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Análise numérica de blocos sobre duas estacas com cálice embutido, submetido à ação de força de compressão excêntrica

Resumos

O comportamento estrutural dos blocos sobre estacas com cálice embutido é influenciado pelo tipo de interface pilar-cálice, a qual pode ser lisa ou rugosa. Com o objetivo de analisar o comportamento de blocos sobre duas estacas com cálice embutido, considerando a rugosidade da interface pilar-cálice, submetido à ação de força normal excêntrica, realizaram-se simulações numéricas, desenvolvidas em programa de computador baseado no método dos elementos finitos - MEF. Na análise numérica as não-linearidades físicas dos materiais concreto e aço foram consideradas, como também o atrito nas interfaces entre as paredes do pilar e do cálice. Considerou-se aderência perfeita entre as barras de aço das armaduras com o concreto do entorno. Observou-se que o comprimento de embutimento do pilar no interior do bloco é fator preponderante no comportamento estrutural do elemento em análise.

blocos sobre estacas; fundações; concreto pré-moldado


The structural behavior of pile caps with sockets embedded is influenced by interface of column-socket, which can be smooth or rough. With intent to analyze the behavior of two pile caps with embedded socket, considering the friction between the column and the socket, with eccentric normal load, the numerical simulations were carried out, using a program based on the Finite Element Methods (FEM). In the numerical analysis the non-linear behavior of materials was considered, also the friction between the column and the socket. It was considered perfect bond between the reinforcement and the concrete around. It was observed that the embedded length is preponderant factor in the structural behavior of the analyzed element.

pile caps; foudations; precast concrete


R. G. DelaliberaI; J. S. GiongoII

IDepartamento de Engenharia Civil, Universidade Federal de Goiás - Campus Catalão, dellacivil@pq.cnpq.br, Av. Lamartine Pinto de Avelar, 1120, CEP: 75704-020, Catalão - GO, Brasil

IIDepartamento de Engenharia de Estruturas, Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, jsgiongo@sc.usp.br, Av. Trabalhador Sãocarlense, 400, CEP: 13566-590, São Carlos - SP, Brasil

RESUMO

O comportamento estrutural dos blocos sobre estacas com cálice embutido é influenciado pelo tipo de interface pilar-cálice, a qual pode ser lisa ou rugosa. Com o objetivo de analisar o comportamento de blocos sobre duas estacas com cálice embutido, considerando a rugosidade da interface pilar-cálice, submetido à ação de força normal excêntrica, realizaram-se simulações numéricas, desenvolvidas em programa de computador baseado no método dos elementos finitos - MEF. Na análise numérica as não-linearidades físicas dos materiais concreto e aço foram consideradas, como também o atrito nas interfaces entre as paredes do pilar e do cálice. Considerou-se aderência perfeita entre as barras de aço das armaduras com o concreto do entorno. Observou-se que o comprimento de embutimento do pilar no interior do bloco é fator preponderante no comportamento estrutural do elemento em análise.

Palavras-chave: blocos sobre estacas; fundações; concreto pré-moldado.

ABSTRACT

The structural behavior of pile caps with sockets embedded is influenced by interface of column-socket, which can be smooth or rough. With intent to analyze the behavior of two pile caps with embedded socket, considering the friction between the column and the socket, with eccentric normal load, the numerical simulations were carried out, using a program based on the Finite Element Methods (FEM). In the numerical analysis the non-linear behavior of materials was considered, also the friction between the column and the socket. It was considered perfect bond between the reinforcement and the concrete around. It was observed that the embedded length is preponderant factor in the structural behavior of the analyzed element.

Keywords: pile caps, foudations, precast concrete.

1. Introdução

A escolha do tipo de fundação é feita após análise que considere as condições técnicas e econômicas da obra, as proximidades dos edífícios limítrofes, a natureza e característica do subsolo, as magnitudes das ações e dos tipos de fundações disponíveis no mercado.

As fundações em estacas são adotadas quando o solo em suas camadas superficiais não é capaz de suportar ações oriundas da superestrutura, sendo necessário, portanto, considerar resistência em camadas profundas. Ao se utilizar solução em fundação profunda por estacas (ou tubulões), faz-se necessário a construção de outro elemento estrutural, o bloco de coroamento, também denominado bloco sobre estacas.

Segundo a NBR 6118:2007[1], blocos sobre estacas são importantes elementos estruturais cuja função é transferir as ações da superestrutura para um grupo de estacas. Esses elementos estruturais, apesar de serem fundamentais para a segurança da superestrutura, geralmente não permitem a inspeção visual quando em serviço, sendo assim, é importante o conhecimento de seu real comportamento nos Estados Limites de Serviço e Último. A Figura [1] ilustra esse elemento estrutural.


Quando a superestrutura é pré-moldada faz-se necessário que o pilar seja embutido no bloco. O comprimento de embutimento do pilar no interior do bloco, para que o mesmo seja considerado engastado, é função dos esforços solicitantes (momento fletor, força normal e força cortante) e do tipo de conformação superficial das paredes (rugosa ou lisa) do cálice e do pilar pré-moldado. Os comprimentos de embutimento são definidos pela NBR 9062:2006[2].

Existem algumas variações nos tipos de blocos com cálice (cálice externo, cálice parcialmente embutido e cálice totalmente embutido). A Figura [2] mostra as variações dos blocos sobre estacas para pilares pré-moldados. O meio técnico utiliza com maior intensidade os blocos com cálice externo e parcialmente embutido.


O código europeu (EUROCODE 2) EN 1992-1-1 [3] apresenta recomendações a respeito do projeto de cálice para ligação pilar-fundação, considerando o comportamento monolítico do conjunto quando se utiliza chave de cisalhamento. Para conformação lisa das paredes do cálice e do pilar, indica que o coeficiente de atrito entre as faces do pilar e as faces do cálice seja maior que 0,3 e o comprimento de embutimento do pilar maior ou igual a 1,2 vez a maior dimensão do pilar.

