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Proteção catódica de estruturas de concreto

Resumos

A adoção de técnicas de proteção às estruturas do concreto é recomendada quando há preocupação com a corrosão das armaduras de aço-carbono. Dentre as principais técnicas, destaque-se a proteção catódica que pode tanto evitar a corrosão prematura como diminuir um processo corrosivo em curso. No exterior, a técnica de proteção catódica tem sido aplicada em vários tipos de estruturas de concreto, especialmente nas sujeitas à corrosão pelo ataque de íons cloreto. No Brasil, essa técnica é pouco usada em estruturas de concreto, o que decorre, em parte, do desconhecimento sobre o seu princípio de funcionamento e da ausência de sistemas disponíveis para aplicação ao concreto (armado ou protendido). O objetivo deste trabalho é apresentar o princípio da proteção catódica para estruturas com armaduras de aço-carbono novas ou já em processo de corrosão. Os métodos de proteção catódica por corrente impressa e por anodo de sacrifício são discutidos. Um caso prático com uso de proteção catódica por corrente impressa, também, é apresentado.

concreto; proteção catódica; corrente impressa; proteção galvânica


Protection techniques against corrosion for concrete structures are required when there is concern about the possibility of corrosion of steel reinforcement. Among the techniques available as corrosion protection techniques, cathodic protection is outstanding for both preventing premature corrosion as well as reducing an ongoing corrosion process. Abroad, the cathodic protection technique has been applied to several types of concrete structures, especially those subject to corrosion attack by chloride ions. In Brazil, this technique is hardly used regarding concrete structures which is partially due to the lack of knowledge of cathodic protection techniques and the lack of commercially available systems for application for concrete structures (reinforced or prestressed). The objective of this paper is to present the principle of cathodic protection both for new concrete structures as well as for those in the process of steel reinforcement corrosion. Cathodic protection methods with impressed current and with sacrificial anodes are discussed. A case study with the use of impressed current cathodic protection is also presented.

concrete; cathodic protection; impressed current; galvanic protection


Proteção catódica de estruturas de concreto

A. AraujoI; Z. PanossianII; Z. LourençoIII

IIPT Instituto de Pesquisas Tecnológicas, Laboratório de Corrosão e Proteção, Av. Prof. Almeida Prado 532, CEP 05508-90, São Paulo/Brasil, araujo@ipt.br

IIIPT Instituto de Pesquisas Tecnológicas, Laboratório de Corrosão e Proteção, Av. Prof. Almeida Prado 532, CEP 05508-90, São Paulo/Brasil, zep@ipt.br

IIIZETACORR, Rua J.M.Simões, 8, 2560-281, Torres Vedras/Portugal, zetacorr@sapo.pt

RESUMO

A adoção de técnicas de proteção às estruturas do concreto é recomendada quando há preocupação com a corrosão das armaduras de aço-carbono. Dentre as principais técnicas, destaque-se a proteção catódica que pode tanto evitar a corrosão prematura como diminuir um processo corrosivo em curso. No exterior, a técnica de proteção catódica tem sido aplicada em vários tipos de estruturas de concreto, especialmente nas sujeitas à corrosão pelo ataque de íons cloreto. No Brasil, essa técnica é pouco usada em estruturas de concreto, o que decorre, em parte, do desconhecimento sobre o seu princípio de funcionamento e da ausência de sistemas disponíveis para aplicação ao concreto (armado ou protendido). O objetivo deste trabalho é apresentar o princípio da proteção catódica para estruturas com armaduras de aço-carbono novas ou já em processo de corrosão. Os métodos de proteção catódica por corrente impressa e por anodo de sacrifício são discutidos. Um caso prático com uso de proteção catódica por corrente impressa, também, é apresentado.

Palavras-chave: concreto, proteção catódica, corrente impressa, proteção galvânica.

