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Influência do tempo de reação simples na seleção de jovens talentos no tênis

Simple reaction time applied for selecting young talents in tennis

Resumos

Este estudo objetivou apresentar a importância dos tempos de reação simples, cognitivo e motor, na seleção de talentos para o tênis. Participaram 240 jovens de seis a 13 anos (9,61 ±1,64), de ambos os sexos. Os voluntários foram submetidos e aprovados, na primeira fase do estudo, em um teste de habilidades específicas da modalidade (ITN). Na segunda fase, foram submetidos a um teste de tempo de reação simples. Foi realizada Ancova para identificar diferenças no ITN tendo o tempo de reação como variável independente e idade como covariável. Os resultados mostraram que houve diferença para o ITN entre os grupos de tempo de reação cognitivo ajustado para a idade (p=0,04) e não houve diferença entre as médias de ITN quando se comparou o tempo de reação motor (p=0,162). Conclui-se que o tempo de reação cognitivo é uma variável importante no processo de detecção de talentos em tênis.

Tenistas; Detecção de talentos; Avaliação cognitiva; Tomada de decisão


The present study aimed at presenting the importance of simple reaction times, both cognitive and motor, in selecting potential talents in tennis players. Two hundred and forty young people participated in the study, from six to thirteen years old, of both sexes. The volunteers were subjected and approved during the first phase of the study, with a skill test specific for the modality (ITN). In the second phase, a test of simple reaction time was applied, stratifying the results by cognitive and motor time. It was used the ANCOVA test in order to identify differences for ITN, assuming the reaction time as an independent variable and the age as a covariate. Results show differences for ITN among the groups of cognitive reaction time adjusted for age (p=0,04) and there was no difference by observing the comparison among the results of motor reaction time (p=0,162). It is concluded that the cognitive reaction time is an important variable in the process for identifying talents in tennis.

Tennis Players; Talent detection; Cognitive evaluation; Decision making


ARTIGOS ORIGINAIS

Influência do tempo de reação simples na seleção de jovens talentos no tênis

Simple reaction time applied for selecting young talents in tennis

Franco NoceI; Tadeu Sartini FerreiraII; Clarice Zinato MoreiraII; André Gustavo Pereira de AndradeIII; Marco Túlio de MelloIV; Varley Teoldo da CostaV

IIDoutor. Professor Adjunto do Curso de Educação Física da Universidade Federal de Ouro Preto, OuroPreto-MG, Brasil

IIDiscente em Medicina, Centro Universitário de Belo Horizonte, Belo Horizonte-MG, Brasil

IIIDoutor. Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte-MG, Brasil

IVDoutor. Professor Associado do Departamento de Psicobiologia, da Universidade Federal de São Paulo, São Paulo-SP, Brasil

VDoutor. Professor Adjunto do Departamento de Educação Física da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte-MG, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Franco Noce. Laboratório de Psicologia do Esporte (LAPES/CENESP/UFMG). Av. Pres. Antônio Carlos, 6627, Campus – Pampulha Belo Horizonte-MG, CEP 31270-901 E-mail: fnoce@hotmail.com

RESUMO

Este estudo objetivou apresentar a importância dos tempos de reação simples, cognitivo e motor, na seleção de talentos para o tênis. Participaram 240 jovens de seis a 13 anos (9,61 ±1,64), de ambos os sexos. Os voluntários foram submetidos e aprovados, na primeira fase do estudo, em um teste de habilidades específicas da modalidade (ITN). Na segunda fase, foram submetidos a um teste de tempo de reação simples. Foi realizada Ancova para identificar diferenças no ITN tendo o tempo de reação como variável independente e idade como covariável. Os resultados mostraram que houve diferença para o ITN entre os grupos de tempo de reação cognitivo ajustado para a idade (p=0,04) e não houve diferença entre as médias de ITN quando se comparou o tempo de reação motor (p=0,162). Conclui-se que o tempo de reação cognitivo é uma variável importante no processo de detecção de talentos em tênis.

Palavras-chave: Tenistas. Detecção de talentos. Avaliação cognitiva. Tomada de decisão.

