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Investigação experimental sobre o uso de ensaios de aderência aço-concreto para estimativa da resistência à compressão axial do concreto: parte 1

Resumos

A presente pesquisa se propõe a estudar a viabilidade do uso de ensaios de aderência aço-concreto para estimativa da resistência à compressão axial do concreto, com o objetivo de empregá-los como um complemento no controle de qualidade do concreto armado. Lorrain e Barbosa (2008) 14] e Lorrain et al. (2011) 15] justificam a utilização de um ensaio de aderência modificado, denominado APULOT, para estimar a resistência à compressão do concreto, incrementando as possibilidades de controle tecnológico do concreto armado em canteiros de obras. Os mesmos propõem uma adaptação do método pull-out test (POT) tradicional, normalizado pela CEB/FIP RC6:1983 8], por ser este um ensaio de baixa complexidade e de custo reduzido. Para viabilizar o uso do ensaio APULOT como ensaio de controle tecnológico do concreto em canteiro de obras é necessário definir um padrão para o mesmo e adaptá-lo da prática experimental do laboratório para o campo. O presente trabalho buscou avaliar num primeiro momento, a potencialidade de efetuar estimativas da resistência à compressão a partir dos dados da tensão de aderência obtidos com uso do POT. Para tanto, foram ensaiadas 2 composições de concreto de classes distintas, aos 3, 7 e 28 dias. Foram, ainda, usadas na confecção dos corpos de prova barras nervuradas com diâmetros nominais de 8, 10 e 12,5 mm, totalizando 108 ensaios do tipo POT. Os resultados obtidos mostram que, sob condições padronizadas de ensaio, a correlação entre a tensão máxima de aderência e a resistência à compressão do concreto é satisfatória, em todas as idades ensaiadas, fortalecendo o propósito de consolidar este ensaio como uma alternativa complementar para controle de qualidade do concreto armado. Na segunda parte deste trabalho serão apresentados e discutidos resultados de ensaios realizados com o método APULOT.

aderência aço-concreto; pull-out; APULOT; resistência à compressão do concreto


This study analyzes the feasibility of using steel-concrete bond tests for determining the compressive strength of concrete in order to use it as a complement in the quality control of reinforced concrete. Lorrain and Barbosa (2008) 14] and Lorrain et al. (2011) 15] justify the use of a modified bond test, termed APULOT, to estimate the compressive strength of concrete, hence increasing the possibilities for the technological control of reinforced concrete for constructions. They propose an adaptation of the traditional pull-out test (POT) method, standardized by the CEB / FIP RC6: 1983 8], because it is a low complexity and low cost test. To enable the use of the APULOT test as a technological control test of concrete at construction sites requires determining its methodology and adapting the experimental laboratory practice to the construction itself. The aim of this study is to evaluate the possibility of conducting compressive strength estimates using bond stress data obtained by the traditional pull-out tests (POT). Thus, two concrete compositions of different classes were tested at 3, 7 and 28 days. Ribbed bar specimens (nominal diameters of 8, 10 and 12.5 mm) were also used in the preparation stage, totaling 108 POT tests. The results show that the correlation between the maximum bond stress and the compressive strength of concrete is satisfactory in predetermined cases, at all ages tested, reinforcing the purpose of consolidating this test as a complementary alternative to control the quality of reinforced concrete. In the second part of this paper the test results obtained with the APULOT method are presented and discussed.

steel-concrete bond; pull-out; APULOT; compressive strength of concrete


Investigação experimental sobre o uso de ensaios de aderência aço-concreto para estimativa da resistência à compressão axial do concreto: parte 1

B. V. SilvaI; M. P. BarbosaII; L. C. P. Silva FilhoIII; M. S. LorrainIV

IDoutorando, Univesidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Pós Graduação em Engenharia Civil, dovalesilva@hotmail.com, Porto Alegre, Brasil

IIProfessora Associada, Univesidade Estadual Paulista, Departamento de Engenharia Civil, mbarbosa@dec.feis.unesp.br, Ilha Solteira, Brasil

