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Caracterização de corpos de prova de tamanho reduzido desenvolvidos para ensaios de microtomografia de raios X (µ-CT)

Resumo

A necessidade de se utilizar amostras de tamanho reduzido, para a obtenção de uma melhor resolução espacial nos ensaios de µ-CT em compósitos de cimento Portland, leva os pesquisadores a realizar o fracionamento do material para a obtenção de amostras com dimensões compatíveis com a capacidade de leitura do equipamento, o que pode ocasionar alterações da microestrutura em análise. Assim, foi proposto um corpo de prova (CP) com dimensões compatíveis com a capacidade de leitura de um microtomógrafo com tubo de raios X que opera dentro de um intervalo de tensão de 20 a 100 kV.Foram realizados testes de resistência à compressão axial e avaliação da sua porosidade total por meio da relação entre a densidade aparente e a densidade da fração sólida, obtidas respectivamente pelas técnicas de picnometria (de mercúrio e hélio) e pela técnica de µ-CT. A adoção deste CP se mostrou viável por proprocionar uma amostragem com maior nível de representatividade.

Palavras-chave:
microtomografia de raios X[/kwd]; [kwd]fracionamento de amostras, corpo de prova, picnometria, estrutura de poros

Abstract

The need to use reduced sample sizes, in order to attain improved spatial resolution in (µ-CT) tests applied in Portland cement composites, makes researchers perform the fractionation of materials to obtain samples with dimensions compatible with the capacity of the scanning equipment, which might cause alterations in the microstructure under analysis. Therefore, a test specimen (TS) with dimensions compatible with the scanning capacity of a microtomography system that operates with an X-ray tube and voltage ranging from 20 to 100 kV was proposed. Axial compression strength tests were made and their total porosity was assessed by an apparent density and solid fraction density ratio, which were obtained by means of mercury and helium pycnometry and µ-CT technique, respectively. The adoption of that TS has shown to be viable for providing a sample with a higher level of representation.

Keywords:
X-ray microtomography[/kwd], [kwd]fractionation of samples[/kwd], [kwd]test specimen[/kwd], [kwd]pycnometry[/kwd], [kwd]pore structure

1. Introdução

O uso da microtomografia computadorizada de raios X (µ-CT) tem contribuído para uma melhor análise da estrutura de poros dos materiais. De acordo com Cnudde et al. [1[1] V. Cnudde, M. Boone, J. Dewanckele, M. Dierick, L. Van Hoorebeke, P. Jacobs, 3D Characterization of sandstone by means of X-ray computed tomography. Geosphere, v.7, n.1, p. 54-61, February 2011.], um ponto crítico ao se trabalhar com a microtomografia de raios X é a relação entre o tamanho da amostra e a resolução espacial obtida. Um tamanho de amostra reduzido é necessário para se conseguir uma alta resolução espacial. No entanto, trabalhar com amostras pequenas conflita com a questão da representatividade, uma vez que o volume da amostra deve conter as propriedades de todo o conjunto, a fim de se obter uma estimativa aceitável das propriedades gerais do material. No caso dos compósitos de matriz cimentícia, a sua heterogeneidade e complexa estrutura de vazios elevam o grau de dificuldade em se determinar um plano de amostragem adequado.

Os estudos, envolvendo a análise da estrutura de poros de compósitos de matriz cimentícia pelo uso da microtomografia de raios X, baseiam-se nas mais diversas técnicas de amostragem. Normalmente, as metodologias adotadas nesses estudos envolvem a moldagem de corpos de prova de onde são extraídas as amostras. Para a realização desta extração, são usados, principalmente, os processos de fragmentação ou extração de testemunho [2-4]. Contudo, esses processos podem induzir o aparecimento de microfissuras, causando alterações na microestrutura dos materiais. Além disto, uma amostragem a partir de uma região específica do corpo de prova (CP) como, por exemplo, da região central [5[5] E. Gallucci, K. Scrivener, A. Groso, M. Stampanoni, G. Margaritondo, 3D experimental investigation of the microstructure of cement pastes using synchroton X-ray microtomography (µCT), Cement and Concrete Research 37 (3) (2007), 360-368. ], pode gerar resultados que não condizem com a realidade do sistema.

