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Fatores de influência na velocidade de pulso ultrassônico no concreto

Resumo

O processo de hidratação do cimento Portland desencadeia reações de estabilização de minerais provenientes do clínquer em contato com a água, que é o Silicato de Cálcio Hidratado (C-S-H), a Etringita (3CaO.Al2O3.3CaSO4.32H2O) e a Portlandita (Ca(OH)2). Para o entendimento do efeito da evolução destes processos de hidratação, é possível aplicar o uso de ensaios não destrutivos. O objetivo do presente trabalho é avaliar a influência do tipo de cimento, da idade de cura, do formato e da umidade dos corpos de prova de concreto na velocidade de pulso ultrassônico (VPU). Para tal, foram moldados 36 corpos de prova cilíndricos (10x20 cm) e 9 cúbicos com 25 cm de arestas, com traço 1:2,7:3,2 (cimento/areia/brita), relação água/cimento de 0,58, e três tipos de cimento Portland (CP II-Z-32, CP IV-32 RS e CP V-ARI). Com os dados obtidos foi possível correlacionar o aumento da resistência do concreto ao longo do tempo (nas idades de 7, 14, 28, 70 e 91 dias) com o aumento da velocidade de pulso ultrassônico. Além disso, foi possível comprovar a influência direta da umidade do concreto e do grau de hidratação na VPU. A forma do corpo de prova, de modo geral não apresentou influência nos resultados, com exceção do caso do cimento CP V ARI.

Palavras-chave:
ensaios não-destrutivos; durabilidade; absorção de água

Abstract

The hydration process of Portland cement triggers reactions of stabilization of minerals from the contact of the clinker with water, which is the Hydrated Calcium Silicate (C-S-H), the Etringite (3CaO.Al2O3.3CaSO4.32H2O) and the Portlandite (Ca(OH)2). In order to understand the effects of the evolution of hydration in cement, it is possible to apply non-destructive tests. In this context, the objective of this work is to evaluate the influence of the type of cement, the curing age, of the format and humidity of the test specimens of concrete in the ultrasonic pulse velocity (UPV). In order to do that, 36 cylindrical test specimens (10 x 20 cm) and 9 cubic ones with 25 cm of edges, with mix proportion of 1:2,7:3,2 (cement/sand/gravel), water/cement ratio of 0.58 and three types of Portland cement (CP II-Z-32, CP IV-32 RS and CP V-ARI) were molded. With data obtained it was possible to correlate the increase of concrete strength along time (at ages of 7, 14, 28, 70 and 91 days) with the increase of the ultrasonic pulse velocity. Besides, it was possible to prove the direct influence of the concrete moisture and of the degree of hydration in the UPV. The shape of the test specimen generally had no influence on the results, except in the case of cement CP V ARI.

Keywords:
non-destructive testing; durability; water absorption

1. Introdução

Em estruturas de concreto armado, a resistência à compressão do concreto consiste em uma das propriedades mais relevantes e aplicadas para o dimensionamento dos elementos estruturais. Para a avaliação desta propriedade nas obras são moldados corpos de provas e posteriormente rompidos em determinadas idades de cura em condições controladas. Alguns autores citam que a hidratação do cimento Portland atinge aos 28 dias de cura cerca de 70-80% do grau de hidratação e praticamente se completa aos 365 dias (Mehta e Monteiro [1[1] P. K. MEHTA and P. J. M. MONTEIRO, Concreto: Microestrutura, Propriedades e Materiais, 2a edição. São Paulo, 2014.]; Taylor [2[2] H. F. W. TAYLOR, Cement chemistry, 2o. London: Thomas Telford Ltda, 1997.]) . Porém, quando o material é lançado, adensado e curado em campo, o mesmo não está nas mesmas condições expostas nos ensaios e os valores de grau de hidratação efetivos devem ser menores do que no caso das condições de cura ideal.

O processo de hidratação do cimento pode ser avaliado diretamente utilizando técnicas como microscopia, termogravimetria ou difração de raios X, ou indiretamente pela determinação do calor desenvolvido na hidratação (Naik et al. [3[3] T. R. Naik, V. M. Malhotra, and J. Popovics, “The ultrasonic pulse velocity method,” in Handbook on non-destructive testing of concrete, 2a edition., New York: CRC Press, 2004, pp. 84-97.]; Neville [4[4] A. M. NEVILLE, Propriedades do Concreto, 2a. São Paulo: Editora Pini Ltda., 2015.]). Mas em estruturas moldadas in loco são necessárias alternativas eficientes para avaliação de estruturas concluídas e em condições de operação, sem danos à funcionalidade ou à aparência (Pereira e Medeiros [5[5] E. PEREIRA and M. H. F. MEDEIROS, “Ensaio de ‘Pull Off’ para avaliar a resistência à compressão do concreto: uma alternativa aos ensaios normalizados no Brasil,” RIEM - Rev. IBRACON Estruturas e Mater., vol. 5, no. 6, pp. 757-768, 2012.]).

Diante disto, um método usual de se inspecionar e fazer diagnósticos do desempenho das estruturas é a extração do testemunho in loco e submetê-lo a ensaios de compressão axial, para determinar a resistência à compressão do concreto analisado. Contudo, em muitas situações, a geometria do elemento estrutural não viabiliza a obtenção padronizada da amostra, além de afetar a estabilidade da peça (Castro et al. [6[6] A. L. CASTRO, S. C. ANGULO, P. C. BILESKY, R. F. C. SANTOS, L. T. HAMASSAKI, and E. SILVA, “Métodos de ensaios não destrutivos para estruturas de concreto.,” Techne Rev. Tecnol. da Construção, vol. 17, pp. 56-60, 2009.]).