IIIProfessor Doutor, Univesidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Pós Graduação em Engenharia Civil, lcarlos66@gmail.com, Porto Alegre, Brasil

IVProfesseur, Institut National des Sciences Apliquées, Département de Génie Civil, michel.lorrain@insa-toulouse.fr, Toulouse, França

RESUMO

A presente pesquisa se propõe a estudar a viabilidade do uso de ensaios de aderência aço-concreto para estimativa da resistência à compressãoaxial do concreto, com o objetivo de empregá-los como um complemento no controle de qualidade do concreto armado. Lorrain e Barbosa (2008) [14] e Lorrain et al. (2011) [15] justificam a utilização de um ensaio de aderência modificado, denominado APULOT, para estimar a resistência àcompressão do concreto, incrementando as possibilidades de controle tecnológico do concreto armado em canteiros de obras. Os mesmos propõemuma adaptação do método pull-out test (POT) tradicional, normalizado pela CEB/FIP RC6:1983 [8], por ser este um ensaio de baixa complexidadee de custo reduzido. Para viabilizar o uso do ensaio APULOT como ensaio de controle tecnológico do concreto em canteiro de obras é necessáriodefinir um padrão para o mesmo e adaptá-lo da prática experimental do laboratório para o campo. O presente trabalho buscou avaliar num primeiromomento, a potencialidade de efetuar estimativas da resistência à compressão a partir dos dados da tensão de aderência obtidos com uso do POT.Para tanto, foram ensaiadas 2 composições de concreto de classes distintas, aos 3, 7 e 28 dias. Foram, ainda, usadas na confecção dos corpos deprova barras nervuradas com diâmetros nominais de 8, 10 e 12,5 mm, totalizando 108 ensaios do tipo POT. Os resultados obtidos mostram que,sob condições padronizadas de ensaio, a correlação entre a tensão máxima de aderência e a resistência à compressão do concreto é satisfatória,em todas as idades ensaiadas, fortalecendo o propósito de consolidar este ensaio como uma alternativa complementar para controle de qualidadedo concreto armado. Na segunda parte deste trabalho serão apresentados e discutidos resultados de ensaios realizados com o método APULOT.

Palavras-chave: aderência aço-concreto; pull-out; APULOT; resistência à compressão do concreto.

1. Introdução

No ramo da construção civil, um dos ensaios mais conhecidos e aplicados para controle da qualidade do concreto armado é o ensaio de compressão axial de corpos de prova, que são normalmente moldados no recebimento do concreto em obra, antes do lançamento nas fôrmas. Este tipo de ensaio é padronizado no Brasil pela ABNT NBR 5739:2007 [5] e, por meio dele, se obtém uma estimativa da resistência à compressão do concreto, principal parâmetro de projeto e do controle estrutural.

Todavia, para execução deste ensaio, faz-se necessário o uso de equipamentos apropriados e de técnicos treinados, que normalmente não estão disponíveis em canteiros de obras, acarretando na necessidade da contratação de laboratórios especializados por parte da construtora. Além disso, para que se obtenham resultados confiáveis, com ruído experimental reduzido, é necessário ter cuidado e controlar uma série de fatores, tais como a moldagem, a armazenagem, o capeamento e a velocidade de carregamento do corpo de prova. Eventuais desvios do procedimento padrão de ensaio, ou problemas de planicidade dos topos, que acarretem em concentrações de tensões, podem afetar significativamente os resultados obtidos, especialmente em concretos de resistência mais elevada.

Reconhecendo a importância e utilidade do ensaio tradicional de determinação da resistência axial à compressão do concreto, mas conscientes dos inconvenientes experimentais, que podem afetar a qualidade e a precisão dos resultados obtidos, um grupo de pesquisadores, liderado pelo Prof. Michel Lorrain do INSA de Toulouse, vem analisando a possibilidade de empregar um ensaio de aderência aço-concreto adaptado à obra para estimar a resis tência à compressão do concreto [14]. Como explicam Lorrain et al. (2011) [15], esse grupo, formado por pesquisadores da França, Brasil e outros países, tem trabalhado no aprimoramento de um novo método de ensaio, tomando como base o ensaio de aderência aço concreto: pull-out test (POT), proposto inicialmente como uma recomendação do CEB/FIP RC6:1983 [8], que se caracteriza pela simplicidade e custo reduzido.

