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Uso de resíduos de gesso como corretivo em solo salino-sódico

Use of gypsum residues as a corrective for saline-sodic soil

Resumos

Um dos grandes problemas enfrentados pelo setor da construção civil é a destinação final de resíduos, principalmente os resíduos de gesso, que têm sua aptidão para reciclagem restringida. No entanto, tais resíduos possuem altos teores de cálcio, em sua composição, podendo ser uma alternativa ao uso de gesso de jazida, na recuperação de solos salino-sódicos. Esta pesquisa objetivou avaliar a eficiência do uso de resíduos de gesso provenientes da construção civil, em relação ao gesso de jazida, na correção de solo salino-sódico. Foi utilizado delineamento em blocos casualizados, com arranjo fatorial constituído por dois tipos de corretivo (resíduos de gesso e gesso de jazida) e cinco lâminas de lixiviação (0,5; 1,0; 1,5; 2,0; e 2,5 vezes o volume de poros do solo), com três repetições. Foram avaliadas as variáveis condutividade elétrica, cátions solúveis e relação de adsorção de sódio, no extrato de saturação do solo. A aplicação de resíduo de gesso revelou ser eficaz na lixiviação de sais e sódio solúvel de solo salino-sódico, podendo ser recomendada, como fonte de cálcio, para a recuperação da sodicidade.

Reciclagem; sodicidade; relação de adsorção de sódio


One of the hugest problems faced by the civil construction sector is the final destination of residues, especially gypsum, which presents recycling restrictions. However, these residues present a high amount of calcium in their composition, and can be alternatively used for replacing mined gypsum as a saline-sodic soil corrective. This study aimed at evaluating the efficiency of gypsum residues from the civil construction, when compared to mined gypsum, for correcting a saline-sodic soil. A randomized blocks design was used, in a factorial arrangement consisting of two kinds of corrective (gypsum residue and mined gypsum) and five leaching depths (0.5, 1.0, 1.5, 2.0 and 2.5 times the soil pores volume), with three replications. Electric conductivity, soluble cations and sodium adsorption ratio were evaluated in the soil saturation extract. The use of gypsum residue proved to be effective in leaching salts and soluble sodium in saline-sodic soil, and can be recommended as a calcium source for recovering from sodicity.

Recycling; sodicity; sodium adsorption ratio


CIÊNCIA DO SOLO

Uso de resíduos de gesso como corretivo em solo salino-sódico

Use of gypsum residues as a corrective for saline-sodic soil

Paulo Medeiros dos SantosI; Mario Monteiro RolimII; Anamaria Sousa DuarteII; Maria de Fátima Cavalcanti BarrosIII; Ênio Farias de França e SilvaII

IInstituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (IFMA), Departamento de Ciências Agrárias, São Luís, MA, Brasil. E-mail: paulosantos@ifma.edu.br

IIUniversidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Departamento de Engenharia Agrícola, Recife, PE, Brasil. E-mails: rolim@dtr.ufrpe.br, asousaduarte@gmail.com, eefsilva@uol.com.br

IIIUniversidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Departamento de Agronomia, Recife, PE, Brasil. E-mail: fatima@depa.ufrpe.br

RESUMO

Um dos grandes problemas enfrentados pelo setor da construção civil é a destinação final de resíduos, principalmente os resíduos de gesso, que têm sua aptidão para reciclagem restringida. No entanto, tais resíduos possuem altos teores de cálcio, em sua composição, podendo ser uma alternativa ao uso de gesso de jazida, na recuperação de solos salino-sódicos. Esta pesquisa objetivou avaliar a eficiência do uso de resíduos de gesso provenientes da construção civil, em relação ao gesso de jazida, na correção de solo salino-sódico. Foi utilizado delineamento em blocos casualizados, com arranjo fatorial constituído por dois tipos de corretivo (resíduos de gesso e gesso de jazida) e cinco lâminas de lixiviação (0,5; 1,0; 1,5; 2,0; e 2,5 vezes o volume de poros do solo), com três repetições. Foram avaliadas as variáveis condutividade elétrica, cátions solúveis e relação de adsorção de sódio, no extrato de saturação do solo. A aplicação de resíduo de gesso revelou ser eficaz na lixiviação de sais e sódio solúvel de solo salino-sódico, podendo ser recomendada, como fonte de cálcio, para a recuperação da sodicidade.

