Acessibilidade / Reportar erro

Apoio matricial na atenção especializada respaldado no modelo de atenção às condições crônicas: pesquisa avaliativa

RESUMO

Objetivo:

Analisar o apoio matricial para equipes de saúde na Atenção Ambulatorial Especializada, segundo o Modelo de Atenção às Condições Crônicas.

Método:

Pesquisa avaliativa qualitativa, conduzida pelo Modelo de Atenção às Condições Crônicas, realizada de fevereiro a julho de 2020. Para coleta de dados, foram feitas entrevistas com 21 profissionais de saúde, observação da assistência e análise documental do serviço. Os dados foram analisados pela triangulação de dados, com auxílio do software MAXQDA, respeitando todos os aspectos éticos.

Resultados:

O matriciamento proporcionou aproximação entre Atenção Primária e Secundária; implantou a gestão de casos e qualificou a integralidade da assistência às pessoas com condições crônicas. Fragilidades na comunicação e na compreensão das bases teóricas do apoio matricial foram obstáculos para a adequada implementação das estratégias matriciais.

Considerações finais:

O apoio matricial para as equipes de saúde especializadas qualificou a atenção profissional dispensada às pessoas com condições crônicas atendidas no serviço.

Palavras-chave:
Avaliação em saúde; Doença crônica; Atenção secundária à saúde; Enfermagem; Atenção primária à saúde

ABSTRACT

Objective:

To analyze the matrix support for health teams in Specialized Outpatient Care, according to the Chronic Conditions Care Model.

Method:

Qualitative evaluative research, conducted by the Chronic Conditions Care Model, carried out from February to July 2020. For data collection, interviews were carried out with 21 health professionals, assistance observation and document analysis of the service. Data were analyzed by data triangulation, with the aid of the MAXQDA software, respecting all ethical aspects.

Results:

The matrix support provided approximation between Primary and Secondary Care; implemented case management and qualified comprehensive care for people with chronic conditions. Weaknesses in communication and understanding of the theoretical bases of matrix support were obstacles to the proper implementation of matrix strategies.

Final consideration:

Matrix support for specialized health teams qualified the professional care given to people with chronic conditions treated at the service.

Keywords:
Health evaluation; Chronic disease; Secondary care; Nursing; Primary health care

RESUMEN

Objetivo:

Analizar la matriz de apoyo a los equipos de salud en Atención Ambulatoria Especializada, según el Modelo de Atención de Condiciones Crónicas.

Método:

Investigación cualitativa evaluativa, realizada por el Modelo de Atención de Condiciones Crónicas, realizada de febrero a julio de 2020. Para la recolección de datos, se realizaron entrevistas a 21 profesionales de la salud, observación asistencial y análisis documental del servicio. Los datos fueron analizados por triangulación de datos, con la ayuda del software MAXQDA, respetando todos los aspectos éticos.

Resultados:

El soporte matricial proporcionó una aproximación entre la Atención Primaria y Secundaria; implementó gestión de casos y atención integral calificada para personas con condiciones crónicas. Las debilidades en la comunicación y comprensión de las bases teóricas del soporte matricial fueron obstáculos para la adecuada implementación de las estrategias matriciales.

Consideraciones finales:

Matriz de apoyo a equipos de salud especializados cualificó la atención profesional prestada a personas con condiciones crónicas atendidas en el servicio.

Palabras clave:
Evaluación en salud; Enfermedad crónica; Atención secundaria de salud; Enfermería; Atención primaria de salud

INTRODUÇÃO

O apoio matricial é considerado um dispositivo utilizado para promover a gestão da atenção à saúde, caracterizado por uma retaguarda especializada de suporte técnico-pedagógico e assistencial, por meio do compartilhamento de informações que evidencia a relação dialógica entre os serviços de saúde envolvidos11. Melo SRB, Melo W. O apoio matricial como cooperação entre artífices no campo da Saúde. Interface. 2022;26:e210278. doi: https://doi.org/10.1590/interface.210278
https://doi.org/10.1590/interface.210278...
-44. Castro CP, Campos GWS. Apoio Matricial como articulador das relações interprofissionais entre serviços especializados e atenção primária à saúde. Physis. 2016;26(2):455-81. doi: https://doi.org/10.1590/S0103-73312016000200007
https://doi.org/10.1590/S0103-7331201600...
.

Ações vinculadas ao matriciamento possuem características de compartilhamento do cuidado entre as equipes multiprofissionais generalistas, integrantes da Atenção Primária à Saúde (APS), e equipes multiprofissionais especialistas, integrantes da Atenção Ambulatorial Especializada (AAE). Pertencente ao nível secundário do Sistema Único de Saúde (SUS), a AAE vem reorganizando sua atenção para implementar as ações de apoio matricial com a APS, atendendo às especificidades do Modelo de Atenção às Condições Crônicas (MACC)55. Mendes EV. Desafios do SUS. Brasília, DF: CONASS; 2019 [cited 2022 Jul 03]. Available from: Available from: https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/08/1104190/desafios-do-sus.pdf
https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/...
.

O MACC foi desenvolvido considerando os princípios do SUS e tomado como referência pelo Ministério da Saúde (MS) para o desenvolvimento das Redes de Atenção à Saúde (RAS) que realizam atendimento às pessoas em situação de cronicidade55. Mendes EV. Desafios do SUS. Brasília, DF: CONASS; 2019 [cited 2022 Jul 03]. Available from: Available from: https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/08/1104190/desafios-do-sus.pdf
https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/...
.

Segundo o MACC, as ações de matriciamento entre AAE e APS ocorrem quando os profissionais especialistas oferecem uma retaguarda assistencial e de apoio educacional, sendo imprescindível o conhecimento mútuo entre as equipes desses dois pontos de atenção para somarem diferentes saberes no trabalho clínico conjunto55. Mendes EV. Desafios do SUS. Brasília, DF: CONASS; 2019 [cited 2022 Jul 03]. Available from: Available from: https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/08/1104190/desafios-do-sus.pdf
https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/...
. Dentre as ações, destacam-se as consultorias técnico-pedagógicas, os atendimentos conjuntos e as ações assistenciais específicas44. Castro CP, Campos GWS. Apoio Matricial como articulador das relações interprofissionais entre serviços especializados e atenção primária à saúde. Physis. 2016;26(2):455-81. doi: https://doi.org/10.1590/S0103-73312016000200007
https://doi.org/10.1590/S0103-7331201600...
,55. Mendes EV. Desafios do SUS. Brasília, DF: CONASS; 2019 [cited 2022 Jul 03]. Available from: Available from: https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/08/1104190/desafios-do-sus.pdf
https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/...
.

