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As primeiras incertezas, o profeta machadiano e o malogro do primeiro livro

The first uncertainties, the machadian prophet and thefailure of the first book

Resumo

O artigo discute aspectos da formação literária de Machado de Assis através da leitura do poema "O profeta", que tematiza o problema da criação literária, e da discussão sobre um livro malogrado de poemas românticos.

Romantismo; Machado de Assis; poesia; livro malogrado

Abstract

The article discusses aspects of the literary education of Machado de Assis through a reading of the poem "The Prophet" that thematizes the problem of literary production and the discussion about a foiled book of romantic poems.

Romanticism; Machado de Assis; poetry; foiled book

O maior prosador brasileiro era antes de tudo um poeta. Fazia ele uma volta sobre si mesmo quando escreveu, no fim da vida, ao jovem amigo Magalhães de Azeredo: "cada idade tem a sua poesia, mas a mocidade é de si mesma a poesia".

Jean-Michel Massa,

A juventude de Machado de Assis

Do poeta maduro às primeiras incertezas

Em 1901, Machado de Assis publicou Poesias completas, reunindo nesse volume as três obras anteriores – Crisálidas (1864), Falenas (1870) e Americanas (1875) – e os poemas, ainda inéditos em livro, de Ocidentais. Embora estivesse no apogeu literário, o aparecimento da coletânea foi acompanhado de alguns ruídos na imprensa, sobretudo os oriundos da contundente crítica feita pelo jornalista e poeta Múcio Teixeira. Como explica Raimundo Magalhães Júnior, Teixeira escreveu cinco extensos artigos para o Jornal do Brasil (20 e 27 de maio; 3, 10 e 17 de junho de 1901) "contra a obra poética de Machado de Assis, em que não reconhecia a menor qualidade ou vocação para tal gênero de literatura", afirmando, entre outras coisas e sem meias palavras, que "há no Sr. Machado de Assis um bom prosador a amparar um medíocre poeta" ou ainda que "sua maneira de poetar é fria e monótona". Na interpretação do biógrafo, o poeta gaúcho tentava se vingar da crítica desfavorável que Machado lhe fizera no ensaio "A nova geração".1 1 Cf. MAGALHÃES JÚNIOR, Vida e obra de Machado de Assis, vol. 4, p. 154-155.

No dia seguinte ao primeiro ataque desferido por Múcio Teixeira, o crítico José Veríssimo, em artigo publicado na "Revista Literária" do Jornal do Comércio, de 21 de maio, e que, mais tarde, seria incorporado ao quarto volume dos Estudos de literatura brasileira (1904), saiu a campo para defender o projeto poético machadiano. Além de observar que "é o Sr. Machado de Assis também um poeta à parte na nossa poesia" e que a "originalidade de seu engenho" devia-se, acima de tudo, à "singularidade de seu temperamento",2 2 VERÍSSIMO, Estudos de literatura brasileira, p. 51. Veríssimo, em conhecida passagem, afirmou que:

[...] como poeta, [Machado de Assis] não foi propriamente romântico, nem propriamente parnasiano, nem propriamente naturalista, e foi simultaneamente tudo isto junto. A cada tendência artística, a cada forma estética, colheu discretamente das flores de beleza que produziram a que se casava com o seu temperamento, usou-lhe sobriamente o perfume, obtendo da sua mistura um novo aroma, delicado e modesto.3 3 Idem, p. 55.

Nesse fragmento, o juízo crítico de José Veríssimo, que obviamente mirava um Machado de Assis maduro e, por assim dizer, já consagrado em vida, afirma com todas as letras que o poeta carioca, como singular marca de seu processo criativo, apropriava-se "discretamente" de eventuais influxos poéticos ligados aos mais diversos momentos literários, sem, no entanto, explicitar qualquer suposta filiação estética.

Além de o ecletismo literário nortear o projeto poético machadiano, é interessante salientar que havia sido do próprio autor a ideia de publicar essa suposta "edição definitiva" das Poesias completas. Em carta de 30 de outubro de 1899 ao editor francês Hippolyte Garnier, que assumira a direção da editora após a morte de seu irmão Baptiste Louis em 1893,4 4 “Instalada no Brasil desde 1844, a livraria Garnier é um exemplo eloquente das novas estratégias do comércio livreiro no movimento internacional de produção e circulação de mercadorias na segunda metade do século XIX, bem como da inserção brasileira nesse circuito de negócios com livros e livrarias. [...] O editor Baptiste Louis manteve sociedade com os irmãos parisienses [Hippolyte, August e Pierre] até 1852, quando assumiu a condição de proprietário exclusivo da então livraria de B. L. Garnier. O rompimento da sociedade não o impediu, contudo, de continuar a imprimir as obras de autores brasileiros em Paris, bem como de comercializá-los e, sobretudo, de vender no Brasil os títulos traduzidos ou no original, publicados pela parisiense Garnier Frères. Com a morte de B. L. Garnier em 1893, a livraria retornou, por direito de herança, a seu irmão Hippolyte, da Garnier Frères.” DUTRA, Impresso no Brasil: dois séculos de livros brasileiros, p. 70-71. Machado de Assis escreve:

Agora, prezado Senhor, tenho algo a propor-lhe. Guardei mais ou menos um volume dos meus últimos versos, impressos em revistas e outras publicações. Por outro lado, pedem-me que faça um só livro das três coletâneas que publiquei com seu saudoso irmão e amigo, e que fazem parte de nosso contrato, Crisálidas, Falenas, Americanas. Minha última coletânea (se eu não encontrar outro título) será Ocidentais. Creio que essas quatro coletâneas poderão fazer um só grande volume, em que toda minha bagagem poética será unificada, especificando as respectivas datas. Que pensa disso? Diga-o, para que eu possa coligir e corrigir a tempo.5 5 ASSIS, Correspondência de Machado de Assis: tomo III, 1890-1900, p. 422.

De antemão, mais do que a republicação dos três primeiros livros, já pertencentes à editora francesa por contrato, juntamente com os poemas de Ocidentais, o que chama atenção na carta é, sem dúvida, a afirmação de que "essas quatro coletâneas poderão fazer um só grande volume, em que toda minha bagagem poética será unificada, especificando as respectivas datas". Por trás do tom algo modesto da proposta – tom, aliás, percebido pelo editor francês que, em sua resposta, afirmou que aceitava "reunir num volume o que o Sr. chama modestamente de sua bagagem poética"6 6 Idem, p. 439. – Machado de Assis pensava, na verdade, em transformar sua última coletânea de poemas numa espécie de despedida simbólica da própria poesia. É o que se infere da leitura do trecho de outra carta, agora ao poeta Carlos Magalhães de Azeredo, de 5 de novembro de 1900, isto é, pouco mais de um ano depois do acerto com o editor francês. De início, Machado de Assis comunica ao amigo que o novo livro já estava no prelo: "já lhe disse que tenho um livro no prelo, e de versos. São todos os que estão por colecionar e mais os colecionados, desde os primeiros anos: Poesias completas". E, em seguida, anuncia o seu intuito de abandonar a poesia para, nos anos que lhe restassem pela frente, dedicar-se somente à prosa:

Creio ou antes estou certo que não darei mais versos. Assim o título definitivo fica ajustado à coleção de todos. Agora só a prosa me prenderá os anos de vida que me restam, e naturalmente irá perdendo com eles a pouca força que tem. Desculpe-me de falar tanto na idade, e alguma vez na morte. Cuido que há de ser assim com todos, ou então é do temperamento melancólico, apenas encoberto por um riso já cansado. [...] A minha fortuna tem sido que me entendam as novas gerações.7 7 Idem, p. 515.

