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Avaliação da substituição parcial de clínquer por cinza de bagaço de cana: redução de emissão de CO2 e potencial de créditos de carbono

Resumos

Este trabalho apresenta um estudo sobre a viabilidade de possíveis cenários de redução de emissão de CO2 na fabricação de cimento através da implementação de projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) associados à substituição parcial de cimento por cinza do bagaço de cana de açúcar (CBCA). Estudos sobre o comportamento térmico, químico e mecânico de concretos com 5 a 20% de cinza indicaram que existe melhora no desempenho de todas as propriedades analisadas e que a cinza pode ser usada como aditivo na fabricação de cimento. As emissões de CO2 de dois cenários hipotéticos de implementação de projeto de MDL através desta tecnologia no estado de São Paulo, com base na metodologia oficial aplicável, foram avaliadas. Os resultados demonstram que existem reduções de emissões em ambos os cenários, inclusive para o mais desfavorável, evidenciando a possibilidade de obtenção de créditos de carbono negociáveis.

mecanismos de desenvolvimento limpo; emissão de CO2; cinza do bagaço de cana de açúcar; créditos de carbono


This work presents a study about the viability of possible CO2 emissions reductions scenarios for the cement manufacturing through the implementation of Clean Development Mechanisms (CDM) associated with the partial replacement of cement by sugar cane bagasse ash (SCBA). Studies on the thermal, chemical and mechanical behavior of concretes containing 5 to 20% of ash indicated that there is improvement on the performance of all analyzed properties and that the ash can be used as admixture on the cement manufacturing. The CO2 emissions of two hypothetical scenarios of CDM Project implementation in the state of São Paulo through this technology were evaluated based on the official and applicable methodology. The results show that there are emission reductions on both scenarios, even for the most unfavorable, evidencing the possibility of obtaining negotiable carbon credits.

clean development mechanisms; CO2 emissions; sugar cane bagasse ash; carbon credits


Avaliação da substituição parcial de clínquer por cinza de bagaço de cana: redução de emissão de CO2 e potencial de créditos de carbono

E. M. R. FairbairnI; T. P. De PaulaI; G. C. CordeiroII; B. B. AmericanoIII; R. D. Toledo FilhoI

ICivil Engineering Program, COPPE, Universidade Federal do Rio de Janeiro, toledo@coc.ufrj.br, eduardo@coc.ufrj.br, CT-Ilha do Fundão, 21945-970, Rio de Janeiro-RJ, Brazil;

IICivil Engineering Laboratory, Science and Technology Center, Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, gcc@uenf.br, Av. Alberto Lamego, 2000, 28013-602, Campos dos Goytacazes - RJ, Brazil;

IIIFBDS – Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável, Rio de Janeiro, RJ, branca.americano@gmail.com

RESUMO

Este trabalho apresenta um estudo sobre a viabilidade de possíveis cenários de redução de emissão de CO2 na fabricação de cimento através da implementação de projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) associados à substituição parcial de cimento por cinza do bagaço de cana de açúcar (CBCA). Estudos sobre o comportamento térmico, químico e mecânico de concretos com 5 a 20% de cinza indicaram que existe melhora no desempenho de todas as propriedades analisadas e que a cinza pode ser usada como aditivo na fabricação de cimento. As emissões de CO2 de dois cenários hipotéticos de implementação de projeto de MDL através desta tecnologia no estado de São Paulo, com base na metodologia oficial aplicável, foram avaliadas. Os resultados demonstram que existem reduções de emissões em ambos os cenários, inclusive para o mais desfavorável, evidenciando a possibilidade de obtenção de créditos de carbono negociáveis.

Palavras-chave: mecanismos de desenvolvimento limpo, emissão de CO2, cinza do bagaço de cana de açúcar, créditos de carbono.

1. Introdução

Até o início da década de 70, a maioria dos projetos de desenvolvimento como a construção de barragens, rodovias, edificações e instalações industriais, que demandam grandes quantidades de matérias-primas base, como aço, cimento, dentre outros, levavam em conta apenas a relação benefício/custo econômica. Em decorrência deste modelo de desenvolvimento surgiram crescentes degradações ambientais ocasionadas pelos impactos oriundos das atividades humanas. A produção de cimento, por exemplo, é uma atividade que emite grande volume de gases capazes de intensificar o efeito estufa, como o dióxido de carbono (CO2). A resultante destas diversas interferências negativas despertou a opinião pública e induziu diversos organismos internacionais a considerarem imprescindível uma mudança de paradigmas, onde deveriam ser perseguidos meios de desenvolvimento ambientalmente mais amigáveis. Podem ser citados os relatórios gerados pelo Clube de Roma sobre a forma de desenvolvimento do planeta, reuniões de cúpula como a Convenção de Estocolmo em 1972, a criação do PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) em 1980, a Comissão Bruntland de 1987, onde se cunhou o conceito de desenvolvimento sustentável. A reunião intergovernamental Rio 92 e sua edição subsequente em 2002, a Rio +10, ocorrida em Johanesburgo, África do Sul, buscaram oficializar o comprometimento dos países para colocar em prática o desenvolvimento sustentável.