Como não há consenso junto aos meios técnico e científico com relação à seção do bloco onde se forma a escora (ou biela), realizou-se análise numérica, com intuito de observar o comportamento estrutural dos blocos. Para isso foram analisados numericamente dezoito blocos sobre duas estacas, nove com interface rugosa e nove com interface lisa.

O comprimento de embutimento do pilar (ℓemb) e a espessura da laje de fundo do bloco (hs) foram variados. Assim, os comprimentos de embutimento dos pilares pré-moldados foram iguais a 80 cm, 60 cm e 50 cm. As espessuras da laje de fundo foram iguais a 30 cm, 20 cm e 10 cm. Laje de fundo do bloco, não é o melhor termo para expressar a dimensão hs, em função de não existir uma laje propriamente dita no fundo do bloco. Porém, julga-se que esse termo é o que apresenta melhor compreensão para os leitores.

O objetivo deste trabalho é analisar o comportamento estrutural de blocos sobre duas estacas com cálice embutido, com interfaces lisa e rugosa das paredes dos pilar e do cálice, submetido à ação de força normal de compressão excêntrica e, verificar por meio de análise de variância, qual a variável apresenta maior relevância no comportamento dos mesmos.

O método empregado foi o relativo a trabalhos com ênfase em análise numérica. Definidos os modelos que foram estudados, análise estatística foi desenvolvida, utilizando valores obtidos por meio de simulações numéricas. Os blocos de concreto armado sobre estacas foram analisados numericamente por meio de programa de computador baseado nos métodos dos elementos finitos - MEF. As não-linearidades física e geométrica foram consideradas. A fissuração do concreto e a armadura do bloco também foram levadas em consideração. Para a análise numérica dos blocos via método dos elementos finitos, utilizou-se o programa ANSYS® [23] (ANalyser SYStem).

2. Propriedades geométricas dos modelos analisados numericamente

Os modelos foram dimensionados com os critérios de Blévot & Frémy [4]. As taxas de armadura foram fixadas, pois não eram objetos de análise. A distância entre os eixos das estacas também foi fixada, variando-se o comprimento de embutido do pilar (ℓemb) e a espessura da laje de fundo do bloco (hs). O dimensionamento das barras de aço da armadura principal de tração do bloco e as verificações do esmagamento do concreto da diagonal comprimida junto à zona nodal inferior (bloco-estaca) e junto à zona nodal superior (bloco-pilar) foram feitos de acordo com as recomendações do modelo proposto por Blévot & Frémy [4]. Utilizaram-se como limites para verificação das tensões junto às zonas nodais superior e inferior os valores observados pelos pesquisadores franceses, ou seja, 1,40∙fck junto ao pilar e fck junto à estaca.

Optou-se por utilizar ancoragem reta, pois verificou-se por meio das recomendações da NBR 6118:2007[1] que o gancho não era necessário (critérios de ancoragens em apoios extremos). Ao admitir essa hipótese o pesquisador não considerou (decisão de projeto) a recomendação da NBR 6118:2007[1] que exige a utilização de ganchos em blocos sobre estacas. Lembram-se os resultados obtidos por Delalibera [5], Miguel [6] e Adebar et al.[7], para blocos rígidos sobre estacas, onde a tensão na ponta do tirante foi despresível, corroborando com esta descisão.

Para o dimensionamento dos blocos, utilizou-se um bloco padrão, ou seja, todos os blocos tiveram as mesmas dimensões em planta do bloco padrão, variando-se apenas os comprimento de embutimento do pilar (ℓemb) e a espessura da laje de fundo do bloco (hs). Subentende-se, então, que as alturas totais dos modelos e os ângulos de inclinação da biela de compressão também sofreram variações. Para o bloco padrão adotaram-se estacas de seção transversal quadrada igual a 30 cm de lado, pilar também com seção transversal quadrada, porém com 40 cm de lado. O comprimento de embutimento do pilar no bloco padrão foi igual a 60 cm. Esse valor representa o comprimento mínimo de embutimento para paredes lisas (cálice e pilar) especificado na NBR 9062:2006 [2], quando a relação [Md/(Nd∙h)] < 0,15. A Figura [3] apresenta as propriedades geométricas do bloco padrão.


A distância entre os eixos das estacas foi determinada em função do ângulo limite inferior estabelecido pelos pesquisadores franceses, ou seja, 45°. Portanto, a altura total do bloco padrão foi igual a 90 cm, e as dimensões em plantas foram iguais a 240 cm por 84 cm. A distância entre os eixos das estacas de todos os blocos foi igual a cento e oitenta centímetros.

O comprimento de embutimento das estacas na face inferior do bloco seguiu sugestão de Montoya et al. [8], isto é, embutiu-se dez centímetros do fuste da estaca no interior do bloco.

Com relação aos pilares e as estacas adotaram-se resistências características do concreto à compressão igual a 50 MPa procurando evitar assim, ruína desses elementos. As armaduras das estacas foram compostas por oito barras de aço com diâmetro de 20 mm e resistência característica de escoamento igual a 500 MPa, totalizando área de aço igual a 25,1 cm2 (8 barras de 20 mm). Nos pilares utilizaram-se doze barras de 20 mm com resistência característica ao escamento igual a 500 MPa, totalizando área de aço igual a 32,7 cm2. O comprimento externo do pilar foi igual a 100 cm.

Para o material de preenchimento, adotou-se resistência característica à compressão igual a 50 MPa (valor igual à resistência característica do concreto do pilar).

A Figura [4] mostra os fatores que apresentam variações na análise numérica.


A Tabela [1] apresenta as propriedades dos blocos analisados com relação à conformação das paredes lisas e com chave de cisalhamento (rugosa), solicitada pela força de compressão supostamente centrada no pilar e por uma força horizontal aplicada no topo do pilar.