Palavras-chave: Reciclagem; sodicidade; relação de adsorção de sódio.

ABSTRACT

One of the hugest problems faced by the civil construction sector is the final destination of residues, especially gypsum, which presents recycling restrictions. However, these residues present a high amount of calcium in their composition, and can be alternatively used for replacing mined gypsum as a saline-sodic soil corrective. This study aimed at evaluating the efficiency of gypsum residues from the civil construction, when compared to mined gypsum, for correcting a saline-sodic soil. A randomized blocks design was used, in a factorial arrangement consisting of two kinds of corrective (gypsum residue and mined gypsum) and five leaching depths (0.5, 1.0, 1.5, 2.0 and 2.5 times the soil pores volume), with three replications. Electric conductivity, soluble cations and sodium adsorption ratio were evaluated in the soil saturation extract. The use of gypsum residue proved to be effective in leaching salts and soluble sodium in saline-sodic soil, and can be recommended as a calcium source for recovering from sodicity.

Key-words: Recycling; sodicity; sodium adsorption ratio.

INTRODUÇÃO

No Brasil, as perdas de material, na construção civil empresarial, variam de 20% a 30%, dependendo do patamar tecnológico do executor. Porém, na construção tradicional, tais perdas tendem a ser maiores (Pinto 1999). Agopyan et al. (1998) afirmam que, nos canteiros de obra brasileiros, cujo processo construtivo não é o empresarial, 45% do gesso utilizado é desperdiçado. Cardoso et al. (2009), em pesquisa mais recente, relatam que a perda de gesso, na construção civil brasileira, é da ordem de 30%.

A disposição inadequada do gesso acarreta problemas ambientais, como a formação de gás sulfídrico (H2S), que é tóxico e inflamável, e a alteração da composição química dos solos e das águas (Alencar et al. 2011). Além disto, diversos problemas de saúde são relacionados à poeira gerada pelos resíduos de gesso (Medeiros et al. 2010). Face ao cenário descrito, existe grande preocupação, no tocante à gestão e gerenciamento dos resíduos de gesso, com formas de se reduzir o consumo de recursos naturais e a degradação ambiental, bem como melhorar a qualidade de vida da população, sendo a reciclagem uma das principais etapas utilizadas para o gerenciamento deste tipo de resíduo (Bernhoeft et al. 2011).

A Resolução Conama no. 307, de 5 de julho de 2002 (Brasil 2002), classifica os resíduos de construção e demolição (RCDs), de acordo com as possibilidades de reciclagem, em quatro classes: A - materiais reutilizáveis ou recicláveis como agregados; B - recicláveis para outros usos; C - materiais sem tecnologia de reciclagem economicamente viável; D - materiais com periculosidade. Segundo esta resolução, os resíduos de gesso, classificados como classe C, não podem ser misturados com outros materiais provenientes da construção civil, pois, devido à sua composição química, podem acarretar diversos tipos de problemas.

O uso de resíduos de gesso, como agregados, não tem gerado bons resultados, por não conferir resistência. John & Cincotto (2003) afirmam que a presença de gesso nos agregados fabricados com RCDs reciclados, utilizados para a execução de base e sub-base de pavimentos, poderia trazer problemas, a longo prazo, devido à formação de vazios, pela lixiviação do gesso. A presença de sulfatos na composição química do gesso pode comprometer a qualidade dos produtos cimentícios utilizados na produção de concretos e argamassas, ocasionando redução na resistência mecânica destes e diminuindo a vida útil das edificações (Collepardi 2003, Bernhoeft et al. 2011).

Por outro lado, os resíduos de gesso podem ser reciclados e reutilizados em outras atividades, como corretores de solos agrícolas (Carr & Munn 2001), aditivos para compostagem de resíduos sólidos e no tratamento de lodo de estações de tratamento de água e esgoto (John & Cincotto 2003). No entanto, existe uma enorme carência de estudos relacionados à reutilização de tais resíduos, no que diz respeito à correção de solos salino-sódicos e sódicos.