1.1 Mudanças climáticas

Alguns dos principais temas discutidos na Rio 92 e Rio +10 são as mudanças climáticas e as formas de se evitarem interferências antropogênicas perigosas no sistema climático. As principais evidências científicas destes fenômenos já vinham sendo abordadas em relatórios redigidos pelo IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas), criado em 1988.

Ligado ao PNUMA e à OMM (Organização Meteorológica Mundial), o IPCC consiste em uma rede de cientistas de mais 130 países que objetiva traduzir o conhecimento científico da comunidade internacional em recomendações para políticas governamentais. Em seu primeiro relatório, o IPCC sugeriu o estabelecimento de uma instância de negociação política, a UNFCCC (Convenção Quadro das Nações Unidas para Mudanças Climáticas), que foi então criada em 1990. Em seu segundo relatório, em 1995, o IPCC mostrou que há uma intensificação do aquecimento global (Figura 1) devido à emissão excessiva de gases de estufa oriundos das atividades humanas, como o metano (CH4), o óxido nitroso (N2O), gases com flúor (HFC, PFC, SF6) e especialmente gás carbônico (CO2).


1.2 O protocolo de Kyoto e seus mecanismos

Com base nestas evidências e no âmbito da UNFCCC, foi redigido em 1997 na cidade de Kyoto no Japão, um protocolo cuja principal diretriz é o estabelecimento de metas de redução das emissões de gases de efeito estufa dos países desenvolvidos, então denominados países do anexo I, em 5,2% em relação às suas emissões de 1990, no período de 2008 a 2012.

Os países em desenvolvimento, ou não anexo I, dentro dos quais o Brasil se enquadra, não contribuíram com emissões significativas devido à baixa atividade industrial e de consumo nos últimos 150 anos. Estes países estariam então isentos do compromisso de redução de emissões, mas poderiam contribuir com o protocolo de outras maneiras.

No intuito de criar alternativas para que a redução das emissões fosse mais flexível, o protocolo disponibiliza três mecanismos: Emissions Trading, onde países desenvolvidos com cotas de emissão não utilizadas podem vender sua cota para países que tiverem ultrapassado suas metas de redução; Joint Implementation, onde países com metas de redução podem comprar ERUs (Unidades de Redução de Emissão) de outros países com metas que tenham implantado projetos de redução de emissão e queiram vender estes créditos; e MDL (Mecanismos de Desenvolvimento Limpo), onde um país com metas pode investir em um projeto de redução de emissão em um país em desenvolvimento, podendo o projeto adquirir CER (Certificados de Redução de Emissões), cuja unidade equivale a 1 tonelada de CO2. O país investidor pode descontar os créditos nas suas emissões no intuito de cumprir suas metas, e o país sede do projeto além de receber tecnologia, tem o retorno financeiro da venda dos CER gerados. Estes três mecanismos configuram o chamado "mercado de carbono" [1].

O Protocolo de Kyoto entrou em vigor em 2002, após ratificação da Rússia, e atualmente foi ratificado por um total 184 países, dentro dos quais não se inclui os Estados Unidos, um dos países que, historicamente, contribuiu com a maior parte das emissões do mundo.

1.3 O cimento Portland, a cinza do bagaço de cana de açúcar (CBCA) e o MDL

Diversas iniciativas no âmbito do protocolo de Kyoto e do MDL ocorreram nos países em desenvolvimento, especialmente no Brasil, Índia e China. Podem ser citados inúmeros projetos relacionados à redução de emissão de gases de efeito estufa como: o aterro sanitário de Nova Iguaçu, no estado do Rio de Janeiro, onde há conversão do metano gerado na decomposição do lixo em CO2, cujo potencial de estufa é 21 vezes menor; o uso de biomassa para geração de energia; o aproveitamento de energia da incineração do lixo, como faz a Usina Verde, no campus da UFRJ, também no Rio de Janeiro; o reflorestamento de áreas degradadas; o uso de combustíveis alternativos; a diminuição da fração de clínquer para produção de cimento, onde são emitidos em média 1 tonelada de CO2 por tonelada de cimento [2]; dentre outras inúmeras formas de redução de emissões, vêm recebendo CER. Todos os projetos de MDL, como os exemplificados anteriormente, devem atender, dentre outras exigências, ao requisito de utilizarem uma tecnologia inovadora, desconhecida pelo mercado e o cálculo das reduções de emissões deve seguir uma metodologia específica, aprovada e consolidada pela UNFCCC, para a atividade.

A modalidade que envolve a redução da fração de clínquer no cimento através do aumento da fração de aditivos representa uma alternativa bastante promissora para o Brasil, que no ano de 2010 apresentou uma produção de 59,1 Mt de cimento, sendo a região sudeste do país responsável por cerca de 50% deste montante [3]. A maior parte das emissões da produção do cimento ocorre durante a queima do calcário nos fornos de clinquerização para produção do clínquer e na queima de combustíveis fósseis. Os principais aditivos ora misturados ao clínquer são cinza volante, gipsita, escória de alto forno e fíler calcário.