Para tanto, nas últimas décadas buscou-se desenvolver novas tecnologias que permitissem a isenção de danos ou que interferisse minimamente na capacidade resistente da estrutura, também conhecidos como ensaios não destrutivos. Além de permitir o monitoramento e diagnóstico de estruturas recentes ou antigas, os ensaios não destrutivos devem apresentar características econômicas e operacionais interessantes, tais como: facilidade de operação, baixo custo de operação do monitoramento, rapidez de execução e ainda manter incólume a estrutura do material analisado, conforme relatado por Grantham et al. [7[7] J. H. BUNGEY, S. G. MILLARD, and M. G. GRANTHAM, Testing of concrete in structures, 4a Edição. New York: Taylor & Francis, 2006.]. O ultrassom é um representante destes métodos não destrutivos que, de acordo com a ASTM E 114 [8[8] ASTM - AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS, “ASTM E114 - Standard Practice for Ultrasonic Pulse-Echo Straight-Beam Contact Testing,” West Conshohocken, PA, USA, 2015.], pode ser usado para a detecção de defeitos no interior do concreto, assim como a deterioração decorrente de agressividade do meio e dos ciclos de gelo-degelo.

Em termos funcionais, Ferrari e Padaratz [9[9] V. J. FERRARI and I. J. PADARATZ, “Aplicação de ondas ultra-sônicas na detecção das primeiras fissuras em vigas de concreto armado e na avaliação da resistência à compressão,” Acta Sci. Technol., vol. 25, no. 2, pp. 185-191, 2003.] explicaram que quando os impulsos mecânicos são aplicados a um sólido são produzidas três ondas, de forma que cada onda possibilita um movimento específico de partículas, sendo elas: Longitudinal (compressão), transversal (cisalhamento) e superficial. Dentre os mais variados fatores (Ex: presença de armadura, fissuras, temperatura e dimensão do agregado) existem fatores intrinsecos ao concreto que interferem nas medições do ensaio de ultrassom como o tipo de cimento, relação água/cimento, grau de hidratação, umidade e condições de cura do concreto (NBR 8802 [10[10] ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, “NBR 8802 - Concreto endurecido - Determinação da velocidade de propagação de onda,” Rio de Janeiro/RJ, 2013.]; De Belie et al. [11[11] N. De Belie, C. U. Grosse, J. Kurz, and H.-W. Reinhardt, “Ultrasound monitoring of the influence of different accelerating admixtures and cement types for shotcrete on setting and hardening behaviour,” Cem. Concr. Res., vol. 35, no. 11, pp. 2087-2094, Nov. 2005.]; Nagrockiene et al. [12[12] D. Nagrockiene, I. Pundienė, and A. Kicaite, “The effect of cement type and plasticizer addition on concrete properties,” Constr. Build. Mater., vol. 45, pp. 324-331, Aug. 2013.]; Ferrari e Padaratz [9[9] V. J. FERRARI and I. J. PADARATZ, “Aplicação de ondas ultra-sônicas na detecção das primeiras fissuras em vigas de concreto armado e na avaliação da resistência à compressão,” Acta Sci. Technol., vol. 25, no. 2, pp. 185-191, 2003.]). Sobre este tema Nagroskiene et al.[12[12] D. Nagrockiene, I. Pundienė, and A. Kicaite, “The effect of cement type and plasticizer addition on concrete properties,” Constr. Build. Mater., vol. 45, pp. 324-331, Aug. 2013.]) ressaltam que o teor de aditivo superplastificante e sua interação com o tipo de cimento também tem influência na velocidade de pulso ultrassônico. Além disso, é importante salientar que o tipo de cimento e o grau de hidratação têm maior influencia nas primeiras idades (até 24-48 horas) como mostram os resultados de Sturrup et al. [13[13] H. STURRUP, V. R.; VECCHIO, F. J.; CARATIN, “Pulse Velocity as a Mesuare of Concrete Compressive Strength,” in Nondestructive Testing of Concrete, Special Pu., Detroit: American Concrete Institute (ACI), 1984, pp. 201-228.]; Elvery e Ibrahim [14[14] R. H. Elvery and L. A. M. Ibrahim, “Ultrasonic Assessment of Concrete Strength At Early Ages.,” Mag. Concr. Res., vol. 28, no. 97, pp. 181-190, 1976.] e Evangelista [15[15] A. C. J. EVANGELISTA, “Avaliação da resistência do concreto usando diferentes ensaios não destrutivos,” 2002.].