A nomenclatura utilizada na Tabela [1] é descrita: L, blocos com conformação lisa das paredes do cálice e do pilar; R, conformação rugosa das paredes do cálice e do pilar; ℓe80, embutimento do pilar igual a oitenta centímetros (demais números são análogos); hs30, espessura da laje de fundo igual a trinta centímetros (demais números são análogos); NM significa que foi aplicada força de compressão excentrica.

Na mesma tabela Ast representa a área da seção transversal das barras de aço classe CA-50, Blx o comprimento do bloco, Bly a largura do bloco, ℓemb o comprimento de embutimento do pilar pré-moldado e hs a espessura da laje de fundo do bloco.

Utilizando as indicações de Blévot & Frémy [4], fez-se uma previsão das capacidades resistentes dos blocos.

3. Análise numérica

O objetivo da análise numérica foi fornecer resultados para a aplicação de uma análise estatística denominada ANOVA (análise de variância), sendo assim, blocos sobre duas estacas com cálice embutido, com conformação das paredes lisas e rugosas foram analisados. A análise numérica não tinha como objetivo calibrar curvas de resultados experimentais, mas sim, apresentar tendências de comportamento dos modelos analisados.

A geometria de todos os modelos foram criadas no programa de computador AutoCad® e exportadas para o programa de computador ANSYS®[23], por meio de extensão SAT.

A Figura [5] apresenta a rede de elementos finitos utilizadas para a discretização dos elementos de volume (concreto) e os elementos de barra (barras de aço das armaduras).


A força normal foi considerada por meio de uma pressão de 20 MPa aplicada no topo do pilar. O momento foi considerado por meio de uma força horizontal, também aplicada no topo do pilar, cujo valor foi igual a 100 kN, gerando um momento na base pilar de 100 kNm. Ver Figura [04].

Como os modelos eram simétricos, utilizou-se o recurso de simetria. Portanto, analisou-se apenas metade do elemento estrutural. Restringiu-se as translações (nas três direções, x, y e z) dos nós dos elementos posicionados nas pontas das estacas. A Figura [6] apresenta as condições de contorno empregadas nos modelos.


O comprimento de um metro das estacas e do pilar, foi escolhido em função do princípio de Saint - Venant, assim, eliminaram-se as influências das perturbações de tensões nas regiões de aplicação das forças e nas regiões de restrições de translações.

3.1 Elementos finitos utilizados

Para a modelagem do material concreto, utilizou-se o elemento finito Solid 65. Esse elemento possui oito nós com três graus de liberdade por nó - translações nas direções x, y e z. O elemento apresenta deformações plásticas, fissuração e esmagamento em três direções ortogonais. No elemento Solid 65, a fissuração ocorre quando a tensão principal de tração em qualquer direção atinge a superfície de ruptura. Depois da fissuração, o módulo de elasticidade do concreto tem valor igual a zero na direção considerada. O esmagamento ocorre quando todas as tensões de compressão atingem a superfície de ruptura, subseqüentemente, o módulo de elasticidade tem valor igual a zero em todas as direções. A Figura [7] apresenta o elemento Solid 65.


Na modelagem das barras de aço da armadura foi utilizado o elemento finito Link 8. Esse elemento tem dois nós, sendo que cada nó possui três graus de liberdade - translações nas direções x, y e z. A Figura [8] mostra esse elemento. Optou-se por esse elemento, pois as armaduras nos modelos foram discretas.


Nos modelos, não foi considerado o fenômeno da aderência entre as barras de aço e o concreto. Apesar disso, os resultados das comparações entre resultados experimentais e numéricos mostraram-se satisfatórios, como apresentado no item 3.3.

Para representar o atrito entre as paredes do cálice e o material de preenchimento (graute) e as faces do pilar pré-moldados, utilizaram-se elementos de contato, definindo-se superfícies de contato entre os materiais (superfície de contato e superfície alvo). As superfícies de contato entre os materiais foram representadas por dois elementos finitos, denominado "par de contato". Para a superfície de contato, utilizou-se o elemento finito Contact 173 e para a superfície alvo, utilizou-se o elemento finito Target 170. Esses elementos possuem três graus de liberdade em cada nó e as propriedades geométricas são as mesmas das faces dos elementos sólidos aos quais estão ligados, podendo ter geometria triangular ou quadrangular. A Figura [9] apresenta os pares de contado (elemento Contact 173 e Target 170).


Os elementos finitos de contato foram utilizados apenas nos modelos com conformação das paredes do cálice e o pilar lisa, pois, em virtude de pesquisas já realizadas por diversos pesquisadores, pode-se considerar que a ligação pilar-fundação por meio de cálice com chave de cisalhamento tenha comportamento monolítico.

3.2 Propriedades dos materiais

Desenvolver um modelo capaz de representar o comportamento do concreto o mais próximo do comportamento real é um desafio. O concreto armado é um material quase-frágil e tem diferentes comportamentos na compressão e na tração.

Na compressão, a curva tensão vs. deformação do concreto é elástica e linear até aproximadamente 30% da força última de compressão. Após esse ponto, o concreto perde rigidez e segue elevando os valores das tensões até a força de ruptura. Depois disso, não há aumento da tensão sofrendo amolecimento. Na tração, a curva tensão vs. deformação do concreto é aproximadamente elástica e linear até a tensão de tração máxima. Após esse ponto, o concreto fissura e sua resistência é não considerando o amolecimento na tração.