Os solos afetados por sódio são comuns em zonas áridas e semiáridas, sendo caracterizados pela presença de sódio em concentrações tão elevadas que ocorre a destruição da estrutura do solo, acarretando a diminuição da taxa de infiltração da água no solo, reduzindo, assim, a produção agrícola (Leite et al. 2007, Jalali & Ranjbar 2009, Gharaibeh et al. 2010, Tavares Filho et al. 2012).

A correção de solos com alta concentração de sais e sódio tem como objetivo a redução dos sais solúveis e do sódio trocável presentes no solo (Barros et al. 2004, Gharaibeh et al. 2009), podendo ser realizada mediante o uso de lâminas de lixiviação e de corretivos químicos.

Existem vários corretivos químicos que podem ser utilizados para a recuperação de solos com elevadas concentrações de sódio. Entretanto, por ser mais abundante, apresentar alta eficiência, menor custo de aquisição e maior facilidade de manuseio, o gesso de jazida é o corretivo mais utilizado para a correção de solos salino-sódicos (Barros et al. 2004, Leite et al. 2010, Yazdanpanah & Mahmoodabadi 2011) e, como a constituição química dos resíduos de gesso assemelha-se à do gesso de jazida, sua utilização pode ser uma boa opção para a recuperação da sodicidade dos solos.

Dessa forma, em virtude da crescente preocupação com o descarte dos resíduos de gesso e da necessidade de tecnologias viáveis, que possibilitem a reutilização deste resíduo em atividades rentáveis, esta pesquisa objetivou avaliar a eficiência do uso de resíduos de gesso provenientes da construção civil, em relação ao gesso de jazida, na correção de um Neossolo Flúvico salino-sódico.

MATERIAL E MÉTODOS

O solo utilizado neste estudo foi coletado no perímetro irrigado de Custódia (PE) (08º05'S, 37º38'W e 700 m de altitude). O clima da região é do tipo BShw, semiárido quente e seco, segundo a classificação de Köppen, com alternância de duas estações nitidamente delimitadas: a de chuvas, que ocorre de janeiro a junho, e a estação seca, que acontece de julho a dezembro.

A coleta foi realizada na camada de 0-40 cm de solo classificado como Neossolo Flúvico salino-sódico, o qual foi levado ao Laboratório de Aproveitamento de Resíduos e Mecânica dos Solos da Universidade Federal Rural de Pernambuco, em Recife (PE), onde foi instalado o experimento, o qual foi realizado de agosto a dezembro de 2009. Depois da coleta, as amostras de solo foram secas ao ar livre, destorroadas e peneiradas (malha de 2 mm), para determinação das características físicas e químicas (Tabela 1) (Embrapa 1997).

Adotou-se delineamento experimental em blocos ao acaso, em arranjo fatorial 2×5 (dois tipos de corretivo e cinco lâminas de lixiviação), com três repetições, totalizando 30 unidades experimentais. Os corretivos para a recuperação do solo utilizado no experimento foram o gesso de jazida, oriundo de uma jazida localizada no Pólo Gesseiro de Araripina (PE), e os resíduos de gesso provenientes de sobras e de refugos de placas pré-moldadas, empregadas na construção civil da cidade de Recife (PE). O gesso de jazida apresentou 32,90% de CaO e 0,50% de MgO, enquanto os resíduos de gesso apresentaram 28,70% de CaO e 0,50% de MgO, em sua composição.

As lâminas de lixiviação utilizadas foram equivalentes a 0,5; 1,0; 1,5; 2,0 e 2,5 vezes o volume de poros do solo (V.P.), correspondendo a 50,0 mm; 100,0 mm; 150,0 mm; 200,0 mm; e 250,0 mm de água.

A unidade experimental foi constituída de uma coluna de PVC, com 10 cm de diâmetro e 30 cm de altura, preenchida até a altura de 25 cm de solo, de modo a reproduzir a densidade do solo em condições de campo. Na base inferior da coluna, foram colocadas brita no. 0 e manta geotêxtil 100% poliéster, com a finalidade de sustentar o solo da coluna e permitir a passagem apenas da solução do solo. Para garantir maior uniformidade e homogeneidade do perfil de solo no interior da coluna, foram adicionadas camadas de solo com 5 cm de altura, aproximadamente, por meio de funil com haste longa.