ABSTRACT

The present study aimed at presenting the importance of simple reaction times, both cognitive and motor, in selecting potential talents in tennis players. Two hundred and forty young people participated in the study, from six to thirteen years old, of both sexes. The volunteers were subjected and approved during the first phase of the study, with a skill test specific for the modality (ITN). In the second phase, a test of simple reaction time was applied, stratifying the results by cognitive and motor time. It was used the ANCOVA test in order to identify differences for ITN, assuming the reaction time as an independent variable and the age as a covariate. Results show differences for ITN among the groups of cognitive reaction time adjusted for age (p=0,04) and there was no difference by observing the comparison among the results of motor reaction time (p=0,162). It is concluded that the cognitive reaction time is an important variable in the process for identifying talents in tennis.

Key words: Tennis Players. Talent detection. Cognitive evaluation. Decision making.

INTRODUÇÃO

Talento esportivo caracteriza-se por indivíduos que possuem aptidão especial para o desempenho esportivo (BOHME, 2007; VIEIRA, L.; VIEIRA, J., 2000). Para Bohme (2007), a detecção de talentos esportivos corresponde a todas as formas utilizadas para encontrar um número suficientemente grande de crianças e adolescentes que estejam dispostas e prontas para a admissão em um programa de formação esportiva geral básica, considerado como primeira etapa do treinamento em longo prazo.

Bolonhini e Daolio (2010) verificaram na literatura diversas definições e interpretações para o termo talento, estando estas definições relacionadas às pessoas que atingem resultados superiores aos das outras, situadas no mesmo estágio de vida, pelas suas capacidades de desempenho; pelas disposições para alcançar altos desempenhos esportivos ou mesmo pelas pessoas que possuem aptidão especial para o desempenho esportivo. Para Tucker e Collins (2012), um desempenho de alto nível é influenciado por uma combinação de inúmeros fatores, sendo que se destacam componentes genéticos e prática deliberada.

A detecção de talentos não deve ser baseada em um único teste motor ou de aptidão. Porém, a identificação é um processo de desenvolvimento, que se torna evidente nos treinamentos, testagem e mensuração sistemática, além da participação real em competições esportivas (HEBBELINCK, 1989).

Entende-se seleção de talentos esportivos como os meios utilizados para a determinação dos indivíduos que possuem condições de atingirem níveis mais altos de treinamento em longo prazo (KISS et al., 2004). Filin (1996) demonstra que na seleção de talento devem-se aplicar métodos de observação médico-biológica, pedagógica, psicológica e sociológica. Os métodos pedagógicos definem um nível de desenvolvimento das qualidades físicas, capacidades coordenativas e habilidade técnica desportiva. Já os métodos medicobiológicos consideram as particularidades morfofuncionais, nível do desenvolvimento físico, estado do organismo e estado de saúde do atleta. Kiss et al. (2004) apresentam um modelo no qual o desempenho depende da condição global do indivíduo, levando-se em consideração diversos aspectos, dentre eles, os cognitivos.

O tempo de reação é uma variável cognitiva importante para o sucesso em diversas modalidades. É compreendido pelo lapso de tempo entre a apresentação do estímulo e o início da resposta (SCHUHFRIED; PRIELER, 2005). Miyamoto e Meira Júnior (2004) dividem o tempo de reação em dois períodos: pré-motor e motor. A medida do tempo de reação simples pode ser utilizada como um método que determina a habilidade motora de um indivíduo (SCHMIDT; WRISBERG, 2010), podendo ser empregada para a seleção e detecção de um talento no tênis, de modo a avaliar as velocidades de reação tanto no aspecto motor quanto no cognitivo. O tênis de campo é uma modalidade individual de habilidades abertas, em que o tenista depende de um raciocínio rápido e eficiente para cada contexto (GRABB, 2003). No tênis moderno houve incremento significativo na velocidade do jogo. Por exemplo, os atletas de nível profissional têm conseguido efetuar o saque a mais de 200 km/h, o que torna muito difícil a tarefa de recebê-lo. Brody (2006) relatou que o recorde mundial de velocidade no saque é de 240 km/h, executado, até então, por Andy Roddick. Fleisig et al. (2003) avaliaram, durante os Jogos Olímpicos de Sydney/2000, a velocidade média do saque de homens (182,9 km/h) e de mulheres (149,4 km/h). Além disso, os profissionais têm conseguido manter os ralis a uma velocidade de mais de 100 km/h, exigindo dos adversários além de boa capacidade de reação, uma grande velocidade de movimento para se posicionar bem e efetuar um bom golpe (BRODY, 2006). Isto evidencia a importância da capacidade perceber e reagir no tênis de campo.

