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Segurança do paciente em clínicas de hemodiálise: percepção da equipe de enfermagem

RESUMO

Objetivo:

Analisar a percepção da equipe de enfermagem sobre a segurança do paciente em clínicas de hemodiálise.

Método:

Estudo descritivo-exploratório com abordagem qualitativa, realizado com 37 profissionais da equipe de enfermagem de cinco clínicas de hemodiálise, localizadas nos municípios de Sobral e Fortaleza, no Ceará, Brasil. Os dados foram coletados no período de outubro a dezembro de 2021, por meio de entrevistas semiestruturadas gravadas e analisados por Classificação Hierárquica Descendente.

Resultados:

Emergiram quatro classes: funcionamento das clínicas de hemodiálise; papel do acompanhante e do paciente na sua segurança em clínicas de hemodiálise; atuação da equipe de enfermagem no cuidado seguro do paciente em tratamento hemodialítico; metas internacionais de segurança do paciente nas clínicas de hemodiálise.

Conclusão:

Os participantes reconhecem a existência de falhas nas metas internacionais de segurança do paciente, principalmente a ocorrência de erros na identificação dos pacientes e administração de medicamentos.

Descritores:
Enfermagem; Segurança do paciente; Diálise renal; Participação do paciente

ABSTRACT

Objective:

To analyze the perception of the nursing team regarding patient safety in hemodialysis clinics.

Method:

Descriptive-exploratory study with a qualitative approach, conducted with 37 professionals from the nursing team of five hemodialysis clinics, located in the cities of Sobral and Fortaleza, in Ceará, Brazil. Data were collected from October to December 2021, through semi-structured interviews recorded and analyzed by Descending Hierarchical Classification.

Results:

Four classes emerged: operation of hemodialysis clinics; role of companions and patients in their safety in hemodialysis clinics; role of the nursing team in the safe care of patients undergoing hemodialysis; international patient safety goals in hemodialysis clinics.

Conclusion:

The participants recognize the existence of shortcomings in international patient safety goals, mainly errors in patient identification and medication administration.

Descriptors:
Nursing; Patient safety; Renal dialysis; Patient participation

RESUMEN

Objetivo:

Analizar la percepción del equipo de enfermería sobre la seguridad del paciente en clínicas de hemodiálisis.

Método:

Estudio descriptivo-exploratorio con abordaje cualitativo, realizado con 37 profesionales del equipo de enfermería de cinco clínicas de hemodiálisis, ubicadas en las ciudades de Sobral y Fortaleza, en Ceará, Brasil. Los datos fueron recolectados de octubre a diciembre de 2021, a través de entrevistas semiestructuradas grabadas y analizadas por Clasificación Jerárquica Descendente.

Resultados:

Surgieron cuatro clases: operación de clínicas de hemodiálisis; papel del acompañante y del paciente en su seguridad en las clínicas de hemodiálisis; actuación del equipo de enfermería en el cuidado seguro de los pacientes en hemodiálisis; objetivos internacionales para la seguridad del paciente en las clínicas de hemodiálisis.

Conclusión:

Los participantes reconocen la existencia de fallas en las metas internacionales de seguridad del paciente, principalmente la ocurrencia de errores en la identificación de pacientes y administración de medicamentos.

Descriptores:
Enfermería; Seguridad del paciente; Diálisis renal; Participación del paciente

INTRODUÇÃO

A Segurança do Paciente é uma ciência da área da saúde que tem por objetivo estudar e aplicar na assistência à saúde formas de prevenção e redução de riscos, erros e danos que podem ocorrer aos pacientes durante a prestação do cuidado11. World Health Organization. Patient safety. Washington, DC: WHO; 2019 [cited 2022 May 30]. Available from: https://www.who.int/news-room/factsheets/detail/patient-safety
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. É entendida como a diminuição dos riscos de danos desnecessários, no cuidado em saúde, a um mínimo aceitável, sendo elemento fundamental para garantia da qualidade da assistência em saúde22. Ministério da Saúde (BR). Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Pacientes pela segurança do paciente em serviços de saúde: Como posso contribuir para aumentar a segurança do paciente? Orientações aos pacientes, familiares e acompanhantes [Internet]. Brasília, DF: Anvisa; 2017 [cited 2022 May 30]. Available from: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/centraisdeconteudo/publicacoes/servicosdesaude/publicacoes/guia-como-posso-contribuir-para-aumentar-a-seguranca-do-paciente-orientacoes-aos-pacientes-familiares-e-acompanhantes/view
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No âmbito de clínicas de hemodiálise, identifica-se que os pacientes com doença renal crônica em tratamento hemodialíticos estão suscetíveis a diversos riscos e danos que comprometem sua segurança, quer sejam relacionados aos procedimentos invasivos, ao tratamento em si, condição clínica dos pacientes e administração de medicamentos potencialmente perigosos33. Rocha RPF, Pinho DLM. Segurança do paciente em hemodiálise. Rev Enferm UFPE Online. 2018;12(12):3360-67. doi: https://doi.org/10.5205/1981-8963-v12i12a235857p3360-3367-2018
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A literatura nacional e internacional apresenta dados relevantes sobre a temática. Um estudo realizado em Taiwan, uma ilha localizada na China, com a maior prevalência de doença renal terminal em todo o mundo, destaca que 9,6% de óbitos em pacientes com Doença Renal Crônica (DRC) são causados por infecções e 3,5% relacionados a erros organizacionais e humanos, como decisões médicas inadequadas44. Lin CH, Ho TF, Chen HF, Chang HY, Chien JH. Applying healthcare failure mode and effect analysis and the development of a real-time mobile application for modified early warning score notification to improve patient safety during hemodialysis. J Patient Saf. 2022;18(5):475-85. doi: https://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000977
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. Por sua vez, pesquisadores brasileiros identificaram que os eventos mais prevalentes estão relacionados ao fluxo sanguíneo inadequado, sangramento pelo acesso venoso e coagulação do Sistema Extracorpóreo (SE). Desses eventos adversos, 0,9% foram graves e 0,8% geraram óbito55. Luft J, Boes AA, Lazzari DD, Nascimento ERP, Busana JA, Canever BP. Chronic kidney injury at an intensive care service: clinical characteristics and outcomes. Cogitare Enferm. 2016;21(2):01-09. doi: http://doi.org/10.5380/ce.v21i2.43822
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Os profissionais de saúde que trabalham em clínicas de hemodiálise, devem ser capazes de identificar os fatores que podem prejudicar a segurança do paciente e que levantam preocupações ao reconhecer ou tomar conhecimento das ações inseguras ou insatisfatórias, pois com isso eles podem prevenir os episódios de eventos adversos, melhorar o desempenho da equipe e favorecer um ambiente de aprendizagem66. Bellier-Teichmann T, Roulet-Schwab D, Antonini M, Brandalesi V, O’Reilly L, Cara C, et al. Transformation of clinical nursing practice following a caring-based educational intervention: a qualitative perspective. SAGE Open Nurs. 2022;8:23779608221078100. doi: https://doi.org/10.1177/23779608221078100
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. Quando os profissionais não falam sobre os problemas, as organizações perdem oportunidades de melhoria e aprendizagem. Para criar estas oportunidades, as organizações precisam nutrir culturas que removem barreiras para falar.