Cosme-Lopez et al. [16[16] M. F. COSMES-LÓPEZ, F. CASTELLANOS, and P. F. de J. CANO-BARRITA, “Ultrasound frequency analysis for identification of aggregates and cement paste in concrete,” Ultrasonics, vol. 73, pp. 88-95, Jan. 2017.] verificaram em seu trabalho que devido à alta correlação encontrada no seu experimento, os ensaios com ultrassom podem até substituir os de resistência à compressão para detectar a evolução da hidratação da pasta de cimento presente no concreto. O trabalho de Pereira e Medeiros [5[5] E. PEREIRA and M. H. F. MEDEIROS, “Ensaio de ‘Pull Off’ para avaliar a resistência à compressão do concreto: uma alternativa aos ensaios normalizados no Brasil,” RIEM - Rev. IBRACON Estruturas e Mater., vol. 5, no. 6, pp. 757-768, 2012.] corrobora esta informação indicando uma correlação linear entre a resistência à compressão e a velocidade de pulso ultrassônico com R2 de 0,98. Por outro lado, o trabalho de Capraro et al. [17[17] A. P. B. Capraro, C. B. Scremim, M. H. F. Medeiros, and N. S. Polegato, “Velocidade de Propagação de Ondas de Ultrassom e Resistividade Elétrica para a Detecção do Ataque por Sulfatos de Origem Interna.,” vol. 2, no. 3, pp. 38-47, 2017.] apresentou relação linear com R2 variando entre 0,75 e 0,92, indicando que existe a possibilidade de índices de correlação menos precisos do que os que ficam acima de 0,90 já relatados. Contudo, Demirboga et al. [18[18] R. Demirboğa, İ. Türkmen, and M. B. Karakoç, “Relationship between ultrasonic velocity and compressive strength for high-volume mineral-admixtured concrete,” Cem. Concr. Res., vol. 34, no. 12, pp. 2329-2336, Dec. 2004.] e Sabbag e Uyanik [19[19] N. Sabbağ and O. Uyanık, “Prediction of reinforced concrete strength by ultrasonic velocities,” J. Appl. Geophys., vol. 141, pp. 13-23, Jun. 2017.] apresentaram relações exponenciais com R2 entre 0,90 e 0,99, e este último apresentou uma proposição de um modelo de estimativa da resistência à compressão com o uso de dados de velocidade de pulso ultrassônico.

De acordo com a ASTM 114 [8[8] ASTM - AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS, “ASTM E114 - Standard Practice for Ultrasonic Pulse-Echo Straight-Beam Contact Testing,” West Conshohocken, PA, USA, 2015.], o ensaio de velocidade de pulso ultrassônico representa uma tecnologia viável a diagnóstico de estruturas pois além de permitir caracterizar o material, serve para avaliar a sua integridade e estimar a resistência à compressão e o módulo de elasticidade do material. Além disso, Hernandez et al. [20[20] M. G. HERNÁNDEZ, M. A. G. IZQUIERDO, A. IBÁÑEZ, J. J. ANAYA, and L. G. ULLATE, “Porosity estimation of concrete by ultrasonic NDE,” Ultrasonics, vol. 38, no. 1-8, pp. 531-533, Mar. 2000.] citaram que o método de velocidade de pulso ultrassônico é utilizado amplamente para verificar a densidade e os parâmetros elásticos dos materiais cerâmicos, assim como indicam os trabalhos de Mesquita et al. [21[21] E. Mesquita, R. Martini, A. Alves, P. Antunes, and H. Varum, “Non-destructive characterization of ancient clay brick walls by indirect ultrasonic measurements,” J. Build. Eng., vol. 19, pp. 172-180, Sep. 2018.] e Mesquita et al. [22[22] E. Mesquita et al., Heterogeneity detection of Portuguese-Brazilian masonries through ultrasonic velocities measurements, vol. 8. 2018.] que fizeram aplicações da técnica para o estudo de obras históricas construídas de paredes estruturais com blocos cerâmicos.

Dentro deste contexto, este estudo tem o objetivo de avaliar a influência do tipo de cimento, da idade de cura, da forma e da umidade dos corpos de prova de concreto nas leituras de velocidade de pulso ultrassônico (VPU).

2. Materiais e métodos

Para atingir os objetivos propostos foram moldados um total de 45 corpos de prova cilíndricos (10 cm x 20 cm) e 9 corpos de prova cúbicos de arestas de 25 cm. Deste conjunto de amostras, 36 corpos de prova cilíndricos foram submetidos ao ensaio de compressão axial de acordo com a norma NBR 5739 [23[23] ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, “NBR 5739 - Ensaio de compressao em corpos-de-prova cilindricos,” Rio de Janeiro, 2007.], e nove cilindros e os nove cúbicos foram utilizados exclusivamente para as leituras de velocidade de pulso ultrassônico (VPU), conforme a NBR 8802 [10[10] ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, “NBR 8802 - Concreto endurecido - Determinação da velocidade de propagação de onda,” Rio de Janeiro/RJ, 2013.]. Os corpos de prova foram mantidos em cura por imersão, em água saturada com cal, com temperatura ambiente (20 ± 5 oC) durante todo o período de 100 dias do experimento, de acordo com a NBR 5738 [24[24] ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, “NBR 5738: Concreto - Procedimento para moldagem e cura de corpos de prova,” Rio de Janeiro/RJ, 2003.].

2.1 Materiais

Os cimentos empregados no experimento foram o CP V-ARI, CP II-Z-32 e CP IV-32 RS, cujas propriedades químicas (que foram realizadas em um espectrômetro de fluorescência de raios X (FRX) PW2424/00 - Magix Panalytical) e físicas estão informadas nas Tabela 1 e Tabela 2.

Tabela 1
Caracterização química dos cimentos CP V-ARI, CP II-Z-32 e CP IV-32 RS

Tabela 2
Caracterização física dos cimentos CP V-ARI, CP II-Z-32 e CP IV-32 RS

O agregado miúdo, oriundo da região metropolitana de Curitiba, ficou dentro dos limites inferiores e superiores da zona ótima de distribuição granulométrica (Figura 1). O agregado graúdo, também é oriundo da região metropolitana de Curitiba, de origem basáltica, e ficou dentro da zona granulométrica 9,5/25 mm. Para ambos os agregados, a caracterização foi obtida a partir do descrito pela NBR 7211 [25[25] ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, “NBR 7211 - Agregados para concreto - especificação,” Rio de Janeiro-RJ, 2009.]. A massa específica do agregado miúdo foi de 2,59 g/cm³ e do agregado graúdo foi de 2,72 g/cm³.