A essa altura da vida, um melancólico Machado de Assis, que morreria em 1908 e ciente de que não daria mais versos, releu sua obra poética com o firme propósito de coligir os poemas que, para ele, deveriam entrar nessa edição definitiva, com o cuidado de não somente se fazer entendido pelas novas gerações como também com o cuidado de tentar demarcar no terreno literário, para leitores e críticos, as linhas mestras do que, em última instância, considerava ser a unificação de sua "bagagem poética". Ou seja, no tempo de maturidade literária, o velho poeta já estava preocupado com o legado que seria deixado por sua obra poética e, sobretudo, com as futuras interpretações da mesma.

Na breve "Advertência" com que abre as Poesias completas, datada de 22 de julho de 1900, e embora tenha feito questão de afirmar que releu os primeiros versos "com saudades", Machado de Assis esclarece que suprimiu "da primeira série algumas folhas; as restantes bastam para notar a diferença de idade e de composição".8 8 ASSIS, Poesias completas, p. V. Apesar do tom igualmente modesto que permeia o texto de abertura, o autor tratou mesmo de expurgar muitos poemas da edição definitiva. No que se refere, por exemplo, ao primeiro livro, Crisálidas (1864), e talvez até rigoroso demais, republicou apenas doze dos vinte e oito poemas que originalmente compunham o livro de estreia literária em poesia. Se, por um lado, tal preocupação, que atingiu – embora em menores proporções – os outros dois livros,9 9 Segundo Ubiratan Machado, na preparação das Poesias completas, Machado de Assis “das obras publicadas, […] conservou cinquenta poemas e suprimiu 26. As Crisálidas foram o volume mais expurgado. Dos 28 trabalhos que compõem a primeira edição, foram reeditados doze, sendo abandonado ainda o prefácio de Caetano Filgueiras. Dos 35 poemas das Falenas, restaram 26. Das Americanas foram aproveitados doze poemas, sendo suprimida apenas a ‘Cantiga do Rosto branco’”. MACHADO, Dicionário de Machado de Assis, p. 268. revela um elevado rigor estético para com a posteridade de sua obra poética; por outro, notadamente por pesar a mão sobre o primeiro livro, também revela o explícito desejo de "sumir" com alguns poemas, sobretudo os de primeira lavra.

Na verdade, para Jean-Michel Massa, a constante insatisfação de Machado de Assis com seus versos constitui-se, por assim dizer, num traço inerente ao seu trabalho poético. A "autocrítica vigilante" – a expressão é do crítico francês –, que implicava o processo contínuo de julgar o passado e cortar incisivamente, vinha de longe. À guisa de exemplo, na própria preparação de Crisálidas, "dos sessenta e tantos poemas anteriores a 1860, só aproveitou um, e ainda assim transformado", trata-se do poema dedicado a Monte Alverne. "Entre a vintena de poesias dos anos 1860 a 1863, tomou apenas seis, retiradas às obras publicadas; onze se contarmos os textos inéditos". Em resumo, "das 22 peças originais de Crisálidas, deixam-se de lado as seis traduções; muitas delas são inéditas ou publicadas pouco antes".10 10 MASSA, A juventude de Machado de Assis, p. 327. Ainda nas palavras do crítico francês, num jovem poeta, "essa procura de certa perfeição é comovedora", pois:

Como um joalheiro, Machado de Assis cortava e emendava suas poesias. Suprimia ou anulava. O momento presente exprimia um progresso estético sobre o passado. O escritor aceitava haver mudado, envelhecido, evoluído, pois seus poemas de ontem perderam uma parte da vida.11 11 Idem, p. 328.

Aliás, a "procura de certa perfeição" já estava presente em Crisálidas. Na carta posfácio em resposta ao prefácio "O poeta e o livro" do Dr. Caetano Filgueiras, o jovem Machado de Assis, creditando o principal motivo da escolha dos poemas à falta de tempo, explicou sua opção pelos mais recentes:

Não incluí neste volume todos os meus versos. Faltou-me o tempo para coligir e corrigir muitos deles, filhos das primeiras incertezas. Vão porém todos, ou quase todos de recente data. Se um escrúpulo de não acumular muita coisa sem valor me não detivesse, este primeiro volume sairia menos magro do que é. Entre dois inconvenientes preferi o segundo.12 12 ASSIS, Crisálidas, p. 163.

Se o método de trabalho vinha desde Crisálidas, no caso de Poesias completas há ainda o traço distintivo, e talvez agravante, de que, para o autor, esta seria sua última obra poética. Ou seja, ao atingir a maturidade literária, qualquer escritor, mais dia menos dia, acaba por se ver frente a frente com a questão da possível ressonância literária que será deixada por sua obra. Regida por padrões estéticos e/ou subjetivos, a escolha de determinados textos em detrimento de outros é, no fundo, uma tentativa de interferir na posterior apreciação e valoração crítica dos mesmos.

Ainda que obviamente se reconheça o pleno direito de Machado de Assis (ou de qualquer outro autor) na escolha dos textos literários que, para ele, sejam considerados os melhores representantes de sua "bagagem poética", aqui, no entanto, o problema é outro. Pois, para se pensar a importância de qualquer escritor numa determinada literatura, além obviamente do estudo das obras que o consagraram no tempo, também é preciso levar em conta o percurso de formação literária, incluindo tanto as obras consideradas menores quanto as eventuais influências estéticas, já que estas podem contribuir de alguma forma para o melhor entendimento de seu projeto literário.

E o caso do poeta Machado de Assis não poderia ser diferente. Apesar da ainda recorrente desconfiança da crítica literária sobre a qualidade de sua poesia, gerada, sobretudo, pelo posterior lugar-comum da comparação sempre desfavorável em relação à prosa, que levou, por exemplo, Manuel Bandeira a afirmar que o "Machado de Assis poeta tornou-se uma vítima de Machado de Assis prosador",13 13 BANDEIRA, Machado de Assis: Obra completa, vol. III, p. 11. o problema da existência de supostas influências literárias na fatura poética machadiana mantém-se vivo. Em outras palavras, se a tese de José Veríssimo sobre a peculiar independência criativa acerta em cheio no poeta maduro, quando se mira o jovem Machado de Assis, que era poeta por excelência, a mesma tese não dá conta do problema, pois, nesse momento de formação literária, notadamente entre os anos de 1854 e 1860, tempo "das primeiras incertezas", é possível, por razões óbvias, constatar que o moço poeta, ainda imaturo, foi mais sujeito a influxos estéticos, sobretudo românticos.

Influxos românticos

Quando Machado de Assis apareceu na cena literária local em meados da década de 1850, a literatura brasileira era, como se sabe, dominada pela estética romântica. No que se refere à poesia, Gonçalves de Magalhães e Gonçalves Dias ainda disputavam palmo a palmo a primazia do lugar de honra nas letras locais, sobretudo pela ressonância social da novidade indianista que cuidava de dar foros de nacionalidade à literatura brasileira. Ainda nesse mesmo período, quando do aparecimento do primeiro volume das obras de Álvares de Azevedo que trazia os poemas da Lira dos vinte anos (1853),14 14 Cf. AZEVEDO, Obras de M. A. Álvares de Azevedo (Poesias, vol. 1). a poesia romântica local conheceu um momento deveras interessante de inflexão estética que introduziu novos temas na ordem do dia. Entre outros aspectos, ao expressar traços mórbidos da vida, Azevedo acabou por adotar "o byronismo como uma tendência legítima para a literatura brasileira em oposição ao nacionalismo literário vigente".15 15 CUNHA, O belo e o disforme, p. 127.