Diante da intensa rotina e das diversas atribuições as quais estão submetidos os profissionais de enfermagem das clínicas de hemodiálise, faz-se necessário o entendimento sobre como esses profissionais vêem a temática de segurança do paciente, considerando que a identificação dos eventos adversos nas etapas do cuidar e da estrutura organizacional contribuem para o desenvolvimento de estratégias que promovam a cultura de segurança do paciente77. Amiri M, Khademian Z, Nikandish R. The effect of nurse empowerment educational program on patient safety culture: a randomized controlled trial. BMC Med Educ. 2018;18(1):158. doi: https://doi.org/10.1186/s12909-018-1255-6
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Desse modo, questiona-se: qual a percepção da equipe de enfermagem no cenário das clínicas de hemodiálise sobre aspectos relacionados à segurança do paciente? Portanto, este estudo tem como objetivo analisar a percepção da equipe de enfermagem sobre a segurança do paciente em clínicas de hemodiálise.

MÉTODO

Trata-se de um estudo descritivo-exploratório com abordagem qualitativa, com orientação metodológica do tipo narrativa, baseada no construtivismo. Ressalta-se que as orientações metodológicas foram pautadas nos critérios do Consolidated criteria for reporting qualitative research (COREQ)88. Souza VRS, Marziale MHP, Silva GTR, Nascimento PL. Translation and validation into Brazilian Portuguese and assessment of the COREQ checklist. Acta Paul Enferm. 2021;34:eAPE02631. doi: https://doi.org/10.37689/acta-ape/2021AO02631
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O cenário do estudo foi em cinco clínicas de hemodiálise vinculadas ao Sistema Único de Saúde (SUS), sendo duas localizadas no município de Sobral/CE e três em Fortaleza/CE. As clínicas foram selecionadas de maneira intencional por serem os principais centros de referência de duas macrorregiões do estado do Ceará. Ressalta-se que os pesquisadores não tinham vínculo com as instituições.

Participaram do estudo os profissionais de enfermagem das clínicas selecionadas, sendo a amostra do estudo não probabilística intencional, mediante convite, logo, a seleção dos participantes ocorreu por conveniência. O critério de inclusão adotado foi trabalhar na instituição há mais de seis meses. Foram excluídos os profissionais afastados do trabalho ou em férias no período de coleta de dados, outubro a dezembro de 2021.

Após aplicação dos critérios de elegibilidade, participaram do estudo 37 profissionais da equipe de enfermagem, sendo sete enfermeiros e 30 técnicos de enfermagem. Ressalta-se que todos os convidados aceitaram participar do estudo.

Utilizou-se um roteiro semiestruturado, submetido ao teste piloto com três enfermeiros que atuam em núcleos de segurança do paciente e três enfermeiros que trabalham em unidades de hemodiálise de uma instituição diferente do cenário estudado. O roteiro foi avaliado quanto à compreensão e à capacidade de alcançar os objetivos da pesquisa, sendo composto de duas partes. A primeira correspondeu à caracterização sociodemográficas e laborais. A segunda parte foi representada pelas perguntas disparadoras: “Fale sobre a segurança do paciente nessa clínica de hemodiálise”; Quais dificuldades encontradas no dia-a-dia no processo de segurança do paciente?” e “Quais medidas podem ser implementadas para melhorar a segurança do paciente?”