A preparação do resíduo de gesso consistiu na trituração em moinho de bolas e no peneiramento das sobras e refugos das placas de gesso utilizadas na construção civil, sendo utilizado apenas o resíduo de gesso com granulometria inferior a 0,3 mm. Com o intuito de manter o gesso de jazida com a mesma granulometria do resíduo de gesso, realizou-se, também, o seu peneiramento.

A quantidade de gesso necessária para a recuperação do solo utilizado no experimento foi determinada por meio do método de Schonoover (1952), modificado por Barros & Magalhães (1989), para solos salino-sódicos do Estado de Pernambuco, denominado Schoonover M-1. Após o cálculo da quantidade de gesso a ser aplicada ao solo, os corretivos foram incorporados aos 5 cm superficiais da camada de solo.

As colunas contendo o solo e os corretivos foram saturadas, por capilaridade, com água deionizada, permanecendo em repouso, nesta umidade, por 24 horas, até estabelecer o equilíbrio entre a fração sólida e líquida. A fim de se evitarem perdas por evaporação, as colunas de PVC foram vedadas com filme plástico. Em seguida, as colunas de solo foram lixiviadas com água deionizada, mantendo-se lâmina constante de 2,0 cm, acima da superfície do solo.

Para a determinação dos cátions solúveis e condutividade elétrica do extrato de saturação (CEes), preparou-se uma pasta saturada, conforme metodologia proposta por Richards (1954). Em seguida, foram determinados, segundo Embrapa (1997), a CEes, pelo método eletrométrico; os teores de Ca2+ e Mg2+, por espectrofotometria de absorção atômica; e o teor de Na+, por fotometria de chama. A relação de adsorção de sódio (RAS) foi calculada a partir dos valores obtidos para cálcio, magnésio e sódio solúveis, conforme a expressão: RAS = (Na+)/[( Ca2+ + + Mg2+)/2]1/2.

Os dados obtidos foram submetidos à análise de variância e de regressão, considerando-se o nível de probabilidade de até 5%, pelo teste F. Para a comparação das variáveis entre os dois materiais estudados (gesso de jazida e resíduo de gesso), determinou-se o índice de concordância de Willmott (Willmott 1982).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A relação entre a variável independente (lâmina de lixiviação equivalente ao volume de poros) e a dependente (teor de sódio solúvel), para os dois tipos de corretivos utilizados, apresentou comportamento quadrático e coeficientes de determinação elevados (Figura 1). Observou-se, também, que o decréscimo no teor de sódio solúvel se relacionou com o aumento nas lâminas de lixiviação.


Na caracterização do solo (Tabela 1), foi possível verificar que o teor de sódio, no extrato de saturação do solo, era de 148,52 mmolc L-1. Depois da incorporação dos corretivos e da aplicação de lâmina de lixiviação equivalente a 0,5 vezes o volume de poros, este teor de sódio foi reduzido para 7,13 mmolc L-1 e 6,94 mmolc L-1, quando se utilizou gesso de jazida e resíduo de gesso, respectivamente, atingindo valores mínimos estimados pelas equações de regressão, quando utilizada fração de lixiviação equivalente a duas vezes o volume de poros do solo. Com isto, verificou-se que o resíduo de gesso utilizado na recuperação do solo estudado apresentou comportamento semelhante ao do gesso de jazida (Figura 1), o qual, associado a uma lâmina de lixiviação eficiente (no caso, a lâmina de lixiviação equivalente a duas vezes o volume de poros do solo), promoveu 95% de lixiviação do sódio solúvel existente no solo.

Vários estudos versam sobre a recuperação de solos salino-sódicos utilizando gesso de jazida, porém, raríssimos são os trabalhos sobre o emprego de resíduos de gesso para este fim. Contudo, com relação à aplicação de gesso jazida, os resultados aqui encontrados se assemelharam aos observados por Leite et al. (2010), quando utilizaram gesso de jazida e ácido sulfúrico, na recuperação de solo salino-sódico proveniente de Condado (PB), concluindo que a aplicação de gesso de jazida ao solo promoveu redução de 79% no teor de sódio solúvel, sendo que este corretivo, associado a uma lâmina de lixiviação, foi mais eficiente do que o ácido sulfúrico, na lixiviação deste íon.