Aliás, muito tempo depois, Machado de Assis, num discurso pronunciado por ocasião do lançamento da pedra fundamental da estátua de José de Alencar e publicado no dia seguinte, isto é, em 13 de dezembro de 1891, no jornal Gazeta de Notícias, além obviamente de louvar a influência de Alencar na sua obra em prosa, relembra também o impacto dos poetas românticos – notadamente Gonçalves Dias e Álvares de Azevedo – em sua adolescência literária:

Quando entrei na adolescência, fulgiam os primeiros raios daquele engenho [Alencar]; vi-os depois em tanta cópia e com tal esplendor que eram já um sol, quando entrei na mocidade. Gonçalves Dias e os homens de seu tempo estavam feitos; Álvares de Azevedo, cujo livro era a boa nova dos poetas, falecera antes de revelado ao mundo. Todos eles influíam profundamente no ânimo juvenil que apenas balbuciava alguma coisa; mas a ação crescente de Alencar dominou as outras.16 16 ASSIS, Machado de Assis: crítica literária e textos dispersos, p. 579-580.

Além de Gonçalves Dias e Álvares de Azevedo, para ficar somente nos poetas, outro personagem importante para a formação literária do primeiro Machado foi, sem dúvida, Almeida Garrett. Numa outra crônica em homenagem ao centenário de nascimento do escritor português, também publicada na Gazeta de Notícias, em 1899, o escritor não apenas reconhece a importância de Garrett (e novamente de Alencar) como também voltou a se referir aos dois poetas brasileiros:

Nem só éramos moços, éramos ainda românticos; cantava em nós a toada de Gonçalves Dias, ouvíamos Alencar domar os mares bravios da terra, naquele poema em prosa que nos deixou, e Álvares de Azevedo era o nosso aperitivo de Byron e Shakespeare. De Garrett até as anedotas nos encantavam.17 17 Idem, p. 677-678.

No entanto, anterior à tríade de autores (Dias, Azevedo e Garrett), já consagrada e plenamente reconhecida pelas respectivas tradições literárias, e ainda no tempo em que "nem só éramos moços, éramos ainda românticos", encontra-se outro e desconhecido poeta: Francisco Gonçalves Braga (1836-1860). Como já salientou Jean-Michel Massa, Braga – mestre e amigo – foi a primeira influência poética sobre o jovem Machado, "um exemplo imitado, copiado e, digamos a palavra certa, plagiado".18 18 MASSA, cit., p. 111. O crítico francês, esforçando-se para relativizar a influência do poeta português, ainda observou que:

Qualquer versificador teria representado o mesmo papel, atuando como uma espécie de catalisador. Mas foi por intermédio de Braga que Machado de Assis estabeleceu contato com todo um patrimônio poético. Infelizmente era um autor medíocre, um versejador desajeitado que devolvia, como um eco, os sons dos versos que estavam na moda.19 19 Idem, p. 113.

A despeito da opinião reticente do crítico francês, não se pode menosprezar de todo esta influência literária, pois, no início da carreira, Machado de Assis praticamente gravitou em torno de Gonçalves Braga. Conheceram-se ao longo do segundo semestre de 1854, pouco depois da chegada do português ao Rio de Janeiro. A partir de setembro de 1854, Braga começou a mandar versos para o Periódico dos Pobres20 20 Entre setembro e dezembro de 1854, Francisco Gonçalves Braga publicou cinco poemas no Periódico dos Pobres: “Soneto”; “Quem sou eu?”; “O mendigo”; “Paródia” e “Amor e traição”. Cf. BRAGA, Periódico dos Pobres, n. 96, p. 3; n. 99, p. 4; n. 103, p. 4; n. 107 e 108, p. 6; n. 133 e 134, p. 5-6. e foi possivelmente por seu intermédio que Machado de Assis conseguiu publicar nesse mesmo periódico seu primeiro poema ("Soneto à Ilma. Sra. D. P. J. A."), uma vez que não parece ser o caso de mera coincidência histórica que, logo abaixo do soneto machadiano, viesse impresso o poema "O mendigo", de Braga.21 21 Cf. Periódico dos Pobres, n. 103, p. 4 Poucos meses depois, a partir de novembro de 1854, o poeta português passou a colaborar na Marmota Fluminense, o que, inclusive, levanta a possibilidade de Machado de Assis ter sido apresentado a Francisco de Paula Brito também por intermédio de Braga. Nesse sentido, para ficar em dois exemplos simbólicos, basta lembrar que os dois primeiros poemas publicados pelo jovem Machado na Marmota Fluminense foram justamente "Ela", com epígrafe de Braga,22 22 A epígrafe diz o seguinte: “Nunca vi, – não sei se existe/ Uma deidade tão bela,/ que tenha uns olhos brilhantes/ Como são os olhos dela!” / F. G. Braga. Cf. ASSIS. Marmota Fluminense, n. 539, p. 4. e "A palmeira", dedicado a Braga,23 23 O poema “A palmeira” está datado de “Rio de Janeiro, 6 de janeiro de 1855” com a seguinte dedicação “O. D. C. a Francisco Gonçalves Braga”. Cf. ASSIS. Marmota Fluminense, n. 540, p. 4. ambos em janeiro de 1855. Enfim, poeta de um livro só, o português ainda publicaria em 1856 o livro Tentativas poéticas, que incluía o poema "A um jovem poeta", dedicado a Machado de Assis.24 24 BRAGA, Tentativas poéticas, p. 213-214. Além deste último, entre novembro de 1854 e janeiro de 1856, Braga publicou outros seis poemas na Marmota Fluminense, de Paula Brito.25 25 Os sete poemas de Francisco Gonçalves Braga na Marmota Fluminense, incluindo-se o dedicado a Machado, foram os seguintes: “Soneto a Charton”, “Ode”, “Saudades de Pernambuco”, “Saudação poética ao Sr. Conselheiro António Feliciano de Castilho”, “Ao Sr. J. M. M. D’Assis (em resposta), “Vida e Morte (Meditação)” e, por fim, outro “Soneto a Charton”. Cf. BRAGA, Marmota Fluminense, n. 523, p. 1; n. 525, p. 2; n. 534, p. 2-3; n. 587, p. 3; n. 636, p. 4; n. 644, p. 1; n. 672, p. 1.