Foi realizado contato prévio, via telefone, com as equipes de enfermagem e apresentação do objetivo do estudo, seus riscos e benefícios. Após aceitarem participar, as entrevistas foram agendadas, e realizadas em uma sala reservada da instituição pesquisada com entrevistas individuais, com duração média de 20 minutos, mediadas por duas enfermeiras, sendo uma doutoranda e outra mestranda, que pesquisam sobre segurança do paciente em clínicas de hemodiálise e não possuíam vínculo laboral, acadêmico ou interpessoal com os entrevistados. Além disso, as pesquisadoras foram treinadas previamente sobre o estudo e seu método, ademais, possuem experiência com coleta de dados de pesquisas com abordagem qualitativa.

Para captação dos dados, utilizou-se gravações de áudios. As entrevistas foram gravadas através de um gravador do tipo MP4. Utilizou-se a técnica de amostragem por saturação teórica de dados, que consiste na interrupção da coleta de dados a partir da constatação de que não surgirão mais elementos novos para subsidiar a teorização almejada99. Fontanella BJB, Luchesi BM, Saidel MGB, Ricas J, Turato ER, Melo DG. Amostragem em pesquisas qualitativas: proposta de procedimentos para constatar saturação teórica. Cad Saúde Pública. 2011 [cited 2022 May 30];27(2):389-94. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v27n2/20.pdf
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Posteriormente, às entrevista foram transcritas na íntegra no Microsoft Word® com dupla checagem do conteúdo transcrito e processadas pelo software Interface de R pourles Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (IRAMUTEQ)® 0.7 Alfa 2.3.3.1 e analisadas por Classificação Hierárquica Descendente (CHD). Em seguida, os dados foram codificados por três pesquisadores. Ressalta-se que não foi possível o envio dos textos transcritos para comentários e sugestões dos participantes.

Destaca-se que não houve conflito de interesse durante as entrevistas e que o estudo obedeceu aos aspectos da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Ressalta-se que, este estudo faz parte de um projeto intitulado “Avaliação da segurança do paciente renal crônico em hemodiálise no Ceará: pesquisa multifásica de métodos mistos”, aprovado, em 2021, pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Ceará, sob parecer 4.542.075, CAAE: 38707520.1.0000.5054 e visa responder a um dos objetivos secundários dessa pesquisa. Antes do início da entrevista, foi disponibilizado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e, mediante concordância de participação da pesquisa, foi solicitada a assinatura do termo e autorização de uso de som. Para manter o anonimato, as citações foram identificadas por meio da letra E, conforme a ordem das entrevistas.

RESULTADOS

Os achados identificaram que entre os 37 participantes do estudo, houve o predomínio do sexo feminino (86,5%), cor parda (59,5%), estado civil casado (48,6%), com renda familiar entre um e dois salários mínimos (62,9%) e com religião católica (70,3%). A faixa etária variou entre 21 a 57 anos, sendo a média de 35,7 anos. Os técnicos de enfermagem atendiam a média de quatro pacientes por turno, enquanto os enfermeiros atendiam 35 pacientes.

O software IRAMUTEQ® dividiu o texto em 449 segmentos textuais, 1505 formas, 19.698 ocorrências com aproveitamento de 83,15% do texto. O dimensionamento das Unidades de Contexto Elementar (UCE) dividiu as falas dos participantes em quatro classes, detalhadas na Figura 1.

Figura 1 -
Dendrograma das palavras distribuídas em quatro classes. Fortaleza, Ceará, Brasil, 2022

Classe 1 - Funcionamento seguro das clínicas de hemodiálise (26,6%)

A Classe 1 é a primeira classe com maior número de UCE (26,6%). Esta categoria revelou como os profissionais relacionam o funcionamento das clínicas de hemodiálise com a busca pela segurança do paciente. Dentre as falas, observou-se a influência das legislações e normativas, máquinas e equipamentos e cultura do profissional no funcionamento seguro das clínicas de hemodiálise.

Neste contexto, em relação às legislações e normativas, os profissionais da equipe de enfermagem concordaram sobre a importância de fazer um trabalho guiado por protocolos, bem como, enfatizaram que as regulamentações relacionadas a segurança do paciente em clínicas de hemodiálise são recentes, conforme as falas:

A gente sempre tenta fazer as coisas direitinho de acordo com o que a lei manda, pensando na segurança do paciente. (E5)

A gente tem sempre tentado melhorar, tem implantado os protocolos que a gente consegue na medida do que é pedido pelo ministério. (E20)

Nós temos hoje poucas regulamentações que respaldam. Hoje, no que tange a segurança, a única coisa que a gente tem no crônico são os indicadores de infecção, de troca de cateter, óbito, mas pouco é explanado sobre evento adverso e ainda existe muita dúvida sobre o que de fato é advento adverso. (E30)

Ademais, para um funcionamento seguro, além da implantação de legislações e normativas, os profissionais da equipe de enfermagem destacaram-se a influência das máquinas, materiais e equipamentos no processo de cuidar do paciente, uma vez que equipamentos antigos e escassos são barreiras durante a assistência segura, conforme as falas:

Já melhorou muita coisa, eu já peguei máquina aqui muito antiga. A segurança aqui era nossos olhos. Hoje não, a máquina faz tudo, é mais seguro. Mas se fosse umas máquinas mais modernas, então era mais seguro ainda. (E1)

