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A educação e a escola: princípios de formação em três contos de Machado de Assis

Education and the school: principles of formation in three short stories by Machado de Assis

Resumo

Pretende-se neste artigo discutir ideias de educação e de formação pela escola que Machado de Assis desenvolve em três de seus contos "Um cão de lata ao rabo", "O programa" e "Conto de escola". Busca-se destacar como os textos abordam a educação e a escola do Brasil do século XIX, e como desvelam certas concepções de formação essenciais para a compreensão dos significados da escola e da educação na vida dos brasileiros da época. Resulta dessa abordagem a perspectiva de que das obras emergem princípios formativos alternativos e uma ácida crítica à educação e à formação proporcionadas pela escola do Brasil oitocentista.

formação; educação; leitura; literatura; Machado de Assis

Abstract

This article aims at discussing ideas of education and formation through the school that Brazilian writer Machado de Assis develops in three of his short stories: "Um cão de lata ao rabo" (A dog with a can in his tail), "O programa" (The program) e "Conto de escola" (School Tale). Our attempt was to highlight how the texts deal with education and schooling in nineteenth-century Brazil, and how they reveal certain concepts of formation that are crucial for understanding the meanings of school and education in the formation of Brazilians at that time. The result of such approach is the perspective that Machado’s works give rise to alternative formative principles as well as an acerbic criticism of the education and schooling provided by Brazilian schools in the nineteenth century.

formation; education; reading; literature; Machado de Assis

Introdução1 1 Este texto é decorrente da tese de doutorado Machado de Assis e a crítica à escola de seu tempo: uma ideia de formação nos contos "Um cão de lata ao rabo", "O programa" e "Conto de escola", defendida em 2014 na linha de pesquisa Linguagem e Educação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.

Os contos "Um cão de lata ao rabo", "O programa" e "Conto de escola" mostram-se em diálogo estreito com as questões da época em que foram produzidos – a segunda metade do Brasil do século XIX – e problematizam uma concepção de formação intimamente ligada à educação formal proporcionada pela escola naquele momento.

A obra de arte, como construção estética,2 2 CANDIDO, O direito à literatura. opera com diversas mediações, que constroem por sua vez novos discursos sobre a realidade. Segundo John Gledson,3 3 GLEDSON, Machado de Assis: impostura e realismo. Uma reinterpretação de Dom Casmurro, p. 13. nesse propósito, o realismo poderia ser entendido como "a intenção do romancista de revelar, através da ficção, a verdadeira natureza da sociedade que está retratando". Contudo, não há dúvida de que o conhecimento dessa natureza se revela, mais do que uma verdade, um ângulo de observação, "e de que o resultado da apreensão do real é sempre uma verdade aproximada".4 4 CHAMON, Trajetória de feminização do magistério: ambiguidades e conflitos, p. 15. Nos três contos, há uma abordagem de métodos de ensino, comportamento de alunos e professores, de conteúdos ensinados, características de escolas, práticas escolares e ideias educacionais do tempo que se mostram nas ações das personagens.

O século XIX brasileiro, em quase toda a sua extensão, foi um período assolado pelo analfabetismo, com manifestações de atraso e vergonha por parte de quem via na educação um caminho possível para o progresso social. A partir de 1822, com a Independência do Brasil, iniciava-se a luta pela escolaridade, sobretudo a popular. "Debatia-se na Assembleia Constituinte a questão da difusão da escolarização e do acesso das mulheres, dos negros, dos índios, em suma, dos excluídos, à instrução."5 5 MARCÍLIO, História da escola em São Paulo e no Brasil, p. 46. A Assembleia Constituinte de 1823 recebeu muitos projetos educacionais, e a maioria deles apontava para a necessidade da criação de um sistema de ensino uniforme para todo o país.6 6 Idem, p. 56.

A luta iniciada com a independência política se arrastaria por cerca de meio século e permaneceria na pauta dos discursos políticos e da intelectualidade, com grande debate na imprensa: "criticava-se a negligência dos órgãos públicos em suas ações, insuficientes para garantir o acesso das crianças à escola".7 7 GUIMARÃES, Os leitores de Machado de Assis: o romance machadiano e o público de literatura no século 19, p. 91. No decênio de 70 e 80, a população brasileira permanecia em sua grande maioria analfabeta, como informa Hélio de Seixas Guimarães:

Em 1872, apenas 18,6% da população livre e 15,7% da população total, incluindo os escravos, sabiam ler e escrever, segundo dados do recenseamento; entre a população em idade escolar (seis a quinze anos), que somava 1.902.454 meninos e meninas, apenas 320.749 frequentavam escolas, ou seja, 16,9%. Já em 1890, a porcentagem diminuiu: apenas 41,8% sabiam ler e escrever.8 8 Idem, p. 66.

Machado de Assis não ficou insensível a nenhuma dessas questões, afirma Guimarães. Em 1876, o escritor comenta o resultado do recenseamento feito naquele ano "do qual se colige que 70% da nossa população não sabem ler".9 9 ASSIS, “História de 15 Dias”, Semana Ilustrada, 15 ago. 1876, apud GUIMARÃES, p. 102. Machado, que jamais se furtou, direta ou indiretamente – se assim podemos dizer em relação, respectivamente, às crônicas e aos textos literários ficcionais –, a inquirir sobre questões essenciais da sociedade, também tomou a educação como matéria de seus textos. Sobressai a percepção da educação formal como veículo estratégico de distinção das elites e meio para a conservação de seu poder. Não obstante os discursos oficiais alardeassem a necessidade da educação do povo, as práticas destoavam sensivelmente.