Figura 1
Curva granulométrica dos agregados para a produção dos corpos de prova

A proporção de mistura adotada como concreto de referência foi de 1:2,7:3,2 (cimento: areia: brita) e a relação água/cimento de 0,58, a mesma utilizada por Pereira e Medeiros [5[5] E. PEREIRA and M. H. F. MEDEIROS, “Ensaio de ‘Pull Off’ para avaliar a resistência à compressão do concreto: uma alternativa aos ensaios normalizados no Brasil,” RIEM - Rev. IBRACON Estruturas e Mater., vol. 5, no. 6, pp. 757-768, 2012.]. O abatimento do tronco de cone obtido dos três traços referentes aos três cimentos foram 160, 180 e 210, referentes ao CP V-ARI, CP II-Z-32 e CP IV-32 RS, respectivamente. A água utilizada foi água potável fornecida pela concessionária local de abastecimento (Companhia de Saneamento do Paraná - SANEPAR). O adensamento foi realizado manualmente, com haste metálica padronizada, sendo o preenchimento dos corpos de prova feito em 2 camadas de concreto, para todas as amostras, como preconizado pela NBR 5738 [24[24] ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, “NBR 5738: Concreto - Procedimento para moldagem e cura de corpos de prova,” Rio de Janeiro/RJ, 2003.].

2.2 Ensaio de Velocidade de Pulso Ultrassônico (VPU)

As leituras foram realizadas com auxílio do equipamento Ultrasonic Pulse Velocity - Pundit Lab do fabricante Proceq, constituído de dois transdutores que trabalham em conjunto na medição (um emissor e o outro receptor de ondas). O equipamento foi configurado com frequência de transmissão/recepção de 54 kHz, usando os transdutores de 50 mm de diâmetro.

Todas as leituras foram conduzidas de acordo com a NBR 8802 [10[10] ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, “NBR 8802 - Concreto endurecido - Determinação da velocidade de propagação de onda,” Rio de Janeiro/RJ, 2013.] empregando o método de transmissão direta entre os transdutores, como ilustrado na Figura 2. Antes de cada leitura, foi realizada a limpeza da superfície, retirando qualquer material que possa mascarar a penetração do feixe sônico. Em seguida, para cada leitura foi utilizado o gel de acoplamento indicado pelo fabricante para produzir o contato adequado entre os transdutores e as superfícies do concreto.

Figura 2
Esquema do posicionamento dos transdutores para emissão e recepção da onda ultrassônica nos corpos de prova cilíndricos 10 cm x 20 cm

Para garantir a centralização das leituras em cada corpo de prova cilíndrico foi utilizado um aparato metálico usado como guia de posicionamento, como ilustrado na Figura 2.

2.3 Avaliação da VPU no estado fresco

Como ilustrado na Figura 3, o ensaio foi realizado com o concreto fresco introduzido numa fôrma cilíndrica com dimensões de 10 cm x 20 cm restrita na base e no topo por duas placas de vidro com o intuito confinar o concreto.

Figura 3
Ensaio de VPU em concreto no estado fresco com formas cilíndricas 10 cm x 20 cm e placas de vidro temperado nas bases

A moldagem foi efetivada com a fôrma cilíndrica posicionada na vertical com a base apoiada na placa de vidro. Em seguida, a segunda placa de vidro foi posicionada no todo da fôrma, foi executada a fixação com os parafusos e o conjunto foi posicionado na posição horizontal, como mostra a Figura 3.

As leituras foram executadas utilizando as placas de vidro como superfície de contato dos transdutores. O gel de acoplamento foi utilizado para o contato dos transdutores de 54 kHz, assim como foi feito no caso de acoplamento direto no concreto, quando feito o ensaio em estado endurecido. FREIRE et al. [26[26] J. F. Freire, D. J. Q. ROSA, R. G. V. CARVALHO, R. J. PEDROSA, J. M. A. PINTO, and O. L. NASCIMENTO, “Estudo do comportamento da velocidade de onda ultrassônica em concreto fresco de cimento Portland,” in Anais do 58o Congresso Brasileiro de Concreto - CBC 2016, 2016, no. 1.] realizaram um procedimento de monitoramento da VPU do concreto no estado fresco com procedimento semelhante a este.

As leituras foram realizadas nos tempos de 3 h, 5 h, 7 h e 9 h contadas a partir da mistura dos materiais secos com a água. Estes momentos de leituras foram adotados para monitorar a VPU entre o início e fim de pega do cimento, gerando informações acerca do período de transição do concreto entre o estado líquido e sólido.

2.4 Avaliação da VPU no estado endurecido

Influência da umidade

A absorção de água por capilaridade no concreto endurecido foi avaliada para as idades de 28 dias, 70 dias e 91 dias de cura para os três diferentes cimentos, seguindo a NBR 9779 [27[27] ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, “NBR 9779: Argamassa e concreto endurecidos - Determinação da absorção de água por capilaridade,” Rio de Janeiro/RJ, 1995.]. Para a realização do ensaio, os corpos de prova foram submetidos saturados ao procedimento de medição da VPU. Em seguida, os corpos de prova passaram por uma secagem em estufa, a uma temperatura de 100 ºC até constância de massa, para se determinar a massa seca e a VPU na condição seca. De posse dos corpos de prova secos, os mesmos foram posicionados sobre suportes, preenchendo com água o recipiente de ensaio, de modo que o nível d’água permaneceu com 5 ± 1 mm acima de sua face inferior (Figura 4). Posteriormente, foi determinada a massa e a VPU dos corpos de prova em 3 h, 6 h, 24 h, 48 h e 72 h, para se verificar a influência da absorção d’água por capilaridade na VPU.