Assim, o estreitamento das relações entre as equipes é um dos requisitos para a adequada implementação do apoio matricial conforme o MACC, que incentiva um contato remoto frequente por meio de ligações telefônicas, correio eletrônico e aplicativos de mensagem, permitindo um diálogo constante entre os pontos da rede de atenção55. Mendes EV. Desafios do SUS. Brasília, DF: CONASS; 2019 [cited 2022 Jul 03]. Available from: Available from: https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/08/1104190/desafios-do-sus.pdf
https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/...
.

A implementação do Modelo possibilita a integralidade dos serviços por meio da horizontalidade nas relações entre os pontos da rede55. Mendes EV. Desafios do SUS. Brasília, DF: CONASS; 2019 [cited 2022 Jul 03]. Available from: Available from: https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/08/1104190/desafios-do-sus.pdf
https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/...
, buscando o rompimento do modelo hierárquico e permitindo a construção de elos que favoreçam a interação multiprofissional por meio do vínculo e confiança66. Chazan LF, Fortes SLCL, Camargo Junior KR. Matrix support in Mental Health: narrative revision of the concepts horizontality and supervision and their practical implications. Cien Saude Colet. 2020;25(8):3251-60. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232020258.31942018
https://doi.org/10.1590/1413-81232020258...
.

As ações compartilhadas entre as equipes da APS e AAE com base no apoio matricial garantem os benefícios da corresponsabilização de uma atenção integralizada e longitudinal77. Baeta SR, Melo W. O apoio matricial e suas relações com a teoria da complexidade. Cien Saude Colet. 2020;25(6):2289-95. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232020256.19912018
https://doi.org/10.1590/1413-81232020256...
. Dessa forma, o fortalecimento de estratégias que favoreçam o matriciamento é considerado um fator facilitador que pode ampliar as intervenções, estimular as ações no território e construir uma atenção com foco na horizontalização22. Lima MC, Gonçalves TR. Apoio matricial como estratégia de ordenação do cuidado em saúde mental. Trab Educ Saúde. 2020;18(1):e0023266. doi: https://doi.org/10.1590/1981-7746-sol00232
https://doi.org/10.1590/1981-7746-sol002...
,77. Baeta SR, Melo W. O apoio matricial e suas relações com a teoria da complexidade. Cien Saude Colet. 2020;25(6):2289-95. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232020256.19912018
https://doi.org/10.1590/1413-81232020256...
.

Pesquisas avaliativas a respeito do apoio matricial não representam uma expressividade nas publicações científicas. A maioria dos estudos avaliativos está focada especificamente na linha de cuidados da saúde mental88. Pinheiro GEW,Kantorski LP. Apoio matricial em saúde mental na atenção primária à saúde: um estudo avaliativo e participativo. Rev Contexto Saúde. 2020;20(40):199-208. doi: http://doi.org/10.21527/2176-7114.2020.40.199-208
http://doi.org/10.21527/2176-7114.2020.4...
-1212. Rocha HA, Santos AF, Reis IA, Santos MAC, Cherchiglia ML. Mental health in primary care: an evaluation using the item response theory. Rev Saude Publica. 2018;52:17. doi: https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018052000051
https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018...
. Outros estudos avaliativos foram conduzidos na perspectiva da APS erevelaram suas responsabilidades como coordenadora e ordenadora do cuidado, integração com os demais pontos das RAS e o envolvimento das equipes apoiadora e de referência1010. Pereira LCDV, Barone LR, Paulon SM. Apoio matricial em saúde mental na atenção primária à saúde: construções processuais. Av Psicol Latinoam. 2021;39(1):1-18. doi: https://doi.org/10.12804/revistas.urosario.edu.co/apl/a.7429
https://doi.org/10.12804/revistas.urosar...
,1313. Almeida PF, Marin J, Casotti E. Estratégias para consolidação da coordenação do cuidado pela atenção básica. Trab Educ Saúde. 2017;15(2):373-98. doi: https://doi.org/10.1590/1981-7746-sol00064
https://doi.org/10.1590/1981-7746-sol000...
-1515. Lopes CGS, Rocha TAH, Thomaz EBAF, Tonello AS, Rocha NCS, Duarte KMM, et al. Diabetes Mellitus macro-regional inequalities in PHC: comparing the three PMAQ-AB cycles. Saúde Debate. 2022;46(133):376-91. doi: https://doi.org/10.1590/0103-1104202213309
https://doi.org/10.1590/0103-11042022133...
.

Neste contexto, essa pesquisa destaca-se pela originalidade e relevância em avaliar o apoio matricial pelo prisma da AAE. Diante dessa consideração, emergiu a seguinte pergunta de pesquisa: Como os profissionais de saúde inseridos no MACC avaliam a implementação do apoio matricial na AAE?

Portanto, o presente artigo tem como objetivo analisar o apoio matricial para equipes de saúde na Atenção Ambulatorial Especializada, segundo o Modelo de Atenção às Condições Crônicas.

MÉTODO

Pesquisa avaliativa qualitativa1616. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14.ed. São Paulo: Hucitec; 2014., que utilizou como base conceitual o MACC55. Mendes EV. Desafios do SUS. Brasília, DF: CONASS; 2019 [cited 2022 Jul 03]. Available from: Available from: https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/08/1104190/desafios-do-sus.pdf
https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/...
. Foi utilizado o protocolo Consolidated Criteria for Reporting Qualitative Research (COREQ) como ferramenta de apoio em relação ao desenvolvimento de estudos qualitativos.

O cenário do estudo foi uma AAE situada no Estado do Paraná, referência de atendimento especializado para 17 municípios, que implementa o MACC desde 2016, por meio das RAS de Gestantes e Crianças, Saúde Mental, Hipertensão Arterial, Diabetes mellitus e Idoso. Justifica-se a escolha do serviço para o estudo pelo fato de ser pioneiro na implantação do Modelo naquela região.

Inicialmente, a pesquisadora realizou contato com a coordenação da AAE agendando data e horário para sua visita no serviço. Neste dia, foi apresentada a proposta do estudo e que foi prontamente aceito pela coordenação. A pesquisadora recebeu a listagem dos profissionais do serviço, estabeleceu contato com cada um, realizou uma apresentação pessoal e explicou a importância e os motivos de participarem da pesquisa. Foram elegíveis para o estudo profissionais de saúde da AAE que atuavam nas RAS havia pelo menos três meses; não foram elegíveis critérios de exclusão. Somente um profissional não atendeu aos critérios de elegibilidade por atuar no serviço há menos de três meses. Assim, dos 23 profissionais que atuavam nas RAS, 22 foram considerados elegíveis para a pesquisa e estes foram convidados a participar; destes, apenas um se recusou a participar da pesquisa por motivos particulares. Assim, após aceite formal e voluntário, os participantes totalizaram 21 profissionais de saúde, sendo: cinco médicos, quatro enfermeiros, quatro psicólogos, três nutricionistas, dois assistentes sociais, um fisioterapeuta, um fonoaudiólogo e um pedagogo.