Das obras de sua autoria que lidam com aspectos da educação,10 10 Entre elas o conto "Umas férias", publicado na coletânea Relíquias de casa velha, de 1906, cuja temática é o primeiro contato da criança com a morte e o cenário da narrativa, a escola. Também trata de escola e de educação o capítulo "Um salto", do romance Memórias póstumas de Brás Cubas, em que o protagonista Brás Cubas rememora os tempos da "enfadonha escola", diz o defunto-autor, onde aprendera a ler, escrever, dar e tomar "cacholetas". priorizamos os três contos ora em estudo porque apresentam perspectivas formativas inovadoras, mesmo para a educação contemporânea, o que nos permite estabelecer um diálogo vivaz e profícuo tanto em relação aos horizontes históricos quanto na relação literatura e realidade na obra do escritor.

"Um cão de lata ao rabo"

Originalmente publicado no jornal O Cruzeiro em 2 de abril de 1878, o conto "Um cão de lata ao rabo" integraria em 1937 a coletânea Páginas recolhidas. A narrativa é ambientada em uma escola de primeiras letras – termo usado à época para designar o ensino hoje equivalente à primeira etapa do Ensino Fundamental (1º ao 5º ano) – de Chapéu d’Uvas, localidade mineira cuja existência remonta ao ano de 1745 (incorporada ao município de Juiz de Fora em 1850, na época Vila de Santo Antônio do Paraibuna).11 11 Cf. LACERDA, Os padrões das alforrias em um município cafeeiro em expansão (Juiz de Fora, Zona da Mata de Minas Gerais, 1844-88). O protagonista, cujo nome não é revelado, é também o narrador da história. Um campeonato de redações proposto pelo mestre-escola aos alunos é o enredo do conto; o tema da redação (Um cão de lata ao rabo), aos nossos olhos, mostra-se inusitado e extravagante para uma redação escolar, porém nas palavras do mestre pretendia ser "simples, aparentemente vulgar, mas profundamente filosófico".

As três redações finalistas do concurso proposto pelo mestre resultam paródia de usos que intelectuais literatos e membros da escola brasileira oitocentista, professores e alunos, faziam da língua portuguesa. Machado de Assis zomba das formas codificáveis de discursos, que circulavam no meio literário e jornalístico.

Dos sete inscritos no dito concurso, três "mereceram a palma e encheram de pasmo o júri e o mestre". Testemunha e membro do júri, o narrador apresenta os resultados:

Os três estilos nós os classificamos pela ordem do mérito e do estilo. Assim, temos:

1º Estilo antitético e asmático.

2º Estilo Ab ovo.

3º Estilo largo e clássico.12 12 ASSIS, Um cão de lata ao rabo, p. 174.

Antitético é o que apresenta antítese, ou seja, argumentos, expressões e pensamentos em oposição, enquanto asmático é o indivíduo que padece de asma, doença inflamatória crônica das vias aéreas caracterizada pela falta de ar e pelo cansaço. O aluno autor desse estilo de narrativa utiliza opostos na construção dos argumentos, com palavras grandiloquentes e sintaxe acelerada – a escrita, tal qual o asmático em uma crise a padecer por falta de ar, sufoca-se e emite palavras sem nada dizer.

O céu pôs esse transparente manjar ao alcance dos impetuosos. Quando uns jantam e outros jejuam; quando, em oposição às toalhas da casa nobre, há os andrajos da casa pobre; quando em cima as garrafas choram lacrima-christi, e em baixo os olhos choram lágrimas de sangue, Deus inventou um banquete para a alma.13 13 Idem, p. 175-176.

Com o recurso da paronomásia, ao batizar o primeiro estilo vencedor de "antitético" e "asmático", parodiam-se dois estilos da oratória grega: o ático e o asiático.14 14 O asianismo ou estilo asiático, vigente durante o Império de Vespasiano e então chamado de estilo "corrupto" ou anticlassismo, passou a opor-se ao estilo ático, cujo maior representante foi Demóstenes (384 a.C. - 322 a.C.). Considerado um grande orador e contrário aos representantes do estilo asiático, Demóstenes, não obstante utilizasse atributos da eloquência, planejava discursos cuidadosamente, com linguagem simples e acessível e seguindo os fatos narrados um encadeamento direto. Segundo Brandão,15 15 BRANDÃO, Os manuais de retórica brasileiros do século XIX, p. 46. as escolas brasileiras inicialmente utilizavam a retórica clássica "na alfabetização das crianças" e posteriormente no "ensino das humanidades". Eram comuns citações de autores como Aristóteles, Cícero, Horácio, Quintiliano, "considerados autoridades no assunto". Contudo, "muitas expressões que nestes não passavam de formas descritivas ou observações sobre realidades de seu tempo assumiam nos manuais do século XIX papel de verdades eternas".16 16 Idem, p. 45.