O tema detecção de talentos é um assunto que tem sido evidenciado cada vez mais na literatura. A necessidade de otimizar o processo tem motivado alguns pesquisadores a investir na área. A variável tempo de reação tem sido pouco destacada no processo e, em especial, sua estratificação em cognitivo (processos perceptivos) e motor (tempo de movimento).

O presente estudo objetiva apresentar a influência dos tempos de reação simples, tanto cognitivo quanto motor, na seleção de talentos para o tênis.

MÉTODOS

Procedimentos éticos

Os voluntários receberam explicações sobre os objetivos e procedimentos do estudo e puderam optar por participar ou não do mesmo. Os responsáveis pelos voluntários, menores de idade, assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) que autoriza a participação no estudo. Este trabalho foi previamente submetido e aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade Estácio de Sá de Belo Horizonte, protocolo n° 023/2010.

Amostra

Participaram deste estudo 240 jovens de seis a 13 anos (9,61 ± 1,60), sendo 159 (66,25%) do sexo masculino e 81 (33,75%) do feminino. Estes voluntários foram selecionados a partir de uma amostragem inicial de 6.000 jovens que passaram por uma bateria de testes de campo, proposta por Isnidarsi e Gonçalves (2005), composta por testes de habilidades específicas da modalidade (agilidade, velocidade, resistência, flexibilidade, testes de habilidades técnicas, coordenação óculo-manual). Essa bateria de testes (ITN) é adotada pela Federação Internacional de Tênis e pela Confederação Brasileira de Tênis para diagnosticar e classificar o desempenho dos praticantes. Para cada um dos testes da bateria foi obtida uma pontuação e, baseado no escore total, os jovens foram selecionados para o estudo. (http://www.itftennis.com/shared/medialibrary/pdf/original/IO_7604_original.PDF)

Instrumentos e procedimentos

Para obtenção dos tempos de reação, utilizou-se o teste computadorizado de reação simples do Sistema de Viena, na versão RT/S1 (SCHUHFRIED; PRIELER, 2005). Nesta versão do teste, apenas um tipo de estímulo é apresentado (uma luz amarela no centro da tela), sendo solicitada ao examinado uma reação mais rápida possível (Figuras 1a e 1b).



O teste (RT/S1) estratifica o tempo de reação em cognitivo (RTcog) e motor (RTmot). O primeiro é o tempo que decorre entre o início da apresentação do estímulo requerido e o abandono da tecla de descanso. O segundo é o intervalo de tempo entre o abandono da tecla de descanso e o contato com a tecla de reação, face aos estímulos requeridos.

O aparelho utilizado é composto de um monitor e um console de respostas dotado de uma tecla de descanso e outra tecla de reação, possibilitando segregar os tempos de reação, o cognitivo e o motor (SCHUHFRIED; PRIELER, 2005).

Os examinados foram submetidos a uma fase de treino (o equipamento possui um sistema que simula as condições que o examinado será submetido) com a finalidade de proporcionar a familiarização com o teste, garantindo o pleno entendimento com relação às características e particularidades do teste. Neste momento, os avaliadores fizeram correções quanto a eventuais formas equivocadas de execução (como, por exemplo, a antecipação). Na fase de teste, os voluntários submeteram-se a 28 estímulos, com duas séries contínuas de 14 intervalos aleatórios.

Procedimentos estatísticos

Para a análise estatística, foi utilizado o programa SPSS, versão 18 para Windows e adotado o nível de significância de p≤0,05. Utilizou-se o teste de Shapiro Wilk, dentro de cada faixa etária, com o objetivo de se verificar a normalidade dos dados. Para se verificar as possíveis relações entre os tempos de reação, cognitivo e motor, foi utilizado o coeficiente de correlação de Pearson. Antes de se realizar a análise de covariância (Ancova), a variável independente tempo de reação, estratificado em cognitivo (RTcog) e motor (RTmot), foi codificada tendo a mediana dos valores de tempo de reação como valor de corte para se criar os grupos. Assim, por exemplo, para o RTmot, foram formados dois grupos, sendo um com valores abaixo da mediana (1) e outros com os valores iguais ou acima da mediana (2) dos tempos de reação. O mesmo procedimento foi adotado para o RTcog.