O novo método recebeu a denominação de APULOT (Appropriate Pull-Out Test) e, nos testes realizados, tem apresentado boa reprodutibilidade e uma adequada capacidade de estimação da resistência à compressão [19]. Dentre as vantagens do novo método proposto podem-se destacar a simplicidade de execução, a redução do tempo recomendado para realização do ensaio (de 28 para 7 dias) e a possibilidade de aferição não só da resistência mas também do comportamento de aderência aço-concreto, fator importante para o bom funcionamento das estruturas de concreto armado.

Segundo Ferguson (1966) e o FIB (2000) o conhecimento do comportamento da aderência é imprescindível para a correta compreensão das regras de cálculo do comprimento de ancoragem e das emendas por transpasse das barras de armaduras, e para o cálculo dos deslocamentos, considerando o efeito de enrijecimento por tração, o controle de fissuração e a quantidade mínima de armadura [9, 10]. Mas, sob o ponto de vista da presente pesquisa, o aspecto principal de interesse é que a resistência do concreto armado é um aspecto determinante no comportamento de aderência aço-concreto. A hipótese de trabalho do projeto APULOT é que, se o ensaio for realizado em condições controladas e padronizadas, essa relação se torna ainda mais evidente e robusta, permitindo que se faça a estimativa da resistência à compressão do concreto a partir de dados de resistência máxima de aderência.

Em função dos indicativos positivos, o processo de desenvolvimento, aperfeiçoamento e validação dos testes APULOT vem avançando, pois se considera que os mesmos podem vir a se tornar uma alter nativa complementar importante aos ensaios de compressão axial tradicionalmente usados no controle tecnológico do concreto ou, até mesmo, se constituir na forma principal de controle da qualidade do concreto armado em obras. O grupo APULOT vem estudando diferentes aspectos associados ao teste, buscando identificar os fatores mais influentes na relação fc x τb (resistência à compressão axial versus tensão de aderência). Esse conhecimento é fundamental para embasar a formalização de um procedimento de ensaio padrão, que possa ser empregado em testes de campo em obras reais, fornecendo subsídios para uma eventual normalização do método.

Dentro desse escopo, a primeira parte desse artigo apresenta os resultados experimentais dos ensaios utilizando o método pull-out test (POT) tradicional, para avaliar sua capacidade de estimação da resistência à compressão de concretos de diferentes classes a partir dos resultados de testes de arrancamento, e, ao mesmo tempo, avaliar o efeito da variação do diâmetro de barra nos testes. O objetivo era confirmar a validade da hipótese fundamental de trabalho e estabelecer as bases para definição do procedimento padrão de teste APULOT, considerando aspectos concernentes à sua eventual implementação em canteiros de obras. Na segunda parte desse artigo serão apresentados e discutidos resultados de ensaios realizados com o método APULOT.

2. Considerações sobre a aderência aço-concreto

Existem diversos fatores que influenciam na aderência aço-concreto. O ACI 408R:2003 [1] enfatiza os seguintes: tipo de configuração das nervuras da barra; o diâmetro da barra; o estado em que se encontra a superfície da barra (deterioração); a disposição da barra na hora do lançamento do concreto - horizontal ou vertical, a relação água cimento (a/c), as resistências mecânicas do concreto, as adições minerais, tais como os materiais pozolânicos, as características físico-químicas dos materiais empregados no concreto, o adensamento e a idade de ruptura, dentre outros.

Para a quantificação da aderência aço-concreto existem diversos tipos de ensaios. O mais utilizado, dada a sua simplicidade e eficiência, é o chamado pull-out test (POT). Um dos parâmetros que o teste determina é a tensão máxima de aderência (τbmáx), que na verdade é um valor nominal médio obtido dividindo a força de arrancamento máxima aplicada para provocar o escorregamento da barra pela superfície lateral de ancoragem da barra de aço [8].