Os dados foram coletados no período de fevereiro a julho de 2020. Foram utilizadas três técnicas para coleta: entrevista intensiva, observação com participação moderada e análise dos documentos utilizados pela AAE para acompanhamento e supervisão das equipes da APS. A combinação de diferentes pontos de vista, a formação diversificada dos participantes, o uso de várias fontes de informação e o emprego de múltiplas técnicas de coleta de dados coaduna com o referencial metodológico1616. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14.ed. São Paulo: Hucitec; 2014.. A coleta de dados foi conduzida por uma pesquisadora, enfermeira, pós-graduanda e com experiência nas técnicas utilizadas que, primeiramente, realizou apresentação pessoal, explicou a importância e os motivos de participarem da pesquisa.

A observação com participação moderada ocorreu durante as atividades de apoio matricial, totalizando 30 horas de atividade, as quais foram registradas em diário de campo. A análise dos documentos ocorreu concomitantemente à observação a partir da verificação das ferramentas utilizadas para matriciamento da APS, registradas em planilhas eletrônicas. Essas análises permitiram investigar a periodicidade do contato com a APS e a qualidade dos registros realizados pela AAE. As informações coletadas a partir da análise dos documentos também foram registradas em diário de campo, atendendo aos pressupostos da triangulação dos dados1717. Minayo MCS, Assis SG, Souza ER. Avaliação por triangulação de métodos: abordagem de programas sociais. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2005.) para avaliação qualitativa.

Para a realização da entrevista, foi elaborado um guia de perguntas com informações sobre a categorial profissional, sexo, idade, escolaridade e tempo de atuação na AAE, além de questões referentes ao apoio matricial. O guia foi submetido à validação aparente e de conteúdo1818. Joventino ES, Oriá MOB, Sawada NO, Ximenes LB. Apparent and content validation of maternal self-efficiency scale for prevention of childhood diarrhea. Rev Latino Am Enfermagem. 2013;21(1):371-9. doi: https://doi.org/10.1590/S0104-11692013000100012
https://doi.org/10.1590/S0104-1169201300...
realizada por oito integrantes do Grupo de Estudo e Pesquisas em Condições Crônicas (GEPECRON). Para proceder a validação, foram realizados aprofundamento da temática, análise aparente quanto à semântica e clareza das questões e análise teórica de cada item quanto ao conteúdo e pertinência1818. Joventino ES, Oriá MOB, Sawada NO, Ximenes LB. Apparent and content validation of maternal self-efficiency scale for prevention of childhood diarrhea. Rev Latino Am Enfermagem. 2013;21(1):371-9. doi: https://doi.org/10.1590/S0104-11692013000100012
https://doi.org/10.1590/S0104-1169201300...
. Com o avanço da pandemia por COVID-19 no país, o serviço teve seus atendimentos modificados em cumprimento às orientações técnicas estaduais. Por isso, as entrevistas foram feitas com auxílio da tecnologia virtual dos aplicativos para videoconferência e ligações por chamada de vídeo, de forma individual com cada participante, respeitando o sigilo e a privacidade, com duração de aproximadamente 45 minutos, audiogravadas e transcritas na íntegra pelo pesquisador.

A combinação das técnicas adotadas permitiu a triangulação no processo de análise, conferindo rigor metodológico para garantir resultados válidos e confiáveis1717. Minayo MCS, Assis SG, Souza ER. Avaliação por triangulação de métodos: abordagem de programas sociais. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2005.. Para a análise dos dados referentes ao conteúdo das entrevistas, utilizaram-se as técnicas analíticas de codificação inicial e focalizada1919. Charmaz K. A construção da teoria fundamentada: guia prático para análise qualitativa. Porto Alegre: Artmed; 2009., realizadas com o auxílio do software MAXQDA®, versão 20.0.8. A codificação inicial1919. Charmaz K. A construção da teoria fundamentada: guia prático para análise qualitativa. Porto Alegre: Artmed; 2009. implica em transcrever o material coletado fazendo umestudo rigoroso das frases analisadas, fragmentando-as em palavras-chave. Nesta etapa, os dados foram identificados e separados conforme as similaridades e diferenças das dimensões descobertas linha por linha, sendo revelados 42 códigos. A codificação focalizada1919. Charmaz K. A construção da teoria fundamentada: guia prático para análise qualitativa. Porto Alegre: Artmed; 2009. requer uma classificação, sintetização, integração e organização dos dados a partir dos códigos ou categorias iniciais mais significativas ou frequentes. Nesse momento da análise, foi realizada uma sintetização dos códigos, agrupando-os por similaridade, resultando na formação de duas categorias.

Os registros realizados em diário de campo referentes às etapas de observação e consulta aos documentos foram analisados manualmente após as codificações das entrevistas e foram utilizadas para dar suporte à compreensão dos fatos e esclarecimento das falas dos participantes e subsidiou os juízos de valores atribuídos à análise avaliativa.

E, para dar sentido ao objetivo da investigação, a interpretação dessa construção analítica foi respaldada pela base conceitual adotada55. Mendes EV. Desafios do SUS. Brasília, DF: CONASS; 2019 [cited 2022 Jul 03]. Available from: Available from: https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/08/1104190/desafios-do-sus.pdf
https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/...
, utilizando seus preceitos teóricos para correlacionar os resultados obtidos sobre a implementação do MACC no serviço.

A pesquisa foi aprovada pela Comissão Permanente de Avaliação de Projetos e do Comitê Permanente de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (COPEP), conforme Parecer n° 4.032.609, de acordo com as Resoluções 466/2012 e 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde sobre pesquisas com seres humanos. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e, para assegurar a preservação da identidade dos envolvidos na pesquisa, eles foram identificados pela Letra P (Participante) e um número correspondente à inclusão da entrevista no software utilizado.

RESULTADOS

Participaram do estudo 21 profissionais de saúde, a maior parte do sexo feminino; com idade entre 25 e 61 anos, e a categoria profissional de maior idade foi a dos médicos.A maioria cursou ao menos uma especialização; e possuíam experiência na AAE havia mais de um ano.

Os resultados apresentados revelaram como os profissionais de saúde da AAE compreendiam o apoio matricial, sua influência para qualificação da assistência e a identificação de desafios que fragilizam sua consolidação. O processo de análise permitiu o agrupamento dos dados, sintetizando-os em três categoriais: Compreensão das especificidades do apoio matricial; O apoio matricial como elemento qualificador da assistência; e Desafios para consolidação do apoio matricial.