Nos manuais escolares17 17 Manuais de retórica ou tratados de política eram livros didáticos, suportes pedagógicos com os quais se ensinava literatura, principalmente nos cursos secundários nas escolas brasileiras do século XIX. De acordo com a autora Leyla Perrone-Moisés, no seu O Ateneu: retórica e paixão: os manuais de retórica brasileiros do século XIX, o plano de estudos desses manuais "resumia-se a uma parte introdutória dedicada aos problemas gerais, a distinção entre eloquência e retórica, entre gênio e arte, os fins da eloquência, os atributos do orador, considerações sobre a dignidade do homem enquanto falante, etc.". PERRONE-MOISÉS, O Ateneu: retórica e paixão, p. 43. da época de Machado, cuja inspiração remonta aos cânones da Grécia antiga, o objetivo era formar para a elite e, nesse intuito, a retórica ocupava o papel principal. Na Grécia de Demóstenes ou na Roma de Quintiliano, a eloquência era "o magno poder de constituir cidades, conduzir os povos, instituir leis".18 18 VASCONCELOS, Ciência do dizer bem: a concepção de retórica de Quintiliano em Institutio oratoria, II, II-21, p. 14. Preceitos formativos similares eram deslocados para os manuais19 19 Segundo Perrone-Moisés, "o estudo da elocução ocupava a maior parte dos manuais e compreendia a enumeração dos vícios e das virtudes da elocução, os ornamentos, os tropos e as figuras, e, finalmente, os estilos: ático, ródio e asiático. PERRONE-MOISÉS, O Ateneu: retórica e paixão, p. 44. e ações educativas dos mestres-escolas do Brasil do século XIX, onde a retórica e seu caráter formativo podiam resumir-se a três aspectos: "o de deleitar, instruir e mover, através dos quais se efetivam três modos básicos do relacionamento humano que ia desde uma atitude 'desinteressada' até uma relação de poder".20 20 BRANDÃO, Os manuais de retórica brasileiros do século XIX, p. 55.

Esses três pressupostos transmitidos aos filhos da elite nos exercícios e aulas de oratória objetivavam imprimir uma cultura de cunho destacadamente literário, despertando e reprimindo vocações, a fim de formar o indivíduo ou futuro cidadão em membro da classe dominante naquelas profissões consideradas adequadas.21 21 A esse respeito o autor Sílvio Romero (apud BRANDÃO, 1988, p, p. 57) comenta: "[…] no Brasil, mais ainda do que noutros países, a literatura conduz ao jornalismo e este à política, que no regime parlamentar e até no simplesmente representativo, exige que seus adeptos sejam oradores. Quase sempre as quatro qualidades andam juntas: o literato é jornalista, é orador e é político".

Quanto à segunda finalista, a composição de estilo Ab ovo,22 22 Algumas hipóteses procuram explicar a origem da expressão latina ab ovo – que significa "desde o ovo", "desde a origem". A primeira delas sugere que a expressão ab ovo usque ad mala, que significa literalmente "do ovo à maçã", remete ao modelo de banquete completo da Roma antiga. Em teoria literária, a expressão ab ovo é utilizada para delimitar a narrativa desde o nascimento do protagonista. trata-se igualmente de uma paródia,23 23 Machado de Assis utiliza nestes contos a paródia de um modo muito próximo ao que Linda Hutcheon classifica como paródia moderna: "um jogo irônico, com convenções múltiplas, repetição alargada com diferença crítica. […] Não se trata de imitação nostálgica de modelos passados: é uma confrontação estilística, uma recodificação moderna que estabelece a diferença no coração da semelhança". HUTCHEON, Uma teoria da paródia, p. 19. cujo alvo são os pressupostos da Escolástica,24 24 "Por vezes são as convenções tanto como as obras individuais que são parodiadas." Idem, p. 25. marcados pela divisão entre fé e razão, pelo excesso de retórica e pela recorrência a filósofos antigos ou a autores clássicos de Grécia e Roma e às Sagradas Escrituras, fontes consideradas primordiais para o desenvolvimento da reflexão. Recorreu a esses documentos o aluno, autor da composição, para quem os argumentos dali extraídos eram irrefutáveis e, portanto, verdadeiros. No entanto, o aluno não consegue concluir ou mesmo adentrar o tema proposto: "Assim explorada a origem do uso, entrarei no exame do assunto que… (Não houvera tempo para concluir)".25 25 ASSIS, Um cão de lata ao rabo, p. 181-2. Entretanto, mesmo não conseguindo dar conta de seu objetivo, o aluno foi considerado pelo júri o segundo finalista.