Gharaibeh et al. (2010) utilizaram ácido fosfórico e fosfogesso, com o objetivo de recuperar um Calcisol Háplico salino-sódico proveniente de área agrícola localizada no sudeste do Vale do Rio Jordão, e concluíram que o sódio trocável do solo e a CEes diminuíram de 4,75 cmolc kg-1 para 0,85 cmolc kg-1 e de 54,4 dS m-1 para 2,35 dS m-1, respectivamente, sendo o ácido fosfórico mais eficiente na correção do solo em estudo do que o fosfogesso.

Observou-se que o cálcio e o magnésio solúvel apresentaram comportamento quadrático, em relação às lâminas de lixiviação aplicadas, independentemente do corretivo empregado na recuperação do solo (Figuras 2a e 2b). Verificou-se, também, que o teor de cálcio solúvel no solo foi maior quando se utilizou resíduo de gesso, em relação ao gesso de jazida. Este fato pode ter ocorrido devido à maior quantidade de cálcio existente no gesso de jazida, que favoreceu o aumento da floculação e da permeabilidade do solo, ocasionado perda de cálcio, no processo de lixiviação (Vasconcelos et al. 2013). Além disto, foi observada a formação de grumos, durante a incorporação do gesso reciclado, o que pode ter contribuído para o acúmulo de cálcio solúvel, uma vez que a reatividade de um corretivo é bastante influenciada pela sua granulometria.



Antes da incorporação dos corretivos, o teor de cálcio solúvel no extrato de saturação era de 50,26 mmolc L-1 (Tabela 1) e, após a aplicação dos corretivos e lixiviação do solo (lâmina equivalente a 1,5 o volume de poros), constatou-se aumento nos teores de cálcio solúvel, quando foram utilizados os resíduos de gesso (55,5 mmolc L-1) e de jazida (49,8 mmolc L-1), respectivamente, para correção do solo. Verificou-se, ainda, que lâminas de lixiviação superiores a 1,5 o volume de poros acarretaram redução do cálcio solúvel (Figura 2a), fato que não é interessante, do ponto de vista agrícola (Silveira et al. 2008).

Constatou-se, também, que o comportamento do magnésio presente no extrato de saturação do solo tratado com gesso de jazida foi semelhante ao do solo tratado com resíduo de gesso. A aplicação de lâminas de lixiviação crescentes provocou redução nos teores de magnésio solúvel. Antes da adição dos corretivos, o teor de magnésio solúvel era de 18,17 mmolc L-1, diminuindo para 3,99 mmolc L-1 e 4,77 mmolc L-1, quando se utilizou o gesso de jazida e o resíduo de gesso, respectivamente.

Os resultados encontrados nesta pesquisa, quanto aos teores de cálcio, corroboram os observados por Leite et al. (2007), quando aplicaram gesso de jazida em amostras de Luvissolos Crômicos salino-sódicos, provenientes de perímetros irrigados nos municípios de Condado e Souza (PB), e constataram que o uso do gesso promoveu aumento nos teores de cálcio solúvel dos solos estudados. Jalali & Ranjbar (2009) também encontraram acréscimo de cálcio solúvel, quando testaram soluções de NaCl e CaCl2 com níveis crescentes de RAS [10, 20 e 40 (mmol L-1)1/2] e lâminas de lixiviação que variaram de 0,5 a 20 volumes de poros, em solo de textura franco-argilosa tratado com gesso de jazida e estrume de origem animal. A aplicação de gesso garantiu maior teor de cálcio solúvel no solo, independentemente da RAS da solução utilizada, no entanto, tal variável diminuiu com o aumento da lâmina de lixiviação.

Quanto ao teor de magnésio solúvel do solo, Melo et al. (2008) também encontraram respostas semelhantes às observadas neste trabalho e relataram que as aplicações de gesso de jazida e de uma lâmina de lixiviação equivalente a três vezes o volume de poros reduziram os teores médios de magnésio solúvel de 18,17 mmolc L-1 para 0,67 mmolc L-1,em Neossolo Flúvico salino-sódico de textura arenosa, e de 10,17 mmolc L-1 para 0,15mmolc L-1, em Neossolo Flúvico salino-sódico de textura franco-argilo-arenosa, ambos no município de Custódia (PE). Esta redução, conforme explicam os autores, foi ocasionada pela substituição do magnésio trocável pelo cálcio introduzido, em maior quantidade, pelo corretivo e à sua lixiviação, por causa da lâmina aplicada.

