do Escore NAS foi discretamente maior naqueles com COVID-19, no entanto, houve potencial variação. Entre os que foram a óbito, a mediana do Escore NAS foi substancialmente maior em quem teve COVID-19 (Figura 1).

Figura 1 -
Boxplot representativo do Escore NAS em participantes com e sem COVID-19, a depender do desfecho da internação hospitalar (n=69). Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, 2020

O modelo de regressão linear múltipla indicou que a presença do diagnóstico de COVID-19 no paciente acarretou aumento de 22,406 pontos no Escore NAS (p<0,001), enquanto realizar tratamento clínico e possuir insuficiência respiratória aguda por COVID-19 causaram aumento de 20,539 (p=0,017) e 38,180 (p=0,029). As demais variáveis incluídas na análise não se mostraram significativas para alterar o Escore NAS (Tabela 4).

Tabela 4 -
Modelo de regressão linear múltipla, considerando como desfecho o Escore NAS e as variáveis explicativas: características sociodemográficas e clínicas dos participantes (n=69). Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, 2020

DISCUSSÃO

O presente estudo objetivou avaliar a carga de trabalho da enfermagem em pacientes oncológicos, no contexto da pandemia da COVID-19, sendo observados que a presença desta infecção e a necessidade de internação em fase aguda desta doença aumentaram a pontuação no Escore NAS em pacientes oncológicos.

Observou-se, também, alta carga de trabalho na população do estudo, independente da infecção por COVID-19. No geral, a média do Escore NAS foi de 92,99 (±30,58), o que significa que seria necessário um profissional de enfermagem para cada paciente nesta condição.

Esses valores médios do escore encontrados foram superiores a vários estudos publicados na literatura nacional realizados em UTI, o que demonstrou relação com a complexidade dos pacientes com câncer e COVID-19, e ampliaram a demanda de cuidados pela enfermagem para além daquela esperada para a unidade55. Fuly PSC, Pires LMV, Souza CQS, Oliveira BGRB, Padilha KG. Nursing workload for cancer patients under palliative care. Rev Esc Enferm USP. 2016;50(5):792-9. doi: http://doi.org/10.1590/S0080-623420160000600012.
http://doi.org/10.1590/S0080-62342016000...
,1212. Cucolo DF, Perroca MG. The qualitative dimension of nursing workload: a measurement proposal. Rev Latino Am Enfermagem. 2019;27:e3238. doi: http://doi.org/10.1590/1518-8345.3274.3238.
http://doi.org/10.1590/1518-8345.3274.32...
. Constatou-se aproximação do valor médio do NAS com os valores de outro estudo que encontrou escore médio de 82,0%55. Fuly PSC, Pires LMV, Souza CQS, Oliveira BGRB, Padilha KG. Nursing workload for cancer patients under palliative care. Rev Esc Enferm USP. 2016;50(5):792-9. doi: http://doi.org/10.1590/S0080-623420160000600012.
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. Contudo, as complicações infecciosas não foram as que prevaleceram na amostra estudada.

Na era da COVID-19, novos fatores poderiam influenciar diretamente a carga de trabalho da enfermagem: os pacientes com COVID-19 requereram medidas profiláticas para prevenir ou conter a propagação do vírus para outros pacientes, como vestir roupas de proteção, procedimentos específicos de descontaminação, áreas dedicadas isoladas onde suprimentos específicos são armazenados. Essas medidas aumentaram a carga de trabalho da enfermagem1414. Lucchini A, Iozzo P, Bambi S . Nursing workload in the COVID-19 era. Intensive Crit Care Nurs. 2020;61:102929. doi: https://doi.org/10.1016/j.iccn.2020.102929.
https://doi.org/10.1016/j.iccn.2020.1029...
, não somente pelo tempo necessário à implementação, como também pela organização e gestão. Alguns relatórios preliminares realizados na Europa revelaram aumento de, aproximadamente, 33% na carga de trabalho da enfermagem nesse cenário1515. Lucchini A, Giani M, Elli S, Villa S, Rona R, Foti G . Nursing Activities Score is increased in COVID-19 patients. Intensive Crit Care Nurs. 2020;59:e102876. doi: https://doi.org/10.1016/j.iccn.2020.102876.
https://doi.org/10.1016/j.iccn.2020.1028...
.

Os achados geraram importante reflexão acerca do dimensionamento de pessoal da unidade. Considerando-se o valor médio de Escore do NAS obtido neste estudo, foram requeridas 25 horas de assistência de enfermagem por paciente com câncer e diagnóstico de COVID-19 nas 24 horas e 19 horas de assistência para o paciente com câncer sem a infecção. Essa alta carga de trabalho pode implicar sobrecarga da equipe de enfermagem, se não houver dimensionamento adequado, o que se torna ainda mais problemático no contexto pandêmico, já que a COVID-19 repercute aumento das internações em UTI1414. Lucchini A, Iozzo P, Bambi S . Nursing workload in the COVID-19 era. Intensive Crit Care Nurs. 2020;61:102929. doi: https://doi.org/10.1016/j.iccn.2020.102929.
https://doi.org/10.1016/j.iccn.2020.1029...
.