Como incansável editor dedicado à divulgação da arte literária no Brasil, e mais notadamente das obras dos autores locais, Francisco de Paula Brito sempre procurou abrir espaços generosos em seus jornais para os jovens talentos. Em setembro de 1849, no editorial de abertura de A Marmota da Corte (1849-1853), primeiro nome do jornal, Paula Brito já conclamava os jovens a enviarem suas contribuições, rogando tanto "à bela rapaziada desta cidade (que tanta viveza tem), que remetam à tipografia notícias interessantes que eu publicarei, e basta só dar o tema que eu farei o sermão", quanto, e sobretudo, "[a]os que tiverem veia poética mandem todas as poesias que fizerem, ainda meio incorretas que eu as corrigirei".26 26 A Marmota da Corte, n. 1, p. 1. Como esta postura de "mecenas literário" do editor acabou por se tornar regra geral na história das "marmotas", não é de se estranhar nem um pouco que, "com veia poética", Machado de Assis tenha sido um dos muitos jovens que se apressaram em atender ao pedido de Paula Brito, enviando-lhe poemas e mais poemas. Desse modo, neste momento de iniciação literária, o jovem poeta, além de publicar, de forma esparsa, poemas no Diário do Rio de Janeiro, no Correio Mercantil, no jornal O Paraíba, no Jornal do Comércio e na revista O Espelho, publicou, de longe, o maior número de versos na Marmota Fluminense (1853-1857) e, finalmente, em A Marmota (1857-1864).27 27 Para a relação dos poemas que Machado de Assis publicou nos jornais de Paula Brito, ver: SOUSA, Bibliografia de Machado de Assis, 1955, e MASSA, Dispersos de Machado de Assis, 1965.

Paula Brito não apenas abria espaço em suas "marmotas" para os jovens autores, como também os acolhia na famosa Sociedade Petalógica. Como sugere Jean-Michel Massa, "em certo sentido, a Marmota Fluminense e a Petalógica eram as duas faces da mesma realidade".28 28 MASSA, A juventude de Machado de Assis, cit., p. 85. O próprio Machado, em crônica de 1864 em que comenta a segunda edição do livro de José Antônio da Silva, rememoraria que:

Este livro é uma recordação, é a recordação da Petalógica dos primeiros tempos, a Petalógica de Paula Brito, [...], onde ia toda a gente, os políticos, os poetas, os dramaturgos, os artistas, os viajantes, os simples amadores, amigos e curiosos, onde se conversava de tudo, desde a retirada de um ministro até a pirueta da dançarina da moda, onde se discutia de tudo, […], verdadeiro campo neutro onde o estreante de letras se encontrava com o conselheiro.29 29 Apud idem, p. 87.

De todo modo, naqueles tempos da Petalógica de Paula Brito, uma questão que devia atormentar qualquer "estreante de letras", incluindo obviamente o jovem Machado, era a premente necessidade de enfrentar as muitas incertezas teóricas que, desde sempre, rondam a fatura do texto literário. Em outras palavras, foi nesse ambiente literário que Machado de Assis começou a pensar no problema da criação poética, seja explicitando seu precoce pensamento crítico em prosa,30 30 No dia 10 de junho de 1856, ou seja, a onze dias de completar dezessete anos, Machado de Assis publicou o seu primeiro texto em prosa no jornal de Paula Brito. Sob a rubrica de “Ideias vagas”, o jovem autor escolheu como tema de estreia justamente a poesia. Cf. ASSIS. Marmota Fluminense, n. 731, p. 2-3. seja através da publicação sistemática de poemas na Marmota Fluminense. Para exemplificar aqui como esse problema foi tratado literariamente pelo poeta, veja-se, a seguir, a breve leitura de "O profeta", publicado em 2 de novembro de 1855.

O profeta romântico

Datado de 11 de setembro de 1855, "O profeta", que trazia logo abaixo do título a expressão "fragmento", tematiza a figura romântica do profeta bíblico. Da mesma forma que o poeta, o profeta intenta mediar (revelando) as relações entre os homens e os mistérios de Deus, inacessíveis a esses mesmos homens. Como adentra numa realidade inacessível e, inclusive, superior ao seu próprio entendimento, o profeta, para traduzir o que vê, deve necessariamente lançar mão de uma linguagem simbólica e poética, cuja força metafórica resida justamente numa espécie de duplo poder: o de explicitar os significados de tais visões e o de levar os eventuais leitores a refletirem sobre a importância de tais significados. É, portanto, dentro dessa mesma perspectiva romântica que se insere o poema do jovem Machado. Veja-se o texto:

O profeta31 31 ASSIS, Marmota Fluminense, n. 644, p. 3.

(fragmento)

.......................... ungido crente,

Alma de fogo na mundana argila

M. A. A. Azevedo.

Em sacro templo, sobre as negras ruínas

Lá medita o profeta

Com fatídica voz, dizendo aos povos

Os decretos de um Deus;

Ao rápido luzir do raio imenso

Traçando as predicações.

Dos soltos furacões, libertas asas

Adejam sobre a terra;

Do sacro templo em denegridos muros

Horríssono gemendo

Lá fende o seio de pesadas nuvens

O fulminoso raio

Sinistro brilho, que o terror infunde.

Que negro e horrível quadro!

Propínquo esboço de infernal morada!...

.............................................................

E o profeta ergue a fronte, a fronte altiva

Cheio de inspiração, de vida cheio;

Revolvem-se na mente escandecida

Inspiradas ideias que Deus cria

Nesse cofre que encerra arcanos sacros;

Revolvem-se as ideias, pensamentos

Que num lampejo abrangem as idades

Rápidas aglomeradas

Nesse abismo que os séculos encerra!

Profeta, em que meditas,

O espírito de Deus que te revela?

Um novo cataclismo,

Que a terra inunde e a humanidade espante?

De guerras sanguinosas longa série?

A desgraça talvez dum povo inteiro?

Enviado de Deus; conta-me os sonhos

Que te revelam do futuro as sortes

Quando absorto em sacros pensamentos

A fronte reclinando tu dormitas

Essas visões que à hora do silêncio

Quando reina o pavor, e as trevas reinam

Os caos insinuam qu'o porvir revelam:

E quando é bela a noite, quando brilha

A prateada lua

Lâmpada argêntea, que alumia as trevas

Que fulguram meigos

Formosos, belos astros, que semelham

Longa série de luzes

Que a lousa aclaram de sepulcro imenso:

O que te inspira o céu?

.............................................................

Já sossega a tormenta; – refreados

Jazem mudos os ventos; só a brisa

Plácida expele as condensadas nuvens;

Envolta em negro véu lá brilha acaso

Medrosa estrela que sorri medrosa:

'Stá muda a atmosfera! Lá se ergue

De súbito o profeta, (sacra gota

Na mente lhe vertem do Eterno a destra).

Do Supremo Arquiteto o mando grava

No extenso muro do arruinado templo!..

A epígrafe...

De imediato, salta aos olhos a epígrafe do poema machadiano, pinçada no poema "Ideias íntimas", de Álvares de Azevedo, publicado apenas havia dois anos na Lira dos vinte anos (1853). Evidentemente, além de tal fato sugerir um primeiro movimento de aproximação e diálogo com a obra do poeta ultrarromântico, a justeza da escolha amplifica seu significado, sobretudo quando se percebe que o trecho escolhido pelo jovem Machado de Assis é, na verdade, uma referência direta ao escritor francês Lamennais. Como se sabe, "Ideias íntimas" é um longo poema de catorze estrofes irregulares e que, segundo Mário de Andrade, talvez seja "o que [Álvares de Azevedo] fez de maior em poesia".32 32 ANDRADE, Aspectos da literatura brasileira, p. 242. No poema, além de reconstruir poeticamente as angústias e medos de seu cotidiano de estudante, o jovem autor paulista apresenta ao leitor suas principais afinidades literárias. Na quinta estrofe, refere-se explicitamente ao escritor e religioso francês:

Aquele é Lamennais – o bardo santo

Cabeça de profeta, ungido crente,

Alma de fogo na mundana argila

Que as harpas de Sion vibrou na sombra,

Pela noite do século chamando

A Deus e à liberdade as loucas turbas.33 33 AZEVEDO, Obra completa, p. 205.