Para modelar o material concreto, é necessário fornecer ao programa Ansys®[23] os seguintes dados de entrada: módulo de elasticidade longitudinal do concreto; resistência última do concreto à compressão e tração; coeficiente de Poisson; e coeficientes de transferência de cisalhamento. O Ansys®[23] também permite como dado de entrada, a inclusão de uma curva tensão vs. deformação para representar as propriedades mecânicas do concreto. Isso normalmente é feito, quando por problemas de convergência, o processamento é interrompido bruscamente por esmagamento precoce do concreto. Kachlakev et al. [9] trazem maiores informações sobre esse fenômeno. Nos modelos analisados, não ocorreu este problema.

O módulo de elasticidade longitudinal do concreto, Ec, como também, a resistência característica à tração, ftk, foram determinadas com base nas recomendações da NBR 6118:2007 [1]. O coeficiente de Poisson, n, adotado para o concreto foi igual a 0,2 e os coeficientes de transferência cisalhamento, b adotados foram iguais a 1 para fissuras abertas e fechadas. Esse valor para os coeficientes b foi utilizado, pois testes feitos demonstraram maior eficiência na convergência do processamento quando utilizou-se o valor mencionado, ver Delalibera [5].

Foi utilizado o critério de ruptura Concrete fornecido pelo Ansys®. Para a definição da superfície de ruptura se fazem necessários apenas dois parâmetros: as resistências à compressão e tração últimas do concreto. O critério de ruptura Concrete é análogo ao critério de ruptura de Willam-Warnke. A Figura [10] apresenta a superfície de ruptura.


Em todos os blocos adotaram-se resistência característica do concreto à compressão (fck) igual a 25 MPa.

Para as barras de aço, adotou-se comportamento elastoplástico perfeito. O módulo de elasticidade utilizado foi igual a 210 GPa, o coeficiente de Poisson igual a 0,3 e a resistência característica ao escoamento igual a 500 MPa.

Por meio de testes realizados, constatou-se que o critério de Newton-Raphson foi o que apresentou melhores resultados quanto à convergência dos modelos, sendo assim, em todas as análises utilizou-se esse critério.

Para as propriedades dos elementos de contato, utilizou-se o modelo de atrito de Coulomb, sendo necessário definir o valor do coeficiente de atrito m, as tensões máximas de cisalhamento, tmáx e duas constantes, FKN e FTOLN. FKN representa um coeficiente de rigidez normal do elemento de contato e a constante FTOLN é um fator de tolerância a ser aplicado no sentido do vetor normal da superfície. Esse fator é utilizado para determinar a compatibilidade da penetração. A compatibilidade do contato é satisfeita se a penetração estiver dentro de uma tolerância permissível (FTOLN mede a profundidade de elementos subjacentes). A profundidade é definida pela profundidade média de cada elemento individual do contato no par. Se o programa de computador Ansys®[23] detectar qualquer penetração maior do que esta tolerância, a solução global não converge, mesmo que as forças residuais e os incrementos de deslocamento se encontrem dentro dos critérios da convergência adotada. Para o coeficiente FKN utilizou-se valor igual a 1 e para FTOL valor igual 0,1.

A escolha do valor "correto" do coeficiente de atrito é uma tarefa difícil, pois o mesmo depende de vários fatores: tipo de superfície, intensidades das ações, propriedades mecânicas dos materiais que compõem a ligação pilar-fundação. Existem nas literaturas técnicas várias indicações para o valor do coeficiente de atrito concreto-concreto. Segundo Nielsen [10] o valor a ser utilizado é 0,6, a EN 1992-1-1 [03] indica que o valor do coeficiente de atrito para a situação onde a ligação pilar-fundação por meio cálice com paredes lisas, deve ser maior que 0,3. Canha [11] e Ebeling [12] analisaram a influência do coeficiente de atrito em ligações pilar-fundação por meio de cálice, variando-se o valor de 0,60, 0,45 e 0,30. Osanai et al. [13] sugere que os valores dos coeficientes de atrito tenham valores iguais a 0,5 e 1, função do comprimento de embutimento do pilar e do tipo de conformação das paredes do cálice e do pilar. Neste trabalho, sugerindo as recomendações de Canha & El Debs [14] utilizou-se coeficiente de atrito igual a 0,6. É importante lembrar que esta análise numérica tem como objetivo apresentar tendência do comportamento da ligação pilar-fundação por meio de cálice embutido em blocos sobre duas estacas, com fim principal de analisar a relevância dos fatores analisados.

Com relação à tensão de cisalhamento, tmáx, adotou-se o valor utilizado pelo programa de computador, [σy/(3½)], em que σy é a resistência ao escoamento do critério de ruptura de Von Mises, do material adjacente à superfície de contato. Para σy utilizou-se valores indicados por Canha [11], onde essa tensão vale trinta por cento da resistência à compressão do concreto de menor resistência pertencente ao contato. Portanto, o valor de σy adotado foi igual a 7,5 MPa, resultando 2,5 MPa para o valor de tmáx.

3.3 Análise comparativa

Visando verificar se os modelos adotados para a análise numérica dos blocos sobre duas estacas mostram tendência de comportamento correta, fizeram-se análises comparativas de ensaios experimentais e simulações numéricas de vários pesquisadores. Neste trabalho serão apresentados os resultados das análises numéricas comparativas dos ensaios realizados por Mautoni [15] e Adebar et al.[16] e da simulação numérica desenvolvida por Sam & Iyer [17]. Em Delalibera [5], pode-se observar os restantes das análises comparativas realizadas e maiores detalhes das análises numéricas desenvolvidas.

Na análise comparativa, também utilizaram-se os mesmos elementos finitos empregados nas análises dos blocos sobre duas estacas, ou seja, o Solid 65 - discretizando o material concreto e o Link 8 - modelando as barras de aço. Todas as propriedades mecânicas e geométricas adotadas na análise comparativa foram às mesmas dos ensaios experimentais. As condições de contorno empregadas nos modelos numéricos tentaram representar as condições de contorno empregadas nos experimentos com maior grau de realidade possível, o mesmo acontecendo com o carregamento.