Tal qual a indústria do cimento, a indústria sucroalcooleira, atualmente em processo de franca expansão, impulsionada pela crescente demanda por combustíveis alternativos como o etanol, também figura como setor estratégico no cenário econômico e ambiental global, tendo sido produzidos cerca de 730 Mt de cana de açúcar na safra de 2010, respondendo a região sudeste por aproximadamente 70% deste total [4]. A cana produzida no Brasil serve de matéria-prima para a produção de açúcar e etanol, gerando cerca de 190 Mt de bagaço. Quase que a totalidade do bagaço de cana gerado nas usinas tem sido queimada para aproveitamento energético da biomassa através de cogeração termoelétrica, processo no qual o resíduo final é uma cinza residual do bagaço. Estima-se que cerca de 4,5 Mt de CBCA são geradas no Brasil a cada safra [5].

Dentro deste contexto, pesquisas recentes sobre o desempenho da cinza do bagaço em concreto têm sido desenvolvidas no Laboratório de Estruturas da COPPE/UFRJ com base em estudos de propriedades reológicas, térmicas, mecânicas e associadas à durabilidade. Os resultados obtidos [5-9] mostram que há grande potencial para o uso da CBCA, como pozolanas na produção de cimento. Adicionalmente, em virtude de a cinza ser originada em biomassa vegetal, cuja queima não contribui para intensificação do efeito estufa, a substituição de clínquer por cinza possibilita a redução das emissões de CO2 para a atmosfera. Identifica-se, portanto, um promissor cenário de implantação de MDL, em especial na região sudeste, através do aproveitamento de um resíduo da indústria da cana de açúcar na indústria do cimento, ambas fortemente presentes nesta região.

1.4 Objetivos

Este trabalho objetiva quantificar a redução de emissões de CO2 decorrentes da substituição parcial de cimento Portland por CBCA e avaliar a possibilidade de implementação de um MDL.

1.5 Justificativa

Tendo em vista que a indústria do cimento é responsável por aproximadamente 5% [10] das emissões mundiais de CO2, a busca por tecnologias de produção mais limpa capazes de absorver um resíduo largamente gerado em outra indústria e que proporcione ganhos financeiros, mostra-se um campo de pesquisa e desenvolvimento bastante promissor. Neste sentido, o Laboratório de Estruturas da COPPE/UFRJ tem pesquisado o uso de materiais cimentícios com novas perspectivas na dosagem e composição, onde o uso da CBCA com potencial pozolânico, em substituição parcial de cimento, tem mostrado os melhores desempenhos mecânicos e potenciais de redução de emissão de CO2 na produção de cimento.

2. Viabilidade da CBCA como aditivo em cimento

A CBCA, por ser rica em dióxido de silício amorfo, pode ser usada como pozolana na fabricação de cimento. A sílica presente na cinza é proveniente principalmente da epiderme das células vegetais, através da absorção de ácido monossílico (H4SiO4) do solo, e de areia residual que por vezes não é inteiramente removida no processo de lavagem da cana e é queimada em conjunto com o bagaço nas caldeiras de vapor [6].

Os primeiros estudos relativos ao comportamento de materiais cimentícios contendo cinza residual do bagaço datam do final dos anos 1990. Estudos de Martirena Hernández et al. [11], Singh et al. [12], Ganesan et al. [13] e Morales et al. [14] mostram que a substituição de cimento por cinza (5 a 30% em massa) é capaz de melhorar as propriedades mecânicas e a durabilidade do concreto.

Mais recentemente, através de testes reológicos, mecânicos, calorimétricos e de durabilidade em amostras de concretos com 0 a 20% de cinza do bagaço, Cordeiro et al. [5] concluíram que existe melhora considerável na performance reológica e na durabilidade e manutenção da resistência à compressão a longo prazo, como mostrado na Figura 2. A cinza utilizada neste estudo foi coletada durante a operação de limpeza da caldeira de queima do bagaço e moída para melhorar a homogeneização e reatividade. Este trabalho também indicou que o aumento máximo de temperatura adiabática do concreto diminuiu em 11%. Dessa maneira, é possível inferir que o uso de cinza residual do bagaço da cana como aditivo mineral em cimento é tecnicamente viável, pois é capaz de melhorar diversas propriedades físicas e mecânicas de concretos.


3. Emissões da produção do cimento

As emissões na produção de cimento estão principalmente associadas à etapa de clinquerização e à queima de combustíveis fósseis, como o carvão, óleo mineral e diesel, tanto para autogeração elétrica da fábrica quanta relativa à matriz energética da rede. A etapa de queima consiste no aquecimento da farinha ou "cru" até temperaturas em torno de 1450°C. Com isso, o calcário sofre uma decomposição térmica dando origem ao clínquer, conforme a reação de calcinação mostrada abaixo:

O primeiro produto da reação é o óxido de cálcio, principal óxido constituinte do clínquer. O segundo produto desta reação é o CO2. O aquecimento do calcário representa mais da metade das contribuições em gases de efeito estufa da produção de cimento, tendo em vista que o carbono emitido está fora do ciclo natural do carbono.