Carr & Munn (2001) comentam que o uso de resíduos de gesso provenientes da construção civil ocasionou aumento do teor de cálcio no solo, porém, não houve reposta positiva, com relação ao acréscimo de magnésio ao solo, pois a quantidade deste íon, na composição de resíduos de gesso, é bem pequena.

As modificações verificadas na concentração de sais, expressas pela CEes do extrato de saturação (Figura 3a) e na RAS (Figura 3b), comprovam a eficiência do resíduo de gesso na correção da salinidade e sodicidade do solo estudado.


Constatou-se redução da condutividade elétrica no extrato de solo, em relação aos valores originais deste parâmetro (22,4 dS m-1), antes da aplicação do gesso de jazida e do resíduo de gesso ao solo (Figura 3a). Após a aplicação dos corretivos e das lâminas de lixiviação, foram encontrados valores médios de condutividade elétrica, no extrato de saturação, próximos a 5,3 dS m-1. Apesar de ter ocorrido remoção de sais equivalente a 76%, o solo não foi corrigido quanto à salinidade, uma vez que a condutividade elétrica do extrato de saturação do solo foi superior a 4,00 dS m-1,conforme classificação proposta por Richards (1954).

Gheyi et al. (1995) afirmam que o gesso interfere na salinidade do solo, aumentando-a, inicialmente, pela liberação de eletrólitos e reduzindo-a, no decorrer do tempo, em consequência do aumento da permeabilidade do solo, que favorece a infiltração e a redistribuição de água no perfil de solo, bem como a lixiviação dos sais contidos.

As respostas aqui encontradas, no que diz respeito à condutividade elétrica do extrato de saturação do solo, concordam com os resultados obtidos por Barros et al. (2004), quando estudaram o efeito da aplicação de gesso de jazida e calcário, em solos salino-sódicos com diferentes texturas, provenientes de perímetros irrigados de Custódia (PE), e Yazdanpanah & Mahmoodabadi (2011), quando aplicaram tratamentos que consistiam de gesso de jazida, estrume bovino, restos culturais de pistache, gesso de jazida + estrume e gesso de jazida + restos culturais de pistache, para recuperação de solo calcário salino-sódico da região de Kerman (Irã), cultivado com pistache (Pistacia vera L.), e concluíram que o uso apenas de gesso de jazida não foi eficiente, devido à sua baixa solubilidade no solo calcário. No entanto, os tratamentos em que se utilizou gesso de jazida e fertilizantes orgânicos (estrume e restos culturais de pistache) favoreceram a lixiviação de sais e a diminuição da condutividade elétrica.

Segundo os autores supracitados, o aumento da condutividade elétrica do extrato de saturação está relacionado à floculação das argilas, decorrente da substituição do sódio adsorvido no complexo de troca pelo cálcio, fato que aumenta a permeabilidade do solo e favorece uma rápida infiltração e redistribuição de água no solo, com consequente aumento da lixiviação dos sais.

Duarte et al. (2013) afirmam que os cátions hidratáveis de pequeno diâmetro no solo, dentre eles o cálcio, promovem a agregação das suas partículas por meio do processo de floculação, o que propicia melhora da estrutura e aumento da permeabilidade do solo.

Por outro lado, os resultados do presente estudo contrastam com os encontrados por Tavares Filho et al. (2012), os quais constataram que houve aumento na condutividade elétrica do extrato de saturação do solo, em decorrência do uso de gesso de jazida na recuperação de solo salino-sódico com diferentes texturas, no perímetro irrigado de Ibimirim (PE). A elevação da CEes do extrato de saturação do solo, neste caso, ocorreu em função do aumento nos níveis da necessidade de gesso (maior adição de sais), sendo que os valores máximos encontrados de CEes foram iguais a 2,04 dS m-1 e 3,88 dS m-1, no solo salino-sódico com texturas franco-argilosa e argilo-siltosa, respectivamente, quando se aplicou nível de necessidade de gesso (NG) igual a duas vezes a necessidade de gesso adequada para o referido solo (200%).