No geral, em considerável parte das pesquisas, a média de profissionais de enfermagem calculada pelo NAS foi superior à média de profissionais requerida pela legislação. Mesmo em UTI com a mesma especificidade, pôde-se perceber grandes diferenças na média do Escore NAS. Desta forma, o perfil do paciente, assim como o da instituição, tem particularidades, demandando tempos de assistência diferentes e, consequentemente, divergências no dimensionamento, mostrando que números padronizados propiciam dimensionamento inadequado1616. Werneck GL, Carvalho MS . The COVID-19 pandemic in Brazil: chronicle of a health crisis foretold. Cad Saúde Pública. 2020;36(5):e00068820. doi: https://doi.org/10.1590/0102-311x00068820.
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.

Ao ponderar o perfil dos pacientes, observou-se maior proporção de mulheres. A prevalência de pacientes do sexo feminino com cânceres do tipo ginecológico pode ser justificada pelas características do local da pesquisa, isto é, unidade oncológica direcionada à ginecologia e aos tumores de Tecido Ósseo Conectivo (TOC). As informações vêm ao encontro das estatísticas do câncer ginecológico que apontam que o câncer do colo do útero foi o quarto mais frequente em todo o mundo, com prevalência de 570 mil casos novos, representando 3,2% de todos os cânceres. Já o câncer do corpo do útero é o sexto câncer mais frequente entre as mulheres, seguido do câncer de ovário11. Ministério da Saúde (BR). Estimativa 2020: incidência de câncer no Brasil [Internet]. Rio de Janeiro, RJ: Instituto Nacional de Câncer; 2019 [cited 2020 Oct 10]. Available from: https://www.inca.gov.br/sites/ufu.sti.inca.local/files/media/document/estimativa-2020-incidencia-de-cancer-no-brasil.pdf .
https://www.inca.gov.br/sites/ufu.sti.in...
.

O estudo, também, evidenciou que homens idosos demandaram maior carga de trabalho de enfermagem. Os idosos representam 12% da população mundial, com previsão de duplicar esse quantitativo até 2050 e triplicar em 2100. A maior longevidade pode ser considerada história de sucesso para humanidade1717. Gillsjö C, Karlsson S, Ståhl F, Eriksson I. Lifestyle's influence on community-dwelling older adults' health: a mixed-methods study design. Contemp Clin Trials Commun. 2020;21:100687. doi: http://doi.org/10.1016/j.conctc.2020.100687.
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. Além disso, o crescimento populacional e envelhecimento são os maiores contribuintes para o aumento do número total de casos de câncer, principalmente no contexto de países em desenvolvimento econômico, como o Brasil1818. Fhon JRS, Silva LM, Leitón-Espinoza ZE, Matiello FB, Araujo JS, Rodrigues RAP . Hospital care for elderly COVID-19 patients. Rev Latino Am Enfermagem. 2020;28:e3396. doi: http:/doi.org/10.1590/1518-8345.4649.3396.
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. Sugere-se, ainda, que a idade avançada estaria associada à rápida evolução da COVID-191919. Veras RP, Oliveira M . Aging in Brazil: the building of a healthcare model. Cien Saude Colet. 2018;23(6):1929-36. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232018236.04722018.
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. Estudo realizado na China, por exemplo, evidenciou que a idade avançada, entre os pacientes com câncer foi importante fator de risco para eventos graves acarretados pela COVID-192020. Liang W, Guan W, Chen R, Wang W, Li J, Xu K, et al. Cancer patients in SARS-CoV-2 infection: a nationwide analysis in China [comment]. Lancet Oncol. 2020;21(3):335-7. doi: https://doi.org/10.1016/S1470-2045(20)30096-6.
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.

Importantes reflexões podem ser tecidas sobre políticas públicas de saúde que sejam voltadas para o idoso, com a finalidade de se atingir a terceira idade com condições mínimas de saúde1818. Fhon JRS, Silva LM, Leitón-Espinoza ZE, Matiello FB, Araujo JS, Rodrigues RAP . Hospital care for elderly COVID-19 patients. Rev Latino Am Enfermagem. 2020;28:e3396. doi: http:/doi.org/10.1590/1518-8345.4649.3396.
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. Um modelo de atenção à saúde do idoso que se pretenda ser eficiente deve possuir fluxo bem desenhado de ações de educação, promoção da saúde, prevenção de doenças evitáveis, reabilitação de agravos, dentre outros. Essa linha de cuidado se inicia na captação, no acolhimento e monitoramento do idoso e somente se encerra nos momentos finais da vida1919. Veras RP, Oliveira M . Aging in Brazil: the building of a healthcare model. Cien Saude Colet. 2018;23(6):1929-36. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232018236.04722018.
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,2121. Gomes MMF, Paixão LAR, Faustino AM, Cruz RCS, Moura LBA. Positive self-perceived health markers in the older adult population in Brazil. Acta Paul Enferm. 2021;34:eAPE02851. doi: https://doi.org/10.37689/acta-ape/2021AO02851.
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.