O clínquer é misturado a outros aditivos como gipsita e pozolanas em proporção variável de acordo com o tipo de cimento. Esta mistura sofre então uma segunda moagem, dando origem ao cimento Portland propriamente dito, que é ensacado e estocado, e cuja composição média (cimento CPII) é de 80% de clínquer, 15% de aditivos e 5% de outros materiais [15].

Estima-se que seja emitida uma tonelada de CO2 para cada tonelada de cimento produzido. Este valor médio da produção mundial tende a ser maior ou menor nos diferentes países principalmente em função da matriz energética nacional ser menos ou mais limpa. Países com grande parcela de energia renovável como a eólica, solar, de biomassa ou hidroelétrica, como o Brasil, tendem a apresentar menores emissões associadas à produção.

Uma alternativa para a redução das emissões da atividade de produção de cimento é o uso de combustíveis renováveis em detrimento de combustíveis de origem mineral, tanto na autogeração dentro da fábrica quanto na rede elétrica e a melhora na eficiência de queima dos fornos.

Outra possibilidade é a redução da quantidade de clínquer no cimento através de adições minerais, como escória de alto forno e pozolanas, como a CBCA. Esta última alternativa mostra-se mais vantajosa uma vez que não exige adaptações de motores e fornos a novos combustíveis evitando, portanto, grandes investimentos financeiros e tecnológicos. No entanto, para que haja uma redução efetiva de CO2 gerado é necessário considerar todas as emissões relativas à obtenção, transporte e preparo dos aditivos utilizados, o que muitas vezes compromete a viabilidade de substituição de muitos materiais objetivando redução de emissões e ganhos de créditos de carbono.

4. A CBCA como aditivo "limpo"

Atualmente, a biomassa de cana tem servido de combustível para a geração termoelétrica a vapor, cuja energia gerada é suficiente para garantir a autossuficiência energética das usinas e ainda gerar excedentes. As emissões de CO2 decorrentes da queima de biomassa não contribuem para a intensificação do efeito estufa, uma vez que o carbono proveniente da cana já existia na atmosfera e foi absorvido durante o crescimento da planta.

O principal produto da queima do bagaço é a CBCA. A massa de cinza gerada corresponde a cerca de 2,5% da massa de bagaço queimada, ou a 0,6% da massa de cana colhida.

5. Considerações sobre a metodologia de implementação de MDL

De acordo com as diretrizes da UNFCCC, a implementação de um projeto de MDL deve seguir uma metodologia específica para a atividade desenvolvida. Para o caso deste estudo, a metodologia aplicável é a ACM 0005 Approved and Consolidated Baseline Methodology for Increasing the Blend in Cement Production [16], que define todos os pré-requisitos, condicionantes e equações necessárias para a legítima determinação da redução de emissões.

A metodologia ACM 0005 é aplicável a qualquer projeto que aumente a fração de aditivos no cimento, isto é, que reduza a fração de clínquer. Além disso, são pré-requisitos que não haja escassez do aditivo usado, que não exista destinação alternativa adequada para o aditivo, e que a produção do cimento seja voltada apenas para o mercado interno.

Considerando a produção nacional de cinza de bagaço de cana (2,556 Mt) e de cimento (46 Mt) no ano de 2007, e admitindo-se uma substituição de até 50% permitida pela norma brasileira [17], conclui-se que a quantidade de aditivo produzido é suficiente para suprir 37% da produção nacional de cimento durante a implementação do projeto com fração de substituição de 15%, sem haver escassez de cinza.

Atualmente, a destinação mais comum da cinza produzida nas usinas é a aplicação no solo como adubo, embora suas propriedades fertilizantes não sejam relevantes e sua degradação seja bastante lenta, de modo que esta prática objetiva o simples descarte da cinza. Buscas por novas destinações que agreguem valor à cinza, como material aditivo na produção de cimento, são alternativas preferíveis e, portanto, mais adequadas do que a prática comum [6].

De acordo com o SNIC [3], a produção de cimento voltada para a exportação em 2007 correspondeu a 2,7% do cimento total produzido, de modo que a produção nacional de cimento é predominantemente voltada para o mercado interno. Ainda de acordo com o SNIC, a região sul/sudeste, responsável pela maior parte da produção nacional, não registrou exportação de cimento no ano de 2007, à exceção apenas do estado do Paraná que exportou cerca de 1% de sua produção [3].

Outro pré-requisito importante para a aceitação do projeto de MDL é que este apresente o que é denominado na metodologia como "adicionalidade". A adicionalidade ocorre se as emissões decorrentes da implantação do projeto forem inferiores às que teriam ocorrido na ausência do projeto. Além disso, é necessário provar que o projeto é somente viável ou torna-se economicamente mais vantajoso somente se aprovado como MDL e se forem obtidos créditos de carbono. Projetos considerados mais atrativos do que outros quando é avaliado apenas o retorno financeiro que trazem, de modo que poderiam ser implantados mesmo sem os ganhos do crédito de carbono, não possuem adicionalidade. Projetos resultantes da introdução de tecnologias desconhecidas e que enfrentam barreiras de aceitação de mercado são exemplos de projetos passíveis de serem legitimados como MDL.