A terceira finalista, a redação de estilo largo e clássico, em linguagem rebuscada, eloquente e pontilhada de preciosismos, utiliza-se de palavras de pouco uso, "catadas a dedo para luzir, verdadeiros pedregulhos do estilo".26 26 LUCAS, O núcleo e a periferia de Machado de Assis, p. 80. A crítica nesse conto dirige-se a um estilo de escrita de valor incontestável para os autores dos manuais escolares e também para os professores que deles se serviam. Para evidenciar esse emprego da literatura e dos recursos didáticos, o texto machadiano exagera na retórica para aumentar o efeito, deixando então subentendida, em oposição, outra faceta do estilo – a objetividade, simplicidade, coesão e articulação. A crítica à má interpretação do legado greco-romano aparece nos três textos, como neste trecho do estilo "Largo e clássico", em que a Grécia clássica é referência para as justificativas do aluno:

Manha foi sempre puerícia atar uma lata ao apêndice posterior do cão: e essa manha, não por certo louvável, é quase certo que a tiveram os párvulos de Atenas, não obstante ser a abelha-mestra da antiguidade, cujo mel ainda hoje gosta o paladar dos sabedores.27 27 ASSIS, Um cão de lata ao rabo, p. 182.

A nosso ver, a peculiaridade desse conto reside sobretudo na articulação das questões educacionais, que possivelmente incomodavam o autor, com uma ferrenha crítica à linguagem esteticamente elaborada de seu tempo, às suas grandiloquências de linguagem e consequentemente ao seu ensino. A voz do mestre-escola é a representação literária de uma das várias vertentes da educação da época, de suas ações e instruções para os alunos, que decerto ocorriam no interior de uma sala de aula.

"O programa"

O conto é ambientado em 1850, na Gamboa, zona portuária do Rio de Janeiro na época. A narrativa trata da trajetória de um homem e de seus sonhos. Ascender a uma classe social superior à sua era o ideal perseguido por muitas personagens machadianas, homens brancos e livres, mas pobres, na sociedade estratificada do século XIX. Esse também era o ideal do protagonista Romualdo, incitado pelos conselhos do mestre-escola Pitada. Este exibe para cinco meninos de dez e onze anos como se tornara mestre-escola e quais estratégias utilizara, expondo, assim, o seu "programa":

– Programa é o rol das coisas que se hão de fazer em certa ocasião; por exemplo, nos espetáculos, é a lista do drama, do entremez, do bailado, se há bailado, um passo a dois, ou coisa assim… É isso que se chama programa. Pois eu entrei no mundo com um programa na mão; não entrei assim à toa, como um preto fugido, ou pedreiro sem obra, que não sabe aonde vai. Meu propósito era ser mestre de meninos, ensinar alguma coisa pouca do que soubesse, dar a primeira forma ao espírito do cidadão… Dar a primeira forma (entenderam?), dar a primeira forma ao espírito do cidadão…28 28 ASSIS, O programa, p. 273.

Ao expor suas metas e métodos para a vida, mestre Pitada destaca um dos princípios formativos legados por seu ofício de educador: "Dar a primeira forma (entenderam?), dar a primeira forma ao espírito do cidadão…".29 29 Ibidem. O excerto de Pitada enquadra-se no princípio aristotélico de formação, cuja metáfora utilizada para representar o processo formativo do sujeito é o "bloco de pedra sobre o qual o escultor trabalha", a matéria bruta que ele torna primorosa escultura.30 30 ROCHA, Tonar-se quem se é: educação como formação, educação como transformação, p. 269. Tal qual o escultor, mestre Pitada também procura moldar a matéria – as crianças –, pedras brutas, que a partir de sua ação se tornarão os futuros cidadãos. Uma provável ética se manifesta contudo como conselho, em que o próprio mestre se consagra como exemplo e instrui os alunos acerca dos pontos necessários para se alcançar uma bela posição social – uma educação em que o percurso de aprendizagem não é importante, mas sim o resultado.

Romualdo incorporou o discurso de seu mestre. Este ambicionou ser professor, Romualdo almejava ser ministro de Estado. Sem consciência do terreno gigantesco que separava sua meta do "programa" do mestre – tornar-se professor –, equiparou os projetos. Não tinha dúvidas de que, como o sol "que ele imaginava ter sido criado unicamente com o fim de o alumiar",31 31 ASSIS, O programa, p. 279. reluziria nos salões da sociedade carioca, alcançaria a realização de seus objetivos; não cogitava sequer em pensamentos a possibilidade da derrota, afinal era jovem e talentoso. Iniciou seus planos pela literatura, desejava ser autor, ou nas suas palavras "autor impresso" – "tudo muda com o impresso", dizia a si mesmo o jovem poeta. Reaparece aqui um dos temas caros a Machado de Assis, o da aparência, pois o texto no jornal, dado a público, visto e lido pelos outros, estava longe de significar um verdadeiro pendor poético, mas sim o uso do poético para projetar o homem no social.

Machado acaba roendo a substância do eu e do fato moral considerados em si mesmos; mas deixa viva e em pé, como verdade fundante, a relação de dependência do mundo interior em face da conveniência mais forte. É dessa relação que se ocupa enquanto narrador.32 32 BOSI, Machado de Assis: o enigma do olhar, p. 85.