Embora seja simples e conveniente, a utilização do ensaio POT enfrenta restrições quando se deseja estimar com precisão o efetivo valor da resistência de aderência, para definir, por exemplo, comprimentos mínimos de ancoragem a serem usados em elementos estruturais. Esse tipo de ensaio não avalia o efeito de confinamento do concreto devido à presença de armadura e não considera que o arrancamento pode estar associado a deformações por flexão do conjunto aço-concreto, o que muda a forma de interação da barra com o concreto circundante.

A Figura 1 mostra um desenho esquemático do funcionamento ensaio POT adaptado de Leonhardt e Mönnig (1977) [13]. Como se observa na figura, o procedimento de ensaio padrão acaba gerando distorções, pois durante a realização do mesmo as placas de apoio colocam o concreto sob compressão, criando restrições às deformações transversais do corpo de prova. Na figura se indicam as trajetórias de compressão e o impedimento à deformação transversal na placa de apoio que aparecem quando se emprega essa configuração de ensaio, o que pode levar à possibilidade de que a resistência de aderência seja superestimada.


Embora o ensaio POT sofra restrições quando se deseja determinar a resistência máxima de aderência efetiva de elementos estruturais, o mesmo se mostra bastante atraente para o fim de controle tecnológico do concreto. Alguns pesquisadores afirmam que a correlação entre a resistência à compressão do concreto e a resistência da ligação aço-concreto é diretamente proporcional [18]. Lorrain e Barbosa (2008) [14] e Lorrain et. al (2011) [15] analisaram a correlação entre a resistência de compressão (fc) e a tensão máxima de aderência (τbmáx) confirmando que, se forem considerados apenas os resultados de testes onde ocorreu o deslizamento da barra, a relação se mostra robusta. A Figura 2 mostra parte dos resultados da correlação entre a tensão máxima de aderência (τbmáx) e a resistência à compressão axial do concreto, analisada por Lorrain et al. (2011). O mesmo foi elaborado somente com resultados de ensaios do tipo POT que apresentaram deslizamento da barra de aço em relação a concreto.


Com base nessas observações, os autores sugerem a utilização de ensaios de aderência aço-concreto para estimar a resistência à compressão axial, ou seja, como uma alternativa no controle de qualidade do concreto armado. Outro aspecto interessante as sociado ao eventual emprego do teste de aderência no controle tecnológico do concreto é que a força necessária para provocar o escorregamento da barra é da ordem de dez a vinte vezes menor que aquela necessária para romper um cilindro normalizado de 15x30 cm durante um ensaio de compressão axial. Isso significa que os equipamentos de ensaio de campo podem ser mais leves e simples (LORRAIN et al., 2011).

3. Materiais e métodos

Nesta seção são apresentados as características dos materiais utilizados no programa experimental e os procedimentos empregados nos ensaios de aderência efetuados com o método POT.

3.1 Características dos concretos empregados

Os materiais constituintes dos concretos empregados na pesquisa, com exceção do aditivo superplastificante, foram caracterizados no Laboratório CESP de Engenharia Civil (LCEC), em Ilha Solteira/SP.

O cimento utilizado foi o CPV-ARI (Cimento Portland de Alta Resistência Inicial), com densidade absoluta de 3,05 g/cm³, densidade aparente de 0,90 g/cm³ e superfície específica Blaine de 4768 cm2/g. O agregado miúdo foi uma areia média, com módulo de finura igual a 2,15; massa específica aparente de 2,61 g/cm3; e diâmetro máximo de 4,75 mm. O agregado graúdo foi brita de origem basáltica, com módulo de finura igual a 6,48, massa específica aparente de 2,90 g/cm3 e diâmetro máximo de 19,0 mm.