O uso da CBCA como aditivo em cimento é uma prática inexistente no mercado. O aproveitamento deste resíduo agroindustrial, cujo balanço de emissões é nulo, é uma tecnologia nova e que, consequentemente, tem sido estudada ainda de maneira incipiente pelo meio acadêmico, indicando que o uso da cinza como aditivo gera adicionalidade.

5.1 O cálculo das emissões

De acordo com a metodologia ACM 0005, a análise das emissões não é feita para todos os gases de estufa, mas somente para o CO2, uma vez que reduções nas emissões de CH4 e N2O por alterações no processo de combustão não são significativas.

A metodologia exige que sejam determinadas duas realidades distintas (cenários) para o cálculo das emissões. A primeira, denominada Baseline Scenario, reflete as emissões que ocorreriam em um determinado período futuro caso não fossem alterados os processos atuais de produção, representando uma tendência do histórico das emissões. A outra, denominada Project Scenario, representa as emissões que ocorreriam em virtude da implantação do projeto. O Baseline deve considerar a situação em que ocorram as menores emissões possíveis, para que o cálculo da redução de emissões seja conservador.

O cálculo das emissões envolve quatro etapas principais: Baseline emissions, Leakage, Project emissions, e Emissions reduction.

5.1.1. Baseline emissions

A emissão do Baseline é calculada através da seguinte equação:

sendo 〖BE〗BC,y a emissão total em t de CO2 por tonelada de cimento no Baseline; 〖BE〗clinker as emissões em tonelada de CO2 por tonelada de clínquer no Baseline; 〖BE〗blend a fração de clínquer no cimento em t de clínquer por tonelada de cimento e 〖BE〗ele_ADD_BC as emissões relativas à eletricidade para moagem e preparo de aditivos no Baseline, incluindo a gipsita, dado em t de CO2 por tonelada de cimento.

Os termos da equação acima são por sua vez calculados conforme abaixo:

O termo 〖BE〗calcin refere-se às emissões decorrentes da calcinação do carbonato de cálcio e de magnésio. O cálculo deste termo envolve a determinação dos teores de óxido de cálcio e magnésio tanto na farinha crua quanto no clínquer e o uso de fatores de emissão fornecidos pela metodologia para ambos os óxidos. O termo 〖BE〗fossil_fuel refere-se às emissões relativas à queima de combustíveis fósseis para a produção de clínquer. Este termo é calculado através do somatório da quantidade dos diversos tipos de combustíveis consumidos ponderados por seus fatores de emissão. O termo 〖BE〗ele_grid_clnk refere-se às emissões decorrentes do uso de energia da rede para a produção de clínquer. Este termo envolve a energia total utilizada ponderada pelo fator de emissão da rede. Por fim, o termo 〖BE〗elec_sg_CLNK refere-se às emissões decorrentes da autogeração elétrica na produção de clínquer, e é calculado de maneira semelhante ao termo 〖BE〗ele_grid_clnk. Todos os termos usados para o cálculo do termo 〖BE〗clinker são divididos pela produção anual de clínquer de modo que a unidade dos termos é tonelada de CO2 por tonelada de clínquer.

5.1.2. Leakage

A segunda etapa do cálculo das emissões é denominada Leakage, que corresponde às emissões "fugitivas" que ocorrem fora do processo devido à queima de combustíveis fósseis para o transporte de matérias primas, combustíveis e aditivos para a fábrica. No entanto, a metodologia contabiliza estas emissões apenas para o transporte do aditivo usado no projeto, uma vez que estas tendem a diminuir quando se reduz as quantidades de clínquer no cimento. Este tipo de emissão é calculado através da seguinte equação:

sendo Ly as emissões fugitivas totais relativa ao transporte de aditivos, em kt de CO2; Ladd_trans as emissões relativas ao transporte de aditivos em t de CO2 por tonelada de aditivo; Ablend,y a fração de aditivos no cimento do Baseline e Pblend,y a fração de aditivos por cimento no Project, ambos em t de aditivo por tonelada de cimento. O termo 〖BC〗y representa a produção total de cimento para cada ano do projeto em kt.

A queima de combustíveis fósseis necessários para o transporte do aditivo usado no projeto do seu local de origem até a fábrica é a principal fonte de emissões do novo cenário. A distância média de transporte, o combustível utilizado e a eficiência do sistema de transporte usado também influenciam este montante. O termo Ladd_trans sintetiza estas emissões e é dado por:

sendo 〖TF〗cons o consumo do veículo em kg de combustível por km; Dadd_source a distância média de transporte em km; TEF o fator de emissão do combustível utilizado em kg de CO2 por kg de combustível; C4 um fator de conversão constante igual a 0,001 t por kg; Qadd a quantidade de aditivos carregada por veículo por viagem em t; 〖ELE〗conveyor_add o consumo anual de energia do sistema de transporte para movimentação dos aditivos em MWh; 〖EF〗grid o fator de emissão da rede elétrica em t de CO2 por MWh e 〖ADD〗y a quantidade anual de aditivo consumido em t.