1. Introdução

Tradicionalmente, a proteção catódica é usada como método de combate à corrosão em estruturas metálicas, submersas ou enterradas, sendo largamente utilizada para proteção de cascos de navios e tubulações enterradas. Nas últimas décadas, essa técnica de proteção tem sido utilizada para a reabilitação de estruturas de concreto deterioradas (Chess [1]; NACE RP0209 [2]), tendo sido adotada pela primeira vez em 1973, em uma ponte na Califórnia (Estados Unidos) em processo de degradação por corrosão severa da armadura (Beamish e Belbol [3]). Além da utilização em estruturas degradadas, a proteção catódica tem sido utilizada em estruturas novas, como técnica de prevenção da corrosão. Tais usos podem ocorrer em estruturas parcialmente ou totalmente enterradas ou submersas ou em estrutura atmosférica, sejam estas de concreto armado ou de concreto protendido.

De acordo com Broomfield [4], até 1994 havia mais de um milhão de metros quadrado de proteção catódica aplicada em estruturas de concreto nos Estados Unidos e Canadá e, provavelmente, outro milhão, ou mais, no resto do mundo. Segundo Pedeferri [5], até 1996 a proteção catódica já tinha sido aplicada em cerca de 500.000 m2 de estruturas de concreto com corrosão induzida por cloretos e 140.000 m2 de estruturas novas, estas últimas na maioria estruturas protendidas.

O conceito geral de aplicação da proteção catódica em estruturas de concreto é definido conforme o estado da armadura (estado passivo ou estado ativo) e do agente causador da corrosão, a saber:

  • repassivação de pites já nucleados: é o caso de estruturas com armaduras com corrosão induzida por cloretos;

  • diminuição da taxa de corrosão generalizada: é o caso de estruturas com armaduras com corrosão induzida por carbonatação do concreto de cobrimento ou corrosão induzida por cloretos em estado avançado em que os pites coalesceram dando origem a corrosão generalizada;

  • prevenção catódica: é o caso de estruturas novas (estado passivo) que podem ser contaminadas com cloretos ou de estruturas contaminadas com cloretos em níveis abaixo do limite crítico.

Apesar da aplicação da proteção catódica ser adequada para estruturas expostas a diferentes condições e estados de conservação, ela é mais largamente empregada em estruturas atmosféricas sujeitas à ação de íons cloreto, tais como as localizadas em ambientes marinhos, ambientes industriais com fontes de cloretos e, em alguns países, em ambientes que utilizam sal de degelo. A contaminação com cloretos, associada à elevada umidade, determina a diminuição da resistividade elétrica do concreto. Com isso, são necessárias menores densidades de correntes elétricas para alcançar o nível de proteção desejada quando comparado às densidades necessárias para um concreto de mesmas características, porém sem contaminação com cloreto. Em estruturas com concreto carbonatado são necessárias maiores densidades de corrente elétricas, pois a carbonatação do concreto aumenta a sua resistividade elétrica.

A aplicação da proteção catódica em estruturas de concreto pode ser feita por meio de dois métodos: por corrente impressa e por anodos de sacrifício. Normalmente, a proteção catódica por corrente impressa é mais utilizada em estruturas atmosféricas; porém, caso o ambiente apresente alta umidade relativa ambiental ou a estrutura esteja sujeita à variação e aos respingos de maré, a proteção por anodos de sacrifício também é utilizada com sucesso. O mesmo é válido para estruturas submersas e enterradas.

Tanto o método de corrente impressa, como o método de anodos de sacrifício, é dependente principalmente do conhecimento das características da estrutura ou do elemento a proteger e, também, das condições ambientais de exposição. Além desses fatores, citam-se a facilidade de instalação do anodo de cada uma dessas técnicas, os efeitos da instalação da proteção na estrutura, o custo envolvido, o aspecto estético, a durabilidade, a vida útil requerida e a manutenção.

No Brasil, não é usual a aplicação da técnica de proteção catódica em estruturas de concreto expostas em ambientes de alta agressividade. Normalmente, são adotados critérios rígidos de projeto, essencialmente uma elevada espessura de cobrimento e a especificação de um concreto de alta qualidade. No caso de estruturas deterioradas, é frequente a adoção de técnicas tradicionais de recuperação e do tratamento superficial do concreto. Na prática, nem sempre tais critérios são garantia da durabilidade, sendo questionável a sua eficiência na extensão da durabilidade de estruturas em condições ambientais adversas. Desse modo, justifica-se a importância do tema abordado neste trabalho, podendo o melhor conhecimento da técnica da proteção catodica contribuir para que a mesma seja considerada frequentemente na etapa de projeto e de recuperação estrutural.