Na análise inferencial, a Ancova foi utilizada para avaliar diferença média do ITN, variável dependente, entre os dois grupos de tempos de reação, ajustada pela covariável idade. A Ancova se justifica haja vista que há correlação entre a idade e o tempo de reação (GALLAHUE; OZMUN, 2005; GROUIOS, 1991; WILKINSON; ALLISON, 1989), confirmada no presente estudo, via Correlação de Spearman.

RESULTADOS

Os 240 voluntários foram organizados em três grupos por faixa etária (g1: 6 a 7 anos; g2: 8 a 10 anos; g3: 11 a 13 anos) de acordo com a classificação proposta por Gallahue e Ozmun, (2005). Houve a predominância na faixa etária do grupo 2 (N=135) em comparação às demais faixas etárias (g1: N=27; g3: N=78).

Na Figura 2 observa-se a influência da idade nos tempos de reação cognitivo e motor. Ao realizar comparações dos tempos de reação (cognitivo e motor) entre as faixas etárias, foram observadas diferenças significativas entre todas elas demonstrando a melhoria dos resultados com o avançar da idade.


Foi utilizada a Correlação de Spearman para se verificar a relação entre as faixas etárias e os tempos de reação cognitivo e motor. Observam-se correlações (moderada/baixa) significativas em que quanto maior a faixa etária menor os tempos de reação (Tabela 1)

Ao serem relacionadas as variáveis tempo de reação cognitivo e motor (Figura 3), foi obtida uma correlação (moderada/baixa) e significativa de r = 0,439 (p<0,000).


Nas Figuras 4a e 4b é mostrada uma correlação positiva (baixa) e significativa entre os tempos de reação, cognitivo e motor, com o teste de 30 m. O resultado demonstra que quanto maior a velocidade de reação, melhor o resultado no teste de 30 m. Ao serem utilizados os resultados do teste ITN (utilizado na primeira etapa do processo de seleção com os 6 mil voluntários), verifica-se uma correlação positiva (baixa) e significativa com os tempos de reação cognitivo e motor (Figuras 4c e 4d).





A influência da idade no tempo de reação simples foi ajustada na análise de covariância permitindo que fossem realizadas as comparações entre os valores médios de ITN (variável dependente indicadora de desempenho) entre os grupos definidos pela mediana dos tempos de reação (grupos acima e abaixo da mediana). Na Tabela 2 são apresentados os valores de médias ajustadas para a idade, bem como o valor p calculado.

Para o tempo de reação cognitivo houve diferença significativa (p=0,040) entre as médias de ITN dos dois grupos (acima vs abaixo da mediana). A mesma relação não foi observada para o tempo de reação motor (p=0,162).

DISCUSSÃO

O objetivo deste estudo é apresentar a importância dos tempos de reação simples, tanto cognitivo quanto motor, na seleção de talentos para o tênis. Na literatura, poucos estudos foram publicados com foco na modalidade tênis e, ainda menos se relacionando à questão do talento esportivo.

De certa forma, o conceito de talento confunde-se com o de expert, em que o talento apresenta potencial acima da média e o expert apresenta desempenho atlético superior e manifestam-se em todas as valências físicas, técnicas e mentais (TUCKER; COLLINS, 2012). Ollis, Macpherson e Collins (2006), baseado nos estudos de Ericsson (2003) e Ericsson e Lehmann (1996), discutem três características gerais para distinguir um expert, incluindo a habilidade de tomada de decisão (inclusive em condição de pressão), a habilidade de gerar reações rápidas e a habilidade de controle de movimento. Em especial, a habilidade de gerar reações rápidas é refletida na qualidade da tomada de decisão rápida e precisa de acordo com as demandas do ambiente. No caso, o tênis, como na maioria dos esportes, é uma modalidade em que a exigência mental (percepção, antecipação, reação, tomada de decisão) é elevada em função da grande velocidade imposta pelo jogo (ERICSSON; LEHMANN, 1996). Desta forma, o componente velocidade de reação toma um papel de destaque para o sucesso do atleta/praticante.