Comprar máquinas novas, seria bom pra nós funcionários trabalhar com o material, seria bom pra todo mundo, máquinas mais eficientes. (E2)

Você não presta uma assistência adequada ao paciente por que você não pode gastar material... Eu acho que é o controle excessivo de material. A gente não tem acesso ao material para dar um atendimento adequado ao paciente. (E32)

Além disso, os profissionais destacaram que a cultura do profissional influencia no funcionamento seguro das clínicas de hemodiálise, conforme citado:

Mas o que eu acho que dificulta mais ainda é realmente a cultura do profissional. (E9)

A segurança do paciente depende muito dos profissionais, da capacitação deles, se eles estão preparados para as intercorrências. (E36)

Apesar da cultura profissional influenciar no nível de segurança do paciente, os profissionais também enfatizaram a influência do paciente com doença renal crônica na sua própria segurança, conforme a Classe 2 descrita abaixo.

Classe 2 - Papel do paciente na sua segurança em clínicas de hemodiálise (25,9%)

A Classe 2 enfatiza o quanto pacientes necessitam conhecer a temática “segurança do paciente”, visto que as atitudes deles influenciam no cuidado prestado pela equipe de enfermagem. Com isso, dentre as falas, destacou-se: o conhecimento do paciente, as barreiras impostas pelos pacientes no dia-a-dia das clínicas de hemodiálise e a influência externa no cuidado seguro nas clínicas de hemodiálise.

O conhecimento dos pacientes foi citado como um ponto essencial, visto que pacientes que receberam orientações prévias têm maior autocuidado. Contudo, as clínicas de hemodiálise não apresentam um padrão no perfil dos pacientes, conforme as falas:

Tem paciente que observa tudo que você faz. Ele observa até se realmente aquilo é dele, mas tem outros que se senta em uma cadeira dessas e nem presta atenção se é o sistema dele nem nada. (E1)

Alguns pacientes têm bastante conscientização. Eles chegam e já olham se é o capilar dele, se na placa o nome está correto. Tem paciente que presta atenção em tudo, tem uns que estão sentados aqui e já presta atenção no outro paciente que está em frente. (E11)

Tem paciente que é colaborativo, é disciplinado porque ele sabe que não pode utilizar o material do outro paciente pra não correr o risco, ele tem esse olhar. Ás vezes eu percebo tem paciente que sentadinho na poltrona, ele esqueceu de olhar depois de sentado ele levanta e olha, ainda não está ligado ainda dá tempo, essa questão mesmo é cultura. (E14)

Um paciente bem esclarecido, bem orientado no cuidado com a fístula... não vai colocar peso na fístula, ele vai lavar bem pra evitar infecção, ele não vai colocar um relógio, ele não vai deixar que ninguém aperte o braço dele, isso serve muito pra qualidade de vida dele. (E18)

Ademais, os enfermeiros e técnicos de enfermagem falaram com clareza sobre as barreiras impostas pelos pacientes no dia-a-dia das clínicas de hemodiálise, principalmente em relação ao uso do crachá de identificação, assiduidade e pressa para sair, conforme citado:

Os mais idosos são bem mais difíceis. Às vezes eles querem fazer coisas que não podem, por exemplo, às vezes eles querem se levantar e andar até a balança sozinhos às vezes a gente diz: não, você não pode. eles são bem teimosinhos. (E5)

Às vezes tem um paciente que é um pouco mais difícil em aceitar as coisas, em colocar um crachá, de se identificar, porque eles dizem que não estão nem trabalhando na hemodiálise... a medicação, às vezes eles aceitam, às vezes eles dizem não quero. (E8)

Nós temos exemplo aqui de paciente que se recusa a usar a identificação, de assinar um termo de consentimento, tem gente que tem esse tipo de problema. (E9)

O problema que está ocasionando aquela falta de assiduidade no próprio tratamento. Ás vezes o paciente não adere bem, às vezes o próprio problema social que ele vive, é familiar. (E18)

Também tem a dificuldade de aceitar o tratamento, porque muitos não aceitam não, faltam por motivo nenhum. (E24)

A principal dificuldade é quando o paciente é cabeça dura, a gente tenta explicar as coisas pra ele e ele não quer entender. (E27)

Tem paciente que é muito nervoso, que às vezes quer arrancar as agulhas, quer sair mais cedo, mas a gente tenta conversar com o paciente. (E28)

Tem uns que são muito teimosos, resistentes. Tem uns que quando dá o horário dizem eu faço 3 horas, 4 horas e já quer se desligar logo. Tem uns que querem tirar as agulhas, aí eu digo vai puxar, vai sangrar, vamos pensar bem, é tua vida que está em risco, vamos conversar, às vezes eu driblo, mas às vezes é difícil de driblar. (E24)

Além da influência do paciente no dia-a-dia das clínicas de hemodiálise, os profissionais entrevistados falaram sobre a rotina do serviço e as medidas adotadas para prevenção de eventos adversos, conforme Classe 3.