2. Princípio da proteção catódica

O princípio da técnica de proteção catódica é a redução do potencial da interface aço/concreto para valores mais negativos do que seu potencial natural de corrosão (Ecorr). Isto é feito pela imposição de uma corrente contínua nas armaduras, a qual pode ser fornecida por uma fonte externa de alimentação (proteção por corrente impressa) ou pela ligação elétrica do aço a um metal mais ativo, ou seja, de potencial mais negativo (proteção por anodo de sacrifício). Em qualquer dos dois métodos, o suprimento de corrente contínua deve ser adequado para a polarização negativamente a interface aço/concreto.

Classicamente, a proteção catódica leva o potencial da interface aço/meio ao domínio de imunidade do ferro/água do diagrama de Pourbaix ou a um potencial muito próximo a este domínuo. Em estruturas de concreto, este conceito pode ser aplicado somente para aquelas em condição submersa ou enterrada. Em estruturas atmosféricas, o conceito é diferenciado. Para entender melhor, considere a Figura 1, que apresenta o diagrama de Pourbaix.


Pela Figura 1, observa-se que, em potenciais elevados, o aço mantém-se no estado passivo em torno de pH 13, que é o usual em concreto íntegro. O estado passivo é devido à presença, na superfície do aço, de um filme de óxidos que é composto de Fe3O4 ou Fe2O3. No entanto, o aço só está imune à corrosão quando o potencial da interface aço/concreto é levado a valores abaixo do potencial de equilíbrio da reação Fe3O4 + 8H+ + 8e- ž 3Fe + 4 H2O (Ponto 1 da Figura 1).

O potencial de imunidade inicia-se em torno de -900 mV (EH, eletrodo de hidrogênio). Nesse potencial há o favorecimento da redução do hidrogênio (2H+ + 2e- ž H2; Ponto 2 da Figura 1) e da redução do oxigênio (O2 + 2H2O + 4e- ž 4OH-; Ponto 3 da Figura 1). A redução do oxigênio também ocorre no domínio da passivação, característico do aço embutido no concreto (faixa chamada de Ecorr na Figura 1).

Ao longo do tempo da manutenção do potencial da interface aço/concreto no domínio da imunidade, ambas as reações apresentadas determinam um progressivo aumento da alcalinidade do concreto, o que pode resultar na sua degradação caso este contenha agregados reativos (reação álcali/agregado). Além disso, o aumento do volume de hidrogênio formado devido à reação 2H+ + 2e- ž H2 pode prejudicar a aderência aço/concreto. No caso de concreto protendido, essa condição pode causar trincamento de aços de alta resistência devido à penetração do hidrogênio atômico no metal. Com tais possíveis consequências, não é usual a aplicação de potenciais muito negativos em estruturas de concreto atmosféricas, principalmente nas protendidas.

O princípio de proteção catódica que se aplica em estruturas de concreto pode ser entendido por meio da compreensão do mecanismo da ocorrência da corrosão por pite, resultante do ataque de íons cloreto ao aço. Nesse caso, o controle da corrosão é feito pela repassivação do pite ou pela diminuição da sua nucleação.

A corrosão por pite ocorre em valores de potenciais maiores do que os potenciais característicos, denominado potencial de pite (Ep). Uma vez que a corrosão por pite é iniciada, esta pode se propagar em potenciais mais negativos que Ep. Para interromper a propagação do pite é necessário alcançar um potencial mais abaixo, conhecido como potencial de repassivação ou potencial de proteção de pite (Eprot). Os valores de Ep e Eprot dependem de vários fatores, incluindo teor de cloretos, pH, temperatura e tipo de cimento. Dentre estes fatores, o teor de cloretos e o pH do concreto são os mais importantes, a saber:

  • quanto

    maior o teor de cloretos, menores são os valores de

    E

    p e de

    E

    prot;

  • quanto

    menor o valor de pH, menores são os valores

    E

    p e de

    E

    prot.