Figura 4
Ensaio de absorção por capilaridade dos corpos de prova (procedimento da NBR 9779 [27[27] ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, “NBR 9779: Argamassa e concreto endurecidos - Determinação da absorção de água por capilaridade,” Rio de Janeiro/RJ, 1995.])

Influência da resistência à compressão

O ensaio de resistência à compressão axial ocorreu segundo a NBR 7215 [28[28] ABNT - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, “NBR 7215: Cimento Portland - Determinação da resistência à compressão,” Rio de Janeiro/RJ, 1996.], cujos corpos de prova foram retirados da imersão e foi realizada a leitura com o aparelho de ultrassom momentos antes da ruptura, com os corpos de prova ainda saturados para as idades de 7 dias, 14 dias, 28 dias, 70 dias e 91 dias de cura submersa em água saturada com cal.

Influência da forma do corpo de prova

Foram moldados três corpos de prova cilíndricos (10 cm x 20 cm) e três cúbicos (25 cm de arestas) para cada um dos três tipos de cimentos (CP V-ARI, CP II-Z-32 e CP IV-32 RS), totalizando nove cilíndricos e nove cúbicos. As leituras da VPU, com os corpos de prova sempre saturados com superfície seca, foram realizadas nas idades de 7, 14, 28, 70 e 91 dias, utilizando transdutores de 54 kHz, acoplados nos corpos de prova com gel condutor de ultrassonografia. Para os cilíndricos foi utilizado o suporte metálico para alinhar os transdutores com o centro dos corpos de prova. Para os cúbicos, o centro dos corpos de prova foi marcado com o auxílio de um parquímetro para também facilitar o alinhamento dos transdutores (Figura 5).

Figura 5
Esquema do posicionamento dos transdutores para emissão e recepção da onda ultrassônica nos corpos de prova cúbicos de 25 cm de arestas

Análise estatística

Para corroborar os resultados e verificar a diferença e significância ou não dos dados obtidos, foi realizada a Análise de Variância (ANOVA: um critério) e o teste de Tukey a posteriori, com 95% de confiança com o auxílio do Software livre Bioestat - versão 5.3.

3. Resultados e discussões

3.1 Velocidade de pulso ultrassônico do concreto no estado fresco

Nesta fase do estudo buscou-se verificar o comportamento da velocidade de pulso ultrassônico nas primeiras horas de hidratação do concreto, ou seja, no período de transição entre o estado plástico e de sólido poroso. Desse modo, a Figura 6 mostra os dados de leituras nos tempos de 3 h, 5 h, 7 h e 9 h após a mistura dos materiais secos com a água. Segundo Mehta e Monteiro [1[1] P. K. MEHTA and P. J. M. MONTEIRO, Concreto: Microestrutura, Propriedades e Materiais, 2a edição. São Paulo, 2014.] a hidratação é influenciada pela finura do cimento, relação água/cimento, temperatura de cura, presença de aditivos e adições no cimento. Com base no teste estatístico aplicado, não foi possível verificar diferenças significativas, pois o p-valor foi maior que 0,05 para todos os tempos de leitura. Como a tendência dos resultados não ficou muito clara, outros estudos focados especificamente na VPU no estado fresco são necessários para ter conclusões mais efetivas.

Figura 6
Velocidade de ultrassom para os três diferentes tipos de cimento nas primeiras horas da hidratação no estado fresco

3.2 Velocidade de pulso ultrassônico do concreto no estado endurecido

Na Figura 7 é apresentada a evolução da resistência à compressão e da velocidade de pulso ultrassônico ao longo do tempo para os três tipos de cimentos estudados (CP V-ARI, CP II-Z-32 e CP IV-32 RS), bem como a correlação para esses dois parâmetros. É importante ressaltar que a correlação foi realizada para as leituras obtidas nos mesmos corpos de prova que foram rompidos.

Figura 7
Evolução da resistência e da VPU do concreto ao longo do tempo: a) resistência à compressão; b) velocidade de pulso ultrassônico em função da forma do CP; c) correlação entre a resistência à compressão e a velocidade de pulso ultrassônico

Observa-se na Figura 7 (a) que a resistência à compressão dos três tipos de cimento aumentou ao longo do tempo e esse aumento dos 7 dias aos 91 dias de cura foi de 45% para o CP V, 117% para o CP II Z e de 95% para o CP IV. É interessante observar que houve um acentuado incremento de resistência nos cimentos CP II Z 32 e CP IV dos 70 para os 91 dias oriundo das reações pozolânicas tardias referentes a hidratação das adições do cimento. Mehta e Monteiro [1[1] P. K. MEHTA and P. J. M. MONTEIRO, Concreto: Microestrutura, Propriedades e Materiais, 2a edição. São Paulo, 2014.] afirmam que concretos sem adições minerais no cimento e com níveis de clínquer superiores a 90% (CP V) ganham aproximadamente 90% da resistência aos 28 dias de cura úmida. Para o presente estudo o concreto dosado com o cimento CP V obteve 89% do ganho de resistência aos 28 dias (comparado com a ruptura aos 91 dias) e os cimentos CP II Z e CP IV o ganho foi de aproximadamente 55%, que também era esperado pois de acordo com Mehta e Monteiro [1[1] P. K. MEHTA and P. J. M. MONTEIRO, Concreto: Microestrutura, Propriedades e Materiais, 2a edição. São Paulo, 2014.] as adições pozolânicas tem menor velocidade de hidratação em relação ao clínquer. Foi possível observar diferenças estatisticamente significativas em relação a resistência à compressão na comparação do CP V com C II Z e CP V com C IV até a idade de 70 dias e não significativas entre o CP II Z com CP IV até essa mesma idade. Em relação a idade de 91 dias nenhum dos cimentos teve diferença significativa.