Compreensão das especificidades do apoio matricial

A avaliação evidenciou a existência de diferentes perspectivas sobre o apoio matricial entre os profissionais, que o compreendiam como uma importante estratégia de capacitação das equipes da APS, e como aporte para a gestão do cuidado das pessoas com condições crônicas.

A utilização do recurso visual da Nuvem de Palavras (Figura 1) permitiu identificar que a palavra de maior frequência foi “capacitação”.

Figura 1 -
Compreensão das especificidades do apoio matricial pelos profissionais de saúde da Atenção Ambulatorial Especializada. Maringá, Paraná, Brasil, 2020

O apoio matricial como suporte educacional da APS ocorria mediante uma programação acordada e definida previamente, a partir das temáticas sugeridas pelos profissionais da APS ou provenientes das dificuldades identificadas pelos profissionais da AAE. Com cronograma definido, os profissionais da AAE se deslocavam até a APS para partilharem momentos de aprimoramento científico.

Na conversa, a gente vai lá, faz reunião, pergunta: “Vocês têm alguma dúvida? Vocês gostariam de ouvir sobre o quê?”. Então, a gente tem essa abertura para eles nos dizerem. (P15)

[...] a gente tem normalmente um tema que é relevante dentro da questão dos idosos, pode ser: tratamento de pressão no idoso, quedas no idoso, pedido de exames para o idoso, a situação do idoso com as suas múltiplas morbidades, múltiplas medicações, interações, enfim... então, acho que esse trabalho é o que deveria ser mais relevante em todo o MACC. (P04)

O apoio matricial também foi reconhecido como estratégia de gestão do cuidado, realizada por reuniões e discussões dos casos prioritários entre as equipes da APS e AAE. Nestes momentos, o planejamento do tratamento é elaborado, metas são traçadas e planos de cuidados são construídos em conjunto.

Nesses matriciamentos são feitas as discussões de casos, definido as datas de retorno para ver quais ações foram feitas, quais ações deram certo, o que precisa ser reavaliado. (P17)

Essa discussão dos casos entre nós (profissionais da AAE) e os profissionais da UBS é rica, porque a gente agrega mais informações e cria um plano de cuidados completo que são orientações médicas, fisioterápicas, nutricionais, etc, que é um plano de cuidados criado a múltiplas mãos, tanto do serviço especializado quanto do serviço básico. (P04)

A compreensão das vertentes do apoio matricial sugere que a AAE oferece uma retaguarda educacional, ofertada por capacitações, reuniões e discussões de casos, demonstrando que as ações realizadas pela atenção especializada corroboram com as prerrogativas do apoio matricial pelo MACC.

O apoio matricial como dispositivo que qualifica a assistência

Os profissionais avaliaram que a implementação do apoio matricial proposto pelo MACC foi determinante para mudanças das práticas profissionais na AAE. Nesta categoria, foram apresentadas as repercussões do apoio matricial para o desenvolvimento profissional individual; para a integralidade da assistência; e para a saúde das pessoas atendidas na atenção especializada.

Para o desenvolvimento individual, as ações de matriciamento foram capazes de agregar conhecimento com constantes trocas de saberes entre profissionais de diferentes categorias.

Quando eu ouço as observações que as minhas colegas fazem, normalmente tornam a minha consulta muito mais rica, muito mais efetiva também. (P04)

Está sendo muito boa para mim essas trocas (de opiniões). Às vezes, eu sozinha não tenho uma opinião completa sobre aquela situação. E essas discussões de caso fazem com que a gente ouça a opinião dos outros profissionais. Isso me acrescentou muito. (P15)

O apoio matricial também repercutiu favoravelmente para o desenvolvimento da assistência integral. A aproximação entre APS e AAE durante os momentos de matriciamento favoreceu a consolidação das práticas profissionais de ambas as equipes, potencializando a integralidade das ações de saúde.

Talvez esse seja o grande ponto para conseguirmos fazer todas essas conexões. Nós somos a atenção secundária, então precisamos nos relacionar com a atenção primária e a terciária. Então, nós temos trabalhado ajudando a melhorar a APS, junto com colegas que trabalham em cada município. A gente conhece cada enfermeira, cada equipe, os pontos fortes e os pontos fracos de cada município e eu acho que isso foi o que mais engrandeceu o trabalho do que todo o resto. Porque teve uma construção muito forte de relacionamento. (P01)

Se tiver uma idosa em situação de violência, sabendo que temos o serviço de proteção ao idoso que podemos encaminhar, entrar em contato para fazer o estudo de caso, podemos conversar sobre isso, qual encaminhamento pode ser feito, o que cada serviço pode fazer, é outra forma de cuidado que vamos oferecer. Esse conhecimento que a gente tem deles (da APS) faz com que a gente saiba quais caminhos temos que percorrer. (P11)

A melhoria da saúde das pessoas com condições crônicas foi um dos desdobramentos influenciados pela implementação do apoio matricial na AAE. As ações do matriciamento consolidaram as práticas profissionais qualificando a assistência, resultando em condutas capazes de agregar valor à saúde das pessoas atendidas na atenção especializada.

Essa formação de uma equipe multiprofissional permite que os profissionais conversem durante os atendimentos e troquem informações. Tudo isso agrega aos pacientes. (P17)

O atendimento que a gente oferece hoje é um diferencial. Acho que nem no particular você tem isso: um acompanhamento multiprofissional com atendimento do médico, enfermeiro, nutricionista, fisioterapeuta, assistente social, todo esse apoio, além de discussão de caso e matriciamento na atenção primária. É um cuidado diferenciado. (P16)

A implementação do apoio matricial na AAE foi avaliada positivamente para o desenvolvimento individual dos profissionais envolvidos, para a assistência integral e para a saúde das pessoas com condições crônicas atendidas na atenção especializada. Dadas as potencialidades, o apoio matricial foi considerado como um elemento transformador das práticas profissionais, cujas trocas de informações e saberes permitiram a apreensão de novos conhecimentos entre os pares, fortalecendo o desenvolvimento do MACC na AAE para o cuidado às pessoas em situação de cronicidade.

Desafios para o desenvolvimento do apoio matricial

Alguns elementos foram pontuados como um desafio para o desenvolvimento das práticas de apoio matricial no serviço. A escassa participação dos profissionais médicos da APS nos momentos agendados para capacitação, reunião e discussão foram aspectos considerados prejudiciais para a integralidade do cuidado e fragilizadores para a implementação do apoio matricial.