Os resultados mostraram também a presença de comorbidades em todos os pacientes com câncer, achado superior a resultados internacionais que indicaram a presença de pelo menos uma comorbidade em um pouco mais da metade dos pacientes com COVID-19, em UTI, no ano de 202133. Robilotti EV, Babady NE, Mead PA, Rolling T, Perez-Johnston R, Bernardes M, et al. Determinants of COVID-19 disease severity in patients with cancer. Nat Med. 2020;26(8):1218-23. doi: https://doi.org/10.1038/s41591-020-0979-0.
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. Quanto a isso, a literatura destaca que, no contexto do paciente com câncer, a presença de comorbidades é importante fator prognóstico negativo para esta clientela, com efeitos relevantes acerca do tratamento e da mortalidade desses pacientes55. Fuly PSC, Pires LMV, Souza CQS, Oliveira BGRB, Padilha KG. Nursing workload for cancer patients under palliative care. Rev Esc Enferm USP. 2016;50(5):792-9. doi: http://doi.org/10.1590/S0080-623420160000600012.
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. Assim, urge considerar que a presença de comorbidades deve influenciar a tomada de decisão pela equipe de saúde, visando, também, possíveis e, até mesmo ainda desconhecidos, desfechos, devido à infecção pela COVID-1955. Fuly PSC, Pires LMV, Souza CQS, Oliveira BGRB, Padilha KG. Nursing workload for cancer patients under palliative care. Rev Esc Enferm USP. 2016;50(5):792-9. doi: http://doi.org/10.1590/S0080-623420160000600012.
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.

Apesar disso, as características sociodemográficas e clínicas investigadas neste estudo não influenciaram a ocorrência da COVID-19, e os escores NAS não se mostraram estatisticamente diferentes, a depender exclusivamente do sexo, da faixa etária, da escolaridade, do estado civil e do número de filhos, em ambos os grupos de pacientes. Nesse contexto, questões relacionadas ao gênero e à escolaridade têm sido associadas significativamente às condições de saúde do indivíduo em geral. Além disso, a literatura aponta que o nível educacional revela diferenças quanto à renda e condição de saúde, mostrando que quanto mais anos de estudo, mais chances de melhor renda salarial e menor a chance de adoecer2222. Valle TD, Garcia PC . Critérios de admissão do paciente oncológico em Unidades de Terapia Intensiva de hospitais gerais. Rev Cien Med. 2018;27(2):73-84. doi: http://doi.org/10.24220/2318-0897v27n2a4121.
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. No entanto, esses fatores não se mostraram relevantes no contexto de pacientes oncológicos com COVID-19.

Sobre os aspectos clínicos do paciente em terapia intensiva, a literatura revela que a complicação mais comum nos pacientes com câncer e que requer cuidados intensivos é a sepse, com incidência até quatro vezes maior em pacientes com câncer do que em outros tipos de pacientes2323. Werneck GL, Carvalho MS . The COVID-19 pandemic in Brazil: chronicle of a health crisis foretold. Cad Saude Publica. 2020;36(5):e00068820. doi: https://doi.org/10.1590/0102-311x00068820.
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. No entanto, os dados deste estudo evidenciaram outras complicações, estas relacionadas à própria doença oncológica.

Doenças respiratórias, neoplasias, cardiopatias, hipertensão e diabetes aumentam a letalidade da doença causada pelo novo coronavirus. No entanto, pacientes com câncer apresentam risco mais elevado do que a população geral de responder à COVID-19, evoluindo para elevadas taxas de letalidade33. Robilotti EV, Babady NE, Mead PA, Rolling T, Perez-Johnston R, Bernardes M, et al. Determinants of COVID-19 disease severity in patients with cancer. Nat Med. 2020;26(8):1218-23. doi: https://doi.org/10.1038/s41591-020-0979-0.
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. Entretanto, são inúmeros os desafios no que diz respeito à prevenção e ao controle da COVID-19, havendo, ainda, muitas questões a serem respondidas pela ciência.