Os sonhos de Romualdo relacionavam-se, pois, com projeção social, com aparência e não com mérito. A personagem tampouco parece ter consciência de que a mobilidade dentro da estrutura rígida daquela sociedade era possível em pouquíssimas situações. Como as ambições literárias não renderam frutos, passou Romualdo para os estudos, conforme aconselhara mestre Pitada: "entendeu que sempre era tempo de ganhar um diploma. Foi para São Paulo, entregou-se aos estudos com afinco, dizendo consigo e a ninguém mais que ele seria citado algum dia entre os Nabucos, os Zacarias, os Teixeiras de Freitas, etc. Jurisconsulto!".33 33 ASSIS, O programa, p. 284. Enquanto estudava, "metia-se pelo direito dentro", passava para o segundo tópico da lista sugerida pelo mestre, as relações, as quais vieram com um colega do terceiro ano de Direito, Josino M., sobrinho de um rico fazendeiro residente em Guaratinguetá. As viagens viriam após o terceiro item da lista – o casamento. O terceiro item "era uma moça de quinze anos", filha do fazendeiro. "A moça gostava dele: era o primeiro amor dos seus quinze anos."34 34 Ibidem. Contudo, com o andar da carruagem, o casamento gorou, como goraram todos os outros tópicos do programa de Romualdo. Dadas a sua condição social e a falta de relações dentro da classe privilegiada, encontrou obstáculos intransponíveis ao procurar seguir o mesmo trajeto dos filhos da elite.

Do início ao fim, o objetivo permanece o mesmo, respaldado na ideia de imutabilidade na essência do sujeito, mas aperfeiçoável por meio da educação que potencializa essências preexistentes em estado latente. Não por acaso, a figura de Romualdo é quase estática diante da dura realidade imposta pelas adversidades da vida, pois representa o sujeito que não muda durante o processo, mesmo tendo vivido fortes experiências. Uma representação crítica da ineficácia de um processo formativo que só vislumbra metas para se inserir numa sociedade sem intenção de mudá-la.

Silvia Rocha discute dois modelos de formação do indivíduo – um aristotélico, que acredita numa essência do sujeito que não muda ao longo da vida, e outro que ela identifica em Nietzsche, para quem não há sujeito preexistente às circunstâncias da vida. A educação sempre se pautou pelo princípio aristotélico, como se vê em "O programa": "As virtudes, saberes ou habilidades que alguém venha a desenvolver são acidentais, e embora capazes de imprimir uma transformação no sujeito, são, no entanto, incapazes de agir sobre sua natureza essencial".35 35 ROCHA, Tonar-se quem se é: educação como formação, educação como transformação, p. 268. Romualdo – rapaz humilde, talvez o primeiro membro de sua família a se sentar em um banco escolar – cavou seu próprio fracasso, seguindo os preceitos do mestre. Quanto ao princípio formativo que, por contraponto, decorre da crítica do texto machadiano, valoriza o aprendizado contínuo, que não cessa, que continua por toda uma vida.

É só quando adentra a velhice que finalmente Romualdo se conscientiza do desmoronamento de seu "programa", síntese de seus sonhos nunca realizados.

"Conto de escola"

Raízes históricas e sociais do Brasil consistiam um substrato para a configuração das narrativas e definição dos traços das personagens de Machado. Em "Conto de escola", os acontecimentos sociais e históricos do Brasil Regência são o pano de fundo para uma narrativa que aborda a iniciação da criança na sociedade adulta e o papel da escola nessa iniciação. A história é ambientada na cidade do Rio de Janeiro da primeira metade do século XIX e narra as desventuras do narrador e protagonista, Pilar, que rememora a infância quando já adulto.

Na "Rua do Costa", onde se localizava a escola, em uma segunda-feira do mês de maio do ano de 1840, um fato inusitado mudaria a rotina escolar do menino e tornaria aquele dia extraordinário, rendendo-lhe um importante aprendizado. Enquanto rememora o acontecimento, são reveladas informações preciosas da escola da época. Assim começa o narrador:

A escola era na Rua do Costa, um sobradinho de grade de pau. O ano era de 1840. Naquele dia – uma segunda-feira, do mês de maio – deixei-me estar alguns instantes na Rua da Princesa a ver onde iria brincar a manhã. Hesitava entre o morro de S. Diogo e o Campo de Sant’Ana, que não era então esse parque atual, construção de gentleman, mas um espaço rústico, mais ou menos infinito, alastrado de lavadeiras, capim e burros soltos. Morro ou campo? Tal era o problema. De repente disse comigo que o melhor era a escola. E guiei para a escola.36 36 ASSIS, Conto de escola, p. 97.

Pilar, sem falsa modéstia, descreve-se como "dos mais adiantados da escola; e dos mais inteligentes". Não era "pálido nem mofino: tinha boas cores e músculos de ferro".37 37 Idem, p. 98. Nas atividades escolares tinha sempre bom desempenho. Na lição de escrita, por exemplo, acabava sempre antes de todos, mas deixava-se estar "a recortar narizes no papel ou na tábua, ocupação sem nobreza nem espiritualidade, mas em todo caso ingênua".38 38 Ibidem. Entediado com o ambiente e também com as atividades da rotina escolar, buscava distrair-se caricaturando a imagem de mestre Policarpo em várias expressões. No dia rememorado não foi diferente; conta o narrador que, terminada uma tarefa, passou a reproduzir na tábua cinco, "talvez seis feições, a interrogativa, a admirativa etc." e, enquanto se divertia, os outros alunos foram terminando a lição. Contudo, um dos colegas, Raimundo, filho do professor, sem conseguir resolver um difícil ponto da lição de sintaxe, incita Pilar a aceitar um negócio.