Diversos modelos para detecção do talento têm sido investigados e propostos. No DMGT (Differentiated Model of Giftedness and Talent - Modelo Diferenciado de Superdotação e Talento), apresentado por Gagné (2007), o limite mínimo para qualquer tipo de dom ou talento é colocado no percentil 90. Assim, aqueles que pertencem ao top 10% do grupo de referência em termos de suas habilidades naturais (por dons), ou habilidades sistematicamente desenvolvidas (pelo talento) merecem o rótulo relevante. Já, Matsudo, Araujo e Oliveira (2007) apresentam a proposta do índice Z para a predição do talento, em que Z equivale à distância que o avaliado se encontra na média de referência da população. Para o autor, é necessário um Z = 4 para que o indivíduo obtenha a classificação de talento.

As capacidades cognitivas fazem parte da maioria das propostas de detecção de talentos. Em diversas modalidades, a capacidade de reagir rapidamente a um estímulo pode ser determinante para a vitória (MIYAMOTO; MEIRA JÚNIOR, 2004). No tênis, em especial, o tempo de reação pode assumir um papel decisivo no rendimento esportivo. Essa afirmação pode ser explicada pelo aumento do nível da concorrência em esportes que exigem respostas aceleradas. Desta forma, o tempo disponível para produzir respostas diminui pela maior força e velocidade dos adversários de elite. Os atletas de elite têm que selecionar as respostas com base em sinais antecipados de percepção (ERICSSON; LEHMANN, 1996).

Nesse sentido, é importante compreender que o tempo de reação pode ser estratificado em cognitivo e motor. O tempo de reação cognitivo, segundo Manso et al. (1998), é caracterizado pelas seguintes etapas: (a) tempo que o receptor demora a captar o estímulo; (b) tempo que o estímulo demora a chegar aos receptores da zona cerebral até cada sentido correspondente; (c) tempo de elaboração da resposta (única parte realmente treinável); e (d) tempo que o estímulo demora a percorrer a via aferente até chegar à placa motora. Aqui apenas a etapa C é considerada como treinável.

Os resultados deste estudo mostraram correlações baixas, porém significativas, entre os tempos de reação e os indicadores de desempenho por meio do teste ITN (FIG. 4c e 4d). É possível observar também que, se separarmos os indivíduos que alcançaram o percentil 90 (conforme proposta de GAGNÉ, 2007), nos tempos de reação (286 ms para o cognitivo; 136 ms para o motor), estes também apresentaram uma tendência a um bom desempenho no teste de aptidão específica ITN.

É esperado que a velocidade de reação diminua com o aumento da complexidade do estímulo. No estudo de Schweizer (1996), numa bateria de complexidade crescente de seis níveis, a velocidade caiu quase pela metade ao comparar-se à primeira com a sexta bateria. Como o tempo de reação é parte fundamental do complexo decisório (SCHMIDT; WRISBERG, 2010), o desempenho final também poderá ser influenciado por outros componentes do processo como, por exemplo, a antecipação.

A antecipação, segundo Manso et al. (1998), pode estar relacionada à experiência, o que pode melhorar o tempo de reação quando comparado ao de indivíduos menos experientes. Nesse sentido, a expertise adquirida (expressada muitas vezes pelo nível de experiência do atleta) pode dar uma vantagem ao executante. O expert além de ter uma maior velocidade dos processos perceptivos, também pode ter mais sucesso em situações de elevada demanda de velocidade por meio de um preciso processo de antecipação. Quando confrontados com situações representativas, os atletas de elite podem produzir as reações necessárias de forma mais rápida (HELSEN; PAUWELS, 1993) e fazer movimentos antecipatórios mais cedo do que atletas menos habilidosos. Para atingir esse nível de precisão, o sistema motor de atletas pode reagir em até 50 ms antes do contato com a bola (BOOTSMA; VAN WIERINGEN, 1990).