Classe 3 - Atuação da equipe de enfermagem no cuidado seguro do paciente em tratamento hemodialítico (24%)

Na Classe 3, os profissionais iniciaram falando sobre a rotina das clínicas de hemodiálise, com ênfase para o horário de funcionamento, os turnos de atendimento e a assistência oferecida, conforme citado:

Aqui funciona de 6 às 22, nesse período a gente tem que fazer o tratamento de três turnos. (E16)

O turno se inicia, o enfermeiro vai checar no quadro a programação dos pacientes e passa em todas as máquinas vendo se o quadro está de acordo com a programação de cada máquina. (E19)

Aqui geralmente a gente procura sempre ficar atualizando as coisas e sempre é tudo bem explicadinho, desde a administração até eles entrarem lá dentro. (E35)

A gente recebe o paciente na hemodiálise, a gente vai ter todos os cuidados, ver a pressão, o rebaixamento, a hipotensão, o risco que eles correm, ter o cuidado na hora de puncionar pra não fazer o hematoma. (E24)

Os profissionais relataram também relataram as medidas adotadas para a prevenção de eventos adversos nas clínicas de hemodiálise e a importância de checklists nesse processo, conforme as falas:

Eu acho que seria útil tendo um checklist de passagem de plantão, porque a gente vê aqui que as meninas só passam aquele paciente que hoje ele vai fazer hemodiálise sem heparina, paciente que está com horário diminuído. (E9)

Aqui não tinha antes o checklist que agora tem e já melhorou muito. (E36)

A gente também tem que prestar mais atenção... O médico passa um esquema de antibiótico, a gente só coloca lá pra tomar antibiótico 5 doses, a gente só faz colocar no prontuário o dia que ele tomou a primeira e vai colocando os dias que eles vão tomando, mas um checklist não tem não. (E17)

Por fim, complementando as falas sobre a prevenção de eventos adversos, a Classe 4 apresenta informações sobre a implantação das metas internacionais de segurança do paciente nas clínicas de hemodiálise.

Classe 4 - Metas internacionais de segurança do paciente nas clínicas de hemodiálise (23,4%)

Na Classe 4, os profissionais da equipe de enfermagem falaram sobre as medidas adotadas para implementação da segurança do paciente e as falhas nas metas internacionais de segurança do paciente. Em relação às medidas adotadas no dia-a-dia das clínicas de hemodiálise, houveram relatos relacionados a: Identificação do paciente, identificação de linhas e capilares e cuidado relacionado a sorologia do paciente, conforme falas:

Quando sai a sorologia que eles vão pra outras máquinas, se der positivo eles não ficam aqui (vão para uma sala específica), positivo de alguma outra coisa, tipo hepatite ou alguma outra coisa eles não ficam. (E4)

É identificado no capilar o nome do paciente e em cada linha para depois quando vem aqui pro reprocessamento. (E7)

Nós temos a plaquinha da identificação do paciente, temos o capilar propriamente dito identificado e temos o crachá. (E14)

A gente faz a identificação do capilar, identificação da plaquinha que é o crachá também, tem todo o processo de higienização do capilar. (E16)

A segurança em si é conferir o capilar, conferir as linhas. O próprio capilar tem o nome do paciente, a patologia dele, se ele é positivo ou negativo pra essa patologia, o próprio sistema venoso e arterial é identificado, a própria placa é identificada, medicação só é feita se for uma necessidade. (E17)

Você tem que conferir o prontuário, conferir o nome do paciente, diluir, identifica. (E18)

Além dos cuidados realizados na rotina dos serviços, os profissionais entrevistados citaram as falhas nas metas internacionais de segurança do paciente relacionadas a troca de capilar e medicação, conforme dito:

A gente muitas vezes peca, sempre acontece de a gente trocar um capilar, às vezes não dá certo a punção, faz um hematoma... quando ocorre essas coisas que a gente fica até chateado, mas não tem como, a gente é ser humano, acontece. (E7)

A pessoa colocar um capilar de outro paciente aí vai lá e troca o paciente, isso complica muito... isso é um erro, de ligar ele e não ter conferido se é o capilar mesmo dele. (E12)

Tais resultados enfatizam os desafios vivenciados pela equipe de enfermagem para manter a segurança do paciente nas clínicas de hemodiálise.