Segundo Bertolini e colaboradores [6], no concreto Ep varia dentre -259 mV (ECSC - eletrodo de cobre / sulfato de cobre) e -459 mV (ECSC) e Eprot dentre -559 mV (ECSC) e -809 mV (ECSC). Em geral, Ep é da ordem de 300 mV mais positivo do que Eprot. A influência do teor de cloretos e do potencial do aço, em concreto com pH elevado, nas condições de corrosão das armaduras pode ser observada na Figura 2, elaborada por Pedeferri [5]: na zona A o pite se inicia e propaga; zona B o pite não se inicia, mas pode se propagar; zona C o pite não se inicia e nem se propaga; zona D e E a evolução do hidrogênio ocorre. Com base na Figura 2 e no conhecimento dos critérios da proteção (EN 12696 [7]; Pedeferri [5]) pode-se concluir que:

  • estruturas novas integras ou contaminadas por cloretos, sem corrosão: o concreto está alcalino e a armadura passiva, sem pites. Nessas condições, a proteção catódica tem por objetivo manter o potencial abaixo do potencial

    E

    p (

    zona B da

    Figura 2). Deste modo, quando a contaminação do cloreto atingir níveis críticos, o metal permanecerá passivo sem nucleação de pites. O objetivo neste caso é de prevenção da corrosão. A densidade de corrente típica para esta condição fica entre 0,2 mA/m

    2 e 2 mA/m

    2 (em relação à área da armadura). A variação se deve a diversos fatores, como a resistividade elétrica do concreto e o nível de contaminação por cloretos;

  • estrutura com corrosão induzida por cloretos: o concreto está alcalino e a armadura apresenta ruptura localizada da camada passiva, i.e, com pites nucleados. Nessas condições, a proteção catódica tem por objetivo abaixar o potencial para valores inferiores ao do potencial

    E

    prot. Assim, os pites formados serão repassivados e não haverá formação de novos pites. Em concreto protendido, a armadura deve, necessariamente, ser mantida na

    zona C da

    Figura 2. Em concreto armado, o potencial pode ser mantido na

    zona C ou

    D. Quando somente a diminuição da taxa de corrosão é desejada, pode-se aplicar valores para manter a armadura na parte mais inferior da

    zona B. A densidade de corrente de proteção típica para estas condições varia entre 2 mA/m

    2 e 20 mA/m

    2 (em relação à área da armadura). Esta variação é devido a diversos fatores, como os acima mencionados e o estado de deterioração das armaduras e o grau de contaminação do concreto;

  • obras com corrosão induzida por carbonatação: o concreto tem seu pH diminuído, tendo-se perda generalizada do estado de passivação da armadura. Nessas condições, a proteção catódica consiste em aplicar ao sistema um valor de potencial abaixo do potencial de corrosão do sistema, porém acima do potencial de equilíbrio do ferro. Como resultado, ter-se-á uma diminuição da taxa de corrosão.


Na prática, não é necessário o conhecimento de Ep e Eprot para a aplicação de proteção catódica. Existem critérios empíricos largamente aceitos, incluindo o critério de 100 mV de despolarização (NACE RP0209 [2]).

Em estruturas atmosféricas em que há indícios de corrosão, nas quais o potencial da armadura é mais negativo que -200 mV (ECSC), a corrente de proteção a ser adotada deve ser tal que, no local mais anódico em cada área de 50 m2, o potencial da polarização catódica real seja de, no mínimo, 100 mV. Em obras integras ou pouco contaminadas com cloreto, com potenciais mais positivos do que -200 mV (ECSC), não há necessidade de adoção deste valor limite mínimo de polarização (NACE RP0209 [2]).

A Figura 3, elaborada por Raupach e Bruns [8], ilustra a aplicação do critério de 100 mV de polarização catódica real. Pela Figura 3, observa-se que, quando a armadura não está protegida, esta assume um potencial natural (Ecorr na Figure 3). Quando a proteção catódica é aplicada, o potencial da armadura muda na direção catódica, assumindo o valor CP on da Figura 3. Com a posterior desativação da corrente de proteção ou a desconecção do anodo no caso de proteção galvânica, há um decaimento brusco do potencial que é atribuído à interferência da resistência do meio (queda ôhmica) no potencial. O valor do potencial após este decaimento é denominado Potencial instant off (CP off da Figura 3) e também conhecido como "real" potencial IR-Free por causa do aumento brusco do potencial resultante do potencial de decaimento devido à resistividade do meio. Em seguida, o potencial tende a assumir assintomaticamente um valor constante, denominado Enatural (Figura 3).