[…] uma troca de serviços; ele me daria a moeda, eu lhe explicaria um ponto da lição de sintaxe. Não conseguira reter nada do livro, e estava com medo do pai. E concluía a proposta esfregando a pratinha nos joelhos…39 39 Idem, p. 100.

Disfarçando, a cada vez que Policarpo mostrava perceber a ação, voltavam-se ambos para o livro de leitura, pois àqueles flagrados em ações consideradas impróprias eram aplicados castigos, dos quais o pior era a palmatória: "E essa lá estava, pendurada do portal da janela, à direita, com os seus cinco olhos do diabo. Era só levantar a mão, despendurá-la e brandi-la, com a força do costume, que não era pouca".40 40 Idem, p. 99. Entretido com a leitura do jornal, o mestre havia deixado de vigiar os alunos, mas estes foram delatados, pelo colega Curvelo, segundo supôs Pilar.

Ao não dar voz própria para aquele que delata, há a representação da delação feita por subterfúgio, às escondidas, o que no conto aparece moralmente reprovável. As duas crianças são punidas com doze golpes da terrível palmatória, cujo intuito era incutir preceitos morais: "Estendi-lhe a mão direita, depois a esquerda, e fui recebendo os bolos uns por cima dos outros, até completar doze, que me deixaram as palmas vermelhas e inchadas".41 41 Idem, p. 102. Além do castigo físico, o mestre proferiu um sermão, com palavras duras, severas – que parecem descabidas para um educador da atualidade, mas condizentes com a realidade imposta pelas tradições culturais do Brasil do século XIX. A vergonha, o vexame, a exposição perante os demais colegas, tudo era considerado método pedagógico para ensinar aquilo que parecia o mais importante – a moral. O método era considerado eficaz porque punia os transgressores e servia de exemplo aos demais alunos, supostamente evitando reincidências.

Além do vexame, Pilar perdeu a pratinha, que o mestre no auge de sua raiva arremessou pela janela; enraivecido, jura "quebrar a cara" do delator Curvelo, que escapa por uma rua vizinha à da escola. Na manhã seguinte, ao rumar para a escola, com a intenção de recuperar a pratinha, o menino é surpreendido pelo batalhão de fuzileiros navais: "Eu senti uma comichão nos pés e tive ímpeto de ir atrás deles. Já lhes disse: o dia estava lindo, e depois o tambor…".42 42 Idem, p. 104.

Pilar não foi à escola, acompanhou os fuzileiros passando a manhã a brincar, na praia da Gamboa. Contudo, ao findar da história o narrador-protagonista conceitua o aprendizado adquirido: "E contudo, a pratinha era bonita e foram eles, Raimundo e Curvelo, que me deram o primeiro conhecimento, um da corrupção, outro da delação; mas o diabo do tambor…".43 43 Ibidem.

Pilar, analisando os acontecimentos em retrospectiva, conscientiza-se de seu passado, até então incompreendido, e integra-o de forma consciente em sua vida. Ao assenhorear-se de seu passado, compreende as proporções daquele aprendizado: "indissociável da obstinação de imaginá-lo de um modo diferente do que ele é e em transformá-lo, captando-o naquilo que ele é. Essa atitude consiste na capacidade de elaborar sua própria subjetividade".44 44 PORTOCARRERO, Práticas sociais de divisão e constituição do sujeito, p. 282. No ambiente escolar, as normas estabelecidas são incutidas, e a narrativa revela como contribuem na formação da subjetividade do indivíduo, ou seja, como este vem a constituir-se a partir das relações éticas e sociais desencadeadas naquele espaço.

Considerações finais

Nos contos que abordamos neste artigo, destacamos as práticas e concepções do ensino da escola do Brasil do século XIX, estruturalmente presentes nos textos, reelaboradas pelo autor com o intuito de, a contrapelo, produzir uma crítica ferrenha para mostrar não só sua inadequação como seu absurdo, como em "Um cão de lata ao rabo", no qual aparecem "a corrupção da língua e o seu uso em situações de cada dia, seja no jornalismo, na propaganda, na política, nas escolas ou na burocracia".45 45 GLEDSON; GRANJA, Machado de Assis: notas semanais, p. 67.

Corrupção e delação também formam o aprendizado adquirido por Pilar naquele memorável dia na escola em "Conto de escola"; a iniciação da criança no mundo adulto, o poder das relações sociais para moldar, ou melhor, "dar forma ao espírito do cidadão", palavras de mestre Pitada no conto "O programa". Moldar a criança para se obter o homem, princípio de formação aristotélico, cuja preocupação é a preparação do indivíduo para a vida em sociedade, para a obediência de normas e regras e manutenção de uma pirâmide social predeterminada. Esse princípio é propagado pelas escolas e pelos mestres dos três contos de Machado de Assis, em uma correspondência com as práticas promovidas pelas escolas da época. Ação formativa rejeitada pelos textos machadianos visto que aqueles que se mantiveram fiéis aos preceitos sociais e às convenções, como os alunos autores das três redações finalistas, foram bem-sucedidos.