Pela Figura 7 (b) observa-se que a velocidade de pulso ultrassônico aumentou apenas 6% dos 7 dias aos 91 dias para o CP V e aproximadamente 23% para os cimentos CP II Z e CP IV, sendo possível verificar diferença estatística na comparação das idades em relação ao tipo de cimento, que corrobora a influência do tempo de cura/grau de hidratação no aumento da velocidade de pulso ultrassônico. Após a realização do teste estatístico, não foi possível verificar diferenças estatísticas para nenhuma das idades, na comparação do CP II Z com CP IV. Na comparação do CP V com C II Z, foi possível observar diferenças nas idades de 7 dias e 70 dias. Já na comparação do CP V com CP IV as idades que apresentaram diferenças foram 7 dias, 14 dias e 70 dias. Assim como ocorreu com a resistência a compressão, na idade de 91 dias, nenhum dos cimentos teve diferença significativas para a VPU. Comparando com os experimentos de Sturrup et al. [13[13] H. STURRUP, V. R.; VECCHIO, F. J.; CARATIN, “Pulse Velocity as a Mesuare of Concrete Compressive Strength,” in Nondestructive Testing of Concrete, Special Pu., Detroit: American Concrete Institute (ACI), 1984, pp. 201-228.], Elvery e Ibrahim [14[14] R. H. Elvery and L. A. M. Ibrahim, “Ultrasonic Assessment of Concrete Strength At Early Ages.,” Mag. Concr. Res., vol. 28, no. 97, pp. 181-190, 1976.] e Evangelista [15[15] A. C. J. EVANGELISTA, “Avaliação da resistência do concreto usando diferentes ensaios não destrutivos,” 2002.], este trabalho confirma que o tipo de cimento e o grau de hidratação têm maior influência nas primeiras idades, porém, pelo menos para os materiais usados nesta pesquisa, não só até 24-48 horas da mistura dos materiais secos com a água.

Estas informações estão de acordo com o trabalho de Malhotra e Carino [29[29] V. M. . Malhotra and N. J. Carino, Handbook on Nondestructive Testing of Concrete, 2a edition. New York: CRC Press, 2004.], que afirma que o efeito da idade do concreto sobre a VPU é semelhante ao efeito da idade sobre a resistência à compressão do concreto. Segundo os autores, no início as velocidades crescem mais rapidamente, e em idades mais avançadas este crescimento é reduzido. Assim como encontrado na Figura 7, Malhotra e Carino [29[29] V. M. . Malhotra and N. J. Carino, Handbook on Nondestructive Testing of Concrete, 2a edition. New York: CRC Press, 2004.] afirmam que a tendência de crescimento da VPU é semelhante à curva tensão versus idade de um determinado concreto, mas a VPU atinge um patamar de constância antes do que no caso da resistência à compressão.

Além disso, notou-se que a velocidade de pulso ultrassônico aumentou de forma mais rápida para o CP II Z e CP IV nas primeiras idades e continuou a uma taxa mais lenta até atingir os 91 dias, resultados estes, que estão de acordo com o trabalho de ABO-QUDAIS [30[30] S. A. ABO-QUDAIS, “Effect of concrete mixing parameters on propagation of ultrasonic waves,” Constr. Build. Mater., vol. 19, no. 4, pp. 257-263, 2005.], onde o autor estudou o efeito dos parâmetros de mistura do concreto na propagação de ondas ultrassônicas, obtendo leituras começando de 4200 m/s aos 28 dias e com valores próximos de 5000 m/s aos 90 dias de cura. Estes dados corroboram com os dados da Figura 7 (b) que também variaram entre 4100 a 5300 m/s.

Ainda segundo ABO-QUDAIS [30[30] S. A. ABO-QUDAIS, “Effect of concrete mixing parameters on propagation of ultrasonic waves,” Constr. Build. Mater., vol. 19, no. 4, pp. 257-263, 2005.] o volume de poros capilares na pasta de cimento hidráulico diminui com o tempo, uma vez que o grau de hidratação do cimento depende da duração da cura, além de outras condições de cura como temperatura e umidade que no estudo do autor foram mantidas constantes. Esta informação justifica o aumento da VPU com o passar do tempo de cura, assim como ocorreu na Figura 7 (b).

Como é possível observar na Figura 7 (c), foram obtidas boas correlações lineares (R² ≥ 90%) entre a resistência à compressão média e a velocidade de pulso ultrassônico para os concretos produzidos com os três tipos de cimentos. O ajuste linear apresentou-se razoável para descrição desta relação, conclusão também obtida por Pereira e Medeiros [5[5] E. PEREIRA and M. H. F. MEDEIROS, “Ensaio de ‘Pull Off’ para avaliar a resistência à compressão do concreto: uma alternativa aos ensaios normalizados no Brasil,” RIEM - Rev. IBRACON Estruturas e Mater., vol. 5, no. 6, pp. 757-768, 2012.] estudando três traços de concretos com relações a/c de 0,43, 0,50 e 0,59 que correlacionaram a resistência à compressão versus a velocidade de pulso ultrassônico (m/s) através de uma regressão linear cujo R² foi igual a 0,9972.