A relação de adsorção de sódio (RAS), no extrato da pasta saturada, diminuiu após a incorporação do gesso de jazida e do resíduo de gesso ao solo (Figura 3b). O valor inicial da RAS, no extrato de saturação do solo, era igual a 27,27 (mmolc L-1)1/2 e, após a aplicação dos corretivos, o valor mínimo estimado pelas equações de regressão foi de 0,06 (mmolc L-1)1/2,obtido quando se aplicou lâmina de lixiviação equivalente a duas vezes o volume de poros do solo, independentemente do tipo de gesso utilizado. A RAS do extrato de saturação do solo não sofreu influência do tipo de gesso utilizado e seus valores médios não diferiram significativamente, quando se utilizou gesso de jazida e resíduo de gesso, para recuperação do solo salino-sódico aqui estudado.

O decréscimo da RAS, no extrato de saturação do solo, também foi observado em trabalho conduzido por Gharaibeh et al. (2009), quando testaram lâminas de lixiviação equivalentes a 1; 2; 3; 4; 5; e 6 vezes o volume de poros, doses de gesso (0 Mg ha-1; 4,5 Mg ha-1; 8,5 Mg ha-1; 12,5 Mg ha-1; 17,0 Mg ha-1; 21,25 Mg ha-1) e de cloreto de cálcio (0 Mg ha-1; 5,0 Mg ha-1; 8,5 Mg ha-1; 10,0 Mg ha-1; 15,0 Mg ha-1; 20,0 Mg ha-1; 25,0 Mg ha-1; 32,0 Mg ha-1), em Calcisol Háplico salino-sódico proveniente de área agrícola no sudeste do Vale do Rio Jordão. No referido estudo, os autores ainda relataram que o gesso foi mais eficiente na remoção do sódio trocável do que o cloreto de cálcio, e que a fração de lixiviação equivalente a três vezes o volume de poros foi a mais adequada para efetuar a remoção do sódio solúvel.

Os resultados obtidos nesta pesquisa concordam com os Leite et al. (2007), que constataram, em estudo realizado em solos (Luvissolos Crômicos) com texturas distintas, provenientes dos perímetros irrigados de Condado e Sousa (PB), que o aumento das doses de gesso (0 g kg-1; 3,2 g kg-1; 6,3 g kg-1; 9,4 g kg-1; 12,5 g kg-1) aplicadas aos solos propiciou redução da RAS. Estes autores observaram que o declínio foi mais acentuado no solo em que a fração de areia era maior. Tal fato ocorreu pela maior macroporosidade deste solo, que favoreceu uma maior lixiviação de sais. Respostas semelhantes também foram observadas por Melo et al. (2008) e Tavares Filho et al. (2012), quando encontraram correlação positiva entre o uso de gesso de jazida, seguido da aplicação de lâminas de lixiviação, e a diminuição da RAS, em solos salino-sódicos provenientes de perímetros irrigados localizados, respectivamente, em Ibimirim e Custódia, em Pernambuco.

A correlação existente entre as variáveis estimadas para o gesso de jazida e o resíduo de gesso encontra-se exposta na Figura 4.


O desempenho do resíduo de gesso utilizado para recuperação do solo salino-sódico foi mensurado por meio do índice de concordância de Willmott, cujos valores variam de zero (nenhuma concordância) a 1 (concordância perfeita). A partir dos dados expostos na Figura 4, verificou-se que os índices de concordância de Willmott (id) encontrados para a RAS, CEes, sódio, cálcio e magnésio solúveis foram iguais a 0,994; 0,991; 0,987; 0,666; e 0,938, respectivamente, indicando o bom desempenho do resíduo de gesso, em relação ao gesso de jazida, no tocante à recuperação de solo salino-sódico, uma vez que houve pouco afastamento dos dados, em relação à reta 1:1. Pôde-se notar, também, que o valor menor de id (0,666) encontrado foi para o cálcio solúvel, fato que pode estar relacionado à menor quantidade de cálcio existente no resíduo de gesso proveniente da construção civil.

CONCLUSÃO

A aplicação de resíduos de gesso da construção civil revelou-se eficaz na lixiviação de sais e sódio solúvel de solo salino-sódico, podendo ser recomendada, como fonte de cálcio, para a recuperação da sodicidade.

Trabalho recebido em nov./2013 e aceito para publicação em mar./2014 (nº registro: PAT 27197).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Abr 2014
  • Data do Fascículo
    Mar 2014

Histórico

  • Recebido
    Nov 2013
  • Aceito
    Mar 2014
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