5.1.3. Project emissions

A terceira etapa corresponde ao cálculo das emissões do cimento produzido no projeto ou Project emissions. As equações de cálculo desta etapa são iguais às utilizadas no Baseline emissions, alterando-se apenas a nomenclatura de BE para PE. Pode-se concluir de antemão que os termos 〖BE〗clinker e 〖PE〗clinker são iguais sempre que o clínquer usado no projeto for o mesmo que o produzido correntemente, havendo apenas diferenças nas quantidades de clínquer presentes no cimento final. Adicionalmente, os termos 〖BE〗ele_ADD_BC e 〖PE〗ele_ADD_BC também serão iguais se não existirem emissões associadas ao preparo do novo aditivo. Dessa maneira, os valores calculados na Equação 3 podem ser aproveitados para a determinação das emissões do projeto, sintetizadas pela seguinte equação:

A metodologia ACM 0005 estabelece que os fatores de emissão da rede elétrica utilizados nos cálculos devem ser determinados de acordo com outra metodologia chamada Tool to calculate the emission factor for an electricity system, também de autoria da UNFCCC. No entanto, quando existem dados locais precisos e confiáveis, a adoção destes valores pré-determinados também é possível.

5.1.4. Emissions reductions

O cálculo da redução das emissões é dado por:

sendo 〖ER〗y a redução anual de emissões em kt de CO2;

〖BE〗BC,y e 〖PE〗BC,y as emissões totais em t de CO2 por tonelada de cimento no Baseline e no Project, respectivamente; 〖BC〗y a produção total de cimento para cada ano do projeto em kt; Ly as emissões fugitivas totais relativa ao transporte de aditivos, em kt de CO2 e o termo ay representa uma emissão extra decorrente da diversificação do uso dos aditivos. Isto é, se a quantidade de aditivos que são efetivamente excedentes após aplicação em seu uso já existente não for suficiente para alimentar o projeto, devem-se ponderar as reduções de emissões pelo fator ay dado pela divisão entre a quantidade de aditivos não excedentes e a quantidade total de aditivos usados no projeto.

Para o caso do uso da CBCA não há nenhum uso corrente para este aditivo, já que sua utilização como adubo objetiva mais a disposição final do resíduo do que o aproveitamento das pobres propriedades fertilizantes da cinza. Desta maneira, se a quantidade de cinza gerada for capaz de suprir o projeto, o termo ay será nulo.

6. Cenários hipotéticos de implementação de MDL

As possibilidades de aplicação da CBCA como aditivo na fabricação de cimento são numerosas para boa parte do território nacional, tendo em vista a grande quantidade de estados que abrigam concomitantemente a produção de cana de açúcar e cimento. No entanto, a distância de transporte da cinza das usinas para as fábricas é um fator decisivo que pode inviabilizar algumas alternativas. Distâncias demasiado longas diminuem a redução de emissões e, em alguns casos, podem aumentar as emissões da produção do cimento devido à queima de combustíveis fósseis dos veículos de transporte que, no Brasil, são predominantemente rodoviários. Desta maneira, a região sudeste, e especialmente o estado de São Paulo, que concentra em seu território mais de 60% da produção nacional de cana [4] e 16% da produção nacional de cimento [3], apresentam maiores possibilidades de redução de emissões.

Neste estudo foram analisados, para o ano base de 2005, dois cenários hipotéticos de implementação de um projeto de MDL em fábricas do estado de São Paulo com base na fabricação de cimentos com fração de 15% de CBCA. Para os dois cenários optou-se pelo emprego de uma cinza residual do bagaço de cana de açúcar coletada diretamente de uma caldeira e que não sofreu nenhum tratamento posterior, além da moagem. É evidente que para uma aplicação industrial será necessário o estabelecimento de um protocolo para obtenção das cinzas.

Objetivando simplificar a análise, a produção da cinza e de cimento foi concentrada em municípios produtores totalizando 35 núcleos de produção de cinza [18] e 4 núcleos de fabricação de cimento. A produção destes núcleos foi obtida pela soma das produções das principais usinas ou fábricas situadas dentro de um raio de 30 km da sede do município base, a partir de dados fornecidos pelo Sindicato Nacional da Indústria do Cimento e pela União dos Produtores de Bioenergia. A seguir, foram determinadas as distâncias rodoviárias das possíveis 140 combinações entre núcleos produtores de cinza e de cimento [19]. O mapa mostrado na Figura 3 ilustra o resultado desta simplificação e exibe os principais municípios analisados.


Para a estimativa das emissões do transporte da cinza foi assumido a utilização de um caminhão a diesel com características de capacidade de carga e consumo específico de combustível semelhantes aos do veículo mais vendido na região para este tipo de transporte, de acordo com dados da Associação dos Fabricantes de Veículos Automotores [20]. A capacidade de carregamento e o consumo específico, necessários aos cálculos das emissões, foram determinados a partir do manual do veículo divulgado pelo fabricante.