Em contradição, para Del Río et al. [31[31] L. M. DEL RÍO, A. JIMÉNEZ, F. LÓPEZ, F. J. ROSA, M. M. RUFO, and J. M. PANIAGUA, “Characterization and hardening of concrete with ultrasonic testing,” Ultrasonics, vol. 42, no. 1-9, pp. 527-530, 2004.] a melhor maneira de apresentar a correlação entre a resistência à compressão e a velocidade de pulso ultrassônico é de forma exponencial, mas como já foi citado anteriormente são muitos os fatores que influenciam nas leituras e não há um consenso do melhor método de correlação, sendo eles linear, polinomial ou exponencial.

Na Figura 8 estão apresentados os resultados de velocidade de pulso ultrassônico e absorção de água ao longo de 72 h de ensaio de sucção de água por capilaridade para os três tipos de cimento na idade de 28 dias de cura.

Figura 8
Ensaios físicos ao longo de 72 h para os três tipos de cimento na idade de 28 dias: a) velocidade de pulso ultrassônico ao longo do ensaio de absorção; b) absorção de água por capilaridade; c) correlação entre a velocidade de pulso ultrassônico e a absorção de água por capilaridade

Para o presente estudo, o aumento da velocidade de pulso ultrassônico ao longo das 72 h do ensaio de absorção foi de 3%, 5% e 4% para os cimentos CP V, CP II Z e CP IV, respectivamente, sendo que na comparação do CP V com CP II Z somente houve diferença significativa nos tempos de 3 h e 72 h. Na comparação do CP V com CP IV houve diferenças apenas no tempo de 72 h. Na comparação do CP II Z com CP IV, não houve diferença em nenhum dos tempos. O ingresso de água no concreto deve causar aumento da VPU porque o som se transporta com maior velocidade na água do que nos poros vazios do concreto. Porém, a magnitude de aumento na VPU ao longo do ensaio de absorção por capilaridade foi pequena. De modo geral, pode-se dizer que isso ocorreu pelas características do ensaio de absorção de água por sucção capilar, que envolve a penetração de pequena quantidade de água no concreto (12 gramas no caso da menor absorção de 0,15 g/cm2 e 20 gramas para o caso da maior absorção, que foi de 0,25 g/cm2). No ensaio, a água penetra no corpo de prova apenas pela face que fica em contato com a lâmina de água, de modo que a umidade fica heterogeneamente distribuída nos corpos de prova de concreto. Desse modo, durante o ensaio o concreto aumenta a umidade mas fica longe da saturação, sendo esta a justificativa para que o grau de influência da VPU ao longo do ensaio seja pequeno e não seja possível verificar a influência estatística do tipo de cimento para os resultados de absorção observados.

A Figura 8 (c) apresenta a correlação linear entra a VPU e a absorção de água por capilaridade. Os valores de R2 são todos acima de 0,90, o que indica que existe influência com relação direta entre o ingresso de água no concreto e os valores de VPU.

Na Figura 9 são apresentados os resultados de ultrassom e absorção de água por capilaridade ao longo de 72 h para os três tipos de cimento na idade de 70 dias de cura.

Figura 9
Ensaios físicos ao longo de 72 h para os três tipos de cimento na idade de 70 dias: a) velocidade de pulso ultrassônico ao longo do ensaio de absorção; b) Absorção de água por capilaridade; c) correlação entre a velocidade de pulso ultrassônico e a absorção de água por capilaridade

A Figura 9 mostra os resultados de velocidade de pulso ultrassônico e absorção de água ao longo de 72 h de ensaio de sucção de água por capilaridade para os três tipos de cimento na idade de 70 dias de cura. Após a análise estatística foi verificado diferença da VPU somente na comparação do CP V com CP IV no tempo de 24 h de ensaio. Contudo, deve-se observar que a faixa de variação dos dados de VPU é menor para 70 dias (4900 - 5000 m/s). Além disso, como esperado devido ao aumento do grau de hidratação, os valores de absorção foram menores para os concretos curados por 70 dias, com diferença significativa na comparação do CP V com CP IV e do CP II Z com CP IV nas idades de 3 h e 6 h., todavia, para a comparação do CP V com CP II Z, não foi possível observar diferenças. Mas é importante destacar na Figura 9 (c) que a correlação entre VPU e absorção de água tem valores de R2 maiores do que 0,89. Comparando os gráficos de correlação para 28 dias (Figura 8 (c)) com os de 70 dias (Figura 9 (c)) nota-se que a amplitude de influência da absorção é maior no primeiro caso pois a 70 dias a hidratação está mais avançada e o concreto menos poroso.

Na Figura 10 são apresentados os resultados de velocidade de pulso ultrassônico e absorção de água por sucção capilar ao longo de 72 h para os três tipos de cimento na idade de 91 dias de cura. Após a avalição estatística, na comparação do CP V com CP II Z e do CP II Z com CP IV, somente foi observado diferença na VPU nos tempos de 6 h e 72h, mas não foi observado diferença entre o CP V com CP IV em nenhum dos tempos. Neste caso também houve menor variação da absorção de água e de VPU, que se explica pelo fato de esta ser a idade de leitura com maior tempo de cura submersa, ou seja, com maior grau de hidratação. Vale ressaltar que não foi possível observar diferença estatística na absorção para os três tipos de cimento.

Figura 10
Ensaios físicos ao longo de 72 h para os três tipos de cimento na idade de 91 dias: a) velocidade de pulso ultrassônico ao longo do ensaio de absorção; b) Absorção de água por capilaridade; c) correlação entre a velocidade de pulso ultrassônico e a absorção de água por capilaridade

Avaliando a Figura 10 (c), mais uma vez existe relação direta entre a VPU e o tempo de ensaio de absorção de água por sucção indicando que o ingresso de água no concreto aumenta a VPU.