Neste estudo (Tabela 2), ao se comparar a variável indicadora de desempenho no tênis (ITN) com os grupos formados pelos tempos de reação maior e menor que a mediana (isto é, mais rápidos e mais lentos), foi observada diferença significativa apenas no tempo de reação cognitivo. Isto significa que a capacidade/velocidade de percepção diferenciou os voluntários de melhor desempenho.

Outra variável importante na detecção do talento é o tempo de movimento, que pode ser entendido como o lapso entre a primeira contração muscular e o final do movimento (por exemplo, a linha de chegada). A literatura descreve baixa associação entre o TR e o TM. Chagas et al. (2005) não encontraram correlações significativas, porém utilizando testes motores distintos. Magill e Powell (1975), em uma tarefa única utilizada para mensurar os dois tipos de tempo de reação, encontraram correlações moderadas e significativas, o que está de acordo com o nosso estudo (Figuras 4a e 4b).

Para compreender a melhoria observada no desempenho dos tempos de reação cognitivo e motor em relação à idade (Figura 2 e Tabela 1), Gallahue e Ozmun (2005) explicam que o desenvolvimento cognitivo e o motor iniciam-se após o nascimento e suas fases de desenvolvimento se relacionam à idade, portanto, quanto mais nova a criança menor o desenvolvimento quando comparado à criança mais velha.

O desenvolvimento motor se manifesta ao longo da vida. O indivíduo, aos poucos, vai aprendendo a se mover com eficiência, a controlar e a se adaptar às constantes alterações do meio. As influências genéticas e ambientais são fundamentais para compreender o desenvolvimento (RICE, 2001). Os marcos do desenvolvimento motor são bem estabelecidos, mas o ritmo de progressão é variável. Trata-se de um processo dinâmico, o que deve ser considerado de maneira multidimensional, relacionando-se às grandes áreas do desenvolvimento humano (cognitivo, afetivo e motor) que operam sobre o próprio indivíduo e também sobre o ambiente. Neste estudo, a comparação entre faixas etárias para os tempos de reação cognitivo e motor mostrou melhor desempenho significativo à medida que os voluntários envelhecem (Figura 2).

As limitações deste estudo envolvem a não-avaliação dos demais componentes do rendimento esportivo, como proposto por McLeod (1987), além da falta de equilíbrio na amostragem dos voluntários no que tange à faixa etária.

Este estudo contribui ao apresentar uma nova ferramenta para avaliação objetiva da variável em evidência neste estudo, bem como demais variáveis psicomotoras (MTTS - mental test and tranining system, HACKFORT; KILGALLEN; HAO, 2009). Ele contribui também para auxiliar no processo de detecção do talento esportivo para o tênis brasileiro.

CONCLUSÃO

Pode-se concluir que a idade influencia a capacidade de responder de forma veloz ao estímulo. Quando correlacionados os tempos de reação, cognitivo e motor, com um teste de desempenho específico (ITN), observaram-se valores moderados e significativos, o que evidencia a contribuição desta variável (tempo de reação) no processo de seleção de talentos.

Também é possível concluir que a contribuição da variável tempo de reação no processo de detecção de talentos ocorre, principalmente, por meio da variável estratificada "tempo de reação cognitivo" que representa a qualidade da percepção do atleta. No tênis de campo moderno, a velocidade do jogo aumentou de tal forma que a velocidade de movimento não é mais suficiente para o sucesso na execução de um bom golpe (o atleta deve se posicionar bem diante da bola, o que é pré-requisito para efetuar uma técnica eficiente), sendo cada vez mais necessária a qualidade dos processos perceptivos que permitam a antecipação das ações do adversário. Desta forma, o tempo de reação cognitivo se mostrou uma variável importante para selecionar jovens talentos para a modalidade Tênis de Campo.

Recebido em 30/04/2012

Revisado em 02/07/2012

Aceito em 04/09/2012

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  • Endereço para correspondência:

    Franco Noce.
    Laboratório de Psicologia do Esporte (LAPES/CENESP/UFMG).
    Av. Pres. Antônio Carlos, 6627, Campus – Pampulha
    Belo Horizonte-MG, CEP 31270-901
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Maio 2013
    • Data do Fascículo
      Set 2012

    Histórico

    • Recebido
      30 Abr 2012
    • Aceito
      04 Set 2012
    • Revisado
      02 Jul 2012
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