A primeira análise comparativa trata-se do bloco B1-A ensaiado por Mautoni [15]. O bloco teve ruína por cisalhamento com força última igual a 800 kN. A primeira fissura surgiu com aproximadamente trinta por cento da força última, cerca de 240 kN. O bloco tinha altura de vinte e cinco centímetros, o pilar era quadrado com área igual a 225 cm2 e as estacas tinham seções transversais iguais a 10 cm x 15 cm. O concreto apresentou resistência à compressão igual a 32,30 MPa e as barras de aço do tirante apresentavam resistência ao escoamento igual a 720 MPa. Como não existiam informações sobre o módulo de elasticidade e sobre os coeficientes de Poisson do aço e concreto, adotaram-se as recomendações da NBR 6118:2007[1].

Aplicou-se no modelo numérico trezentos incrementos de força, sendo que, para cada incremento o valor da força aplicada era de 2,67 kN. A Figura [11] mostra a configuração final obtida no experimento e na simulação do bloco B1-A.


O valor da força que originou a primeira fissura no modelo numérico foi de 312,33 kN. Ocorreu diferença de 23,15% com relação ao valor da força que originou a primeira fissura no modelo experimental. Isso ocorreu, pois, no modelo experimental, a força que provocou a primeira fissura foi determinada em função de observação visual, ou seja, a primeira fissura visível ao olho humano. Com relação à força última, o modelo numérico, apresentou força última de 799,98 kN, praticamente, não ocorrendo diferença com o valor obtido experimentalmente.

A segunda análise comparativa trata-se dos blocos ensaiados por Adebar et al. [16]. Foram simulados os blocos A, B, C, D e F. Todos os blocos tinham altura de sessenta centímetros e coeficientes de Poisson iguais 0,3 e 0,2 para aço e concreto respectivamente. Em todos os blocos foram aplicados quinhentos incrementos de força.

O Bloco A foi constituído por quatro estacas com diâmetro de vinte centímetros e pilar com seção transversal quadrada com trinta centímetros de lado. A resistência média à compressão do concreto (fcm) obtida nos ensaios foi igual a 27,10 MPa. As barras de aço possuíam resistência ao escoamento igual a 479 MPa. No ensaio, a primeira fissura surgiu com força igual a 1186 kN e a força de ruptura foi igual a 1781 kN. No modelo numérico, a primeira fissura ocorreu com força igual a 1403,86 e a força de ruína obtida foi igual a 1781,10 kN.

O Bloco B possuía as mesmas propriedades geométricas do Bloco A, porém, a armadura era distribuída sobre as estacas, enquanto que no Bloco A, a armadura era distribuída em malha. A resistência do concreto à compressão foi de 24,80 MPa e a resistência ao escoamento das barras de aço dos tirantes foi a mesma do Bloco A. No ensaio, a primeira fissura surgiu para uma força de 1679 kN, já, no modelo numérico, a primeira fissura ocorreu com 1505,71 kN. A força de ruína experimental foi registrada com valor igual a 2189 kN e na simulação numérica, a força obtida foi de 2186 kN.

O Bloco C tinha seis estacas com diâmetros de vinte centímetros e pilar com a mesma seção transversal dos demais modelos. A resistência média do concreto à compressão era de 27,10 MPa enquanto que a resistência ao escoamento das barras de aço dos tirantes tinha valor igual 479 MPa. A primeira fissura no ensaio surgiu para uma força de 1780 kN e a força de ruptura observada foi de 2892 kN. No modelo numérico essas forças foram de 1588,30 kN e 2647,70 kN respectivamente.

O Bloco D era semelhante ao Bloco B, mudando-se apenas a área das barras de aço da armadura do tirante. A resistência do concreto à compressão foi igual a 30,30 MPa e a resistência ao escoamento das barras igual a de 486 MPa. A primeira fissura apresentou-se para a força de 1122 kN e a ruptura do bloco se deu para a força de 3222 kN. Na simulação numérica, a força que originou a primeira fissura foi de 1097,74 kN e a força de ruína observada foi de 3212,17 kN. Apesar de obter boa correlação entre as forças de fissuração e última, a simulação numérica apresentou diferenças significativas em relação à rigidez do bloco D ensaiado experimentalmente, ver Figura [15].



O Bloco F tinha as mesmas propriedades mecânicas do Bloco B, porém, mudou-se apenas a forma geométrica do mesmo. A força que provocou a primeira fissura no ensaio foi igual a 650 kN e a força de ruína observada foi igual a 3026 kN. Na simulação numérica, essas forças foram de 501,94 kN e 2589,74 kN.

As Figuras [12], [13], [14], [15] e [16] mostram as correlações obtidas entre os resultados experimentais e numéricos e a Tabela [2] as relações entre as forças últimas experimentais e numéricas.

A terceira análise comparativa refere-se aos blocos simulados numericamente por Iyer & Sam [17]. Foram simulados os blocos com arranjo de armadura distribuída em malha e sobre as estacas.

Os blocos tinham altura de vinte e dois centímetros e cinco milímetros e eram compostos por quatros estacas com seção transversal quadrada de 10 cm x 10 cm. Os pilares também tinham seção quadrada com 14,14 cm x 14,14 cm de lado. A resistência característica do concreto era igual a 19 MPa e a resistência característica ao escoamento das barras de aço igual a 300 MPa. O coeficiente de Poisson adotado para aço e concreto foi 0,3 e 0,2, respectivamente. Nas simulações numéricas adotaram-se 345 incrementos de força. As forças últimas obtidas nas análises desenvolvidas por Iyer & Sam (1995) foram de: 600 kN, para armadura em malha e 560 kN, para armadura sobre as estacas. Na simulação numérica desenvolvida neste texto, as forças encontradas foram de: 582,17 kN para os blocos com arranjo de armadura distribuída em malha e 594,59 kN para os blocos com arranjo de armadura distribuída sobre as estacas. As Figuras [17] e [18] apresentam as correlações entre os resultados obtidos.