DISCUSSÃO

Dentro da Classe 1, relacionada ao funcionamento seguro das clínicas de hemodiálise, a partir das colocações feitas, ficam evidentes os aspectos de que ambientes de trabalho oportunos e equipamentos médicos apropriados estão relacionados à redução de eventos adversos, do tempo de permanência do paciente e de mortes associadas aos cuidados de saúde1010. Siman AG, Braga LM, Amaro MOF, Brito MJM. Practice challenges in patient safety. Rev Bras Enferm. 2019;72(6):1504-11. doi: http://doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0441
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Avanços tecnológicos em hemodiálise vêm alcançando destaques em grande escala. A conformação das máquinas de hemodiálise está conectada a melhoria da prestação da assistência ao paciente tornando o tratamento mais satisfatório, fornecendo dados pertinentes para o trabalho dos profissionais envolvidos no procedimento1111. Neumann ME. Technology improves home dialysis machines. Nephrol News Issues. 2020 [cited 2022 May 30]. Available from: https://www.healio.com/news/nephrology/20200122/technology-improves-home-dialysis-machines
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Ainda nessa perspectiva de funcionamento seguro das clínicas de hemodiálise, destaca-se, também, a cultura de segurança, pois envolve as atitudes e percepções individuais dos profissionais, de como sentem a organização, os comportamentos e as ações que as pessoas fazem na organização1212. Li J, Goerlandt F, van Nunen K, Ponnet K, Reniers G. Conceptualizing the contextual dynamics of safety climate and safety culture research: a comparative scientometric analysis. Int J Environ Res Public Health. 2022;19(2):813. doi: https://doi.org/10.3390/ijerph19020813
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Dentre os aspectos relativos à cultura de segurança relatados pelos profissionais, que repercutem como desafios, destaca-se a diferenciação entre advento adverso e intercorrência. De acordo com pesquisadores internacionais, a segurança do paciente é um processo multifatorial relacionado a fatores não modificáveis (associados ao paciente) e fatores modificáveis (incidentes durante o procedimento)1313. Suárez MDT, Rodas L, Quíntela M, Mejía AP. Valoración de la seguridad del paciente en la práctica clínica de terapia renal sustitutiva en las unidades de vigilancia intensiva. Enfermería Nefrol. 2023;26(1):49-58. doi: https://doi.org/10.37551/s2254-28842023006
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Vale destacar que as intercorrências que ocorrem durante as sessões de hemodiálise podem estar associadas a questões relacionadas ao processo de filtração artificial do sangue ou as comorbidades inerentes à insuficiência renal1414. Santos KAS, Souza WB, Silva CS, Alves AA, Fortes GN, Fortes MF, et al. Principais intercorrências durante sessões de hemodiálise em pacientes com comorbidades. Braz J Dev. 2021;7(2):14066-79. doi: https://doi.org/10.34117/bjdv7n2-162
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. Já quanto aos eventos adversos, são lesões acidentais provocadas e/ou aumentadas pelas más práticas assistenciais durante o diagnóstico, tratamento ou internação e não pela própria doença de base1515. Agency for Healthcare Research and Quality. Patient Safety Network 2019. Adverse events, near misses, and errors [Internet]. 2019 [cited 2022 May 30]. Available from: https://psnet.ahrq.gov/primer/adverse-events-near-misses-and-errors
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Nesse viés, cabe aos profissionais se manterem resguardados de conhecimentos tanto técnicos como científicos, pois, isso lhes possibilitará um olhar minucioso para lidar e diferenciar as situações que podem surgir durante as sessões, sejam intercorrências ou eventos adversos em hemodiálise, de modo a adotar uma série de medidas, considerando as especificidades de cada paciente e a complicação em curso1616. Lee JJ, Jeon MY, Kim GN, Jeong DI. Effect of dialysis nurses’ perception of patient safety risk factors and patient safety competency on safety nursing activities. J Korean Clin Nurs Res. 2021;27(2):210-9. doi: https://doi.org/10.22650/JKCNR.2021.27.2.210
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Relativo a problemática de mecanicidade das ações, vai ao encontro da literatura sobre a temática que evidenciam que esta é algo presente no tratamento hemodialítico e que na continuidade, leva os profissionais a apresentarem comportamentos automáticos e gera aspectos de fragilidade em rotinas marcadas pela pressão do tempo e a repetição de tarefas1717. Lima MMS. Análise da segurança do paciente com doença renal crônica em clínicas de hemodiálise [dissertação]. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará; 2021 [cited 2022 Jun 03]. Available from: http://www.repositorio.ufc.br/handle/riufc/57472
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Os profissionais possuem dificuldade em convergir formação e atuação com o discurso e a prática, julgam o tempo de serviço no setor, a autoconfiança, a experiência e a resistência como fatores que dificultam a não utilização dos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) ou uso incompleto e adesão da higiene das mãos nos devidos momentos1818. Souza GSD, Coelho HP, Sales JKD, Pereira HCV, Borges AMM, Alencar AMV. Medidas de biossegurança na assistência de enfermagem a pacientes hemodialíticos: revisão integrativa. Rev Baiana Enferm. 2022;36. doi: https://doi.org/10.18471/rbe.v36.38203
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Mudanças na cultura organizacional e na cultura individual do profissional de saúde podem influenciar positivamente na cultura de segurança do paciente, tornando-se essencial para a assistência segura e de qualidade, já que impactam na motivação e comportamentos seguros, com reflexos na prática diária1919. Hessels AJ, Paliwal M, Weaver SH, Siddiqui D, Wurmser TA. Impact of patient safety culture on missed nursing care and adverse patient events. J Nurs Care Qual. 2019; 34(4): 287-294. doi: https://doi.org/10.1097/NCQ.0000000000000378
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Conforme a Classe 2 sobre o papel do paciente na sua segurança em clínicas de hemodiálise, confirma-se por meio da ênfase dos profissionais que a participação do paciente é cada vez mais estimada como constituinte dos cuidados de saúde é um item crítico de serviços seguros. Um estudo, publicado em 2019 pela Comissão da Lancet Global Health, reforçou a concepção de que os profissionais de saúde devem discernir que a segurança do paciente é uma via de mão dupla. Os pacientes devem estar envolvidos e ser o centro em seus próprios cuidados2020. The Lancet. Patient safety: too little, but not too late [editorial]. Lancet. 2019;394(10202):895. doi: https://doi.org/10.1016/S0140-6736(19)32080-X
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. Por sua vez, pesquisadores da Espanha, evidenciaram que a participação do paciente é diversa e compreende desde a educação sobre os riscos até a atuação no monitoramento das práticas de segurança dos profissionais2121. Añel Rodríguez RM, Aibar Remón C, Martín Rodríguez MD. La participación del paciente en su seguridad. Aten Primaria. 2021;53(Suppl 1):102215. doi: https://doi.org/10.1016/j.aprim.2021.102215
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Portanto, o paciente deve ser sempre o foco da assistência. Em vista disso, as instituições de saúde têm adotado diretrizes e princípios de segurança do paciente para a melhoria dos cuidados prestados, um desses princípios está relacionado com os “Pacientes pela segurança do paciente em serviços de saúde”. Em âmbito nacional, a ANVISA esclarece que “o paciente deve colaborar com a prevenção dos erros, ficando atento às etapas mais críticas do trabalho, de forma a participar dessas etapas de forma proativa”22. Ministério da Saúde (BR). Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Pacientes pela segurança do paciente em serviços de saúde: Como posso contribuir para aumentar a segurança do paciente? Orientações aos pacientes, familiares e acompanhantes [Internet]. Brasília, DF: Anvisa; 2017 [cited 2022 May 30]. Available from: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/centraisdeconteudo/publicacoes/servicosdesaude/publicacoes/guia-como-posso-contribuir-para-aumentar-a-seguranca-do-paciente-orientacoes-aos-pacientes-familiares-e-acompanhantes/view
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O incentivo à participação dos pacientes não deve ocorrer simplesmente na intenção de advertir aos profissionais de saúde sobre possíveis atitudes descuidadas, mas também de criar meios para abordar com os pacientes falhas ou erros com o propósito de que não se reproduzam. É preciso que o paciente esteja na qualidade de colaborador para que o sistema possa evoluir, portanto, cabe aos profissionais validar, em vez de reprimir, a fala do usuário, de modo a impedir que ele, na qualidade de vítima, assuma posição de conflito2222. Behrens R. Segurança do paciente e os direitos do usuário. Rev Bioet. 2019;27(2). doi: https://doi.org/10.1590/1983-80422019272307
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Na Classe 3, sobre a atuação da equipe de enfermagem no cuidado seguro do paciente em tratamento hemodialítico, têm-se a relação das principais práticas para o cuidado seguro em hemodiálise. Destacaram-se nas falas os seguintes cuidados: observar a programação das máquinas, verificar os sinais vitais e usar um checklist para guiar a assistência. Todas essas práticas mencionadas corroboram com os achados de outros estudos e seguem sendo indispensáveis33. Rocha RPF, Pinho DLM. Segurança do paciente em hemodiálise. Rev Enferm UFPE Online. 2018;12(12):3360-67. doi: https://doi.org/10.5205/1981-8963-v12i12a235857p3360-3367-2018
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,2323. Hamid HA, Bouanane H, Ibrahim A, Ismail S, Sayed A, Mahmoud KM, et al. Effective prevention bundle to eliminate catheter-related bloodstream infections in ambulatory hemodialysis patients. Can J Infect Control. 2019;34(1):54-7. doi: https://doi.org/10.36584/CJIC.2019.007
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Como um meio de melhorar a assistência e segurança das sessões, foi citado também o uso da lista de verificação ou checklist. As altas taxas de infecções da corrente sanguínea relacionadas ao cateter de hemodiálise em uma instituição do Catar, fez com que pesquisadores internacionais implantassem um novo protocolo para guiar a assistência. Tal medida reduziu a taxa de infecção de 1,4/1.000 em 2011 para 0,014/1.000 em 2017, atingindo uma redução de 99% (p < 0,001)2323. Hamid HA, Bouanane H, Ibrahim A, Ismail S, Sayed A, Mahmoud KM, et al. Effective prevention bundle to eliminate catheter-related bloodstream infections in ambulatory hemodialysis patients. Can J Infect Control. 2019;34(1):54-7. doi: https://doi.org/10.36584/CJIC.2019.007
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. O uso de protocolos e check-list auxilia nas condutas habituais que otimiza o tempo, padroniza registros e dá continuidade a assistência de cuidados prestados ao paciente2424. Bayoumi M, Ahmed A, Hassan H. Nurse´s pratices toward applying infection control measures using NOTICE checklist at a dialysis unit. In: Papathanassoglou E, Williams G, editors. The World of Critical Care Nursing. 2019;13(2):90-101. doi: https://doi.org/10.1891/1748-6254.13.2.90
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Por conseguinte, entende-se que o procedimento de hemodiálise necessita de cuidados específicos e de qualidade, mediante o auxílio de ferramentas para guiar essa assistência com o intuito de fornecer um cuidado seguro, efetivo e de qualidade.