A educação proporcionada pela escola não questionava a estrutura de exclusão das classes populares, mas servia a ela e a disseminava. Os ensinamentos do mestre que imitavam os passos propostos aos "bem-nascidos" não dialogaram com a vida do rapaz de origem humilde. Em nenhuma das três narrativas, os métodos da escola levaram em conta as incertezas da vida, ou seja, alguma particularidade dos alunos, um olhar para o indivíduo. A corrupção e alguns de seus sentidos são temática comum aos três contos, e um princípio presente e disseminado na prática das escolas retratadas, e representação do princípio aristotélico, fora de lugar, praticado por elas.

Vislumbra-se, pois, nos textos de Machado de Assis, uma concepção de formação contrária àquela de seu tempo, ao mesmo tempo em que se descortina a partir desta seu posicionamento crítico em relação às ideias e comportamentos sociais.

Referências

  • ASSIS, Machado de. Um cão de lata ao rabo. In: Páginas recolhidas. São Paulo: W. M. Jackson Editores, 1955a. Obras Completas de Machado de Assis.
  • ASSIS, Machado de. O programa. In: Relíquias de casa velha. São Paulo: W. M. Jackson Editores, 1955b. Obras Completas de Machado de Assis.
  • ASSIS, Machado de. Obras completas de Machado de Assis. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, vol. I.
  • ASSIS, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas São Paulo: Ática, 1997.
  • ASSIS, Machado de. Conto de escola. In: Várias histórias. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2004.
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  • BOSI, Alfredo. Machado de Assis: o enigma do olhar. São Paulo: Ática, 2003.
  • BRANDÃO, Roberto de Oliveira. Os manuais de retórica brasileiros do século XIX. In: PERRONE-MOISÉS, Leila (Org.). O Ateneu: retórica e paixão. São Paulo: Brasiliense/Edusp, 1988.
  • CÂMARA JÚNIOR, Joaquim Matoso. Ensaios machadianos. Brasília: INL, 1977.
  • CANDIDO, Antonio. O direito à literatura In: CANDIDO, Antonio. . Vários escritos. São Paulo: Duas Cidades, 1995.
  • CHAMON, Magda. Trajetória de feminização do magistério: ambiguidades e conflitos. Belo Horizonte: Autêntica, 2005.
  • GLEDSON, John. Machado de Assis: impostura e realismo. Uma reinterpretação de Dom Casmurro São Paulo: Companhia das Letras, 2005.
  • GLEDSON, John; GRANJA, Lúcia. (Orgs.). Machado de Assis. Notas semanais Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2008.
  • GUIMARÃES, Hélio de Seixas. Os leitores de Machado de Assis: o romance machadiano e o público de literatura no século 19. São Paulo: Nankin/Edusp, 2004.
  • HUTCHEON, Linda. Uma teoria da paródia Rio de Janeiro: Edições 70, 1989.
  • LACERDA, Antônio Henrique Duarte. Os padrões das alforrias em um município cafeeiro em expansão (Juiz de Fora, Zona da Mata de Minas Gerais 1844-88). São Paulo: Fapeb/Annablume, 2006.
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  • PORTOCARRERO, Vera. Práticas sociais de divisão e constituição do sujeito. In: RAGO, Margareth; NETO, Alfredo Veiga (Org.). Figuras de Foucault. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.
  • MARCÍLIO, Maria Luiza. História da escola em São Paulo e no Brasil São Paulo: Instituto Fernand Braudel, 2005.
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  • VASCONCELOS, Beatriz Avila. Ciência do dizer bem: a concepção de retórica de Quintiliano em Institutio oratoria, II, II-21. São Paulo: Associação Editorial Humanitas, 2005.
  • 1
    Este texto é decorrente da tese de doutorado Machado de Assis e a crítica à escola de seu tempo: uma ideia de formação nos contos "Um cão de lata ao rabo", "O programa" e "Conto de escola", defendida em 2014 na linha de pesquisa Linguagem e Educação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.
  • 2
    CANDIDO, O direito à literatura.
  • 3
    GLEDSON, Machado de Assis: impostura e realismo. Uma reinterpretação de Dom Casmurro, p. 13.
  • 4
    CHAMON, Trajetória de feminização do magistério: ambiguidades e conflitos, p. 15.
  • 5
    MARCÍLIO, História da escola em São Paulo e no Brasil, p. 46.
  • 6
    Idem, p. 56.
  • 7
    GUIMARÃES, Os leitores de Machado de Assis: o romance machadiano e o público de literatura no século 19, p. 91.
  • 8
    Idem, p. 66.
  • 9
    ASSIS, “História de 15 Dias”, Semana Ilustrada, 15 ago. 1876, apud GUIMARÃES, p. 102.
  • 10
    Entre elas o conto "Umas férias", publicado na coletânea Relíquias de casa velha, de 1906, cuja temática é o primeiro contato da criança com a morte e o cenário da narrativa, a escola. Também trata de escola e de educação o capítulo "Um salto", do romance Memórias póstumas de Brás Cubas, em que o protagonista Brás Cubas rememora os tempos da "enfadonha escola", diz o defunto-autor, onde aprendera a ler, escrever, dar e tomar "cacholetas".