Na determinação do Baseline emissions de cada cenário os dados usados foram obtidos através de valores médios de cada fábrica ponderados pela sua produção total no ano de 2005. A composição do cimento do Baseline adotada foi de 80% de clínquer, 15% de aditivos e 5,0% de gipsita [15].

Para o cálculo do Project emissions, em ambos os cenários, a metodologia exige que as quantidades de aditivos utilizados no cimento do projeto sejam iguais às utilizadas no cimento do Baseline, sendo permitido, pela norma brasileira, uma fração de até 75% de aditivos [17]. Para tanto, considerou-se, em ambos os cenários, que metade da produção das fábricas envolvidas seria de um cimento genérico tipo A com 65% de clínquer, 30% de aditivos e 5,0% de gipsita, e a outra metade seria de um cimento genérico tipo B, com 80% de clínquer, 15% de CBCA e 5,0% de gipsita. A composição final da produção de ambos os cimentos do projeto em cada cenário será, portanto, de 72,5% de clínquer, 15% de aditivos, 7,5% de CBCA e 5,0% de gipsita.

No cálculo das reduções de emissões não foram determinadas as emissões relativas aos aditivos e à gipsita, representadas pelos termos 〖BE〗ele_ADD_BC e 〖PE〗ele_ADD_BC das equações 2 e 6, uma vez que estes termos são equivalentes, tanto no Baseline quanto no Project, e se anulam no cálculo da redução de emissões, pois a quantidade de aditivo e gipsita em ambas as situações é igual.

Para o primeiro cenário, foi simulada a implementação do projeto entre os municípios de maior produção de CBCA e de cimento. O município identificado com a maior concentração de produção de cana foi Jaboticabal, na região norte do estado, com 31.630 kt de cana produzida em 18 usinas, e o município de maior produção de cimento foi Sorocaba, que abriga duas fábricas com produção total de 2.793 kt. Esta hipótese foi assumida, pois envolve as maiores quantidades de cinza e de cimento em um projeto de redução de emissões entre duas municipalidades. Entretanto, a relação clínquer-cimento na região de Sorocaba foi assumida hipoteticamente como sendo aquela da média brasileira, uma vez que a produção local varia sazonalmente.

Em um segundo cenário foi analisada a implementação do MDL para o conjunto de municípios cimento/cinza com maior distância de transporte entre si, sendo, aparentemente, o cenário menos favorável à redução de emissões. As maiores distâncias possíveis entre os diversos pares de municípios cimento/cana de São Paulo ocorrem entre o município de Ribeirão Pires, a leste do estado, com uma produção de 631 kt de cimento, e os municípios produtores de cana da porção oeste de São Paulo. Distante 724 km de Ribeirão Pires, a cidade de Teodoro Sampaio é a mais afastada daquele município e apresentou uma produção de 897,3 kt de cana, seguida por Andradina e Pereira Barreto, com distâncias de 719 km e 711 km e produções de 2.200 e 1.300 kt de cana, respectivamente.

A determinação do cenário mais favorável à implantação do MDL dentro do estado de São Paulo envolveria todas as combinações possíveis de municípios produtores e receptores de aditivos bem como as diversas combinações de quantidade transportada de cinza. O conjunto de combinações mais favorável seria aquele que minimizasse a distância média final de transporte da cinza. Esta análise foi abordada em estudos recentes de Fairbairn et al. [21], onde o uso de algoritmos computacionais para minimização da distância de transporte e otimização da distribuição de cinza entre as fábricas foi bem sucedido.

7. Resultados

7.1 Cenário 1: municípios de maior produção de cinza e cimento

Para este cenário, o cálculo das reduções de emissões decorrentes da implementação do projeto de MDL é feita entre os dois municípios base de maior produção do estado de São Paulo: Jaboticabal e Sorocaba.

As duas cidades estão separadas por uma distância rodoviária de 318 km. Considerando a fração de substituição de cinza no cimento total produzido de 7,5% (cimento tipo A com 0% de cinza e cimento tipo B com 15% de cinza) e a produção de cimento de Sorocaba, são necessárias 209,475 kt de cinza para viabilizar este cenário, o que é facilmente suprido pela produção de cinza de Jaboticabal, estimada em 790,769 kt. A Tabela 1 resume os resultados obtidos pela aplicação da metodologia ACM 0005 para o cálculo das emissões do cenário 1.

7.2 Cenário 2: distâncias mais desfavoráveis de transporte de cinza

O cenário 2 estima a situação mais desfavorável para aplicação do projeto de MDL no que se refere às emissões do transporte da cinza, principal emissão decorrente do uso deste aditivo. A produção de cimento de Ribeirão Pires exige, para a fração de substituição proposta, 47,3 kt de cinza. Considerando que Teodoro Sampaio produz 22,4 kt do aditivo, existe um déficit de -24,9 kt de cinza para suprir a produção total de cimento. Desta maneira, foi incluída a produção de 55 kt de cinza do município base de Andradina, que apresenta a segunda maior distância de transporte, mantendo a análise conservadora e suprindo o projeto com excedentes de cinza. Ressalta-se que a viabilidade econômico-financeira do transporte da cinza não faz parte do escopo desta análise, que é restrita aos critérios definidos pela metodologia ACM 0005.