A únicacoisa ruim é que o médico do município nunca está presente. Nas primeiras vezes que fomos até os municípios, eles iam para entender a ideia do MACC, mas agora não vão mais. (P19)

Normalmente, os médicos estão sempre vinculados à questão dos atendimentos, então fica difícil tirá-los para uma situação de educação continuada. (P04)

Muitos (médicos) não se interessam pelas capacitações e reuniões de matriciamento. Quando tenho abertura e o médico da APS se mostra interessado em saúde mental, é muito legal, porque assim o trabalho flui e os pacientes são melhores tratados e melhoram mais. (P03)

Apesar da disponibilidade de diferentes ferramentas para facilitar a comunicação entre os pontos de atenção, a avaliação apontou falhas por parte dos profissionais da APS em manter uma comunicação periódica com a AAE, cujos motivos pontuados pelos participantes foram sobrecarga de trabalho, desmotivação ou desinteresse em utilizar o apoio matricial.

Penso que a gente cobra muito da APS e eles têm um enfermeiro, um técnico de enfermagem, cinco ou seis ACS, dependendo da equipe. Tem UBS que tem NASF uma vez na semana, ou seja, distribuiu o pessoal do NASF. A gente tem que cuidar muito mais da APS. E a gente só cobra, cobra, cobra, para que ela dê conta de tudo! Eu só sei que hoje é assim: “ai, você não pode vir tal dia porque eu tenho gestante, tal dia eu tenho idoso, tal dia eu tenho criança”, sabe, a gente chega lá e percebe que eles não sabem nem para que lado vão primeiro. (P06)

Às vezes, a gente percebe que o atendimento em rede necessita de certa disciplina, de um “vestir a camisa” e, às vezes, aquele local, aquele nó do atendimento em rede está um pouco frágil e isso atrapalha. (P02)

Os obstáculos que comprometeram a adequada implementação do apoio matricial pela AAE expressaram fragilidades advindas da APS. Os resultados identificados podem apontar lacunas na aproximação da APS com a AAE por intermédio do apoio matricial. Tal resultado é importante ser considerado no momento em que a AAE é responsável pelo suporte educacional da APS, indicando a necessidade de trabalhar a importância do apoio matricial com os profissionais da rede de atenção para o cuidado integral às pessoas com condições crônicas.

DISCUSSÃO

A introdução gradativa do MACC nos serviços de saúde brasileiros permitiu uma aproximação com diversas ferramentas para o manejo das condições crônicas2020. Silocchi C, Junges JR, Martino A. Comparative study of innovations on chronic conditions in primary health care in Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brazil, and Ferrara, Italy. Saúde Soc. 2020;29(1):e190633. doi: https://doi.org/10.1590/s0104-12902020190633
https://doi.org/10.1590/s0104-1290202019...
, muitas delas compostas por tecnologias leves que são pautadas nas relações de vínculo e acolhimento2121. Merhy EE, Feuerwerker LCM, Santos MLM, Bertussi DC, Baduy RS. Basic healthcare network, field of forces and micropolitics: implications for health management and care. Saúde Debate. 2020;43(esp 6):70-83. doi: https://doi.org/10.1590/0103-11042019s606
https://doi.org/10.1590/0103-11042019s60...
. O apoio matricial é uma ferramenta sustentada no compartilhamento do cuidado entre as equipes de profissionais generalistas e especialistas, em prol de uma atenção integralizada e centrada nas necessidades do usuário66. Chazan LF, Fortes SLCL, Camargo Junior KR. Matrix support in Mental Health: narrative revision of the concepts horizontality and supervision and their practical implications. Cien Saude Colet. 2020;25(8):3251-60. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232020258.31942018
https://doi.org/10.1590/1413-81232020258...
.

Os profissionais de saúde da AAE demonstraram compreender as especificidades do apoio matricial como suporte educacional e aporte para gestão do cuidado. Segundo o MACC, capacitações, reuniões e discussões de casos entre os pontos de atenção respondem ao componente pedagógico preconizado pelo apoio matricial44. Castro CP, Campos GWS. Apoio Matricial como articulador das relações interprofissionais entre serviços especializados e atenção primária à saúde. Physis. 2016;26(2):455-81. doi: https://doi.org/10.1590/S0103-73312016000200007
https://doi.org/10.1590/S0103-7331201600...
.

Contudo, os resultados evidenciaram as capacitações como exemplificação das ações vinculadas ao apoio matricial, o que pode sugerir uma postura ainda enraizada no modelo vertical, hierárquico, cujos especialistas precisam capacitar os profissionais da APS. Ações de matriciamento fornecem espaços para o diálogo entre as equipes e oportunizam o protagonismo dos profissionais, sua busca por novos saberes e novas práticas, sendo relevantes para a qualificação do serviço2222. Santos EO, Pinho LB, Silva AB, Eslabão AD. Analysis of access to the psychosocial care network for users of alcohol and other drugs in rural areas. Rev Gaúcha Enferm. 2022;43:e20210229. doi: https://doi.org/10.1590/1983-1447.2022.20210229.en
https://doi.org/10.1590/1983-1447.2022.2...
.

Resultado semelhante foi identificado em estudo cuja equipe do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) assumia uma postura supervisora e orientadora das equipes de Saúde da Família, gerando conflitos e um contexto antagônico à integralidade da assistência2323. Klein AP, d’Oliveira AFPL.O "cabo de força" da assistência: concepção e prática de psicólogos sobre o apoio matricial no núcleo de apoio à saúde da família. Cad Saúde Pública. 2017;33(1):e00158815. doi: https://doi.org/10.1590/0102-311x00158815
https://doi.org/10.1590/0102-311x0015881...
.

Ressalta-se que o apoio matricial está fundamentado na horizontalidade, na perspectiva dialógica e na inexistência de autoridade na relação entre as equipes de generalistas e especialistas11. Melo SRB, Melo W. O apoio matricial como cooperação entre artífices no campo da Saúde. Interface. 2022;26:e210278. doi: https://doi.org/10.1590/interface.210278
https://doi.org/10.1590/interface.210278...
,44. Castro CP, Campos GWS. Apoio Matricial como articulador das relações interprofissionais entre serviços especializados e atenção primária à saúde. Physis. 2016;26(2):455-81. doi: https://doi.org/10.1590/S0103-73312016000200007
https://doi.org/10.1590/S0103-7331201600...
. Por isso, as relações interprofissionais precisam estar dotadas de uma postura colaborativa na tentativa de superar a existência de possíveis relações de poder66. Chazan LF, Fortes SLCL, Camargo Junior KR. Matrix support in Mental Health: narrative revision of the concepts horizontality and supervision and their practical implications. Cien Saude Colet. 2020;25(8):3251-60. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232020258.31942018
https://doi.org/10.1590/1413-81232020258...
.