Na epígrafe, Machado de Assis, ao sobrevalorizar a figura de Lamennais – o "bardo santo" azevediano –, antecipa e, ao mesmo tempo, eleva o tom romântico que permeará o corpo do poema, notadamente por intensificar de antemão a imagem poética do profeta. Dentro do Romantismo francês, Lamennais ocupa não apenas um lugar singular, mas também, por sua postura literária, acabou por ser igualmente reconhecido como uma espécie de profeta solitário. A evolução do seu pensamento religioso vai do primeiro e explícito desejo de pregar uma contrarrevolução às mudanças ocasionadas pela Revolução Francesa, sobretudo no que tange à efetiva perda de poder da Igreja Católica na França, até as fronteiras imprecisas de um humanismo laico que, inclusive, terá ressonância direta na formação do pensamento socialista ao longo do século XIX. No entanto, mais que propriamente os desdobramentos teóricos das ideias político-sociais do religioso francês, o que de fato importa, no contexto do poema machadiano, é sem dúvida a reiteração do lugar-comum, inerente à tradição literária romântica, que reproduz a implícita relação metafórica entre a imagem do profeta bíblico e a imagem do poeta romântico.

e o poema

De início, chama a atenção o fato de Machado de Assis ter reproduzido, à maneira de subtítulo, a palavra "fragmento". Para o pensamento romântico, a noção de fragmento transformou-se numa prática literária que desafiava a noção de unidade e totalidade clássica. Do ponto de vista romântico, a criação artística – observa Anatol Rosenfeld – "por mais imperfeita que seja, na perspectiva das regras clássicas, será sempre a grande obra, porque exprime o estado de exaltação do criador com toda sinceridade, fato que constitui o valor máximo nesse sentido".34 34 ROSENFELD, O romantismo, p. 267. Desse modo, o caráter fragmentário, inerente ao eu romântico, impõe-se através da própria expressão literária, uma vez que "realizaria também a utopia de um gênero único, capaz de conciliar diferenças entre narrativa, drama e lírica numa única forma, totalidade e unidade enquanto tal".35 35 FERRAZ, Dicionário do romantismo literário português, p. 193-194. Nessa perspectiva, para justificar e ao mesmo tempo acentuar a ideia de fragmento literário, o jovem poeta organizou formalmente o poema de cinquenta e cinco versos, marcados por evidente variação métrica, numa única estrofe, que, no entanto, em função do uso estratégico de reticências, pode ser subdividida em três estrofes irregulares de quinze, trinta e dez versos respectivamente.

Em tom algo elevado, o eu lírico machadiano não apenas se preocupa com a construção da imagem simbólica do profeta/poeta, apropriando-se de uma temática inerente ao universo romântico, como de certa forma também discute o papel e o lugar do poeta na sociedade. Na primeira estrofe, tendo apropriadamente um lugar sombrio como pano de fundo, vê-se a descrição de uma cena, isto é, vê-se o profeta sobre "negras ruínas" a meditar solitário num "sacro templo" em meio a uma tempestade noturna, para, com "fatídica voz", dizer aos povos "os decretos de Deus". Nessa estrofe, além da referência à solidão em si, que reforça sua condição de apartado da sociedade, o profeta é reconhecido como o porta-voz dos desígnios de Deus.

Na segunda estrofe, o eu lírico "aproxima-se" do profeta, focando inicialmente sua "fronte", querendo, num primeiro momento, expressar de algum modo o instante da própria inspiração poética:

E o profeta ergue a fronte, a fronte altiva

Cheio de inspiração, de vida cheio;

Revolvem-se na mente escandecida

Inspiradas ideias que Deus cria

Nesse cofre que encerra arcanos sacros;

Revolvem-se as ideias, pensamentos

Que num lampejo abrangem as idades

Rápidas aglomeradas

Nesse abismo que os séculos encerra!

E, num segundo momento, dirigindo-se a ele – "Profeta, em que meditas" – indaga-o então sobre os possíveis vaticínios revelados por Deus:

Enviado de Deus; conta-me os sonhos

Que te revelam do futuro as sortes

Quando absorto em sacros pensamentos

A fronte reclinando tu dormitas

O profeta, no entanto, mantém-se em silêncio, enquanto o eu lírico, descrevendo a beleza da noite e o aparecimento da "prateada lua", questiona-o novamente sobre o que lhe "inspira o céu?". Por fim, na terceira estrofe, quando "já sossega a tormenta", o profeta se ergue de súbito e, ao invés de "falar", apenas grava no "extenso muro do arruinado templo" suas palavras, que, no entanto, não são reveladas.

À primeira vista, o final abrupto do poema, que sintomaticamente também termina em reticências, reforçando o seu caráter fragmentário, frustra o leitor. Entretanto, tal final sugere que, para o jovem Machado, o cerne do problema não estava na suposta revelação do profeta, mas, ao contrário, estava mesmo na tentativa de apreensão do instante em si da criação poética. Enfim, além de demarcar a marginalização social do profeta/poeta, a importância do poema está no fato simbólico de salientar um dos aspectos essenciais da crença romântica de então conferir à poesia uma dimensão especial, a crença de que, antes de tudo, ela seria, intermediada pela capacidade de sentir do profeta/poeta, a própria expressão da vontade divina.

O malogro do Livro dos vinte anos

Entre 1858 e 1860, aconteceu um fato singular na vida literária de Machado de Assis e que não foi percebido, ao que tudo indica, pelos olhares atentos de seus principais biógrafos: nesse mesmo período, ele intentou publicar aquele que poderia ter sido o seu livro de estreia na literatura brasileira. Afinal de contas, seria algo natural que, a exemplo do amigo Francisco Gonçalves Braga e suas Tentativas poéticas em 1856, o jovem Machado, como qualquer poeta iniciante no mundo das letras, também desejasse publicar seus primeiros versos em livro.

Como já se mostrou, entre 1854 e 1860, a produção literária do jovem Machado de Assis, sobretudo a poética, além de imatura, era muito influenciada pelo ideário romântico, o que, por consequência lógica, indicaria que essa primeira e desejada recolha de textos deveria necessariamente ser formada por poemas do mesmo período. Nessa perspectiva, o primeiro indício, a respeito dessa coletânea machadiana, apareceu numa breve nota, publicada nas "Notícias Diversas" do jornal Correio Mercantil, no dia 20 de agosto de 1858. Diz a nota:

Mais um volume de versos se anuncia, e podemos já dizer mais um poeta se vai revelar.

Modesto e muito jovem são, além de felizes inspirações, qualidades bastantes para recomendarem o nome do Sr. Machado de Assis, autor do livro cuja publicação se nos anuncia.36 36 Correio Mercantil, n. 225, p. 1.