Uma alternativa à extração de amostras seria a moldagem de corpos de prova com dimensões reduzidas, compatíveis com a capacidade de leitura do equipamento a ser utilizado [5-7], o que proporcionaria o aumento da relação amostra/CP, ou até mesmo uma amostragem total.

Contudo, vale ressaltar que esta redução de dimensões aumenta o grau de dificuldade em se realizar o estudo com concretos, uma vez que a presença de agregados graúdos dificulta a moldagem de corpos de prova muito pequenos. Desta forma, é comum que estudos deste gênero utilizem materiais de base cimentícia como, por exemplo, pastas de cimento, argamassa e microconcretos.

O objetivo deste estudo foi produzir corpos de prova de argamassa com tamanho reduzido, passíveis de serem utilizados em estudos de µ-CT com estruturas inteiras e intactas. Além disto, buscou-se avaliar se a estrutura interna destes CPs poderia ser considerada representativa, quando comparada a corpos de prova com dimensões de (5x10) cm, produzidos a partir do procedimento especificado pela NBR 7215 [8[8] ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 7215 (Incorpora a Errata nº 1 de 1997): Cimento Portland - Determinação da resistência à compressão. Rio de Janeiro, 1996. ]. A adoção de um procedimento normalizado tem o intuito de diminuir o grau de variabilidade do estudo, facilitando a comparação de resultados para futuras pesquisas.

As dimensões dos CPs de tamanho reduzido foram determinadas por meio de testes preliminares realizados no próprio equipamento de µ-CT utilizado nos ensaios subsequentes. Buscou-se o maior diâmetro que, de acordo com a potência do equipamento, permitisse superar o grau de opacidade do material aos raios X. Para a definição da altura, respeitou-se a condição definida na NBR 5738 [9[9] ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 5738: Concreto - Procedimento para moldagem e cura de corpos de prova. Rio de Janeiro, 2003] em que a relação entre altura/diâmetro do corpo de prova deve ser igual a 2. Deste modo, observou-se a viabilidade de testar CPs cilíndricos de (2x4) cm.

Para os dois tipos de CPs adotados, foram realizados testes de resistência à compressão axial, além de se avaliar sua porosidade total por meio da relação entre a densidade volumétrica (aparente) e a densidade da fração sólida, obtidas, respectivamente, pelas técnicas de picnometria de mercúrio e de hélio e pela técnica de µ-CT. A avaliação da porosidade por meio da técnica de µ-CT foi realizada apenas no CP de tamanho reduzido, uma vez que o equipamento não possui potência suficiente para leitura no CP de (5x10) cm.

Com o intuito de se comparar os resultados obtidos dos ensaios de resistência à compressão axial, realizados nos dois grupos de CP estudados, de modo a se avaliar o efeito provocado pela redução do tamanho, utilizou-se o teste de hipótese baseado na distribuição de probabilidade T de Student (ou teste estatístico T) para amostras independentes. Para efeito de verificação, foi realizado um novo teste de hipótese utilizando-se o teste de distribuição de probabilidade de Fisher-Snedecor (teste F).

2. Materiais e programa experimental

2.1 Argamassa

Utilizou-se o cimento Portland de alta resistência inicial (CP V - ARI), cujas análises químicas e físicas são apresentadas nas Tabelas 1 e 2, respectivamente, de acordo com a NBR 5733 [10[10] ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 5733 /EB-2: Cimento Portland de alta resistência inicial. Rio de Janeiro, 1991. ]. Sua adoção se deve por este ser o cimento com menor teor de adições disponível no mercado brasileiro.