O valor obsoluto da diferença entre esse potencial natural e o potencial Instant off (Enatural - ECP off) é o valor "real" da despolarização da interface aço/concreto, devendo este ser igual ou maior que 100 mV para ser atendido a mencionado critério de 100 mV. Caso o valor de despolarização em um determinado sistema de proteção catódica seja menor que 100 mV, uma maior corrente de proteção catódica deve ser imposta.

Segundo Bennet e Turk [9] e Pedeferri [5], o tempo de decaímento mencionado de 4 h é o padrão. No entanto, este tempo pode ser insuficiente para atingir a estabilização do potencial. Nesses casos, tempos maiores podem ser adotados, chegando a 24 h (Pedeferri [5]). Cita-se que a estabilização do potencial depende da disponibilidade de oxigênio e não da eficiência da proteção catódica. Em estruturas saturadas com água, onde a disponibilidade de oxigênio é menor, o tempo de estabilização é maior (Glass, Hassanein, Buenfeld [10]; NACE RP0209[2]).

A verificação da eficácia dos sistemas de proteção catódica é feita através da medição dos potenciais do aço-carbono na interface com o concreto. Para tal, é necessário o embutimento de sensores (eletrodos de referência) no concreto em áreas críticas do concreto as quais representem as diferentes condições de corrosão de toda a estrutura a proteger ou em regiões onde o controle do potencial é mais importante. Os sensores mais utilizados são os elétrodos de Ag/AgCl /0,5 mol/L KCl-gel, Mn/MnO2/0,5 mol/L NaOH e titânio ativado com ou sem argamassa de preenchimento. Para a monitorização de partes enterradas ou submersas pode-se ainda utilizar eletrodos de zinco ou de cobre/sulfato de cobre (Cu/CuSO4), instalados na água ou solo. (Lourenço [11]).

3. Proteção catódica por corrente impressa

No método de proteção catódica por corrente impressa, a corrente de proteção é fornecida por imposição de tensões elétricas geradas por uma fonte externa de alimentação. Para tanto, normalmente são usados retificadores, para retificar corrente alternada, sendo o pólo positivo conectado a um anodo e o pólo negativo conectado à armadura. O anodo tem a função de distribuir a corrente nos elementos da estrutura, sendo este composto de um material condutivo de tempo de vida elevado, o qual é embutido no concreto, ou aplicado na sua superfície. Nesse sistema pode-se regular facilmente, em função das medidas dos potenciais estrutura/meio, a corrente de proteção liberada pelos anodos, mediante ajuste na saída do retificador.

Para a proteção da parte atmosférica das estruturas, os sistemas de anodos mais utilizados são:

  • malha de titânio ativado revestido com óxidos de metais nobre (Ti/MMO) e embebida em argamassa de baixa resistividade elétrica. A malha de Ti/MMO é fixada à superfície do elemento a proteger e encapsulada com argamassa que é usualmente aplicada por projeção (ver

    Figura 4);

  • revestimentos ou tintas orgânicas condutoras, aplicados diretamente na superfície do concreto a proteger;

  • anodos em forma de sonda com comprimento e diâmetro variável, dependendo do elemento. O material pode ser titânio platinado, Ti/MMO ou cerâmicas condutoras. O formato da sonda/anodo pode ser tubular, fita de malha, varão etc. Os anodos são inseridos em furos realizados no elemento de concreto a ser protegido, sendo estes embebidos num meio condutor, como pasta ou gel de grafite ou argamassas de baixa resistividade. Os furos realizados no elemento são de diâmetro e comprimento variável, dependendo do tipo de anodo;

  • fitas de malha de Ti/MMO de espessura variável. As fitas são instaladas em frisos pouco profundos feitos na camada superficial do concreto, com posterior revestimento com argamassas de baixa resistividade (ver

    Figura 5);

  • revestimentos condutores aplicados por projeção na superfície do elemento a proteger. São essencialmente constituídas por argamassas que incluem fibras de carbono revestidas com níquel;

  • revestimentos metalizados (especialmente zinco puro), os quais também são aplicados na técnica de proteção galvânica, descrita mais adiante.