O aditivo empregado foi um superplastificante de terceira geração, à base de éter policarboxílico, que, conforme dados do fabricante, tem densidade de 1,08 g/cm³, teor de sólidos de 30% e pH de 4,42. Após a caracterização dos materiais foi realizado uma dosagem com base no método IPT/EPUSP [12], com o objetivo de obter dois traços de concreto correspondentes às classes 25 e 45 MPa. A intenção foi trabalhar com dois patamares de resistência para avaliar se seria possível estimar a resistência à compressão pela tensão de aderência numa faixa de resistência equivalente a que é atualmente empregada nas obras de concreto. Para facilitar a identificação, essas composições foram denominadas de T25 e T45. O abatimento de tronco de cone foi fixado em 10 ± 2 cm. Com o intuito de limitar a relação a/c se admitiu um teor de aditivo superplastificante de 0,26% em relação à massa de cimento, para ambos as composições. Os traços unitários resultantes da dosagem tiveram seus traços unitários (composições) fixados em 1:2,90:3,07 com a/c=0,61 (T25) e 1:1,53:1,98 com a/ c=0,37 (T45), respectivamente.

Com o objetivo de caracterizar os concretos produzidos foram realizados ensaios de resistência à compressão axial segundo a ABNT NBR 5739:2007 [5]; de resistência à tração por compressão diametral segundo a ABNT NBR 7222:2010 [4]; e de módulo estático de elasticidade, segundo a ABNT NBR 8522:2008 [3].

Para cada idade de ruptura foram moldados três corpos de prova cilíndricos, com dimensões de 10 x 20 cm, de acordo com a ABNT NBR 5738:2003 [6]. Os mesmos foram adensados com utilização de mesa vibratória, tendo sido preenchidos em 2 camadas de concreto com duração de 10s por camada. A cura foi realizada em câmara úmida a uma umidade relativa do ar superior a 95% e a uma temperatura de 23±2ºC.

Na data da ruptura os corpos de prova foram ensaiados com auxílio de uma prensa hidráulica da marca Wolpert, com capacidade de carga de 1000 kN. A Tabela 1 exibe os resultados obtidos, indicando a média e o desvio padrão da amostra composta pelos três corpos de prova, para cada idade e tipo de ensaio. Conforme se pode ver na Tabela 1, as resistências médias à compressão (fcm) atingiram valores de 27,8 MPa e 49,3 MPa, respectivamente, aos 28 dias, atendendo às especificações da classe desejada para cada traço.

3. 2 Características das barras de aço

As barras nervuradas de aço CA-50, usadas para gerar os corpos de prova dos ensaios de aderência, foram caracterizadas de acordo com a ABNT NBR 7480:2007 [2]. Essa norma especifica que a tensão de escoamento das barras de aço seja no mínimo de 500 MPa e a tensão de ruptura seja 10% maior que este valor. Para cada diâmetro ensaiado (8, 10 e 12,5 mm), foram ensaiadas três amostras com 60 cm de comprimento. Os resultados obtidos estão apresentados na Tabela 2. Na mesma pode-se observar que as barras atendem as especificações das normas brasileiras. Com o intuito de melhorar a análise das características geométricas das barras de aço que afetam a aderência se decidiu empregar um novo método de análise, com ampla utilização na área de design de materiais, mas inovador no campo da engenharia civil. Essa técnica envolve a geração de um modelo 3D da barra através do redimensionamento a laser, em um scanner tridimensional modelo Digimill 3D. Os dados obtidos podem ser tratados e transformados de forma a que se obtenha um modelo 3D de grande precisão, manipulável em ambiente CAD.

A Figura 3(a) mostra uma imagem 3D gerada com auxílio do programa computacional Geomagic Studio. Já a Figura 3(b) mostra a área plana de projeção da nervura dessa barra. Com esse tipo de tratamento é possível estimar, de forma inovadora e com muito mais exatidão, as áreas e inclinações das nervuras.


Esse procedimento, usado de forma original e inovadora pelo Grupo de Pesquisa LEME da UFRGS para estudar os efeitos da perda de seção por corrosão no trabalho desenvolvido por Graeff (2007) [11], o qual foi adaptado para o estudo da aderência de barras deterioradas por Caetano (2008) [7]. Desde então vem sendo usado pelo grupo APULOT para caracterizar em detalhes as nervuras de barras de aço [16, 17, 19]. O Grupo APULOT acredita que a disseminação dessa forma de análise irá propiciar grandes avanços no estudo da aderência aço-concreto, pois permite uma caracterização geométrica com extrema precisão, diferenciando as barras quanto ao efeito da aderência mecânica provocada pelas nervuras.