Tabela 1
Análise química CP V - ARI de acordo com norma NBR 5733

Tabela 2
Análise mecânica CP V - ARI de acordo com norma NBR 5733

A argamassa foi produzida na proporção 1:3 (cimento/areia) com uma relação água/cimento (a/c) de 0,48. A areia utilizada foi preparada a partir de uma mistura homogeneizada das quatro frações individuais de areia normal em proporções iguais, em massa, conforme especificado na NBR 7215 [8[8] ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 7215 (Incorpora a Errata nº 1 de 1997): Cimento Portland - Determinação da resistência à compressão. Rio de Janeiro, 1996. ]. A Tabela 3 apresenta as frações granulométricas da areia normal, segundo a NBR 7214 [11[11] ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 7214: Areia Normal para ensaio de cimento - Especificação. Rio de Janeiro, 2012. ].

Tabela 3
Frações granulométricas da areia normal

2.2 Moldagem e cura

Na preparação dos corpos de prova (CPs) foram utilizados moldes normalizados de (5x10) cm e moldes especiais de (2x4) cm, cujas imagens são mostradas na Figura 1. O diâmetro de 2 cm do corpo de prova foi previamente definido com base no grau de opacidade do material estudado em relação à capacidade de leitura do equipamento de µ-CT a ser utilizado [6[6] N.N. Naik, K.E. Kurtis, A.P. Wilkinson, A.C. Jupe, S.R. Stok, Sulfate deterioration of cement-based materials examined by x-ray microtomography. Proc. SPIE 49th Annual Meeting, Optical Science and Technology: Developments in X-ray Tomography: IV. Denver, August 2- 6, 2004. ].

Figura 1
Moldes para corpos de prova de (2x4) cm e (5x10) cm

Para o ensaio de resistência à compressão, foram moldados 55 CPs cilíndricos com dimensões de (2x4) cm e 56 CPs com dimensões de (5x10) cm, rompidos aos 7 dias de idade. Os ensaios de compressão nos CPs normalizados com dimensões de (5x10) cm têm o intuito de validar o material, o procedimento de dosagem e preparação das amostras, adotados neste estudo, uma vez que os seus resultados são respaldados por norma [10[10] ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 5733 /EB-2: Cimento Portland de alta resistência inicial. Rio de Janeiro, 1991. ] e literatura. Assim, ao se aplicar os mesmos procedimentos para o CP com dimensões de (2x4) cm, é possível realizar uma comparação de resultados, uma vez que não há norma ou dados na literatura específicos para corpos de prova com estas dimensões.

As amostras para os ensaios de picnometria de gás hélio (He) e picnometria de mercúrio (Hg) foram obtidas a partir de um mesmo corpo de prova. Desta forma, para cada idade analisada (7 e 28 dias), foi moldado um único corpo de prova de (2x4) cm e outro de (5x10) cm.

Para a leitura com o microtomógrafo de raios X, foi moldado 1 corpo de prova com dimensões de (2x4) cm, sendo este utilizado nas duas idades de ensaio (7 e 28 dias). Por se tratar de uma técnica não destrutiva, a realização de leituras em diferentes idades, utilizando o mesmo corpo de prova, além de viável é conveniente, pois permite acompanhar as reais alterações na porosidade do material em decorrência do processo de hidratação das partículas de cimento, sem que haja variabilidades provenientes do processo de moldagem.

Na moldagem dos corpos de prova, foi utilizado o adensamento mecânico, por meio de mesa vibratória, com o objetivo de reduzir a variabilidade no processo.

Após a etapa de moldagem, os corpos de prova foram mantidos em câmara úmida por um período de 24 horas, sendo então desmoldados e mantidos submersos em tanque contendo água potável até o momento de serem preparados para os ensaios.

2.3 Preparação dos corpos de prova

Para o ensaio de resistência à compressão, todos os CP’s tiveram suas extremidades capeadas com enxofre, de modo a garantir o paralelismo entre as mesmas. Já para os ensaios de picnometria, foi necessário estabelecer um procedimento de preparação específico para cada tamanho de CP.

Os corpos de prova de (2x4) cm foram divididos em duas metades, por um corte longitudinal. Uma das metades foi destinada ao ensaio de picnometria de hélio e a outra à picnometria de mercúrio.