Observa-se nas Figuras [17] e [18] , que existe ótima correlação entre os resultados, indicando que o modelo adotado na análise numérica é coerente.

3.4 Influência do comprimento da estaca e do solo

Como o ensaio experimental de blocos com estacas de comprimentos reais são de difícil execução, simularam-se blocos com estacas de comprimentos reais, com objetivo de observar o comportamento do fluxo de tensões principais de compressão e a influência do comprimento das estacas no bloco. Para isso, quatro blocos foram modelados - três com estacas com comprimentos reais e um com estacas de pequena altura. Na modelagem utilizou-se um bloco sobre duas estacas com ângulo de inclinação da biela de compressão igual a 45º. O comprimento das estacas foi determinado em função do resultado da sondagem executada pelo Departamento de Geotecnia, no Campus I da USP em São Carlos. Assim, o comprimento calculado do fuste das estacas foi igual a 9,0 m. A Figura [19] mostra o resultado da sondagem a percussão (S.P.T.) e a Figura [20] os blocos analisados numericamente.



O atrito entre a estaca e o solo não foi levado em consideração. Para o solo existente em torno do fuste da estaca, adotou-se comportamento plástico (critério de ruptura Drucker-Prager). O resultado da sondagem a percussão e as propriedades mecânicas do solo foram obtidas em Senna Júnior [18]. A força foi aplicada por meio de cem incrementos, admitindo-a centrada. Nos modelos onde não existia a contribuição do solo (Bloco A e B - Figura [20]), aplicou-se força até a ruptura do bloco. Nos demais modelos, a ação aplicada correspondeu à capacidade de carga das estacas, ou seja, 600 kN.

Na modelagem do solo, utilizou-se o modelo do Meio Contínuo elástico (Solo 1, 4 e 5 - Figura [20]) e elastoplástico (Solo 1 e 2 - Figura [20]). O solo poderia ser modelado utilizando as hipóteses de Winkler (pressões de contato são proporcionais aos recalques), porém, segundo Velloso [19], o modelo do Meio Contínuo representa com maior precisão o fenômeno da interação solo-estrutura.

Para evitar que ocorresse perturbação localizada de tensões no ponto de aplicação da força, modelou-se uma placa de aço na cabeça do pilar com espessura de cinco centímetros e material elástico e linear, o mesmo ocorrendo em toda a análise numérica desenvolvida.

Como se pretendia analisar o comportamento dos blocos, adotaram-se nas estacas e nos pilares, concreto com resistência característica à compressão igual a 50 MPa. Os coeficientes de transferência de cisalhamento também tiveram valor igual a 1. O módulo de elasticidade do aço e do concreto, como também os seus respectivos coeficientes de Poisson, foram determinados com auxílio da NBR 6118:2007[1]. As taxas de armadura foram iguais em todos os modelos, sendo que, as áreas de armadura das estacas, dos pilares e dos tirantes são apresentadas na Tabela [3]. Para maiores informações, ver Delalibera [5].

Por meio das Figuras 21 a 24, observa-se que existe maior concentração de tensões de compressão nas seções do bloco logo abaixo do pilar e nas seções das estacas mais afastadas da borda do bloco, seções F e G - Figura [20]. Verificou-se que as estacas não são solicitadas de maneira uniforme, ou seja, as seções mais afastadas das bordas do bloco (seções F e G - Figura [25]) foram mais solicitadas que as seções mais próximas da borda (seções D e I - Figura [25]). Este fenômeno ocorreu em todos os modelos analisados.






Em função da diferença entre as intensidades das forças aplicadas nos blocos sem a presença do solo (blocos A e B - Figura [20]), que foram maiores, em relação aos blocos modelados com o solo (blocos C e D - Figura [20]), ocorreram diferenças nas intensidades das tensões principais de compressão, o que era previsto, uma vez que a ruptura do conjunto solo-estrutura dos blocos C e D se deram pelo solo.

Por meio dos valores apresentados na Tabela [4] é possível concluir que as seções F e G, na zona nodal inferior (junto às estacas) foram mais solicitadas, pois como a distribuição das tensões oriundas da escora (ou biela) não se dá de maneira uniforme na "cabeça" das estacas, as regiões mais próximas do pilar foram as que apresentaram maiores tensões. Esses resultados são similares aos resultados experimentais obtidos por Delalibera & Giongo [25].

Em função destes resultados, todas as análises desenvolvidas foram feitas utilizando estacas curtas, pois constatou-se, que a distribuição dos fluxos das tensões principais de compressão é pouco influenciada pela rigidez das estacas.

Um resultado interessante constatado durante estas análises foi com relação à uniformização das tensões principais de compressão nas estacas. Nos blocos B, C e D (ver Figura [20]), que tinham estacas com comprimentos longos, verificou-se que as tensões se uniformizaram aproximadamente a 1/3 da altura do fuste da estaca.

4. Análise de variância

A análise de variância é um teste estatístico amplamente difundido entre os estatísticos e visa fundamentalmente verificar se existe diferença significativa entre as médias e se os fatores exercem influência em alguma variável dependente.

Os fatores propostos podem ser de origem qualitativa ou quantitativa, mas a variável dependente necessariamente deverá ser contínua.

A principal aplicação da ANOVA (analise of variance) é a comparação de médias oriundas de grupos diferentes, também chamados tratamentos.

Existem dois tipos de problemas a serem resolvidos por meio da ANOVA: fatores fixos ou fatores aleatórios. A aleatoriedade determina a questão do problema.

Na grande maioria dos casos trata-se de fatores fixos, afinal o segundo tipo de problema (aleatório) somente surgirá quando ocorrer um estudo envolvendo uma escolha aleatória de fatores.