A Tabela 3 mostra um resumo das características geométricas obtidas através da análise dos modelos 3D das barras.

3.3 Ensaios de aderência aço-concreto

Para estudar a aderência aço-concreto foram ensaiados duas composições de concreto de resistências distintas (T25 e T45), três idades de ruptura (3 dias, 7 dias e 28 dias) e três diâmetros de barras de aço CA-50, a saber: 8 mm e 10 mm e 12,5 mm. Para cada combinação descrita acima, foram ensaiados seis corpos de prova, totalizando 108 ensaios. Vale salientar que em todas concretagens dos ensaios de aderência avaliou-se a resistência à compressão axial do concreto conforme a caracterização descrita no item 3.1, obtendo resistências à compressão médias não exatamente iguais a dos testes preliminares mostradas na Tabela 1, contudo com diferenças não significativas. O método de ensaio pull-out test foi realizado seguindo às recomendações da norma CEB/FIP RC6:1983 [8], que estipula que as dimensões do cubo de concreto são iguais a dez vezes o diâmetro da barra (10Ø), sendo que a dimensão mínima é de 20 cm e o comprimento de ancoragem é fixado em cinco vezes o diâmetro da barra (5Ø). A Figura 4 ilustra as dimensões do ensaio pelo método POT.


Com a realização do ensaio pelo método POT obtém-se as intensidades das forças em kN (quilonewtons) em função do deslizamento da barra de aço. E de acordo com as recomendações da CEB/FIP RC6:1983 [8], com este valor de força dividido pela área de ancoragem da barra, calculou-se a tensão de aderência (τb), como mostra a Equação 1.

Onde F é a força de arrancamento, Ø é o diâmetro da barra de aço e lexp é o comprimento de ancoragem do ensaio. Vale ressaltar que a tensão máxima de aderência (τbmáx) foi calculada com base na força máxima de arrancamento. A Figura 5 mostra o molde metálico sobre a mesa vibratória e os corpos de prova para os ensaios do método POT. O sistema de arrancamento para o método POT foi montado sobre um suporte móvel, devidamente nivelado. Para aplicação da força foi utilizado um macaco hidráulico de pistão vazado com capacidade de seiscentos quilonewtons (600 kN), conectado a uma bomba manual de pressão onde foi aplicada uma força de tração em um dos extremos da barra, que reagiu contra o corpo de prova. A Figura 6 mostra a visão geral do sistema de arrancamento e de medição posicionados sobre uma mesa. A Figura 7 ilustra um esquema do método de ensaio de arrancamento POT.




A força de arrancamento foi medida por meio da célula de carga e o deslocamento linear pelo LVDT (Linear Variable Differential Transformer) como ilustra a Figura 7. Estes dados foram coletados através do sistema de aquisição de dados (QuantumX) e visualizados através do programa computacional (CatmanEasy), ambos da HBM. Com este sistema foi possível à obtenção de curvas de força versus deslocamento.

4. Resultados dos ensaios de aderência aço-concreto

Nesta seção estão apresentados os resultados obtidos nos ensaios POT, onde é analisado o comportamento mecânico das barras de aço arrancadas do concreto através de curvas de deslizamento em função da tensão de aderência e avalia-se a correlação entre a tensão máxima de aderência com a resistência à compressão axial do concreto mediante a metodologia análise de variância (ANOVA) em que são analisados estatisticamente os resultados obtidos nos ensaios POT, a fim de verificar a influência das variáveis envolvidas nos ensaios de aderência.