Nos CPs com dimensões de (5x10) cm, foram realizados dois cortes ortogonais entre si, na direção longitudinal, e um corte transversal, resultando em uma divisão de 8 partes com dimensões similares. A Figura 2 traz o modelo esquemático de corte dos CPs e a indicação das partes selecionadas para os ensaios. Pela divisão longitudinal, ¼ do corpo de prova foi selecionado para o ensaio de picnometria de He (partes 1 e 2) e o outro ¼, oposto ao vértice da primeira amostra, foi reservado para o ensaio de picnometria de Hg (partes 1A e 2A), sendo as demais partes descartadas.

Figura 2
Esquema de corte do CP (5x10) cm

As amostras destinadas aos ensaios de picnometria foram secas em estufa, a uma temperatura de (105±5) ºC, por um período de aproximadamente 6 horas. Este tempo de secagem foi suficiente para que duas pesagens sucessivas, intervaladas em 1 hora, não diferissem em mais de 0,5% da menor massa.

As partes destinadas ao ensaio de picnometria de hélio foram, então, pulverizadas em moinho almofariz de ágata até a obtenção de uma granulometria inferior a 75 mm, controlada por peneiramento (100% do material passante na peneira # 200). Finalizada a etapa de moagem, o material foi quarteado de modo a se obter uma fração de aproximadamente 3,6 gramas.

O corpo de prova destinado ao ensaio de µ-CT não passou por qualquer preparação especial.

2.4 Ensaio de resistência à compressão

Para o ensaio à compressão axial dos CPs (2x4) cm, foi utilizada uma máquina Universal servo-elétrica com capacidade de 30 kN, com uma junta universal especial adequada ao CP e uma célula de carga com fundo de escala de 10 kN.

Para os CPs de (5 x 10) cm, utilizou-se a máquina Universal servo-elétrica com capacidade de 300 kN, com uma junta universal especial adequada ao CP e uma célula de carga com fundo de escala de 300 kN.

Em ambos os casos, utilizou-se uma velocidade de carregamento de (0,25 ± 0,05) MPa/s, conforme especificação da NBR 7215 [8[8] ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 7215 (Incorpora a Errata nº 1 de 1997): Cimento Portland - Determinação da resistência à compressão. Rio de Janeiro, 1996. ], sendo todos os corpos de prova ensaiados aos 7 dias, uma vez que os maiores ganhos de resistência à compressão do CP V ocorrem até esta idade [10[10] ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 5733 /EB-2: Cimento Portland de alta resistência inicial. Rio de Janeiro, 1991. ].

2.5 Ensaios de picnometria de hélio e mercúrio

Os ensaios de picnometria de hélio foram realizados com o aparelho QUANTACROME STEREOPYCNOMETER - Modelo SPY-3, utilizando-se o porta-amostra de menor volume.

A picnometria de mercúrio foi realizada em um frasco volumétrico com capacidade para 100 mL. Para o CP com dimensões de (5x10) cm, o ensaio foi realizado em duas etapas, sendo na primeira utilizados os fragmentos provenientes da parte superior do CP (parte 1A) e na segunda, os fragmentos provenientes da parte inferior (parte 2A).

A partir dos valores de densidade real e densidade volumétrica, obtidos pelos ensaios de picnometria de hélio e mercúrio, respectivamente, foi calculada a porosidade do material nas idades de 7 e 28 dias.

2.6 Obtenção de imagens por µ-CT

Para a realização da microtomografia computadorizada de raiox X, utilizou-se um microtomógrafo de alta resolução, modelo SkyScan 1172. Este equipamento possui câmera CCD com resolução de 10 Mp (megapixel), tubo de raios X que opera dentro de um intervalo de tensão de 20 a 100 kV e potência de até 10 W. Para o escaneamento das imagens, foi utilizada uma resolução de (2000 x 1048) pixels e filtro de Al+ Cu. Foi adotada uma rotação em ângulos de até 180º, a passos de 0,40º.

As leituras foram realizadas aos 7 e 28 dias. Após a primeira leitura, o corpo de prova foi embalado em filme de PVC e acondicionado em câmara úmida até os 28 dias, sendo realizada nova leitura nesta idade.