  • 11
    Cf. LACERDA, Os padrões das alforrias em um município cafeeiro em expansão (Juiz de Fora, Zona da Mata de Minas Gerais, 1844-88).
  • 12
    ASSIS, Um cão de lata ao rabo, p. 174.
  • 13
    Idem, p. 175-176.
  • 14
    O asianismo ou estilo asiático, vigente durante o Império de Vespasiano e então chamado de estilo "corrupto" ou anticlassismo, passou a opor-se ao estilo ático, cujo maior representante foi Demóstenes (384 a.C. - 322 a.C.). Considerado um grande orador e contrário aos representantes do estilo asiático, Demóstenes, não obstante utilizasse atributos da eloquência, planejava discursos cuidadosamente, com linguagem simples e acessível e seguindo os fatos narrados um encadeamento direto.
  • 15
    BRANDÃO, Os manuais de retórica brasileiros do século XIX, p. 46.
  • 16
    Idem, p. 45.
  • 17
    Manuais de retórica ou tratados de política eram livros didáticos, suportes pedagógicos com os quais se ensinava literatura, principalmente nos cursos secundários nas escolas brasileiras do século XIX. De acordo com a autora Leyla Perrone-Moisés, no seu O Ateneu: retórica e paixão: os manuais de retórica brasileiros do século XIX, o plano de estudos desses manuais "resumia-se a uma parte introdutória dedicada aos problemas gerais, a distinção entre eloquência e retórica, entre gênio e arte, os fins da eloquência, os atributos do orador, considerações sobre a dignidade do homem enquanto falante, etc.". PERRONE-MOISÉS, O Ateneu: retórica e paixão, p. 43.
  • 18
    VASCONCELOS, Ciência do dizer bem: a concepção de retórica de Quintiliano em Institutio oratoria, II, II-21, p. 14.
  • 19
    Segundo Perrone-Moisés, "o estudo da elocução ocupava a maior parte dos manuais e compreendia a enumeração dos vícios e das virtudes da elocução, os ornamentos, os tropos e as figuras, e, finalmente, os estilos: ático, ródio e asiático. PERRONE-MOISÉS, O Ateneu: retórica e paixão, p. 44.
  • 20
    BRANDÃO, Os manuais de retórica brasileiros do século XIX, p. 55.
  • 21
    A esse respeito o autor Sílvio Romero (apud BRANDÃO, 1988, pBRANDÃO, Roberto de Oliveira. Os manuais de retórica brasileiros do século XIX. In: PERRONE-MOISÉS, Leila (Org.). O Ateneu: retórica e paixão. São Paulo: Brasiliense/Edusp, 1988., p. 57) comenta: "[…] no Brasil, mais ainda do que noutros países, a literatura conduz ao jornalismo e este à política, que no regime parlamentar e até no simplesmente representativo, exige que seus adeptos sejam oradores. Quase sempre as quatro qualidades andam juntas: o literato é jornalista, é orador e é político".
  • 22
    Algumas hipóteses procuram explicar a origem da expressão latina ab ovo – que significa "desde o ovo", "desde a origem". A primeira delas sugere que a expressão ab ovo usque ad mala, que significa literalmente "do ovo à maçã", remete ao modelo de banquete completo da Roma antiga. Em teoria literária, a expressão ab ovo é utilizada para delimitar a narrativa desde o nascimento do protagonista.
  • 23
    Machado de Assis utiliza nestes contos a paródia de um modo muito próximo ao que Linda Hutcheon classifica como paródia moderna: "um jogo irônico, com convenções múltiplas, repetição alargada com diferença crítica. […] Não se trata de imitação nostálgica de modelos passados: é uma confrontação estilística, uma recodificação moderna que estabelece a diferença no coração da semelhança". HUTCHEON, Uma teoria da paródia, p. 19.
  • 24
    "Por vezes são as convenções tanto como as obras individuais que são parodiadas." Idem, p. 25.
  • 25
    ASSIS, Um cão de lata ao rabo, p. 181-2.
  • 26
    LUCAS, O núcleo e a periferia de Machado de Assis, p. 80.
  • 27
    ASSIS, Um cão de lata ao rabo, p. 182.
  • 28
    ASSIS, O programa, p. 273.
  • 29
    Ibidem.
  • 30
    ROCHA, Tonar-se quem se é: educação como formação, educação como transformação, p. 269.
  • 31
    ASSIS, O programa, p. 279.
  • 32
    BOSI, Machado de Assis: o enigma do olhar, p. 85.
  • 33
    ASSIS, O programa, p. 284.
  • 34
    Ibidem.
  • 35
    ROCHA, Tonar-se quem se é: educação como formação, educação como transformação, p. 268.
  • 36
    ASSIS, Conto de escola, p. 97.
  • 37
    Idem, p. 98.
  • 38
    Ibidem.
  • 39
    Idem, p. 100.
  • 40
    Idem, p. 99.
  • 41
    Idem, p. 102.
  • 42
    Idem, p. 104.
  • 43
    Ibidem.
  • 44
    PORTOCARRERO, Práticas sociais de divisão e constituição do sujeito, p. 282.
  • 45
    GLEDSON; GRANJA, Machado de Assis: notas semanais, p. 67.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2016

Histórico

  • Recebido
    26 Abr 2016
  • Aceito
    01 Jul 2016
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