A Figura 6 contém um resumo das principais reações que podem ocorrer no anodo e no catodo (armadura), quando da aplicação da corrente impressa. Se o anodo não participa das reações (o que ocorre nos casos de anodos inertes, de titânio, platina e níquel), a única reação que ocorre é a oxidação da água (2H2O ž 4H+ + O2 + 4e-). Se o anodo participa das reações (anodo consumível, como o zinco), a única reação que ocorre é a de sua oxidação (Zn + 2H2O ž Zn(OH)2 + 2H+ + 2e-). Quanto ao catodo, neste ocorre redução do oxigênio (O2 + H2O + 4e- ž 4OH-) e, caso o aço-carbono da armadura seja levado ao domínio da imunidade, ocorre também a sua redução (Fe3O4 + 8H+ + 8e- ž 3Fe + 4H2O) e, ainda, a do hidrogênio (2H+ + 2e- ž H2).


Como mostra a Figura 6, a passagem de corrente elétrica também induz outras modificações químicas no concreto, sendo os íons negativos (hidróxido, cloreto, carbonato e sulfato) repelidos pelo catodo e os íons positivos (cálcio, sódio, potássio, zinco e hidrogênio) repelidos pelo anodo. Assim, o efeito da proteção catódica por corrente impressa não é só efetiva para a eliminação ou redução da corrosão, mas também para a restauração do filme passivo e da remoção do agente agressor (Lourenço e Costa [12]).

4. Proteção catódica por anodo de sacrifício (proteção galvânica)

No método de proteção catódica por anodo de sacrifício, a corrente elétrica é resultado da diferença natural de potencial entre dois metais distintos, sendo um deles o aço-carbono da armadura (catodo) e, o outro, um metal menos nobre (anodo). Dentre os metais mais adotados em sistemas de proteção galvânica citam-se zinco, alumínio ou magnésio e ligas metálicas destes metais (ACI 222.3R [13]).

Além da diferença de potencial, esse método exige que o meio apresente uma condutividade elétrica constante para que a circulação da corrente elétrica entre anodo e catodo ocorra continuamente. Em estruturas de concreto, tais condições normalmente só são verificadas quando o concreto está exposto a uma umidificação constante ou está imerso. Caso isto não ocorra, a resistividade será variável, podendo em períodos de alta resistividade haver uma queda da corrente, o que pode comprometer a proteção da armadura. Cita-se, também, que esse método não é aplicado em estruturas em que há presença de corrente de interferência.

No Brasil, o sistema mais conhecido e adotado de proteção galvânica é o das pastilhas de zinco puro envolvida por uma argamassa condutiva e alcalina. Essas são galvanicamente conectadas às armaduras expostas, antes da aplicação de argamassas de reparo. Segundo a publicação NACE 01105 [14], esse sistema tem o objetivo de conferir maior eficiência ao reparo, já que pode retardar a corrosão no local e, também, de restringir o aparecimento de anodos incipientes em áreas adjacentes.

No exterior, além desse sistema, é usual adotar, quando da recuperação da estrutura, o sistema de jaqueta, que é composta de uma malha de zinco fixada a uma placa de fibra de vidro. A jaqueta é usada também na recomposição de estacas. Essa é instalada no entorno da estaca, sendo a malha de zinco (anodo) conectada à armadura. Quando da aplicação do material cimentício de reparo, a jaqueta é utilizada como fôrma de concretagem.

Outro sistema, tanto para estruturas novas como deterioradas, é a metalização da superfície do concreto, o que é feito pela aspersão de uma fina camada de zinco puro ou de sua liga com alumínio e índio. Conforme a publicação NACE 01105 [14], em alguns casos, também é necessário o uso de um promotor de retenção de umidade (produto hidrofílico) sob o filme. Em estruturas marinhas, em que ocorre umidificação periódica do concreto, o sistema pode manter uma corrente 10,8 mA/m2, atendendo por anos o critério de 100 mV de polarização real.