Para este cenário, o cálculo das emissões fugitivas relativas ao transporte da cinza, denominado Leakage, e o cálculo das reduções de emissões são separados em duas equações: uma para o transporte de 22,4 kt de cinza de Teodoro Sampaio a Ribeirão Pires, e outra para 24,9 kt transportadas de Andradina ao mesmo município. A soma das reduções de emissões das duas alternativas compõe a redução de emissão final do cenário 2. Os resultados obtidos para este cenário são mostrados na Tabela 2.

8. Discussão dos Resultados

Em ambos os cenários hipotéticos analisados foi possível obter um saldo positivo de redução de emissões, revelando que há perspectivas concretas de implementação de um projeto de MDL. Mesmo para o cenário 2, o mais desfavorável em virtude das maiores distâncias de transporte, a emissão média de CO2 por tonelada de cinza (Ladd_trans) é quase 100 vezes menor que a emissão de CO2 por tonelada de clínquer (〖BE/PE〗clinker).

Os resultados obtidos para as emissões de CO2 por tonelada de cimento no Baseline de ambos os cenários são inferiores à média mundial, estimada em 1,0 toneladas de CO2 por tonelada de cimento [2]. Esta baixa taxa de emissões se deve ao fato de que a matriz energética que sustenta a rede elétrica brasileira é de natureza hidroelétrica, cujos fatores de emissão são consideravelmente menores que os de outras fontes energéticas mais comuns em outros países. Este fato é demonstrado pelos baixos valores dos termos 〖BE〗ele_grid_clnk e 〖PE〗ele_grid_clnk.

As emissões relativas à reação de calcinação e à queima de combustíveis fósseis representam quase que a totalidade das emissões do Baseline de ambos os cenários. No entanto, dentre as fábricas consideradas neste estudo, há uma discrepância considerável em relação ao uso de combustíveis fósseis na produção, denotando sensíveis diferenças tecnológicas. As fábricas do município base de Ribeirão Pires não registraram emissões relativas à queima de combustíveis, ao contrário das fábricas de Sorocaba.

Em ambos os cenários, a quantidade total de CBCA gerada foi capaz de suprir a demanda das fábricas, gerando excedentes de cinza. É possível imaginar uma série de alternativas para a destinação deste excedente como: (1) envolver mais fábricas de cimento e usinas de cana no projeto; (2) aumentar a fração de cinza no cimento nos cenários analisados através de melhorias tecnológicas no preparo da cinza e (3) aumentar a produção de cimento nos cenários analisados. Todas estas alternativas levantadas poderiam promover maiores reduções de emissões.

Um estudo mais detalhado da viabilidade de implementação deste tipo de projeto de MDL deveria considerar uma análise econômico-financeira, incorporando custos de preparo e obtenção da cinza, de transporte, as receitas obtidas pela venda dos CER, além de diversas variáveis do mercado local, mas que estão fora dos propósitos deste trabalho. No entanto, vale ressaltar que, por se tratar de um resíduo a ser disposto, a cinza possui um custo de obtenção praticamente nulo, embora seu custo tenda a aumentar com o aumento da demanda. Em relação às receitas obtidas pela venda dos CER, o valor pago por tonelada de CO2 tem variado historicamente entre € 15 e € 35.

9. Conclusões

Iniciativas de redução de impactos ambientais na indústria como a redução da emissão de gases de efeito estufa e a reutilização de resíduos gerados são estratégicas, tanto política quanto economicamente, e figuram como questões de grande relevância no cenário internacional atual. Neste sentido, o uso da CBCA como aditivo na fabricação de cimento vai de encontro ao anseio global por tecnologias de produção ambientalmente corretas. A capacidade de melhora no desempenho mecânico através do uso de cinza em compostos cimentícios já foi comprovada por diversos pesquisadores.

O Brasil apresenta um grande potencial para implementação de projetos de MDL envolvendo o uso da CBCA e os estados do sudeste, como o estado de São Paulo, concentram a maior parcela de ambas as produções de cinza e cimento. O uso da metodologia da UNFCCC para estimativa das reduções de emissões indicou, para dois cenários hipotéticos de implementação de MDL dentro do estado de São Paulo, reduções de 182,5 e 19,9 kt de CO2. O primeiro valor se refere à alternativa envolvendo os dois municípios de maior produção de cinza e cimento e o segundo à alternativa mais desvantajosa, com municípios de maior distância de transporte entre si.

O uso da cinza como adição em cimento atendeu a todos os pré-requisitos da UNFCCC para fins de implementação de projetos de MDL e ganhos de certificados de redução de emissões, sendo capaz de gerar benefícios não apenas tecnológicos, mas também financeiros e ambientais.

10. Agradecimentos

À Capes, ao CNPq e à Faperj pelo auxílio financeiro.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2012
  • Data do Fascículo
    Abr 2012
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