Se, por um lado, apesar de sugerir alguma expectativa em torno da possibilidade de que "mais um poeta se vai revelar", essa primeira nota, a rigor, não esclarece lá muita coisa, apenas menciona o anúncio de "mais um volume de versos" do "modesto e muito jovem [...] Sr. Machado de Assis", sem, no entanto, explicitar maiores detalhes da suposta publicação. Por outro, o teor de uma segunda nota, publicada quase um ano e meio depois também nas "Notícias Diversas" do Correio Mercantil, em 19 de janeiro de 1860, vai um pouco mais longe, revelando, inclusive, o título da referida obra: Livro dos vinte anos, o que, de modo evidente, e a exemplo da epígrafe de "O profeta", sugere mais um indício de diálogo poético com a famosa de nascença Lira dos vinte anos, de Álvares de Azevedo.37 37 Outro possível diálogo com Álvares de Azevedo estaria na coincidente publicação em A Marmota, em 30 de março de 1860, de algumas cenas de uma “fantasia em um ato”, intitulada Odisseia dos vinte anos. Trata-se de um fragmento dialogado entre Luís, pintor e poeta, e Álvaro, em que, segundo Jean-Michel Massa, “o desejo de ser amado [do primeiro] se mistura à tristeza de nunca tê-lo sido”. Cf. A Marmota, n. 1147, p. 3, e Cf. MASSA, A juventude de Machado de Assis, p. 275-276. Veja-se a nota:

Vai publicar-se uma coleção de versos com o título de Livro dos vinte anos.

O autor é um moço que enceta apenas a carreira das letras.

Talento viçoso e original, o Sr. Machado de Assis promete mais um poeta e um prosador distinto no país.

Nas poesias ligeiras ou ensaios de prosa que tem publicado até hoje, revela o Sr. Assis qualidades notáveis que recomendam o seu nome.

O público receberá sem dúvida o seu livro como merece o talento do autor, que tem tanto de real como de modesto. Na atualidade é uma associação rara.38 38 Correio Mercantil, n. 19, p. 1.

Nessa segunda nota, as coisas mudam de figura, pois, além do título, as outras informações indicam com mais precisão que o projeto do primeiro livro de poemas de Machado de Assis parecia mesmo progredir, o que, inclusive, pode ser corroborado tanto pela afirmação peremptória de que "vai publicar-se uma coleção de versos" quanto pelo precoce reconhecimento de que "nas poesias ligeiras ou ensaios em prosa [...], revela o Sr. Assis qualidades notáveis que recomendam o seu nome".

Por fim, e muito mais importante, reforçando o evidente progresso da edição do Livro dos vinte anos e ainda com o detalhe adicional de aparecer apenas um mês depois da nota anterior do Correio Mercantil, surgiu na história desse primeiro livro de Machado de Assis um outro e significativo anúncio – que, até onde se pôde averiguar, foi publicado apenas e tão somente uma única vez – agora no jornal Correio da Tarde, em sua edição de 20 de fevereiro de 1860. Sem sombra de dúvidas, a grande novidade está nas surpreendentes revelações de tal anúncio, que tanto convidava os eventuais leitores a encomendarem o novo livro pelo sistema de assinatura – "Assina-se nas lojas de costume" – quanto, além de estimar o número de páginas e o preço, afirmava com todas as letras que o mesmo estava em processo de impressão na tipografia do Sr. Paula Brito. Veja-se o anúncio:

Livro dos Vinte anos por Machado de Assis

Um volume de 200 a 240 páginas; 2$

Assina-se nas lojas de costume e na tipografia do Sr. Paula Brito, onde é impresso.39 39 Correio da Tarde, n. 39, p. 3.

Diante da surpresa, que obviamente permeia esse anúncio do Correio da Tarde,40 40 Abaixo do anúncio do livro, vinha outro de A Marmota, referindo-se ao “Sr. Machado de Assis” como um “moço de grandes esperanças, de muito futuro”. Cf. Idem. a pergunta que, de imediato, se apresenta ao crítico é: o que teria acontecido com essa malograda coletânea de poemas? Ainda que o anúncio em si não seja garantia de verdade histórica, é importante destacar que, nele, afirma-se literal e assertivamente que o Livro dos vinte anos "é impresso" na tipografia do Sr. Paula Brito. Dessa forma, como ainda não se encontraram – exceto, é claro, a nota citada e o próprio anúncio – outras informações que confirmem a existência desse primeiro livro de Machado de Assis, nem sobre um eventual lançamento, nem sobre quaisquer repercussões que viessem a se transformar numa hipotética recepção crítica, é possível afirmar, com alguma margem de segurança, que a publicação do livro não foi levada a termo. Assim, diante do silêncio da imprensa, configuram-se naturalmente ao menos duas possíveis hipóteses: ou teria faltado o número necessário de assinantes para cobrir os custos de impressão do livro ou então o jovem poeta teria, ele mesmo, desistido da empreita.

Apesar de a evidente escassez de informações sobre esse malogrado livro dificultar a busca de respostas e, ao mesmo tempo, levando-se em conta o grande apreço que o "mecenas" Paula Brito tinha pelos novos autores, e sobretudo pelo jovem Machado de Assis,41 41 Na mesma edição do Correio da Tarde em que aparece o anúncio do livro foi antecipada na coluna “Notícias e Avisos Diversos” uma “Declaração” que sairia no dia seguinte em A Marmota: “Temos o prazer de anunciar aos nossos leitores que o Snr. – Machado de Assis – faz hoje parte da colaboração da Marmota”. Essa declaração pública de Paula Brito nos dois periódicos sobre a colaboração de Machado de Assis, além de louvar o jovem escritor, reforçava obviamente a própria publicidade do Livro dos vinte anos. Nesse mesmo sentido, e já no mês seguinte, em outro anúncio – “Lede a Marmota” – publicado no Correio Mercantil, a colaboração de Machado na revista de Paula Brito seria mais uma vez destacada: “O Sr. Machado de Assis, cuja pena é bem conhecida e melhor conceituada, é ainda um de seus principais colaboradores”. Cf. Correio da Tarde, n. 39, p. 2-3; Cf. A Marmota, n. 1136, p. 1, e Cf. Correio Mercantil, n. 89, p. 4. apostar na segunda hipótese não seria nenhum despropósito. Em outras palavras, se se considerar o rigor da "autocrítica vigilante", que, como se mostrou, Machado usaria na escolha dos poemas de Crisálidas, aproveitando, entre os anteriores a 1860, isto é, entre os poemas românticos, somente o dedicado a Monte Alverne, talvez não seja mesmo arriscado afirmar que o jovem poeta tenha desistido de publicar seus poemas românticos em livro.

O consequente abandono dos primeiros versos talvez possa ser explicado por outro motivo: a então crescente preocupação de Machado de Assis com o teatro, que, como ele mesmo já havia observado no segundo texto em prosa publicado na Marmota Fluminense em 1856, "era o verdadeiro meio de civilizar a sociedade e os povos".42 42 ASSIS, Marmota Fluminense, n. 753, p. 1-2. Pouco mais adiante, além de realizar várias traduções – ou imitações, como se dizia na época – de peças teatrais a partir de 1857,43 43 Para detalhes sobre as peças traduzidas por Machado de Assis, ver: FARIA, Machado de Assis – Tradutor de teatro, p. 48-68. essa nova preocupação com a dramaturgia também poderia ser exemplificada, sobretudo a partir de meados de 1859, através dos muitos textos que o jovem autor publicou sobre o assunto e resultantes do intenso trabalho crítico na revista O Espelho, seja pela precoce reflexão teórica sobre o gênero ("Ideias sobre o teatro I e II"), seja pelas dezoito crônicas da "Revista de Teatros",44 44 Os dois artigos “Ideias sobre o teatro” I e II foram publicados em 25 de setembro e 2 de outubro de 1859. Já as “Revistas de Teatro” foram publicadas a partir do segundo número de O Espelho, a primeira em 11 de setembro de 1859, e a última em 8 de janeiro de 1860. Cf. ASSIS, O Espelho. e que, entre outros aspectos, e em detrimento da então predominante escola romântica de teatro, revelam a sua preferência pela estética teatral realista.45 45 Cf. FARIA, Teatro de Machado de Assis, p. IX-XXX.