Para cada idade de leitura, foram obtidas aproximadamente 450 projeções provenientes do trecho escaneado da amostra. Para a reconstrução das imagens foi utilizado o software NRecon, sendo geradas em média 1000 seções. O software CTAn [12[12] SkyScan, Structural parameters measured by SkyScan CT-analyser software. August 1, 2009.] foi utilizado para calcular a porosidade de cada seção.

Os percentuais de porosidade apresentados representam uma média global dos valores de porosidade obtidos para as seções geradas a partir da leitura com o microtomógrafo (1042 seções para a leitura aos 7 dias e 1038 seções para leitura aos 28 dias), e o erro foi calculado a partir do desvio padrão entre as leituras das seções, dentro de um intervalo de confiança de 95%.

3. Resultados e discussões

3.1 Resistência à compressão

A Figura 3 apresenta o gráfico de dispersão para os resultados de resistência à compressão dos CPs. Observa-se que os CPs que atingiram resistências superiores a 40 MPa pertencem, na maior parte, ao grupo com dimensões de (2x4) cm. Os maiores valores individuais de resistências à compressão também pertencem a corpos de prova do referido grupo.

Figura 3
Gráfico de dispersão para resistência dos CPs aos 7 dias

A Tabela 4 apresenta os valores para referencial estatístico das resistências à compressão. Nota-se que os CPs de (2x4) cm e (5x10) cm apresentaram valores muito próximos para a resistência mais baixa, contudo o valor de resistência máxima do CP (2x4) cm foi bastante superior. Este também apresentou uma maior resistência média e um maior desvio padrão dos resultados. Para ambos os grupos de CPs, o valor da mediana apresentou-se bem próximo do valor da média, o que indica uma curva de distribuição bem próxima da distribuição Normal.

Tabela 4
Referencial estatístico da resistência à compressão dos CPs aos 7 dias

A partir dos valores de resistência média e desvio padrão, foi calculado o coeficiente de variação de Pearson (cv), sendo o maior valor apresentado pelo grupo de CPs com dimensões de (2x4) cm. O cv indica a variabilidade dos resultados (desvio padrão) em relação à média. Quanto menor for o seu valor, mais uniformes serão os dados.

Para análise dos valores de resistência média dos CPs, foi aplicado o teste de hipótese, baseado na distribuição de probabilidade T de Student (ou teste estatístico T) para amostras independentes. Este teste é utilizado para avaliar se há diferença significativa da média de uma medida entre dois grupos. A hipótese nula é de que a média seja igual nos dois grupos. A hipótese alternativa é de que a média seja diferente. Se o p-valor, probabilidade de errar ao rejeitar a hipótese nula, for menor que 5%, a hipótese nula fica rejeitada. Ou seja, assume-se que a média é diferente nos dois grupos.

No caso desse estudo, o p-valor encontrado foi de 2,7%, indicando que há uma diferença significativa entre a resistência à compressão dos dois grupos, sendo a resistência do cilindro (2x4) cm maior. Desta forma, embora os valores médios de resistência sejam muito próximos (diferença de 1,11 MPa), estatisticamente a diferença entre as resistências é bastante significativa.

Para efeito comparativo, foi realizado um novo teste de hipótese utilizando-se o teste de distribuição de probabilidade de Fisher-Snedecor (teste F) para a comparação de variância. Obteve-se um p-valor igual a 0,024 (2,4%), indicando novamente que a variabilidade para os CPs de (2x4) cm é significativamente maior em relação ao CP de (5x10) cm.

A Figura 4 apresenta o gráfico boxplot1 1 The boxplot is formed by the first and third quartiles and by the median. The lower and upper stems extend respectively from the lower quartile to the smallest value not lower than the lower limit and the upper quartile to the largest value not exceeding the upper limit. (gráfico de caixa) de distribuição da resistência para os dois gurpos de corpos de prova. É possível observar que a variabilidade da resistência utilizando o cilindro (2x4) cm é maior, em relação ao cilindro (5x10) cm.