A análise de variância é amplamente utilizada em diversas áreas. Na Engenharia Civil, sua utilização ainda é restrita, porém, já existem trabalhos desenvolvidos utilizando a técnica, como por exemplo: Lima Júnior [20], Delalibera [5] e Pituba et al. [21].

Na análise de variância desenvolvida neste trabalho, utilizaram-se fatores fixos, escolhendo-se três variáveis de estudo: o comprimento de embutimento do pilar no cálice (ℓemb); a espessura da "laje" de fundo do bloco (hs); e a conformação das paredes do cálice embutido e do pilar pré-moldado. As variáveis escolhidas totalizaram dezoito casos de combinações. Os modelos foram divididos em dois grupos (paredes lisas - L e paredes rugosas - R).

4.1 Formulação da análise de variância

Sejam N e M os fatores principais fixos da análise de variância, a, b e c, as variações desses fatores e n o número de réplicas. Em geral existirá abc...n combinações possíveis. Se todos os fatores do experimento forem fixados, pode-se facilmente formular o problema, obtendo resultados que indicam quais dos fatores analisados são importantes como também suas combinações. A Tabela [5] apresenta uma análise de variância com dois fatores.

Para verificar a relevância de um determinado fator principal fixo ou combinações entre os fatores principais, faz-se a relação entre a média dos quadrados de cada fator principal ou combinação dos fatores principais pela média dos quadrados dos erros. A divisão entre a média dos quadrados de cada fator principal ou combinação dos fatores principais pela média dos erros é chamada de F0.

O número de graus de liberdade de cada fator principal é igual ao número de variações de cada fator menos a unidade. O número de graus de liberdade dos fatores principais combinados é o produto entre os fatores principais que foram combinados.

A soma total dos quadrados é calculada por meio da Equaçao [1].

A soma dos quadrados da combinação N x M é expressa por meio da Equação 2. A soma dos quadrados do erro é definida pela Equação 3.

Para verificação da relevância de uma determinada variável principal fixa ou combinada, aplica-se o teste F. Por meio de valores tabelados de Fcrítico, fornecidos por Montgomery [24], compara-se o valor calculado de F0 com o valor de Fcrítico. Se o valor calculado de F0 for maior que o valor tabelado de Fcrítico significa que esse fator é relevante, caso contrário, implica que o fator não possui importância significativa. Os valores de Fcrítico são função do número de graus de liberdade de cada variável e do número de graus de liberdade total.

5. Resultados obtidos

5.1 Análise dos blocos sobre duas estacas - força normal, momento e paredes lisas

Foram analisados nove blocos solicitados por ação de força de normal de compressão e momento (o momento aplicado ao bloco foi obtido por meio de aplicação de uma força horizontal aplicada no topo do pilar). Os blocos apresentavam variações no comprimento de embutimento do pilar (ℓemb) e na espessura da "laje" de fundo do bloco (hs). A variação dos fatores analisados modificou de modo significativo a distribuição das tensões principais de compressão e o panorama de fissuras no último incremento de força aplicado aos modelos. A Tabela [6] apresenta resultados das análises numéricas realizadas.

Considerando os resultados da Tabela [6], observa-se que para menores comprimentos de embutimento do pilar e menores espessuras da laje de fundo (no caso dos modelos Lℓe60hs10NM e Lℓe50hs10NM) ocorreram diferenças significativas com relação aos valores analíticos. Isso demonstra que a capacidade resistente do bloco não pode ser determinada em função da ruptura da diagonal comprimida, mas sim, pelo efeito de punção da "laje" de fundo. É interessante observar, que, o efeito da punção só ocorrerá se, e somente se, a força no pilar for transmitida (quase toda) para a "laje" de fundo e, isso só ocorrerá se o comprimento de embutimento do pilar for pequeno, não sendo possível a formação da biela (ou escora), sendo a ruptura do elemento caracterizada por punção.

A Figura [26] apresenta curvas "reação na estaca mais solicitada vs. deslocamento no meio do vão do bloco" para os modelos analisados numericamente.


A Figura [27] mostra a distribuição das tensões principais de compressão no interior de um dos blocos analisados numericamente e a Figura [28] mostra o panorama de fissuração do mesmo bloco apresentado na Figura [27], referente ao último incremento de força.


Para os modelos de blocos com conformação das paredes do cálice e do pilar, com atuação de força normal e momento no bloco, o fator ℓemb é o principal fator relevante, seguido do fator hs.

A Tabela [7] mostra os resultados da análise de variância dos modelos de blocos com conformação das paredes do cálice e do pilar, com atuação de força normal e momento no bloco.

Por meio da análise numérica, observou-se que as diferenças existentes nas áreas das bielas de compressão junto às estacas, quando comparadas com as áreas das bielas calculadas utilizando os critérios de Blévot & Frémy [4] também ocorreram, corroborando com os resultados experimentais encontrados por Delalibera & Giongo [25]. Na Tabela [6] apresentam-se os resultados das áreas das bielas calcudas pelo critério de Blevót (considerando um plano inclincado de q) e as áreas das bielas obtidas numericamente (para o cálculo das áreas das bielas obtidas por meio dos resultados numéricos, utilizou-se os valores das tensões principais de compressão junto às estacas), como também as excentricidades da força normal de cada modelo.

5.3 Análise dos blocos sobre duas estacas - força normal, momento e paredes rugosas

Foram analisados nove blocos solicitados por ação de força normal de compressão e momento, com variações no comprimento de embutimento do pilar (ℓemb) e na espessura da "laje" de fundo do bloco (hs). A variação dos fatores analisados modificou, também neste caso, a distribuição das tensões principais de compressão e o panorama de fissura no último incremento de forças (horizontal e vertical) aplicadas aos modelos. A Tabela [8] apresenta resultados das análises numéricas, a Figura [29] mostra a distribuição das tensões principais de compressão e a Figura [30] o panorama de fissuração dos blocos analisados numericamente.