Por fim, nessa mesma perspectiva, e de modo algo sintomático, o jovem Machado de Assis, ao longo do ano de 1861, finalmente conseguiria estrear em livro na literatura brasileira. Mas, ao invés de poesia, publicou nada menos que duas peças de teatro: Queda que as mulheres têm para os tolos, que, conforme anunciava A Marmota de 4 de junho, era uma "pequena obrinha, traduzida pelo Snr. Machado de Assis",46 46 Cf. A Marmota, n. 1270, p. 4. e, apenas três meses depois,47 47 Em 17 de julho de 1861, uma nota nas “Notícias Diversas” do Correio Mercantil informava que: “acha-se no prelo em casa do Sr. Paula Brito a peça dramática Desencantos, do Sr. Machado de Assis. / O nome do autor é garantia da obra. Subscreve-se em casa do Sr. Paula Brito, Pinto & Comp. e Waldemar”. Correio Mercantil, n. 194, p. 1. a fantasia dramática Desencantos,48 48 No dia 4 de setembro de 1861, o aparecimento do livro foi noticiado tanto pelo Jornal do Comércio – “O Sr. Machado de Assis acaba de publicar uma fantasia dramática, como ele mesmo a chama, com o título de Desencantos. É um quadro de costumes da época, que, tanto quanto por uma rápida leitura nos foi possível avaliá-lo, não deslustra por certo o nome de seu autor” –, quanto pelo Diário do Rio de Janeiro – “Acaba de sair à luz uma fantasia dramática do Sr. Machado de Assis, intitulada: Os Desencantos [sic]”. Além disso, em 15 de setembro, um longo excerto da peça (Segunda parte, cena VII) apareceria traduzido em francês nas páginas do jornal Courrier du Brésil, semanário editado no Rio de Janeiro. Cf. Jornal do Comércio, n. 245, p. 1; Cf. Diário do Rio de Janeiro, n. 242, p. 1, e Cf. MASSA, Machado de Assis e a crítica internacional, p. 243-252. ambas editadas pela mesma tipografia do malogrado Livro dos vinte anos, ou seja, a tipografia do "mecenas" Francisco de Paula Brito.

À guisa de fechamento

Ainda hoje, quando a crítica literária se propõe a estudar algum aspecto específico da obra multifacetada de Joaquim Maria Machado de Assis, que é marcada tanto pela pluralidade de gêneros tratados quanto pela extensão em si, a possibilidade de eventuais surpresas ao longo do caminho é uma hipótese que, a priori, nunca deve ser descartada. Dessa forma, como no caso do presente artigo, quando a atenção é voltada para o período inicial da trajetória literária de Machado de Assis, quase sempre relegada pela crítica a um longínquo segundo plano, abre-se a chance ímpar de encontrar novos problemas sobre o autor e sua obra.

Nesse sentido, se, no caso da leitura de "O profeta", percebe-se sem maiores dificuldades que o jovem Machado de Assis, como era de se esperar, se apoiou numa concepção poética romântica, para, "no tempo das primeiras incertezas", enfrentar as dúvidas que rondavam (e sempre rondam) o nebuloso processo da criação literária; no caso da não publicação do Livro dos vinte anos, e ainda fiando-se na citada sugestão de Jean-Michel Massa de que, naquele período inicial, "o momento presente exprimia um progresso estético sobre o passado" e que "seus poemas de ontem perderam uma parte da vida",49 49 MASSA, A juventude de Machado de Assis, p. 327. é possível conjecturar que parecia existir um duplo movimento no interior do projeto literário machadiano: um de afastamento da concepção poética de "O profeta" e, por consequência, da maioria dos poemas românticos anteriores a 1860, e outro de aproximação da estética teatral realista. Em suma, com tais movimentos antagônicos, o jovem Machado de Assis dava evidentes sinais de sua obstinada (e recorrente) busca pelo aperfeiçoamento estético e, ao mesmo tempo, revelava traços visíveis de sua precoce consciência literária.