4.1 Curvas de tensão de aderência versus o deslizamento da barra de aço

Avaliou-se o comportamento mecânico dos corpos de prova através das curvas de deslizamento versus tensão de aderência e de verificações visuais. Deste modo constatou-se em quais corpos de prova ocorreu o deslizamento da barra de aço em relação ao concreto, o fendilhamento do concreto ou a ruptura da barra de aço. Os resultados obtidos mostraram que o comportamento predomi nante foi o deslizamento da barra de aço em relação ao concreto. A explicação deste fato é que os corpos de prova apresentam cobrimento de concreto (c) ao redor da barra de aço adequado para suportarem as tensões geradas no ensaio de aderência POT. A Figura 8 mostra o deslizamento da barra de aço em relação ao concreto após o ensaio POT.


As Figuras 9, 10 e 11 mostram as diferenças das curvas de tensão de aderência versus deslizamento em função da composição e idade do concreto para o ensaio POT com 8 mm, 10 mm e 12,5 mm respectivamente.

Com o comportamento mecânico dos corpos de prova analisados por meio das curvas de deslizamento em função da tensão de aderência, foi realizada uma análise da correlação entre a tensão máxima de aderência e a resistência à compressão axial do concreto.




4. 2 Análise da correlação entre a tensão máxima de aderênciabmáx) e a resistência àcompressão (fc)

A Tabela 4 exibe os resultados obtidos nos ensaios de aderência POT, assim como a composição e idade do concreto, os resultados de compressão axial e o diâmetro da barra de aço. Vale salientar que a análise de correlação entre as variáveis fc e τbmáx é valida somente para os resultados onde observa-se o deslizamen to da barra de aço em relação ao concreto, deste modo exclui-se os resultados onde observou-se o fendilhamento e a ruptura da barra de aço [15].

Inicialmente realizou-se uma análise estatística, através da metodologia análise de variância (ANOVA) nos resultados apresentados na Tabela 4, com intuito de verificar se os fatores: (1) diâmetro da barra de aço, (2) composição do concreto e (3) idade do ensaio, influenciam significativamente na tensão máxima de aderência. A Tabela 5 mostra os resultados da análise de variância realizada com o auxílio do programa computacional Statistica 7.0. Pode-se designar um fator como significativo se o valor de "Pc>Fc" for menor que 0,05, o que significa dizer que existe 5% de chance de não ser significativo, ou seja, 95% de chance de ser significativo o fator isolado ou a interação entre os fatores.

Nota-se na Tabela 5 que a variação do diâmetro, composição do concreto e a idade de ruptura apresentaram influência significativa de primeira ordem na tensão máxima de aderência. A Figura 12 ilustra os resultados obtidos na análise de variância (ANOVA).


Com a finalidade de correlacionar a resistência à compressão axial do concreto com a tensão máxima de aderência aço-concreto, foram realizadas regressões lineares entre os valores de resistência e de aderência. A Figura 13 mostra as correlações lineares obtidas. Cabe destacar que foi efetuada uma regressão linear específica para cada diâmetro de barra utilizado, visto que cada barra tem uma capacidade de ancoragem diferente, em função das características peculiares de cada nervura e da relação volume-superfície distinta. A Tabela 6 mostra as regressões e os valores dos coeficientes de correlação obtidos. Nota-se que os coeficientes de correlação (R2) obtiveram valores satisfatórios, ou seja, valores próximos do valor 1. Verifica-se que, como esperado, as regressões são quase paralelas entre si e produzem famílias de curvas que dependem do diâmetro da barra.


Observando-se graficamente as regressões na Figura 13, nota-se que todos os coeficientes angulares obtidos são sempre positivos, ou seja, para todos os diâmetros de barra, se observa que existe uma tendência de comportamento marcante, caracterizada por um aumento da tensão máxima de aderência proporcional ao acréscimo da resistência à compressão axial do concreto, na faixa de resistência testada.

5. Conclusões

A análise da correlação entre a tensão máxima de aderência e a resistência à compressão para os ensaios POT ora realizados, permitem concluir que os ensaios de aderência POT são adequados para estimar a resistência à compressão axial do concreto, em todas as idades testadas. A análise estatística mostrou que a tensão máxima de aderência é influenciada pela variação do diâmetro da barra, composição e idade do concreto. Com a análise das correlações é possível concluir que o crescimento da tensão máxima de aderência é proporcional ao crescimento da resistência à compressão do concreto, porém observando as peculiaridades dos ensaios, conforme foi elucidado no início deste trabalho. As curvas de correlação obtidas nesta pesquisa fortalecem a proposta do método de Lorrain et al. (2011) [15] de tornar os ensaios de aderência em ensaios de qualificação do concreto armado em razão da boa proporcionalidade da resistência a compressão axial e a tensão máxima de aderência.