Na Classe 4, sobre as metas internacionais de segurança do paciente nas clínicas de hemodiálise, percebe-se que o conhecimento dos profissionais de enfermagem sobre segurança do paciente repercute positivamente nesse processo e que a adoção de condutas individuais e coletivas contribui para a satisfação e qualidade dos serviços prestados. Indo ao encontro de tais achados, pesquisadores brasileiros identificaram que as principais condutas para promover a segurança do paciente estão relacionadas ao ensino, assistência e gestão. Todas as estratégias estão inter-relacionadas e devem ser utilizadas em conjunto para melhorar a segurança do paciente com doença renal2525. Mendes SROL, Pessoa NRC, Santos GMR, Costa NFCG, Frazão CMFQ, Ramos VP. Strategies to promote patient safety in hemodialysis: an integrative review. Nephrol Nurs J. 2020;47(5):447-54. doi: https://doi.org/10.37526/1526-744X.2020.47.5.447
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Foi possível notar que a compreensão da maioria das falas pode ser enquadrada em aspectos relacionados às metas internacionais da segurança do paciente2626. Joint Commission International. Manual internacional de padrões para acreditação de hospitais da Joint Commission International. 7. ed. 2021. [cited 2023 Jun 19]. Available from: https://cbacred.org.br/site/novidades-manual-jci-7a-edicao
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, com foco principalmente na: identificação correta dos pacientes, melhora na comunicação eficaz, .melhora na segurança dos medicamentos de alto risco prescritos e redução no risco de infecções associadas. Dentre todas as metas, percebeu-se uma melhor fluidez no entendimento dos aspectos relacionados à identificação correta dos pacientes.