5. Caso prático de proteção catódica por corrente impressa

Um sistema de prevenção catódica foi instalado durante a construção do novo cais de carga geral do Porto de Aveiro, Portugal. O sistema de proteção catódica foi instalado nas zonas de maré e de respingos da viga frontal do Cais. Esta zona é considerada a zona de maior risco de corrosão, devido à proximidade com a água. O cais tem um comprimento de 250 m. A área total de concreto armado a ser protegida foi de 1046 m2. Como sistema de anodo foram utilizadas fitas de malha de Ti/MMO, com 20 mm de largura e 0.5 mm de espessura. As fitas foram instaladas com espaçamento de 250 mm e ligadas, por meio de solda, a outra fita de titânio, distribuidora da corrente (ver Figura 7). Essas foram fixas às armaduras, antes da concretagem. Espaçadores apropriados foram usados para evitar a ocorrência de curto circuito.


O controle e monitorização, nesse caso, foram efetuados manualmente, através de uma Unidade Central. Esta unidade era essencialmente constituída por três fontes de alimentação, uma por zona, voltímetros e amperímetros, para medição da intensidade da corrente e da voltagem fornecida, e voltímetro de alta impedância, para medição dos potenciais de eletrodo (ver Figura 7).

Antes do início da aplicação de corrente, foram realizados testes para verificação da funcionalidade de todos os componentes do sistema e assegurar a correta conexão de todos os circuitos. O sistema foi energizado em modo de corrente constante e foi inicialmente ligado com correntes de proteção baixas, de modo a permitir uma polarização lenta do sistema. Em cada subzona foram aplicados diferentes valores de corrente, de modo a permitir avaliar a influência da corrente de proteção nas características de polarização e despolarização de cada parte da estrutura.

A relação entre os valores de despolarização (Potencial CP Off) obtidos em cada sub zona e a densidade de corrente é apresentada na Figura 8. Estes resultados indicam que a densidade de corrente que é necessário aplicar para a obtenção de 100 mV de despolarização, ao fim de 72 h de interrupção da corrente, é da ordem de 3,5 mA/m2. Como o sistema foi dimensionado de modo a poder fornecer densidades de corrente muito superiores ao máximo recomendado, a necessidade de aumento da corrente não apresenta problemas de durabilidade do anodo ou dos outros componentes do sistema.


6. Conclusões

A proteção catódica é uma solução tecnicamente eficaz para evitar a deterioração prematura e prolongar o tempo de vida útil de estruturas de concreto em que se anteveem problemas de durabilidade devido à agressividade do meio ambiente ou devido a problemas de qualidade na construção.

A pesquisa na literatura mostrou que, embora a técnica de proteção catódica seja adequada para estruturas expostas a condições ambientais diversas, esta vem sendo especialmente aplicada em estruturas atmosféricas sujeitas à corrosão por íons cloreto, ou já em processo corrosivo. O método de proteção catódica por corrente impressa é mais usual nessas estruturas do que ao por anodo de sacrifício. No entanto, em alguns casos, a utilização desse últime método é recomendada. Isso ocorre usualmente em elementos mais expostos à umidificação superficial. Em geral, a técnica de anodo de sacrifício é considerada de maior simplicidade de aplicação e de monitoramento mais fácil do que a corrente impressa.

A seleção de ambas os métodos de proteção catódica deve ser feita com base em estudos aprofundados da estrutura e das condições de exposição ao ambiente, dentre outros fatores como os efeitos da sua instalação na estrutura, o custo envolvido, a vida útil requerida e a manutenção. A aplicação de ambas deve ser feita com o apoio de pessoal qualificado.

7. Referências bibliográficas

Received: 19 Jan 2012

Accepted: 12 Aug 2012

Available Online: 05 Apr 2013

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Abr 2013
  • Data do Fascículo
    Abr 2013

Histórico

  • Recebido
    19 Jan 2012
  • Aceito
    12 Ago 2012
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