Referências

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  • VERÍSSIMO, José. O Sr. Machado de Assis, poeta. Estudos de literatura brasileira: 4ª série. Belo Horizonte/São Paulo: Itatiaia/Edusp, 1977.
  • 1
    Cf. MAGALHÃES JÚNIOR, Vida e obra de Machado de Assis, vol. 4, p. 154-155.
  • 2
    VERÍSSIMO, Estudos de literatura brasileira, p. 51.
  • 3
    Idem, p. 55.
  • 4
    “Instalada no Brasil desde 1844, a livraria Garnier é um exemplo eloquente das novas estratégias do comércio livreiro no movimento internacional de produção e circulação de mercadorias na segunda metade do século XIX, bem como da inserção brasileira nesse circuito de negócios com livros e livrarias. [...] O editor Baptiste Louis manteve sociedade com os irmãos parisienses [Hippolyte, August e Pierre] até 1852, quando assumiu a condição de proprietário exclusivo da então livraria de B. L. Garnier. O rompimento da sociedade não o impediu, contudo, de continuar a imprimir as obras de autores brasileiros em Paris, bem como de comercializá-los e, sobretudo, de vender no Brasil os títulos traduzidos ou no original, publicados pela parisiense Garnier Frères. Com a morte de B. L. Garnier em 1893, a livraria retornou, por direito de herança, a seu irmão Hippolyte, da Garnier Frères.” DUTRA, Impresso no Brasil: dois séculos de livros brasileiros, p. 70-71.
  • 5
    ASSIS, Correspondência de Machado de Assis: tomo III, 1890-1900, p. 422.
  • 6
    Idem, p. 439.
  • 7
    Idem, p. 515.
  • 8
    ASSIS, Poesias completas, p. V.
  • 9
    Segundo Ubiratan Machado, na preparação das Poesias completas, Machado de Assis “das obras publicadas, […] conservou cinquenta poemas e suprimiu 26. As Crisálidas foram o volume mais expurgado. Dos 28 trabalhos que compõem a primeira edição, foram reeditados doze, sendo abandonado ainda o prefácio de Caetano Filgueiras. Dos 35 poemas das Falenas, restaram 26. Das Americanas foram aproveitados doze poemas, sendo suprimida apenas a ‘Cantiga do Rosto branco’”. MACHADO, Dicionário de Machado de Assis, p. 268.
  • 10
    MASSA, A juventude de Machado de Assis, p. 327.
  • 11
    Idem, p. 328.
  • 12
    ASSIS, Crisálidas, p. 163.
  • 13
    BANDEIRA, Machado de Assis: Obra completa, vol. III, p. 11.
  • 14
    Cf. AZEVEDO, Obras de M. A. Álvares de Azevedo (Poesias, vol. 1).
  • 15
    CUNHA, O belo e o disforme, p. 127.
  • 16
    ASSIS, Machado de Assis: crítica literária e textos dispersos, p. 579-580.
  • 17
    Idem, p. 677-678.
  • 18
    MASSA, cit., p. 111.
  • 19
    Idem, p. 113.
  • 20
    Entre setembro e dezembro de 1854, Francisco Gonçalves Braga publicou cinco poemas no Periódico dos Pobres: “Soneto”; “Quem sou eu?”; “O mendigo”; “Paródia” e “Amor e traição”. Cf. BRAGA, Periódico dos Pobres, n. 96, p. 3; n. 99, p. 4; n. 103, p. 4; n. 107 e 108, p. 6; n. 133 e 134, p. 5-6.
  • 21
    Cf. Periódico dos Pobres, n. 103, p. 4
  • 22
    A epígrafe diz o seguinte: “Nunca vi, – não sei se existe/ Uma deidade tão bela,/ que tenha uns olhos brilhantes/ Como são os olhos dela!” / F. G. Braga. Cf. ASSIS. Marmota Fluminense, n. 539, p. 4.
  • 23
    O poema “A palmeira” está datado de “Rio de Janeiro, 6 de janeiro de 1855” com a seguinte dedicação “O. D. C. a Francisco Gonçalves Braga”. Cf. ASSIS. Marmota Fluminense, n. 540, p. 4.
  • 24
    BRAGA, Tentativas poéticas, p. 213-214.
  • 25
    Os sete poemas de Francisco Gonçalves Braga na Marmota Fluminense, incluindo-se o dedicado a Machado, foram os seguintes: “Soneto a Charton”, “Ode”, “Saudades de Pernambuco”, “Saudação poética ao Sr. Conselheiro António Feliciano de Castilho”, “Ao Sr. J. M. M. D’Assis (em resposta), “Vida e Morte (Meditação)” e, por fim, outro “Soneto a Charton”. Cf. BRAGA, Marmota Fluminense, n. 523, p. 1; n. 525, p. 2; n. 534, p. 2-3; n. 587, p. 3; n. 636, p. 4; n. 644, p. 1; n. 672, p. 1.
  • 26
    A Marmota da Corte, n. 1, p. 1.
  • 27
    Para a relação dos poemas que Machado de Assis publicou nos jornais de Paula Brito, ver: SOUSA, Bibliografia de Machado de Assis, 1955, e MASSA, Dispersos de Machado de Assis, 1965.
  • 28
    MASSA, A juventude de Machado de Assis, cit., p. 85.
  • 29
    Apud idem, p. 87.
  • 30
    No dia 10 de junho de 1856, ou seja, a onze dias de completar dezessete anos, Machado de Assis publicou o seu primeiro texto em prosa no jornal de Paula Brito. Sob a rubrica de “Ideias vagas”, o jovem autor escolheu como tema de estreia justamente a poesia. Cf. ASSIS. Marmota Fluminense, n. 731, p. 2-3.
  • 31
    ASSIS, Marmota Fluminense, n. 644, p. 3.
  • 32
    ANDRADE, Aspectos da literatura brasileira, p. 242.
  • 33
    AZEVEDO, Obra completa, p. 205.
  • 34
    ROSENFELD, O romantismo, p. 267.
  • 35
    FERRAZ, Dicionário do romantismo literário português, p. 193-194.
  • 36
    Correio Mercantil, n. 225, p. 1.
  • 37
    Outro possível diálogo com Álvares de Azevedo estaria na coincidente publicação em A Marmota, em 30 de março de 1860, de algumas cenas de uma “fantasia em um ato”, intitulada Odisseia dos vinte anos. Trata-se de um fragmento dialogado entre Luís, pintor e poeta, e Álvaro, em que, segundo Jean-Michel Massa, “o desejo de ser amado [do primeiro] se mistura à tristeza de nunca tê-lo sido”. Cf. A Marmota, n. 1147, p. 3, e Cf. MASSA, A juventude de Machado de Assis, p. 275-276.
  • 38
    Correio Mercantil, n. 19, p. 1.
  • 39
    Correio da Tarde, n. 39, p. 3.
  • 40
    Abaixo do anúncio do livro, vinha outro de A Marmota, referindo-se ao “Sr. Machado de Assis” como um “moço de grandes esperanças, de muito futuro”. Cf. Idem.
  • 41
    Na mesma edição do Correio da Tarde em que aparece o anúncio do livro foi antecipada na coluna “Notícias e Avisos Diversos” uma “Declaração” que sairia no dia seguinte em A Marmota: “Temos o prazer de anunciar aos nossos leitores que o Snr. – Machado de Assis – faz hoje parte da colaboração da Marmota”. Essa declaração pública de Paula Brito nos dois periódicos sobre a colaboração de Machado de Assis, além de louvar o jovem escritor, reforçava obviamente a própria publicidade do Livro dos vinte anos. Nesse mesmo sentido, e já no mês seguinte, em outro anúncio – “Lede a Marmota” – publicado no Correio Mercantil, a colaboração de Machado na revista de Paula Brito seria mais uma vez destacada: “O Sr. Machado de Assis, cuja pena é bem conhecida e melhor conceituada, é ainda um de seus principais colaboradores”. Cf. Correio da Tarde, n. 39, p. 2-3; Cf. A Marmota, n. 1136, p. 1, e Cf. Correio Mercantil, n. 89, p. 4.
  • 42
    ASSIS, Marmota Fluminense, n. 753, p. 1-2.
  • 43
    Para detalhes sobre as peças traduzidas por Machado de Assis, ver: FARIA, Machado de Assis – Tradutor de teatro, p. 48-68.
  • 44
    Os dois artigos “Ideias sobre o teatro” I e II foram publicados em 25 de setembro e 2 de outubro de 1859. Já as “Revistas de Teatro” foram publicadas a partir do segundo número de O Espelho, a primeira em 11 de setembro de 1859, e a última em 8 de janeiro de 1860. Cf. ASSIS, O Espelho.
  • 45
    Cf. FARIA, Teatro de Machado de Assis, p. IX-XXX.
  • 46
    Cf. A Marmota, n. 1270, p. 4.
  • 47
    Em 17 de julho de 1861, uma nota nas “Notícias Diversas” do Correio Mercantil informava que: “acha-se no prelo em casa do Sr. Paula Brito a peça dramática Desencantos, do Sr. Machado de Assis. / O nome do autor é garantia da obra. Subscreve-se em casa do Sr. Paula Brito, Pinto & Comp. e Waldemar”. Correio Mercantil, n. 194, p. 1.
  • 48
    No dia 4 de setembro de 1861, o aparecimento do livro foi noticiado tanto pelo Jornal do Comércio – “O Sr. Machado de Assis acaba de publicar uma fantasia dramática, como ele mesmo a chama, com o título de Desencantos. É um quadro de costumes da época, que, tanto quanto por uma rápida leitura nos foi possível avaliá-lo, não deslustra por certo o nome de seu autor” –, quanto pelo Diário do Rio de Janeiro – “Acaba de sair à luz uma fantasia dramática do Sr. Machado de Assis, intitulada: Os Desencantos [sic]”. Além disso, em 15 de setembro, um longo excerto da peça (Segunda parte, cena VII) apareceria traduzido em francês nas páginas do jornal Courrier du Brésil, semanário editado no Rio de Janeiro. Cf. Jornal do Comércio, n. 245, p. 1; Cf. Diário do Rio de Janeiro, n. 242, p. 1, e Cf. MASSA, Machado de Assis e a crítica internacional, p. 243-252.
  • 49
    MASSA, A juventude de Machado de Assis, p. 327.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2016

Histórico

  • Recebido
    14 Jul 2016
  • Aceito
    27 Set 2016
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