A causa da ruína precoce do modelo Rℓe60hs10NM provavelmente está relacionada com a punção da "laje de fundo" do bloco e do modelo Rℓe50hs20NM, em virtude do pequeno comprimento do embutimento do pilar.

Por meio da Tabela [8], observam-se as diferenças entre as áreas das bielas de compressão junto às estacas, calculadas pelo critério analítico desenvolvido por Blévot & Frémy [4] e utilizando os modelos numéricos. Na mesma tabela, apresentam-se os valores das excentricidades da força normal de cada modelo analisado numericamente.

É possível observar por meio das Figuras [29] e [30] a formação das diagonais comprimidas e o panorama de fissuração de um dos blocos analisados numericamnete. Constata-se que os modelos de bielas de tirantes devem ser modificados em função das ações externas atuantes no bloco, ou seja, idealizar um modelo que contemple as ações de momento, força normal e força horizontal.

A Figura [31] mostra curvas "reação na estaca mais solicitada vs. deslocamento no meio do vão do bloco".


O comportamento dos blocos submeticos a ação de momento e força de compressão, indicam que os blocos com maior rigidez apresentam maior capacidade portante e a presença de momento nos mesmos, a reduz. Delalibera [5] comprova experimentalmente essa afirmação.

Delalibera & Giongo [26], analisaram os mesmos blocos deste trabalho, porém aplicou-se apenas força de compressão centrada. Observou-se, que a capacidade portante dos blocos com apenas força centrada foi superior aos blocos com força excêntrica.

A Tabela [9] apresenta os resultados da análise de variância dos blocos submetidos à força de compressão excêntrica e conformação rugosa da interface pilar-cálice.

Outro resultado muito interessante que condiz com afirmações de outros pesquisadores pode ser observado por meio dos valores da Tabela [9]. Como a ligação com chave de cisalhamento, confere à ligação pilar-fundação comportamento monolítico, é de esperar que a ruína dos blocos esteja associada com outros fatores. Isso foi constatado, pois, nota-se que os fatores previamente escolhidos para esta análise não foram relevantes, ou seja, não apresentaram valores significantes. Tais resultados corroboram com os resultados apresentados por Canha & El Debs[14], onde constatou-se que se respeitando o comprimento de embutimento mínimo do pilar estabelecido pela NBR 9062:2006, pode-se consdiderar mononítico o comportamento da ligação pilar-cálice.

5.3 Tensões nas barras de aço

Analisando-se a Figura [32], percebe-se que as barras de aço da armadura dos modelos apresentaram valores consistentes e em alguns casos, ocorreu escoamento. Observou-se que em algumas barras de aço das estacas, ocorreram tensões de tração. Esses resultados são coerentes em função das ações externas aplicadas.


Os resultados apresentados na Figura [32] corroboram com os resultados apresentados por Adebar. et al. [7], Miguel [6] e Delalibera [5], ou seja, a tensão nas barras da armadura principal de tração não é constante, tendo valores nulos (ou até negativo) na ponta dos tirantes e valores máximos no meio de vão. Observa-se também que, as barras de aço que compõem a armadura das estacas apresentam tensões com valores diferentes, o que indica flexo-compressão nas estacas.

6. Conclusão

As simulações numéricas se mostraram coerentes e apontaram tendência do comportamento estrutural de blocos sobre duas estacas com cálice embutido, com conformação das paredes do cálice e do pilar lisas e rugosas.

Observaram-se para os blocos com interface lisa entre as paredes do cálice e do pilar, os seguintes fatores: comprimento de embutimento do pilar - ℓemb e espessura da laje de fundo - hs, tem importância relevante na capacidade portante dos modelos. Pois, os modelos analisados numericamente com maiores comprimentos de embutimento do pilar e maiores espessuras da "laje" de fundo, apresentaram maior capacidade portante. Além disso, ficou evidente que nas situações em que se tinha comprimento de embutimento do pilar diminuído e pequena espessura da "laje" de fundo, a possível ruína ocorreu por punção do bloco na região de contato entre a base do pilar e a base do bloco.

Para os modelos simulados com interface rugosa entre as paredes do cálice e do pilar (chave de cisalhamento), os fatores analisados (ℓemb e hs) não foram relevantes na determinação da capacidade portante dos blocos. Esses resultados são interessantes, pois é possível projetar blocos sobre estacas com cálice embutidos e chave de cisalhamento, com modelos de bielas e tirantes, preocupando-se apenas com a punção da "laje" de fundo do bloco, durante a fase de montagem (ou seja, antes da aplicação do material de preenchimento), desde que respeitado o comprimento mínimo de embutimento do pilar no cálice, sugerido pela NBR 9062:2006. Faz-se necessário um maior número de ensaios experimentais, para que possa verificar a possiblidade da diminuição do comprimento de embutimento do pilar no cálice.

Observou-se também que a rigidez do bloco influencia na capacidade portante do mesmo. Pode-se se afirmar isso, em função dos resultados obtidos, pois os modelos com maiores alturas foram os que apresentaram maior capacidade resistente.

Constatou-se, e isso já era esperado, que os modelos analisados numericamente com interface lisa, apresentaram menor capacidade portante com relação aos modelos analisados numericamente com interface rugosa.

7. Agradecimentos

Ao CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e à FAPESP - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo pelo apoio financeiro para fazer a pesquisa que permitiu escrever este artigo.

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  • Análise numérica de blocos sobre duas estacas com cálice embutido, submetido à ação de força de compressão excêntrica

    Numerical analysis of two pile caps with sockets embedded, subject the eccentric compression load
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Jul 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 2013

    Histórico

    • Recebido
      04 Set 2012
    • Aceito
      07 Mar 2013
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