Os profissionais do estudo mencionaram as estratégias utilizadas pelas clínicas para identificação dos pacientes. Foram mencionados a existência de crachás de identificação dos pacientes, identificação verbal e de placas padronizadas que ficam afixadas aos sistemas de hemodiálise durante a sessão de modo que o paciente pudesse fazer uma dupla checagem. O uso de identificação está estabelecido na maior parte dos hospitais, mas precisa ser adaptado nos setores de atendimento especializado como as clínicas de hemodiálise.

Segundo a percepção dos profissionais, a segurança do paciente foi considerada importante por todos, e verificou-se que a sua aplicação envolve mais que o cumprimento de metas a serem seguidas, requerendo do profissional, além do conhecimento da sequência das práticas seguras assistenciais que o processo dialítico demanda, uma visão sistemática do processo de trabalho e sensibilidade para conciliar as necessidades do paciente às condições de trabalho2727. Feo R, Conroy T, Wiechula R, Rasmussen P, Kitson A. Instruments measuring behavioral aspects of the nurse‐patient relationship: a scoping review. J Clin Nurs. 2019;29(11):1-14. doi: https://doi.org/10.1111/jocn.14947
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Apesar de tais achados, um estudo realizado em uma clínica de referência em hemodiálise no Estado do Ceará identificou que apenas o nome do paciente era conferido antes da terapia substitutiva, não sendo adotado o uso de pulseiras como forma de identificação. Tais fatores contribuem para a ocorrência de eventos adversos2828. Aguiar LL, Guedes MVC, Oliveira RM, et al. Enfermagem e metas internacionais de segurança: avaliação em hemodiálise.Cogitare Enferm. 2017;22(3). doi: http://doi.org/10.5380/ce.v22i3.45609
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De acordo com um estudo realizado no Canadá, o baixo dimensionamento e a alta carga horária semanal dos profissionais da equipe de enfermagem estão associados com o não cumprimento das normas de segurança das instituições de hemodiálise, tornando-se necessário que gestores e políticos estejam atentos a tais fatores2929. Jennifer Dillon MPA. Registered nurse staffing, workload, and nursing care left undone, and their relationships to patient safety in hemodialysis units. Nephrol Nurs J. 2020;47(2):133-42. doi: https://doi.org/10.37526/1526-744x.2020.47.2.133
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Como limitações, destaca-se o não atendimento a um dos itens do COREQ, cujo assunto trata da necessidade de devolver as transcrições das falas para os participantes com o intuito de confirmar o que foi dito durante as entrevistas, no entanto as transcrições foram revisadas por três pesquisadores.

CONCLUSÃO

Os profissionais percebem a segurança do paciente fragilizada e desafiadora, uma vez que máquinas/equipamentos, insumos e cultura do profissional influenciam de forma direta no funcionamento seguro das clínicas de hemodiálise. Os participantes reconhecem, também, a presença de falhas nas metas de segurança do paciente, principalmente, a falta de identificação dos pacientes, o que ocasiona trocas de capilares, além dos erros na administração de medicações.

A maneira como os profissionais vêem a temática segurança do paciente e os principais fatores que corroboram para a ocorrência de eventos adversos, oferecem subsídios para que os gestores dos serviços de saúde busquem a aquisição de máquinas e insumos mais atualizados, bem como, realizem educações permanentes e implementem protocolos para prevenção de erros relacionados às metas de segurança, principalmente no processo de identificação do paciente e administração de medicamentos.

Ademais, sugere-se a realização de novos estudos em outros estados brasileiros, com profissionais vinculados ao sistema privado e o desenvolvimento de tecnologias educativas voltadas para capacitar o paciente com doença renal crônica sobre a temática segurança do paciente em clínicas de hemodiálise.

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  • Contribuição de autoria:

    Administração do projeto: Joselany Áfio Caetano. Análise formal: Joselany Áfio Caetano. Conceituação: Joselany Áfio Caetano. Escrita - rascunho original: Francisca Geisa Silvestre Rocha, Magda Milleyde de Sousa Lima, Cristina da Silva Fernandes. Escrita - revisão e edição: Lívia Moreira Barros, Joselany Áfio Caetano. Investigação: Magda Milleyde de Sousa Lima, Francisca Geisa Silvestre Rocha, Cristina da Silva Fernandes. Metodologia: Magda Milleyde de Sousa Lima, Francisca Geisa Silvestre Rocha, Cristina da Silva Fernandes. Software: Nelson Miguel Galindo Neto.

Editado por

Editor associado:

Carlise Rigon Dalla Nora

Editor-chefe:

João Lucas Campos de Oliveira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    19 Fev 2023
  • Aceito
    22 Jun 2023
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