Os profissionais apresentaram um posicionamento condizente com os pressupostos do apoio matricial ao integrar o serviço especializado com a atenção básica e, portanto, proporcionar uma troca de conhecimentos de forma mais integral e menos fragmentada. Atividades de matriciamento pautam-se na interdisciplinaridade, no compartilhamento de saberes e na articulação entre os diferentes pontos da RAS2424. Vieira G, Castanho P. Das consultas terapêuticas à consulta conjunta: contribuições de Winnicott à prática do apoio matricial. Cien SaudeColet. 2022;27(5):1929-38. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232022275.08012021
https://doi.org/10.1590/1413-81232022275...
,2525. Marques FRDM, Domingues LF, Carreira L, Salci MA. Reorganization of the outpatient reference service for chronic conditions during the COVID-19 pandemic. Esc Anna Nery 2022;26:e20210354. doi: https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2021-0354
https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-20...
. A mudança na atitude dos profissionais evidencia maior compreensão da complexidade que envolve o convívio com as condições crônicas, permitindo maior aproximação dos casos e assumindo responsabilidades para o cuidado88. Pinheiro GEW,Kantorski LP. Apoio matricial em saúde mental na atenção primária à saúde: um estudo avaliativo e participativo. Rev Contexto Saúde. 2020;20(40):199-208. doi: http://doi.org/10.21527/2176-7114.2020.40.199-208
http://doi.org/10.21527/2176-7114.2020.4...
.

Dentre os benefícios da aproximação entre AAE e APS para ações de apoio matricial, identifica-se o fortalecimento do vínculo entre os pontos da rede de atenção com vistas à integralidade2525. Marques FRDM, Domingues LF, Carreira L, Salci MA. Reorganization of the outpatient reference service for chronic conditions during the COVID-19 pandemic. Esc Anna Nery 2022;26:e20210354. doi: https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2021-0354
https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-20...
,2626. Rodrigues DC, Pequeno AMC, Pinto AGA, Carneiro C, Machado MFAS, Magalhães Júnior AG, et al. Permanent education and matrix support in primary health care: family health routine. Rev Bras Enferm. 2020;73(6):e20190076. doi: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2019-0076
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2019-0...
. Assim, a aproximação entre os pontos da rede de atenção amplia a coparticipação dos atores nos processos de cuidado, melhorando a qualidade da atenção2727. Saraiva SAL, Zepeda J, Liria AF. Componentes do apoio matricial e cuidados colaborativos em saúde mental: uma revisão narrativa. Cien Saude Colet. 2020;25(2):553-65. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232020252.10092018
https://doi.org/10.1590/1413-81232020252...
.

O compartilhamento de casos, o trabalho coletivo, a facilidade de acesso entre os profissionais potencializa o trabalho em rede e, portanto, poderão repercutir para a melhoria da qualidade de vida das pessoas com condições crônicas33. Medeiros CRG, Freitag AL,Martines LSE, Saldanha OMFL, Grave MQ, Jager LK, et al. O apoio matricial na qualificação da Atenção Primária à Saúde às pessoas com doenças crônicas. Saúde Debate. 2020;44(125):478-90. doi: https://doi.org/10.1590/0103-1104202012515
https://doi.org/10.1590/0103-11042020125...
,77. Baeta SR, Melo W. O apoio matricial e suas relações com a teoria da complexidade. Cien Saude Colet. 2020;25(6):2289-95. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232020256.19912018
https://doi.org/10.1590/1413-81232020256...
,2828. Treichel CAS, Campos RTO, Campos GWS. The consolidation and effectiveness of matrix support in mental health in Brazil - bottlenecks and challenges. Interface. 2019;23:e180617. doi: https://doi.org/10.1590/interface.180617
https://doi.org/10.1590/interface.180617...
.

Sendo a pessoa com condição crônica o sujeito do processo de matriciamento44. Castro CP, Campos GWS. Apoio Matricial como articulador das relações interprofissionais entre serviços especializados e atenção primária à saúde. Physis. 2016;26(2):455-81. doi: https://doi.org/10.1590/S0103-73312016000200007
https://doi.org/10.1590/S0103-7331201600...
, o compartilhamento de saberes e a integralidade entre os pontos de atenção fornecem subsídios para que as ações de apoio matriciais sejam capazes de repercutir favoravelmente na saúde das pessoas atendidas.

Como pesquisa avaliativa, a identificação de fragilidades que desafiam a consolidação do apoio matricial na AAE oferece condições para que os pares possam intervir e transformar sua realidade, qualificando o matriciamento na perspectiva do MACC.

Os desafios para a implementação do apoio matricial enfrentam obstáculos referentes a mudanças nas relações de trabalho, mudança no modo de operacionalizar o cuidado em saúde, e mudança na formação em saúde centrada no saber médico2929. Iglesias A, Avellar LZ. Matrix support in mental health: practices and concepts brought by reference teams, matrix teams and managers. Cien Saude Colet. 2019;24(4):1247-54. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232018244.05362017
https://doi.org/10.1590/1413-81232018244...
. A incorporação das práticas matriciais em programas de residência médica no âmbito do SUS identificou que a presença preponderante do modelo flexneriano na formação dos médicos favorece uma divisão de trabalho que dificulta a integração com os demais profissionais da equipe, resultando em um pensar e um agir centrados no processo saúde/doença3030. Oliveira JM, Malvezzi E, Gigante RL, Soeiro E, Campos GWS. Innovation in medical education: matrix support in residency programs. Interface. 2018;22(64):211-22. doi: https://doi.org/10.1590/1807-57622016.0758
https://doi.org/10.1590/1807-57622016.07...
.

Além disso, para o estabelecimento das relações horizontais por meio de ações e discussões conjuntas entre APS e AAE, se faz necessário que os profissionais das equipes de saúde da família possuam um horário para atividades compartilhadas. Entretanto, a dificuldade de reunir todos os membros da equipe e a sobrecarga de atividade dos integrantes da APS foram avaliadas como barreiras para a construção colaborativa das ações de apoio matricial em outros estudos33. Medeiros CRG, Freitag AL,Martines LSE, Saldanha OMFL, Grave MQ, Jager LK, et al. O apoio matricial na qualificação da Atenção Primária à Saúde às pessoas com doenças crônicas. Saúde Debate. 2020;44(125):478-90. doi: https://doi.org/10.1590/0103-1104202012515
https://doi.org/10.1590/0103-11042020125...
,2323. Klein AP, d’Oliveira AFPL.O "cabo de força" da assistência: concepção e prática de psicólogos sobre o apoio matricial no núcleo de apoio à saúde da família. Cad Saúde Pública. 2017;33(1):e00158815. doi: https://doi.org/10.1590/0102-311x00158815
https://doi.org/10.1590/0102-311x0015881...
,2828. Treichel CAS, Campos RTO, Campos GWS. The consolidation and effectiveness of matrix support in mental health in Brazil - bottlenecks and challenges. Interface. 2019;23:e180617. doi: https://doi.org/10.1590/interface.180617
https://doi.org/10.1590/interface.180617...
.