Acredita-se que a implementação desse tipo de ensaio expedito de aderência, de forma complementar ou até mesmo alternativa aos ensaios de compressão tradicionalmente usados na construção civil, podem melhorar significativamente o controle de qualidade das obras, permitindo que o controle de qualidade do concreto possa ser realizado em idades mais curtas, de forma rápida e segura, "in loco".

6. Atividades futuras

Na primeira parte do estudo, aqui apresentado, foram analisados os resultados de tensão máxima de aderência obtidos nos ensaios de aderência aço-concreto POT, correlacionando os ensaios à determinação da resistência a compressão axial do concreto. Com base nos dados obtidos na primeira parte deste estudo se confirma que a proposta de Lorrain et al. (2011) [15], de implementar uma alternativa de controle de qualidade do concreto armado baseada em ensaios de aderência, é viável de ser implementada. Existe uma forte e clara relação entre essas variáveis, se outras fatores, como o diâmetro das barras, for mantido constante. Com base nessas constatações, o grupo de pesquisa APULOT vem agora tentando determinar a influência de diversas variáveis na resposta do ensaio de aderência, visando consolidar um método de ensaio. Os estudos envolvem não somente atividades experimentais mas também simulações numéricas, efetuadas buscando identificar maneiras simplificadas e robustas de implementar o ensaio em canteiros de obras. Dentre os aspectos estudados se incluem o formato e a preparação do molde de ensaio, assim como o procedimento de arrancamento da barra (pull-out ou push-out).

Na segunda parte desse artigo serão discutidos os resultados de outra série de ensaios realizada pelos autores, no qual se utilizou o conceito APULOT com corpos de prova moldados usando como molde garrafas PET, uma forma de demonstrar que os ensaios podem ser realizados com baixo conteúdo tecnológico e numa terceira etapa, serão analisadas as melhores metodologias de implementação do método em canteiros de obras, a qual possa proporcionar boa reprodutibilidade e confiabilidade.

7. Agradecimentos

À FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo); Ao CNPQ (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico); Ao LCEC (Laboratório CESP de Engenharia Civil - Ilha Solteira/SP); Ao Laboratório Central de Engenharia Civil da UNESP -Ilha Solteira/SP; À empresa ArcelorMittal que forneceu as barras de aço; À empresa Holcim do Brasil pelo fornecimento do cimento; À empresa Grace Concrete Products pelo fornecimento do superplastificante.

8. Referências bibliográficas

9. Nomenclatura

A - Altura máxima da nervura (mm);

Agt - Alongamento total na força máxima (%)

β - Ângulo de inclinaçãoda nervura (º);

APULOT - AppropriatePULL-Out Test;

F - Força aplicada no arrancamento (kN);

lexp- Comprimento de ancoragem experimental (mm);

e - Espaçamento entre alturas máximas de nervuras (mm);

Ø- Diâmetro da barra de aço (mm);

Ec - Módulo estático de elasticidade à compressão (GPa);

POT - Pull-Out Test (RILEM/CEB/FIP RC6: 1983);

fc - Resistência à compressão axial (MPa);

fcm - Resistência à compressão axial média (MPa);

fctm - Resistência à tração por compressão diametral média (MPa);

fsy - Resistência ao escoamento do aço (MPa);

fst - Resistência à tração do aço (MPa);

τb- Tensão de aderência entre o aço e o concreto (MPa);

τbmáx-Tensão máxima de aderência entre o aço e o concreto (MPa).

Received: 10 Sep 2012

Accepted: 23 Jul 2013

Available Online: 11 Oct 2013

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Out 2013
  • Data do Fascículo
    Out 2013

Histórico

  • Recebido
    10 Set 2012
  • Aceito
    23 Jul 2013
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