Observou-se que as características clínicas e fisiopatológicas do paciente com câncer colaboraram para necessidade de suporte intensivo, em algum momento, durante a evolução da doença. No contexto dos diversos cenários que levam o paciente com câncer à UTI, notou-se que avanços recentes reduziram a mortalidade, mesmo em populações de risco, como os submetidos à ventilação2323. Werneck GL, Carvalho MS . The COVID-19 pandemic in Brazil: chronicle of a health crisis foretold. Cad Saude Publica. 2020;36(5):e00068820. doi: https://doi.org/10.1590/0102-311x00068820.
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, o que significa que, cada vez mais, essa será a realidade dos pacientes.

Em suma, no contexto da pandemia da COVID-19, a segurança no cuidado ao paciente permanece como uma das principais preocupações dos gestores de enfermagem, além de ser um desafio para garantia de um atendimento com riscos mínimos22. Soares SSS, Carvalho EC, Varella TCMML, Andrade KBS, Souza TDO, Souza NVDO. Brazilian nursing in the fight against the infodemic during the COVID-19 pandemic. Cogitare Enferm. 2020;25:e74676. doi: http://doi.org/10.5380/ce.v25i0.74676.
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. Neste sentido, cenários como o da pandemia exigem, ainda mais, a necessidade de os gestores das UTI garantirem otimização na alocação de recursos, principalmente da enfermagem.

As limitações identificadas estão relacionadas à obtenção de dados a partir de prontuários, ou seja, procedidos por diferentes profissionais em condições assistenciais não controladas, e o fato de ter sido estudado um pequeno grupo de pacientes oncológicos. No entanto, entende-se que os achados podem contribuir para o avanço das discussões em relação ao dimensionamento da equipe de enfermagem nesse contexto.

A despeito das limitações, o estudo pretende contribuir: na gestão, recomendando o NAS como ferramenta para indicar a carga de trabalho da enfermagem; no ensino, a partir de reflexões críticas sobre a carga de trabalho durante a formação do enfermeiro; e na pesquisa, oferecendo subsídios para o surgimento de novos estudos na área. Ademais, sugere-se o desenvolvimento de pesquisas multicêntricas para avaliar diferentes cenários de unidade de terapia intensiva, com abrangência maior no tamanho da amostra.

CONCLUSÃO

O presente estudo concluiu que pacientes com câncer e diagnóstico de COVID-19 demandaram mais horas de enfermagem do que os que não possuem esse diagnóstico através de análise estatística da mensuração da carga de trabalho de enfermagem aplicada aos pacientes oncológicos, separados em grupos com e sem a infecção por COVID-19. Além disso, comprovou-se que a carga de trabalho da equipe de enfermagem foi alta no contexto do paciente com câncer na unidade de terapia intensiva, independente dos aspectos sociodemográficos e clínicos. Esse resultado indicou a necessidade da relação enfermagem-paciente de 1/1 no contexto da COVID-19, o que revela assistência altamente complexa que demanda muitas horas do profissional.

Espera-se com estes achados, a sensibilização de gestores de saúde e de enfermagem na busca de ferramentas como o Nursing Activies Score como estratégia para aferir a carga de trabalho de enfermagem, a fim de nortear o dimensionamento adequado da equipe no contexto do paciente oncológico internado em unidade de terapia intensiva, principalmente na condição de infectado por COVID-19.

Por fim, salienta-se que os resultados aqui descritos devem ser contemplados com cautela e dentro dos limites impostos pelas análises baseadas em registros de uma pequena amostra de pacientes, o que pode não refletir a realidade de muitos serviços de saúde no Brasil.

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    » https://doi.org/10.1590/0102-311x00068820
  • Errata ao artigo:

    Lima VCGS, Pimentel NBL, Oliveira AM, Andrade KBS, Santos MLSC, Fuly PSC. Carga de trabalho da enfermagem de terapia intensiva oncológica na pandemia da COVID-19: coorte retrospectiva. Rev Gaúcha Enferm. 2023;44:e20210334. doi: https://doi.org/10.1590/1983-1447.2023.20210334.pt.
    Na lista de autores, página 1:
    onde se lê:
    Patrícia Claro dos Santos Fuly
    leia-se:
    Patrícia dos Santos Claro Fuly
    Em “Como citar este artigo”, página 1:
    onde se lê:
    Fuly PCS
    leia-se:
    Fuly PSC
    No cabeçalho:
    onde se lê:
    Fuly PCS
    leia-se:
    Fuly PSC
    Em Contribuição de autoria, página 16:
    onde se lê:
    Patrícia Claro dos Santos Fuly
    leia-se:
    Patrícia dos Santos Claro Fuly

Editado por

Editor associado:

Dagmar Elaine Kaiser

Editor-chefe:

Maria da Graça Oliveira Crossetti

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Fev 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    22 Dez 2021
  • Aceito
    20 Jun 2022
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