A base para uma adequada realização do apoio matricial se sustenta em uma comunicação qualificada, para que assim possam ser consolidadas as ações de retaguarda especializada. O diálogo entre as equipes de generalistas e especialistas precisa ocorrer de forma descomplicada e periódica. Isto significa que o apoio matricial se concretiza a partir do empenho, disponibilidade e mudanças por parte de todos os envolvidos2525. Marques FRDM, Domingues LF, Carreira L, Salci MA. Reorganization of the outpatient reference service for chronic conditions during the COVID-19 pandemic. Esc Anna Nery 2022;26:e20210354. doi: https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2021-0354
https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-20...
,2929. Iglesias A, Avellar LZ. Matrix support in mental health: practices and concepts brought by reference teams, matrix teams and managers. Cien Saude Colet. 2019;24(4):1247-54. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232018244.05362017
https://doi.org/10.1590/1413-81232018244...
.

Os resultados revelaram que a fragilidade na comunicação pode advir da sobrecarga de trabalho, desmotivação ou desinteresse na utilização do apoio matricial pelos profissionais da APS. No momento em que a APS passa a ver as ações de matriciamento como mais uma atividade que é obrigada a cumprir, isso fragiliza o reconhecimento das suas próprias dificuldades em compreender e aplicar o dispositivo11. Melo SRB, Melo W. O apoio matricial como cooperação entre artífices no campo da Saúde. Interface. 2022;26:e210278. doi: https://doi.org/10.1590/interface.210278
https://doi.org/10.1590/interface.210278...
,44. Castro CP, Campos GWS. Apoio Matricial como articulador das relações interprofissionais entre serviços especializados e atenção primária à saúde. Physis. 2016;26(2):455-81. doi: https://doi.org/10.1590/S0103-73312016000200007
https://doi.org/10.1590/S0103-7331201600...
.

Esta avaliação buscou impulsionar as transformações que estão ocorrendo no serviço desde a implantação do MACC, uma vez que foi realizada com a participação dos atores que podem intervir e modificar sua realidade, qualificando as ações de matriciamento e repercutindo positivamente para a saúde das pessoas com condições crônicas acompanhadas pelo serviço.

Como limitações, registra-se que este estudo teve abrangência de um único serviço de atenção especializada com uma inserção recente do MACC, e que não foram envolvidos técnicos, gestores e usuários como participantes da pesquisa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A avaliação da implementação do matriciamento na AAE foi considerada pelos profissionais do serviço como satisfatória. O apoio matricial para as equipes de saúde especializadas qualificou a atenção profissional dispensada às pessoas atendidas no serviço, possibilitou a integralidade da assistência e proporcionou a gestão do cuidado das pessoas com condições crônicas.

Como pesquisa avaliativa, foram identificados elementos que fragilizam a completa utilização do apoio matricial em conformidade com o MACC, tais comolacunas na comunicação com os profissionais da APS e resquícios do modelo hierárquico ao resumirem as ações de matriciamento em capacitações, divergindo dos referenciais da horizontalidade que pressupõe a indissociabilidade entre o ensinar e o aprender.

Os resultados apresentados podem contribuir para melhor qualificação das práticas de matriciamento utilizadas pela AAE, iniciando por estratégias educacionais com os profissionais da rede de atenção para fortalecer as práticas matriciais, organizadas na perspectiva dialógica e reflexiva, que valorizam as diferentes percepções e corroboram com as prerrogativas da ferramenta para o cuidado integral às pessoas com condições crônicas.