Figura 4
Boxplot para distribuição de resistência à compressão dos cilindros

A Figura 5 apresenta a distribuição de frequência do percentual de CPs por classe de resistência à compressão. Nota-se que o maior percentual assumido pelos CPs de (5x10) cm foi a classe de 39 MPa. Já para os CPs de (2x4) cm foi a classe de 41 MPa.

Figura 5
Distribuição de frequência do percentual de CPs por classe de resistência à compressão

A maior resistência média à compressão e maior dispersão nos resultados apresentados pelo CP com dimensões de (2x4) cm são justificadas pelo efeito escala, ou seja, há um decréscimo da resistência à compressão axial com o incremento da dimensão do corpo-de-prova. Este efeito é insignificante em grandes estruturas, mas com grande influência nas pequenas, como é o caso dos corpos de prova [13[13] C.V.G, Coura; M.T.G, Barbosa; F.A.I, Darwish, Análise da lei de Bažant e de Carpinteri na resistência à compressão do concreto. Revista Internacional de Desastres Naturales, Accidentes e Infraestructura Civil, v.8, n.1, mayo, 2008.].

3.2 Porosidade por picnometria de He e Hg e µ-CT

A Tabela 5 apresenta os percentuais de porosidade, calculados a partir das técnicas de picnometria e pelas leituras com o microtomógrafo de raios X.

Tabela 5
Percentual de porosidade

A porosidade das amostras, pelo método de picnometria, foi calculada a partir dos valores de densidade real e densidade volumétrica, obtidos pelos ensaios de picnometria de hélio e mercúrio, respectivamente.

Os resultados de porosidade, obtidos pela técnica de µ-CT, foram calculados a partir da média global dos valores de porosidade obtidos para cada seção gerada pela leitura com o microtomógrafo, sendo 1042 seções para a leitura aos 7 dias e 1038 seções para leitura aos 28 dias.

Pela técnica de picnometria, nota-se que os percentuais de porosidade obtidos para os corpos de prova com dimensão de (2x4) cm foram menores que os apresentados pelos CPs com dimensão de (5x10) cm.

Embora, normalmente, sejam esperadas alterações na porosidade dos materiais cimentícios com o avanço das idades, ocasionadas por mudanças em sua microestrutura devido ao processo de hidratação do cimento, a variação dos resultados, pela técnica de picnometria, não foi significativa. Este resultado pode ser consequência de uma aceleração deste processo de hidratação, ocasionada pela secagem das amostras em estufa, a uma temperatura de (105±5) ºC. [14, 15]

Todavia, a µ-CT, cujo CP analisado não passou por processo de secagem, não apenas indicou uma grande redução na porosidade do material aos 28 dias, mas também um percentual de porosidade mais elevado na idade de 7 dias, comparado ao resultado obtido pela técnica de picnometria para o CP de (2x4) cm. Já na idade de 28 dias, os valores de porosidade entre as técnicas se apresentaram muito próximos.

De acordo com Cervera et al. [16[16] M. Cervera; R. Faria, J. Oliver; T. Prato, Numerical modelling of concrete curing, regarding hydration and temperature phenomena. Computers and Structures 80 (2002), 1511-1521.], para levar em consideração a influência da temperatura, muitos modelos de envelhecimento têm se baseado nos conceitos de “maturidade” ou “idade equivalente”, por meio da definição de uma idade artificial para o material cimentício. Esta idade artificial pode ser superior ou inferior à idade real, dependendo se o histórico de temperatura tenha acelerado ou retardado o processo de maturação.

3.3 Avaliação dos resultados

A maior variabilidade nos resultados e maior resistência média à compressão, apresentadas pelos corpos de prova de menores dimensões, estão em consonância com os comportamentos relatados em estudos sobre o assunto [7, 17-21], e pode ser explicado, especialmente, pela teoria do Efeito Tamanho [19, 20].

Além disto, deve-se levar em consideração o fato de que a resistência mecânica de um compósito de matriz cimentícia é significativamente afetada pela porosidade de sua estrutura interna [21[21] C.A. Gutschow, A avaliação da resistência do concreto em estruturas acabadas através da extração e ensaio de testemunhos de pequenos diâmetros. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1995. 146 p.]. Desta forma, a menor porosidade dos CPs de (2x4) cm condiz com uma maior média de resistência à compressão, em relação aos CPs de (5x10) cm.