Na Figura 11 é apresentada a velocidade de pulso ultrassônico para os três tipos de cimento e com os dois graus de umidade (corpos de prova secos e saturados). Neste caso, a influência da umidade é mais clara pois a diferença é mais extrema, seco e saturado. Utilizando a técnica estatística ANOVA com teste de Tukey a posteriori com 95% de significância, pode-se afirmar que existe diferença entre a VPU de corpos de prova secos e saturados, com exceção do CP V aos 28 dias, CP IV aos 70 dias e CP V e CP IV aos 91 dias. Desse modo, os poros vazios existentes no concreto seco representam um fator significativo na transmissão das ondas sonoras uma vez que a velocidade de pulso ultrassônico é menor no ar do que no sólido. Quando o concreto fica saturado, a VPU tende a aumentar, pois os poros vazios agora estão preenchidos com água que se transporta com maior velocidade do que nos poros vazios. Estas informações estão de acordo com os trabalhos de Naik et al. [3[3] T. R. Naik, V. M. Malhotra, and J. Popovics, “The ultrasonic pulse velocity method,” in Handbook on non-destructive testing of concrete, 2a edition., New York: CRC Press, 2004, pp. 84-97.] e Ohdaira e Masuzawa [32[32] E. Ohdaira and N. Masuzawa, “Water content and its effect on ultrasound propagation in concrete - the possibility of NDE,” Ultrasonics, vol. 38, no. 1-8, pp. 546-552, Mar. 2000.].

Figura 11
Velocidade de pulso ultrassônico para os três tipos de cimentos, em três idades, comparando corpos de prova saturados com secos

A Figura 12 mostra a comparação das leituras executadas em corpos de prova cilíndricos de 10 cm x 20 cm e cúbicos de aresta de 25 cm para todas as séries estudadas. Na maioria dos casos pode-se afirmar que a forma dos corpos de prova não apresentou diferença estatística nas leituras, com exceção do CP V em todas as idades e do CP IV aos 7 dias. O fato de não ocorrer mudança com a variação da forma e dimensões (na maioria dos pares de comparação) confirma que a medida da velocidade de pulso ultrassônico é efetivamente dependente da variação do material, sendo este um ponto positivo para comparação de resultados entre diferentes estudos experimentais relativos a trabalhos de outros autores.

Figura 12
Comparação entre medida de VPU em corpos de prova cilíndricos de 10 cm x 20 cm e cúbicos de aresta de 25 cm, para os três tipos de cimentos, em diferentes idades

A Figura 13 mostra a correlação linear da velocidade de pulso ultrassônico nos corpos de prova cilíndrico e nos cúbicos para cada um dos três tipos de cimento. Verifica-se que tanto a linha de tendência para o CP II Z e CP IV ficaram muito próximas da linha de 45 graus em relação ao eixo x. O comportamento para o caso do CP V foi diferente de modo que o coeficiente angular da linha de tendência dos dados com relação ao eixo x foi menor do que 45 graus. Isso confirma a comparação de médias pelo teste de Tukey, reafirmando que no caso do CP V os dados de VPU não são equivalentes para o cilindro e para o cubo.

Figura 13
Correlação entre medida de VPU em corpos de prova cilíndricos de 10 cm x 20 cm e cúbicos de aresta de 25 cm

4. Conclusões

Esta pesquisa experimental possibilitou o estabelecimento das conclusões elencadas a seguir:

  • Com a correlação estabelecida entre a resistência à compressão e a velocidade de pulso ultrassônico, pode-se constatar que foram obtidas relações lineares satisfatórias para os três cimentos estudados, com os valores de R² superiores a 0,89;

  • Foi possível verificar diferença estatística na comparação das idades em relação ao tipo de cimento, que corrobora a influência do tempo de cura/grau de hidratação no aumento da velocidade de pulso ultrassônico;

  • O tipo de cimento apresentou influência na VPU até a leitura de 70 dias na comparação do CP V com CP II Z e do CP V com CP IV, diferente do que afirmam alguns autores que relatam ter encontrado efeito do tipo de cimento apenas até 24-48 horas da mistura dos materiais secos com a água;

  • O ensaio de absorção ocasionou pouco variação na VPU, que se tornou ainda menor a medida que o tempo de cura aumentou entre 28 e 91 dias;

  • A comparação entre concreto seco e saturado mostrou diferença na VPU, de modo que o concreto saturado apresentou sempre maiores valores de VPU. A exceção foi o CP V ARI, que se comportou diferente dos demais;

  • A diferença da velocidade de pulso ultrassônico (VPU) entre corpos de prova com diferentes geometrias (cilíndricos e cúbicos) foi inferior a 200m/s para a maioria dos pares comparados. Isso confirma conclusões de outros estudos que indicam que a variação da geometria do corpo de prova não interfere na propagação de ondas ultrassônicas. A exceção foi o CP V em todas as idades, assim como ocorreu na comparação entre concreto seco e concreto saturado.

5. Agradecimentos

Os autores expressam a sua gratidão as agências brasileiras CNPq, CAPES e Fundação Araucária pelas bolsas e apoio financeiro, bem como ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Construção Civil (PPGECC) da Universidade Federal do Paraná (UFPR), e ao grupo de pesquisa de Patologia e Recuperação das Construções (PRC).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    Mar-Apr 2020

Histórico

  • Recebido
    03 Ago 2018
  • Aceito
    18 Set 2019
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