REFERENCES

  • 1. Melo SRB, Melo W. O apoio matricial como cooperação entre artífices no campo da Saúde. Interface. 2022;26:e210278. doi: https://doi.org/10.1590/interface.210278
    » https://doi.org/10.1590/interface.210278
  • 2. Lima MC, Gonçalves TR. Apoio matricial como estratégia de ordenação do cuidado em saúde mental. Trab Educ Saúde. 2020;18(1):e0023266. doi: https://doi.org/10.1590/1981-7746-sol00232
    » https://doi.org/10.1590/1981-7746-sol00232
  • 3. Medeiros CRG, Freitag AL,Martines LSE, Saldanha OMFL, Grave MQ, Jager LK, et al. O apoio matricial na qualificação da Atenção Primária à Saúde às pessoas com doenças crônicas. Saúde Debate. 2020;44(125):478-90. doi: https://doi.org/10.1590/0103-1104202012515
    » https://doi.org/10.1590/0103-1104202012515
  • 4. Castro CP, Campos GWS. Apoio Matricial como articulador das relações interprofissionais entre serviços especializados e atenção primária à saúde. Physis. 2016;26(2):455-81. doi: https://doi.org/10.1590/S0103-73312016000200007
    » https://doi.org/10.1590/S0103-73312016000200007
  • 5. Mendes EV. Desafios do SUS. Brasília, DF: CONASS; 2019 [cited 2022 Jul 03]. Available from: Available from: https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/08/1104190/desafios-do-sus.pdf
    » https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/08/1104190/desafios-do-sus.pdf
  • 6. Chazan LF, Fortes SLCL, Camargo Junior KR. Matrix support in Mental Health: narrative revision of the concepts horizontality and supervision and their practical implications. Cien Saude Colet. 2020;25(8):3251-60. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232020258.31942018
    » https://doi.org/10.1590/1413-81232020258.31942018
  • 7. Baeta SR, Melo W. O apoio matricial e suas relações com a teoria da complexidade. Cien Saude Colet. 2020;25(6):2289-95. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232020256.19912018
    » https://doi.org/10.1590/1413-81232020256.19912018
  • 8. Pinheiro GEW,Kantorski LP. Apoio matricial em saúde mental na atenção primária à saúde: um estudo avaliativo e participativo. Rev Contexto Saúde. 2020;20(40):199-208. doi: http://doi.org/10.21527/2176-7114.2020.40.199-208
    » http://doi.org/10.21527/2176-7114.2020.40.199-208
  • 9. Amaral CEM, Torrenté MON, Torrenté M, Moreira CP. Matrix support in Mental Health in primary care: the effects on the understanding and case management of community health workers. Interface. 2018;22:801-12. doi: https://doi.org/10.1590/1807-57622017.0473
    » https://doi.org/10.1590/1807-57622017.0473
  • 10. Pereira LCDV, Barone LR, Paulon SM. Apoio matricial em saúde mental na atenção primária à saúde: construções processuais. Av Psicol Latinoam. 2021;39(1):1-18. doi: https://doi.org/10.12804/revistas.urosario.edu.co/apl/a.7429
    » https://doi.org/10.12804/revistas.urosario.edu.co/apl/a.7429
  • 11. Silva GT, Carvalho FO, Vieira-Meyer APGF, Gomes GMS, Bezerra LMMR, Camelo RV, et al. Planejamento e apoio no processo de trabalho das equipes de atenção básica no Nordeste: análise do PMAQ-AB (3º ciclo). Cien Saude Colet. 2021;26(5):1749-55. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232021265.03722021
    » https://doi.org/10.1590/1413-81232021265.03722021
  • 12. Rocha HA, Santos AF, Reis IA, Santos MAC, Cherchiglia ML. Mental health in primary care: an evaluation using the item response theory. Rev Saude Publica. 2018;52:17. doi: https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018052000051
    » https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018052000051
  • 13. Almeida PF, Marin J, Casotti E. Estratégias para consolidação da coordenação do cuidado pela atenção básica. Trab Educ Saúde. 2017;15(2):373-98. doi: https://doi.org/10.1590/1981-7746-sol00064
    » https://doi.org/10.1590/1981-7746-sol00064
  • 14. Chaves LA, Jorge AO, Cherchiglia ML, Reis IA, Santos MAC, Santos AF, et al. Integração da atenção básica à rede assistencial: análise de componentes da avaliação externa do PMAQ-AB. Cad Saude Publica. 2018;34(2):e00201515. doi: https://doi.org/10.1590/0102-311x00201515
    » https://doi.org/10.1590/0102-311x00201515
  • 15. Lopes CGS, Rocha TAH, Thomaz EBAF, Tonello AS, Rocha NCS, Duarte KMM, et al. Diabetes Mellitus macro-regional inequalities in PHC: comparing the three PMAQ-AB cycles. Saúde Debate. 2022;46(133):376-91. doi: https://doi.org/10.1590/0103-1104202213309
    » https://doi.org/10.1590/0103-1104202213309
  • 16. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14.ed. São Paulo: Hucitec; 2014.
  • 17. Minayo MCS, Assis SG, Souza ER. Avaliação por triangulação de métodos: abordagem de programas sociais. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2005.
  • 18. Joventino ES, Oriá MOB, Sawada NO, Ximenes LB. Apparent and content validation of maternal self-efficiency scale for prevention of childhood diarrhea. Rev Latino Am Enfermagem. 2013;21(1):371-9. doi: https://doi.org/10.1590/S0104-11692013000100012
    » https://doi.org/10.1590/S0104-11692013000100012
  • 19. Charmaz K. A construção da teoria fundamentada: guia prático para análise qualitativa. Porto Alegre: Artmed; 2009.
  • 20. Silocchi C, Junges JR, Martino A. Comparative study of innovations on chronic conditions in primary health care in Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brazil, and Ferrara, Italy. Saúde Soc. 2020;29(1):e190633. doi: https://doi.org/10.1590/s0104-12902020190633
    » https://doi.org/10.1590/s0104-12902020190633
  • 21. Merhy EE, Feuerwerker LCM, Santos MLM, Bertussi DC, Baduy RS. Basic healthcare network, field of forces and micropolitics: implications for health management and care. Saúde Debate. 2020;43(esp 6):70-83. doi: https://doi.org/10.1590/0103-11042019s606
    » https://doi.org/10.1590/0103-11042019s606
  • 22. Santos EO, Pinho LB, Silva AB, Eslabão AD. Analysis of access to the psychosocial care network for users of alcohol and other drugs in rural areas. Rev Gaúcha Enferm. 2022;43:e20210229. doi: https://doi.org/10.1590/1983-1447.2022.20210229.en
    » https://doi.org/10.1590/1983-1447.2022.20210229.en
  • 23. Klein AP, d’Oliveira AFPL.O "cabo de força" da assistência: concepção e prática de psicólogos sobre o apoio matricial no núcleo de apoio à saúde da família. Cad Saúde Pública. 2017;33(1):e00158815. doi: https://doi.org/10.1590/0102-311x00158815
    » https://doi.org/10.1590/0102-311x00158815
  • 24. Vieira G, Castanho P. Das consultas terapêuticas à consulta conjunta: contribuições de Winnicott à prática do apoio matricial. Cien SaudeColet. 2022;27(5):1929-38. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232022275.08012021
    » https://doi.org/10.1590/1413-81232022275.08012021
  • 25. Marques FRDM, Domingues LF, Carreira L, Salci MA. Reorganization of the outpatient reference service for chronic conditions during the COVID-19 pandemic. Esc Anna Nery 2022;26:e20210354. doi: https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2021-0354
    » https://doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2021-0354
  • 26. Rodrigues DC, Pequeno AMC, Pinto AGA, Carneiro C, Machado MFAS, Magalhães Júnior AG, et al. Permanent education and matrix support in primary health care: family health routine. Rev Bras Enferm. 2020;73(6):e20190076. doi: https://doi.org/10.1590/0034-7167-2019-0076
    » https://doi.org/10.1590/0034-7167-2019-0076
  • 27. Saraiva SAL, Zepeda J, Liria AF. Componentes do apoio matricial e cuidados colaborativos em saúde mental: uma revisão narrativa. Cien Saude Colet. 2020;25(2):553-65. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232020252.10092018
    » https://doi.org/10.1590/1413-81232020252.10092018
  • 28. Treichel CAS, Campos RTO, Campos GWS. The consolidation and effectiveness of matrix support in mental health in Brazil - bottlenecks and challenges. Interface. 2019;23:e180617. doi: https://doi.org/10.1590/interface.180617
    » https://doi.org/10.1590/interface.180617
  • 29. Iglesias A, Avellar LZ. Matrix support in mental health: practices and concepts brought by reference teams, matrix teams and managers. Cien Saude Colet. 2019;24(4):1247-54. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232018244.05362017
    » https://doi.org/10.1590/1413-81232018244.05362017
  • 30. Oliveira JM, Malvezzi E, Gigante RL, Soeiro E, Campos GWS. Innovation in medical education: matrix support in residency programs. Interface. 2018;22(64):211-22. doi: https://doi.org/10.1590/1807-57622016.0758
    » https://doi.org/10.1590/1807-57622016.0758
  • Financimento:

    O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

Editado por

Editor associado:

Adriana Aparecida Paz

Editor-chefe:

João Lucas Campos de Oliveira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    05 Jul 2022
  • Aceito
    09 Jan 2023
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Escola de Enfermagem Rua São Manoel, 963 -Campus da Saúde , 90.620-110 - Porto Alegre - RS - Brasil, Fone: (55 51) 3308-5242 / Fax: (55 51) 3308-5436 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: revista@enf.ufrgs.br