A comparação dos resultados de porosidade, obtidos a partir das técnicas de µ-CT e picnometria, é apresentada na Figura 6. Embora os resultados de porosidade, apresentados pelas duas técnicas, tenham sido bem diferentes na idade de 7 dias, aos 28 dias estes foram próximos. Este comportamento ressalta a hipótese de que a utilização da temperatura para secagem das amostras, destinadas ao ensaio de picnometria, pode ter afetado a estrutura de poros do material, especialmente na idade de 7 dias, levando este a assumir uma estrutura de poros característica de idades mais avançadas [15, 16].

Figura 6
Valores de porosidade obtidos por μ-CT e picnometrias de hélio e mercúrio

3.4 Imagens microtomográficas

A Figura 7 apresenta imagens geradas a partir das leituras com o microtomógrafo de raios X nas idades de 7 e 28 dias, selecionadas aleatoriamente. Nota-se que a geometria proposta para o corpo de prova permitiu a obtenção de uma resolução satisfatória, sendo, inclusive, possível visualizar a redução na porosidade das seções aos 28 dias.

Figura 7
Seleção de seções tomográficas do CP

4. Conclusões

Para o equipamento de µ-CT utilizado neste estudo, a adoção de corpos de prova com dimensões de (2x4) cm mostrou-se viável, indicando que estudos sobre a estrutura de poros do compósito cimentício podem ser realizados em uma estrutura inteira e intacta. Ressalta-se que equipamentos com resolução e potência inferiores ao utilizado neste estudo podem não apresentar resultados tão satisfatórios para as dimensões de CP consideradas.

De acordo com os testes estatísticos, verificou-se que, no ensaio de resistência à compressão, os corpos de prova de (2x4) cm apresentaram maior variação de resultados e uma resistência média mais elevada, comparado aos corpos de prova de (5x10) cm, embora suas resistências médias sejam bem próximas. Tal comportamento está compatível com os resultados obtidos por diversos estudos sobre a influência da variação dimensional em corpos de prova.

O percentual de porosidade, calculado a partir dos valores de densidade obtidos pelos ensaios de picnometria de hélio e mercúrio, apresentou-se um pouco menor para o corpo de prova de (2x4) cm. Uma vez que a resistência à compressão é afetada pela porosidade do material, em uma relação inversamente proporcional, a maior resistência média a compressão apresentada por este corpo de prova é condizente.

O estudo mostrou que a comparação de resultados de porosidade obtidos a partir das técnicas de picnometria e microtomografia pode ser viável [2, 23], contudo, o processo de preparação da amostra deve ser reavaliado, especialmente no que concerne à utilização de temperatura para secagem do material em idades mais precoces, uma vez que o procedimento foi viável para a idade de 28 dias, mas influenciou os resultados aos 7 dias.

O grande número de pesquisas abordando a microestrutura de poros de materiais cimentícios, e, principalmente a utilização da µ-CT, ressalta a necessidade de elaborar um procedimento para confecção de corpos de prova com dimensões reduzidas. Embora não haja a obrigatoriedade de se seguir normas técnicas em pesquisas, e cada pesquisador tenha a liberdade de definir os procedimentos a ser seguidos, tentar criar um padrão dimensional de referência para estudos de microtomografia pode ajudar a comunidade científica a alcançar maiores avanços, uma vez que o efeito escala, preparação de amostras e técnica de amostragem têm correlação direta na resistência à compressão e na estrutura de poros do material, o que pode criar grandes dificuldades na comparação dos resultados.

5. Agradecimentos

Os autores agradecem ao CNPq e a FAPEMIG pelo apoio financeiro e a HOLCIM, pelo fornecimento do cimento utilizado nesta pesquisa.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Set 2017

Histórico

  • Recebido
    12 Jul 2015
  • Aceito
    12 Jan 2017
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